Hautnah Katinka Horn, Designer / Diplomada pela Academia de Moda & Design de Hamburgo A Coleção Hautnah compõe-se de 9 trajes e constitui o meu trabalho de conclusão de curso, do ano de 2009, na Academia de Moda & Design de Hamburgo. O meu tema era a pele, daí o título "Hautnah"1. Interessou-me a idéia de que a pele é tanto um interior quanto um exterior. Ela possui, além disto, uma grande e intrínseca afinidade com o vestuário. Fascinou-me a sua posição dupla, como algo altamente pessoal e íntimo e, ao mesmo tempo, destinado ao olhar público. Eu me decidi a investigar este campo de tensões, e a expressá-lo em forma de moda. A coleção tem um tom muito pessoal, e se baseia na sensação que eu tenho do meu próprio corpo. Determinante para isto é, certamente, a minha cidade natal, Hamburgo, uma cidade fria, quase nórdica. O que a coleção mostra é que eu sou dotada de corporalidade. Devo, aqui, acrescentar, que eu, como também muitas outras pessoas, não suporto a visão da minha nudez no espelho. Apesar disto, eu trago exatamente esta nudez à discussão, tornando-a visível para todos. Ironicamente, eu, com isto, possibilito que outras pessoas cubram, com ela, a sua própria nudez. Talvez algo deste tipo ocorra em toda relação criador/usuário de moda, porém, nesta coleção, isto se dá escancaradamente. Muitos brasileiros, provavelmente, têm uma relação mais descomplicada do que a minha com a modificação do corpo. A minha idéia de corpo é, ao contrário, ainda tradicional. Os corpos são honestos: O que se vê é predisposição e esforço em tempo real. Este é um aspecto pelo qual foi tão interessante para mim o intercâmbio com designers de moda brasileiros. Nas minhas pesquisas sobre o tema "pele", eu me deparei com a mitológica competição entre o habitante das matas Mársias e o deus grego Apolo. Mársias o desafiou para uma competição musical e foi derrotado. Como punição, Apolo o esfolou. Mársias geme: "Por que você me arranca de mim mesmo?" Em termos de recepção histórica, Mársias pode ser interpretado como "o sentimento", Apolo, como "a razão". O ato do esfolamento é, então, a sublimação do inconsciente cru pela análise claríssima e cortante do intelecto. Este tipo de divisão do trabalho eu encontrei, também, ao lidar com imagens de corpos. A autoexpressão não controlada da pele, como, por exemplo, acne, vermelhidões, rugas, distúrbios de pigmentação, é, na medida do possível, combatida. Por outro lado, a modificação deliberada da superfície do corpo, como bronzeamento, body-modification, depilação e cirurgia plástica, é aceita ou se torna até mesmo a regra. 1 NT – Palavra alemã que significa "muito perto", mas que, traduzida literalmente, seria algo como "tão próximo quanto da pele". 1 Desenvolvi a idéia de trabalhar sobre a minha própria pele ou sobre um molde de mim mesma. A estrutura da experimentação consistiu em combinar este molde corporal, altamente pessoal, com os clássicos do vestuário, apessoais porque historicamente condicionados, como a Sacco & Co. Primeiramente, eu desenvolvi uma técnica para encontrar um molde para a forma do meu corpo: Eu me cobri com gesso, recortei a forma nos pontos mais elevados e apliquei recortes onde necessários, até que a forma rígida do gesso se tornasse plana. As partes recortadas assim surgidas resultam, quando costuradas umas nas outras, na forma do corpo "Katinka Horn 2009". Deste modo, eu utilizei um método que desempenha um papel importante na moda: a transferência do tridimensional para o bidimensional, e de volta para o tridimensional. As experimentações com cortes básicos e forma corporal, que realizei em seguida, resultaram em: 1. Imitação da corporalidade em peças de roupas 2. Conversão de corporalidade em elementos de design: montes/convexos; sulcagens/côncavos (fossa poplítea, etc.); bem como a interpenetração, sem costuras, de partes individuais. Como resultado, eu apresento uma coleção que não se presta a uma interpretação simples, que possui vários níveis. Nem o que está por baixo é mostrado explicitamente, nem é atribuído ao que está por cima qualquer outra razão de ser, do que servir de espelho e citação do que o que está por baixo. Para ser coerente esta afirmação, é indispensável que sejam utilizados apenas tecidos da cor da minha pele. Os modelos brasileiros se enfiam, proverbialmente, "em uma outra pele". 2