UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
CENTRO DE CIÊNCIAS DO AMBIENTE
Programa de Pós-Graduação em Ciências do Ambiente e
Sustentabilidade na Amazônia- PPG/CASA
O PROGRAMA BOLSA - FLORESTA: A RECOMPENSA FINANCEIRA
AOS
GUARDIÕES
DAS
FLORESTAS
NAS
UNIDADES
CONSERVAÇÃO DO ESTADO DO AMAZONAS
JANDER CARDENES SANTOS
Orientadora: Profª. Drª.Elenise Faria Scherer
MANAUS
2010
DE
FichaCatalográfica
(Catalogação realizada pela Biblioteca Central da UFAM)
Santos, Jander Cardenes
237p
O Programa Bolsa- Floresta: a recompensa financeira
aos guardiões das florestas nas unidades de conservação do estado do
Amazonas /Jander Cardenes Santos.- Manaus: UFAM, 2010.
150f.; il. color.
Dissertação (Mestrado em Ciências do Ambiente e
Sustentabilidade na Amazônia) –– Universidade Federal do
Amazonas, 2010.
Orientadora: Profª. Drª. Elenise Faria Scherer
1. Unidades de conservação- Floresta 2. Bolsa
floresta- Amazonas 3.Mudanças climáticas I. Scherer, Elenise Faria
(Orient.) II. Universidade Federal do Amazonas III. Título
CDU(1997) 504.03(811.3)(043.3)
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
CENTRO DE CIÊNCIAS DO AMBIENTE
Programa de Pós-Graduação em Ciências do Ambiente e
Sustentabilidade na Amazônia- PPG/CASA
O PROGRAMA BOLSA - FLORESTA: A RECOMPENSA FINANCEIRA
AOS
GUARDIÕES
DAS
FLORESTAS
NAS
UNIDADES
DE
CONSERVAÇÃO DO ESTADO DO AMAZONAS
JANDER CARDENES SANTOS
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Ciências do Ambiente e
Sustentabilidade na Amazônia – Nível: Mestrado
Acadêmico, para obtenção do Título de Mestre
em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na
Amazônia, Área de Concentração: Política e
Gestão Ambiental
Orientadora: Profª. Drª. Elenise Faria Scherer
MANAUS
2010
JANDER DOS CARDENES SANTOS
O PROGRAMA BOLSA-FLORESTA: OS EFEITOS DA RECOMPENSA
FINANCEIRA AOS GUARDIÕES DAS FLORESTAS NAS UNIDADES
DE CONSERVAÇÃO DO ESTADO DO AMAZONAS
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Ciências do Ambiente e
Sustentabilidade na Amazônia – Nível: Mestrado
Acadêmico, para obtenção do Título de Mestre
em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na
Amazônia, Área de Concentração: Política e
Gestão Ambiental
APROVADA POR:
_________________________________________
Profª. Drª. Elenise Scherer
Universidade Federal do Amazonas
________________________________________
Prof. Dr. Henrique dos Santos Pereira
Universidade Federal do Amazonas
_________________________________________
Profª. Drª. Andrea Borghi Moreira Jacinto
Universidade do Estado do Amazonas
Dedico Aos meus pais,
Lucio de Oliveira e Maria Joaquina,
que me deram o dom da coragem de persistir sempre.
Aos comunitários, que constroem a cada dia
um novo capítulo da história na Amazônia.
AGRADECIMENTOS
Todo o momento de agradecimentos também traz o sentimento de uma trajetória, não
mencionarei as ausências que tive com minha família especialmente a amada filha Maria
Julia, mas posso dizer o quanto estas foram importantes, a quem devo o fôlego, a energia e o
prazer necessários à realização dessa tarefa.
Agradeço a Profª. Dra. Elenise Scherer, por toda atenção e paciência, apoio,
compreensão, sei que aceitar um orientando no meio do caminho é um desafio para qualquer
orientador, por isso, muitos se esquivam. Mas poder contar com a professora Elenise no
período que considero o mais crítico de minha trajetória no Mestrado, que foi o momento de
desencanto e abandono diante dos desafios encontrados, foi de um valor imensurável.
Reconheço o papel sem igual desempenhado por ela em minha história e na construção deste
trabalho.
Aos demais professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Ambiente e
Sustentabilidade na Amazônia da Universidade Federal do Amazonas, que em muito
contribuíram para minha iniciação e processo de formação no campo sociedade e ambiente.
Aos amigos que encontrei e que me acompanharam nos trabalhos desenvolvidos
junto a Universidade do Estado do Amazonas, no Município de São Sebastião do Uatumã e o
IDESAM.
Agradeço a todos os amigos que contribuíram direta e indiretamente no percurso do
curso de Pós-Gradução em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia, em
especial a meu irmão Luciano Cardenes, Emeline Moraes, Elitânia Mourão, Jayme Pereira
Junior, Salomão Monteiro, Keila Aniceto, Sisley Monteiro, todos cúmplices e inspiradores
dos meus tempos de pesquisas e projetos pessoais.
“Se pode olhar, veja. Se pode ver,
repara". Ensaio sobre a cegueira.
(José Saramago, 2007).
RESUMO
Esta dissertação pretende trazer para o debate o Programa Bolsa Floresta - PBF instituído pelo
governo do Estado do Amazonas em 2007, com duplo objetivo: Compensar financeiramente
as famílias rurais residentes nas comunidades das Unidades de Conservação - UC e, ao
mesmo tempo, incentivá-las a conservação dos recursos naturais, ou seja, a manutenção da
floresta em pé. Este Programa de compensação financeira ambiental tem como área focal o
território mais conservado da região, a chamada Amazônia profunda, caracterizada por baixa
taxa de desmatamento. Ele foi criado a partir do reconhecimento governamental de que as
atividades antrópicas provocam efeitos nocivos na mudança global do clima e do
compromisso político com o desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, pretendeu-se
reconhecer e valorizar os povos tradicionais que passaram a ser denominados de guardiões da
floresta. O PBF é uma política governamental que envolve quatro componentes: o BolsaFloresta Renda que visa incentivar a inserção das famílias produtoras rurais nas cadeias
produtivas dos recursos florestais sustentáveis; o Bolsa Floresta Social direcionado para os
investimentos em infraestrutura e implementação de políticas de educação, saúde,
comunicação e transporte, o Bolsa Floresta Familiar que recompensa financeiramente as mães
das famílias rurais que assumiram o compromisso de não desmatar a floresta e o Bolsa
floresta Associação destinado a organização dos moradores das comunidades dentro das
Unidades de Conservação com objetivo de fortalecer a organização política e o controle social
do Programa.
Palavras - Chave: Bolsa-Floresta - Mudanças climáticas - Unidades de Conservação
Comunidades tradicionais.
ABSTRACT
This thesis attempts to bring to the debate Bolsa Floresta - PBF imposed by the government of
Amazonas state in 2007 with two objectives: Compensate the families living in rural
communities of Protected Areas - UC and at the same time, encourage them conservation of
natural resources, namely the maintenance of the forest. This compensation program has as
environmental focal area of the territory more conserved region, called the deep Amazon,
characterized by low rates of deforestation. He was raised from government recognition that
human activities cause adverse effects on global climate change and the political commitment
to sustainable development. Accordingly, we sought to recognize and value the traditional
peoples who came to be called guardians of the forest. The PBF is a government policy that
involves four components: the Forest-Income Grant which aims to encourage the integration
of rural producer families in the productive chains of sustainable forest resources, the Social
Forestry Grant directed to investments in infrastructure and implementation of education
policies, health, communication and transportation, Forestry Grant Family financially
rewarding mothers in rural families who have pledged not to clear the forest and forest
Association Scholarship for the organization of residents of communities within protected
areas with the aim of strengthening the political organization and social control program.
Key - words: Bag-Forest - Climate Change - Conservation Units - Traditional communities
LISTA DE FIGURAS
Pág.
Figura 01 - Unidades de conservação por categoria e período de governo.....................
Figura 02 – Local das reuniões comunitárias.....................
Figura 03 - Alguns Grupos sociais existentes na RDS Uatumã......................................
Figura 04 – Localização das Comunidades da RDS Uatumã..........................................
Figura 05 - Tempo de moradia das famílias entrevistas .................................................
Figura 06 - Motivos considerados pelos comunitarios como condicionantes para
32
43
74
105
107
108
residir na comunidade.
Figura 07 - Dificuldade para recebimento do B.F ..........................................................
Figura 08 - Atividades proíbidas a partir da implementação do B.F...............................
Figura 09 - Atividades que são permitidas segundo os entrevistados da comunidade.
Figura10 - Vista da comunidade Livramento..................................................................
Figura 11- Festa cultural comemorativa da soltura dos quelônios.................................
Figura12-Moradores da comunidade Maracaranã homens, mulheres, crianças ............
Figura 13 - Igreja e escola da comunidade Maracaranã...................................... .........
Figura 14 -. Localização das casas na parte mais alta da comunidade em terra firme.
Figura 15 - Pousada Tucuna localizada na Comunidade Nossa Senhora. do Perpetuo..
112
115
116
118
119
120
124
125
126
Figura 16 - Motivos condicionantes para residir na comunidade Maracaranã..............
Figura 17- Atividades produtivas permitidas na RDS Uatumã.....................................
Figura 18- Gastos do valor recebido do BF Família......................................................
Figura 19 – Atividades que foram proíbidas na RDS Uatumã.....................................
Figura 20 – Oficina de educação alimentar realizada na comunidade Maracaranã......
127
128
129
131
132
LISTA DE TABELAS E QUADROS
Tabela 01- Expansão das Unidades de Conservação no Amazonas
Tabela 02- Aspectos demográficos da RDS Uatumã ...............................................
34
42
Tabela 03- Componentes do Programa Bolsa-Floresta ...........................................
74
Tabela 04- Comunidades com o numero de famílias por pólos..................................
