Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. O MELHOR DE NÓS: IGNORÂNCIA? CONFUSÃO? MEDO? CORAGEM? DETERMINAÇÃO? SOLIDARIEDADE?... Maria João Amaral * * Docente do Pólo de Lamego do Instituto Superior Politécnico de Viseu. Alguns meses após ter aceite o convite para participar nos Encontros de Didáctica promovidos pela ASACRIAP, dei-me conta que, desta vez, me sentia muito mais insegura do que em anteriores situações semelhantes. Não sabia por onde começar, pois não encontrava as receitas que provavelmente trouxeram alguns professores a estar presentes neste fórum. Nunca fui muito adepta de receitas, nem mesmo na cozinha...! Sentia-me e sinto-me um pouco perdida porque é também assim que sinto muitos dos Colegas com quem contacto nas escolas, para já não falar dos meus estagiários. No meio de todas estas dúvidas e numa tentativa de as esquecer e de matar Saudades de Nova Iorque, lendo Pedro Paixão (2000:83), comecei a estabelecer convosco um diálogo imaginário que poderia vir a ocorrer: Como se sente? Perguntaríeis, e eu teria de responder: Confuso[ a] . Logicamente interpelarme-iam: [ Então] Porque veio até cá? Não sei de facto dizer-lhe[ s] porquê. No momento presente, estas palavras não pretenderiam senão encontrar uma saída para ter "embarcado" em mais este desafio, ignorante que estava (não estamos todos?) das exigências e das angústias que as mais recentes convulsões e incertezas sobre a Educação estão a causar. Na altura, foi-me proposto que falasse sobre os novos referentes programáticos e sobre as novas áreas curriculares. Teria que me documentar... que estudar umas coisas... mas isso até seria positivo para as minhas aulas de Didáctica e para as minhas funções de Supervisora de estágios ... Não era nada a que já não estivesse habituada...! Lá fui lendo as "novidades"; fui a um Congresso sobre Currículo ... mas cada vez me sentia mais incapaz de vir "debitar" receitas. Desengane-se por isso quem espera encontrar certezas nas minhas palavras. Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. Através do contacto diário com Colegas nas escolas que frequento e/ou onde lecciono, só encontro angústias ..., ouço queixas sobre o excesso de trabalho que nos é exigido ..., discussões entre os mais descrentes ou os totalmente avessos às mudanças e aqueles que ainda crêem ser possível fazer algo. O panorama não é agradável e criou, também em mim, alguma ansiedade para enfrentar aquele momento e aquele público. Como já disse antes, não sou, e se calhar nunca fui, apologista de receitas mágicas... Em Educação, e concretamente no ensino da língua Inglesa, nunca as houve ou haverá... Poderão existir alguns lenitivos mais ou menos apaziguadores das angústias, das queixas e das "brigas contra o sistema" ("nós somos seres de briga", Freire, 1997) e entre eles gostaria de destacar um que há muito considero fundamental e sobre o qual já escrevi (Sá-Chaves e Amaral, 2001): precisamos deixar de ser "eus solitários", para nos sentarmos à volta de uma mesa ou de várias e tentarmos resolver, como "eus solidários", os problemas que sentimos que nos afectam, mas que vão sobretudo atingir os nossos Alunos se não os resolvermos colegialmente nos microssistemas das nossas escolas/reuniões/turmas ... (Fullan & Hargreaves, 2001:136; 113; 99) Apesar de não concordar com tudo o que Marçal Grilo afirma numa obra polémica recentemente publicada (Neto, 2001), há algo que subscrevo totalmente, o título – Difícil é Sentá-los – porque o associei sobretudo a nós, Professores. Sobre os Alunos já muito se tem dito e escrito e julgo ser verdade aceite, mais ou menos genericamente, que, se não forem considerados os seus interesses, os seus estilos de aprendizagem e as suas necessidades, dificilmente os manteremos sentados. São precisamente os novos ... (atrevo-me a apelidá-los de "velhos") aspectos da reforma educativa em curso que necessitam que nos sentemos para sobre eles reflectirmos e discutirmos honestamente, partilhando os nossos saberes e ignorâncias, enriquecendo-nos mutuamente, sem receio dos saberes dos outros. Ninguém sabe tudo e muito menos sabe como resolver todos os problemas. A ignorância e a confusão são gerais, mas mantê-las não é apenas sinal do individualismo desenfreado de hoje. É antes um sinal de fraqueza e de falta de respeito por aqueles que nos são confiados para os ajudarmos a tornarem-se cidadãos esclarecidos, responsáveis e autónomos. Não será porque esperávamos que este encontro nos poderia elucidar que aqui viemos todos? Não