E s p a n h o l
•
F r a n c é s
•
I n g l ê s
Tempo,
fé e fósseis de baleias
Pode a realidade
ser entendida sem Deus?
A ligação mente-corpo
Eu sei em
quem tenho crido
Devo beber vinho para
minha saúde?
2
Vo l u m e 1 6
•
P o r t u g u ê s
REPRESENTANTES REGIONAIS
DIVISÃO ÁFRICA OCIDENTAL
22 Boite Postale 1764, Abidjan 22,
Cote d’Ivoire
Japheth L. Agboka
[email protected]
DIVISÃO ÁSIA-PACIFICO NORTE
Koyang IIsan, P.O. Box 43, 783 Janghang-Dong,
Ilsan-Gu, Koyang City, Kyonggi-do 411-600,
República da Coréia
Dong Hee Shin
[email protected]
DIVISÃO ÁSIA-PACIFICO SUL
P.O. Box 040, Silang, Cavite,
4118 Filipinas
Gladden Flores
[email protected]
DIVISÃO CENTRO-L’ESTE AFRICANA
P.O. Box 14756, Nairobi, Kenya
Hudson E. Kibuuka
[email protected]
DIVISÃO DO SUL DO PACÍFICO
Locked Bag 2014,
Wahroonga, N.S.W. 2076, Austrália
Gilbert Cangy
[email protected]
Barry Hill
[email protected]
DIVISÃO EURO-AFRICANA
P.O. Box 219, 3000 Bern 32, Suiça
Roberto Badenas
[email protected]
DIVISÃO EURO-ASIÁTICA
Krasnoyarskaya Street 3, Golianovo, 107589
Moscow, Federação Russa
Heriberto Muller
[email protected]
DIVISÃO INTERAMERICANA
P.O. Box 140760, Miami, FL 33114-0760, EUA
Carlos Archbold
[email protected]
Bernardo Rodríguez
[email protected]
DIVISÃO NORTE-AMERICANA
12501 Old Columbia Pike,
Silver Spring, MD 20904-6600, EUA
Martin Feldbush
[email protected]
Gerald Kowalski
[email protected]
DIVISÃO SUL-AFRICANA E OCEANO
INDICO
H.G. 100, Highlands, Harare, Zimbábue
Tommy Nkungula
[email protected]
DIVISÃO SUL-AMERICANA
Caixa Postal 02-2600,
70279-970 Brasília, DF, Brasil
Roberto de Azevedo
[email protected]
Erton Carlos Kohler
[email protected]
DIVISÃO SUL-ASIÁTICA
P.O. Box 2, HCF Hosur,
Tamil Nadu 635110, Índia
Gordon Christo
[email protected]
DIVISÃO TRANS-EUROPÉIA
119 St. Peter’s Street, St. Albans,
Herts., AL1 3EY Inglaterra
Orville Woolford
[email protected]
2
CONTEÚDO
5
ARTIGOS
Tempo, fé e fósseis de baleias
A ocorrência de fósseis bem preservados denuncia as
sérias deficiências da hipótese de uma longa cronologia,
comumente aceita pelos evolucionistas.
Raúl Esperante
8
Pode a realidade ser entendida sem Deus?
A pesquisa humana pode ter muitos contornos – entre
o subjetivo e o real, o conhecido e o desconhecido, a
mente e os sentidos – mas no final ela necessita postar-se
reverentemente junto à cruz.
Clifford Goldstein
11
A ligação mente-corpo:
algumas descobertas recentes
Uma função holística e saudável é mais provável quando
existe equilíbrio entre mente, corpo e espírito.
Linda Caviness
15
Eu sei em quem tenho crido
Como podemos estar certos acerca do Deus a quem
adoramos?
Niels-Erik Andreasen
DEPARTAMENTOS
3
4
18
20
22
22
24
EDITORIAL
Você é uma poesia em
movimento!
Humberto M. Rasi
CARTAS
PERFIS
Romualdo Costa
Humberto M. Rasi
Elaine Kennedy
Kathy Ching
PONTO DE VISTA
Apaixonado pela Paixão
Samuele Bacchiocchi
A mesma história contada de
modo diferente
Alberto R. Treiyer
FÓRUM ABERTO
Devo beber vinho
para conservar minha saúde?
Peter N. Landless
25
28
28
29
30
33
34
VIDA NO CAMPUS
Como dar testemunho
aos seus amigos muçulmanos
Borge Schantz
LIVROS
The Essential Jesus
(Ball and Johnsson)
Roberto Badenas
A Search for Identity (Knight)
Jean-Luc Rolland
Grace at 30,000 Feet and Other
Unexpected Places (Hansen)
Sylvia Rasi Gregorutti
PRIMEIRA PESSOA
Retornando
de uma terra distante ao lar
Barry Gane
INTERCÂMBIO
LOGOS
Portas fechadas ou abertas?
Reuel U. Almocera
DIÁLOGO 16•2 2004
EDITORIAL
Você é uma poesia em movimento!
Conta-se que antes de começar um importante trabalho, o grande escultor, pintor,
arquiteto e poeta Michelangelo viajou para as pedreiras da cidade de Carrara, situada
a noroeste da Itália, e escolheu pessoalmente o bloco de mármore no qual iria realizar
uma obra de arte. Enquanto supervisionava pessoalmente o trabalhoso transporte do
bloco branco até seu estúdio, projetava em sua mente os contornos da estátua que
seu cinzel iria esculpir.
Séculos antes, em sua epístola aos crentes de Éfeso, o apóstolo Paulo escreveu
uma poderosa passagem concernente à obra criativa de Deus na vida do cristão:
“Porque somos criação de Deus realizada em Cristo Jesus para fazermos boas
obras, as quais Deus preparou antes para nós as praticarmos.” (Efésios 2:10, NVI).
Significativamente, a palavra grega original para “artesanato” é poieo. Este termo se
refere à criação de um artista talentoso. Em realidade, a frase-chave nessa passagem
poderia ser traduzida como: “Nós somos o poema de Deus”. Pense nisso!
Não há ninguém exatamente como você. Bem no início, os seres humanos foram
trazidos à existência mediante um ato criativo de Deus — não como resultado de
uma fortuita interação de forças naturais. Cada um de nós é inigualável e, apesar de
nossa condição pecaminosa, ainda portamos a imagem dAquele que nos fez. Quando
vamos a Deus em busca de perdão e de uma nova vida mediante Jesus, Ele nos recria,
transformando nossa vontade, afeições e propósitos. Essa miraculosa mudança é
graciosamente oferecida e, de modo semelhante, tem de ser livremente aceita. Assim
como Deus nos estende Sua misericordiosa mão, precisamos apegar-nos a ela a fim
de sermos erguidos.
Deus preparou as boas obras para fazermos. Uma vez que experimentemos o
novo nascimento em Cristo, somos capacitados a fazer o bem. Paulo se expressa com
meridiana clareza explicando que nossas boas obras não são meios de conseguirmos
a salvação, mas o resultado natural de havermos sido salvos. Como a roseira produz
rosas e a macieira maçãs, as ações altruístas são uma conseqüência natural da vida de
um cristão renascido. O Artista-Mestre nos recriou com um propósito — para planejar e agir em benefício de outrem. E Deus é quem proporciona oportunidades e nos
motiva a usar nossos talentos, habilidades e dons para esse fim.
Podemos escolher fazer o bem. Em tudo isso, Deus respeita nossa individualidade e vontade. Ele não Se impõe e nem impinge Seus planos sobre nós, mas graciosamente convida-nos a nos tornarmos Suas mãos e pés — Seus instrumentos de
misericórdia no mundo. O Espírito Santo nos move à ação. Nossas palavras positivas
podem transformar a tensa atmosfera de um escritório.
Nosso interesse pode transformar a exacerbada competitividade de uma sala de
aulas. Nossas ações de amor podem transformar e reunir amigos e famílias separados.
Realmente, “o mais forte argumento em prol do evangelho é um cristão que sabe
amar e é amável” (Ellen G. White, A Ciência do Bom Viver, p. 470).
O Artista-Mestre já agiu. A cena já está montada. Diariamente, as oportunidades
de fazer o bem acham-se disponíveis ao nosso redor. Gostaríamos, você e eu, de optar
por atuar agora como novas criaturas Suas, em todos os lugares onde nos encontrarmos?
Esta revista internacional de fé, pensamento e
ação, é publicada três vezes por ano em quatro
edições paralelas (espanhol, francês, inglês e
português) sob o patrocínio da Comissão de
Apoio a Universitários e Profissionais Adventistas
(CAUPA), organismo da Associação Geral dos
Adventistas do Sétimo Dia.
Volume 16, Número 2.
Copyright © 2004 pela CAUPA.
Todos os direitos reservados.
Diálogo afirma as crenças fundamentais da Igreja
Adventista do Sétimo Dia e apóia sua missão. Os
pontos de vista publicados na revista, entretanto,
representam o pensamento independente dos
autores.
Equipe Editorial
Editor-chefe Humberto M. Rasi
Editor John M. Fowler
Editores-Associados Martin Feldbush, Alfredo
García-Marenko
Gerente Editorial Julieta Rasi
Secretária Editorial Esther Rodriguez
Edições Internacionais Julieta Rasi
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Correspondência Editorial
Diálogo
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Presidente Gerry Karst
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Feldbush, Baraka G. Muganda
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Membros John M. Fowler, Jonathan Gallagher,
Alfredo García-Marenko, Clifford Goldstein,
Bettina Krause, Kathleen Kuntaraf, Vernon
B. Parmenter, Gerhard Pfandl, Gary B. Swanson
Correspondência sobre circulação Deve ser
dirigida ao Representante Regional da CAUPA
na região em que reside o leitor. Os nomes e
endereços destes representantes encontram-se
na p. 2.
Assinaturas US$13.00 por ano (três números,
via aérea). Ver cupom na p. 6 para detalhes.
Website http://dialogue.adventist.org
DIÁLOGO tem recebido correspondência de
leitores de 117 países ao redor do mundo.
Humberto M. Rasi
Editor-chefe
DIÁLOGO 16•2 2004
3
CARTAS
Tornando-se mais interessante
Em nome de todos os membros da
Associação Nigeriana de Estudantes
Adventistas (NAAS), desejo expressar
nossa gratidão aos editores da Diálogo.
Sempre que me encontro com os colegas
da universidade, ouço palavras elogiosas sobre o conteúdo dessa revista. “A
Diálogo contribui para o meu crescimento espiritual”, declarou um deles. “Minha
relação com meu cônjuge está melhorando, graças a um dos artigos publicados na
revista”, observou outro. “Viva a Diálogo!
Parece que esse periódico está se tornando mais interessante a cada nova edição”,
foi outro comentário.
Embora ainda não tenhamos recebido
todos os exemplares que necessitamos,
creio que Deus está utilizando a Diálogo
para atender as necessidades intelectuais
e espirituais dos estudantes universitários
adventistas.
Sati Satmer Dapel
Presidente nacional da NAAS
NIGÉRIA
[email protected]
revista chegam até nós, consideramo-los
assim muito valiosos. Os artigos contribuem muito para o crescimento espiritual
de estudantes como eu; eles são uma verdadeira bênção.
Arvel L. Huilar
Iligan City
FILIPINAS
[email protected]
leio seus estimulantes artigos, entrevistas
e testemunhos pessoais e me sinto encorajado a viver e compartilhar minha fé.
Onde posso conseguir edições anteriores
da revista?
Anderson Luiz Marotti
Universidade Estadual de Maringá
BRASIL
[email protected]
Justamente o que eu estava
procurando
Os editores respondem:
Obrigado, Anderson, por seus comentários positivos. Você pode agora mesmo ler os
melhores artigos da Diálogo, acessando seu
site na Internet:
http://dialogue.adventist.org. Aproveite!
Sou estudante de contabilidade de
uma universidade pública e durante uma
convenção de jovens recebi um exemplar
da Diálogo. Que surpresa agradável! Os
assuntos abordados, as histórias pessoais e
a possibilidade de intercomunicação com
outros estudantes universitários adventistas eram justamente o que eu estava
procurando. Obrigado!
Flor Elena López
Universidad Veracruzana
Veracruz, MÉXICO,
[email protected]
Artigos úteis
Vocês devem ser parabenizados pelos
artigos úteis que selecionam para publicação na Diálogo. Juntamente com alguns
de meus colegas da faculdade, organizamos uma associação de estudantes
adventistas desta universidade pública.
Mediante campanha de evangelismo
público no campus, fazemos contato
Encorajado a viver e compartilhar com estudantes interessados em estudar
a Bíblia. Também partilhamos com eles
minha fé
alguns dos excelentes artigos contidos na
Há ocasiões em que me sinto quase
Lendo revistas emprestadas
Diálogo.
Durante meu mestrado numa univer- esmagado pelas filosofias seculares e
Daniel Mendoza
sidade pública das Filipinas, li exemplares naturalistas apresentadas por muitos de
Universidad Federico Villarreal
meus professores e colegas estudantes, na
da Diálogo emprestados de amigos, que
Lima, PERU,
universidade pública onde estou cursando
também os haviam pedido emprestados
[email protected]
Geografia. Mas quando recebo a Diálogo
de outros. Como poucos exemplares da
Escreva-nos!
Recebemos seus comentários, reações e
perguntas, mas, por favor, limite suas cartas
a 200 palavras. Escreva para
DIALOGUE LETTERS
12501 Old Columbia Pike
Silver Spring MD 20904
EUA.
FAX 301 622 9627
EMAIL [email protected]
“Eu estava fugindo do pecado. I Timóteo 6:11”
4
As cartas selecionadas para publicação
podem ser editadas para maior clareza ou
necessidade de espaço.
DIÁLOGO 16•2 2004
Tempo, fé e fósseis de baleias
Raúl Esperante
A ocorrência de fósseis
bem preservados denuncia
as sérias deficiências da
hipótese de uma longa cronologia, comumente aceita
pelos evolucionistas.
O tempo tem sido um assunto
importante na maioria das controvérsias relacionadas à fé e à ciência,
desde que, no princípio do século XIX,
foram propostos os primeiros modelos
não-bíblicos para a origem da Terra.
Geólogos e naturalistas como Hutton,
Lyell e outros divisavam longos períodos
de tempo em muitas características do
registro geológico, incluindo o resfriamento das rochas ígneas, a deposição
das camadas sedimentares e a sucessão
da flora e da fauna em tempos passados.
Darwin e Wallace foram aparentemente
bem-sucedidos em conectar as linhagens
evolutivas de organismos a longos períodos de tempo, durante os quais a morte
do mais fraco e a sobrevivência do mais
apto abriram caminho para organismos
mais complexos, intrincados e adaptados. Se as alterações (tanto no âmbito
biológico como no geológico) ocorreram
segundo a velocidade que presenciamos
hoje, então a Terra e a vida devem ser
muito antigas para que as mudanças
acumuladas produzissem novas formas.
Esse círculo vicioso é reiterado na breve
sentença: “O presente é a chave para o
passado”. As longas eras foram apoiadas
posteriormente pelo desenvolvimento
de técnicas radiométricas, em meados
do século XX, que permitiram o cálculo
de taxas de desintegração dos elementos
instáveis presentes nas rochas ígneas.
Uma imensidade de tempo?
Nas últimas cinco décadas foram aprimoradas diversas técnicas, as quais resultaram em idades consistentes de centenas de milhares ou milhões de anos.
O Carbono 14 (C-14) é amplamente
DIÁLOGO 16•2 2004
conhecido no levantamento de idades
que vão desde centenas até 50.000
anos, apesar de ser altamente discutida
a validade da precisão de datas mais
remotas. Séries de elementos instáveis e
seus derivados tais como K/Ar (Potássio/
Argônio), U/Pb (Urânio/Chumbo) e
Rb/Sr (Rubídio/Estrôncio) são comumente utilizadas na datação de rochas
mais antigas e seus fósseis.
A datação radiométrica é um problema para quem acredita no relato de
Gênesis da criação, porque ela ajusta
o relógio para muito antes do tempo
registrado nas genealogias de Gênesis
5 e 11, bem como nas declarações de
Ellen White, que indicam que a humanidade existe na Terra há cerca de 6.000
anos. De fato, a datação radiométrica é
o principal desafio que os criacionistas
partidários da posição de uma Terra
jovem enfrentam como cientistas, e
muitos crêem que a evidência científica
é forte o suficiente para desafiar a validade das afirmações bíblicas relativas à
Criação e, portanto, escolhem acreditar
em modelos alternativos como a criação
progressiva ou a evolução teísta.1 Muitos
vão além e questionam a validade das
declarações do Novo Testamento sobre a
Criação, incluindo as do próprio Jesus,
de Paulo e Pedro.
Apesar das datas radiométricas serem
comumente aceitas pelos geólogos como
confiáveis em toda a coluna geológica
das bacias oceânicas e dos continentes,
também é verdade que às vezes elas são
inconsistentes com outras evidências
geológicas e paleontológicas. Os intervalos de tempo obtidos mediante o uso
de isótopos instáveis podem ser muito
maiores do que o tempo real necessário
para a deposição dos leitos sedimentares
ou para a formação e preservação dos
fósseis. As camadas sedimentares que
indicam a rápida deposição de sedimentos e fósseis de tartarugas na Formação
Bridger, no Wyoming, EUA, são um
exemplo desse fato. Supõe-se que essas
tartarugas foram acumuladas e sepultadas ao longo de enormes períodos de
Baleia WCBa-20. Esta baleia foi preservada quase que inteiramente e bem
articulada (faltam apenas alguns poucos ossos). As barbatanas (não visíveis
na figura) foram preservadas sobre o
membro esquerdo.
tempo, num ambiente lacustre afetado
por ocasionais precipitações de cinza
vulcânica. Entretanto, pesquisas efetuadas pelo paleontólogo Leonard Brand e
outros, da Universidade de Loma Linda,
mostraram que provavelmente as tartarugas foram soterradas rapidamente por
enchentes e cinzas vulcânicas, em curto
espaço de tempo.2
Tempo para as baleias
Outro exemplo disso é a presença de
baleias fósseis em vasas diatomáceas e
arenitos da Formação Pisco, no Sul do
Peru. Nela foram descobertos milhares
de cetáceos fósseis em camadas sedimentares jacentes numa antiga enseada marinha de baixa profundidade, localizada a
cerca de 30 quilômetros do litoral. Esses
fósseis estão sendo estudados por uma
equipe multidisciplinar de geólogos e
paleontólogos dos EUA, da Espanha,
5
Peru e Itália, que descobriu múltiplas
camadas de fósseis bem preservados de
barbatanas de baleias, golfinhos, leões
marinhos, tartarugas, pingüins e outras
criaturas.
As baleias são mamíferos marinhos
que respiram e nadam ativamente, e
possuem alto conteúdo de gordura.
Quando uma baleia morre, seu corpo
pode afundar imediatamente (no caso
de espécies detentoras de menor teor
gorduroso) ou flutuar durante certo
tempo (espécies com alto teor gorduroso), submergindo depois até o solo
oceânico. Logo após sua morte, iniciase a decomposição bacteriana e a ação
dos necrófagos na carcaça, removendo
a carne e a gordura até que os ossos
fiquem expostos. Esses processos podem
prolongar-se por vários meses, dependendo do tamanho da baleia e de seu
volume de gordura. Uma característica
particular de muitas baleias é que os seus
ossos são ricos em gordura (o que ajuda
na flutuabilidade do cetáceo), e que essa
gordura (também chamada de graxa)
ainda permanece como fonte alimentar
por muito tempo após a carne ter sido
removida dos ossos. Observações atuais
de esqueletos de baleias existentes no
solo oceânico mostram que eles são
colonizados por abundante e diversificada comunidade de invertebrados
incrustados, como mariscos, caramujos,
vermes, crustáceos, que se fixam sobre os
ossos e também no solo oceânico adjacente. Acredita-se que esses esqueletos
submersos podem abrigar durante muitos anos uma grande comunidade de
pequenos invertebrados marinhos.3 Os
ossos dessas baleias usualmente encontram-se corroídos, desarticulados e, às
vezes, deslocados pela ação de correntes
marinhas ou de necrófagos. Se o esqueleto for arrastado para a praia, é provável
que os ossos sejam bastante dispersos
pela ação das ondas e das tempestades.
Em comparação com os exemplos
atuais, o que vemos nas baleias fósseis da
Formação Pisco é um quadro diferente,
embora com algumas similaridades.
Alguns esqueletos aparecem parcial ou
totalmente desarticulados, como acontece com os modernos espécimes, mas os
ossos se apresentam associados e agrupados, indicando ter ocorrido pequena
perturbação no arcabouço ósseo após o
soterramento. Os esqueletos, em grande
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6
número, encontram-se inteiramente
articulados, com os ossos na posição que
tinham quando em vida. Essa característica indica claramente um rápido
sepultamento. Caso os sedimentos tivessem sido depositados no solo oceânico
de águas rasas (profundidades menores
que 100 metros) durante muitos anos,
moluscos, crustáceos e vermes em quantidade teriam perfurado os ossos na
tentativa de se alimentarem da gordura
interna. As correntes marítimas também
poderiam ter movido alguns ossos. Em
vez disso, a preservação dos ossos é excelente, sem quaisquer evidências de danos
causados por correntes marinhas, perfuração ou necrofagia por invertebrados.
Além do mais, não existem evidências
de quaisquer invertebrados sepultados
junto com os ossos das baleias. Parece
não ter havido tempo para que os invertebrados colonizassem os ossos frescos e
deixassem neles suas marcas.
Ainda mais impressionante é a preservação das barbatanas (o dispositivo
de filtragem) e, em alguns casos, a
mineralização da medula espinhal, pois
ambas são tecidos moles que tendem a
se destacar e degradar muito mais rapidamente que os ossos. As barbatanas
são constituídas de queratina (o mesmo
tipo de proteína insolúvel que compõe
o cabelo humano e suas unhas), e não
se enraízam nas mandíbulas da baleia,
estando apenas aderidas a elas através da
gengiva. Sabe-se mediante as observações atuais que as barbatanas se destacam da mandíbula superior em questão
de poucas horas ou dias após a morte,
tornando extremamente improvável a
preservação do esqueleto juntamente
com o dispositivo de filtragem, a não ser
que ocorra sedimentação muito rápida.
Surpreendentemente, numerosas baleias
fósseis foram encontradas na Formação
Pisco, com suas barbatanas preservadas
e muitas delas conservando o dispositivo
de filtragem na posição que tinham em
vida. Essas características das baleias fósseis sugerem sepultamento e fossilização
rápidos.