105
Quadro 01- Tipologias e Categorias de Unidade de Conservação estabelecidas pelo 8
SNUC
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AACBU- Associação Agroextrativista das Comunidades da Bacia do Rio Uatumã
AFEAM -Agência do Fomento do Estado do Amazonas
AGROAMAZON- Agência de Agronegócios do Amazonas
ARPA- Programa Áreas protegidas na Amazônia
ATTO - Amazonian Tall Tower Observatory
BFA- Bolsa-Floresta Associação
BFF- Bolsa-Floresta Familiar
BFR-Bolsa-Floresta Renda
BFS-Bolsa-Floresta Social
BID- Banco Interamericano de Desenvolvimento
CDB - Convenção sobre Diversidade Biológica
CDB- Convenção Sobre Mudanças Climáticas e Diversidade Biológica
CESTU- Centro de Estudos Superiores do Trópico Úmido
CEUC- Centro Estadual de Unidades de Conservação
CMC- Convenção Quadro de Mudanças Climáticas
CNPT- Centro Nacional para o Desenvolvimento Sustentável das Populações Tradicionais
CNUMAD- Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento
COP- Conferência das Partes
FAO- Organização para a Agricultura e Alimento
FAS- Fundação Amazonas Sustentável
FEPI- Fundação Estadual de Política Indigenista
FUNAFIFO- Fundo Nacional de Financiamento Florestal
FVS- Fundação de Vigilância Sanitária
GEE- Gases do efeito estufa
GEF -Fundo para o Meio Ambiente Global
IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
ICMBIO- Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
IDAM- Instituto de Desenvolvimento Agropecuário do Amazonas
IDESAM - Instituto de Desenvolvimento Sustentável do Amazonas
INPA- Instituto Nacional Pesquisas na Amazônia
INPE- Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
IPAAM -Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas
IPCC- Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas
ITEAM- Instituto de Terras do Amazonas
IUCN- União Internacional para a Conservação da Natureza
LBA- Programa de grande escala da biosfera - atmosfera na Amazônia
MMA -Ministério do Meio Ambiente
ONG-Orgnização não governamental
ONU- Organização das Nações Unidas
PBF- Programa Bolsa Floresta
PPG7- Programa Piloto de Para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil
PSA- Pagamento por serviços ambientais
PZFV- Programa Zona Franca Verde
RDSBRU- Reserva de Desenvolvimento Sustentado do Baixo Rio Uatumã
RDS-Reserva de Desenvolvimento Sustentável
REDD- Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal
RESEX -Reserva Extrativista
SDS- Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
SEPROR- Secretária de Estado e Produção Rural
SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação
UC- Unidades de Conservação
UEA- Universidade do Estado do Amazonas
UNEP-Programa da ONU para o Meio Ambiente
WWF- World Wildlife Fund
SUMÁRIO
S237p .........................................................................................................................................2
LISTA DE FIGURAS...............................................................................................................10
SUMÁRIO................................................................................................................................13
INTRODUÇÃO........................................................................................................................15
CAPÍTULO I- As Unidades de Conservação no Estado do Amazonas e as mudanças
climáticas .................................................................................................................................21
1.2 – A expansão das Unidades de Conservação no estado do Amazonas e as mudanças
climáticas. ................................................................................................................................32
1.2 - O Programa Zona Franca Verde.......................................................................................35
1.3 - A Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uatumã......................................................39
1.4 - A Lei Estadual de Mudanças Climáticas: ........................................................................44
CAPÍTULO II - O Programa Bolsa-Floresta: serviços ambientais e as mudanças climáticas. 53
2.1 – As comunidades locais e os conhecimentos tradicionais ................................................54
2.2- Serviços ambientais e a utopia de manutenção da floresta em pé.....................................60
2.3 - O Programa Bolsa-Floresta na RDS Uatumã e a manutenção da floresta em pé.............72
2.4 - O Programa Bolsa-Floresta: política governamental .......................................................92
CAPÍTULO III - A RDS Uatumã: as comunidades e o Bolsa-Floresta.................................102
3.1-Comunidade Santa Luzia do Jacarequara ........................................................................102
Localização e infraestrutura ...................................................................................................102
3.2 Comunidade Nossa do Senhora do Livramento................................................................117
3.3 Comunidade Nossa Senhora do Perpetuo Socorro do Maracaranã...................................124
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS...................................................................142
ANEXO 01- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido .................................................149
15
INTRODUÇÃO
Nas últimas duas décadas a questão ambiental alcançou status global,
principalmente, às mudanças climáticas e ao aumento da concentração de gases de efeito
estufa e seus prováveis efeitos sobre o clima do planeta que se converteram em uma das
maiores preocupações do nosso tempo, desencadeando a criação dos regimes de proteção para
os recursos naturais disputados diretamente pelos interesses políticos e econômicos presentes.
A imposição de estratégias e políticas torna-se patente nos contornos da nova configuração do
campo de interesses que envolve a política ambiental. Neste cenário a Amazônia se insere em
meio à configuração e expressão de forças e processos de mudanças, distintivos de outras
épocas, pois agora se realizam, de fato, a partir do local, envolvendo diferentes movimentos e
sentidos.
De acordo com Chesnais (1991), é somente no quadro da mundialização do capital
que se pode analisar a amplitude dos desastres ecológicos sofridos pelos países do Sul.
Também é primeiro, por esses países que se pode compreender que a destruição de qualquer
forma de resistência política das populações é a condição para que a pilhagem dos recursos
naturais se amplifique. Tal é uma das funções desempenhadas pelos programas das
organizações econômicas internacionais, porque, por detrás da compaixão pelas populações
do Sul, as relações com essas organizações apertam o cerco: a solução reside no
prosseguimento das políticas neoliberais em proveito dos grupos financeiros multinacionais e
a privatização dos serviços públicos.
É neste contexto que em 2007, o governo do Estado do Amazonas sancionou a Lei
Estadual de Mudanças Climáticas, cujo principal instrumento norteador compreende o
Programa Bolsa-Floresta, que em seu início, visava apenas ao pagamento no valor de R$50,00
(cinqüenta reais) para famílias que sob o regime de contrato não desmatem a floresta nas
Unidades de Conservação da chamada Amazônia profunda.
Em 2008, para fazer a gestão do PBF, cria-se a Fundação Amazonas Sustentável
(FAS), uma fundação sem fins lucrativos1 subsidiada com os recursos do governo do Estado
do Amazonas, a Coca-Cola e do Bradesco. Trata-se, pois de uma parceria entre o público e o
privado tão propicio nos tempos neoliberais. De fato, o Estado do Amazonas passou a integrar
1
Toda a gestão da contabilidade da FAS é feita pela Deloitte Touchge Tohmatsu e auditada externamente pela
PricewaterhourseCooper. As duas empresas possuem elevada reputação e atendem as mais importantes
empresas do Brasil e do mundo.
16
os debates em torno das mudanças climáticas, sendo possível, ainda que de forma preliminar
identificar três perspectivas discursivas: 1. aquela que diz respeito ao discurso científico com
articulações em nível mundial. O Programa de grande escala da biosfera-atmosfera na
Amazônia (LBA) é uma iniciativa internacional de pesquisa liderada pelo Brasil, planejado
para gerar novos conhecimentos, necessários à compreensão do funcionamento climatológico,
ecológico, biogeoquímico e hidrológico da Amazônia, do impacto das mudanças dos usos da
terra nesse funcionamento, e das interações entre a Amazônia e o sistema biogeofísico global
da Terra (BECKER, 2003).
O LBA está centrado em torno de duas questões principais que serão abordadas
através de pesquisa multidisciplinar, integrando estudos de ciências físicas, químicas,
biológicas e humanas. Responsável por uma enorme contribuição científica através de
modelagens climáticas, executando comparações experimentadas a distância por meio de
monitoramentos computadorizados, mediante a transmissão de dados levantados também à
distância, contudo internaliza-se nesta instituição a visão da Amazônia apenas como um
argumento de forte aceite das agências financiadoras de pesquisas aplicadas. O LBA
representa de forma exemplar a integração das ciências da natureza com as conexões
científicas globais de interesses planetários (SILVA, 2000, p.41).
2. Diz respeito aos estudos desenvolvidos Fearnside (2002), que comprovam os
impactos dos desmatamentos dos ecossistemas amazônicos, tendo como base o argumento de
que a floresta Amazônica como conhecemos vai se extinguir, se permanecer com essa
dinâmica de degradação, uma projeção do predomínio da vegetação de savana em detrimento
da floresta como a conhecemos.
3. A perspectiva que constitui a reflexão do Centro de Estudos Superiores do Trópico
Úmido da Universidade do Estado do Amazonas (CESTU/UEA). Este possui como um dos
elementos configuradores a importância da Amazônia no âmbito global, a partir da relevância
dos ecossistemas amazônicos na estabilidade química, mecânica, termodinâmica e climática
planetária. Estes enquanto elementos fundamentais para a incorporação da Amazônia aos
megaprojetos econômicos e políticos.
Na verdade, a noção de Desenvolvimento Sustentável desencadeou formas
estratégicas de administração, neste sentido existe atualmente novas dinâmicas sócioambientais sendo implantadas através de sistemas regulatórios e institucionais. A reafirmação
da Amazônia no processo mundial, destaca-se nos fóruns mundiais, nacionais e locais para
discutir a questão ambiental ( ZOURI, 2010).
17
Em consequência cria-se instituições ambientais que, à sua maneira, absorve o
discurso com viés no ecologismo, mas ainda reorientado e subordinado à esfera de interesses
em torno de projetos com forte vinculação e natureza econômica, estes têm sido
historicamente responsáveis pelo fardo desproporcional de contaminação e esgotamento dos
recursos naturais.
A crise ambiental pode ser expressão em consequência da metafísica que produziu a
separação entre o ser e o ente, que abriu caminho a racionalidade científica e instrumental da
Modernidade, que produziu um mundo fragmentado e coisificado em razão de seu pretenso
domínio do ambiente (LEFF, 2006).
