UNIVERSIDADE
CATÓLICA DE
BRASÍLIA
PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
Curso de Física
UMA ANÁLISE DOS CONCEITOS DE FÍSICA
QUÂNTICA COMO BASE PARA AS TEORIAS DA
NOVA ERA
Autor: Rafael Aragão Dias
Orientador: Prof. Dr. Sérgio L. Garavelli
BRASÍLIA
2008
RAFAEL ARAGÃO DIAS
UMA ANÁLISE DOS CONCEITOS DE FÍSICA QUÂNTICA COMO BASE PARA AS
TEORIAS DA NOVA ERA
Trabalho de Conclusão de Curso
submetido à Universidade Católica de
Brasília para obtenção do Grau de
Licenciado em Física.
Orientador: Dr. Sérgio L. Garavelli
Brasília
Novembro de 2008
RESUMO
Neste trabalho será feita uma análise de alguns conceitos de física quântica utilizados como
base para teorias de um movimento que se denomina Nova Era. Conceitos esses
divulgados na forma de livros e de filmes, que pregam basicamente a idéia de que a
consciência humana pode alterar a realidade ao seu redor, seja na área da saúde, das
finanças ou dos relacionamentos. Os assuntos tratados pela literatura desse movimento são
bastante variados e possuem diversas implicações filosóficas, mas será dado aqui o
enfoque a questão da consciência como fator determinante de propriedades das partículas
subatômicas e as implicações dessa idéia na medicina, no misticismo e no dia-a-dia.
Palavras Chaves: Física Quântica, Nova Era, Pseudociência.
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1. INTRODUÇÂO
Chamamos de pseudociência a tentativa de agregar um aspecto científico a
uma hipótese que não o é, seja através da utilização de conceitos de outra área do
conhecimento, seja pela associação do nome de grandes universidades ou de
pesquisadores com alto grau de formação.
Muitas vezes a pseudociência distorce os conceitos, para que possam servir
de base para a explicação de suas hipóteses, o que pode gerar falsas concepções.
Isso é prejudicial na medida em que influencia em decisões, individuais ou sociais,
como a escolha de um tratamento médico ou no caso ocorrido na cidade de São
Paulo citado a seguir:
Em 1999 circulou na internet uma série de mensagens alertando para o perigo
iminente do uso de celulares em postos de gasolina, relatando o caso de algumas
supostas explosões, que na realidade foram posteriormente desmentidas pelas
empresas. (...) Em 2003 a prefeita Marta Suplicy regulamentou a Lei 13440, que
proíbe o uso de celulares em postos de combustíveis da cidade de São Paulo. (...)
Considerando as condições atuais dos postos de gasolina e as tecnologias dos
celulares, a possibilidade de haver alguma explosão causada por esse tipo de
aparelho é extremamente remota. (...) No caso específico da cidade de São Paulo,
quem acreditou nessa lenda urbana foram os legisladores, criando uma lei
incoerente e sem nenhum suporte cientifico. (KNOBEL, 2008)
Esse caso ilustra como teorias sem embasamento científico podem influenciar
decisões sociais, porém, se difere dos que serão aqui analisados, pois não se trata
de uma nova teoria, divulgada através de livros e apoiada por pesquisadores de
renome. Entenda-se por “pesquisadores de renome” aqueles com alto grau de
formação, não necessariamente reconhecidos por trabalhos anteriores. Isso significa
que esses casos não se tratam de pequenas teorias cotidianas, como no exemplo
citado, e sim de obras que prometem ser uma nova ciência, e que seria
supostamente apoiada pela física quântica.
Essa história começou no final do século XIX, quando muitos pensavam que a
Física era uma ciência quase completa. Em 1900, o Físico irlandês William
Thomson, conhecido como Lorde Kelvin, chegou a recomendar aos jovens que não
se dedicassem a Física, pois já não havia mais quase nada a se descobrir, a não ser
o aumento da precisão das medidas. Ele afirma, porém, que existem duas pequenas
nuvens nos horizontes da física: o problema com o éter, decorrente do resultado
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negativo do experimento de Michelson e Morley e a dificuldade em se explicar a
distribuição de energia irradiada por um metal aquecido (MARTINS, 2001).
Existiam, porém, outros problemas, como o desconhecimento da natureza
dos raios X e da estrutura dos átomos, o que dificultava a compreensão dos
espectros de luz descontínuos emitidos pelo sol e o arranjo molecular dos sólidos. A
compreensão da luz como uma onda, o que parecia uma certeza, graças ao
experimento da dupla fenda de Young, não permitia uma explicação para o que hoje
chamamos de efeito fotoelétrico.
