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relações sino-brasileiras
O embaixador Sergio Amaral (segundo a partir da esquerda),
diretor do Centro de Estudos Americanos da FAAP, dá início
ao evento no qual o embaixador do Brasil na China, Clodoaldo
Hugueney (à sua direita), apresentou uma visão dos acontecimentos que estão ocorrendo naquele país. Também na mesa
principal estão o ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria
e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, hoje membro do
conselho de administração da Brasil Foods, e o vice-diretor da
Faculdade de Economia da FAAP, prof. Luiz Alberto Machado.
Uma visão da China e as
relações sino-brasileiras
Na abertura da palestra do embaixador do Brasil na China, Clodoaldo Hugueney, o diretor do Centro de Estudos
Americanos da FAAP, também embaixador Sergio Amaral,
disse: “Tenho a satisfação de dar as boas-vindas a todos.
Gostaria de registrar entre nós a presença da presidente
do Conselho de Curadores da FAAP, Celita Procopio de
Carvalho, que prestigia esse evento, como, aliás, tem
feito com muitas outras atividades que a FAAP tem desenvolvido nas relações do Brasil com a China. E, hoje, a
FAAP é uma das pioneiras nesse relacionamento, tendo
assinado, recentemente, um convênio com a University
of International Business and Economics (UIBE) para a
criação aqui de um Instituto Confúcio. Este será o quarto
Instituto Confúcio no Brasil, com a particularidade de
que vai ter também uma vocação empresarial e, dessa
maneira, poderá apoiar bastante o crescente intercâmbio
entre empresas brasileiras e chinesas.
Temos, aqui na mesa, a presença do ex-ministro do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e presidente do conselho de administração da Brasil Foods, Luiz
Fernando Furlan, um precursor do olhar para a China não
só pelas suas próprias atividades empresariais, mas pelas
ações públicas que desenvolveu quando foi ministro da
Indústria, Comércio e Desenvolvimento, no momento em
que o Brasil de fato deu uma grande virada e intensificou
a sua relação com a China.
Mas o principal é destacar a presença do nosso palestrante, o embaixador Clodoaldo Hugueney, um dos grandes
diplomatas e negociadores que o Brasil tem e que o
Itamaraty, de maneira acertada, colocou no lugar certo
e no momento certo em que as relações Brasil–China se
expandem de uma forma muito significativa e promissora,
ainda que não deixem de existir dificuldades e desafios.
Falo isso também como presidente do Conselho Empresarial Brasil–China.
Uma das coisas que diferencia a China e o Brasil nessa
sua relação bilateral é o fato de que, ao se fazer negócios
na China, muitas vezes fica a dúvida se o contato feito
é com uma empresa privada, com apoio do governo, ou
com uma empresa pública que desenvolve uma atividade privada, mas em ambos os casos há uma estreita
articulação do governo, que, inclusive, tem uma agência
especial para cuidar das empresas chinesas que investem
no exterior. Daí essa grande articulação, essa grande
coerência que existe nas posturas, na visão estratégica
entre o governo e as empresas chinesas.
A China vai passar por uma nova transição política, mas
já está em evolução a outra transição, que é a econômica. A China está introduzindo importantes mudanças no
seu projeto econômico, desenvolvendo uma conversão
para ter uma expansão do consumo interno, além de
promover pesados investimentos em tecnologia.
O que está evidente é que a China não quer mais apenas
exportar o made in China. O que ela deseja é exportar o
developed in China (criado ou desenvolvido na China).
Isso, obviamente, redirecionará as suas exportações e,
com certeza, terá um impacto no relacionamento comercial entre a China e o Brasil, para não dizer com todos os
países da América do Sul.
A China apenas dramatiza e chama atenção para um
grande problema que existe no nosso País, ou seja, que
o Brasil se transformou numa nação em que a produção
tem altos custos. Isso significa que, para vencer esse
problema, devemos nos tornar mais eficientes, inclusive
no agronegócio, buscando agregar mais valor a ele. É
sobre isso que viemos aprender aqui. Passo, assim, a
palavra para o embaixador Clodoaldo Hugueney.”
Na sua apresentação, o embaixador brasileiro na China,
Clodoaldo Hugueney, ressaltou: “A FAAP é uma Instituição que tenho sempre presente, porque uma das minhas
filhas se formou aqui na Faculdade de Artes Plásticas
e ela se recorda sempre com muita saudade dos seus
tempos de estudante.