Considerando este panorama de crise, foi proclamada com o 4º Relatório do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC sigla na língua
inglesa), divulgado em 17/11/2007, que as temperaturas médias na terra devem aumentar
entre 1.8 e 4ºC até o final do século. Em decorrência, ocorrerão alterações nos padrões de
distribuição e intensidade de ventos e nos regimes de chuvas, com a intensificação de eventos
climáticos extremos, como secas, inundações, furacões e tempestades tropicais, assim como o
aumento do nível dos oceanos (em virtude do derretimento das geleiras nos pólos, provocado
pelas altas temperaturas). Com isso as pressões internacionais são cada vez maiores,
condicionando o governo brasileiro a criar através de decreto nº 6.263/2007 o Plano Nacional
para Mudança do Clima (BRASIL, 2008, p.86).
O governo Brasileiro em 2008 apresentou a proposta que define ações e medidas que
visem à mitigação, bem como à adaptação à mudança do clima. Duas são as vertentes
principais que se apresentam: a difícil tarefa de equacionar a questão das mudanças do uso da
terra com suas implicações de grande magnitude nas emissões brasileiras de gases de efeito
estufa e a instigante tarefa de aumentar continuamente a eficiência no uso dos recursos
naturais (BRASIL, 2008).
As relações globais que processaram estas e outras mudanças na Amazônia também
impulsionaram e mobilizaram inúmeras produções intelectuais para reelaboração da
imaginação do Estado-Nacional sobre a Amazônia. Esta produção intelectual se deu com
novas concepções de regionalismos, das doutrinas de segurança nacional, das teorias
biologizantes, da mobilidade da força de trabalho na região, do sentido desses grandes
projetos para a Amazônia e da produção da sociedade civil amazônica, tudo isso para que as
novas características da economia e da sociedade regional se circunscrevessem a integração
nacional e a globalização (SILVA, 2000).
18
Assim no bojo das dinâmicas sócio-ambientais para a região, emerge a possibilidade
de uma crise dos padrões tradicionais em relação às políticas para a Amazônia, isto por serem
realidades históricas em torno de identidade políticas modernas. Aliás, os chamados povos e
comunidades tradicionais organizam-se em diversos movimentos sociais na luta por seus
espaços territoriais e territorialidades, argumentam que a crise ecológica dos povos e
comunidades tradicionais da Amazônia tem uma dimensão marcadamente política e
ideológica (BARRETO, 2001).
O poder de impor o procedimento de decisão diante do dilema da sociedade
contemporânea, de como promover a utilização de forma sustentável dos recursos naturais,
assegurando os valores e necessidades das gerações presente e futura, explicita-se como
discrepância das relações de poder, principalmente, no poder de procedimento que, triunfando
sobre a aparência da complexidade, se torna capaz de impor a todas as partes implicadas uma
determinada linguagem de valoração como critério básico para o trato dos conflitos
ecológicos distributivos. A governabilidade exige absorver opiniões cientificas e leigas em
diferentes escalas e níveis de realidade (ALIER, 2007).
As contradições da modernidade podem transformar-se na expressão máxima da
produção coletiva de riquezas e na apropriação privada do ambiente natural, constituindo a
um só tempo a produção ampliada do capital e o alicerce das questões ambientais. Porém,
possui pouca visibilidade nos debates no âmbito das configurações que passaram a incluir
estratégias de enfrentamento das mudanças climáticas no planeta, ou mesmo, nas ações de
políticas públicas ambientais.
Nosso interesse por este tema foi despertado e reelaborado a partir de um longo
processo de amadurecimento teórico e empírico. De um lado, a partir das impressões que
pude registrar nos encontros com as populações tradicionais diante da temática das mudanças
climáticas e em suas conferências; de outro, no levantamento realizado em órgãos estaduais e
federais de Estado como Ministério do Meio Ambiente (MMA) e a Secretaria de Estado do
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS).
Diante disso emergiu a proposta de trazer para a esfera do debate o Programa Bolsa
Floresta (PBF) instituído pelo governo do estado do Amazonas em 2007, com duplo objetivo:
Compensar financeiramente as famílias rurais residentes nas comunidades das Unidades de
Conservação (UC) e, ao mesmo tempo, incentivá-las a conservação dos recursos naturais, ou
seja, na manutenção da floresta em pé. Trata-se de abordar das interfaces do Programa Bolsa
Floresta nas formas de organizações e instituições sociais das comunidades da Reserva de
19
Desenvolvimento Sustentável RDS-Uatumã, localizada nos municípios de São Sebastião do
Uatumã, Itapiranga e Presidente Figueiredo a 320 quilômetros de Manaus. No plano amostral
a escolha se justifica por compreendermos que aí se faz presente uma rede de relações sociais
que podem ser percebidas nas demais Unidades de Conservação onde opera o PBF.
Esta pesquisa buscou verificar os efeitos dessa política governamental sobre o modo
de vida das famílias de produtores rurais nas comunidades tradicionais, sua contribuição para
a manutenção da floresta em pé e sua relação com as discussões das mudanças climáticas
globais, na RDS Uatumã.
Do ponto de vista teórico metodológico realizamos o trabalho de campo, momento
da coleta de dados a partir da observação direta (o olhar, o ouvir e o escrever) como
procedimento técnico primordial para o desenvolvimento da pesquisa privilegiando
investigação dos saberes e das práticas na vida social. Nesta ocasião conferimos através do
que Geertz (1989) chama de descrição densa, os modos de vida daquelas comunidades
envolvidas no Programa Bolsa-Floresta; o caráter determinante das relações sociais
envolvidas na racionalidade, sistemas de significação das praticas simbólicas e produtivas das
comunidades.
Realizamos entrevistas semi-estruturadas com coordenadores do Programa BolsaFloresta e lideranças comunitárias, foram aplicados formulários com perguntas abertas e
fechadas para as famílias das comunidades. Elegemos três comunidades2 da Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Uatumã: Nossa Senhora do Perpetuo Socorro do Maracaranã,
Nossa Senhora do Livramento e Santa Luzia do Jacarequara, no período de 11 a 15 de
fevereiro e 9 a 14 de MARÇO de 2010. Também realizamos o levantamento do estado da
arte, assim como as referências de estudiosos sobre a presente situação das UCs no Estado do
Amazonas.
Utilizamos também a gravação das entrevistas em acordo com a autorização dos
sujeitos da pesquisa; durante todas as etapas da pesquisa, o diário de campo consistiu o
registro das descrições do desenvolvimento do trabalho, contando com registro de imagens
por meio de fotografias durante o trabalho de campo também a partir da permissão e
conveniência dos sujeitos envolvidos.
Esta dissertação está estruturada em três capítulos: o primeiro capítulo abordamos o
processo de criação e implementação das Unidades de Conservação no estado do Amazonas a
2
As três comunidades do universo amostral da pesquisa foram selecionadas entre as 20 comunidades que
formam a RDS Uatumã para realização do trabalho de campo. O critério de seleção foram as sedes das
associações de moradores existentes nas três comunidades. Assim, as localidades escolhidas como objeto de
estudo foram: Jacarequara, Nossa Senhora do Livramento e Maracaranã.
20
partir de referências criticas a esse instrumento, tentamos realizar uma análise do processo
que se abre diante das mudanças climáticas no que está fortemente vinculado os serviços
ambientais, marcadamente caracterizada pela criação das condições jurídicas e institucionais
com o objetivo que não se limita a obtenção dos almejados recursos da comercialização de
carbono ou mesmo “doações internacionais”, mas que representa e detém um capital
simbólico.
Destacamos a investigação de aspectos do processo em curso da estadualização da
questão ambiental no Amazonas que se apresenta sob o ideário da noção desenvolvimento
sustentável, mas que internaliza interesses diversos da escala global, nacional e local na
chamada arena política, o jogo de identidades na apreciação ou depreciação das atividades
econômicas na RDS Uatumã enquanto elementos das condições que comprometem desde a
sua fundamentação até à promoção de políticas públicas.
O caminho que o governo do Estado do Amazonas tem delineado remonta as
ausências e ineficiências de suas ações para o desenvolvimento regional e faz parte de um
quadro mais amplo de processo civilizatório que envolve diferentes agentes sociais desde o
pequeno agricultor, a titularidade do acesso aos bens de uso comum e os interesses das
parcerias entre o neoinstitucionalismo governamental e as grandes empresas internacionais
como a Coca-Cola Company (de formas desiguais de participação).
Apesar de não ser tão notório, devido a forte destaque na mídia, a lei estadual de
mudanças climáticas não nasce em uma tarde de céu azul direcionada a solucionar a crise
ambiental ou incluir os debates de inclusão das mudanças climáticas, mas faz parte enquanto
manifestação explícita do jogo de interesses, da relação público privado, as reformulações
institucionais políticas que aqui denominamos de “campo ambiental das mudanças
climáticas” e neste campo está em disputa o controle do acesso aos recursos naturais.
No segundo capítulo abordamos a relevância do papel das comunidades tradicionais
nas Unidades de Conservação e a estreita e tradicional dependência dos recursos biológicos de
muitas comunidades locais com estilo de vida tradicionais, e a escolha legítima e desejável de
repartir equitativamente os benefícios derivados da utilização do conhecimento tradicional.
Contudo, ainda que reconhecidamente tenha surgido relativo avanço nas políticas de
inserção das comunidades tradicionais, permanece a luta destas comunidades pela terra e pela
floresta, para assegurar seu modo de vida, sua reprodução sociocultural, buscando romper
com a hegemonia da corrente preservacionista que, aliás, está presente nas matrizes dos
discursos científicos de técnicos e especialistas que tratam da temática das mudanças
21
climáticas, muitas vezes restritamente através de modelagens morfoclimáticas, e, que
deliberadamente, prescrevem receitas de controle populacional e de controle do acesso aos
recursos naturais na Amazônia.
Para melhor analisar a relação do Programa Bolsa-Floresta e os pressupostos dos
interesses comuns, interesses conflitantes, jogos de poder, instituições, intervenções,
lançamos mão do conceito de campo simbólico nas abordagens feitas por Pierre Bourdieu
(2007).