é por essa razão que vamos a Congressos, Colóquios, etc ...? Não é por isso que alguns de nós lêem os livros que vão saindo sobre os vários temas "quentes" e que outros (talvez em menor número porque ainda não deram conta que podem ser investigadores por direito próprio) investigam sobre as suas práticas e escrevem sobre elas? Nesses momentos estamos geralmente sentados ... Porém raramente Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. dialogamos e partilhamos aquilo que descobrimos, com o que concordamos ou não, e que poderá servir aos outros. É pena...! Esta falta de diálogo é ainda mais patente nas escolas. Falta aquilo que hoje se costuma apelidar de "cultura de escola": uma escola reflexiva e solidária, onde os professores se sentam, às vezes com outros parceiros educativos, para tentar encontrar uma luz ao fundo do túnel que muitos insistem não existir. É de novo em Pedro Paixão que encontro algumas palavras desdramatizadoras desta situação. Passo a citar: Quem não está confuso corre o risco de estar enganado, pior, de se estar a enganar. A ignorância é preferível à crença porque mais profícua. Até certo ponto é o medo e só depois a coragem que produz o juízo, a determinação. Há em mim alguém que persiste numa essencial confusão, que vive uma fatal ignorância. O melhor de mim. (op.cit. p.83) Tomemos pois o que de melhor há em nós – a "fatal, mas profícua ignorância". Depressa descobriremos que muitas das nossas angústias não têm razão de existir, se tomarmos como lema algumas afirmações de Freire (cit. in Macedo et al, 2001:133): 1º) "não há saber sem busca inquieta" (1967); 2º) "o cumprimento de tarefas entre as quais a de tornar algumas delas possíveis, quando delas se fala como inviáveis" (2000). Os novos referentes programáticos e curriculares, na maior parte dos casos, não passam de conceitos ou de teorias mais ou menos velhos, já presentes nos Programas de Inglês desde 1991, alguns dos quais apenas foram rotulados de modo diferente, provavelmente, numa tentativa de que os aceitemos melhor. Concretizando: o Um currículo baseado em competências que se "operacionalizam", ensinam e desenvolvem está já previsto nas "Finalidades", nos "Objectivos" e nos "Conteúdos Programáticos" desses "velhos" programas. Propus aos meus estagiários uma tarefa: cruzarem a informação contida no Programa Nacional de Inglês, para o 2º Ciclo, com a constante no documento das "Competências para o Ensino Básico". Não lhes dei mais directrizes. Apenas dividi as dez competências pelos cinco grupos. Sentaram-se, reflectiram e descobriram que é "viável" cruzar os dois documentos! Cada grupo Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. analisou duas das 10 Competências Gerais, ligou-as às Finalidades e aos Objectivos do Programa "velho" e, neste, encontrou os Processos de Operacionalização equivalentes aos constantes no Documento das Competências. o Alguns até se atreveram a propor que se incluísse uma quinta "skill" – ver – que aparece agora associada à "skill" – ler. Foi preciso lembrar-lhes que, muitas vezes, ouviram dizer que um filme é um tipo de leitura realizado a vários níveis: aquela que cada um faz enquanto o vê, e aquela que foi feita pelo realizador ao interpretar a obra literária (ou não) em que se baseou e que transferiu para a película. Todos temos presentes exemplos de filmes usados nas nossas aulas: "The Go-Between", "The French Lieutenant’s Woman", "The Dead Poets' Society", etc! Recordei-lhes ainda que não é por acaso que as gravuras são apelidadas de "textos iconográficos" e que essa designação já existia nos "velhos" documentos. Só é pena que nos actuais programas do Secundário (p.13) se reduza esta definição lata de texto, e de forma até um pouco contraditória (vide Fig. 2, p.17) apareçam como tipos de textos os video-clips, os filmes, a Internet, rótulos, etc.! o Se como Perrenoud (1999) aceitarmos que competência é "uma capacidade de agir eficazmente num determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem se limitar a eles" (p.7), é preciso que alunos e professores se consciencializem das suas capacidades individuais que melhor podem servir o processo cíclico de AprendizagemEnsino-Aprendizagem. Mas já não estavam previstos, nos anteriores documentos, conceitos como "metacognição", "cognição", "learner-centredness", "learner independence", "experiential learning", etc.? Hoje, as sugestões de gestão curricular privilegiam a transversalidade dos saberes, processos e competências, adquiridos em diversos