Fico feliz também em saber que a FAAP está desenvolvendo esse esforço na colaboração com a China, procurando
estabelecer um melhor entendimento sobre a China no
Brasil. Isso é algo muito importante e acredito que outras
instituições de ensino superior (IESs) brasileiras também
já despertaram para essa necessidade de entender melhor a China e o que está ocorrendo nesse país.
No momento, a China está passando por uma nova
transição política. Para os chineses, 2012 é o ano do
Dragão. Portanto, é um ano especial, inclusive porque
é pouco previsível. No ano do Dragão, produzem-se, às
vezes, grandes resultados, ocorrem importantes eventos,
mas não deixa de existir a probabilidade de acontecerem
enormes tragédias. Porém, o ano do Dragão nunca passa
despercebido, e, neste ano, vai se completar a transição
entre a quarta e a quinta geração no governo chinês.
No final de 2012 acontecerá o 18º Congresso do Partido
Comunista, no qual será selada a nova estrutura do poder
na China com a escolha do presidente, do secretário-geral, do primeiro-ministro, dos integrantes da comissão permanente e assim por diante. Na realidade, esse
processo se estenderá até o começo de 2013, quando
numa sessão da Assembleia Nacional Popular será sacramentado todo esse processo de mudança.
A transição já começou e existe um líder indicado para
substituir o presidente Hu Jintao, que é o atual vice-presidente Xi Jinping, que acabou de realizar uma importantíssima viagem aos Estados Unidos da América (EUA).
Nesse contexto de política interna na China, são muito
importantes três conceitos: estabilidade, transição e
O embaixador Clodoaldo Hugueney faz uma brilhante exposição sobre o que
está ocorrendo atualmente na China e indicou os caminhos para melhorar as
relações sino-brasileiras.
controle. Deng Xiaoping, quando começou a estruturar
o socialismo com características chinesas, iniciou o
processo de transformação, reforma e abertura, mas
sempre preocupado com a estabilidade, pois tinha a
convicção de que sem ela não há desenvolvimento nem
crescimento. Dessa maneira, a estabilidade passou a
ser um valor central dentro da análise política chinesa.
A estabilidade pensada por Deng Xiaoping, obviamente,
estava estruturada em torno do Partido Comunista, como
o grande garantidor da estabilidade na China, que, junto
com as Forças Armadas, assegurariam a soberania e a
integridade nacional. Não é possível pensar numa reforma profunda da situação da organização econômica da
China sem ter subjacente a estabilidade, e a abertura
também requer uma estabilidade! Ou seja, estabilidade
das relações externas, estabilidade do processo de
globalização que abriu tantas oportunidades para que a
China se beneficiasse tanto.
A partir de certo momento, a estabilidade passou a ser vista
como algo gerador de muitas preocupações, e um importante sociólogo chinês desenvolveu o conceito de estabilidade
rígida, talvez pensando um pouco no ensinamento que se
obtém do bambu, que enverga, mas não quebra...
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relações sino-brasileiras
Sob dois ângulos, o grande público
que compareceu ao Centro de
Convenções da FAAP para ouvir
o embaixador do Brasil na China,
Clodoaldo Hugueney.
O tema da estabilidade está presente nessa transição
para a quinta geração, porque um dos grandes desafios
será manejar o conceito de estabilidade e dar a ela uma
dimensão de flexibilidade que permita uma renovação do
sistema político sem ameaçar o crescimento chinês e a
estrutura de poder no país, com as suas características
especiais de socialismo.
Essa transição na China é significativa, pois haverá uma
renovação muito grande dos quadros dirigentes chineses.
Dos nove membros da comissão permanente do bureau
político, sete devem ser substituídos. Dos 25 integrantes do Politburo, a maioria deve ser substituída, e isso
também vai ocorrer com os mais de 200 membros da
comissão central. Sairão do governo figuras muito expressivas, como o presidente Hu Jintao e o primeiro-ministro
Wen Jiabao, responsáveis certamente pelas altas taxas
de crescimento do país na última década.
Assume, assim, a quinta geração, e os integrantes da
quarta geração, ao atingirem a idade fixada, vão se aposentar. Então, isso é uma transição de importância, despertando nos observadores de política chinesa grandes
indagações sobre quais serão os objetivos, rumos etc.,
que essa quinta geração imprimirá na China.