É possível dizer que existe um arcabouço institucional na relação local/ global
expresso nas estratégias de contenção do desmatamento, envolvendo os princípios dos atuais
campos de discussões sobre Reduções de Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). A
criação e gestão de novas UCs e a criação e aprovação da Lei que norteia a política Estadual
de Mudanças Climáticas em curso no Estado do Amazonas. Neste sentido, a intenção foi de
trazer para o debate o processo de institucionalização e suas implicações na esfera política,
econômica e social o Programa Bolsa-Floresta e das mudanças climáticas na RDS Uatumã.
Apresentando os significados que vem se consolidando no Estado do Amazonas como um
tema consensual que não diz respeito unicamente à questão dos limites ou controle do acesso
dos recursos naturais, mas também a outros aspectos da política ambiental em curso.
No terceiro capítulo, delineamos os aspectos socioambientais que envolvem as
comunidades Santa Luzia do Jacarequara, Nossa Senhora do Perpetuo Socorro do Maracaranã
e Nossa Senhora do Livramento, e suas relações com o Programa Bolsa-Floresta. Tentamos
apontar os alcances e limites do processo de transformações no modo de vida daquelas
populações envolvidas. Comparamos os componentes: Renda, Social, Familiar e associação
na forma como são apresentados diante das vozes dos principais atores que presenciam e
vivem seus efeitos. Destacamos ainda as políticas públicas existentes no local, sua relação
com o ambiente e a organização política.
CAPÍTULO I- As Unidades de Conservação no Estado do Amazonas e as
mudanças climáticas
1.1 As Unidades de Conservação e as comunidades tradicionais
22
Na Amazônia, as preocupações ambientais e especialmente as mudanças climáticas,
estão na pauta do dia e os olhares do mundo todo se voltam para as questões referentes ao
maior reduto de floresta tropical do planeta. Assim, desde a década de 1980 têm sido criadas
áreas de conservação, tanto federais como estaduais, no esforço de conservação da floresta
amazônica.
A criação das primeiras áreas protegidas no mundo, sejam as Unidades de
Conservação de proteção integral, sejam as Unidades de Conservação de Uso Sustentável, foi
marcada por discussões e controvérsias sobre a “preservação” com inclusão de pessoas que
habitam as UCs. Esse debate, no Brasil, está associado ao estabelecimento dos modelos
importados que não se limitam aos aspectos estruturais dos parques ou reservas baseados no
modelo preservacionista Wilderness3, mas também à própria forma de pensar a relação do ser
humano com o ambiente (CASTRO, 2000).
Em meados de 1980, houve a descentralização do tema do campo da biologia para
outras áreas do saber. O debate saiu do determinismo preservacionista e expandiu-se e passou
a considerar a existência de grupos sociais e culturais que desenvolvem um estilo diverso de
conduta de relação com o ambiente, daquele orientado pela lógica de estilos de vida
incompatíveis com a conservação dos recursos ambientais, (DIEGUES, 2000).
De acordo com Santilli (2009, p.78), o aquecimento global decorre das atividades
humanas, principalmente, da queima de combustíveis fósseis, como carvão mineral, petróleo e
gás natural, pelo setor industrial e de transporte, que responde por cerca de 80% da
concentração dos chamados gases de efeito estufa na atmosfera terrestre (principalmente
dióxido de carbono, metano, óxido nitroso, etc.). Os outros 20% são atribuídos ao uso
inadequado da terra, principalmente às queimadas e o desmatamento das florestas tropicais.
Historicamente, os países industrializados têm sido responsáveis pela maior parte das
emissões globais de gases de efeito estufa (os Estados Unidos respondem por 30% das
emissões globais). Atualmente, vários países em desenvolvimento, como China, Índia e
Brasil, também estão entre os grandes emissores. O Brasil é responsável por 5% das emissões
globais, mas a maior parte das emissões do Brasil (3/4) decorre do uso inadequado da terra,
como o desmatamento e as queimadas na Amazônia.
3
A noção de wilderness popularizada através das discussões a cerca das áreas protegidas nos Estados Unidos
contribui para uma nova fase do ambientalismo baseadas no debate entre preservacionistas e conservacionistas, o
qual foi bem sintetizado no conflito entre as propostas de Gifford Pinchot e John Muir (LEIS, 2004).
23
De acordo com o 4º Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas das Nações Unidas4 (IPCC sigla na língua inglesa), divulgado em 17/11/2007, as
temperaturas médias na terra devem aumentar entre 1.8 e 4ºC até o final do século. Em
decorrência, ocorrerão alterações nos padrões de distribuição e intensidade de ventos e nos
regimes de chuvas, com a intensificação de eventos climáticos extremos, como secas,
inundações, furacões e tempestades tropicais, assim como o aumento do nível dos oceanos
(em virtude do derretimento das geleiras nos pólos, provocado pelas altas temperaturas). Com
isso, as Unidades de Conservação (UC) atualmente são tidas como o melhor mecanismo de
conservação de áreas florestais pelos organismos nacionais e internacionais, que também
passaram a absorver os debates das mudanças climáticas, no sentido estratégico para redução
de emissões de gases poluentes (RICKETTS, 2010 e FREITAS, 2008).
Antes de continuarmos o caminho tomado pelas dinâmicas sócio-ambientais das UCs
no Estado do Amazonas e sua relação com as mudanças climáticas, convém uma breve
abordagem de outro item acerca do processo histórico das áreas protegidas no Brasil. Assim, é
possível dizer que, no país, as primeiras UCs foram criadas a partir de 1930, seguindo o
modelo norte americano de proteção implementado no Parque de Yellowstone, primeira área
protegida criada no ocidente. As Áreas de Proteção Integral, funcionam como um reduto
natural e não preveem habitantes em sua região. Conhecidos como preservacionistas, “os
defensores destes modelos, partem do pressuposto que o homem necessariamente degrada o
ambiente em que vive. Este modelo de área protegida de uso indireto, que não permite haver
residentes no interior da área mesmo quando esses se tratam de comunidades tradicionais
presentes há muitas gerações, parte do princípio de que toda relação entre sociedade e
natureza é degradadora e destruidora do mundo natural e selvagem” (...) (DIEGUES, 2001
p.60)
Acrescente-se a este fato de que no Brasil o ano de 1934 marca uma considerável
mudança na preocupação ambiental no Brasil, pois é nesse momento que foram promulgados
alguns documentos relativos à gestão dos recursos naturais: o Código de Caça, o Código
Florestal5, Código de Minas e o Código de Águas (BARBIERI, 2004).
4
Existem controversias nas conclusões feitas pela 4º Relatório do IPCC apesar de serem muito difundidas e
normalmente aceitas, cientistas ainda tem incertezas a respeito da realidade da influência antrópica nas mudanças
climáticas. Um entre os diversos autores que não concordam com as afirmações do painel do IPCC é o Dr. Luiz
Molion, que afirma em sua pesquisa que o assunto não vem sendo abordado de maneira isenta e faz uma grande
crítica ao 4º relatório ao afirmar em sua pesquisa que pesquisadores como Monte e Harrison Hierb concluíram
“que mais de 97% das emissões de gás carbônico são naturais, provenientes dos oceanos, vegetação e solos,
cabendo ao homem menos de 3% (Molion, 2007).
5
Refere-se ao primeiro Código Florestal brasileiro que foi editado em 1934 pelo Decreto Federal n. 23.793/34.
24
De acordo com Araújo (2007), o Código Florestal é de interesse especial para as
Unidades de Conservação. Nele começou a reflexão da gestão dos recursos naturais diante do
Estado, estabelecendo os limites para o direito de propriedade. O Decreto Federal nº
23.793/34 foi elaborado com a ajuda de diversos naturalistas e uma doutrina que apregoava a
direta intervenção estatal na proteção de florestas mesmo em terras privadas, pois eram
consideradas bens de interesse comum a todos os habitantes do país.
Cabe ressaltar que no contexto da criação deste Código que as UCs6 aparecem com
maior destaque por se apresentarem como novas oportunidades tangíveis para experiências
locais dos chamados pagamentos por serviços ambientais. Simultaneamente, também,
configuram a expressão de forças e processos de mudanças, distintivos de outras épocas, pois
agora se realizam, de fato, a partir do local, envolvendo diferentes movimentos e sentidos,
seja quando se trata de promover o desenvolvimento sustentável, seja para o efeito de
enfrentamento das mudanças climáticas mundiais. O instrumento de proteção do ambiente
natural mundial permeia as articulações institucionais locais e globais (SILVA, 2000).
Contudo, a abordagem sobre as UCs no estado do Amazonas não pode se limitar a
perspectiva dos agentes que se posicionam favoravelmente a elas, assim é necessário
problematizá-los para além da eficácia do discurso ambiental a partir do campo de poder
agora
em
um
campo
mais
amplo
formado
pelo
contexto
das
mudanças
climáticas( BOURDIEU, 2007).
De fato o estudo das UCs, no âmbito das mudanças climáticas enquanto projeto
ambiental, traz à tona o fator motivador das diferentes ações ambientais e não apenas sua
funcionalidade em relação ao uso ou conservação dos recursos ambientais. Neste sentido,
historicamente as implementações e operações de UCs caracterizam-se por incorporarem
como preocupação central a preservação ou conservação7 do ambiente, relegando ao segundo
plano os agentes sociais locais, ou seja, os projetos de implementação das UCs em geral não
são gerados a partir de demandas das comunidades residentes do local, “mas produto de
6
A terminologia Unidades de Conservação vem sendo historicamente utilizada no Brasil para designar todas as
diferentes áreas criadas no país, à exceção de Terras indígenas, seja pelo poder público, seja pela sociedade civil,
para atender os objetivos específicos da proteção dos recursos renováveis. Mas apenas recentemente, através da
Lei 9985/2000, essa terminologia teve sua conceituação legal definitivamente estabelecida. (MEDEIROS et al
2006, p. 23).