Na busca pela explicação desses e de outros problemas, surgem a teoria da
relatividade e a física quântica, que mudam de forma radical a compreensão da
estrutura do universo e quebram o determinismo do espaço e tempo absolutos.
Diferentemente das chamadas ‘revoluções científicas’ anteriores, que incluíram
embates e concepções fora dos domínios da ciência, as mudanças de perspectiva
ocorridas no início do século passado envolvem revisões radicais de concepções
próprias da física. Em particular, a transição do mundo físico como contemplado no
ultimo ano do século XIX para aquele visto, duas décadas mais tarde, através da
mecânica quântica (...) é, até hoje, a mais profunda e também, em muitos aspectos,
a mais desconcertante delas. Nas palavras recentes de um especialista, “a mecânica
quântica é muito mais que apenas uma teoria, ela é uma forma completamente nova
de ver o mundo”. (TOLEDO, 2005)
Essa nova forma de ver o mundo, porém, não é nada mística. Ela possui forte
embasamento teórico e experimental, possibilitando inclusive, o desenvolvimento de
várias tecnologias. Está relacionada à natureza e o comportamento da matéria, com
conceitos antes inimagináveis, como o de dualidade onda-partícula e o princípio da
incerteza de Heisenberg.
Existe, porém, um movimento que se denomina como Nova Era, que se
propõe como uma nova ciência e se apóia na nova visão da Física para que suas
teorias adquiram aspecto científico. O problema, entretanto é que a Nova Era trata
de assuntos até então tidos como místicos, como a modificação da realidade pelo
poder do pensamento, o que, de certa forma, não condiz com a área de estudos da
Física Quântica.
O objetivo desta obra, então, é fazer uma análise dos conceitos de física
quântica utilizados fora de seu contexto, servindo como base para as idéias de que a
mente humana tem a capacidade de modificar a matéria e a realidade. O intuito não
é comprovar a veracidade ou não dessa teoria, mas apenas observar se os
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conceitos estão sendo utilizados de forma coerente, tornando-se assim um texto
informativo a respeito da construção dos conceitos quânticos. Karl Sagan alerta
sobre a importância da alfabetização científica:
Pode-se afirmar que a pseudociência é adotada na mesma proporção em que a
verdadeira ciência é mal compreendida – a não ser que a linguagem falhe nesse
ponto. Se alguém nunca ouviu falar de ciência (muito menos de como ela funciona),
dificilmente pode ter consciência de estar abraçando a pseudociência. (SAGAN,
1995)
A teoria apresentada aqui pode auxiliar a compreensão de alguns aspectos
da física, para que não se deixe enganar por idéias pseudocientíficas.
2. METODOLOGIA
Foi feita uma revisão bibliográfica com o intuito de aprofundamento nos
conceitos de Física Quântica, bem como sua construção no decorrer da história.
Para isso, o ideal seria a utilização fontes primárias, ou seja, artigos e livros escritos
pelos próprios cientistas da época. Como isso não se mostrou viável, devido à
dificuldade de acesso a essas fontes, bem como o problema com variedade de
línguas, tendo em vista que muitos trabalhos importantes são publicados
principalmente em inglês, francês ou alemão. Foram então utilizadas fontes
secundárias confiáveis, como Brody, D. E. & Brody, E. A. R (1999), Segré (1980) e
Feynman (2005).
Após isso, foi feita a leitura de algumas obras de divulgação da Nova Era
(CAPRA, 1975; ARNTZ et al, 2007; BYRNE, 2007; GOSWAMI, 2006) e anotados os
conceitos relativos à Física Quântica. Muitos outros aspectos poderiam ser
abordados, pois essas obras são muito ricas em variedade de conteúdo e não tratam
de Física especificamente, porém, esse não é o intuito deste trabalho. Foi
selecionado então, um tema comum a todas ou à maioria das obras, o observador, e
sua coerência foi analisada segundo os estudos feitos anteriormente.
