Cavaco Silva: crítica ou ofensa? PORTUGAL 01.12.2015 às 12h35 As semanas em que o Presidente da República esteve debaixo de fogo. O que disseram dele e a opinião de um jurista SARA RODRIGUES Jornalista Desde as eleições legislativas e até à indigitação do novo Governo, o Presidente da República foi alvo de várias críticas. Tanto de políticos como de comentadores. Golpista, múmia, líder de seita, pateta encartado ou gangster foram alguns dos apodos com que Cavaco Silva foi brindado. Aqui ficam alguns exemplos e, de seguida, a opinião de um jurista: "Eu prefiro um presidente divertido [referindo-se a Marcelo Rebelo de Sousa] a um presidente múmia, como temos agora." Miguel Sousa Tavares, escritor, SIC, 4 de outubro “O senhor Presidente da República teve um discurso quase de seita […] está a comportar-se como líder de seita, a tentar criar instabilidade e a fazer chantagem. É completamente inaceitável que assim seja. Não é aceitável que o Presidente da República venha dizer que não aceita soluções que sejam democraticamente sufragadas no país e no parlamento.” Catarina Martins, deputada e porta-voz do Bloco de Esquerda, depois do discurso em que Cavaco Silva anunciou a indigitação de Passos Coelho como primeiro-ministro, TVI, 22 de outubro "Cavaco é definitivamente a maior vergonha que o estado de direito democrático acolheu como órgão." Isabel Moreira, deputada do PS, no facebook, 23 de outubro "O que eu vi, infelizmente, não foi nenhum Presidente, foi uma declaração golpista de direita [...] que sequestra o parlamento, exclui três partidos políticos [PCP, BE e Os Verdes] e apela à sublevação parlamentar de um partido que tem regras. Foi a intervenção de um golpista, o que é inaceitável e lamentável, envergonha o País, a Constituição e qualquer democrata." João Galamba, deputado e dirigente do PS, RTP, 23 de outubro (depois da declaração ao País de Cavaco Silva) "[...] Cavaco esmagou o regime. Da seita deu um salto para o golpe. [...] para um golpista nem toda a gente é gente [referindo-se a quem votou nos partidos de esquerda].” Isabel Moreira, deputada do PS, Expresso, 24 de outubro "As pessoas sabem que de pouco vale recorrer àquela múmia que lá está em Belém, porque não tem coração para atender o povo, está sobretudo interessado em saber como satisfazer os agiotas, os especuladores, aquilo que ele pensa que pensam os mercados." Edgar Silva, candidato presidencial do PCP, num comício em Mirandela, 21 de novembro "Cavaco Silva é um pateta encartado. É um pateta do ponto de vista político - não estou a dizer palhaço porque não quero nenhum processo - vive obcecado com a sua própria imagem." Daniel Oliveira, comentador, "O eixo do mal", SIC Notícias, 21 de novembro O Código Penal tem um artigo especialmente dedicado à honra do Presidente da República. Diz o Art.º 328 que “quem injuriar ou difamar o Presidente da República, ou quem constitucionalmente o substituir é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa”. Se as ofensas forem feitas de forma pública a pena aumenta: “Se a injúria ou a difamação forem feitas por meio de palavras proferidas publicamente, de publicação de escrito ou de desenho, ou por qualquer meio técnico de comunicação com o público, o agente é punido com pena de prisão de 6 meses a 3 anos ou com pena de multa não inferior a 60 dias.” A questão está em saber o que é difamação e o que não é. “O limite é o que distingue a crítica democrática mais ou menos agressiva do insulto”, refere Tiago Félix da Costa, advogado da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados. Múmia pode ser encarado “como uma crítica”, mas caso fosse ladrão, por exemplo, seria “claramente ofensivo”, diz. E o facto da pessoa, depois, pedir desculpas, de acordo com o jurista, “vale zero”, apenas poderá atenuar a eventual pena que possa ser aplicada, já que o Presidente pode, se assim o desejar, apresentar denúncia na mesma. No entanto, Félix da Costa reconhece que a avaliação destes casos é difícil. “A fronteira é muito difícil de delimitar. Estamos perante uma avaliação que tem de ser casuística, a decisão está, em primeiro lugar, nas mãos do procurador” que fica com o caso, mas se for outro procurador a decisão pode, também, ser outra. E como tem decidido a justiça? A tendência nos últimos anos tem “sido a de dar primazia à liberdade de expressão e de imprensa”.