7
Os preservacionistas inspirados por Muir adotavam visão mais radical preservando áreas de qualquer uso
permitindo que essas fossem usadas apenas para fins recreativos e educacionais. Os conservacionistas guiados
por Pinchot contrapunham as propostas de Muir, acreditavam que os recursos naturais poderiam ser explorados
de forma racional de maneira que não causasse degradação (LEIS, 2004). O Preservacionismo estava voltado
para a reverência da natureza no sentindo espiritual de apreciação, pretendia proteger a natureza do
desenvolvimento em massa, causados pelo crescimento econômico. A divergência de idéias entre Gifford
Pinchot e John Muir ficou conhecida nos Estados Unidos por representar claramente as diferenças entre a
conservação dos recursos e a preservação pura da natureza (DIEGUES, 2000).
25
intervenção de interesses de agentes globais, ou mesmo passando a figurar como importantes
instrumentos de política de gestão territorial para compensação de usos ambientais industriais,
extrativistas e agrícolas” (AUDIBERT, 2004, p. 34).
Do ponto de vista político, Menarin (apud Becker 2009 p.19) enfatiza que o estudo
das UCs deve contribuir para um questionamento sobre o modo como a sociedade e o Estado
brasileiro vêm por muito tempo tratando o ambiente, seja via mera extração predatória de
recursos para atender a mercados globais, seja apenas via conservação generalizada, que
pouco ou nada beneficia a população.
Uma das questões de fundo é reconfiguração das dinâmicas de expansão do capital
na Amazônia que fazem com que as populações rurais/florestais sejam ainda necessárias ao
capital sob os laços de subordinação, sobretudo por sua imagem atualmente associada ao
imaginário da natureza conservada com suas exóticas populações (LEROY, 2010. p. 100).
a dificuldade e a importância da gestão dessas áreas para que se tornem indutores de
ações voltadas para o desenvolvimento sustentável local8 e a equidade social.
De uma maneira geral, a partir de uma leitura mais desmistificadora do papel das
Unidades de Conservação de Uso Sustentável, para a necessidade de conservar a floresta e a
sua biodiversidade que antes poderiam ser um obstáculo as ambições da expansão capital,
converteram-se como um fator para a acumulação do capital e dos governos do Norte na
ultima fronteira
como espaços de diferentes territorialidades9, levando em consideração as
múltiplas territorialidades que só podem ser melhor operacionalizadas se vistas sob a
perspectiva diacrônica, pois as diferentes temporalidades expressas nessas territorialidades
podem informar sobre as diversas racionalidades e identidades culturais das distintas
organizações sociais estabelecidas ao longo da história com esses espaços. O que deve
contribuir para uma renovada interpretação sobre as mudanças ambientais para além da
insuficiente visão do ser humano essencialmente destruidor e da idealização da natureza em
estado puro dotada de uma organização e racionalidade intrínseca (BECKER, 2009).
8
A noção de desenvolvimento sustentável local é polissêmica e apresenta muitas controvérsias. Apesar de
polêmica, a noção sobrevive latente nos embates acadêmicos, nos setores público e privado. Pode-se afirmar que
os pontos de convergência centram-se no entendimento sobre a difícil relação entre economia e ecologia. (LEIS,
1995).
9
Cf Paul Little: argumenta que territorialidade é o esforço coletivo de um grupo social para ocupar, usar,
controlar e se identificar com uma parcela especifica de seu ambiente biofísico, convertendo-a assim seu
Território (LITTLE, 2002).
26
A Agenda 2110 e PPG7 representam a iniciativa de integração entre governo e
sociedade nacional e internacional, na busca pelo desenvolvimento local e global. Percebe-se
com isso, que o governo brasileiro adota uma nova postura diante dos interesses voltados para
a Amazônia, desarticulando a administração centralizadora e paradoxalmente propondo um
modelo de desenvolvimento com base no crescimento econômico, participando de um novo
contexto de operacionalização baseado na governança ambiental. Entretanto, devemos
considerar que a participação da sociedade na construção de um futuro socio-ambiental,
deverá ser confirmada na prática, pois só assim será possível reavaliar a participação de
entidades representantes da sociedade civil, a exemplo de ONGs, na governança ambiental e
local.
No cenário local, podemos levar em consideração que o Estado do Amazonas
apresenta atualmente uma das maiores áreas de florestas tropicais preservadas do mundo
(MARINELLI et al, 2007), com pequenas taxas de desmatamento e reconversão do uso do
solo em relação ao percentual total da sua extensão. Isso significa não só uma pressão
internacional para conservação da biodiversidade de tais florestas, mas um atrativo de
processos de mercantilização do ambiente pelo capitalismo. É frente a essa pressão, que o
governo do estado do Amazonas implantou uma política ambiental, configurada na
elaboração de um Sistema Estadual de Unidades de Conservação (SNUC) e na criação do
Centro Estadual de Unidades de Conservação-CEUC.
Não obstante, estão surgindo estratégias de integrar as Unidades de Conservação `a
problemática das questões climáticas globais, contudo tais ações são traçadas dentro do
processo de racionalização do mundo do qual emerge a crise climática, ou seja orientada pelas
forças cegas do mercado (LEFF, 2002).
Estas estratégias parecem romper com a inexistência de estratégias definidas das
Unidades de Conservação às questões globais, embora ainda não expressa de forma clara,
principalmente no que diz respeito à dinâmica local e as prováveis dissonâncias das políticas
públicas.
É preciso ressaltar que o ano 2000 marca a modificação na estrutura de grande parte
das áreas protegidas, pois é quando se concretiza a idéia que surgiu no fim da década de 1970,
ou seja, de estabelecer o Sistema Nacional de Unidades de Conservação –SNUC, este
10
Mais que uma simples decisão consensual extraída de documento de quarenta capítulos durante a Conferência
das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), realizada no Rio de Janeiro em
1992, a Agenda 21 traduz em ações o conceito de desenvolvimento sustentável que não pode se limitar apenas à
visão tradicional de estoques e fluxos de recursos naturais e de capitais (SACHS,1993).
27
subordinado ao Ministério do Meio Ambiente, sob a forma de lei a qual estabelece critérios e
normas para a criação, implantação e gestão das unidades de conservação. Irving (2002)
citado por Medeiros et al (2006, p.24) aborda que:
Inicialmente objeto de diferentes leis, criadas em distintos momentos como resposta
às demandas nacional e internacional de proteção, as categorias de manejo de
Unidades de Conservação foram, em 2000, reconceituadas, agrupadas e
apresentadas segundo uma visão estratégica e sistêmica, dirigida à gestão, em um
único instrumento legal, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza (SNUC), resultado de aproximadamente dez anos de discussões entre
governo e sociedade.
O SNUC11 é regulamentado pela lei federal Nº 9985/2000 que descreve as tipologias
e categorias de manejo de áreas protegidas e estabelece critérios e normas para a criação,
implantação e gestão das mesmas. Assim, o SNUC definiu que: “Uma Unidade de
Conservação é um espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas
jurisdicionais, com características naturais relevantes e legalmente instituído pelo poder
público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de
administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (BRASIL, 2000, p.1).
Além de normatizador dos espaços territoriais, o SNUC estabelece diretrizes para o
planejamento de criação e implantação das Unidades de Conservação, refletida nos critérios e
usos dessas áreas, divididas em dois grupos, com características específicas, os de Proteção
Integral e os de Uso Sustentável (quadro 01). Observa-se a predominância do pensamento
preservacionista e conservacionista discutido no século XIX como sendo um modelo para
pensar o ambiente e o manejo das áreas protegidas nos Estados Unidos (DIEGUES, 2000).
Quadro 01: Grupos e Categorias de Unidade de Conservação estabelecidas pelo SNUC
Unidades de proteção
integral
Estação Ecológica
Reserva Biológica
11
Unidades de uso sustentável
Área de Proteção Ambiental
Área de Relevante Interesse Ecológico
Parque Nacional
Floresta Nacional
Monumento Natural
Reserva Extrativista
Em 1992 foi encaminhado ao Congresso Nacional o projeto de lei referente ao Sistema de UCs, após vários
anos de tramitação no Congresso Nacional, em 2000 foi sancionada a Lei Federal Nº 9.985, que instituiu o
Sistema Nacional de Unidades de Conservação-SNUC, instrumento legal que dispõe sobre as Unidades de
Conservação no país (BRASIL, 2000).
28
Refúgio da Vida Silvestre
Reserva de Fauna
___________
Reserva de Desenvolvimento Sustentável
___________
Reserva Particular do Patrimônio Natural
Fonte: ( IRVING, 2002).
De todas as tipologias de Áreas Protegidas, a Unidade de Conservação é a que
apresenta maior visibilidade. Este fato pode estar relacionado principalmente a dois fatores:
em primeiro lugar, porque ela concentra em um único instrumento e terminologia todas as
principais tipologias anteriores de Áreas Protegidas que foram criadas no país desde os anos
30; em segundo lugar, porque, por meio de uma reorganização, foi possível ordenar de
maneira mais clara, o processo de criação, gestão e manejo destas áreas (MEDEIROS, 2006).
Neste sentido, as ciências humanas procuraram demonstrar que o conceito de
natureza não é universal argumentando que diversas comunidades interagem com o seu meio
de acordo com os valores e significados desenvolvidos em sua cultura. Conforme demonstra
Leff (2001, p. 79) “As práticas de uso dos recursos dependem do sistema de valores das
comunidades, da significação cultural de seus recursos, dialógica social e ecológica de suas
práticas produtivas e de sua capacidade para assimilar a estas, conhecimentos científicos e
técnicos modernos”.
Partindo do argumento cultural, muitos teóricos passaram a intervir em favor destas
populações, e travaram um grande debate com os preservacionistas que consideram apenas o
meio ambiente natural biológico. “Para eles, a natureza selvagem é intocada, intocável e é
impensável que uma unidade de conservação (parque nacionais e reservas ecológicas) possa
proteger, além da diversidade biológica a diversidade cultural”. (DIEGUES, 1993 p. 236).