3. ANÁLISE
Antes de falar sobre Física Quântica, devemos primeiramente defini-la. A
palavra quântica vem de quantum, que em latim significa quantidade. Esse termo é
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usado, pois em 1900, Max Planck, ao tentar formular um ajuste matemático para o
problema da radiação dos metais, quando aquecidos a altas temperaturas, percebeu
que a energia irradiada por eles é dada em quantidades discretas e não em
quantidades continuas. Essa idéia inicialmente não foi bem aceita pela comunidade
cientifica, nem mesmo pelo próprio Planck. Mas, com a física existente na época,
conhecida hoje como física clássica, não era possível encontrar uma fórmula que
descrevesse o fenômeno. A idéia do quantum foi sendo desenvolvida e culminou no
que hoje chamamos de física quântica, que explica muito bem não só o fenômeno
da radiação de corpos aquecidos, como vários outros.
Fritjof Capra em seu livro O Tao da Física (1975), propõe um paralelo entre a
física moderna e o misticismo oriental. Um dos temas abordados em sua obra é a
questão da influencia do observador nas medidas quânticas, ou seja, como o
cientista interfere no resultado das medidas envolvendo partículas subatômicas.
Essa influência de fato existe, mas é colocada pelo autor da seguinte maneira:
O observador humano constitui o elo final na cadeia de processos de observação, e
as propriedades de qualquer objeto subatômico só podem ser compreendidas em
termos de interação do objeto com o observador. (...) Na física atômica, jamais
podemos falar sobre a natureza sem falar, ao mesmo tempo, sobre nós mesmos.
(CAPRA, 1975, pag. 58)
Ou seja, o observador é fundamental para na determinação das propriedades
de objetos subatômicos, que são os eletros, prótons, nêutrons ou qualquer objeto da
ordem de grandeza menor que a do átomo. Mais à frente, coloca essa idéia
juntamente com outras oriundas da filosofia oriental:
Essa teoria das partículas subatômicas reflete a impossibilidade de se separar o
observador científico dos fenômenos observados (...) em sua forma mais extrema.
Implica, em última instância, o fato de as estruturas e os fenômenos que observamos
na natureza nada mais serem do que criações de nossa mente medidora e
categorizadora. (...) Os místicos orientais nos afirmam e reafirmam que todas as
coisas e eventos que percebemos são criações da mente, surgindo de um estado
particular de consciência e dissolvendo-se novamente caso esse estado seja
transcendido. (CAPRA, 1975, pag. 207)
Em Física Quântica, porém, quando se trata do observador não se refere à
sua consciência. A mente humana não cria eventos subatômicos e muito menos lhe
altera as propriedades. Sua influência se deve ao fato das medidas serem feitas de
forma indireta, como, por exemplo, no experimento da dupla fenda.
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Para explicar esse experimento, façamos primeiro uma analogia com corpos
macroscópicos, a fim de observar a diferença entre o comportamento das ondas e o
das partículas. Imagine uma chapa de metal muito resistente, onde são feitas duas
fendas idênticas, chamadas fenda 1 e fenda 2, separadas entre si por uma certa
distância. Atrás da chapa coloca-se um anteparo, com um detector que pode medir a
intensidade da onda que chega até ele, ou marcar a posição onde uma partícula o
atingiu, bem como a quantidade de partículas em cada ponto.
Figura 1: Esquema de montagem do experimento (a), gráfico das probabilidades P1 e P2
(b) e gráfico da probabilidade P12. Fonte: Feynman, 2005, pag. 132.
Uma metralhadora é então posicionada em frente à chapa, de modo que fique
no meio da distância entre as duas fendas como mostrado na figura1(a). Como essa
arma não atira as balas em linha reta perfeita, e sim as espalha em várias direções,
existe uma probabilidade de que as balas passem por qualquer uma das fendas,
atingindo o anteparo atrás da placa, onde sua posição será marcada. Se a fenda 2
for tampada e a metralhadora começar a disparar, o detector medirá a quantidade de
balas que chaga em cada ponto. O gráfico dos dados dessa medida pode ser
representado pela curva P1, como mostrado da figura1(b), onde o eixo x indica a
posição em que a bala atingiu o anteparo e o eixo das abscissas representa a
quantidade de balas recebidas. De modo semelhante, se o primeiro orifício for
tampado e o segundo for aberto, o detector mostrará a curva P2 indicada na
figura1(b).
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Agora, se ambas as fendas estiverem abertas e as balas forem disparadas,
as probabilidades mostradas em P1 e P2 se somam, formando assim uma nova
curva P12, indicada na figura1(c).
Esse comportamento é o esperado para qualquer tipo de partícula que possa
atravessar as fendas, e que possa ser lançada em direções de certa forma
aleatórias, como no exemplo citado acima.
