PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL Faculdade de Matemática – Departamento de Matemática CÁLCULO DIFERENCIAL INTEGRAL III MARIA SALETT BIEMBENGUT PORTO ALEGRE 2010 www.pucrs.br/famat/salett 1ª Parte: Funções de Várias Variáveis A aparente complexidade da matemática deriva de idéias basicamente simples centradas na comparação de grandezas e formas. É a linguagem, da descrição, do número e do tamanho. Contar e comparar são atributos próprios do ser humano - são tão inatos quanto os dedos. O conceito de número, por exemplo, foi objeto de um processo longo e gradual; acredita-se que tenha sua origem na Antigüidade pré-histórica. As relações funcionais, em particular, ocorrem em todas as atividades desse meio. São muitas as "leis físicas" onde podemos verificar como certas quantidades dependem de outras na medida em que essas variem. Muitas relações são de natureza qualitativa, porém, aquela na qual pode associar quantidades, em geral, é possível estabelecer uma "lei" matemática ou modelo matemático que represente ou descreva essa relação. Uma relação onde ocorre a "unicidade da associação em somente uma direção" (Batschelet, 1978), em matemática é denominada de função. Pelo Dicionário da Língua Portuguesa, função significa "ação natural e própria de qualquer coisa". Em matemática, significa uma "lei" que rege a interdependência de quantidades variáveis. Observando as "leis" físicas é possível verificar o que a "ação natural e própria" de certas situações acarreta em outra(s) que seja(m) dependente(s). A idéia de função e a partir desta a idéia de limite, derivada e integral tem sido utilizada por muitos cientistas há séculos. A história da Ciência testemunha. Segundo Boyer (1974), no século XIII vários “filósofos escolásticos vinham discutindo a quantificação das „formas‟ variáveis, um conceito de Aristóteles, aproximadamente, equivalente a qualidades. Entre tais formas havia coisas como a velocidade de um objeto móvel e a variação de temperatura, de ponto para ponto, num objeto com temperatura não-uniforme”. Conhecedor desses resultados, Nicole Oresme (1323-1382) procurou representar graficamente, a relação “velocidade-tempo para um corpo que se move com aceleração constante”. Embora a idéia de Oresme não fosse original, a forma como representou é considerada por Boyer como a mais objetiva. A palavra função, porém, só foi utilizada por Leibniz (1646-1716) e a idéia de função, como fórmula matemática que expressa a natureza exata da relação, pelos matemáticos do século XVIII. Ao longo dos anos, a idéia de função, ampliou significativamente, sendo hoje de grande importância em quase todas as áreas do conhecimento. Vários fenômenos físicos envolvem várias variáveis. Por exemplo, a dosagem de medicamento que uma pessoa pode ingerir quando possui alguma enfermidade depende da faixa etária, massa corpórea, pressão sanguínea, grau de enfermidade, dentre outras variáveis. Estabelecer uma lei que melhor represente estas relações e assim, avaliar possíveis resultados requer um conjunto de ferramentas como: Limite, Diferenciação, Integral indefinida e definida. Iniciaremos discutindo funções de duas variáveis, limites e derivadas para estudar planos tangentes, taxas de variação e problemas de maximização e minimização e, em seguida, estender estes conceitos para funções de várias variáveis. www.pucrs.br/famat/salett 1. FUNÇÃO DE VÁRIAS VARIÁVEIS Nos estudos preliminares sobre corrente elétrica temos, por exemplo: a) “Num fio condutor a intensidade de corrente elétrica na seção 0 do condutor depende da quantidade de carga no intervalo de tempo”. q i= t (*) b) “A potência elétrica é proporcional ao quadrado da tensão, quando R é constante”. (**) P= U2 R U2 Cons tan te c) “A 1a Lei de Ohm afirma que a intensidade de corrente é proporcional a tensão U aplicada, desde que a temperatura seja mantida constante”. (***) U=R.i R = constante Os três exemplos, acima, mostram que um determinado conjunto de outro (ou outros). Esta “relação” onde um conjunto “A”, um conjunto “B” e uma regra onde cada elemento de “A” está associado a, exatamente, um único elemento de “B” é denominado “função”. No exemplo (*) acima pode-se dizer que a função é de duas variáveis e nos outros dois, de uma variável. 1.1. Função real de uma variável Uma função é uma regra f que a cada n x associa outro n real f(x). f: A R, y = f(x) Onde: - conjunto A é chamado domínio de f. - conjunto B = {y R/ x A, f(x) = y} é chamado imagem de A pela função f. - gráfico de uma função é o conjunto de pares (x, y) do plano: Graf (f) = {(x, y) R x R / y = f(x)} é uma imagem geométrica da função. www.pucrs.br/famat/salett As funções (de uma variável) elementares podem ser divididas em polinomiais e transcendentes. Abaixo, os exemplos: 1) e 2) são polinomiais e os 3) 4) 5) são transcendentes. 