Várias outras linhas de evidências
sugerem que as taxas de sedimentação
DIÁLOGO 16•2 2004
na Formação Pisco foram muito maiores
do que as observadas em qualquer local
nos tempos atuais, e consideravelmente
maiores do que as inferidas a partir da
datação radiométrica disponível para
aquele local.4 As datações radiométricas
obtidas com isótopos K-Ar indicam
um intervalo entre 10 e 12 milhões de
anos para a sedimentação dos depósitos
que contêm baleias, as quais apresentam espessura de até 1.000 metros.5
Calculando-se 10 milhões de anos para
a deposição de uma seqüência total de
500 metros de espessura, seriam necessários 20.000 anos para acumular um
metro de espessura de sedimentos sobre
o piso oceânico local. Estudos efetuados
em vários ambientes oceânicos indicam
que as atuais taxas de deposição de sedimentos similares aos da Formação Pisco,
situam-se no intervalo entre 2 a 260
centímetros para cada 1.000 anos (com
médias entre 15 a 50cm/1.000 anos, e
2 a 16 cm/1.000 anos para a plataforma
marinha peruana), que estão acima da
ordem de grandeza apurada pelas medições mediante radiometria.
Portanto, mesmo com uma taxa
média anual de sedimentação de
40cm/1.000 anos, levaria um milênio
para soterrar completamente um compacto esqueleto de baleia com 40cm de
altura, e evitar qualquer desarticulação
ou deterioração óssea originada da ação
de correntes marinhas, necrófagos ou
reações químicas. Não parece razoável
pensar que um grande esqueleto pudesse
repousar num piso oceânico de águas
rasas durante tantos séculos, sem ter sido
perturbado por agentes físicos e biológicos causadores de desarticulação, perfuração e remoção dos ossos. Mesmo que
os ossos e a barbatana tivessem sofrido
mineralização rápida após a morte do
animal, é improvável que sua carcaça
durasse tanto tempo sem qualquer deterioração, e a barbatana se conservasse
na posição que tinha quando o animal
vivia.
A implicação dos valores das taxas de
deposição de sedimentos finos sobre o
leito oceânico é dupla. Por um lado, a
excelente preservação das baleias fósseis
DIÁLOGO 16•2 2004
O autor posando ao lado da baleia WCBa-23.
indica que, na Bacia Pisco, os sedimentos acumularam-se muito mais rapidamente no passado do que no presente,
sob características geológicas semelhantes (como as águas rasas oceânicas ao
longo da costa peruana, que é um bom
exemplo dessa espécie de ambiente sedimentar). Certamente os sedimentos contendo fósseis de baleias devem ter sido
depositados muito rapidamente. Quanto
mais esse tipo de evidência se acumula,
maior o questionamento da datação
radiométrica, pois não existe suficiente
atividade sedimentar para preencher um
período de tempo tão extenso.
Por outro lado, a existência desses fósseis bem preservados traz à luz as sérias
deficiências da hipótese comumente
aceita pelos geólogos evolucionistas, de
que “o presente é a chave para o passado”. Se, como vimos com as baleias
atuais, a taxa com que ocorrem os processos hoje (isto é, a sedimentação e o
sepultamento em oceanos e lagos) não
explica satisfatoriamente o fato dos fósseis estarem bem preservados, temos de
concluir que, de algum modo, o passado
deve ter sido muito diferente.
Mais pesquisas e estudos são necessários para averiguar por que os métodos
de datação radiométrica indicam idades
muito antigas, em oposição às rápidas
mudanças catastróficas inferidas das
muitas características paleontológicas.
A geologia evolucionista atual explica
o registro fóssil como resultado de processos e mudanças lentas ocorrendo ao
longo de extensos períodos de tempo.
Entretanto, um crescente número de
formações rochosas e ocorrências de
fósseis anteriormente explicadas em conformidade com essa estrutura conceitual
evolucionista, deve ser reinterpretada
como resultado de processos rápidos e
até catastróficos, operantes numa escala
de tempo diferente.
As coisas podem ter sido diferentes no
passado.
REFERÊNCIAS
1. Esses dois modelos são, de fato, similares em
suas pressuposições. Enquanto os evolucionistas
teístas acreditam que Deus criou as primeiras
moléculas orgânicas, as células, ou os organismos
simples, deixando-os evoluir naturalmente para
se tornarem seres mais complexos, os criacionistas progressivos sugerem que Deus esteve ativo
criando novas formas de vida através dessa longa
trajetória evolutiva.
2. Leonard R. Brand, 2003. Personal communication.
3. P. A. Allison, C. R. Smith, H. Kukert, J.
W. Deming, e B. A. Bennett, “Deep-water
Taphonomy of Vertebrate Carcasses: A Whale
Skeleton in the Bathyal Santa Catalina Basin,”
Paleobiology 17 (1991), pp. 78-89.
4. L. R. Brand, R. Esperante, C. Carvajal, A.
Chadwick, O. Poma e M. Alomia, “Fossil Whale
Preservation Implies High Diatom Accumulation
Rate, Miocene/Pliocene Pisco Formation, Peru”,
Geology 32 (2004) 2:165-168.
5. R. B. Dunbar, R. C. Marty, e P. A. Baker,
“Cenozoic Marine Sedimentation in the Sechura
and Pisco Basins, Peru”, Palaeogeography,
Palaeoclimatology, Palaeoecology 77 (1990), pp.
235-261.
Raúl Esperante (Ph.D. pela Loma
Linda University) é paleontólogo do
Geoscience Research Institute, em
Loma Linda, Califórnia, EUA. E-mail:
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Pode a realidade ser entendida sem Deus?
Clifford Goldstein
A pesquisa humana pode
ter muitos contornos
– entre o subjetivo e o real,
o conhecido e o desconhecido, a mente e os sentidos
– mas no final ela necessita
postar-se reverentemente
junto à cruz.
“O mundo”, disse Arthur
Schopenhauer, “é minha idéia”.1
Se esta é a idéia de Schopenhauer,
também é a sua e a de seu mais feroz
adversário. O que cada um conhece, de
acordo com Schopenhauer, “não é o sol
e nem a terra, mas só um olho que vê o
sol, a mão que sente a terra; o mundo
que cerca a pessoa está ali apenas como
idéia, — isto é, apenas em relação a
outra coisa, quem concebe a idéia, que
é a própria pessoa.”2 Pelo fato de sermos diferentes olhos, mãos diferentes,
diferentes consciências, conhecemos
sóis diferentes e terras diferentes. Se o
mundo é uma idéia, trata-se de uma
idéia diferente para cada um de nós.
Essa questão sobre o que é real em
oposição ao que é percebido estende-se
até a caverna de Platão, àquela poeirenta e velha cova na qual todos os seres
humanos eram acorrentados com as
faces voltadas para a parede; assim toda
a realidade chegava até eles como nada
mais que sombras projetadas contra a
parede por um fogo brilhando às suas
costas.
Somente através da educação racional
e filosófica, argumentava Platão, poderia
alguém escapar da caverna e subir até o
mundo da luz solar, isto é, perceber a
realidade como ela verdadeiramente é.
A despeito de a metáfora de Platão ser
apropriada (ou rude), o que aconteceria
realmente se pudéssemos escapulir e
pôr de lado as aparências, as sensações
e os fenômenos, explorando a realidade
como ela é em si mesma, sem os inatos
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filtros humanos que a colorem e acondicionam para nós como aparências
e fenômenos —o que teríamos? Que
aparência, sensação, odor e gosto tem
uma coisa por si mesma ilusória? Tudo
o que conhecemos da realidade, mesmo
daquela que procede tão-somente da
pura razão, chega até nós através de
processos neuro-eletroquímicos, que
chispam silenciosamente dentro de uma
escuridão empapada, coberta por pele e
crânio.
Mesmo que fosse possível evadir-se
à aparência, superá-la e penetrá-la para
perceber a realidade, como poderíamos
alcançá-la com outra coisa que não os
sentidos — e os sentidos, de qualquer
tipo, sempre têm um viés e limites preestabelecidos? Quaisquer que sejam os
sensores que nos conectam ao que está
fora de nós, quaisquer que sejam os dispositivos que nos ligam ao mundo, cada
um tem seu próprio foco, inclinação e
limites. Combinações diferentes criam
diferentes realidades. Como pode, então,
ser a realidade algo mais que os subjetivos e limitados sentidos que a percebem
— o que significa, então, que a realidade
teria de estar toda em nossas cabeças e
em nenhuma outra parte.
Realidade e mente divina
Se tão-somente houvesse um Ser,
alguma mente divina que pudesse ver
todas as coisas a partir de todas as perspectivas possíveis e todas as possíveis
posições ao mesmo tempo, poder-se-ia
dizer que existe uma realidade objetiva?
Poderia — como argumentou o Bispo
George Berkeley — algo ser realmente
novo, isto é, ter características inatas ou
qualidades não dependentes, em termos
finais, de uma mente que as percebe
em função daquilo que são suas características ou qualidades (quente, frio,
vermelho, amarelo, doce, amargo, duro,
macio), que não sejam as impressões dos
sentidos? Como as impressões sensitivas
podem existir sem a mente que as perceba? Como pode haver dor sem nervos,
ou gosto sem paladar? Sem a Mente
divina, será que faz sentido até mesmo
falar sobre o que verdadeiramente está
lá fora? Até porque, de todos os modos,
o que está lá fora são apenas impressões
sensoriais subjetivas, flutuantes e freqüentemente enganosas — e nada além
disso?
Pode haver verdadeira moralidade (ou
verdadeira realidade), se toda moralidade (ou realidade) existe só em termos
de reações eletroquímicas em mentes
subjetivas? Temos a intuição de que a
moralidade existe independentemente
de nós; de outro modo, como pode ser
imoral o assassinato de bebês — por
serem eles de origem judaica — se cada
mente humana pensa de modo diferente? Intuímos, mais ainda, que a realidade
existe independentemente das mentes.
Por acaso é o Monte Everest inexistente
porque as mentes não o percebem? Mas
como os absolutos morais e ontológicos
podem existir, se tanto a moralidade
quanto a existência só são encontradas
nas mentes, e não fora delas?
As implicações destas questões têm
sido debatidas durante séculos. O empirista britânico, John Locke, argumentou
que se o conhecimento humano só surge
da experiência, como podemos, então,
conhecer algo por mesmos? O conhecimento não pode ir além da experiência. Nada existe no intelecto, escreveu
Locke, que não estivesse primeiro nos
sentidos, e em virtude de que o que se
encontra nos sentidos é sempre limitado, contingente e em fluxo, possuímos
pouco conhecimento real do mundo.
Promovendo ainda mais suas próprias pressuposições empiristas, George
Berkeley articulou sua famosa fórmula
esse est percipi (“ser é ser percebido”),
reivindicando que os atributos e características das coisas, até mesmo em suas
mais primitivas qualidades (tais como
extensão), não possuem existência fora
da mente, e que apenas daquilo que é
percebido como objeto, pode-se dizer
que existe. “Pois o que são os objetos
supracitados [casas, montanhas, rios],
senão coisas que percebemos pelos
sentidos?” — ele escreveu — e o que
percebemos, além de nossas próprias
idéias ou sensações? E não é francamente repugnante que qualquer um deles
DIÁLOGO 16•2 2004
— ou combinação deles — possa existir
sem ser percebido?”3. Em virtude de a
realidade se nos apresentar apenas como
sensação, não existe sensação (e conseqüentemente nenhuma realidade) sem
percepção. O Bispo Berkeley não estava
negando que as coisas estão lá; dizia ele,
antes, que quando se diz que algo “existe”, isso apenas significa que este algo é
percebido pela mente.
Kant: noumenon e phenomenon
Assumindo a realidade das proposições sintéticas apriorísticas, sobre as
quais fundamentou sua revolucionária
filosofia, Immanuel Kant argumentava
que a própria mente comstrói a realidade. Não que ela a crie, mas que — devido a estruturas preexistentes em seu
interior — sintetiza e unifica a realidade,
não de acordo com o mundo real, e sim
de acordo com cada mente. A mente
se impõe sobre o mundo, que aparece
apenas como organizado, filtrado e categorizado por ela. A mente não se conforma ao mundo; o mundo se conforma
à mente. Nossos cérebros não mudam
o mundo tal como ele é (Kant escreveu
isso muito tempo antes da revolução
do quantum), mas o mundo tal como é
chega até nós apenas quando nosso cérebro o permite.
Uma pessoa que olha para uma
montanha através de binóculos verá
algo diferente de alguém que a observa
através de um microscópio. A montanha
está lá, sem dúvida; o que vemos depende do fato de nossa mente trabalhar
como um microscópio, como binóculos
ou como um par de olhos humanos. Em
oposição aos idealistas fenomenalistas
(como Johann Gottlieb Fichte), que descartavam toda a realidade exceto aquela
existente em nossa mente, Kant não
rejeitou o noumenon, isto é, a realidade
independente da cognição humana. O
phenomenon (o modo como a realidade
se apresenta a nós) não pode existir sem
o noumenon (o modo como a realidade efetivamente é), mais do que a dor
pode existir sem os nervos. O que Kant
afirma, de fato, é que nunca podemos
conhecer o noumenon, o mundo real,
DIÁLOGO 16•2 2004
pelo que ele é em si mesmo. Uma impenetrável escuridão separa aquilo que
de fato está ali, daquilo que finalmente
aparece como realidade em nossa consciência.
Nenhum desses filósofos e nenhuma
de suas filosofias têm ficado sem contestação. Não obstante, é difícil argumentar
contra o ponto básico: os limites do
conhecimento, especialmente o conhecimento obtido somente através da percepção sensorial.
O ponto de vista de Platão é que a
realidade não pode ser medida e julgada
apenas pelos padrões humanos, porque
pessoas diferentes mensuram e julgam
diferentemente — e mesmo contraditoriamente — a realidade. O argumento
de que não há nenhuma realidade
objetiva à parte dos sentidos — embora
defensável com alguma lógica e rigor
racional — permanece intuitivamente
não convincente, particularmente para
alguém que sobreviveu por pouco ao
passar de cabeça e corpo por um párabrisas. Tal pessoa conhece algo real,
sólido, objetivo e existente fora de si
mesma.
Da caverna de Platão para o lance
epistemológico de Kant, a questão permanece: O que mais existe lá fora? Que
movimentos e vidas mais existem através
do espaço entre o espectro estreito e finito das aparências formadas nas mentes
humanas, e o espectro amplo e infinito
do real? Tal como os ultra-sons que
somente o ouvido de um cão pode captar, ou sons e partículas tão reais quanto
as bolas de futebol e as cantatas de Bach,
que mais existe como noumenon, que
podemos tocar, ver, sentir ou intuir?
Dimensões além do espaço e do
tempo
Os cientistas falam de outras dimensões além do espaço-tempo; alguns
ramos da física demandam a sua existência (a teoria do superstring estabelece,
ao menos, 10 dimensões). Alguns matemáticos argumentam que esses números
existem numa “realidade independente”,
distinta de nosso mundo, o da percepção sensorial. Outros defendem que o
sobrenatural, o oculto, o reino de fé,
dos anjos, do preternatural, e o reino do
bem e do mal, à parte das contingências
e das limitações da humanidade, existem no noumenon. O autor do livro
de Hebreus, em o Novo Testamento,
escreveu que “as coisas que são vistas
não foram feitas de coisas aparentes”
(Hebreus 11:3, versão King James). O
apóstolo Paulo falou sobre realidades
“nos céus e sobre a Terra, as visíveis e as
invisíveis” (Colossenses 1:15). Quais são
essas coisas que não aparecem? O que
são essas realidades invisíveis existentes
tanto nos céus quanto na Terra?
A distinção que Kant faz entre o phenomenon e o noumenon, embora não
prove a presença do sobrenatural, pelo
menos fornece um espaço para ele.
Um milhão de telefones celulares
zumbindo sobre nós implicam na possibilidade — e não na probabilidade
— também de outras coisas intangíveis
(anjos, talvez?). Os celulares mostram
que uma atividade inteligente e propositada pode estar tendo lugar ao nosso
redor e, todavia, estar além de nossa percepção, mesmo quando exerce impacto
sobre nós. (Quem, por exemplo, cheirou, ouviu, viu, provou ou tocou os
altos níveis de radiação que destruíram
sua mucosa intestinal, debilitaram seu
sistema imunológico e lhe causaram a
morte?).
O noumenon, é importante, de
muitas maneiras e também em todo o
tempo. O phenomenon é, talvez, nada
mais que um ângulo do noumenon, que
a mente pule e absorve, como uma escura esponja encharcada. O fato de não
a tocarmos por completo não significa
que não tangemos algo; o fato de não
podermos conhecê-la plenamente, não
significa que não possamos conhecê-la
em termos parciais. No livro do Êxodo,
quando Moisés pediu a Deus: “Peço-Te
que me mostres a Tua glória” (33:18,
NVI), Deus respondeu: “Você não
poderá ver a Minha face, porque ninguém poderá ver-Me e continuar vivo.”
E então disse: “Há aqui um lugar perto
de Mim, onde você ficará, em cima de
uma rocha. Quando a Minha glória pas9
sar, Eu o colocarei numa fenda da rocha
e o cobrirei com a Minha mão até que
Eu tenha acabado de passar. Então tirarei a Minha mão e você verá as Minhas
costas; mas a Minha face ninguém
poderá ver’” (Êxodo 33:14-23). Talvez
isso seja tudo o que o phenomenon é: a
parte de trás e não a face do númeno.
A matemática parece estar “lá fora”,
não como estruturas físicas, senão como
relações delicadas e precisas entre entidades descontínuas e preexistentes, mais
permanentes e firmes do que o mundo
material. Embora altamente processado
pelo cérebro, ali existe algo que esses
matemáticos percebem como realidades que se mostram mais consistentes,
seguras e estáveis que as passageiras,
vacilantes e sucedâneas excentricidades
do fenômeno. Três quilos de arroz, não
importa quão precisa seja a balança,
sempre serão mais ou menos três quilos
(mesmo subtraídos de algumas poucas
moléculas); porém, o numero três, como
um número só, é absoluto, refinado e
puro, sem nenhuma necessidade de refinamento.
Portanto, quer seja como conceito
ou como sensação, algo do noumenon
passa, mesmo que seja percebido como
phenomenon. Fomos feitos, por assim
dizer, para interagir com o noumenon
ou, pelo menos, com parte dele. Existe
uma harmonia confortável, uma conveniente e mesmo esteticamente encantadora concórdia entre nossos sentidos e
a parte da realidade que penetra nossa
consciência.
Quão afortunados somos em poder
ver uma parte do espectro eletromagnético produzido pela estrela mais
próxima de nossos olhos, de modo que
não somente nos seja permitido ver os
objetos, como também observá-los tão
belamente. Há alguma razão lógica,
necessária ou mesmo prática para os
pôr-de-sóis ou pavões serem retratados
tão agradavelmente em nossas mentes?
Seja qual for a coisa que em si mesma
emana da hortelã, quão agradável é que
no momento em que passa através de
nossas narinas, ela é uma fragrância sensorial na mente. O que quer que uma
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laranja (pêssego, ameixa ou uva) seja em
e de si mesma, não apenas interage tão
agradável e saborosamente com nosso
paladar, como também se apresenta
saturada de substâncias químicas e
nutrientes que se harmonizam com nossas necessidades físicas.
De fato, os mesmos dispositivos que
projetam o bom e o prazeroso em nossa
consciência, fazem o mesmo com o mal
e a fealdade. O pôr-do-sol que lança
poças incandescentes de luz desde o
horizonte, também deixa para trás uma
fria trilha de vias encurvadas, trêmulas e
inamistosas. Por mais que uma uva seja
deliciosa, por mais saborosa que seja a
maçã, a escassez e a pestilência freqüentemente as decompõem antes que o
estômago o faça. Este mesmo estômago
também provê um terreno exuberante
para tumores vorazes. Assim, conquanto
o phenomenon seja inerentemente bom,
o mal freqüentemente polui a embalagem.
Mal: depois do fato
O mal, porém, ocorre após o fato,
e o fato em si mesmo — como fato
puro — é bom. Santo Agostinho, em
A Cidade de Deus, escreveu que o mal
é uma minimização, uma deserção do
bem. O bem veio primeiro, o mal em
seguida. Não há nenhuma causa eficiente para o mal, disse Agostinho, apenas
uma deficiente. O que chamamos de
mal “é meramente uma falta de algo que
é bom.”4
“Agora”, continua Agostinho, “buscar
descobrir as causas dessas defecções —
causas, como eu já disse, não eficientes,
mas deficientes —, são como se alguém
buscasse ver a escuridão ou ouvir o silêncio. Todavia, ambos são conhecidos por
nós, a primeira apenas através da visão e
o último apenas através da audição; mas
não por sua positiva realidade, senão por
sua necessidade.”5
Embora rudemente arruinada, a
natureza ainda pode transcender a árida
lógica e nos regar com sugestões de algo
mais promissor do que a entropia cósmica. Entre o que está em nós (nossos
sentidos) e o que há lá fora (o que é sen-
tido), as equações calculam belamente,
os números operam de forma sublime,
mesmo que eles tenham de ser calculados em nosso coração e não em nossa
cabeça.
Pense por um momento na doutrina
bíblica da encarnação. É uma incrível
afirmação: o próprio Deus encarnado na
humanidade — o Criador do Universo
assumiu nossa carne, e na cruz suportou
todo mau adjetivo e todo mau advérbio
(e cada verbo e substantivo maus). E o
peso de toda essa perfídia — sua culpa,
conseqüência e penalidade — foi suficiente para matá-Lo. Deus não é imune
à nossa dor ou males; ao contrário, estes
esmagaram Sua vida, como manifestada
em Jesus na cruz.
Se a cruz é verdadeira, somente o é
porque Deus nos ama com um amor
que se estende além das frias expansões
da infinidade, para dentro dos desassossegados recessos de nossa temente
e expirante vida. É dito, também, que
com assuntos tão conseqüentes quanto
terminantes, Deus não teria ido para a
cruz sem nos dar razões para acreditar
no que Ele fez, e uma dessas razões
existe nos próprios fatos inalteráveis.
Imagine a criação escoimada de todos
os seus sórdidos modificadores (e então
imagine esses modificadores destruídos,
de uma vez, em Jesus).
Se alguém quebrasse o vidro protetor
e retalhasse o quadro da Mona Lisa,
iriam esses cortes diminuir o amor que
Leonardo dedicou inicialmente à senhora retratada? Não pode haver escassez
sem primeiro haver campos de trigo e
milho. Que dizem o trigo e o milho
sobre Aquele que primeiro envolveu
a semente numa película, antes que a
água, o pó, o ar e a luz solar a fizessem
emergir da terra e a cobrissem de tenros
brotos que nos brindam com um sabor
tão agradável ao paladar, e se ajustam
tão confortável e saudavelmente às nossas células?