Não se pode, porém, esquecer que, na China, o governo
se vale muito do colegiado, ou seja, de uma estrutura
bem integrada, ao contrário do que as pessoas no exterior
pensam, achando que é um regime fechado, no qual não
ocorrem os debates. Na China, os principais líderes do
seu governo envolvem-se em intensas discussões para
chegar a uma conclusão sobre as decisões que devem
tomar e delas participam correntes importantes de facções internas, o que as tornam bem acaloradas.
Como embaixador, tive oportunidade de participar de vários debates com intelectuais chineses e fiquei espantado
com o grau de liberdade com que eles tratam os diversos
temas e as críticas que fazem aos diferentes aspectos das
políticas públicas e as decisões tomadas pelo governo.
Os chineses, há uns seis anos, iniciaram um concurso
no país todo para escolher um caractere representativo
do ano. E para o ano 2011, o caractere escolhido foi o
kong, que significa muitas coisas, inclusive acusar, mas
o seu conceito principal é o de controle.
á E por que eles escolheram esse caractere complexo – controle – para representar 2011?
Porque já estava em execução um processo de transição, e porque a economia chinesa está enfrentando
alguns desequilíbrios que precisam ser controlados,
até para que a transição política aconteça de forma
absolutamente tranquila. A questão de controle é essencial na era econômica para o rebalanceamento das
atividades produtivas.
Em 2011, aconteceu uma acelerada inflação na China,
o que levou a diversos desequilíbrios que forçaram o
governo a injetar muitos recursos na economia.
Houve nesses últimos anos vários desequilíbrios na
China: os financeiros, os de investimentos, no sistema
de preços, etc. e eles foram se tornando cada vez mais
complexos, o que levou ao controle e à necessidade de
promover o rebalanceamento e a mudança de modelo.
Eles não são excludentes, pelo contrário, são uma interpenetração entre rebalanceamento e mudança de modelo.
Naturalmente, o rebalanceamento é mais simples, de
prazo mais curto, mais focado do que a mudança de
modelo, que é uma tarefa de médio e longo prazos e de
complexidade muito maior.
O diagnóstico do 12º Plano Quinquenal foi muito claro
ao indicar que havia um esgotamento do atual modelo
de crescimento chinês. Na realidade, esse diagnóstico
já vinha desde o 11º plano quinquenal, e aí a economia
já começou o processo de rebalanceamento e mudança
de modelo, porém, teve de interrompê-lo pela crise que
ocorreu no mundo em 2008, quando o governo precisou introduzir um enorme montante de recursos na sua
economia para que não houvesse uma queda brusca no
crescimento econômico do país.
A China, durante todo o período de crise, conseguiu
manter taxas de crescimento extremamente elevadas.
Assim, galgou para as primeiras posições, numa velocidade extraordinária, em torno do comércio internacional,
passando de 15º para primeiro exportador mundial.
A China está exportando muito para os Estados Unidos
da América (EUA) e, por outro lado, está continuamente
adquirindo títulos da dívida norte-americana como forma
de financiar esse processo e os déficits norte-americanos,
os quais são crescentes.
Esse modelo, entretanto, é insustentável e chegou a
hora de promover o remanejamento da economia chinesa, que envolve basicamente duas coisas: mudança dos
preços que se pagam pelo trabalho e pelo capital e fazer
com que uma economia que estava baseada na mão de
obra barata e na utilização maciça de recursos naturais
mude para uma situação em que tenha que conviver com
preços mais altos da força de trabalho e do capital.
Claro que o fato de a China fazer um rebalanceamento
interno não significa, necessariamente, que o rebalanceamento externo ocorrerá, apesar de até agora isso estar
acontecendo... O superávit chinês, no entanto, está caindo ano a ano, e, em 2011, foi de US$ 155 bilhões, uma
cifra muito menor do que aquela que se obteve em 2007,
e é possível que, em 2012, a China, pela primeira vez em
muitos anos, tenha déficit na sua balança comercial!
Na China, estão ocorrendo aumentos salariais que, em
2011, alcançaram 20%. Em 2012, devem ser iguais ou
até maiores!
Recentemente, o Banco Central da China já deu as mostras de como vai implementar as profundas reformas
no seu mercado financeiro, mudando radicalmente as
condições de operação, bem como o custo do dinheiro.