1a) Função do 1o grau ou afim: y = ax + b 2a) Função do 2o grau ou quadrática: y = ax2 + bx + c 3a) Função exponencial: y =a ex 4a) Função Logarítmica: y = ln kx 5ª) Função Seno: y = a sen(kx) Onde a, b, c, k são constantes. 1.2. Função de duas variáveis Retratando o exemplo: Num fio condutor a intensidade de corrente elétrica na seção 0 do condutor depende da quantidade de carga no intervalo de tempo. i = q t ou seja, a intensidade (i) média de corrente elétrica é função da quantidade (q) de carga no intervalo de tempo (t) Poderíamos denotar por: i = i (t, q) = q t que é uma função de duas variáveis. As funções de duas variáveis em matemática, usualmente, são denotadas por: z = f(x,y) Definição: Seja D um conjunto de pares ordenados de nos Reais. Uma função f que a cada par (x, y) de D associa um único no relacionado, denotado por f(x, y), é uma função de duas variáveis. D é o domínio de f. O contradomínio de f consiste de todos os nos reais f(x, y) com (x, y) D. Representação Gráfica: O gráfico das funções de duas variáveis no espaço (x, y z) é uma superfície. No estudo da geometria analítica espacial encontramos funções dessa superfície. Por exemplos: a) Plano: ax + by + cz +d ou z = a‟x + b‟y + d‟ b) Cilindros O gráfico de uma equação f(x, y) = 0 é usualmente uma curva do plano xy. Os cilindros são superfícies seguintes aos planos em ordem de complexidade. Para compreender o que são essas superfícies, consideremos uma curva plana C e uma reta l, não paralela ao plano C. l Cilindro é uma figura geométrica do espaço c gerada por uma reta que se paralelamente a l com pontos em C. www.pucrs.br/famat/salett move Supondo que a curva dada C seja a curva f(x, y) = 0 do plano xy e seja a geratriz (reta móvel) paralela ao eixo z. z Observe que o valor de Z não influi no fato de P = (x, y, z) estar ou não no cilindro. y x c) Superfície Quadrática Vimos que o gráfico de uma equação do 2o grau nas variáveis x e y é sempre uma secção cônica - uma parábola, uma elipse, uma hipérbole ou talvez alguma forma degenerada de uma dessas curvas. No espaço tridimensional, a equação mais geral do 2o grau é: Ax2 + By2 + Cz2 + Dxz + Exz + Fyz + Gx + Hy + Iz + J = 0 O gráfico de tal equação se chama Superfície Quadrática. Por meio de rotações e translações convenientes dos eixos coordenados, simplificamos qualquer equação do tipo (1) e podemos mostrar que há exatamente 06 (seis) tipos distintos de superfícies quadráticas não degeneradas: Elipsóide Hiperbolóide de uma folha Hiperbolóide de duas folhas Cone elíptico Parabolóide elíptico Parabolóide hiperbólico z Exemplos: 1) Elipsóide x2 a2 y2 b2 z2 c2 1 y x www.pucrs.br/famat/salett x2 a2 2) Hiperbolóide de uma folha y2 b2 z2 c2 1 z y y x x z x2 a2 3) Hiperbolóide de duas folhas y2 b2 z2 c2 1 y x z 4) Cone elíptico x2 a2 y2 b2 z2 c2 y 5) Parabolóide elíptico: z = ax2 + by2 x z y www.pucrs.br/famat/salett x z = by2 - ax2 6) Parabolóide hiperbólico 1.3. Função de várias variáveis Rn, uma função definida em D (domínio da função) com valores reais, denotada Definição: Seja D por f: D R é uma lei que associa a cada dupla (x1, x2, ..., xn) D um único valor real. O conjunto de valores reais que f pode assumir é chamada imagem de D pela f, ou f(D). Gráfico de f: Se f: D Rn R, definimos gráfico de f por {(x1, x2, ..., xn) Rn + 1 : z = f(x1,..., xn)} Observação.: O traço de uma superfície sobre um plano arbitrário é a intersecção da superfície com o plano. Para determinar a forma da superfície a partir de sua equação, costuma-se utilizar traços em planos paralelos aos planos coordenados. Outro método gráfico útil para descrever o comportamento de uma função f de duas variáveis, consiste em esboçar no plano xy, os gráficos das equações f(x, y) = k, para vários valores de k. Os gráficos assim obtidos chamam-se Curvas de Nível. Z = k1 Z = k2 Z = k2 Z = k3 www.pucrs.br/famat/salett EXERCÍCIOS A) Determine o domínio de f e o valor de f nos pontos indicados: 1) f(x, y) = 2x - y2 2) f(x, y) = y (-2, 5), (5, -2), (0, 2) 2 (3, 1), x (1, 3), (2, 0) B) Descreva o gráfico de f: 1) f(x, y) = 1 x2 y2 2) f(x, y) = 6 - 2x - 3y C) Esboce algumas curvas de nível associada a f: 1) f(x, y) = y2 -x2 2) f(x, y) = y - sen x D) Determine o domínio da função dada: 1) f(x, y) = xy y - 2x 2) f(x, t) = 1 x 1 y 3) f(x, y) = xy E) Esboce o gráfico e algumas curvas de nível: 1) Z = 2x2 + y2 2) Z = x2 –y2 3) f(x, y) = 2 4) f(x, y) = 1- 3x – 2y F) O potencial elétrico em um ponto (x, y) do plano xy é V volta e V = 4 9 - x2 - y2. Trace as curvas equipotenciais para V = 16, 12, 4, 1. G) A temperatura em um ponto (x, y) de uma placa de metal plana é t graus e t = 4x2 + 2y2. Trace as isotermas para t = 0, 1, 8, 12. H) Encontre três exemplos na área específica de estude: 1) Determine o domínio e imagem 2) Esboce o gráfico no R3 www.pucrs.br/famat/salett