No caso das ondas, espera-se outro comportamento. Adaptando-se o
aparato, o colocando agora na água, de forma que não fique completamente imerso
e posicionando uma fonte de ondas no lugar da metralhadora, como mostra a
figura2(a). Com esse aparato, que é um tipo de cuba de ondas, poderão ser
diferenciados os dois casos.
Quando a onda gerada pela fonte atravessa a fenda, uma nova frente de
onda é gerada. Quando a nova onda atinge o aparato, o detector marcará sua
intensidade I1 em cada ponto como mostra a figura2(b). Uma curva I2 semelhante
será mostrada no caso da primeira fenda ser fechada e a segunda aberta. Até
agora, pouco mudou em relação ao caso das partículas, se não o fato do gráfico não
se tratar de probabilidades e sim da intensidade em cada ponto. Essa intensidade é
proporcional à altura quadrática média da onda.
Figura 2: Esquema de montagem do experimento para as ondas (a), gráfico das
intensidades I1 e I2 (b) e gráfico da intensidade I12. Fonte: Feynman, 2005, pag. 133.
Porém, quando ambas as fendas estão abertas, duas frentes de onda são
geradas. No momento em que as frentes se encontram ocorre a interferência, onde
suas alturas são somadas. Nesse caso, a intensidade I12 medida será a soma
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quadrática média da altura das ondas, que indicará um padrão de interferência como
o mostrado na figura2(c).
Deve-se ressaltar que as partículas são detectadas em pontos específicos,
enquanto as ondas atingem toda a extensão do absorvedor, sendo diferenciados
apenas os valores de sua intensidade em cada ponto. Fica então evidente a
diferença de comportamento de uma onda e de uma partícula, no experimento da
dupla fenda. Analisando agora o caso dos elétrons, será mostrada como se dá
realmente a influência do observador nas medidas quânticas. O experimento
apresentado a seguir é uma simplificação de vários experimentos realizados no
decorrer de anos.
No lugar da fonte de ondas, será colocado um fio de tungstênio que,
quando aquecido por uma corrente elétrica, emite elétrons. O fio deve ser envolvido
por uma caixa de metal, cuja voltagem seja oposta a dele, com um orifício, para que
os elétrons saiam em direção às fendas, funcionado como uma metralhadora de
elétrons.
Figura 3: Fotografia do padrão de interferência formado pelos elétrons.
Fonte: Tipler, 2006, pag. 1 (com adaptações).
Quando os elétrons são atirados e uma das fendas está tampada, o padrão
encontrado é semelhante ao das balas, ou seja, a detecção é pontual e será obtido o
padrão de probabilidade P1. O mesmo vale para o padrão P2. Isso indica que o
elétron se comporta como uma partícula. Entretanto, quando as duas fendas são
abertas, os elétrons continuam sendo detectados de maneira pontual, mas, na
medida em que a quantidade de elétrons atirados se torna suficientemente grande,
pode ser observado um padrão de interferência semelhante ao da cuba de ondas,
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com pontos de intensidade máxima ou mínima, além dos pontos intermediários
como mostrado na figura 3.
Esse fato gera dúvida em relação à verdadeira natureza do elétron ser
corpuscular ou ondulatória. Com o intuito de investigar o fenômeno, uma fonte de luz
bastante intensa é colocada entre as fendas e o anteparo, como mostra a figura
4(a), de forma que quando os elétrons passarem por um dos orifícios, os fótons
serão espalhados, formando assim um “clarão” que indicará por qual das fendas o
elétron passou. As curvas P1 e P2 não sofrem alteração, e estão indicadas na
figura4(b) por P’1 e P’2, porém, quando as duas fendas estão abertas, o padrão
medido é semelhante ao do primeiro experimento (da metralhadora), como mostrado
na figura4(c).
Figura 4: Esquema de montagem do experimento para os elétrons e com a fonte de luz
(a), gráfico das probabilidades P’1 e P’2 (b) e gráfico da probabilidade P’12. Fonte:
Feynman, 2005, pag. 136.