Para Salomon (et al 2005 p.7), cabe ressaltar que as UCs ganharam maior
visibilidade para alguns teóricos e estudiosos, Ongs e membros do movimento social, quando
questionaram o grande número de pessoas que estavam sendo expulsas de suas terras, umavez
que em muitos lugares que foram transformados em UCs no Brasil, obedeceram a lógica de
uso restrito das terras, o que obrigou várias famílias a saírem do local onde viviam há várias
gerações, gerando um contingente de pessoas que, desvinculadas de suas terras, tiveram
abaladas suas bases de subsistência material e cultural.
Neste sentido, o território pode ser entendido como um espaço de sobrevivência que
recebe inúmeros significados simbólicos; além de ser um lugar para a reprodução biológica do
grupo, é o lugar de reprodução de cultura. A ligação do território com o ambiente é explicita,
29
pois o território se torna, antes de mais nada uma fonte de recursos, “meios materiais de
existência” (HAESBERT, 2006, p.47).
Contudo, os processos de acumulação do capital impõem regras que externamente
definiram formas de territórios estranha a sua compreensão e uso do espaço. Aliás, muitos
grupos sociais começaram a partir dos anos de 1990, a buscar formas jurídicas as quais
poderiam se enquadrar para afirmar e manter suas territorialidades, dessa forma emerge uma
permanente negociação entre a territorialidade expressa pelo Estado e territorialidade vividas
por eles (LEROY, 2010).
Segundo Valêncio (2010), a eficácia performativa dos órgãos ambientais produziram
determinados mecanismos institucionais que tem a seu modo absorvido as linguagens e
movimentações políticas (tanto da esfera federal como estadual) ainda que não tornem
visíveis situações contraditórias em suas ações: que, de um lado, mantém aspectos de
marginalização das comunidades tradicionais estabelecidas agora dentro das Unidades de
Conservação de Uso Sustentável; e, no outro, a retórica que combina o apelo à “conservação”
do ambiente com a valorização da participação e dos conhecimentos das populações locais.
Supostamente, este parece ser um movimento progressista que pretende repensar o papel
daqueles que, durante muito tempo, foram tidos apenas como apêndices de políticas
ambientais transformando a postura preconceituosa adotada desde a criação dos primeiros
parques públicos.
A partir do III Congresso Mundial de Parques Nacionais, realizado em Bali na
Indonésia, em 1982, firmou-se uma nova estratégia que as Unidades de Conservação só
teriam sentido com a elevação da qualidade de vida da população dos países em vias de
desenvolvimento. Reafirmam-se os direitos das sociedades tradicionais e sua determinação
social, econômica, cultural e espiritual, recomendado-se aos responsáveis pelo planejamento e
manejo das áreas protegidas que respeitassem a diversidade dos grupos étnicos. Dessa forma
questionou-se definitivamente a visão romântica das áreas de preservação como paraísos
protegidos, um dos ideais norteadores da criação do Parque Nacional de Yellowstone
(DIEGUES, 2000).
No Brasil, a criação de UCs foi marcada por altos e baixos, crises e protestos.
Podemos dizer que as áreas de preservação, no país, foram conduzidas ao desenvolvimento de
políticas públicas voltada para a proteção da natureza, e atualmente esse modelo de proteção
esta centrado no SNUC (Lei 9985/2000). Deste modo, pode-se dizer que tais mudanças
influenciaram o cenário de construção das áreas de conservação no país.
30
No entanto, a construção do arcabouço político institucional que funciona atualmente
no Brasil, para além de uma ação isolada ou imposição do Estado, caracteriza-se por diversas
exigências de setores e atores que se somaram e formaram uma complexa rede de interesses e
demandas, atuando em diferentes níveis nacionais e internacionais (MEDEIROS et al, 2006).
A partir da segunda metade da década de 1980, consolidam-se os cenários de
conservação dos recursos naturais. O ambientalismo nacional se fortalece delineando a
construção de uma gestão compartilhada do ambiente em unidades de conservação. O
surgimento das organizações não-governamentais (consequência dos movimentos sociais), o
aparelhamento institucional da política de áreas protegidas brasileiras, a participação de
grupos sociais antes excluídos na articulação de novos paradigmas de desenvolvimento e
conservação dos recursos naturais, e a instituição de grandes projetos/programas de
cooperação técnica-financeira firmados com agências multilaterais, para a conservação da
biodiversidade brasileira, são produtos desta gestão compartilhada, que redefine um novo
momento na gestão do território (DUTRA, 2008).
Nesse contexto, no I Encontro Nacional de Seringueiros, em 1985, é concebido o
ideário das Reservas Extrativistas (RESEX) “como uma alternativa ao desenvolvimento
sustentável” (ALLEGRETTI, 1994 e DIEGUES, 2004), enquanto unidade territorial de uso
comunitário para fins de reprodução continuada do modo de vida dos extrativistas, no sentido
de estabelecer a posse da terra e justiça social, ao passo que são apoiados por agências
multilaterais, como o Banco Mundial.
Assim sendo, em 1990, dois anos após o assassinato de Chico Mendes, as reservas
extrativas são regulamentadas como “espaços territoriais destinados à exploração
autosustentável e conservação dos recursos naturais renováveis, por população extrativista”
(BRASIL, 1990) sendo criadas as primeiras RESEX’s, do Alto Juruá, Chico Mendes e Rio
Cajari, todas no Acre.
De acordo com Araujo (2007), a partir da Conferência das Nações Unidas sobre
Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92 o plano da cooperação internacional dá os primeiros
passos para concepção da “gestão de classe mundial” da biodiversidade, torna-se um marco
estratégico para regulação da preservação da biodiversidade Mundial, notadamente para o
31
Brasil, pois, ratifica-se a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB)12, e é assinado o
projeto Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais Brasileiras (PPG7).
De acordo com os objetivos da Convenção sobre Diversidade Biológica, cada parte
deve se responsabilizar em implementar programas e projetos visando a “conservação da
diversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa e
eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos” estabelecendo um
sistema de áreas protegidas visando manter a integridade dos processos ecológicos (MMA,
2000).
Em 1996 é instituído no PPG7, o Projeto Corredores Ecológicos, financiado pelo
Banco Mundial, países do G7 e Fundo para o Meio Ambiente Global (GEF), com uma
estratégia inovadora para conservação da biodiversidade no território brasileiro, por
intermédio da delimitação de extensos corredores de preservação das florestas tropicais nos
dois biomas brasileiros mais importantes: a Floresta Amazônica (com área aproximada de 52
milhões de hectares) e a Mata Atlântica (com aproximadamente 12,5 milhões de hectares),
composto por Unidades de Conservação, terras indígenas e áreas de interstícios, formando um
extenso tapete verde visando conter as forças de fragmentação da floresta, resguardando a
integridade conectividade ecológica da paisagem, com recursos da ordem de R$ 100 milhões
para 2008 ( MMA, 2007).
Essa nova estratégia política de proteção da natureza se consolida de maneira mais
evidente, a partir dos anos 90, configurando de forma definitiva a criação de um Sistema
Nacional de Unidades de Conservação (Lei no 9.985/2000) capaz de criar e gerir áreas
protegidas no território nacional.
Antes disso, já vinha se discutindo os avanços para definição de duas novas
categorias de unidades de conservação. Primeiramente, por volta de 1996 surge nas planícies
de inundações do médio Solimões no estado do Amazonas, a Reserva de Desenvolvimento
Sustentável (RDS) Mamiraúa, proposta pelo pesquisador Márcio Ayres, com fins científicos,
12
a CDB tem por objetivo a conservação da diversidade biológica, o uso sustentável de suas partes constitutivas
e a repartição justa e eqüitativa dos benefícios que advêm do uso dos recursos genéticos. Ora, se trata de
incentivar o uso sustentável e a conservação da diversidade, além de negociar com os governos, deve-se
evidentemente tratar com as populações que habitam as áreas detentoras de recursos genéticos e que são suas
guardiães efetivas. Quando mais não fora, e dentro de uma estrita perspectiva economicista, seria necessário
convencer tanto os governos quanto as populações locais das vantagens da conservação e do uso sustentável
sobre outras opções possíveis - criação de gado, extração de madeira etc. - mas destrutivas da biodiversidade. Ou
seja, levar em conta o que os economistas chamam de custo de oportunidade. A CDB é um instrumento de
direito internacional, acordado e aberto a adesões durante a reunião das Nações Unidas realizada no Rio de
Janeiro em junho de 1992. (CUNHA 1999)
32
inserindo a Amazônia na concepção de alternativas para conservação dos recursos naturais
(QUEIROZ, 2005 e BORGES et. al, 2007).
1.2 – A expansão das Unidades de Conservação no estado do Amazonas e as mudanças
climáticas.
No Brasil, existem 304 Unidades de Conservação Federais, sob os cuidados do
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO)13, sendo 131 de
Proteção Integral e 173 de Uso Sustentável. Assim nota-se o considerável aumento
quantitativo de Unidades de Conservação sendo criadas na Amazônia, conforme a (figura1).
No entanto, a simples criação não é garantia da realização dos objetivos para o qual essas
áreas foram criadas, pois muitas não possuem plano de gestão e manejo ou ainda
caracterizam-se pela ausência ou escassez de recursos humanos e financeiros para
implementação dos mesmos (ICMBIO/MMA, 2008).
125
100
RDS
APA
75
ARIE
RESEX
FLONA
PARNA
50
EE
REBIO
25
0
1974 -1979
1979 -1985
1985 -1990
1990 -1995
1995 -2003
2003 -2009
Figura 1- Unidades de Conservação criadas na Amazônia por categoria.
Fonte: Pereira (2009).
A expansão das Unidades de Conservação no estado do Amazonas nos últimos anos
aponta para a criação de mais Unidades estaduais que federais. Este avanço quantitativo não
apaga as dificuldades e contradições materializadas na cultura política da população envolvida
nos processos participativos. Observa-se segundo as regras estabelecidas pelo sistema que
estes processos são marcados pelo baixo índice de organização e representação.
13
Órgão ambiental do governo Brasileiro, responsável pela conservação e gestão ambiental federal, o Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), criado pela lei 11.516, de 28 de agosto de 2007.
