AREIA: material indispensável no passado, presente e no futuro da humanidade. Ivam Luís Zanette Geólogo, Consultor em Geologia, Mineração e Meio Ambiente, Consultor da Soc. dos Mineradores de Areia do Rio Jacuí Ltda. [email protected] No início da década de 90, o sociólogo Francês Jacques P. de Brochard afirmou que “dentro de dez anos estaremos usando 50% de bens e serviços que, hoje, ainda não foram inventados”. Se dermos uma olhada em nossa volta, constataremos que as previsões do sociólogo em grande parte se confirmaram, afinal a acelerada dinâmica evolucionista de nossa sociedade leva a uma rápida obsolescência de grande parte dos bens que utilizamos. No entanto alguns bens vêm resistindo aos avanços tecnológicos perpetuando seu uso através de séculos ou até mesmo de milênios como no caso da areia cujo aproveitamento iniciou ainda na pré-história e resiste até hoje. A areia é um dos materiais mais utilizados pelo homem, o espectro de usos é amplo, construção civil,Dentre os variados usos da areia, merece destaque aquele relacionado a construção civil, quer pela importância social, quer pelos grandes volumes consumidos. Os mais antigos dados relacionados ao uso da areia na construção civil, aparecem no sítio arqueológico de Tell Mureybet (na atual Síria) onde foram localizadas casas construídas com areia comprimida. Tell Mureybet é o mais antigo povoamento conhecido (8.600 a 7.300 a.C.), demonstrando assim, que já nas primeiras aldeias, nos primórdios do neolítico, o homem utilizava areia para construir casas. Também remonta ao Neolítico as provas arqueológicas de uso da areia como agregado na confecção de argamassas. Por volta do ano de 6.500 a.C., o povo de Çayönü Tepesi (sítio arqueológico situado no sudoeste da atual Turquia), utilizava argamassa com cal para construir pavimentos do tipo Terrazzo. De forma mais generalizada, registros de emprego da argamassa começam a aparecer nas pirâmides do Egito. Argamassas manufaturadas com areia e aglomerante (inicialmente barro e posteriormente gipsita ou cal) foram utilizadas na edificação das pirâmides, a primeira delas foi construída na 3ª Dinastia do Antigo Império por ordens do Faraó Djoser (2.630-2611 a.C.) e projetada por seu Vizir ImHotep que desenvolveu técnicas de engenharia que o tornaram famoso, tanto é que após sua morte foi considerado um Deus. ImHotep é o mais antigo Arquiteto e Engenheiro de nome conhecido Pirâmide de Queóps upload http://fr.wikipedia.org/wiki/Image:Pyramide_Kheops.JPG by Alex LBH Os Gregos também utilizaram argamassas em suas construções, a eles é atribuída a idéia de adicionar cinza vulcânica a mistura tornando os concretos bastante duros, exemplo desta aplicação é o aqueduto de Megara, construído em 500 a.C., onde um de seus reservatórios ainda preservados foi revestido com uma camada de argamassa pozolâmica de 12 mm. No Século III a.C. os Romanos aperfeiçoaram a argamassa Grega, consolidando o uso da areia como agregado e do cimento pozolâmico como aglomerante, provocando um avanço sem precedentes nas técnicas de construção. Uma de suas principais fórmulas, denominada de “opus cementicium”, era representada pela mistura dosada de cal, areia, cascalho e material de origem vulcânica (mistura natural de argilas e fragmentos de rocha) e produtos orgânicos (leite, gordura animal e sangue). O “opus cementicium” formava uma massa de alta plasticidade, fácil de moldar e que após endurecimento se transformava em um concreto extremamente resistente e durável. È graças a durabilidade do concreto Romano que obras magníficas daquele período chegaram a nossos dias ainda relativamente preservadas. Este novo material alicerçou o desenvolvimento de várias técnicas de construção inovadoras, tornando possível formas arquitetônicas variadas, com destaque para os arcos e as abóbodas, que implementaram uma revolução sem precedentes na arquitetura e modificaram radicalmente a imagem de Roma e das demais cidades do Império. A qualidade de vida dos habitantes destas cidades também deu um salto sem precedentes, proliferaram moradias mais seguras e salubres, aquedutos abasteciam as cidades com águas mais puras, alamedas pavimentadas facilitavam o deslocamento da população, casas de veraneio, estações de banho e teatros propiciavam lazer e templos monumentais serviam à religiosidade. A qualidade da argamassa/concreto dos Romanos possibilitou a construção de obras monumentais tais como o Pantheon, cuja abóboda tem 43 metros de diâmetro e o Coliseu que foi construído em terrenos de baixo suporte geotécnico graças a uma fundação de concreto ciclópico de 12 metros de profundidade. Abóboda do Pantheon - G. Panini upload http://it.wikipedia.org/wiki/Immagine:Pantheon-panini.jpg Embora os Romanos não entendessem de maneira científica as reações químicas que ocorriam no seu concreto, para reduzir a variação da eficácia em diferentes aplicações eles estabeleceram, de forma empírica, diversas fórmulas (traço) de argamassa. Vitruvius, na memorável obra “De architectura” descreve “Depois de a cal ter sido apagada, então far-se-á em seguida a mistura da argamassa, de forma a que se deite três partes de areia, se esta for fóssil, para uma