É certo que os luxuriantes campos
de grãos não validam o argumento
moral para a existência de Deus, mais
Continua na página 17.
DIÁLOGO 16•2 2004
A ligação mente-corpo:
algumas descobertas recentes
Linda Caviness
Uma função holística e
saudável é mais provável
quando existe equilíbrio
entre mente, corpo e espírito.
A desgraça nos atinge sem aviso prévio. Tad, nosso filho mais jovem, nos
havia trazido muita alegria. Enquanto
observávamos seu crescimento, alimentávamos grandes esperanças quanto
ao futuro. Embora estivéssemos preocupados com seu crescente número
de tropeções e quedas, jamais suspeitávamos que a situação fosse tão séria
quanto se tornaria. Depois de intensos
exames, os médicos diagnosticaram sua
enfermidade como sendo a Síndrome
de Niemann-Pick — uma enfermidade
degenerativa do cérebro. Tad estava
com onze anos. Pouco se sabia sobre
essa enfermidade terminal, mas decidi
buscar tudo o que fosse possível a respeito. Enquanto os médicos tentavam
tratar Tad, assumi a batalha sob outro
ângulo. Quis envolver-me com o estado de Tad não apenas emocionalmente,
mas também de forma inteligente,
para que Tad se sentisse tão confortável
e bem tratado quanto possível. Em
desespero comecei a estudar anatomia
e fisiologia do cérebro. Desejava sondar os mistérios ocultos nessa massa
de tecido que atuava como centro de
comando da vida de meu filho, de suas
atividades e esperanças. A ciência do
cérebro subitamente se tornou o foco
impulsionador de minha vida.
Tad faleceu seis anos após o diagnóstico, um pouquinho antes de completar seu décimo sétimo aniversário.
Embora essa trágica perda deixasse um
vazio permanente em nosso coração, a
aventura da ciência do cérebro tornouse-me um catalisador para prover-me
DIÁLOGO 16•2 2004
de novas percepções sobre a relação
mente-corpo. Li todos os livros e artigos que me chegaram às mãos. Assisti
conferências e seminários sobre o cérebro. Dissequei o cérebro humano em
laboratórios de neuroanatomia. Meu
papel como educadora de professores
se expandiu, incluindo o conhecimento da neurobiologia do aprendizado.
Presentemente, utilizo esse conhecimento para ajudar professores a compreenderem as conexões mente-corpo e
facilitar o aprendizado.
Essa pesquisa sobre o cérebro também rendeu uma dissertação doutoral
— uma análise comparativa de dois
grandes grupos de dados relevantes à
educação: a atual pesquisa educacional
do cérebro e os conselhos centenários
de Ellen G. White aos educadores.
Embora esse estudo houvesse comparado dados provenientes de duas
perspectivas filosóficas aparentemente
dissonantes — naturalismo e teísmo
— tal cotejo proveu novas percepções
com relação ao vínculo integral entre
mente e corpo. O estudo também
conduziu a uma postulada conclusão:
uma estrutura ativa do tipo fractal (veja
a coluna lateral) opera nos processos
vitais e pode ser identificada no relacionamento entre mente e corpo.
Uma dinâmica tríade
do tipo fractal
O tema penetrante que emergiu
desse estudo comparativo é que existe
uma relação dinâmica entre os três
principais componentes da função
cerebral — processamento cortical
(pensamento de ordem elevada ou pensamento consciente), estimulação física
e influência sócio-espírito-emocional1
sobre as funções do cérebro e do corpo
através da neuroquímica. Há cerca de
cem anos, Ellen G. White referiu-se a
essas três funções como as “capacidades
físicas, mentais e espirituais”.2
O fato novo a respeito dessa antiga
construção triádica diz respeito aos
dados científicos que corroboram e/ou
negam aquilo que fora simplesmente
especulado filosoficamente. Sabíamos
intuitivamente que essa totalidade envolve mente, corpo e espírito.
Presentemente, com o conhecimento ampliado sobre o cérebro e suas
relações com o corpo, o conceito de
integralidade pode basear-se numa
perspectiva ainda mais objetiva. Com
a ajuda de nova tecnologia de imagens
cerebrais, podemos agora ver como
o cérebro funciona e não apenas nos
envolver em especulação baseada em
comportamentos exteriores.
O conhecimento obtido a partir da s
novas técnicas de imagens aperfeiçoou-se
ainda mais, graças ao crescente conhe-
Fractais
Um matemático por nome Benoit
Mandelbrot introduziu a teoria dos fractais
na década de 1970. O fractal é e contém
um padrão repetido em variados níveis de
forma e/ou função em determinada entidade. Esse padrão repetitivo de unidades
menores exemplifica o padrão de toda a
unidade. Quer o desenho seja observado
microscópica ou macroscopicamente, a
estrututra-padrão sempre aparece. Muitas
vezes é utilizado o exemplo de um feto
para se descrever o fractal em termos
simples. Cada um dos segmentos menores
de um feto reproduz a forma e padrão do
todo. O padrão não apenas é o todo, mas
também é visto como as partes constituintes do todo. (Nesse estudo da função
mente-corpo, a aplicação do termo fractal
é metafórica e filosófica, não matemática.)
11
12
O cérebro como órgão fractal
A área cortical do cérebro é comumente identificada como a do pensamento de ordem mais elevada e o pensamento consciente. O centro límbico está
associado à emoção, à entrada sensorial
provida pelo ambiente e a memória,
enquanto que o tronco cerebral e o cerebelo conduzem informações de entrada
e saída, dos músculos, órgãos e outros
aspectos do corpo físico, e coordenam os
movimentos físicos. Em certo sentido,
o córtex pode ser visto como o componente mental, a área límbica como o
componente sócio-espírito-emocional,
e o tronco cerebral e o cerebelo como o
componente físico.
O neurônio como órgão fractal
Em escala menor, o fractal mentalfísico-espiritual é novamente evidente.
A minúscula célula neuronal responde
a sinais neuroquímicos (função emocional), decide suas respostas aos sinais
(função mental) e atua sobre essa decisão (função física) através da inibição
ou transferência da ação potencial. O
neurônio não opera apenas nessas três
aptidões, mas também influencia e é
influenciado profundamente pelos mesmos elementos. O córtex, o sistema límbico e o tronco cerebral-cerebelo estão
constantemente afetando o neurônio e
sendo afetados pela função neuronal.
Corpo-mente-espírito como órgão
fractal
Observando o corpo-mente a partir
de uma perspectiva mais ampla, vemos
que o cérebro (mental) controla a cog�����
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do próprio cérebro como um órgão, e
holisticamente no relacionamento entre
mente e corpo. Seria essa repetição
uma evidência de representação fractal
adicional?
Os pesquisadores concordavam claramente que três principais funções
contribuíam para a realidade humana
— intelecto, emoção e atividade física.
Entretanto, teria alguém mais alinhado o estudo do cérebro com a teoria
fractal? Uma revisão da literatura confirmou a conexão. Mercier, Bieberich,
Ferandez e outros também haviam discutido a função fractal num contexto
neurocientífico4.
Comparando esses grandes conjuntos
de dados, comecei a ver evidências da
reciprocidade holística entre mente,
corpo e espírito — microscopicamente
ao nível celular, anatomicamente na
organização do próprio cérebro, e evidentemente no relacionamento entre
cérebro e corpo. Examinemos mais
detidamente esses três níveis de forma
e função, começando com a estrutura
anatômica do cérebro.
Na década de 1970, quando Paul
MacLean propôs a teoria cerebral
triúna, descreveu três níveis para o
cérebro — o córtex, o sistema límbico
e o tronco cerebral-cerebelo. Nessa
época, MacLean cria que cada uma
dessas áreas funcionava como um cérebro dentro do cérebro. Desde então,
MacLean se uniu a outros na adoção de
uma postura diferente. O pensamento
atual sugere que cada uma dessas três
áreas funciona como parte de um todo
dinâmico. Cada uma das áreas depende
das outras duas quando ocorre um processamento simultâneo e simbiótico.
Embora o conceito original de
MacLean tenha mudado, as três principais áreas por ele identificadas ainda
são consideradas as áreas básicas da
anatomia cerebral. Cada área é multifuncional e se integra com as outras
duas partes e suas funções. Essas três
áreas continuam identificadas com as
funções principais que têm lugar em
cada área.
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cimento da neuroquímica — o campo
que une mente e corpo. Em 1972, a
descoberta de Candace Pert sobre o
receptor opiáceo abriu caminho para
maior compreensão de como os elementos químicos formam, no interior
de nosso corpo, uma dinâmica rede
de informações que vincula mente e
corpo.3 Pert equipara a neuroquímica
às emoções — os fenômenos que ocorrem quando um neurônio se comunica
com outro e produz atitudes, espírito
e ação. As emoções influenciam todo
pensamento potencial antes que esse se
processe nas áreas corticais de “ordem
elevada”, como pensamento consciente.
De que forma as novas percepções
sobre mente-corpo-espírito se relacionam com a teoria fractal? Antes de dar
essa explicação, talvez um pouco de
história ajude a esclarecer aqueles que
não se acham familiarizados com o
termo fractal.
Quando criança eu costumava gastar
tempo com papai num pequeno avião.
Desde as alturas, fascinavam-me os
padrões observados nos terrenos não
cultivados lá embaixo. Anos mais tarde,
os padrões vistos a partir do avião ainda
apareciam em pequenos pedaços de
rocha sobre os quais eu escrevia versos e
os oferecia de presente. Posteriormente
ainda, arquétipos similares eram evidentes nos microscópios do laboratório
de ciência, ou através de telescópios
ao observar galáxias e nebulosas muito
além da atmosfera terrestre. Esses
padrões repetitivos ou tipo fractal,
aparentes no micro e no macrocosmo
como eu observara ao longo dos anos,
tornaram-se mesmo mais significativos
depois que li a obra Leadership and the
New Science, de Margareth Wheatley,
e me familiarizei com a teoria fractal.
Seriam esses padrões naturais a evidência de um grande plano organizacional
ou desígnio inteligente?
Em meus estudos do cérebro, uma
construção mental repetitiva também
veio à tona por meio da palavra de
numerosos especialistas sobre cérebro
e aprendizado, enquanto descreviam
a função em nível neuronal dentro
DIÁLOGO 16•2 2004
nição, o corpo (físico) provê os aportes
que estimulam a função do cérebro e
a neuroquímica sócio-espírito-emocional é criada pela estimulação sensorial
— geralmente a partir do ambiente,
que ativa os elementos neuroquímicos
para que atuem em rede e integrem
corpo e cérebro. Inquestionavelmente,
a interação entre corpo, mente e espírito afeta suas partes constituintes. Seria
verdade que corpo, mente e espírito
são afetados por uma representação
mais ampla desse postulado fractal?
Existe abundante evidência de que essa
construção fractal é funcional com os
ambientes que cercam o indivíduo.
Influências mentais, físicas e espirituais
não apenas nos rodeiam; elas também
contribuem para a qualidade de nossa
capacidade intelectual, de nossa saúde
física e para as condições e desenvolvimento emocional, social e espiritual.
Considere o impacto ambiental entre
essas três realidades.
Estímulos mentais no ambiente
Examinemos primeiramente a capacidade intelectual. Durante séculos
feriu-se o debate entre natureza versus
educação, e tradicionalmente a natureza parece ter tomado a dianteira. O
que determina a inteligência: a genética
(natureza) ou a influência ambiental
(educação)? Esta tem sido a grande
questão. Novos conhecimentos sobre o
aprimoramento e a capacidade cerebral
de mudar e crescer indicam que a natureza e a educação são iguais em determinar a capacidade cognitiva.
Segundo, as influências filosóficas
dominantes também exercem papel
significativo sobre o estado mental da
pessoa. O sistema de crenças dos pais
desempenha poderoso impacto sobre
as atitudes, hábitos e relacionamentos
dos filhos. Mesmo antes de a criança
ter explícita memória de ocorrências
biográficas, os que cuidam dela moldam
implicitamente sua orientação mental
em formas que são extremamente difíceis ou mesmo impossíveis de serem
mudadas. Além disso, a escola desenvolve as crenças e orientações da sociedade.
DIÁLOGO 16•2 2004
Terceiro, aquilo que imaginamos
que os outros pensam a nosso respeito
exerce profundo impacto sobre nosso
autoconceito e capacidade de recuperação. O considerável volume da pesquisa
atual sobre o perigo dos estereótipos
sugere que, consciente ou inconscientemente, a percepção que os outros
têm de nós determina nossas atitudes e
desempenho. Esse fenômeno se relaciona intimamente com as considerações
seguintes.
Estímulos emocionais, sociais e
espirituais no ambiente
A inteligência emocional, uma
expressão popularizada por Daniel
Goleman na década de 1990, representa
agora uma bem fundamentada construção na teoria educacional, graças aos
novos conhecimentos sobre a função
cerebral. O papel da emoção na cognição é inegavelmente profundo. Mas
a emoção também desempenha um
papel de primeira grandeza em outras
disciplinas. O mundo dos entretenimentos aufere gigantescos lucros ao
aplicar o apelo emocional às audiências
ao redor do mundo. En novos campos
de estudos — neurocardiologia, neuroeconomia e neuropsicologia, para citar
apenas uns poucos — também é feito
uso desse foco relativamente novo sobre
a emoção.
Você pode querer saber de que forma
a neurociência relaciona a economia
com a emoção. Paul Zak, da Claremont
Graduate University, explica que prazer
e escolha conduzem o mercado de capitais. Confiança é outro fator significativo. Novas pesquisas sobre confiança
sugerem que quando duas pessoas confiam uma na outra, elevam-se os níveis
de oxitocina de ambas. A oxitocina é
um hormônio — um neuroquímico
— que produz relaxamento. Sítios
receptores dispostos ao longo do cérebro respondem favoravelmente a níveis
apropriados desse neurotransmissor, o
qual também produz interligações.
A pesquisa sobre feromônios e transferência de sinais de variabilidade no
ritmo cardíaco, além de outras influên-
cias emocionais, sociais e espirituais,
continua provendo informações acerca
do poderoso papel da neuroquímica em
nosso ambiente. Os benefícios obtidos
por níveis positivos de emoções sobre
a mente e corpo aumentam as funções
do sistema imunológico, do coração, da
respiração e da digestão.
Muitas pesquisas têm abordado o
efeito das emoções negativas sobre o
corpo e a mente. Martin E. P. Sligman,
ex-presidente da Associação Americana
de Psicologia, descreve como as emoções negativas podem conduzir à
depressão clínica. Em sua investigação
sobre formas de corrigir essa tendência
ao desequilíbrio emocional, Seligman
começou colaborando com Mihaly
Csikszentmihalyi, autor de Flow, um
livro acerca do valor da experiência
motivacional de pico.
Barbara Fredrickson, da Universidade
de Michigan, está atualmente fazendo
especialização em psicofisiologia e os
efeitos das emoções positivas sobre a
mente e o cérebro. Num artigo para a
American Scientist,5 Fredrickson menciona pesquisas que sugerem que as emoções positivas promovem a longevidade,
o funcionamento individual e coletivo,
o bem-estar psicológico e a saúde física.
Ela está pesquisando “como e por que” a
‘bondade’ é importante.”6
Emoções negativas — ira, temor, tristeza, etc. — são “experiências extremamente diferentes” que sinalizam respostas autonômicas específicas, evidenciadas
pela expressão facial. Emoções positivas
— alegria, entretenimento, serenidade,
etc. — são “relativamente indiferenciadas” e “não produzem respostas autonômicas distinguíveis”.7
As emoções positivas promovem a
saúde física, intelectual e psicossocial,
que perdura “muito depois de a emoção
positiva haver desaparecido”, sugere
Fredrickson. Esse efeito positivo provê
aumento da capacidade de recuperação
e do otimismo, que podem ajudar a
desfazer os efeitos danosos das emoções
negativas sobre a mente e o corpo.
Há mais de cem anos Ellen White
apresentou um conselho similar. Ela
13
afirmou que quando a mente humana
se conecta à mente divina, o Espírito
Santo habita no coração. Ela explica que
nessa ocorrência, o efeito do amor exerce
influência poderosa e benéfica sobre a
mente e o corpo. Subseqüentemente,
forma-se ao nosso redor uma atmosfera
salutar para todos os que se aproximam.
Emoções negativas, por outro lado, sãonos daninhas e também aos que nos
cercam.8
As emoções não apenas servem para
transmitir dados neurológicos entre os
neurônios dentro do cérebro, mas também entre cérebro e corpo. Pesquisas
acerca de emoções positivas provêem
novo significado para o valor da função
espiritual como mantenedora da saúde
da mente e do corpo. O culto congregacional, a confiança no poder divino,
as pausas para agradecer pelos alimentos
antes das refeições, o desvio do foco de
si mesmo para as necessidades alheias,
etc., podem ser mais benéficos do que
até então se admitia.
Estímulos físicos do ambiente
Fisicamente, através do som, tato,
paladar, olfato e visão, o ambiente nos
estimula à ação, à medida que tentamos
sobreviver e desenvolver-nos. Um exemplo tornará mais claro esse ponto.
O Dr. George Javor, bioquímico
da Universidade de Loma Linda,
Califórnia, sugere que a matéria viva
busca constantemente mover-se rumo
ao equilíbrio. Contudo, se ela atinge
o ponto de equilíbrio e aí permanece, a
Figura A: Fractal balanceado
Esp
A natureza da sobreposição dos
estímulos ambientais
Quem sabe já lhe haja ocorrido que
essas três influências ambientais de alguma forma se sobrepõem em natureza.
De acordo com a teoria fractal, cada
componente — mental, emocional,
social, espiritual e físico — contém
efetivamente elementos dos outros dois
componentes.
O papel vital do serviço
Há cerca de cem anos, Ellen White
promoveu a idéia de que o aprendizado
resulta do “harmonioso desenvolvimento
das capacidades físicas, mentais e espirituais”.10 Além disso, ela declarou que tal
desenvolvimento harmonioso “prepara o
estudante para a alegria do serviço neste
mundo e para o elevado gozo de um
serviço mais amplo no mundo futuro”.
O serviço, como o quarto componente
no cultivo do desenvolvimento humano,
é crítico para a função holística.
É vital obter benefícios educacionais,
Figura B: Fractal distorcido
Esp
o
irit
ic
Fís
ual
irit
Fís
ico
vida se dissipa.9
James Zull, da Universidade Case
Western Reserve, afirma que “movimento é cognição expressa”. Os circuitos
internos dos lobos corticais naturalmente movimentam a cognição de forma
repetitiva, da integração sensorial para o
processamento executivo, e finalmente
rumo à ação no centro motor do córtex.
Conseqüentemente, as exigências sociais
de trabalho e serviço promovem a saúde
mental e corpórea.
Mental
Mental
ua
l
relacionais e físicos; contudo, receber
constantemente e não retribuir pode
truncar o potencial humano. Quando
a unidade humana — mente, corpo e
espírito — é acionada em benevolência
para com a comunidade da qual é uma
parte fractal, garante-se a integridade da
substância vital e o potencial humano
tende a expandir-se.
Equilibrando a pirâmide
A função holística poderá ocorrer mais
provavelmente quando favorecermos o
equilíbrio entre mente, corpo e espírito
(veja a Figura A). A Figura B mostra
como uma parte da tríade fractal pode
absorver as outras duas e levar ao desequilíbrio pessoal. Um fractal “achatado”
provavelmente truncará o potencial.
Quando, porém, as três dimensões se
encontram em equilíbrio, e essa integralidade é canalizada em amorável serviço
a outros, alcançamos nosso potencial.
Linda Caviness (Ph.D. pela Andrews
University) leciona na Escola de
Educação da Universidade La Sierra.
Endereço: 4700 Pierce Street,
Riverside, Califórnia 92515, EUA. Email: [email protected].
REFERÊNCIAS
1. Embora nem todos os escritores que aplicam
a pesquisa do cérebro à educação utilizem o
termo espiritual, não é incomum encontrar
referências às funções holísticas da atividade
cerebral nos campos mental, físico, emocional e
social. O termo espiritual é utilizado, mas não
com tanta freqüência.
2. Ellen G. White, Educação (Mountain View,
Calif.: Pacific Press Publ. Assn., 1903), p. 13.
3. C. B. Pertner, Molecules of Emotion (New
York: Scribner, 1997).
4. Ver F. Mercier, “Anatomy of the Brain
Neurogenic Zones Revisited: Fractones
and the Fibroblast/Macrophage Network,”
Journal of Comparative Neurology, 451 (16 de
setembro de 2002) 2:170-88; E. Bieberich,
“Recurrent Fractal Networks: A Strategy for
the Exchange of Local and Global Information
Processing in the Brain,” Biosystems 66 (ago.set. de 2002):145-164; e E. Ferandez, “Use
of Fractal Theory in Neuroscience: Methods,
Advantages, and Potential Problems,” Journal
of Neuroscience Methods 24 (Agosto 2001)
Continua na página 35.
14
DIÁLOGO 16•2 2004
Eu sei em quem tenho crido
Niels-Erik Andreasen
Como podemos estar certos acerca do Deus a quem
adoramos?
Em 1915, com 87 anos de idade,
Ellen G. White faleceu em sua casa, em
Elmshaven, Deer Park, Califórnia. As
últimas palavras registradas como tendo
sido proferidas por essa serva de Deus
foram: “Eu sei em quem tenho crido.”
Quão bem conhecemos o Deus em
quem cremos? Conhecer a Deus não significa que nós O compreendemos. Ter
um profundo conhecimento pessoal de
Deus significa que nos sentimos seguros
em Sua presença e buscamos Sua companhia. Deixe-me falar sobre três coisas
que cheguei a conhecer de Deus por
meio de minha própria experiência.
Deus é meu Criador
Primeiro, eu conheço a Deus como
meu Criador. A criação é um evento
estranho, incomum e maravilhoso. A
própria Bíblia admite isso. Ele fez o
mundo por Sua palavra. Nós não podemos fazer o mesmo. A criação é um
milagre. Ela aparece diante de nossos
olhos já na primeira página da Bíblia e
sem qualquer introdução. Assim ela é
mostrada no Livro Santo: “No princípio
criou Deus.” Não admira que muitos,
mesmo alguns cristãos, têm dificuldade
de aceitar a criação como o meio de feitura do mundo e de tudo o que há nele.
Há, de fato, muitas interrogações.
Para ajudar a responder algumas
dessas perguntas, nossa igreja criou o
Geoscience Research Institute (“Instituto
de Pesquisa Geocientífica”). Já participei
de duas viagens de estudo de campo.
Elas foram agradáveis e informativas.