Conclui-se então, que os elétrons, ao espalharem os fótons, deixam de se
propagar como ondas, ou, em outras palavras, os fótons exerceram influência sobre
os elétrons de forma a alterar-lhe a propriedade de se propagar como onda. Se a
intensidade da fonte de luz for reduzida, para que sua influencia sobre os elétrons
seja reduzida, a quantidade de fótons será tão pequena que um elétron raramente
se “chocará” com um deles. Além disso, se esse choque ocorrer, esse elétron em
especial terá suas propriedades modificadas, e novamente, de nada adiantará saber
por qual fenda ele passou. Os outros elétrons continuarão mostrando o
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comportamento de onda, mas, como eles não espalharam fótons, não será possível
saber qual caminho ele tomou para chegar ao medidor. A melhor opção seria reduzir
a freqüência da luz emitida, pois assim, os fótons teriam uma menor energia,
influenciando no mínimo possível o comportamento dos elétrons. Porém, se o
comprimento de onda da luz for maior que a distancia entre as fendas, o clarão
emitido quando os fótons são espalhados fica confuso, pois não se pode saber de
qual fenda ele saiu. Mais uma vez, é impossível determinar ao mesmo tempo o
caminho percorrido pelo elétron e o seu ponto de chegada no detector.
A princípio, não há evidências de que a mente do cientista que realiza o
experimento, seu humor ou seu estado de espírito exerça alguma influência na
observação desse fenômeno. O fato de a medida ser feita de forma indireta, ou
seja, através da utilização de artifícios que interagem com o objeto quântico medido,
faz com que a observação de fenômenos influencie inevitavelmente em algumas de
suas propriedades, como posição e momento.
No Livro “Quem somos nós?”, de William Arntz, Betsy Casse e Mark Vicente
(2007), um capítulo é dedicado a questão do observador. Logo no inicio é citada
uma afirmação de Capra:
Minha decisão consciente sobre a forma como vou observar o elétron irá até certo
ponto determinar-lhe as propriedades. Se eu fizer uma pergunta própria de partícula,
ele me dará resposta de partícula. Se fizer uma pergunta própria de onda, ele me
dará resposta de onda. (CAPRA apud ARTNZ et al, 2007)
De fato, pode-se escolher que propriedade se quer observar no elétron, como
pode ser visto no experimento descrito acima. Porém, isso não implica no poder da
mente humana em manipular a matéria, e sim, na possibilidade de criar condições
onde cada propriedade pode ser observada, aumentando ou diminuindo a
intensidade da fonte luminosa, por exemplo.
Um leitor leigo em Física Quântica pode compreender essas frases
descontextualizadas como uma forte evidência de que certas teorias são embasadas
pela ciência formal.
Um exemplo dessa prática pode ser visto no livro “O Segredo” de Rhonda
Byrne (2007). A idéia básica da obra é que a mente humana é capaz de manipular a
realidade a nossa volta, devido a um fenômeno chamado Lei de Atração, que
funciona da seguinte maneira: sempre que você pensa, sua mente envia um sinal ao
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universo. O universo por sua vez retorna o sinal com a mesma “freqüência”, ou seja,
se você pensa coisas boas, sua vida será repleta de coisas boas, mas, se você
pensa em coisas ruins, sua vida será repleta de coisas ruins. Além disso, segundo a
autora, se você desejar e crer que receberá, um cheque assinado e com a quantia
desejada vai chegar à sua caixa de correio.
O físico Fred Alan Wolf, um dos colaboradores do livro afirma:
Não estou falando do ponto de vista de uma ilusão ou de uma loucura imaginária.
Estou falando a partir de uma compreensão mais profunda básica. A física quântica
realmente começa a apontar para essa descoberta. Ela diz que você não pode ter
um Universo sem se importar em entrar nele, e que a mente está dando forma a
cada coisa que está sendo percebida. (WOLF apud BYRNE, 2007)
John Hagelin também faz uma declaração no mesmo sentido:
A mecânica quântica confirma. A cosmologia quântica o confirma. Que o Universo
emerge essencialmente do pensamento e que toda essa matéria que nos cerca é
apenas pensamento precipitado. (HEGELIN apud BYRNE, 2007)
A crença de Capra de que a consciência pode alterar as propriedades do
elétron, é uma forte colaboração para a crença de que a mente pode manipular o
universo que nos cerca. Essa afirmação, porém, não tem embasamento científico, e
se justifica apenas pela ambigüidade que a palavra “observador” assume quando se
tenta comparar a ciência com o misticismo oriental. Isso significa dizer que a mesma
palavra utilizada em contextos diferentes pode assumir significados diferentes.
Em seu livro “O Médico Quântico”, o físico Amit Goswami utiliza essas idéias
descontextualizadas para tentar unificar a medicina convencional com as várias
formas de medicina alternativa. Em sua definição de médico quântico ele afirma:
Um médico quântico é um praticante de medicina que conhece as falácias da visão
de mundo determinística newtoniana clássica, baseada na física, e nela já rejeitada
muitas décadas atrás. Um médico quântico fundamenta-se na visão de mundo da
nova física, também chamada de física quântica. E mais: o médico quântico vivifica a
mensagem da física quântica em sua prática médica. (GOSWAMI, 2006)
Essa visão de mundo quântica, segundo o autor, é a de que a consciência
pode determinar a condição de algo probabilístico, como o comportamento das
partículas subatômicas, idéia que se evidencia na citação seguinte.