contextos: outras disciplinas ou fora da escola. Será que as podemos considerar "novas"? o Os "Processos de Operacionalização" já apontam claramente para o Aluno – aprendente – como um dos actores principais desse processo cíclico de "Aprendizagem-Ensino-Aprendizagem", o qual nunca poderia ser considerado "tábua rasa", mas alguém possuidor de saberes "experienciados" aos quais nós ajudaríamos a acrescentar novos consciencializadas. conhecimentos, rentabilizando as tais competências já Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. o A noção de Competência Comunicativa, agora apelidada de "de Comunicação", já era considerada uma "macro-competência" na qual interagiam/interagem outras subcompetências (linguística, discursiva, estratégica, intercultural, processual), hoje também presentes, felizmente já não apenas num glossário, mas bem inseridas no texto. (cf. novo Programa para o Ensino Secundário, p.8-9). São a base para a formulação das finalidades e dos objectivos programáticos e estão ligadas às competências gerais (saber, saber fazer, saber ser e saber aprender; a sociocultural, etc), tendo-se "transformado" em competências específicas que contribuem para a aquisição da dita Competência Comunicativa que inclui: a linguística (desdobrada nas competências lexical, gramatical, semântica, fonológica, isto é, o sistema da língua); a pragmática (desdobrada nas competências discursiva e funcional/ estratégica); e a sociolinguística, determinando assim, que os interlocutores se não tornem "vítimas indefesas" em certos contextos de interacção social pelo desconhecimento de certas linguagens. o A "Área de Projecto" também não é novidade e não me estou a referir à "defunta" Área Escola, que eu tantas vezes defendi e tentei operacionar, sem grandes ou nenhuns resultados. Estou a lembrar-me da metodologia de Trabalho de Projecto veiculada por tantos autores e até manuais de/para a língua inglesa, lá pelos anos oitenta, tantas vezes rejeitada, sem nunca (ou quase) se ter feito uma avaliação cuidadosa e séria junto de todos os actores educativos, das suas vantagens e/ou desvantagens, para além daquela que à partida era totalmente tida como a única "crença" verdadeira – "não se podiam cumprir os programas se a desenvolvêssemos"! o A "Educação Cívica" – para uma Cidadania responsável – esteve sempre presente em programas de línguas que não ignoravam que língua e cultura(s) não podem ser dissociadas. Não há/havia umas "macro áreas de conteúdos" chamadas "Sociocultural" e "Atitudes, valores e competências"? Não se esperava com elas criar cidadãos capazes de, conhecendo e aceitando as diferenças ou semelhanças culturais e/ou rácicas, se tornarem mais tolerantes e capazes de promover um mundo melhor? o Em todas essas áreas de conteúdos não se estavam já a promover competências e atitudes de vária ordem, ligadas à Área de Projecto ou mesmo às aulas mais vulgares, que autonomizassem progressivamente o aluno, pedindo-lhe que investigasse e Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. trouxesse, para partilhar, com os colegas e com o professor, o resultado das suas pesquisas? o Não nos lamentámos sempre de que precisávamos de mais tempo para ajudar cada um dos nossos alunos a aprender melhor, mas que não podíamos abandonar "a maioria"? Temos aí o Estudo Acompanhado! Façamos dele algo diferente do Apoio Pedagógico Acrescido de má memória. Sentemo-nos, investiguemos e, em conjunto, "fabriquemos" fichas de trabalho que privilegiem o "self-study" e a diferenciação (com soluções para os alunos!) que permitam ao "par pedagógico", indigitado para esta tarefa, acompanhar efectivamente os nossos alunos, ensinando-os a aprender melhor, sem cair na tentação de apenas os acompanharam nas "suas" áreas de especialização. Não precisam os pares pedagógicos também de ser ajudados? Não é viável nem desejável organizar o Estudo Acompanhado com um docente de cada disciplina – as finanças não aguentariam e a transversalidade dos saberes também não se concretizaria! Encaremos esta nova área curricular como a solução para a indesejável diminuição da carga horária de certas disciplinas. Poderia provavelmente continuar a dar exemplos, mas o tempo não mo permite. Fica para o debate... ou para a "tareia" que venha a apanhar no final de tantas afirmações, quiçá provocatórias... mas tão evidentes que até os meus estagiários mas ajudaram a formular quando, sozinhos (sem a minha supervisão/protecção/orientação), confrontados com o pedido de "socorro" da sua professora "ignorante", tão confusa quanto eles, se sentaram à volta dos vários documentos e executaram a tarefa solicitada, de modo perfeitamente diferenciado, mas fornecendo-me algumas pistas. Não me senti nem mais nem menos desautorizada por lhes confessar a minha confusão, nem eles o estranharam. Já estão habituados a que me queixe da falta de tempo para tudo o que sou solicitada e também acreditam que, por mais que estude, nunca poderei ser detentora de todo o saber e que "(2)4 olhos vêem melhor do que dois" ... Creio também, sem falsa modéstia, e recorrendo de novo a Pedro Paixão, que "o melhor de mim" é estar em permanente confusão e assumir a "fatal ignorância", as quais, após o "medo" inicial, conduzem à "coragem que produz o juízo, a determinação". Foram precisamente a "coragem e a determinação" que me permitiram não desistir e, embora com "medo", estar hoje aqui sentada, na vossa frente com a esperança de que, juntos, comecemos a Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. abandonar o discurso habitual – "não temos tempo..., não nos pagam para isso..., estão sempre a mudar tudo..., não recebemos formação ..., ..." – e consigamos começar a trabalhar solidariamente na construção de uma cultura diferente de escola, não porque os documentos são diferentes, mas porque o que tem de ser alterado são as nossas atitudes! o Uma escola onde ninguém tem receitas infalíveis – todos já tentaram diferentes "receitas"! Umas resultaram bem, outras menos bem, mas essas experiências servem para a promoção de uma reflexão conjunta na busca das razões dos êxitos ou dos fracassos o Uma escola que é o lugar onde, citando Canário (2000), os professores aprendem, adquirem e desenvolvem conhecimentos de vária ordem, com os outros professores, com os alunos, com o que lêem, sobre o que reflectem, partilham e discutem. Daí que se defenda uma formação contínua de professores centrada na escola e nas necessidades concretas de cada uma, tendente a ajudar a construir a "assustadora" identidade curricular. Promovamos pois Círculos de Estudo, Oficinas de Formação, etc.! o Uma escola onde as aprendizagens dos alunos podem ser realizadas de forma cada vez mais autónoma, se os fizermos descobrir e partilhar os seus estilos e estratégias de aprendizagem. Para tal podemos recorrer a R. Oxford (1990) a qual, sem as hierarquizar, as divide em estratégias directas e indirectas, atribuindo-lhes diferentes funções, com base numa metáfora ligada as cognitivas e compensatórias, ao teatro: utilizadas estratégias metacognitivas, afectivas e sociais, as sobretudo mais estratégias pelo utilizadas de memória, actor/aluno; pelo director as de cena/professor para gerir e monitorizar a actuação dos actores/alunos e as relações interpessoais, contribuindo assim para uma melhor "performance". Será nessas relações interpessoais que poderemos promover sistemas de ensino colaborativo entre os alunos, do tipo "tutoria" ou de Estudo Acompanhado, onde "o melhor de cada um" é posto ao serviço de todos. Também foram a determinação e a coragem que permitiram estar aqui sentada e esperar que, quem me está a ouvir, tem provavelmente ideias diferentes das minhas, mas, porque espero que as vamos poder discutir colegialmente, talvez encontremos a desejada luz ao fundo do túnel, que será sinal de que a tal cultura de escola está emergente. Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. Só assim consigo estar aqui sentada. Na esperança de que me não levem a mal o facto de lhes lembrar que continuando a ser encarados como exemplos pelos nossos alunos, seja qual for o nível de ensino onde nos movamos só poderemos pôr em prática as "novas-velhas" sugestões programáticas e curriculares junto deles se nós próprios começarmos a actuar de acordo com os valores e atitudes que pregamos e pretendemos que estes venham a aceitar. Como podem vir a trabalhar colaborativamente se derem conta que cada disciplina continua a ignorar a existência das outras e que os conhecimentos transmitidos se continuam a sobrepor ou a repetir, sem vislumbrarem a desejável transversalidade que os pouparia a eles e a nós? Finalmente, acredito que se nos habituarmos a estar sentados com a vontade firme de partilhar tarefas não "inviáveis", mas que sabemos ser capazes de fazer bem, porque já encontrámos algumas estratégias valiosas de aprendizagem/ensino, a nossa vida fica menos angustiante e os psiquiatras e psicólogos perdem clientes. Porém, para que tal aconteça, não precisaremos de nos violentar e de nos moldar aos