Disponível em http://www.icmbio.gov.br/menu/institucional, acessado em 22/06/2010
33
Notoriamente, o governo do Estado do Amazonas apoiado nas estratégias de
captação de recursos nacionais e internacionais, consolida uma rede de conservação do
Amazonas, composta por “um conjunto de instituições e iniciativas integradas”
principalmente a partir das ações do Sr.Virgílio Viana14, Secretário de Estado do Meio
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – SDS, criada em 2003, no Governo Eduardo
Braga. Nesta função (2003-2008), coordenou o processo de concepção e implementação do
Programa de Desenvolvimento Sustentável Zona Franca Verde, do Programa Bolsa Floresta e
da primeira Lei de Mudanças, como veremos adiante (AMAZONAS, 2007, p.2).
Essa tendência aparentemente tem sido distinta da União, uma vez que prioriza a
criação de Unidades de Conservação de Uso Sustentável muitas vezes voltada para interesses
políticos específicos em detrimento aos reais interesses da sociedade local. Entretanto, o
governo estadual vem contendo sistematicamente a criação de áreas de proteção integral, pois,
em muitos casos, após estas serem decretadas, origina-se uma infinidade de problemas
institucionais, jurídicos e socioculturais como, por exemplo, a sobreposição de terras
tradicionalmente ocupadas.
A cooperação com instituições como a World Wildlife Fund (WWF) – Brasil, a
Foundation Moore vinculado ao Programa Áreas protegidas na Amazônia (ARPA)
contribuíram para a composição do atual sistema de unidades de conservação estaduais, com
suas quarenta e uma Unidades de Conservação regulamentadas e delimitadas, cobrindo uma
área de 19 milhões de hectares (tabela 01), um incremento considerável na evolução das
unidades de conservação no Amazonas.
Tabela 01: Expansão das Unidades de Conservação no Amazonas
14
Ano
Área acumulada (ha.)
Até 2002
2003
2004
2005
7.938.661.82
11.470.529.70
11.894.959.70
15.233.615.90
Número de
UCE Criadas
12
6
1
12
Número de UCE
(acumulado)
12
18
19
31
Atualmente o Sr. VirgílioViana ocupa o cargo de Diretor geral da Fundação Amazonas Sustentável.
34
2006
2007
2008
2009
Total
16.106.344.18
16,583.386.48
16.583.386.48
19.007.032.62
19.007.032.62
2
1
1
6
41
33
34
35
41
41
Fonte: ( DOMINGOS, 2010)
Como se sabe a relevância da mobilização ambientalista que se intensificou na
década de 1990, a partir da Eco - 9215, consolidou a Amazônia brasileira16 num cenário para o
qual diversos olhares internacionais direcionaram sua atenção, projetando-a em nível mundial
como patrimônio da humanidade em risco, assim:
As potencias mundiais passaram a financiar programas e projetos, (como por
exemplo o PPG7) com o objetivo de promover ações direta e indiretamente, de
desenvolvimento sustentável, por meio de cooperação técnica internacional, para os
países do chamado terceiro mundo, como via de conter crises ambientais futuras.
Concomitante as interpretações preservacionistas, a discussão da sustentabilidade
social abarcou os chamados povos tradicionais enquanto agentes de proteção
ambiental, mas que nem sempre estão nas mesas de construção destas discussões”
(CASTRO, 2000).
A institucionalização das questões que envolvem as mudanças climáticas começa a
se expandir em um movimento que não está restrito ao escopo global, mas que parece
espraiar-se por mecanismos e instrumentos conectados ao nível nacional e local, assim todo
este processo pode constituir uma nova geopolítica ambiental capaz de servir aos interesses
envolvidos em uma disputa pelo poder de acesso e escolha dos processos que envolvem os
recursos naturais, de lutas internas no campo de produção dos debates das mudanças
climáticas. Esta não mais visa à apropriação direta dos territórios, mas à influencia na decisão
das esferas governamentais sobre o uso de seus recursos naturais (BECKER, 2004).
No estado do Amazonas, esta influência é marcadamente caracterizada pela criação
das condições jurídicas e institucionais como o Programa Zona Franca Verde e a Lei de
mudanças Climáticas, este ultimo com o objetivo em um só tempo a obtenção dos almejados
15
A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente ou Conferência Rio 92, teve como objetivo regular a
ação humana em relação a emissão de gases que afetam o efeito estufa e o acesso a informação genética. Deste
encontro resultaram as Convenções Sobre Mudanças Climáticas e Sobre Diversidade Biológica. Esta Convenção
foi assinada no dia 04/06/1992 e ratificada pelo Senado da República 04/02/1994.Decreto Legislativo n 01,
Diario Oficial da União.
16
De acordo com Silva (2000), a Amazônia já estava integrada ao mundo desde sua entrada na história ocidental.
O “esquecimento da região Norte pelo Brasil correspondeu a lembrança crescente das forças mundiais pela
Amazônia. O mundo está presente na Amazônia desde sua “descoberta”, a ação mundial nas realidades regionais
precisa ser percebida nos períodos de estagnação, crise e prosperidade econômica.
35
recursos da comercialização de carbono ou mesmo “doações internacionais”. É importante
ressaltar que estão previstos em lei que todo e qualquer rendimento proveniente da
comercialização dos serviços e produtos ambientais deverão, obrigatoriamente, serem
investidos na implementação dos Planos de Gestão das Unidades de Conservação nos termos
do artigo 49 da Lei Complementar nº. 53, de 05 de junho de 200717 (AMAZONAS, 2007).
Portanto, identificar com melhor precisão essas dificuldades e contradições no atual
processo de estabelecimento e expansão de UCs no Estado do Amazonas permeia a esfera
política local, onde as escolhas que estão sendo feitas, dificilmente revelam as interseções
entre os interesses, a cultura e a economia, mas nitidamente estão inseridas na racionalidade
que dirige as ações como o PBF, assim como para políticas de conservação no Estado.
Diante deste cenário, configuram-se novos processos desagregadores na articulação
do envolvimento do local com o global, ou seja, os efeitos desta relação podem ora
impulsionar, ora imobilizar as dinâmicas socioculturais das populações locais, não só
geograficamente, mas alterando ritmos de vida, dos recursos e das escolhas. Neste sentido as
famílias rurais das Ucs no Estado do Amazonas podem ser as primeiras a serem atingidas
pelos danos ao ambiente e as últimas a se beneficiarem das políticas de conservação
ambiental (ARRUDA, 1999).
Neste sentido, as UCs tem um papel importante, seja na inclusão dos debates das
mudanças climáticas, como também passaram a encontrar lugar nas ações e propostas de
planos de desenvolvimento no estado do Amazonas na administração do ex governador
Eduardo Carlos Braga, como por exemplo, a criação do Programa Zona Franca Verde, como
veremos a seguir.
1.2 - O Programa Zona Franca Verde
O programa governamental Zona Franca Verde (PZFV) criado pelo governo do
Estado do Amazonas em 2003, de acordo com o discurso oficial trata-se da iniciativa de
17
A Lei n.º 3.184, de 13 de novembro de 2007 publicado no Diário Oficial do estado do Amazonas de 13.11.07
altera, na forma que especifica, a Lei n.° 3.135, de 05 de junho de 2007, e dá outras providências, por exemplo,
no Art. 1.° A Seção I do Capítulo VI da Lei n.° 3.135, de 05 de junho de 2007, que "INSTITUI a Política
Estadual sobre Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas,
estabelecendo outras providências: passa a vigorar com a seguinte redação no Art. 6.° assim fica o Poder
Executivo Estadual autorizado a participar de uma única fundação privada(Fundação AS, sem fins lucrativos,
cuja finalidade e objeto se destinem ao desenvolvimento e administração dos Programas e Projetos de Mudanças
Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável, conforme previstos na Lei n° 3.135, de 05
de junho de 2007, e na Lei Complementar n.° 53, de 05 de junho de 2007, bem como gerenciar serviços e
produtos ambientais, definidos nesta lei(Amazonas, 2007, p. 1).
36
implementação do Desenvolvimento sustentável18 no Estado do Amazonas após a Eco-Rio de
1992, sobretudo, uma estratégia de ação do então Governador Carlos Eduardo Braga para a
prevenção e controle do desmatamento na região. Contudo, o PZFV compreende uma ação
estadual que não está articulada com o Plano de Ação para a Prevenção e Controle do
Desmatamento na Amazônia Brasileira, criado e desenvolvido pelo Grupo Permanente de
Trabalho Interministerial do Governo Federal com a finalidade de propor medidas e
coordenar ações que visem à redução dos índices de desmatamento na Amazônia
(AMAZONAS, 2003, p.6).
O referido plano apresenta estimativas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(INPE) de Junho de 2003 sobre o alarmante desmatamento na Amazônia Brasileira, menciona
que foram desmatados cerca de 25.500 km2 na Amazônia Legal no período entre agosto de
2001 e agosto de 2002. Um aumento de 40% em relação ao período anterior. De acordo com
esta projeção, a área cumulativa desmatada na Amazônia Legal chegou a 631.369 km2 em
2002, correspondente a 15,7% de toda floresta amazônica brasileira, também ressalta que o
ritmo do desmatamento na Amazônia tem sido muito superior à criação de novas unidades de
conservação, resultando em pressões crescentes sobre áreas identificadas como prioritárias
para a conservação, desta forma, chama a atenção para a “ausência de ações efetivas de
implantação destas áreas protegidas (demarcação, sinalização, atividades educativas com
populações de entorno, planos de manejo e atividades sustentáveis com populações locais”
(BRASIL, 2004, p.9).