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Diferente da concepção da física clássica, que vê o mundo como um mecanismo
determinado, nós só conseguimos entender a física quântica se a firmarmos sobre a
base do primado da consciência: A consciência vem em primeiro lugar; ela é o
fundamento de todo ser. Tudo o mais, inclusive a matéria é uma possibilidade da
consciência. E a consciência escolhe dentre essa possibilidade, todos os eventos
que vivemos. (GOSWAMI, 2006)
Em toda teoria citada até aqui, bem como em toda fonte de pesquisa utilizada
neste trabalho, nenhuma evidência de que a consciência humana pode interferir no
comportamento de partículas subatômicas foi encontrada, senão em obras da Nova
Era.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise aqui apresentada não teve a intenção de explorar toda a teoria
contida nas obras escolhidas, o que seria inviável para um trabalho deste tipo.
Existem ainda alguns temas que poderiam ser abordados, bem como diversas obras
que poderiam ser analisadas, o que exigiria um trabalho muito mais extenso e uma
abordagem mais profunda dos conceitos, tornando o texto excessivamente denso
para o leitor. Porém, o objetivo proposto foi atingido, pois se pode perceber que a
utilização dos conceitos de física quântica não foi feita de maneira adequada.
Apesar dos erros conceituais, algumas obras da Nova Era são muito bem
aceitas pelo público em geral, tendo em vista que o livro “O Segredo” foi Best-Seller
em 2007 e segundo a nota da editora Cultrix sobre o autor, “Capra é o autor de
diversos livros campeões de venda em vários países do mundo”. Concordamos com
Sagan quanto á necessidade de que a divulgação da ciência seja feita de forma
eficiente, para que as pessoas não adotem a pseudociência como fonte de
informações, que influenciem em suas decisões.
Fica a sugestão de desenvolvimento de um futuro trabalho, com uma análise
mais profunda, porém de fácil acesso. Esse trabalho exigirá maior disponibilidade de
tempo e dedicação, mas é importante como uma forma de divulgação científica
acessível ao público leigo.
"O país que não desenvolver a sua ciência e a sua tecnologia está fadado a
transformar-se em fornecedor de lenha, de latas de água e de seus recursos
naturais para os povos civilizados" – Lorde Rutherford em 1911 (DAMY, 2007).
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5. BIBLIOGRAFIA
Arntz, William et al. Quem Somos Nós?. Rio de Janeiro: Prestígio Editorial, 2007.
Brody, David Eliot; Brody, Arnold R. As Sete Maiores Descobertas Científicas da
História. São Paulo, Companhia das Letras: 1999.
Byrne, Rhonda. O Segredo. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007.
Capra, Fritjof. O Tao da Física: Um paralelo entre a física moderna e o misticismo
oriental. São Paulo: Cultrix,1975.
Damy, Marcelo. Os Percussores da Física no Brasil. Física na Escola, 8, 48-52,
2007.
Feynman, Richard Phillips. Comportamento Quantico in: Física em 12 Lições. Rio de
Janeiro: Ediouro, 129-147, 2003.
Goswami, Amit. O Médico Quantico: Orientações de um físico para a Saúde e a
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Knobel, Marcelo. Ciência e Pseudociência. Fisica na Escola, 9, 6-9, 2008.
Martins, Roberto de Andrade. A Física no final do século XIX: modelos em crise.
Disponível em: <http://www.comciencia.br/reportagens/fisica/fisica05.htm> Acesso
em: novembro de 2008.
Sagan, Carl. O Mundo Assombrado Pelos Demônios: A Ciência Vista Como Uma
Chama no Escuro. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
Segré, Emilio. Dos Raios X aos Quarks. Brasilia: Editora Universidade de Brasilia,
c1987.
Tipler, Paul A; Mosca, Gene. Física para Cientistas e Engenheiros, v3: Física
Moderna: mecânica quântica, relatividade e a estrutura da matéria. Rio de janeiro:
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Toledo, A. R. F. Mecânica Quântica: Uma nova imagem do mundo. Disponível em:
<cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/materia/resource/download/41399> Acesso em
novembro de 2008.
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