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relações sino-brasileiras
Na China, estão ocorrendo
aumentos salariais que, em
2011, alcançaram 20%.
Em 2012, devem ser iguais
ou até maiores!
Em breve, a China deverá se tornar o principal importador
mundial, substituindo os EUA, e isso deverá levar a um
rebalanceamento de sua taxa de câmbio. O dinheiro chinês, o yuan, precisa se valorizar, mas isso está ocorrendo
de forma muito lenta. Também não se pode esquecer
que as taxas de crescimento das exportações chinesas
estão caindo.
Como se pode perceber, a China vive uma profunda transformação na base do seu crescimento, ou seja, é o que
eles chamam de passar de um modelo extensivo para
um modelo intensivo, isto é, de um modelo baseado
na quantidade para um fundamentado na qualidade.
Além disso, a China quer passar de uma economia consumidora maciça e ávida de recursos naturais para uma
economia baseada em indústrias fundamentadas na tecnologia, inovação e criatividade. O país quer sair de uma
economia na qual mais de 70% de sua matriz energética
é baseada na queima de carvão para uma economia verde, valendo-se, principalmente, de fontes renováveis de
energia e com tecnologia desenvolvida no país.
Esse processo tem muitas outras discussões, com
destaque para a social, pois está havendo uma sensível
melhoria da redistribuição de renda, talvez um resultado
claro do intenso processo de urbanização da China.
Pela primeira vez, a população rural é menor do que a
população urbana, e tal processo vai se acelerar nos
próximos anos. Claro que isso está mudando a economia
chinesa. Lidar com esse processo todo não é fácil e exige
um eficiente manejo das políticas macro e microeconômica, pois envolve a mudança da base do crescimento
industrial, alteração de estrutura de propriedade no setor
produtivo e uma redução do setor estatal.
Dessa maneira, o grande desafio da quinta geração é
exatamente promover as reformas estruturais de que o
país precisa para se tornar a primeira potência econômica
mundial, um país desenvolvido, no qual a renda da sua
população esteja no mesmo nível que em outros países
desenvolvidos.
E, para terminar minha exposição, preciso falar sobre
as relações externas, para o que é necessário falar de
ascensão, multipolaridade e controle (outra vez...).
A ascensão chinesa, no plano internacional, é extraordinária, mas não é isolada, pois o Brasil está progredindo,
a Índia está evoluindo e outros países emergentes estão
ascendendo. Naturalmente, os processos de crescimento
nos diferentes países emergentes são bem variados, mas
há uma mudança em curso no cenário internacional de
grandes proporções.
Pela primeira vez na história mundial está se assistindo
ao início da construção de um possível mundo multipolar. Há, assim, uma substituição da unipolaridade e da
hegemonia norte-americana por uma ordem internacional
cujo desenho ninguém sabe muito bem qual será, mas
que terá características completamente diferentes das
atuais. E essa multipolaridade sempre foi um objetivo
de longo prazo da política externa chinesa.
Desde a época do Deng Xiaoping, já se percebia que o
objetivo chinês era chegar à multipolaridade, o que, obviamente, passava por um processo de ascensão chinesa
e de recuperação do poder e do prestígio da China e por
um processo de ascensão de outros países.
Mas esse processo era visto como algo a ser alcançado
a longo prazo.
á O que mudou com a crise de 2008?
A crise acelerou dramaticamente esse processo.
Se ele vai ser concluído e como ele vai ser concluído será
objeto de grande especulação. Mas, para quem olha a
política externa e as relações internacionais, acredito
que esse é um grande momento, porque estão se processando fatos que podem levar a um mundo inteiramente
diferente!
Está em evolução um desenho completamente novo.
Apesar de eu não acreditar que a China irá se transformar
na primeira potência mundial, é nítido o deslocamento
das forças da globalização para a Ásia, mas não se deve
esquecer o progresso que vem tendo o nosso País, que,
em 2013, provavelmente será a quinta maior economia
do planeta, aproximando-se dessa maneira dos dois países que estão na dianteira: EUA (primeiro lugar) e China
(segundo lugar).
Portanto, acredito, e muito, na multipolaridade.