de cal; se for fluvial ou marinha, junte-se duas partes de areia a uma de cal. Desta forma ter-se-á a relação correcta da mistura da composição”. Plínio o Velho, também descreve traços de argamassa. A partir de meados do século XVIII, fomentado pelas necessidades de obras na zona marítima e fluvial (principalmente portos), começaram aparecer evoluções significativas nos aglomerantes, desta vez de maneira científica. Em 1824, o químico britânico Joseph Aspdin deu um avanço revolucionário na engenharia ao descobrir um aglomerante que possibilitava a confecção de argamassas e concretos de alta plasticidade e resistência. Este novo aglomerante foi por ele denominado de Cimento Portland. A partir da base de Aspdim o cimento Portland evoluiu bastante, chegando a nossos dias como um aglomerante intensamente utilizado para fabricação de argamassas (cimento misturado com cal e areia) e, principalmente, de concreto (cimento misturado com areia, água, cascalho e/ou brita). A argamassa e o concreto ocupam lugar de destaque como materiais na construção civil moderna. Fica difícil imaginar a sobrevivência da humanidade em cidades sem uso intensivo de concreto e argamassa. É graças as características técnicas das argamassas e do concreto (versatilidade, plasticidade durante a aplicação e resistência após endurecimento) que foi e ainda é possível construir as cidades, seus prédios e suas obras de infra-estrutura. É graças ao concreto que é possível construir obras com magnitude antes inimagináveis. É graças a areia e a brita que é possível a produção em grande escala de concretos de alta qualidade (cerca de 85% do volume do concreto é representado por areia e brita em proporções similares). Uso intensivo de areia para construir cidades. Obtained from en:User:Jleon of En.Wiki @http://en.wikipedia.org/wiki/Image:Panorama_clip3.jpg Desta forma, a areia vem sendo utilizada isolada ou como coadjuvante de destaque na fabricação de argamassas e concretos desde os primórdios da humanidade, possibilitando a construção de cidades com habitações e infraestrutura que garantem bem estar e saúde a seus habitantes e permitem que continuemos em ritmo acelerado de desenvolvimento. Cabe frisar, que a areia é amplamente utilizada em obras de preservação ambiental, como na construção de sistemas de coleta, condução e tratamento de esgotos. A areia estava presente nas casas dos povos que habitaram as aldeias de Tell Mureybet e Çayönü Tepesi na Idade da Pedra Polida, foi utilizada por ImHotep para construir as primeiras pirâmides e pelos Gregos para construir suas cidades e reservatórios de água, foi importante para os Romanos revolucionarem a arquitetura, esteve presente nas argamassas da Idade Média, chegando a nossos dias como um dos bens minerais mais consumidos pelo homem, em conjunto com a brita (agregados) representa a mais importante indústria mineira do mundo em termos de volume (representa mais de 60% da produção mineira mundial). No transcorrer da história o homem mudou os aglomerantes e outros componentes da argamassa/concreto, no entanto a areia sempre esteve presente como componente de suma importância. Até hoje, não foram encontrados materiais que tenham características técnicas e econômicas capazes de substituí-la. Nos dias atuais, praticamente todas as nações utilizam areia. O consumo per capita deste mineral está relacionado de forma diretamentamente proporcional com a qualidade de vida de seu povo. Quanto maior o consumo per capita de areia de uma sociedade, melhores são as suas moradias, obras de saneamento, obras de tratamento de esgoto e conseqüente, melhor são as suas condições de vida. Por outro lado, quanto menor o consumo per capita de areia, maiores são os índices de favelamento, mais precárias são as obras de infra-estrutura e conseqüentemente pior é a qualidade de vida. No futuro, em que pese toda a evolução tecnológica vivenciada pelo homem, a renomada Instituição Americana USGS, no artigo denominado “Natural Aggregates – Foundation of America’s Future”, estima que o consumo de areia vá aumentar de forma significativa nos Estados Unidos pelo mínimo durante as duas próximas décadas. No resto do mundo o panorama não deverá ser diferente, o Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA) estima que em as populações urbanas continuarão em crescimento desenfreado passando de 3,3 bilhões em 2.008 para 4,9 bilhões em 2.030, assim será necessário muita areia para garantir sobrevivência digna nas cidades. Nos próximos 20 anos a humanidade consumirá mais de uma centena de bilhão de toneladas de areia. Se projetarmos á toda população do mundo um nível de vida equivalente ao da população brasileira este consumo duplicaria ou chegaria perto da casa do trilhão de toneladas com um nível de vida similar ao do Canadá. Referencias Bibliográficas: 1) 2) Bolen, W.P., 2007. Construction Sand and Gravel in 2005 Minerals Yearbook, Reston: United States Geological Survey. 2007. Disponível em: < http://minerals.usgs.gov/minerals/pubs/ commodity/sand_&_gravel_construction/dir2007-sandc.pdf> Acesso em 03 ago 2009. De BROCHARD, Jacques. A Miragem do Futuro. 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