Todavia, trataram principalmente das
evidências de uma catástrofe grande e
terrível — o dilúvio. Entre as palestras,
porém, eu tirava um tempo para contemplar o mundo de Deus — o mar em
baixo e as estrelas em cima. Comecei a
me sentir seguro na presença do meu
DIÁLOGO 16•2 2004
Criador e a procurar Sua companhia
mais intensamente do que antes.
Observe ainda outra história da criação, desta vez sob a perspectiva de uma
criança. Em Salmo 8:1-5, duas pessoas
estão conversando — um pai ou mãe
e uma criança. Talvez fosse o próprio
salmista, o rei Davi, e um de seus filhos,
Absalão ou Salomão. Eles estavam caminhando, certa noite, pela cobertura do
palácio. Olhando para cima, o filho pergunta: “Pai, quantas estrelas cintilantes
existem? E, papai, quem as pôs lá? Veja,
uma está caindo!” Foi nesse momento
que o salmista escreveu: “Dos lábios
das crianças e dos recém-nascidos suscitaste louvor” (NVI, nota de margem).
E ainda: “Quando contemplo os Teus
céus, obra dos Teus dedos, a lua e as
estrelas que ali firmaste, pergunto: Que
é o homem, para que com ele Te importes?” (NVI). Note a expressão “obra dos
Teus dedos.” Para o salmista, a obra
criadora de Deus é tão simples quanto
o trabalho de um dedo; simples quanto
uma brincadeira de criança!
As crianças conhecem a Deus instintivamente porque têm olhos grandes e
curiosos que estão sempre observando.
Elas sabem o que significa estar seguro
na presença de seus pais, se elas realmente têm bons pais. Portanto, elas nos
ensinam como nos sentir seguros na
presença de Deus e como procurar Sua
companhia.
Você pode pensar, porém, que isso é
muito simplista. Não somos mais crianças. Como podemos conhecer nosso
Criador sem primeiro resolver todas as
questões acerca do mundo que Ele criou
— questões acerca dos fósseis primatas
encontrados na África, das eras do gelo
na Escandinávia, da coluna geológica,
dos dinossauros e assim por diante?
Concordo que essas questões são
difíceis e, francamente falando, eu não
tenho encontrado respostas satisfatórias
a todas elas. Mas então me lembro do
Salmo 8 e penso numa criança parada
na esquina, esperando para cruzar uma
rua de tráfego intenso. Ela estende o
braço, apega-se à mão de seu pai e então
se sente segura. É assim que eu me rela-
ciono com meu Criador. É claro que
há questões e problemas. Há mistérios
no mundo. Mas quando tomamos Sua
mão, nos sentimos seguros.
Quando conhecemos a Deus desse
modo, confessamos sem hesitação ou
reserva: Creio em Deus Pai, o TodoPoderoso, Criador dos céus e da Terra.
Eu sei em quem tenho crido. Sinto-me
seguro na presença de meu Criador e
busco Sua companhia.
A vontade de Deus para minha
vida
Segundo, eu conheço a Deus pela
aceitação de Sua vontade para minha
vida.
A vontade de Deus para nós é nosso
bem-estar e Ela está revelada em Sua lei.
Isso também pode parecer muito simples; apesar disso, a vontade de Deus é
uma coisa estranha para muitas pessoas.
Para alguns de nós, a vontade de Deus é
estrita, opressiva, legalista, dura e crítica.
Por essa razão, até mesmo alguns cristãos
não buscam conhecer seriamente a vontade de Deus e obedecê-la seriamente.
Dentro da curta história da Igreja
Adventista do Sétimo Dia, vejo duas
fases distintas em nosso ensino com relação à vontade de Deus e Sua lei.
Fase um: Logo no início, sem querer,
conseguimos afastar muitas pessoas da
vontade de Deus expressa em Sua lei.
Ellen White falou dessa ênfase errada
em 1888, quando nos instruiu acerca
do relacionamento entre lei e graça. A
princípio, ouvimos e mudamos, mas
então nos esquecemos do que havíamos
aprendido.
Falávamos da lei de Deus da mesma
forma como da vinda do juízo de Deus,
intimidando assim nossos ouvintes.
Alguns de meus alunos costumavam
dizer: “Se no juízo Deus vai levar em
consideração meus pecados contra Sua
lei, então eu não vou conseguir. Desisto.
Eu não quero nem ouvir mais sobre a lei
de Deus.” Minha tarefa era mudar o seu
pensamento.
Fase dois: Por volta do final do século
vinte, como adventistas, começamos
outra vez a enfatizar a graça de Deus e a
15
justiça pela fé. Ensinamos corretamente
que a graça precede a tudo o mais em
nosso relacionamento com Deus, e uma
vez que a aceitemos, nós conheceremos a
Deus e também Sua vontade. Mas, essa
descoberta maravilhosa não restabeleceu
a lei de Deus como guia em nossa vida.
Na verdade, parece que a lei de Deus é
mencionada hoje em dia muito menos
do que antes, mas por razões diferentes
— não porque tenhamos medo dela,
mas porque nós a deixamos de lado e
ignoramos seu valor.
Pensando em tudo isso, cheguei a
duas conclusões. Primeira: em todas as
passagens que falam do juízo, especialmente nos escritos dos profetas, Deus
não julga Seu povo por ter falhado em
obedecer a Sua lei, mas por ter falhado em permanecer leal à Sua aliança.
Miquéias 6:6-8 fala do fracasso de Israel
e então passa a enumerar as muitas
maneiras pelas quais Israel poderia ter
sido mais obediente. “Deveríamos oferecer mais ofertas queimadas, óleo e sacrifícios?”, perguntou o povo. “Não!” Foi a
resposta do Senhor. “Eu apenas peço três
coisas (v. 8): pratiquem a justiça, amem
a fidelidade e sejam humildes, ou seja,
sejam leais para Comigo.” É isso o que
Deus quer.
Assim eu explicava aos meus alunos
que o Juízo é um importante ensino da
Bíblia, mas quando nossos nomes forem
passados na corte celestial, aquilo que
Deus irá perguntar não é quão bons,
mas quão leais temos sido. É isso o que
realmente mais importa para Deus. Na
verdade, não são os nossos pecados que
nos deixam numa situação difícil no
Juízo, mas o desdém pela corte é que
nos põe em risco diante dEle. Quanto
aos nossos pecados, Deus sabe que
pecamos, mas Ele tem o remédio para
o pecado: perdão (Miq. 7:19). Mas
o que pode Deus fazer com relação à
deslealdade de nossa parte? O que pode
Ele fazer quando Lhe viramos as costas?
É isso que importa no Juízo. VoltamosLhe as costas em sinal de desrespeito
para com a corte, ou vamos corajosamente perante Seu trono em busca de
aceitação e perdão por meio de Jesus
16
Cristo, nosso Amigo e Advogado? É isso
o que significa lealdade no julgamento.
Minha segunda conclusão é que a
lei de Deus se destina a mostrar-nos
como agir e viver com mais responsabilidade. A lei de Deus consiste em
10 mandamentos divididos em duas
tábuas. Vamos começar pela parte mais
fácil, a segunda tábua, que ensina como
nos relacionarmos com os outros. Não
cobice aquilo que pertence a outro;
esteja satisfeito com o que você tem.
Não minta para o seu próximo; digalhe a verdade. Não tome para si aquilo
que é dos outros. Respeite a esposa de
seu amigo; não cometa adultério. Não
mate ninguém; você não deve tirar a
vida dos outros. “Mas, como podemos
aprender a viver em harmonia com
essas exigentes proibições?”, podemos
perguntar. A resposta está no mandamento positivo da segunda tábua, o
qual aponta para o cerne de todos os
relacionamentos: honre seu pai e sua
mãe. É aqui que tudo começa, em casa
com pai, mãe e filhos. Se as coisas vão
bem em casa, então elas vão bem na
vizinhança, no país e no mundo. A
vontade de Deus não é nenhum mistério, nem algo que cause medo. Ela
começa por um bom e seguro lar.
Mas, perguntamos: Quem nos deu
esses princípios e por que deveríamos
atentar para eles? A resposta é encontrada na primeira tábua — os quatro
mandamentos que tratam de nosso
relacionamento com Deus. O Autor
desses mandamentos não é qualquer
um. Eles vêm de Deus e representam
Sua vontade. Quem é esse Deus? Não
podemos vê-Lo ou sequer fazer uma
imagem dEle. Bem, será que posso falar
com Ele? Sim, de alguma forma, em
oração e meditação, mas não usando
Seu nome de modo leviano. O que
então devemos fazer para conhecermos
esse Deus e Sua vontade? Isso nos leva
ao mandamento positivo correspondente situado na primeira tábua, o quarto.
Ele contém a surpreendente mensagem:
o Doador da lei, que estabeleceu esses
elevados padrões éticos para nós e que
exige tanto de nós, começa oferecendo-
nos uma dádiva — um dia à parte, um
tempo sagrado, um tempo de repouso.
Esse é o dia no qual aprendemos a
conhecer a Deus na segurança de Sua
presença. Uma vez que captemos o
profundo significado do quarto mandamento, todas as questões anteriores
são resolvidas. Nós O conhecemos ao
sentir-nos seguros em Sua presença e
ao Lhe buscarmos a companhia no Seu
dia (Isa. 58:13-14).
Deus me ama
Terceiro, eu conheço a Deus porque
Ele me ama.
“Porque Deus tanto amou o mundo
que deu o Seu Filho Unigênito, para
que todo o que nEle crer não pereça,
mas tenha a vida eterna” (João 3:16,
NVI). Quando jovem, impressionavame muito saber que nosso Senhor e
Salvador teria dado Sua vida mesmo
por um único pecador. Além disso,
Paulo diz que até podemos entender se
alguém estiver disposto a morrer por
um amigo, mas Cristo deu Sua vida
por nós quando ainda éramos inimigos
(Rom. 5:7-8). Temos de pensar com
bastante cuidado na palavra amor, especialmente porque ela expressa a terceira
dimensão de nosso conhecimento de
Deus.
Antes de tudo, o amor de Deus não
é motivado por emoções ou paixões.
Seu amor é um princípio. É isso que
precisamos saber acerca dEle e quando
alcançamos esse conhecimento sentimo-nos seguros em Sua presença e
buscamos Sua companhia. Ou seja,
amamos a Deus da mesma maneira.
Alguns cristãos desenvolvem um relacionamento de amor meramente emocional, passional, com Deus. Nossos
jovens, e até mesmo crianças, são às
vezes enredados pela crença de que
o cristianismo é simplesmente uma
questão do coração. “Dê seu coração a
Jesus”, nós os ensinamos desde a mais
tenra idade. Mas, permanecerá forte e
constante o seu amor para com Deus à
medida que eles crescerem?
Uma das experiências mais tristes
que tive é ver um jovem e um não tão
DIÁLOGO 16•2 2004
jovem cristão substituir seu apaixonado
amor por Deus, por uma certa aversão
a tudo aquilo que é religioso e cristão.
O profeta Oséias também fala dessa
experiência quando se queixa de que
o amor de Israel é como o orvalho da
manhã. Evapora diante dos primeiros
raios de Sol (Oséias 6:4). Então, a fim
de explicar o generoso amor de Deus,
o profeta introduz uma palavra especial
para amor, hesed, que significa amor
baseado em princípio. Hesed poderia
ser traduzido como “amor que perdura”, “amor que guarda a aliança,” ou
“amor eterno.”
Todos temos algo a aprender sobre
o amor de Deus. Ele nos ama por
princípio, mas, diferente do nosso, Seu
amor nunca perde a intensidade. Ele
sempre permanece forte e cálido. Deus
é Alguém que nos ama sempre. Ele é
Alguém cujo amor é firme, não importando as circunstâncias. Ele é Alguém
que ama mui diferentemente do modo
como o mais amoroso entre nós o faria.
É isso o que Jesus nos explicou na
parábola do filho pródigo que voltou
para o seu pai, mãe e irmão (Luc. 15).
Rembrandt, pintor holandês, retratou
essa cena num famoso quadro que
se encontra no Museu Nacional do
Eremita, em São Petersburgo, Rússia.
O teólogo Henri Nouwen escreveu um
livro sobre essa pintura do filho rebelde
que finalmente retorna para casa. O
ponto central na parábola, tanto na
pintura quanto no livro, é que, contrariando todas as expectativas, Deus o Pai
amou a esse jovem com um amor de
mãe e com um amor de pai. Esse ponto
incomum está implícito na parábola
de Jesus onde ambos — pai e mãe —
fazem algo para demonstrar seu amor
ao filho que volta ao lar. O pai veste o
filho com um manto e a mãe lhe prepara um banquete. Isso é mostrado claramente na pintura de Rembrandt e na
interpretação de Nouwen. Rembrandt
pintou as mãos do pai nos ombros do
filho — uma reproduz a mão forte de
um homem e outra se parece com a
mão gentil de uma mulher. E colocou
a figura de uma mulher mais ao fundo
DIÁLOGO 16•2 2004
para indicar que ela também estava ali.
É desse modo que Deus ama a todos
os Seus filhos hoje. Ele ama a você e
a mim, não importa a idade, o sexo, a
raça, a religião ou a procedência geográfica. Todos nós somos Seus filhos!
Nos momentos difíceis não é fácil
manter em nossa mente o conhecimento de Deus com nitidez. Mas,
precisamos estar sempre centrados nele.
Nos tempos de calamitosa destruição
e catástrofe, à medida que este mundo
ruma para o seu final, precisamos ter a
certeza de que Ele é o nosso Criador e
o Criador do mundo todo. Quando a
lei e a ordem parecem não mais existir,
os injustos são arrogantes e os inimigos
de Deus pecam a olhos vistos, precisamos conhecer a vontade de Deus e Suas
exigências éticas, porquanto apenas elas
podem trazer paz à nossa vida, família
e sociedade.
Niels-Erik Andreasen (Ph.D.,
Universidade Vanderbilt) é o presidente da Universidade Andrews.
Este artigo está baseado num
sermão devocional pregado durante o recente Concílio Anual da
Associação Geral dos Adventistas
do Sétimo Dia. Seu endereço:
Andrews University, Berrien Springs,
Michigan 49104, EUA.
Realidade…
Continuação da página 10.
do que o copioso e ameno ar sobre as
orquídeas invalida, a priori, o materialismo. Admite-se prontamente que os
pôr-de-sóis revelam os limites da lógica
e fornecem razões no sentido de conhecer o amor de Deus. E até mesmo a
criança inalterada não mostra que Cristo
morreu na cruz. Não interprete, daquilo que está lá fora, mais do que existe.
Tampouco interprete menos.
“Mas pergunta agora às alimárias, e
cada uma delas to ensinará; e às aves dos
céus, e elas to farão saber. Ou fala com
a terra, e ela te instruirá; até os peixes
do mar to contarão. Qual entre todos
estes não sabe que a mão do Senhor fez
isto? Na Sua mão está a alma de todo
ser vivente, e o espírito de todo gênero
humano”. Jó 12:7-10, Edição Revista e
Atualizada no Brasil.
Clifford Goldstein é o editor do
Adult Bible Study Guide. Este artigo foi extraído de seu livro God,
Gödel, and Grace: A Philosophy of Faith
(Hagerstown, Maryland: Review and
Herald Publ. Assn., 2003). Utilizado
com permissão.
REFERÊNCIAS
Atenção
comunicadores!
Você é um estudante adventista
de comunicação ou está trabalhando
nessa área? A Convenção da Sociedade
Adventista de Comunicadores (SAC, em
inglês) é para você. A SAC promove o
crescimento profissional e espiritual de
adventistas em todas as áreas da comunicação: mídia eletrônica, jornalismo, artes
gráficas, marketing, webdesign e outras.
A convenção de 2004 acontecerá de 14
a 17 de outubro, em Dallas, Texas, EUA.
Para detalhes e inscrição, visite: http://
www.adventistcommunicator.org ou ligue
para 800-732-7587 (EUA).
1. Arthur Schopenhauer, The World as Will and
Idea (London: J. M. Dent, 1995), p. 4.
2. Ibid.
3. George Berkeley, On the Principles of Human
Knowledge, excerpted in The Speculative
Philosophers (New York: Random House,
1947), p. 254.
4. S. Agostinho, The City of God (New York:
Doubleday, 1958), p. 217.
5. Ibid., p. 254.
17
PERFIL
Romualdo Costa
Diálogo com um pintor paisagístico
adventista uruguaio
Nascido numa fazenda no interior do
Uruguai, Romualdo Costa aprendeu a
amar as paisagens da natureza desde sua
infância. Como um dos mais novos dentre 11 irmãos, ele desfrutava uma vida
tranqüila no campo, passeios a cavalo,
pescarias no rio e escaladas em morros
cobertos de árvores e vegetação.
O talento inato de Romualdo para o
desenho e a pintura manifestou-se cedo
e, com o apoio de um professor de arte,
começou a desenvolvê-lo durante sua
adolescência. Logo a pintura tornou-se
uma paixão para Costa, e por décadas
ele tem pintado quase todos os dias.
Como conseqüência, produziu mais de
15 mil quadros de tamanhos diversos e
em diferentes superfícies.
Em 1972, Costa, já casado, mudou-se
com sua família para a Venezuela, onde
se tornou um pintor bem conhecido e
apreciado. Em 1989, em busca de novas
experiências visuais e oportunidades
artísticas, ele e sua família se mudaram
para Porto Rico.
Desde 2001, reside nos Estados
Unidos, onde continua a pintar. “O dia
em que não posso pintar, sinto-me triste
como uma coruja”, confessa. Costa
exibiu seus quadros em mais de 100
exposições pessoais, e trabalhou como
18
jurado em várias mostras de arte.
Atualmente, seus trabalhos fazem parte
de coleções particulares em vários países do mundo.
Costa é casado com Alba Estades,
também pintora, e têm três filhos:
Enrique, Robert e Ronald.
Dialogo visitou o artista em sua casa,
onde estava cercado por algumas de
suas obras. Ele, gentilmente, convidou-nos a entrar e começamos nossa
conversa.
■ Como você se tornou pintor?
Comecei a desenhar e pintar quando
ainda criança. Um dia, aos 14 anos, na
cidade de Melo, Uruguai, eu caminhava perto de uma casa que tinha uma
grande janela aberta. Observando seu
interior, vi vários quadros a óleo fixados
nas paredes e por vários minutos fiquei
ali olhando embasbacado. Alguns dias
depois, visitando novamente a cidade,
vi que as janelas daquela casa estavam
apenas entreabertas. Então subi no parapeito para olhar lá dentro mais uma vez,
e vi um artista pintando. A despeito de
o pintor haver-me pedido que parasse de
olhar e fosse embora, fui para casa convencido de que um dia eu também seria
um pintor.
■ O que o fez dedicar sua vida à pintura?
Primeiro, o grande prazer que tenho
em pintar. Segundo, quando comecei a
pintar toalhas de mesa e tapetes pequenos, as pessoas começaram a comprá-los.
Assim, aos 20 anos, descobri que podia
combinar meu trabalho de colportor
evangelista com as atividades artísticas.
Por um tempo, também decorei porcelana numa fábrica. Oito anos depois,
meus quadros proporcionaram-me uma
renda suficiente para me casar e formar
uma família.
■ De onde você tira idéias para seus quadros?
Observando a natureza, principalmente. Por essa razão, gosto de viajar
e visitar lugares bonitos. Há tanto para
ver! Podemos contemplar as formas, o
contraste de luzes e sombras e a mudança
de cores nos diferentes horários do dia.
Também me inspiro ao observar outros
quadros.
■ Qual é seu tema predileto?
A Natureza fascinou-me desde a infância. Tudo nela fala de um Deus Criador
que ama a diversidade, as cores e a beleza.
Nas paisagens, gosto de combinar terra,
céu e água, acrescentando árvores e flores.
Uma das vantagens de ser pintor é que
você tem liberdade de criar seu próprio
cenário paisagístico e mudar alguns dos
elementos para encaixar o conceito que
você tem em mente.
■ Você tem preferência por alguma tinta em
especial?
Durante anos utilizei tinta a óleo, mas
ela seca lentamente e isso exige que o
artista faça longas pausas antes de usar
uma cor diferente. Além disso, em climas úmidos, quadros a óleo podem ficar
mofados; e esse tipo de tinta tem fortes
componentes derivados de petróleo e
chumbo, os quais são insalubres. Assim,
mudei para tinta acrílica, que seca rapidamente e não mofa.
■ Em que circunstâncias você se tornou
adventista do sétimo dia?
Meu pai era um fiel membro da Igreja
Católica. Tínhamos um altar em casa e a
DIÁLOGO 16•2 2004
cada noite rezávamos o rosário. Mas ele
também lia a Bíblia para nós, ainda que
muitos pensassem ser ela um livro perigoso. Certa noite, quando eu era adolescente, uma de minhas irmãs teve um
sonho impressionante no qual viu duas
luzes resplendentes penetrando em nossa
casa pela porta da frente. Ela acordou
assustada e correu para contar o sonho ao
meu pai. Papai a acalmou e disse-lhe para
voltar a dormir. Na manhã seguinte, dois
colportores evangelistas adventistas entraram por aquela porta! Por vários dias
eles estudaram os ensinos da Bíblia com
nossa família. Após poucos meses, todos
nós fomos batizados no rio que passava
atrás de nossa fazenda. Como éramos os
únicos 14 adventistas da região, começamos a guardar o sábado e fazer nossos
devocionais e cultos em casa.
■ O que aconteceu depois?
Nossa família era querida entre os vizinhos. Muitos deles gostavam das frutas e
vegetais que plantávamos e lhes dávamos
gratuitamente. Mas depois que nos tornamos adventistas, sua atitude mudou
drasticamente. Nossos parentes e amigos
nos abandonaram e viramos objeto de
escárnio. Aqueles dias foram tristes para
a nossa família. Fomos denunciados à
polícia como pessoas perigosas. Um dos
policiais veio até nossa escola, chamounos à parte e nos interrogou sobre nossas
crenças e práticas de culto. Dissemos
a ele que estudávamos a Bíblia juntos,
cantávamos hinos e orávamos diretamente a Deus. Nosso professor interveio e
perguntou-lhe se era crime ler a Bíblia
num país livre. O policial respondeu que,
com certeza, isso não era crime, e então
foi embora.
Em nossa família seguimos a fórmula
cristã “clássica”. Estudamos a Bíblia e
oramos diariamente; somos membros
ativos da igreja adventista local, e compartilhamos nossa fé com todos com
quem temos oportunidade. Jesus Cristo
é o centro de nossa vida como um verdadeiro Amigo. E, conforme recebemos
as bênçãos de Deus, procuramos compartilhá-las com outros.
■ Sua arte proporcionou-lhe ocasiões para
testemunhar de Cristo?