Por fim, é necessário dar mais alguns detalhes sobre as
atuais relações entre o Brasil e a China. Inicialmente,
devemos reconhecer o caráter extraordinário da China
como nosso parceiro comercial, com o qual temos um
significativo superávit, e não esquecendo de que as
exportações brasileiras tiveram um crescimento representativo nesses últimos anos, apesar da crise financeira
mundial de 2008, pois a demanda chinesa pelas nossas
matérias-primas e produtos agrícolas não diminuiu de
forma alguma.
É verdade que a China representa um imenso desafio para
o Brasil, em especial para o setor industrial brasileiro,
pois a entrada de muitos produtos chineses, aqui, abala
a sobrevivência das indústrias brasileiras que fabricam
os nossos produtos!
A China assumiu a globalização como um fato e com
uma tendência da qual ela poderia se beneficiar. E isso
aconteceu realmente. Para tanto, ela abriu zonas de
processamento especial, as zonas para os investimentos
estrangeiros e, assim, absorveu os conhecimentos de
empresas multinacionais do mundo inteiro e investiu na
abertura do seu comércio exterior.
Numa importante cerimônia, assisti ao presidente Hu Jintao
dizer para as lideranças regionais de toda a China que a
grande tarefa deles e do país todo era a de aprofundar o
processo de abertura da economia chinesa, da modernização de sua economia e de uma radical reforma da mesma.
Apesar dessa mensagem presidencial, até agora existem
muitas dificuldades para que esse processo seja implementado. Porém, o crescimento da competitividade da
China não se tornará um desafio, ou melhor, um problema
só para o Brasil, mas, sim, para todos os outros países
do planeta, que devem, por isso mesmo, evoluir nas
suas relações com o gigante asiático, para, pelo menos,
mostrar um equilíbrio na sua balança comercial.
Em especial, isso significa que o Brasil precisa fazer um
esforço enorme em conjunto com os chineses para mudar
o perfil de suas exportações para eles, conseguindo que
a indústria brasileira tenha acesso ao mercado chinês. O
Brasil deve também procurar ações em outras áreas, em
especial reforçar a sua cooperação com os chineses no
que eles gostam de chamar de ‘área humanística’, promovendo um maior intercâmbio cultural e educacional.
Agora, nós temos, por exemplo, o programa Ciência sem
Fronteiras, e a China pode ser um país para o qual se
destinem muitos estudantes brasileiros para aproveitar
o elevado nível de ensino em diversas universidades chinesas, conhecer melhor a China, aprender o mandarim
(que não é tão fácil) e desenvolver uma melhor percepção
do universo cultural chinês, que é de extraordinários
conteúdo e beleza.
Tudo isso irá nos beneficiar, principalmente se tivermos
uma maior abertura no olhar para a China como outro
país que valha a pena conhecer e do qual se deva aproximar, e não encarar a China como um competidor, um
adversário ou até um potencial inimigo.
Tendo essa visão, não será difícil conquistar a confiança
dos chineses para que eles também venham a aprender
conosco. E podemos ensinar-lhes muitas coisas no que
se refere ao meio ambiente, aos direitos humanos, à transição para uma democracia mais ampla, na distribuição
de renda e com os nossos programas sociais.
Espero que, nesses próximos anos, não apenas os que
vieram prestigiar a minha palestra, mas muitos milhares
de brasileiros busquem entender a China, com o que
melhorarão muito as relações entre os dois países e isso
acabará beneficiando ainda mais o nosso País.”
O embaixador Sergio Amaral comentou: “O embaixador
Clodoaldo Hugueney fez uma excelente apresentação,
muito esclarecedora e, ao mesmo tempo, tranquilizadora,
porque todos nós que acompanhamos as ações da China
muitas vezes nos assustamos pela sua dimensão, pela
aceleração do seu processo de crescimento, pela sua
presença avassaladora nos mais diversos mercados. Mas,
com a sua abordagem integradora, também nos mostrou
que é possível viver bem numa cooperação com a China,
desde que consigamos entendê-la. Vamos aproveitar
essa feliz oportunidade e ouvir o ministro Furlan, que tem
uma história bem significativa de como proceder para se
poder negociar com os chineses.”
Na sua exposição, o empresário e ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior do Brasil,
Luiz Fernando Furlan, declarou: “Fui pela primeira vez à
China na primeira exposição brasileira em Pequim, isso
em 1982. Lembro que fiz uma visita turística à Grande
Muralha, acompanhado de outros empresários brasileiros, e como estava muito quente, resolvemos tirar as
camisas e isso foi um verdadeiro espanto para os turistas
chineses, que nunca tinham visto aquilo.