padrões dos outros. É preciso aceitar e acreditar que a "diferença é", já existe em nós, mas a "identidade devém", constrói-se na colaboração e no enriquecimento, proveniente das várias diferenças, (Tadeu da Silva, 2002) – o chamado "efeito multiplicador da diversidade". Às escolas, os novos normativos curriculares pedem que encontrem as suas identidades, que tenham um Projecto Educativo de Escola, vários projectos curriculares, mais ou menos vastos. Porém, Paulo Freire já em 1991 afirmava que "não se pode mudar a cara da escola por portaria". A autonomia das escolas, estando legislada, permite que se comece a construir a sua identidade com base nas diferenças "existentes", se as mesmas forem aceites e rentabilizadas e se não nos refugiarmos na desculpa "esfarrapada" de que assim não se cumprem programas. Estes terão de continuar sempre a existir para se cumprirem. Não faria sentido que Portugal não possuísse um "core curriculum" estruturante das aprendizagens se ele existe em países como os EUA e o Reino Unido! Porém o modo como o cumprirmos pode ser facilitado pelo trabalho colaborativo e reflexivo de todos: alunos, professores, administradores, etc. Descansem, por isso, os mais cépticos. A minha mente confusa não ensandeceu de vez! Os nossos alunos vão poder mudar de escola! As diferenças, as identidade e as competências não significam que os conhecimentos foram para "a gaveta". Há conhecimentos previstos nos programas e há, como já Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. disse, currículos nacionais a organizá-los! Para nós, professores de alemão, francês, inglês, etc... há também algo mais vasto que é o "Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas" que também tem de nos reger nas nossas lides docentes e de avaliação. Porém, para que os possamos cumprir ou seguir, naquilo que as nossas identidades "em devir" necessitam, citando o velho e sábio Dewey, teremos de, com "responsabilidade, entusiasmo e abertura de espírito", nos sentarmos, para os analisarmos e sobre eles reflectirmos, partilhando essas reflexões, eventualmente desconstruindo alguns dos alicerces até hoje considerados seguros, para de novo os construirmos, tendo em conta as diferenças que efectivamente existem em todos os actores educativos com vista à tão almejada identidade curricular de escola, de turma, ... Espero que a confusão ora reinante nos amedronte saudavelmente, abale as nossas crenças inabaláveis e nos consciencialize de que é partilhando as nossas angústias e ignorâncias face aos documentos existentes e tirando partido dos nossos "saberes de experiência feita" que seremos capazes de pôr alguma ordem nas nossas confusões pessoais, tornando-as criativas e capazes de nos irem tranquilizando, contribuindo assim para uma Educação mais responsável que nos tire da "cauda da Europa". Referências Bibliográficas: CANÁRIO, R. (1998) "A escola: o lugar onde os professores aprendem". In Actas do I Congresso Nacional de Supervisão – Supervisão na Formação: contributos inovadores. Univ. Aveiro: Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa, 1999, pp. 11-19. Conselho da Europa (2001) Quadro europeu comum de referência para as línguas. Aprendizagem, ensino, avaliação. Edições ASA FULLAN, M. & HARGREAVES, A. (2001) Por que é que vale a pena lutar? O trabalho de equipa na escola. Porto Editora: Colecção Currículo, Políticas e Práticas, n.º8 MACEDO, E. et al (2001) Revisitando Paulo Freire: sentidos na educação. Porto: Edições ASA. NETO, D. (2002) Difícil é sentá-los. A educação de Marçal Grilo. Lisboa: Oficina o Livro. Amaral, Maria João (2002). O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?... Millenium, 26. OXFORD, R. (1990) Language Learning Strategies – What every Teacher Should Know. Boston: Heinle & Heinle. PAIXÃO, P. (2000) Saudades de Nova Iorque. Lisboa: Edições Cotovia. PERRENOUD, P (1999) Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Editora Artes Médicas Sul. SÁ-CHAVES, I. & AMARAL, M. J. (2001) "Supervisão Reflexiva: a passagem do ‘eu solitário’ ao ‘eu solidário’. In I. Alarcão (2001) Escola Reflexiva e Supervisão – uma escola em desenvolvimento e aprendizagem.Porto: Porto Editora, Cadernos CIDInE 14. TADEU da SILVA, T. (2002) Comunicação não publicada proferida num Painel subordinado ao título: "Currículo e conhecimento: identidade ou diferença?". Braga: Univ. do Minho – Instituto de Educação e Psicologia: Departamento de Currículo e Tecnologia Educativa."V Colóquio sobre Questões Curriculares", 3-5 de Fevereiro.