Sim, muitas. As pessoas que visitam
minhas exposições geralmente fazem
perguntas. Isso possibilita uma abertura
natural para que eu lhes possa falar sobre
minhas razões, esperanças e convicções.
Quando vivi na Venezuela, o Congresso
Nacional honrou-me concedendo a
cidadania do país, e me convidou a
expor anualmente meus quadros no piso
térreo do Congresso. Quando senadores,
congressistas e funcionários visitavam
a exposição, eu dava Bíblias de presente
àqueles que demonstrassem interesse por
assuntos espirituais.
■ Como pintor, o que lhe dá maior satis-
cristãs e a arte?
Estão totalmente conectadas! Vejo
minhas pinturas como uma imitação
modesta e em miniatura do magnífico
poder criativo de Deus revelado na natureza. Como pintor, expresso-Lhe minha
gratidão.
fação?
Ver um quadro terminado! E observar
como as pessoas gostam do que pintei.
Meu desejo é transmitir-lhes alegria e
paz. Uma senhora que comprou uma
das minhas paisagens veio agradecer-me
e contar sua história. Por vários motivos,
ela sofria de depressão e estava internada para terapia. Ela pediu que aquele
quadro fosse trazido de sua casa para o
quarto onde estava e, cada manhã, passava um tempo contemplando-o. Sentiu
então que a paz e a esperança voltaram
à sua vida, e logo pôde voltar para casa
curada.
Além dessa satisfação pessoal, sou
grato porque os rendimentos provenientes das vendas de meus quadros possibilitaram manter minha família, educar
meus filhos, ajudar vários estudantes
promissores e apoiar a missão da Igreja
Adventista do Sétimo Dia.
■ Como você fortalece sua vida espiritual?
■ Conte-nos sobre sua esposa.
■ Há alguma ligação entre suas convicções
DIÁLOGO 16•2 2004
Alba começou a pintar após nosso
casamento e tornou-se uma boa pintora
e crítica afetuosa do meu trabalho. Na
Venezuela, ela ganhou o primeiro prêmio numa exposição internacional de
mulheres pintoras. Temos compartilhado muitos anos de alegria juntos.
■ Algum conselho para os jovens que têm
inclinação para a pintura?
Comece a pintar para desenvolver
suas habilidades, até você descobrir seus
pontos fortes e estilo próprio. Esteja
disposto a aprender com os outros. Faça
isso e sua vida será mais rica e feliz.
Se a inclinação para a arte e o talento
forem fortes, você provavelmente poderá
fazer da arte uma vocação para toda a
vida.
Acredito que a pintura permitiu-me
viver uma longa vida. Deus deu a cada
um de nós certa habilidade artística,
seja pintura, escultura, música, desenho
ou composição literária. Nossa tarefa é
alimentar esse dom com paciente perseverança.
■ Se, pela graça de Deus, você estiver na
Nova Terra, ainda se vê pintando lá?
Não sei. Mesmo em nosso mundo
imperfeito e cheio de pecado ainda
encontramos belezas quase irresistíveis.
Na Terra renovada haverá tantas belezas
ao nosso redor, que eu gostaria de saber
se poderíamos ousar imitá-las em um
mero quadro. Talvez Deus conceda aos
remidos outras habilidades artísticas
superiores, as quais agora não podemos
sequer imaginar. Mas, certamente,
aguardo com firme esperança o dia em
que Cristo fará novas todas as coisas.
Entrevista concedida a
Humberto M. Rasi
O Dr. Humberto M. Rasi é o fundador e editor-chefe da revista Diálogo.
O endereço postal de Romualdo
Costa é: 2255 Cahuila, Apt. 51;
Colton, Califórnia 92324; EUA.
19
PERFIL
Elaine Kennedy
Diálogo com uma geóloga adventista
Elaine Kennedy cresceu nas planícies
de Enid, Oklahoma. Seu amor vitalício
pela Geologia começou cedo, coletando
fósseis que existem em grande quantidade a leste de Oklahoma. Em 1981, ela
concluiu o bacharelado em Geologia e,
quatro anos depois, outro bacharelado
em Educação na Phillips University.
Após terminar seu mestrado em
Geologia na Loma Linda University
(Campus La Sierra) em 1987 e obter
um Ph.D. em Geologia na University
of California, em 1991, Elaine uniuse à equipe do Geoscience Research
Institute como cientista e pesquisadora
nesse mesmo ano. Ela é membro da
Sociedade de Geologia Sedimentária,
da Sociedade Geológica da América,
da Associação Internacional de
Sedimentologistas, e da Afiliação de
Geólogos Cristãos.
Seus projetos de pesquisa abrangem
a sedimentação em águas profundas
da Tapeats Sandstone (Grand Canyon,
Arizona), e o estudo sedimentológico
de ovos de dinossauro e depósitos
de fragmentos de cascas de ovos na
Patagônia, Argentina. Suas publicações
variam desde relatórios em revistas
científicas a testemunhos pessoais em
publicações denominacionais.
O esposo de Elaine, Dee, é gerente de projetos em uma companhia
de engenharia mecânica no sul da
Califórnia. Eles têm duas filhas, Shelley
e Ami.
■ Quando a senhora percebeu pela pri20
meira vez um conflito latente entre as
interpretações científicas tradicionais das
origens e a sua crença em Deus como
Criador?
Em minha classe de biologia do
primeiro ano do ensino médio, fiquei
muito aborrecida com as idéias do livro
Origem das Espécies, de Darwin, mas
meu professor disse-me para não deixar
que a opinião de um homem me incomodasse tanto. Interpretei esse conselho
como significando que eu deveria ser
inteligente o suficiente para pensar por
mim mesma!
■ Como a senhora solucionou esse desafio
à sua fé?
Quando ainda estava no ensino
médio, um novo pastor chegou à minha
cidade e explicou que nós (batistas
do Sul) tínhamos “interpretado mal”
o relato da criação em Gênesis, e que
Deus tinha moldado e desenvolvido a
vida através do processo de evolução.
Sua colocação tipicamente evolucionista teísta foi-me confortadora, pois
eu poderia conservar minha crença em
Deus como Criador, e ainda manter o
grande respeito que tinha pela ciência.
■ A senhora matriculou-se na faculdade
para cursar Geologia. Como sua perspectiva de Deus mudou durante seus estudos?
Eu tinha dificuldade de conciliar a
imagem de um amoroso Criador com
a morte e destruição aparentes nos
depósitos de mortandade em massa.
Embora nossa igreja ensinasse que a
morte fosse o resultado do pecado, eu a
via como uma parte natural do ciclo da
vida criado por Deus, o que O tornava
autor da morte. Essa imagem de Deus
não era consistente com Aquele que eu
conhecia através da minha experiência
pessoal.
■ O que a ajudou a superar essa crise
espiritual?
Deixei a faculdade no penúltimo ano
para me casar com Dee, um piloto da
Força Aérea, e começamos a participar
de um grupo não-denominacional
de estudo da Bíblia. Nosso interesse
pelos eventos dos finais dos tempos
intensificou-se quando lemos The Late
Great Planet Earth, de Hal Lindsay.
Então vimos um anúncio da Cruzada
de Profecia de Kenneth Cox. Nunca
havíamos ouvido falar dos adventistas
do sétimo dia antes, mas decidimos que
valeria a pena assistir às reuniões, se
pudéssemos aprender mais sobre a iminente volta de Cristo. Toda noite tomávamos notas e as comparávamos com
o livro de Lindsay. Na noite seguinte,
encurralávamos o Pr. Cox e o desafiávamos dizendo: “Hal Lindsay diz…”
Ele apenas sorria e dizia: “Vamos ver
o que a Bíblia fala a respeito disso”, e
então ele nos mostrava pela Bíblia qual
era a procedência de sua teologia.
■ Posteriormente, essa série evangelística
estudou o tópico da criação literal em seis
dias. Tendo em vista sua formação científica, como a senhora reagiu?
Certa noite, o título do sermão era
“O aniversário da mãe de Adão” e, após
a reunião, eu disse ao Pr. Cox que era
estudante de Geologia e que achava un
absurdo apresentar uma criação literal e
uma cronologia curta da vida na Terra.
Em vez de pegar sua Bíblia, ele disse
que me daria um livro para ler. Tratavase da Creation: Accident or Design?, de
Harold Coffin. Quando folheei os capítulos, percebi que o autor usava os mesmos dados e evidências que me foram
ensinados, mas suas interpretações e
conclusões eram bem diferentes.
Fiquei surpresa quando compreendi
DIÁLOGO 16•2 2004
que podia crer na Bíblia e ainda assim
ser uma cientista. O problema não
estava nos dados, mas nas suas interpretações. Finalmente o conflito estava solucionado; novamente, Deus Se tornou
para mim o amoroso Criador descrito na
Bíblia. Dee e eu aceitamos o sábado do
sétimo dia como memorial da Criação.
■ A senhora e Dee uniram-se à Igreja
Adventista do Sétimo Dia. Mais tarde,
decidiu terminar a sua faculdade.
Dee não podia guardar o sábado e
manter sua carreira militar, então decidiu fazer um mestrado em matemática.
Nessa época, nossas filhas nasceram e
meus planos educacionais foram postergados. Depois que nossa filha caçula
iniciou a pré-escola, Dee encorajou-me a
continuar meus estudos, cursando uma
disciplina de cada vez. Posteriormente,
completei o segundo bacharelado em
Educação.
■ A senhora tinha a intenção de ser professora de ciências naturais durante o resto
de sua carreira?
Sim, mas antes disso, enquanto vivíamos no Texas, Harold Coffin veio ao
Southwestern Adventist College apresentar um novo livro de ciências para o
ensino médio. O Dr. Coffin incentivoume a fazer doutorado em Geologia com
o precípuo objetivo de participar do
Geoscience Research Institute. No final,
esse sonho se tornou realidade.
ma em Suas mãos, e que compartilharia
minha fé abertamente. Eu não tinha a
intenção de fazer um evangelismo agressivo, mas coloquei um pôster cristão
na parede da minha salinha de estudos,
e tinha uma Bíblia e uma cópia do
Caminho a Cristo sobre minha mesa. A
porta estava sempre aberta para conversar com qualquer pessoa que o Espírito
de Deus me enviasse.
■ Que conselho a senhora tem para dar
aos estudantes adventistas que podem estar
enfrentando desafios à sua fé, seja sobre
a guarda do sábado ou outros assuntos
idelógicos?
Você não necessita ser um cristão
“fechado” para estudar numa universidade pública. Os piores erros que vi
foram cometidos por estudantes com
conhecimento limitado acerca de um
assunto, e que decidiram brigar com
um professor da universidade a fim
de “corrigi-lo”. Se a fé de alguém está
sendo desafiada, ele deve manter-se
firme, mas há várias maneiras de assim
proceder sem tentar humilhar um
professor em público. Se as emoções o
estão pressionando a reagir, retroceda e
ore para que o Espírito Santo o guie.
■ Sob a perspectiva de uma geóloga cristã, o que a convenceu de que os relatos
bíblicos da criação e do dilúvio (Gênesis
1-11) são válidos e factuais?
Em primeiro lugar, creio que a Bíblia
é a Palavra de Deus divinamente inspirada e que o relato bíblico é totalmente
■ Enquanto cursava seu doutorado, a
senhora provavelmente teve problemas com verdadeiro com respeito à história da
Terra. Creio, também, que a cronologia
o sábado nas pesquisas de campo programadas ou mesmo nos exames. Também teve curta da vida proposta por essa visão é
válida.
dificuldades em permanecer no programa
Segundo, vejo o catastrofismo escrito
doutoral porque era criacionista convicta?
Meus professores eram compreensivos sobre toda a superfície da Terra. Olho
com relação às minhas convicções sobre para as rochas pré-cambrianas, as mais
antigas na Terra, e penso no terceiro
o sábado, e um deles até me assegudia da semana da criação. Olho para
rou que eu poderia participar de uma
as montanhas e a mortandade em
pesquisa de campo obrigatória e ainda
massa e penso no dilúvio de Gênesis.
guardar o sábado. Era mais difícil ser
criacionista numa área de estudo domi- Paraconformidades, megasseqüências,
zonas de ruptura da crosta terrestre (o
nada pelo ensino evolucionista. Antes
sistema global de cadeias de fraturas)
de começar o doutorado, orei a Deus
dizendo que estava colocando esse diplo- e os surpreendentes depósitos globais
DIÁLOGO 16•2 2004
(sedimentos vermelhos, combustíveis
fósseis, calcários, argilitos negros, etc.),
provêem evidências de uma catástrofe
mundial extremamente complexa. Vejo
também o tempo nos registros rochosos
e isso reforça meus conceitos referentes
à complexidade do evento.
Terceiro, sei que o tempo é o fator
crucial nessas discussões. Os longos
períodos do modelo padrão da história
da Terra focalizam-se mais e mais entre
as camadas rochosas, não nas próprias
rochas.
E por último, existem coisas das quais
nada sei e não consigo explicar. A mais
significativa delas é: Por que as seqüencias no registro rochoso e no registro
fóssil equiparam-se pelo mundo
inteiro? Tenho muitas idéias acerca da
questão, mas não possuo respostas cientificamente aceitáveis. Acredito que é
preciso um time de pesquisadores para
se chegar a uma conclusão.
■ Trabalhar para a Igreja Adventista
do Sétimo Dia afeta seu trabalho como
geóloga?
Definitivamente! A Igreja tem apoiado minha pesquisa com fundos e incentivos. Os líderes denominacionais nunca
me disseram o quê ou onde pesquisar,
nem que conclusões devo obter. Minha
perspectiva teológica suscita questões
que não seriam consideradas em nenhuma outra instituição, mas aqui, no
Geoscience Research Institute, sinto-me
livre para buscar as respostas. Creio,
conseqüentemente, que minha pesquisa
contribui para o conhecimento científico e a missão da Igreja.
Entrevista concedida a
Kathy Ching
Kathy Ching é editora de publicações
e gráficos do Geoscience Research
Institute. A Dra. Elaine Kennedy pode
ser contatada através do Geoscience
Research Institute; 11060 Campus
Street; Loma Linda, Califórnia 92350;
EUA. Email: [email protected].
21
PONTO DE VISTA
Apaixonado
A mesma história
pela Paixão
contada de modo
Samuele Bacchiocchi
diferente
A Paixão de Cristo, filme de Mel Gibson, despertou profundas emoções e apaixonadas controvérsias. Para alguns o filme
tornou-se a pedra de toque da ortodoxia que separa as “ovelhas” dos “bodes”. Contudo, uma separação mais realística
ocorre entre expectadores emocionais e racionais, e a maioria
cai na primeira categoria. As emoções geradas impedem uma
avaliação racional do filme, especialmente pelos expectadores
não familiarizados com os erros bíblicos e históricos sutilmente entremeados no filme.
De uma perspectiva cinematográfica, o filme é uma extraordinária realização artística. Os personagens parecem reais.
Os judeus, os soldados romanos, Pilatos, sua esposa, e os discípulos, todos usando vestuário do tempo que representam.
Maria é uma exceção, parecendo mais uma freira medieval
do que uma mulher judia do primeiro século. Jim Caviezel,
que interpreta Cristo, transpira suor e sangue e aparece com
um olho permanentemente fechado na maior parte do filme,
depois de brutalmente espancado pelos soldados durante Seu
aprisionamento. A cena da flagelação, rodada em câmara
lenta, é acompanhada por suave canto gregoriano e desperta
profundas respostas emocionais.
Apesar das magníficas qualidades artísticas, A Paixão apresenta sérios problemas bíblicos e teológicos. O filme está
repleto de elementos não bíblicos, tais como as freqüentes
aparições de Satanás como uma encapuzada e andrógina figura; Maria Madalena suplicando aos soldados romanos para
ajudarem a Jesus; Judas forçado ao suicídio por crianças possuídas de demônios; a esposa de Pilatos oferecendo lençóis a
Maria com os quais sepultar Jesus; a superposição de tomadas
do ensangüentado corpo de Cristo com cenas da última ceia,
para advogar a idéia de como a eucaristia é realmente o corpo
e o sangue de Cristo; e o terremoto final que divide o templo
em dois.
Em adição a essas e outras cenas, cristãos crentes na Bíblia
discordam vigorosamente de vários conceitos teológicos que
refletem as convicções religiosas de Gibson, mas que são contrárias aos claros ensinos das Escrituras. Três desses merecem
nossa atenção.
O proeminente papel de Maria
Gibson retrata Maria através das 14 situações da cruz,
como uma parceira de Cristo na redenção humana. Depois
de sua negação, Pedro cai aos pés de Maria chamando-a de
Continua na primeira coluna da página 23.
22
Alberto R. Treiyer
A Paixão de Cristo de Mel Gibson é a mesma história contada de forma diferente. Nossas reações poderão variar, portanto, de acordo com a perspectiva de cada um. Enquanto alguns
judeus se opõem ao filme por interpretá-lo como anti-semita,
os países islâmicos permitiram sua exibição depois de se inteirarem da reação judaica. Algumas autoridades seculares presumiram que o filme exalta a violência, sem entender o pano de
fundo da cruz. Há cristãos que rasgam suas vestes por aquilo
que Gibson acrescentou ao relato dos evangelhos. A maioria,
entretanto, mostra-se impressionada com a mensagem do
filme. A imprensa tem noticiado conversões surpreendentes
como resultado da assistência de A Paixão.
Valor missionário
Muitas congregações adventistas na América do Sul têm
distribuído livros sobre a vida de Cristo nas cercanias dos
cinemas onde o filme é exibido. Um livro especial por título A
Paixão dos Séculos foi publicado nos Estados Unidos, contendo
os últimos 14 capítulos do livro O Desejado de Todas as Nações,
de Ellen White. O filme logo estará disponível em vídeos e
DVDs, o que permitirá seu uso com propósitos missionários e
em encontros evangelísticos.
Alguns filmes anteriormente produzidos apresentavam Jesus
como mal-humorado diante dos Seus oponentes, ou demasiado afável para com o povo. Apesar de tudo, alguns pastores
têm exibido esses filmes em minhas cruzadas evangelísticas,
a fim de preparar o povo para ouvir a mensagem da Bíblia.
Após a apresentação do filme, costumo dizer que os atores,
bem como nós mesmos como cristãos, não podemos representar condignamente o perfeito caráter do Filho de Deus.
O que excluir?
Cansei-me de ver Maria tantas vezes no filme, embora seu
papel não tenha desagradado minha esposa. Concordamos,
contudo, que seria melhor eliminar como sem sentido a cena
em que ela limpa o sangue do seu Filho que havia caído sobre
o pavimento, com um manto que a esposa de Pilatos lhe dera.
Não podemos ignorar, por outro lado, que os Evangelhos contam que Maria seguiu seu Filho até a cruz, juntamente com
outras mulheres fiéis.
Continua na segunda coluna da página 23.
DIÁLOGO 16•2 2004
“mãe” e implorando-lhe perdão. Na cruz, Maria profere as
palavras: “Deixe-me morrer com você.”
Numa entrevista, Jim Caviezel, que faz o papel de Cristo
no filme, disse: “Esse filme é algo que, creio, foi feito por
Maria para o seu Filho. Maria sempre me indicou a direção da verdade... Ela arquitetou toda essa coisa,”(National
Catholic Register, 30 de janeiro de 2004).
Gibson expressa sua admiração a respeito de como os evangélicos estão aceitando A Paixão, “Embora o filme seja tão
Mariano’” (Christianity Today, março de 2004). Pessoalmente
estou impressionado em como alguns adventistas estão reconsiderando o papel de Maria em nossa salvação.
Salvação através do sofrimento de Cristo
O foco central de A Paixão é um incansável bater, flagelar
e dilacerar a carne de Cristo, até ser Ele crucificado. Não há
nenhuma dúvida que a crucifixão era brutal. Mas Gibson
submete Cristo a um tipo de punição que mataria qualquer
super-homem três vezes antes da execução. Por quê? A resposta é encontrada na crença de Gibson sobre salvação através do
intenso sofrimento de Cristo.
De acordo com essa crença, ensinada pelos místicos católicos como Anne Emmerich, que foi a maior fonte do filme,
Cristo tinha que sofrer em Seu corpo e mente a punição
equivalente a todos os pecados da humanidade, a fim de satisfazer as demandas da justiça divina. Essa compreensão sádica
de Deus é completamente estranha às Escrituras, e O transforma num Ser que inspira medo em lugar de amor.
A missa como reencenação do sacrifício de Cristo
O filme de Gibson projeta o sacrifício de Cristo como
tendo lugar em menor escala na celebração da missa. O
roteiro de A Paixão foi especificamente escrito para enfatizar a relação entre o sofrimento e a morte de Cristo com a
celebração da missa. A intenção de Gibson foi mostrar que o
sacrifício de Cristo e a missa são a mesma coisa.
A crença católico-romana de que Cristo pode ser sacrificado inúmeras vezes, e de que benefícios são acumulados cada
vez que essa redenção se repete, está em contradição com
aquilo que as Escrituras ensinam: “Isto fez Ele, uma vez por
todas” (Hebreus 7:27). Os protestantes têm rejeitado historicamente como “abominável” a idéia de que o sacerdote, no
altar, tem poder para sacrificar Cristo repetidas vezes. Mas
a ampla aceitação de A Paixão por cristãos evangélicos diz
muito sobre como o abismo de separação entre o catolicismo
e o protestantismo está sendo estreitado, e como os protestantes estão sendo atraídos para o aprisco católico.
Samuele Bacchiocchi (Ph.D. pelo Seminário Pontifício de
Roma) ensinou teologia na Andrews University. Para uma
detalhada avaliação desse filme, acesse o site: http://www.
biblicalperspectives.com.
DIÁLOGO 16•2 2004
Alguns provavelmente acabem excluindo o diabo do filme.
Mas não é difícil imaginar que o diabo estava no Getsêmani,
acompanhado de seus demônios, tentando desencorajar o
Senhor. Em outras partes do filme, o diabo é representado
observando tudo o que ocorre. Eu excluiria a representação
dos demônios através de crianças ou anões que atormentam
Judas, e também a exposição final do diabo como um monstro enfurecido.
A brutalidade contra Jesus mostrada no filme pode perturbar algumas pessoas. Contudo, será que as autoridades trataram bondosamente o Senhor? Comoveu-me a dignidade que
o Filho de Deus revela sob a provocação e o abuso. Algumas
cenas adicionais de castigo quando o Senhor leva a cruz também podem ser eliminadas, já que não estão nos Evangelhos.
Mesmo assim, o livro O Desejado de Todas as Nações, uma biografia inspirada e autorizada, descreve a participação de alguns
soldados e do povo na zombaria e maus tratos, bem como a
interferência de outros romanos protegendo-O da multidão
que queria linchá-Lo em Seu caminho ao Calvário.