Pois é, o nosso comportamento os chocou muito! Aí
perguntamos para o nosso guia: ‘Aqui é ofensivo tirar a
camisa?’ Ele respondeu: ‘Não, é que a maioria das pessoas daqui nunca viu alguém da raça de vocês!’
Mas as coisas mudaram muito de lá para cá...
No que se refere a negócios, a empresa que dirijo, a Brasil
Foods, firmou, recentemente, um acordo com uma grande empresa chinesa, a Dah Chong Hong. Na realidade,
fizemos uma joint venture, com 50% para cada um (aliás,
é a segunda que fizemos...), para a distribuição, em todo
o território chinês, dos produtos com a marca Sadia.
A nossa primeira joint venture foi feita logo depois
do término da Copa do Mundo de Futebol de 1994,
quando voei diretamente de Los Angeles (onde foi a
final em que vencemos a Itália na cobrança de penalidades) para a China, onde assinei com o Ministério da
Agricultura um acordo de 50-50 de uma churrascaria
brasileira em Pequim. Ela passou a ser o ponto de
encontro dos brasileiros nesse país, e os nossos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio
Lula da Silva, nas suas visitas oficiais à China, também
foram recepcionados nela.
A nossa empresa já está atuando em 120 países do
mundo, e tenho plena convicção de que vamos construir também a nossa marca na China. Na verdade, para
nós, a China, lembrando aquele ideograma de crise e
oportunidade, é muito mais uma grande oportunidade
do que uma ameaça. Na minha concepção, o Brasil tem
que investir em marca e ser proativo não só em relação
à China, mas em todos os outros mercados.
No dia 1º de março de 2012, ocorreu o primeiro embarque dos produtos Sadia para a China, e a nossa esperança
é de que todo chinês venha a comer alguma coisa feita
na nossa empresa, o que significa que o sonho é inundar
o país com as nossas exportações.”
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relações sino-brasileiras
Além dessa participação do ministro Furlan, o embaixador
Clodoaldo Hugueney respondeu com muita propriedade todas as perguntas que lhe foram formuladas por uma plateia
muito seleta. Ele concluiu o encontro dizendo: “Acredito que
essa iniciativa da Brasil Foods de desenvolver as cadeias de
distribuição dos seus produtos com a marca Sadia na China
é extremamente importante. Mas ela só foi possível porque
conseguimos, nos últimos três anos, abrir o mercado de
carnes da China; aliás, para as três carnes brasileiras de
exportação, ou seja, a do boi, do porco e do frango.
Talvez devêssemos iniciar um comércio com a China
em moeda local – o yuan – e, nesse sentido, é vital a
abertura de bancos brasileiros lá, inclusive de agências
do Banco do Brasil.
A China tem muitos números impressionantes, como, por
exemplo: mais de 600 mil engenheiros formados por ano
e mais de 530 milhões de usuários da Internet, a maioria
deles com telefone celular, algumas universidades entre
as 200 mais importantes do mundo e, certamente, isso
indica que existe um enorme contingente de pessoas
talentosas que têm condições de criar um novo modelo
para que o progresso econômico continue, mas acompanhado por uma grande flexibilização na rigidez do fechado
sistema político chinês.”
Nas suas palavras de conclusão do evento, o embaixador
Sergio Amaral enfatizou: “Todos aqueles que se motivaram e se interessaram pela China após essa brilhante
palestra do embaixador Clodoaldo Hugueney, se quiserem mais informações, bem atualizadas, sobre esse país,
devem visitar o site do Conselho Empresarial Brasil–China
e, em breve, se inscrever no Instituto Confúcio, que, em
alguns meses, vai começar a funcionar aqui na FAAP.”
Na recepção na sede da FAAP, a partir da esquerda, Victor Mirshawka, diretor-cultural da FAAP; o embaixador do Brasil na China, Clodoaldo Hugueney; a presidente do Conselho de Curadores da FAAP, Celita Procopio de Carvalho; o embaixador Sergio Amaral; o diretor-tesoureiro da FAAP, Américo Fialdini Jr.; e o
diretor-presidente da FAAP, Antonio Bias Bueno Guillon.
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