Mensagens teológicas
A Paixão representa adequadamente o amor do Filho de
Deus por seus piores inimigos. Condena implicitamente, por
outro lado, todo tipo de genocídio “cristão”.
A cena em que Jesus pisoteia a serpente, embora não literalmente bíblica, ressalta o triunfo de Cristo sobre Satanás
(ver Gên. 3:15; Apoc. 12:9). Contrariamente às ambições
políticas de sua igreja, Gibson mostra que o reino do Senhor
não é deste mundo. Também conduz-nos a enfrentar o sofrimento do Filho de Deus através do ponto de vista de Judas,
Pedro, Maria e da mulher pecadora, a qual, corretamente, é
identificada como Maria Madalena (ver O Desejado de Todas as
Nações, p. 568).
O que falta ao filme
Não podemos exigir que Gibson incluísse tudo o que gostaríamos de ver em seu filme. João escreveu o último Evangelho
precisamente porque sentiu que muitos eventos importantes
não haviam sido incluídos nos outros. Mas teve de admitir
que “nem mesmo no mundo inteiro haveria espaço suficiente
para os livros que seriam escritos” ( João 21:25 - NVI). Além
disso, as epístolas e o livro do Apocalipse foram necessários a
fim de explicar e projetar até o fim do mundo a história da
cruz. Contemos aos outros o que falta no filme de Gibson.
“A cruz de Cristo será a ciência e o canto dos remidos durante
toda a eternidade” (E. White, O Grande Conflito, p. 651).
Alberto R. Treiyer (D.S.R. pela Universidade de
Estrasburgo) é teólogo, evangelista e autor de vários
livros e artigos. Seu website: www.tagnet.org/distinctivemessages.
23
FÓRUM ABERTO
Devo beber vinho para
conservar minha saúde?
Há cerca de dez anos, em minha pré-adolescência, fiz uma promessa de não tomar
qualquer bebida contendo álcool. Até aqui
tenho mantido minha promessa e sem
arrependimentos. Recentemente, todavia,
tenho lido relatórios sobre os benefícios do
consumo regular de vinho para a saúde.
Por outro lado, alguns estudos contradizem
essas afirmações. Estou confuso. Beber
vinho é bom para a saúde?
Nossa sociedade é bombardeada pelo
conteúdo de mensagens veiculadas pela
mídia quanto aos benefícios do consumo do álcool para a saúde. Muitos
artigos da recente literatura científica
têm discutido os benefícios do álcool
em relação à saúde humana. Seria desonesto não reconhecer que pequenas
quantidades de álcool têm produzido
algum benefício quanto a doenças coronarianas. Isso tem sido demonstrado em
laboratório pela exposição das paredes
internas das células endoteliais ao álcool.
Algumas funções dessas células foram
melhoradas pelo álcool.
Entretanto, é importante lembrar
duas coisas. Primeira, essa evidência particular tem sido observada experimentalmente em culturas de células, mas a
vida não é vivida numa placa de Petri!
Segunda, nenhum benefício vascular
coronário se aplica às pessoas jovens.
Os indivíduos estudados são pessoas
inseridas nas faixas etárias entre a meia e
terceira idades, principalmente homens.
A maioria dos indivíduos apresenta
fatores de risco de doenças coronarianas.
Os estudos são observacionais e não
generalizados. Isso significa que eles não
foram elaborados para avaliar resultados
prospectivos (futuros), e dessa maneira
sua significância absoluta está aberta a
discussões.
24
Para contrabalançar o argumento em
relação ao benefício do uso de vinho
tinto, deve ser enfatizado que o suco não
fermentado de uva vermelha apresenta
benefícios significativos para a saúde.
Isso se explica pela presença de substâncias como resveratrol e flavonóides,
os quais agem como antioxidantes. Eles
diminuem o tempo de coagulação e
exercem efeito positivo sobre as células
endoteliais.
Existem muitos aspectos negativos
relacionados ao consumo do álcool.
Creio que todo esse debate pode ser
resumido nas palavras da seção editorial
de uma respeitada revista científica de
medicina: “As descobertas sobre o uso
do álcool em doenças cardiovasculares
ainda são correlativas, já seus efeitos
tóxicos são bem estabelecidos.” O álcool
é uma substância que causa alto grau de
dependência; 15% daqueles que consomem álcool irão tornar-se dependentes
problemáticos ou alcoólatras. O álcool é
a principal causa de retardamento mental evitável em muitos países, incluindo
os Estados Unidos. Isso por causa de
seus efeitos tóxicos sobre o feto durante
o período da gravidez.
O álcool é também a causa fundamental de mortes causadas por violência,
acidentes, traumas e doenças induzidas
por suas toxinas. Tem sido demonstrado que o álcool aumenta o risco de
vários tipos de câncer, incluindo o de
mama. Seu consumo excessivo aumenta
as chances de doenças hepáticas. Esses
efeitos colaterais indesejáveis produzidos pelo álcool raramente são citados,
em especial quando a imprensa veicula
informações sobre os chamados “benefícios do álcool” à saúde. Infelizmente,
a imprensa não trata das conseqüências
sociais, físicas e emocionais do consumo
do álcool.
Os alunos universitários são afetados
por problemas relacionados ao álcool?
Apresentaremos a seguir algumas convincentes estatísticas oriundas de um amplo
estudo realizado com alunos universitários
entre 18 e 24 anos, nos Estados Unidos.
Todos os problemas estão ligados ao uso
do álcool.
• 1.400 alunos morrem a cada ano.
• 500 mil alunos são vítimas de acidentes involuntários.
• 600 mil estudantes são assaltados por
outros alunos.
• 70 mil alunos, anualmente, são vítimas de relações sexuais e estupros
induzidos pelo álcool.
• 400 mil estudantes por ano tiveram
relações sexuais desprotegidos, e mais
de 100 mil estavam tão intoxicados
que não puderam dizer se haviam
consentido com isso.
• 2.1 milhões de alunos dirigiram automóveis sob a influência do álcool.
• 25% dos alunos universitários reconheceram os prejuízos do álcool
sobre sua vida acadêmica.
À luz desses fatos, não faz sentido e
nem há vantagem médica em substituir
uma doença (ou muitas) para obter uns
poucos benefícios para as coronárias. Isso
é particularmente verdade quando observamos as terapias preventivas já comprovadas, tais como o exercício físico, o
Continua na página 27.
Peter N. Landless – Estudou medicina
na Universidade de Witwatersrand,
Joanesburgo, África do Sul. Ele é
especialista em medicina familiar,
medicina interna e cardiologia, com
especificidade em cardiologia nuclear.
É também membro do American
College of Cardiology. Atualmente,
o Dr. Landless está servindo como
diretor-associado do Departamento
do Ministério da Saúde da Associação
Geral da IASD. Seu endereço é:
12501, Old Columbia Pike; Silver
Spring, Maryland 20904; EUA.
DIÁLOGO 16•2 2004
VIDA NO CAMPUS
Como dar testemunho
aos seus amigos muçulmanos
Borge Schantz
Amor, respeito e amizade
podem fazer mais em favor
de uma troca genuína de
idéias, do que toda a lógica
e persuasão do mundo.
Testemunhar aos outros e mesmo
tentar convencê-los a aceitar os ensinos
da Bíblia e do Evangelho é privilégio
e responsabilidade de cada cristão.
Entretanto, o preconceito interfere
com freqüência em nossos relacionamentos com outras pessoas que pertencem a diferentes raças, que falam outra
língua, têm outra cor de pele ou crêem
noutra religião. Tal preconceito é
indigno do nome que portamos como
cristãos, e estorva tanto o relacionamento quanto o testemunho.
Como você, um estudante cristão,
pode relacionar-se com seus colegas
de classe e amigos muçulmanos ou
mesmo dar-lhes testemunho, evitando
o preconceito? A tarefa é delicada, sensível e muitas vezes mal compreendida.
Este artigo procura ser exato e fiel aos
princípios do Evangelho e da Grande
Comissão. Ele expõe princípios de
testemunho que revelam amor e zelo
pela pessoa a quem queremos alcançar.
Aqui estão alguns indicadores que irão
ajudá-lo a entender melhor seus amigos muçulmanos.
Conhecendo as contribuições do
Islã
Na Idade Média, num tempo em
que a Europa vivia em trevas espirituais e religiosas, os muçulmanos,
especialmente no mundo árabe, des-
DIÁLOGO 16•2 2004
frutavam uma era de desenvolvimento
em muitas áreas científicas. Os muçulmanos têm o direito de sentir orgulho
de suas conquistas, as quais reestimularam o progresso da ciência no mundo
ocidental. Isso inclui descobertas e
pesquisas em medicina, matemática,
geografia e astronomia. O zênite dessas
fantásticas explorações científicas ocorreu entre os anos 900 e 1200 a.D.
Os eruditos árabes e muçulmanos
desse tempo se associaram não apenas
a especialistas cristãos e judeus, mas
também a intelectuais chineses e persas. A disposição e a abertura para trabalharem juntos marcaram suas contribuições ao conhecimento em muitos
campos. Textos valiosos da literatura
grega que estavam em perigo de esquecimento, e mesmo perdidos na idade
das trevas européias, foram traduzidos
para o árabe e preservados. A língua
árabe tornou-se a língua franca para os
cientistas que trabalhavam juntos em
Bagdá, Cairo e Córdoba.
Entretanto, ao final do século 13,
essa era dourada de artes e ciências
começou a declinar. Muitas razões
poderiam ser listadas para explicar
esse retrocesso e declínio da civilização
árabe. Guerras perdidas, monopólio estatal com elevados impostos, e
decadência econômica, poderiam ser
responsabilizados por isso. Entretanto,
muitos sentem que a culpa está ligada
à ortodoxia islâmica, onde o Alcorão
foi interpretado de forma restritiva e a
ciência abarrotada de proibições religiosas.
Nesse período de decaimento da
civilização e ciência islâmicas, a Europa
vivenciava não apenas o movimento da
Reforma, mas também o renascimento
das artes e da ciência. Isso abriu um
novo mundo de conhecimento. Entre
outros fatores, a tradução dos textos
árabes ajudou a redescobrir suas tradições culturais.
Entendendo a situação
muçulmana atual
Os resultados desse desenvolvimento no mundo islâmico, ocorridos
séculos atrás, ainda repercutem nos
países muçulmanos. O General Pervez
Musharraf, presidente do Paquistão,
uma das mais poderosas nações muçulmanas, conclamou recentemente todo
o mundo muçulmano, com seus 1.2
bilhões de habitantes, a criar um fundo
multibilionário para promover a ciência e a tecnologia. Ele declarou que as
nações islâmicas têm aproximadamente
1/4 da população mundial e 70% de
todos os recursos energéticos globais.
Ainda assim, produzem menos de
1/5 em relação ao produto nacional
bruto do Japão, que tem apenas 1/10
da população do mundo islâmico. Ele
também chamou a atenção para o fato
de o Japão ter mais de 1.000 universidades, enquanto todo o mundo árabe
possui apenas 450.
Esteja ciente de que existem
“muçulmanos” e “muçulmanos”
Um lingüista alemão está propondo que a expressão “11 de setembro”
conste dos futuros dicionários. Os
eventos trágicos que atingiram os
Estados Unidos de uma forma tão
severa e direta têm provocado conseqüências negativas para todo o mundo.
Esses sinistros acontecimentos em
Nova Iorque e Washington, seguidos
por uma série de atos brutais, têm afe25
tado não apenas o mercado financeiro,
o turismo e a aviação, mas também as
relações entre muçulmanos e cristãos, e
entre muçulmanos e muçulmanos.
Alguns muçulmanos estão envergonhados por causa de tais eventos.
Alguns crêem que, até certo ponto, 11
de setembro e outros ataques são justificáveis. Num campus universitário, os
muçulmanos que defendem tais idéias
terão a tendência de se isolarem e interagirem socialmente apenas com outros
muçulmanos. Felizmente, muitos interagem livremente com seus colegas de
escola, desejosos de se familiarizarem
com eles, e algumas vezes até buscando
seu auxílio nos estudos.
Estudantes muçulmanos mantêm
várias posições na escala teológica islâmica. Essas orientações variam desde
a ortodoxa, onde os devotos tomam
literalmente as palavras do Alcorão e
seguem as tradições à risca, até os que
são apenas muçulmanos nominais, os
quais abandonaram a maior parte das
crenças e práticas muçulmanas.
Entretanto, é óbvio que pode não
existir nenhum padrão metodológico
para o testemunho cristão aos muçulmanos. Há, todavia, alguns princípios
elementares que podem ajudá-lo nos
relacionamentos com amigos muçulmanos da faculdade ou universidade,
onde eles sentem ansiedade pelo fato
de serem a minoria.
Seja um amigo compreensivo
Os alunos muçulmanos se acham
num estado de transição, pelo menos
no início de sua estada num país
estrangeiro. Estão apartados das rotinas
diárias comuns ao ambiente muçulmano. A vida numa sociedade permissiva, com seu estilo de vida liberal e
variadas liberdades, nem sempre é fácil
de ser vivenciada por uma pessoa que
procede de um país muçulmano, com
muitas regras a controlar a vida pública
e privada. Essa nova experiência os
coloca em posição de alerta, criando
neles até certa desconfiança. Mas eles
estão abertos a idéias de novos amigos,
especialmente quando esses os ajudam
26
a enfrentar novos desafios.
A amizade genuína é a condição
mais importante para se estabelecer um
relacionamento confiável e amistoso
com seus amigos muçulmanos. É de
suma importância que a confiança e a
compreensão mútuas sirvam de base
para a comunicação eficaz. Essa amizade pode ser expressa mediante favores,
prestação de de ajuda ou palavras bondosas.
Um estudante muçulmano que é
novo num país estrangeiro pode necessitar de ajuda de várias maneiras. Ele
pode ter problemas lingüísticos com
relação à compreensão das aulas ou
em expressar na nova língua o que
foi ensinado em classe. Os estudantes
muçulmanos podem precisar de auxílio
ao tentarem explicar à equipe da lanchonete a dieta especial que seguem.
A hospitalidade é de extrema importância no Islã. Para um aluno muçulmano, um convite é uma positiva
afirmação de amizade. Em tais casos,
a dieta especial dos muçulmanos deve
ser respeitada.
Antes de um diálogo significativo
e amistoso ser estabelecido com um
muçulmano, o respeito por sua religião
deve ser manifesto. É imperativo um
conhecimento elementar do Islã como
religião, de seu sistema de crenças,
rituais, regras e regulamentos. Obter
informação relacionada com sua terra
natal é também um dever.
Evite duas prováveis armadilhas
Não leva muito tempo para que uma
conversa com um amigo muçulmano
atinja o ponto de algumas comparações impróprias. Haverá tentações para
suscitar paralelos entre os fundadores
das duas religiões, Jesus e Maomé. Isso
conduzirá facilmente às comparações
entre a Bíblia e o Alcorão.
Para os cristãos, Jesus Cristo é o
Filho de Deus que Se tornou homem a
fim de trazer à humanidade a esperança de salvação. Para os muçulmanos,
Maomé foi um homem, chamado por
Alá para ser seu profeta (mensageiro ou
apóstolo). Cristo foi divino, Maomé
foi humano. A diferença desses conceitos pode ser assim resumida:
Na compreensão cristã, a Palavra de
Deus Se tornou carne quando Cristo
nasceu (João 1:14). A maioria dos
cristãos acredita que a Bíblia foi apenas
um caminho pelo qual Deus escolheu
comunicar-Se com a humanidade. Eles
crêem que o Espírito Santo inspirou
seres humanos pecaminosos e de linguagem imperfeita para serem portavozes divinos.
Desse modo, ao traçarmos um
paralelo, o perfeito no cristianismo —
Jesus Cristo — deveria ser comparado
com aquilo que os islâmicos consideram como perfeito —o Alcorão. Num
segundo nível, a Bíblia, expressão da
divina verdade em linguagem humana,
deveria ser comparada a Maomé, o
qual transmitiu as palavras de Alá em
língua árabe.
Outra armadilha a ser evitada é
quando a conversação se volta para
uma comparação entre as duas religiões. Aqui, tanto cristãos como
muçulmanos são inclinados a comparar aquilo que é ideal em sua religião
com aquilo que é praticado na outra
religião. Os muçulmanos irão discorrer
sobre os ideais islâmicos de completa
abstinência do álcool, em oposição ao
uso abusivo de bebidas alcoólicas pelos
cristãos. Eles irão chamar a atenção
para a forma frívola mediante a qual as
mulheres cristãs se vestem, e compará-la às vestimentas requeridas para as
mulheres muçulmanas (hijab), quando
se mostram em público.
Os cristãos irão chamar a atenção
para os terroristas e suicidas muçulmanos, comparando seus atos com os
princípios de comportamento conforme expressos nas Escrituras. Irão
salientar como as seitas muçulmanas
lutam entre si com armas letais, e falar
do que as mulheres islamitas sofrem na
educação, casamento e divórcio.
Em tais discussões, devemos empenhar-nos em comparar ideal com ideal.
Iremos então concordar que, a despeito
de ambas religiões diferirem consideravelmente em seus conceitos quanto
DIÁLOGO 16•2 2004
à divindade e à salvação, seus ensinamentos éticos e morais são de certo
modo parecidos.
Respeito às convenções
A grosso modo, pode-se afirmar que
o Islã é uma “religião de vergonha” e
que o cristianismo é uma “religião de
culpa”. Isso significa que numa discussão, muçulmanos (e nesse sentido
muitos cristãos também) não apreciam
ser ridicularizados. Nas culturas orientais isso não é apenas desagradável,
mas humilhante. Quando um diálogo
religioso entre um cristão e um muçulmano atinge um nível de confrontação
sobre assuntos doutrinários, é oportuno lembrar do antigo ditado: ganhar
na argumentação pode significar perder um amigo. Evite tal espécie de diálogo. Ao invés, construa uma amizade
sólida, onde cada um possa expressar
suas idéias e discutir suas convicções
religiosas sem ferir o outro.
É importante lembrar que discussões
conflitantes podem ser restringidas a
um nível de amizade mútua e pessoal.
A discussão de temas controvertidos
com um amigo na presença de outras
pessoas, cria um clima desagradável.
O que discutimos é tão importante
quanto a maneira como o fazemos.
A experiência tem-me ensinado que
sensibilidade e bondade devem caracterizar nosso diálogo com nossos amigos
muçulmanos. A jornada da fé deve
começar a partir da satisfação de uma
necessidade profunda, e não de uma
teologia pesada. Conduzir uma pessoa
para que reconheça sua condição pecaminosa e necessidade de um Salvador,
é mais importante do que iniciar um
debate sobre a Trindade, tema que a
maioria dos cristãos instruídos acha
difícil de ser entendido a fundo.
Além do mais:
1. Lembre-se de que há mais semelhanças do que diferenças entre as
culturas do nosso mundo. Interesse,
honestidade e amor serão úteis para a
superação de obstáculos difíceis numa
atmosfera intercultural de testemunho
DIÁLOGO 16•2 2004
cristão. Se você atender às regras de
um comportamento aceitável, concluirá que o amor e o respeito mútuo servirão como elementos reconciliadores
de divergências culturais.
2. Respeito à privacidade. Inicie
seu testemunho com uma pessoa em
particular. Seu amigo muçulmano não
se sentirá livre ou à vontade em uma
reunião ou conversa em público.
3. Ensine de forma simples, rápida
e objetiva. Parta do conhecido para o
desconhecido. Para os muçulmanos,
sua fé não significa apenas crenças.
É também uma questão de rituais.
Freqüentemente eles enfatizam mais os
ritos do que as doutrinas.
4. Lembre-se de que ao testemunhar
para muçulmanos, a paciência dos santos não é apenas uma frase bíblica. É
uma metodologia.
5. Aproveite cada oportunidade. Por
anos, igrejas e agências missionárias
têm buscado levar o Evangelho aos
muçulmanos em seus países de origem.
Agora eles são nossos vizinhos, pelo
menos no Ocidente. Eles estudam
conosco, trabalham conosco e fazem
compras conosco. Não deveríamos
conquistar a amizade deles e, como
amigos, termos algo importante a
compartilhar?
Borge Schantz (Ph.D. pela Fuller
University) escreveu este artigo
em sua casa, na Dinamarca, onde
desfruta a aposentadoria ao lado da
esposa Íris. Após uma longa carreira
como pastor, evangelista, administrador e chefe do Departamento
de Teologia do Newbold College,
ele fundou o Centro Adventista do
Sétimo Dia de Estudos Islâmicos
e é o autor do livro O Islã após
11/9 (Alma Park, Grantham, Lincs.,
England: Atumn House, 2003). Seu
e-mail: [email protected]
Vinho…
Continuação da página 24.
abandono do cigarro, a diminuição dos
níveis de colesterol e a manutenção normal da pressão sanguínea, os quais não
apresentam quaisquer efeitos indesejáveis
do álcool.
Espero que você esteja mais determinado que nunca em permanecer fiel à
sua decisão de não ingerir bebidas alcoólicas. Deus o abençoe e o fortaleça em
sua decisão.
REFERÊNCIAS
1. T. Wallerath, D. Poleo, Li Huige, et al., “Red
Wine Inveases the Expression of Human
Endothelial Nitric Oxide Synthase,” Journal of
the American College of Cardiology, 41(2003),
3:471-478.
2. L. Fremont, “Biological Effects of Resveratrol,”
Life Science, 14 de janeiro de 2000, pp. 663673; M. Serafini, G. Maini, and A. FervoLuzzi, “Alcohol-free Red Wine Enhances
Plasma Antioxidant Capacity in Humans,”
Journal of Nutrition 128(6):1003-1007.
3. J. Goldberg, “To Drink or Not to Drink?” New
England Journal of Medicine 348:2 (9 de janeiro
de 2003), p. 164.
4. W. Hingson, T. Heeren, R. C. Zakocs, et al.,
“Magnitude of Alcohol-Related Mortality and
Morbidity Among U.S. College Students Ages
18-24,” Journal of Studies on Alcohol, 63:2,
março de 2002.
5. Goldberg, p. 164.
Atenção,
profissionais
adventistas!
Se você possui e-mail e um título
ou diploma pós-secundário em qualquer campo acadêmico ou profissional,
nós o convidamos para fazer parte da
Rede de Profissionais Adventistas (RPA).
Patrocinado pela Igreja Adventista, esse
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diretamente no website da RPA: http://
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27
LIVROS
The Essential Jesus:
The Man, His Message,
His Mission,
de Bryan W. Ball e William G.
Johnsson, editores (Nampa,
Idaho: Pacific Press Publ.
Assn.; Warburton, Austrália:
Signs Publ. Co., 2002; 299
pp.; brochura).
Resenha de Roberto
Badenas
Quem é Jesus? Foi Ele realmente uma figura histórica
ou um mito religioso? Podemos acreditar nos registros dos
Evangelhos que nos dizem quem era Ele, o que fez e ensinou?
Ou esses registros e o testemunho de outros escritos do Novo
Testamento são uma criação fictícia de entusiastas fanáticos,
que queriam criar uma sociedade dinamicamente diferente da
dominante comunidade judaica de então? É o Jesus da fé diferente do Jesus da história?
Essas questões permaneceram como um colosso, mirando os
corredores da história, desafiando as mentes mais imaginativas
dos críticos acadêmicos, de gigantes da fé e, algumas vezes, de
simples crentes. O livro The Essential Jesus provê algumas respostas. Os editores, bem treinados na complexa arte da ciência
teológica e profundamente comprometidos com a fé entregue
aos santos, supriram-nos de uma celebração da fé sem diluir
os elementos essenciais da erudição. Doze acadêmicos adventistas bem conhecidos ajudam-nos a conhecer o Jesus essencial,
Sua mensagem e missão.
A obra se inicia substanciando as evidências históricas de
que a influência de Jesus sempre tem conduzido a um viver
nobre. Se há alguma influência negativa do cristianismo,
ela não procede do próprio Jesus, mas daqueles que tomam
Seu nome em vão. Uma série de argumentos, solidamente
documentados pela história e a arqueologia, demonstram a
fidedignidade do “Jesus Histórico”. Dois fatos, incontestáveis
e irrefutáveis, confrontam tanto o historiador como o pesquisador religioso: o mistério da tumba vazia e o surgimento da
religião cristã (p. 30).
O livro trata adequadamente de assuntos complexos relacionados à Cristologia: o ministério do Messias profetizado
no Velho Testamento, a pré-existência, a encarnação, o nascimento virginal de Jesus Cristo, e o mistério de ser totalmente
humano e totalmente divino. O mesmo pode ser dito dos
temas intrigantes de soteriologia, como o propósito da cruz, o
28
significado salvífico da morte de Jesus, as teorias de expiação, o
significado da morte sacrifical e do sacrifício substitutivo, e as
implicações teológicas da expiação e propiciação.
Dois estudos bem práticos refletem a relevância de Jesus
para nossa vida pessoal, e apresentam reflexões instigantes
sobre a importância de seguirmos a Jesus e modelarmos nossa
vida, valores e ética, de acordo com o que Ele fez e disse
durante Sua vida terrestre. O livro examina também o ministério de Cristo como Sumo Sacerdote e a Sua segunda vinda
através de uma perspectiva adventista tradicional. A missão do
Evangelho confiada por Jesus aos Seus discípulos é apresentada
de modo tão contemporâneo, que surge como um desafio aos
leitores para testemunharem de Jesus numa sociedade secular e
materialista, através de um estilo de vida persuasivo, um envolvimento social responsável e um evangelismo efetivo.
E nesse processo, o livro convida os leitores a escreverem o
“quinto evangelho”, revelando e vivendo a história de Jesus
em sua vida individual (p. 230). Quando assim fizermos, o
mistério e o enigma teológico — quem é Jesus? — darão lugar
a uma evidente afirmação de que Jesus é o nosso Salvador,
Amigo e Senhor que em breve voltará.
Recomendo enfaticamente aos leitores da revista Diálogo
que não deixem de ler esse excelente livro que confirma nossa
fé.
Roberto Badenas (Th.D. pela Andrews University) é o
Diretor de Educação e representante da Diálogo para a
Divisão Euro-Africana em Berna, Suíça.
A Search for Identity:
The Development of
Seventh-day Adventist
Beliefs,
de George R. Knight.
(Hagerstown, Maryland:
Review and Herald Publ.
2002; 223 pp., brochura).
Resenha de Jean-Luc
Rolland
George Knight é um conhecido autor e eminente historiador, cujos dons acadêmicos se destacam por seu amor à
Bíblia e ao adventismo. Como professor de História da Igreja
na Andrews University, o Dr. Knight é talvez o mais prolífico
autor do adventismo contemporâneo. Seus livros cobrem áreas
que vão desde a Filosofia da Educação à busca pela compresão
DIÁLOGO 16•2 2004
dos escritos de Ellen White, passando também por diversos
livros do Novo Testamento, para definir a história do adventismo em termos de sua singularidade, promessas e desafios.
Como historiador, é incansável pesquisador da verdade e das
origens, onde aplica as mais criteriosas ferramentas para descobrir a ambas dentro do contexto do desenvolvimento da Igreja
Adventista do Sétimo Dia.
Três de suas obras sobre a história do adventismo revelam-nos sua grande apreciação pela herança adventista. A
primeira, A Brief History of Seventh-day Adventists. A segunda,
Organizing to Beat the Devil: The Development of Adventist
Church Structure.
A terceira, A Search for Identity: The Development of Seventhday Adventist Beliefs, coloca o autor numa posição de destaque
quanto ao conhecimento da história adventista. Essa obra
não é apenas sobre história, mas também sobre a história do
pensamento adventista. O autor nos leva a uma viagem pelos
limites do adventismo — suas raízes e maturidade, suas dificuldades e oscilações, e o complexo caminho do desenvolvimento doutrinário.
O processo estabelece uma longa busca pelo esclarecimento
por parte dos estudiosos adventistas. Como a crença adventista
se relaciona com a identidade adventista? São elas parceiras
inseparáveis? Ou pode uma existir sem a outra? Ao tentar levar
o leitor através da fascinante jornada da compreensão desses
assuntos, Knight dá-nos muito mais: uma deslumbrante descrição histórica, intercalada com histórias atrativas, retratos da
capacidade e desafios de nossos pioneiros, e um chamado à
geração presente para descobrir e permanecer fiel à nossa identidade religiosa.
Como os adventistas vieram a crer naquilo que advogam?
Na obra A Search for Identity, o Prof. Knight não se atém apenas a temas polêmicos da teologia, mas mostra também como
podemos manter um equilíbrio entre os pilares de nossa fé e
o desenvolvimento, o progresso, o crescimento e as mudanças nessa fé. As controvérsias apresentadas por Knight são os
temas da inspiração e revelação, a teoria da porta fechada, o
legalismo da época de 1888, a Trindade, o panteísmo, o fundamentalismo e perfeccionismo. A discussão revela claramente
que a resistência ao desenvolvimento parece ser nossos reflexos
e virtude mais naturais, especialmente num mundo que está
altamente desejoso de mudanças.
Entretanto, o Dr. Knight não é um pessimista. Ele encontra
diversos motivos para ser otimista e revela tal esperança no
preâmbulo da declaração das “Crenças Fundamentais da Igreja
Adventista do Sétimo Dia”, feita na década de 1980. Essa
declaração enfatiza que não estamos ligados a qualquer sistema
de crenças humanas, mas olhamos para “a Bíblia como [nossa]
única crença.” Conquanto tal ênfase na Bíblia nos tenha dado
“certas crenças fundamentais”, ela também nos desafia a um
humilde reconhecimento de que essas crenças constituem a
“compreensão e a expressão de nossa Igreja” e não um e-mail
do Céu. Essa posição sugere que se pode esperar uma possíDIÁLOGO 16•2 2004
vel revisão dessas crenças. Segundo o Dr. Knight, tal postura
revela a herança e o espírito de nossos pioneiros para permanecerem abertos à voz do Espírito, a fim de aperfeiçoarem sua
relação com Deus.
Até certo ponto, esse livro é mais do que um trabalho histórico e teológico. Ele tem a ver com a espiritualidade e nos
desafia a permanecermos abertos ao Espírito de Deus, e ser
receptivos à promessa de que “Ele nos guiaria em toda a verdade”. Acadêmico e de fácil leitura, a obra deve ser lida por todo
aquele que deseja conhecer o desenvolvimento do pensamento
adventista, e compreender o espírito de alguns de seus fundadores em relação à sua própria existência.
Jean-Luc Rolland é professor na Salève Adventist
University e diretor do Centro de Pesquisas Ellen G.
White na França. Atualmente está fazendo o doutorado na Universidade Protestante de Montepellier. Email:
[email protected].
Grace at 30,000 Feet
and Other Unexpected
Places,
de Kent Hansen
(Hagerstown, Maryland:
Review and Herald Publ.
Assn., 2002; 189 pp.;
brochura).
Resenha de Sylvia Rasi
Gregorutti
Uma agitada semana de trabalho está à sua frente. O desconhecido, o estresse e a azáfama parecem acenar para você.
Você sabe disso. Você sabe que seus amigos enfrentarão o
mesmo. Por que não partilhar um pensamento, uma mensagem com eles para ajudá-los a enfrentar o que está adiante e,
nesse processo, ajudar a si mesmo? Graça, livre graça de Deus,
é suficientemente poderosa para ajudar. Assim começou o
ministério singular de Kent Hansen. Ele decidiu enviar via
e-mail para o trabalho de seus amigos, cada semana, simples
mensagens sobre a graça. O resultado foi esse inspirador,
mas coloquial livro, compartilhando o amor de Deus com as
outras pessoas. Agora, com o quinto aniversário da “Palavra de
Graça” se aproximando, a mensagem de esperança atinge mais
de três mil pessoas em variados locais de trabalho: escritórios
Continua na página 32.
29
PRIMEIRA PESSOA
Retornando de uma terra distante ao lar
Barry Gane
Devo a minha ligação com a Igreja
ao amor incondicional de pais cristãos piedosos e aos membros de
minha igreja, que viram em mim um
potencial que somente Deus poderia
realmente ter revelado. Logo após
meu aniversário de 17 anos, decidi
finalmente ser batizado. Por ocasião do
meu batismo, eu esperava que a raiva,
os questionamentos e a inquietação
cessariam — que as coisas mudariam e
que eu mudaria. No entanto, algumas
semanas após o batismo, envolvi-me
ainda mais com um grupo de amigos
que pensava ter deixado para trás. A
gangue de motoqueiros parecia atrairme mais do que nunca. Com meus
últimos anos de ensino médio pela
frente, decidi passar menos tempo na
escola e mais tempo com os motoqueiros. Freqüentemente deixava minha
casa e dizia a meus pais que nunca
mais voltaria. Em vez de ficarem irados, eles simplesmente diziam que a
porta estaria sempre aberta.
Eu era totalmente egocêntrico,
ficava irado com as pessoas sem qualquer razão. Havia apenas uma pessoa
importante em minha vida, além de
mim mesmo; era minha namorada.
Mas, finalmente, terminamos o namoro e decidi começar uma vida completamente nova noutro Estado. Parti
rumo ao oeste com apenas alguns dólares no bolso, uma muda de roupas e
um saco de dormir, dizendo para mim
mesmo: “Qualquer lugar é melhor do
que aqui!” Eu tinha dois amigos que
sentiam a mesma coisa, e então se juntaram a mim na aventura.
Cansados de dormir no chão e
famintos como leões, chegamos a
Adelaide, a 2000 km de casa. Um
dos colegas tentou entrar em contato
com alguns amigos dali, mas eles não
estavam em casa. De qualquer maneira, decidimos “visitá-los”. Foi uma
30
casa fácil de arrombar. Pensamos em
ficar ali até seus legítimos ocupantes
voltarem para casa, ou até os vizinhos
chamarem a polícia. Mas o proprietário da casa era um pastor, e os vizinhos
deviam estar acostumados a ver garotos
por ali.
Comemos o que tinha na geladeira,
mas não dormimos nas camas da família. Depois de alguns dias dormindo
no chão, eu estava disposto a tentar
dormir em algo diferente. Encontrei
um velho colchão no quintal e o arrastei para dentro. Cheirava mal, mas ao
menos seria mais macio que o chão.
Quando voltei à casa nas primeiras
horas da manhã seguinte, estendi meu
saco de dormir sobre aquele colchão e
cai num sono profundo. Mas quando
acordei, descobri minha insensatez:
o colchão estava infestado de pulgas.
Obviamente algum animal usou esse
colchão antes de mim! Eu tinha picadas em todo o corpo e me arranhava
de tanto coçar. Havia tantas pulgas que
o piso parecia mover-se.
Comecei a sentir saudades de casa
e decidi que era hora de retornar.
Levei 48 horas, de carona, para chegar
em casa. Estava com uma forte gripe
quando lá cheguei. Sentia-me exausto
e não me havia alimentado bem por
várias semanas. Embora não tivesse
dormido por algumas noites, a primeira coisa que fiz foi telefonar para
a minha namorada e perguntar-lhe se
queria sair comigo aquela noite.
— Pensei que nunca voltaria, disse
ela.
— Bem, aqui estou. Você quer sair
comigo ou não?
— O.K.!
Eu pedi a picape de meu pai emprestada e algum dinheiro e saí para apanhá-la. Fomos a uma praia deserta e
ficamos conversando por várias horas.
Finalmente, de madrugada, voltamos
para casa. Não muito tempo depois de
deixar a praia, descobri que a gasolina
estava acabando. Parei a picape, enchi
o tanque e então comecei a procurar
desesperadamente minha carteira. Após
uma busca ansiosa, entrei no posto
e informei o caixa que tinha perdido
minha carteira.
— Ouço essa história toda noite.
Fique aí mesmo que vou chamar a polícia, ele disse.
Decidi que iria apagar as luzes e fugiria, esperando que ele não tivesse tempo
de anotar o número da placa. Mas o
bom senso prevaleceu. Sugeri: “Por que
você não telefona para o meu pai?” Ele
fez isso e se convenceu de que o meu pai
pagaria pelo combustível. A última coisa
que me disse foi: “Seu pai parece ser um
homem decente. Não sei onde ele arranjou você!”
Antes que o funcionário do posto
concluísse a ligação, agarrei o telefone
e falei com meu pai manifestando uma
consideração fora do comum: “Pai, vá
para a cama. Não espere por mim; estou
indo para casa. Eu apenas vou voltar à
praia para tentar encontrar minha carteira”.
Quando liguei o carro, murmurei
uma oração simples e não muito reverente: “Deus, eu quero a carteira, certo?”
Não houve “Querido Pai” ou “Amém”,
mas apenas uma exigência. Retornamos
à praia e voltamos pelo mesmo caminho
até chegarmos onde tínhamos ficado a
maior parte do tempo. Comecei a passar
minhas mãos pela areia e rapidamente
encontrei minha carteira. Um golpe de
sorte!
No caminho para casa, estava quase
cedendo ao sono. Olhando o velocímetro e hipnotizado por ele, percebi várias
vezes que estava saindo para o acostamento. Supliquei à minha namorada
que conversasse comigo, mas naquela
altura ela também estava exausta e, deiDIÁLOGO 16•2 2004
tando-se no banco, colocou sua cabeça
em meu colo e mergulhou num sono
profundo. Liguei o rádio no volume
máximo, abri a janela, cantei a plenos
pulmões e continuei dirigindo até que
houve um estrondoso BANG. Quando
recuperei a consciência, vi faíscas saltitando no capô do carro. Olhei para
baixo e vi minha namorada coberta de
sangue. O motor atravessou a parede
de proteção da cabine e foi parar no
banco, parecendo prensar seu corpo.
Eu não podia sair pela minha porta e
não conseguia abrir a porta do lado
dela. Mas, finalmente, deitando por
cima de seu corpo, chutei repetidas
vezes a janela até quebrá-la. Deslizando
através da janela, caí na estrada.
Lutando para ficar em pé, segurei-a
pelos pés, arrastei-a para o calçamento
e deixei-a longe das ferragens.
As pessoas começaram a sair de suas
casas. Não havia luz elétrica, somente
lanternas. Eu tinha batido contra um
poste elétrico e cortei a eletricidade
de toda a área. Uma das mulheres que
chegou ao local era alguém que eu
conhecia, uma enfermeira do hospital
adventista local. Enquanto estava deitado ali no chão com a cabeça, braços
e joelhos sangrando, olhei e percebi
que minha namorada não se havia
mexido desde que a tirei das ferragens.
Em desespero comecei a perguntar: “A
Shirley está bem?” “A minha namorada
está bem?” Alguém me garantiu que
ela iria ficar bem. Então as pessoas
me tiraram dali, apoiaram-me numa
árvore e me disseram para colocar meu
polegar no lado da cabeça e pressionar
meu joelho para deter o sangramento.
Eu havia cortado artérias em ambos os
lugares. Enquanto observava, alguém
trouxe um cobertor e cobriu o corpo
aparentemente sem vida de minha
namorada, estendido ali no chão.
Comecei a orar pela segunda vez
naquela noite — uma oração de absoluto desespero. Dessa vez, comecei do
modo tradicional: “Querido Deus...”
Pressenti, completamente desesperado, que havia matado a única pessoa
com quem me preocupava, além de
DIÁLOGO 16•2 2004
mim mesmo. Comecei a pleitear com
Deus, mas nada aconteceu. A ambulância chegou, os atendentes colocaram Shirley na viatura e me puseram
sentado ao seu lado. Na escuridão,
minha oração era ainda mais fervente: “Querido Deus, se Tu a poupares,
então eu me entregarei a Ti.” Que
grande negócio eu estava oferecendo
a Deus! Olhando o passado, eu mal
podia crer que Ele estivesse interessado em minha proposta. No entanto,
quando terminei de orar, ouvi um
grito agudo horrível, do tipo que só
as garotas conseguem fazer. Isso fez
meu cabelo ficar em pé; mas era maravilhoso. Muito embora Shirley ainda
não tivesse recobrado a consciência,
eu sabia que ela estava viva. Murmurei
rapidamente uma outra oração:
“Obrigado, Senhor”.
Quando chegamos ao hospital,
os atendentes da sala de emergência
começaram a tirar minha roupa e
raspar-me o cabelo do lado da cabeça. Quase perdi uma orelha e minha
perna estava muito ferida. Antes de
começar os curativos, meu pai entrou
na sala. Fiquei curioso em saber quem
lhe disse onde me encontrar. Ele perguntou se eu e a Shirley ficaríamos
bem. Os cirurgiões garantiram-lhe que
não havia risco de vida, ainda que ela
estivesse inconsciente. E, então, para o
meu constrangimento, ele perguntou
se podia orar. Senti-me muito incomodado, mas enquanto ele orava, percebi
algo mudando em mim.
Mais tarde, descobri o que meu
pai tinha feito naquela noite.
Normalmente, quando eu saía à noite,
ele não dormia até eu chegar. Isso significava muitas horas sem dormir. Mas,
aquela noite, meu pai foi dormir. Ele
acordou de repente, logo após as duas
da manhã, ajoelhou-se e, pela segunda
vez naquela noite, orou pelo seu filho
que estava fora em algum lugar. Ele
tentou acender a luz e percebeu que
não havia eletricidade. Então, foi até
a cozinha e viu que o relógio elétrico
tinha parado no exato momento em
que havia acordado. Ele despertou
minha mãe e ambos saíram à minha
procura. Quando passou pela picape
batida contra o poste, a apenas uns 16
km de casa, foi direto para o hospital
chegando pouco depois de nós.
Algumas semanas após o acidente,
minha namorada estava quase que
completamente recuperada, apenas
com umas poucas cicatrizes. Recebi
alta do hospital logo depois. A experiência desse acidente foi transformadora
para mim, mas não voltei à igreja. Até
então eu não me havia entregue a Jesus
como Salvador e não O reconhecia
como Senhor. Ainda havia um longo
caminho a percorrer.
Um sábado, depois que voltei para
casa, minha família foi à igreja e deixou um recado convidando-me para
me juntar a eles. Enquanto eu rastejava
debaixo de um velho carro que estava
consertando, veio-me à mente o fato
de que eu ainda não tinha cumprido
minha promessa com Deus. O primeiro passo, pensei, seria voltar para
a igreja. Eu ainda sentia raiva e não
Diálogo grátis
para você!
Se você é um estudante adventista do
sétimo dia que freqüenta faculdade ou universidade não-adventista, a Igreja tem um
plano que lhe permitirá receber gratuitamente a revista Diálogo enquanto você estiver estudando. (Aqueles que não são mais
estudantes podem assinar Diálogo usando o
cupom da página 6). Entre em contato com
o diretor do Departamento de Educação
ou do Departamento de Jovens de sua
União, e peça que seu nome seja colocado
na lista de distribuição da revista. Forneça
seu nome completo, endereço, faculdade ou
universidade onde está estudando, o curso
que está fazendo e o nome da igreja onde
você é membro. Você pode também escrever para os nossos representantes regionais
nos endereços indicados na página 2, anexando uma cópia da carta que enviou aos
diretores da União já mencionados. Caso
os passos acima não produzirem nenhum
resultado, você poderá contatar-nos via
e-mail: [email protected].
31
queria ir, então arquitetei um plano
que provocaria minha rejeição por
parte da igreja. Sem tomar um banho,
com as roupas sujas, com graxa preta
no cabelo e nas mãos, peguei minha
moto e fui à igreja. Dei alguns cavalosde-pau com a moto no estacionamento
e fiz vários giros completos na poeira.
Eu queria que os membros soubessem
que eu havia chegado. Entrei relaxadamente na igreja, assentei-me num
dos bancos de trás e olhei para frente
esperando notar aversão e desdém na
face dos membros. Em vez disso, vi
lágrimas rolando no rosto do meu pai,
que estava assentado na plataforma ao
lado do pregador.
Eu esperava que o diácono-chefe,
que tinha dois filhos exemplares, viesse e em alta voz me pedisse para sair
da igreja: “Você deveria se comportar
melhor; seu pai é o ancião. O que faz
aqui na igreja vestido desse jeito?”
Minha boca estava cheia de veneno e
o coração repleto de fel. Eu iria cuspir
nele e depois sairia da igreja e diria:
“Deus, Tu viste? Eu tentei, mas eles
não me quiseram”. Mas o diácono não
veio.
O sermão prolongou-se. Finalmente
a agonia terminou e as pessoas começaram a sair. Eles colocaram as mãos
nos meus ombros e disseram que estavam felizes por me ver na igreja. Isso
não era o que eu esperava e nem o que
queria.
Enquanto me dirigia à porta, cumprimentei meu pai com um aperto de
mão. Eu podia perceber que ele estava
muito emocionado. Ele não disse nada,
mas o aperto de mão falou tudo. Eu
apertei a mão do pastor com minha
mão suja de graxa, e quase pude ver o
tipo de reação que eu queria. Mas ele
mordeu a língua e não disse nada.
Então, enquanto descia os degraus
na frente da igreja, vi o diácono se
aproximando. Ele esperou até agora,
pensei. Estava certo que ele vinha para
me bater; assim decidi que iria atingilo primeiro, correr e torcer para que a
moto funcionasse antes que os outros
diáconos me alcançassem. Mas, em vez
32
de um punho cerrado, ele estendeu
a mão aberta. E, enquanto segurava
suavemente meu braço, disse-me como
estava contente por eu ter voltado à
igreja.
Foi o amor incondicional dos meus
pais e o apoio da igreja, que era realmente uma família e conhecia o sentido de comunidade e aceitação, que
finalmente quebrou minha barreira de
ódio e alienação e me ajudou a descobrir quão importante eu era aos olhos
de Deus.
Barry Gane trabalhou mais de 30
anos como pastor, professor e
diretor de jovens. Atualmente ele
dirige o programa de Mestrado
em Ministério Jovem na Andrews
University. Seu endereço: Andrews
University; Berrien Springs,
Michigan 20904; U.S.A. E-mail:
[email protected]. Esta história
é um excerto do livro We Can
Keep Them in the Church, compilado
por Myrna Tetz e Gary L. Hopkins
(Nampa, Idaho: Pacific Press Publ.
Assn., 2004).
Grace...
Continuação da página 29.
de advocacia, empresas de construção,
escritórios de contabilidade, indústria de
computadores, universidades e hospitais,
desde o Alaska até o Zimbábue.
O autor, Kent Hansen, é um advogado adventista do sétimo dia que atua
como conselheiro geral da Universidade
e Centro Médico de Loma Linda. O
título do livro faz alusão a um evento
tipo “estrada de Damasco”, no qual
o autor teve uma experiência com a
graça de Deus num contexto totalmente inesperado. O propósito da obra é
“descrever um Deus que, através de
Jesus Cristo, busca incessantemente
relacionar-Se com homens e mulheres
nos locais onde eles tratam de negócios, educam seus filhos, ganham o seu
salário, enamoram-se, vivenciam dor e
perda, constroem amizades, enfrentam
tentações e queda, e padecem solidão e
coração quebrantado” (p. 12). O autor
define graça como “o poder pelo qual
vivemos uma vida que agrada a Deus e
que nos traz deleite como Seus filhos”, e
afirma que essa graça é necessária agora,
mais do que nunca, porque, apesar da
riqueza material e dos avanços tecnológicos, sofremos de estresse, de falta de
relacionamentos duradouros e de sentimentos de incapacidade.
Cada uma das 45 leituras é breve
(3 a 4 páginas), e as citações bíblicas
foram extraídas de versões contemporâneas. Embora o autor apresente uma
moderna e interessante interpretação
de Maria Madalena, na maior parte
da obra ele apropriadamente se utiliza,
sobretudo, de histórias bíblicas não tão
proeminentes, como a vigília de Rispa
sobre os corpos de seus filhos (II Samuel
21:7-11) e o pedido de Jesus por uma
jumenta e um jumentinho (Mateus
21:1-7). Modernas perspectivas de contextos contemporâneos (por exemplo,
uma unidade de tratamento neonatal
intensivo) proporcionam várias leituras
bem reais.
Alguns devocionais incluem poemas de escritores como Rabindranath
Tagore, Walt Whitman e do próprio
autor. Outros citam versos ou letras de
hinos ou autores como Henri Nouwen,
Brendan Manning, Annie Dillard e
Willa Cather. Várias leituras terminam
com uma simples oração.
Sylvia Rasi Gregorutti (Ph.D. pela
Georgetown University) é professora-associada e coordenadora
do Departamento de Línguas
Modernas do Pacific Union
College, Califórnia. Seu e-mail:
[email protected]. Um excerto da
obra de Kent Hansen foi publicado
na Diálogo 16:1.
DIÁLOGO 16•2 2004
INTERCÂMBIO
Amplie sua rede
de amizades
Estudantes universitários e profissionais adventistas leitores de Diálogo, interessados em trocar corresponência com colegas em outras partes do mundo.
Kyere Aaron: 22; solteiro; cursando
contabilidade; interesses: ouvir música,
trocar opiniões com pessoas de outras
culturas e fotografia; correspondência em
inglês. Endereço: Koforidua Polytechnic;
Post Office Box 981; Koforidua; GANA.
Karen Ruth Aguilar: 22; solteira;
professora do ensino fundamental e programadora de sistemas; interesses: escrever
poesia, ler e ouvir música; correspondência em espanhol. Endereço: Colonia
Molina, Pje. 1, Casa # 5 – Cuscatancingo;
San Salvador; EL SALVADOR. E-mail:
[email protected].
Elda V. Alicante: 33; solteira; formada no ensino médio com concentração
em matemática, professora na Toledo
National High School; interesses: ler, fazer
novos amigos e ouvir música; correspondência em inglês ou tagalog. Endereço:
Solong Village, Gibon, Nabas; Aklan;
FILIPINAS 5607.
Juan Carlos Alvarez C.: 28; solteiro;
formado em engenharia de topografia
pela Universidade do Vale; interesses:
cantar, estudar vulcões, atividades JA e
camping; correspondência em espanhol
ou inglês. Endereço: Calle 13 # 43 A 17,
Barrio Panamericano: Cali; COLÔMBIA.
E-mail: [email protected] ou
[email protected].
Fatima Andrada: 27; solteira; cursando faculdade de francês na Universidade
Nacional de Tucumán; interesses: ler,
trabalhar com crianças e artesanato;
correspondência em espanhol ou francês. Endereço: Constitución 1155; San
Miguel de Tucumán. Tucumán 4000;
ARGENTINA. E-mail:fatimafle@yahoo.
com.
Radive Báez Amancio: 20; solteira;
cursando administração de empreDIÁLOGO 16•2 2004
sas na Universidade Autônoma de
Santo Domingo; interesses: ler, fazer
novos amigos e ouvir música cristã; correspondência em espanhol.
Endereço: Autopista Duarte Km. 14,
Las Trinitarias # 89; Santo Domingo;
REPUBLICA DOMINICANA. Email: [email protected] ou
[email protected].
Emmanuel G. Bhatti: 21; solteiro;
cursando administração de empresas
no Seminário Adventista do Paquistáo;
interesses: jogar cricket, ouvir música
cristã e halterofilismo; correspondência
em inglês. Endereço: Old Civil Line
– Mission Hospital near Noor Manzail;
Sahiwal; PAQUISTÃO. E-mail:
[email protected].
Neida Calizaya H.: 20; solteira;
cursando engenharia comercial na
Universidade Domingo Savio; interesses:
fazer novos amigos, camping, música
e esporte; correspondência em espanhol ou português. BOLÍVIA. E-mail:
[email protected].
Zogo Bessala Faustin: 23; solteiro;
cursando faculdade de espanhol na Escola
Normal Superior; interesses: ler, escrever,
discutir assuntos espirituais e promover
igualdade da mulher; correspondência
em francês, espanhol ou inglês. Endereço:
B.P. 47; Yaounde; CAMARÕES. E-mail:
[email protected].
Aura Dandrade Francis: 19; solteira;
cursando administração de empresas na
Universidade Interamericana; interesses:
cantar, participar do clube de cadetes
médicos adventistas e esportes radicais.
Correspondência em espanhol. Endereço:
Calle 21 AB-16 A, Urb. El Cortijo;
Bayamón; Puerto Rico 00956; EUA.
Hopeful Hajanianina: 23; solteiro;
cursando faculdade de teologia; interesses: atividades JA, música e basquete;
correspondência em malagasi, inglês ou
francês. Endereço: Universite Adventiste
Zurcher; B.P. 325; Sambaina, Antisirabe;
110 MADAGÁSCAR. E-mail;
[email protected].
Eucimara Alves Jorge: 29; solteira;
formada em educação física e professora
no Colégio Adventista de São Carlos;
interesses: viajar, ser útil e ajudar aos
outros; correspondência em português
ou espanhol. Endereço: Rua General
Osório, 347 – Centro; 13560-640;
São Carlos, SP; BRASIL. E-mail:
[email protected].
María de los Angeles Martínez V.:
25; solteira; formada em administração
de empresas; interesses: fazer novos
amigos, trocar poesias, colecionar postais e atividades JA; correspondência
em espanhol. Endereço: Moctezuma
#825, Esq. Narciso Mendoza; Cd. Isla,
Veracruz; 95641 MÉXICO. E-mail:
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Convite
Se você é universitário ou profissional
adventista e quer ter seu nome listado
aqui, envie-nos as seguintes informacões:
(1) Seu nome completo, com o sobrenome em letras maísculas; (2) sua idade;
(3) sexo; (4) estado civil; (5) estudos correntes ou diploma obtido e especialidade;
(6) faculdade ou universidade que está
freqüentando ou na qual graduou-se;
(7) três principais passa-tempos ou interesses; (8) língua(s) nas quais quer se
corresponder; (9) o nome da congregação
adventista da qual é membro; (10) seu
endereço postal; (11) seu e-mail, caso o
tenha. Por favor, datilografe ou use letra
de imprensa clara. Envie esta informação
para Dialogue Interchange; 12501 Old
Columbia Pike; Silver Spring, MD 209046600, EUA. Você pode também usar e-mail:
[email protected]. Apenas poremos na
lista aqueles que fornecerem os 10 items
de informação requerida acima. Dialogue
não assume responsabilidade pela exatidão
da informação dada ou pelo conteúdo da
correspondência que possa resultar.
33
LOGOS
Portas fechadas ou abertas?
Quando abrimos as portas do coração e permitimos que
Jesus entre, uma nova vida tem lugar.
Reuel U. Almocera
Vivemos num mundo de portas
fechadas. Portas de oportunidades se
fecham por causa do desemprego, da
pobreza e do analfabetismo. Portas
de relacionamentos rompidos, hostilidade e sentimentos doentios que
nos afastam uns dos outros. Portas de
fracassos e derrotas. Acima de tudo,
portas que fechamos para Deus por
causa do medo, da dúvida e da incredulidade.
Seria bom se nenhuma dessas portas existisse, especialmente as últimas
três.
Sei que nosso Salvador não aprecia portas fechadas. Os Evangelhos
contêm inúmeros relatos sobre como
Jesus abria as portas fechadas da vida
das pessoas comuns. Veja, por exemplo, o estupendo episódio relatado em
João 20:19-21. Lemos: “Ao cair da
tarde daquele primeiro dia da semana, estando os discípulos reunidos
a portas trancadas, pôs-se no meio
deles e disse: ‘Paz seja com vocês!’...
Novamente Jesus disse: ‘Paz seja com
vocês! Assim como o Pai Me enviou,
Eu os envio.’ E com isso, soprou
sobre eles e disse: ‘Recebam o Espírito
Santo.’”*
Por que os discípulos fecharam
as portas?
Medo. O medo pode fechar portas.
Ele paralisa e imobiliza as pessoas. Ele
tem o poder de isolá-las num canto
qualquer. Mas os discípulos nada
tinham a temer. Bem cedo naquele
dia, eles haviam visto a tumba vazia.
Foram testemunhas oculares de muitos milagres que Jesus realizara. Viram
34
Jesus alimentar mais de 5.000 pessoas
com apenas dois peixes e cinco pães.
Alguns deles tinham-nO visto caminhar sobre as ondas e ordenar ao mar
revolto que se acalmasse.
Dúvida. A dúvida está implícita no
texto. Mas o fato de Jesus Se haver
preocupado em mostrar aos discípulos
as marcas em Suas mãos, indica que
eles ainda precisavam ser convencidos
da realidade de Sua ressurreição.
Culpa e vergonha. Também é
possível que os discípulos tenham
fechado a porta por causa da culpa
e vergonha. Eles deveriam estar sentindo a dor do fracasso e do remorso
por haverem desapontado a Jesus.
Lembram-se daquela fatídica noite de
quinta-feira? Até Pedro, provavelmente o mais destemido dentre os discípulos, traiu o Mestre.
Os discípulos tremiam de medo,
tinham dúvidas e relembravam o
fracasso quando, de repente, Jesus
apareceu e Se pôs no meio deles. Ele
veio pela porta dos fundos, por assim
dizer, e trouxe Consigo as chaves que
abriram a porta da frente da vida dos
discípulos. Aquelas chaves incendiaram o cristianismo durante o primeiro
século. Essas mesmas chaves nos estão
disponíveis hoje.
Chaves para uma vida cristã
plena
A chave de uma nova paz. As portas de nossa vida podem estar fechadas pelo pecado, o fracasso e a culpa.
Podemos não encontrar um trabalho
decente porque nosso currículo não é
dos melhores. Não temos condições
de erguer nossa cabeça por causa de
um passado comprometedor. Não
podemos fazer o máximo que nossas
capacidades permitem, por causa do
ódio, da frustração ou do remorso.
Para todos nós, Jesus diz: “Paz seja
com vocês!”
Paz não é a ausência de problemas.
Não é uma vida isenta de turbulências. A verdadeira paz vem quando
o Príncipe da Paz reina no coração.
Foi somente quando nosso Senhor
estava no barco e bradou: “Aquietese”, que os discípulos foram salvos
daquela terrível tempestade no mar da
Galiléia. Foi somente quando o endemoninhado gadareno encontrou a
Jesus, que sua esposa e filhos puderam
finalmente abrir-lhe as portas da casa
e viverem todos em paz. Foi somente
porque Jesus estava presente que a
festa de casamento em Caná foi salva
de um grande fiasco.
Assim como fez com os discípulos,
Jesus veio para nos trazer a chave da
paz. Ele está insistindo conosco agora:
“Abra a porta da frente.” Por favor,
não diga: “Sinto muito, ela está fechada.” Experimente a alegria de Sua salvação e você se encherá de paz.
A chave de um novo propósito.
Nossas portas podem estar fechadas
por causa de relacionamentos rompidos. Assim como o pecado faz com
que fujamos de Deus, o medo e o
trauma fazem com que nos apartemos uns dos outros. Os discípulos,
naquele domingo da ressurreição,
estavam prontos a se isolarem do resto
do mundo. Foi para lhes abrir a alma
que Jesus trouxe a chave de um novo
DIÁLOGO 16•2 2004
propósito.
Quando temos a chave de um
novo propósito, abrimos a porta do
serviço e cuidado para aqueles que
têm sido feridos por relacionamentos
rompidos. Podemos ir e tocar a vida
das pessoas com uma nobre agenda e
motivos generosos. Não servimos porque queremos ser salvos, mas porque
estamos salvos.
A chave de um novo poder. Nossas
portas podem estar fechadas por
fracassos e dúvidas. Assim como o
pecado faz com que fujamos de Deus
e uns dos outros, o fracasso faz com
que fujamos de nós mesmos. Muitos
se voltam para o álcool, as drogas
e mesmo o esporte para compensar
o senso de fracasso. Para todos nós,
Jesus traz a chave de um novo poder.
Poder é um dos artigos mais procurados no mundo moderno. As
pessoas se tornam heroínas por causa
do poder. Outros têm sido destruídos
pelo poder. Há vários tipos de poder:
coercivo, utilitário e legítimo.
Poder coercivo é aquele que dá
ordens e usa a punição para forçar a
obediência. Os militares e policiais
usam o poder coercivo como meio de
obter submissão. Há o perigo de se
confiar demais nesse tipo de poder,
porque geralmente ele provoca alienação, hostilidade e ira.
O poder econômico ou utilitário
usa recursos para induzir outros a se
ajustarem às suas expectativas. Esse
tipo de poder produz cooperação e
comprometimento apenas enquanto
as compensações econômicas se mantêm num nível satisfatório. Mas, o
uso do poder utilitário traz consigo o
espírito de ambição e outros problemas.
O poder legítimo é derivado da
posição que se ocupa. Um professor
bem-preparado e dedicado tem poder
legítimo sobre seus alunos. O poder
legítimo pode ser útil, mas nem sempre é suficiente. Esse tipo de poder
algumas vezes faz com que as pessoas
oponham resistência.
Jesus concede poder espiritual.
DIÁLOGO 16•2 2004
A última chave que Jesus deu para
os discípulos naquele domingo à
tarde, foi a do poder do Espírito. “E
com isso, soprou sobre eles e disse:
‘Recebam o Espírito Santo.’” O
Espírito Santo é a chave poderosa que
torna a vida bem-sucedida para Deus
e a humanidade.
Pense nos discípulos trancafiados
naquela sala durante o domingo da
ressurreição. Lá estava Pedro, que
negara a Cristo três vezes. Lá estavam
Tiago e João, que viviam discutindo
sobre quem seria o maior entre os
seguidores de Jesus. Lá estava Tomé,
o discípulo da dúvida. Lá estavam
algumas mulheres anônimas. Todos
eles tinham pouca educação formal, se
é que a tinham. Mas, quando receberam o poder do Espírito Santo, viraram o mundo de cabeça para baixo.
Jesus está disposto a conceder a
todos o poder do Espírito. Tem você
relutado em se aventurar por Cristo,
em razão de seus fracassos no passado?
Tem você sido tímido demais para
pensar grande, para fazer grandes planos para Cristo, por causa da dúvida
ou medo do fracasso? A todos nós,
Jesus diz: “Abram a porta da frente.
Por favor, não digam: Sinto muito,
estamos fechados.” Experimente as
maravilhas desse poder.
Conclusão
As portas de uma vida de sucesso e
realização não podem estar fechadas.
Jesus tem as chaves. Ele diz: “Peçam, e
lhes será dado; busquem, e encontrarão; batam, e a porta lhes será aberta”
(Luc 11:9). Ele também diz: “Eu Sou
a porta; quem entra por Mim será
salvo. Entrará e sairá, e encontrará
pastagem” (João 10:9).
Há, porém, uma porta que pode
estar fechada. Jesus hoje apela: “Eis
que estou à porta e bato. Se alguém
ouvir a Minha voz e abrir a porta,
entrarei e cearei com ele, e ele
Comigo.” (Apoc 3:20). Abramos-Lhe
a porta da frente de nossa vida. A
qualquer momento Jesus, o Noivo,
virá. Então Ele fechará todas as por-
tas da oportunidade. E àqueles que
não tiverem as chaves, o Senhor dirá
com tristeza: “Não o conheço. Sinto
muito, estou fechado!” (cf. Mat 25:113).
*Todas as citações bíblicas
neste artigo são da Nova Versão
Internacional.
Reuel U. Almocera ministra cursos
na área de teologia aplicada no
Adventist International Institue of
Advanced Studies (AIIAS). Este
artigo é baseado num sermão de
Leighton Ford intitulado “Abramos
a Porta da Frente”. O endereço do
Pr. Almocera é: P.O. Box 038; 4118
Silang, Cavite; Filipinas. Para mais
informações sobre o AIIAS, visite o
website http://www.aiias.edu.
A ligação
mente-corpo...
Continuação da página 14.
4:309-321.
5. Barbara L. Frederickson, “The Value of Positive
Emotions,” American Scientist 91 (jul.-ago.,
2003): 330-335.
6. Idem, p. 330.
7. Idem, p. 332.
8. Ellen G. White, “Life, Love, and Union,” The
Signs of the Times, 29 de outubro de 1898,
b.; “Sabbath-School Influences,” Sabbath
School Worker, 1 de abril de 1886, a; Sons
and Daughters of God (Washington, D.C.:
Review and Herald Publ. Assn., 1955); Mind,
Character, and Personality, 2 vols. (Nashville,
Tenn.: Southern Publ. Assn., 1977), vol. 1,
p. 802; Reflecting Christ (Hagerstown, Md.:
Review and Herald Publ. Assn., 1985), p. 262;
Faith and Works (Nashville. Tenn.: Southern
Publ. Assn., 1979), p. 65.
9. George T. Javor, “Life: An Evidence for
Creation,” Origins 28 (mar. 2000) 1:24-33.
10. White, Educação.
35
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Rochosas em diferentes períodos do
ano. A beleza serena de um lago cristalino está envolta pelas nuanças das
cores do outono.
“Frutas Saborosas” (Acrílico; 57 x 72cm.) Muitas vezes
tenho inspiração para uma pintura à noite quando vou dormir ou quando estou acordando pela manhã. Nessa composição, eu quis representar as várias formas, cores e texturas de
frutas que nos proporcionam saúde.
Inserção A
“Picos Imponentes” (Acrílico 76
x 102cm.) Há algo de majestoso nas
montanhas, que produz impressão
duradoura em nós. Elas testemunham
silenciosamente do incomensurável
poder de Deus. Esse é um ângulo
das Montanhas de Sierra Nevada, na
Califórnia.
“Amigo Fiel” (Acrílico 92 x
92cm.) Cresci na fazenda de meus
pais trabalhando com cavalos. Retratei
aqui um daqueles nobres companheiros de minha juventude, buscando fixar
na tela sua personalidade. Ele serviu
bem a seu mestre e agora está desfrutando merecida aposentadoria.
“Ancião em Paz” (Acrílico; 92 x
23cm.) Recriei aqui uma imagem que
me acompanhou por vários anos. Há
melancolia e também serenidade nesse
homem, enquanto ele se aquece ao sol
e medita em sua provecta existência.
Inserção B
DIÁLOGO 16•2 2004
“Sabedoria do Pescador” (Acrílico; 92 x
123cm.) Quando menino eu gostava de pescar
no rio que demarcava o limite de nossa fazenda
no Uruguai. Anos atrás vi um filme produzido
na Venezuela, que exibiu uma cena na qual esta
pintura está baseada.
“A Primavera Chegou ” (Acrílico; 61 x 77cm.) A apamate é uma
árvore comum da área rural da Venezuela. Na primavera, suas belas flores
acrescentam um toque belo e suave à paisagem.
“Paisagem Marítima ” (Acrílico; 76 x 102cm.) Na Venezuela e em
Porto Rico morávamos perto do mar, que estava constantemente mudando. Assim que o sol começava a declinar no horizonte, grandes nuvens o
cobriam criando efeitos cintilantes sobre as ondas.
DIÁLOGO 16•2 2004
“Estrada Sombreada” (Acrílico;
76 x 102cm.) Há muitas estradas
como esta em Porto Rico. Elas parecem convidar-nos para uma vagarosa
caminhada em direção às surpresas
que nos esperam além do horizonte.
Essas estradas são metáforas de nossa
vida.
Inserção C
“El Capitan, Parque Nacional de
Yosemite” (Acrílico; 52 x 72cm.) A força
imensa desse despenhadeiro, esculpido por
geleiras, contrasta com a suavidade das flores
silvestres embaixo.
“Curva do Rio” (Acrílico; 61 x 77cm.) Nessa composição imaginária
uni meus elementos favoritos – céu, terra e água – e completei a cena
com plantas, árvores, e flores.
“Capela de Cristo
Christ’s Chapel”
(Acrílico; 52 x
72cm.) Essa pequena
capela localizada perto
das muralhas da antiga
San Juan é um local
favorito para os habitantes e turistas de
Porto Rico. A capela
preserva memórias
importantes dos tempos coloniais.
Inserção D
DIÁLOGO 16•2 2004
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