Assim é possível identificar como expressão da articulação do PZFV e o Plano de
Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal do Governo Federal,
o fortalecimento e ampliação do Sistema Estadual de Unidades de Conservação, tendo como
meta a criação de 4,2 milhões de hectares de novas unidades de conservação constitui uma
das principais medidas dentre as ações do PZFV19, primeiro por esta adoção de medidas
18
A noção Desenvolvimento Sustentável é consideravelmente recente, que embora germinada na década de
1960, ganha força nos anos de 1970, nos anos de 1980 ele aparece nos relatórios da União Internacional para a
Conservação da Natureza ( IUCN em suas iniciais inglesas), em 1987 ganhou popularidade pelo chamado
Relatório Bruntland ( Nosso Futuro Comum), que o define da seguinte forma: “Desenvolvimento Sustentável é o
desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer as capacidades das gerações futuras
de satisfazer as suas próprias necessidades. Neste sentido, um dos fatores preocupantes é o aparente consenso
que existe a respeito do termo, ainda que o conteúdo seja diferente segundo o grupo social que o utiliza. Para
certos setores orientados pelo “novo marketing” significa uma proteção do "verde" independente da realidade
social envolvida. Para os empresários trata-se, no fundo, do desenvolvimento que possa garantir a
"sustentabilidade da taxa de lucro" baseada, sobretudo na criação e venda de equipamentos contra a poluição.
Para certos governos, o termo muitas vezes constitui o preâmbulo de documentos oficiais para solicitação de
empréstimos internacionais a organismos financeiros que foram obrigados a introduzir em seus critérios de
aprovação de projetos as variáveis ambientais (”(CMMAD, 1991 e DIEGUES 2000 ).
37
voltadas para mudanças estruturais que visam corrigir os erros de políticas governamentais
pretéritas destacam-se:
-Assistência técnica florestal, com a criação da Agência de Florestas e Negócios
Sustentáveis do Amazonas – Florestas do Amazonas/Secretaria de Desenvolvimento
Sustentável;
-Assistência técnica para a agropecuária e piscicultura sustentáveis, com a
reformulação do Instituto de Desenvolvimento Agropecuário do Amazonas – IDAM; e da
Agência de Agronegócios do Amazonas – Agroamazon;
-Regularização fundiária, com a criação do Instituto de Terras do Amazonas –
ITEAM;
-Programa de etnodesenvolvimento indígena sustentável, com a reformulação da
Fundação Estadual de Política Indigenista – FEPI;
- Incentivos econômicos para sistemas de produção sustentáveis, com a reformulação
da Lei Estadual de Incentivos Fiscais;
- Crédito para sistemas de produção sustentáveis, com a reformulação da Agência do
Fomento do Estado do Amazonas – AFEAM e a criação do Cartão Zona Franca Verde e
programas setoriais de crédito;
- Modernização e desburocratização do licenciamento ambiental do manejo florestal,
com o fortalecimento do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas – IPAAM;
- Reformulação do processo de licenciamento ambiental de projetos de infraestrutura,
sob a coordenação da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
– SDS;
Para além de seu caráter discursivo, O PZFV encaixa-se no ideário do
desenvolvimento sustentável que não se traduz em ações práticas, constrói a imagem baseada
no marketing verde ao afirmar adoção de medidas voltadas para mudanças estruturais que
visam a corrigir os erros de políticas governamentais pretéritas. De fato, torna-se indissociável
o entendimento do PZFV do processo de intervenções governamentais que historicamente
marcaram as relações dos interesses do grande capital nacional e internacional
subalternizando os povos e comunidades na Amazônia a apêndices de planos, programas e
projetos econômicos e empresariais, geralmente cobertos com o véu do falso caráter redentor
das ausências e ineficiências das políticas de desenvolvimento para região (SILVA, 2000).
19
Os dados do Programa Zona Franca Verde foram extraídos do site da Secretária de Estado do Meio Ambiente
e Direito Sustentável. Disponível em: http://www.sds.am.gov. Acesso em: 22 de novembro de 2009.
38
Neste sentido, a criação no final da década de 1960, da Zona Franca de Manaus,
constitui-se como uma das ações do Estado em posse do governo da ditadura militar com
objetivo de desenvolver economicamente o Estado do Amazonas a partir do fortalecimento do
comércio, da implantação de um parque Industrial e de elevação da eficiência técnica e
econômica das atividades associadas ao setor primário. No entanto nem sua originalidade nem
o compromisso com o desenvolvimento regional faziam parte das dinâmicas historicamente
produzidas conhecidas das zonas francas, mas que ponto pacífico a sua natureza de
dinamização e desenvolvimento de setores da economia mundial em regiões em processo de
integração do sistema capitalista (SILVA 2000 apud PINTO 1986, p. 20).
As políticas de desenvolvimento econômico propostas pelo governo federal do setor
primário mostraram-se ineficazes e, ao contrário do esperado, constatou-se um esvaziamento
do interior do Estado, grande queda na produção estratégica de alimentos e crescente processo
migratório para a capital, induzindo ao surgimento de favelas na cidade de Manaus com o
aparecimento de precárias condições de moradia. O esvaziamento tendêncial dos municípios
também reflete a centralização dos investimentos de grande porte no centro urbano
desenvolvido dotado de infra-estrutura para atender as necessidade de acumulação e
circulação do capital (BENTES, 1993).
Para Moura (2002), todo o processo do modelo de desenvolvimento ao Pólo
Industrial de Manaus, desencadeou uma concentração de capital na capital do Amazonas,
relegando os municípios a enormes problemas como a migração determinada pelas condições
de vida das pessoas que vivem na área rural dos pequenos municípios do Estado do
Amazonas.
Contudo, para Singer (1998), as migrações campo-cidade são caracterizadas através
de fatores de expulsão e fatores de atração correlacionados com o modo de produção
capitalista, que desemprega no campo e cria esperança de trabalho na cidade. Nesta
perspectiva, emerge o espaço não mais apenas como lugar de partida e destino ou como
superfície de medida entre estes dois pontos.
Diante desse problema, o governo do estado do Amazonas, em 1998, criou um
programa de desenvolvimento voltado para o interior, denominado Terceiro Ciclo (alusão aos
dois primeiros ciclos o da Borracha e o da Zona Franca de Manaus). Mas, os resultados
alcançados por esse programa não corresponderam às expectativas e o interior continuou sua
fase de estagnação.
39
O PZVF deveria ser direcionado na resolução dos gargalos da cadeia produtiva no
interior do Estado do Amazonas (produção, transporte, beneficiamento e industrialização,
comercialização). Assim, uma obtenção de linha de credito para incremento da produção do
pequeno agricultor era tido pelo governo como um dos principais problemas a ser
enfrentados. E por meio do Cartão Zona Franca Verde, priorizando suas ações nas RDS
localizadas no Estado do Amazonas.
Para Oliveira (2008), os projetos como Terceiro Ciclo e Zona Franca Verde
ocorridos no Estado do Amazonas, na verdade acabam por favorecer apenas uma camada
econômica (elites locais) e estão totalmente voltados para o incremento da atividade agrícola
de grande porte que compreende a monocultura de grãos ou a pecuária de extensão. O grande
problema é que este setor de atividades é o que justamente o que menos emprega e menos
investe no desenvolvimento local onde se instala.
É nesta breve reconstituição do processo político econômico em que se delineou o
PZFV, em concomitância à criação em 2004, da Unidade de Conservação de Uso Sustentável
Uatumã, conforme abordaremos a seguir.
1.3 - A Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uatumã
A Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uatumã foi criada pelo governo estadual
em 25 de Junho de 2004 (pelo Decreto nº 24.295 de 25/06/2004) com 402 mil hectares,
abrangendo os municípios de São Sebastião do Uatumã, Itapiranga e Presidente Figueiredo,
estando localizada a nordeste do Estado do Amazonas distante 243 km de Manaus, sendo
cortada em toda sua extensão pelo Rio Uatumã. Existe na Unidade de Conservação 20
comunidades rurais, alcançando cerca de 257 famílias, distribuídas em 38% do território da
RDS.
Contudo, existem aspectos contraditórios da explicação oficial dos órgãos
governamentais estaduais em que pese sobre processo de criação da UC Uatumã que envolve
os antecedentes históricos da criação da RDS Uatumã20, remontam o ano de 1996, quando
estudos feitos por agentes do Centro de Preservação e Pesquisa da Usina Hidrelétrica de
20
No ano de 2000, em Assembléia Geral realizada pela então Associação Agroextrativista das Comunidades da
Bacia do Rio Uatumã (AACBU), entidade representante dos moradores da Reserva, optando pelo processo de
criação da RESEX do Rio Uatumã. Em 2004, servidores do Centro Nacional para o Desenvolvimento
Sustentável das Populações Tradicionais (CNPT) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA) realizaram viagem de reconhecimento da região do rio Uatumã para avaliação e
identificação das comunidades a serem inseridas na RESEX. Posteriormente a essa atividade, o CNPT/IBAMA,
através de sua Coordenação Geral em Brasília, repassou para os Governos Estaduais a responsabilidade pela
conclusão dos estudos e a criação e implantação de Reservas Extrativistas, passando de instância federal a
estadual (AMAZONAS, 2008).
40
Balbina, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(IBAMA), Instituto Nacional Pesquisas na Amazônia (INPA), Instituições Ambientais
Estaduais e Municipais e Organizações Não Governamentais (ONG’s), propunham a criação
da Reserva de Desenvolvimento Sustentado do Baixo Rio Uatumã/RDSBRU, incorporada ao
Projeto Parques e Reservas/Corredores Ecológicos do Brasil, do Ministério do Meio
Ambiente (MMA-PPG7), visando a proteção e ao uso dos recursos naturais da região
(AMAZONAS, 2008).
A partir do ano de 2003 a Secretaria do Estado de Desenvolvimento SustentávelSDS, criada no governo Eduardo Braga, após estudar a região, resolveu que seria criado outra
categoria de Unidade de Conservação e não mais uma RESEX, mas sim uma RDS. Segundo
fontes orais, junto aos moradores mais antigos da RDS, foi dito que a primeira escolha feita
pela comunidade teria sido a modalidade Reserva Extrativista. No entanto, todo o processo
que desembocou na criação RDS Uatumã, e no momento subseqüente, por meio de manobras
burocráticas com a intenção de atender a interesses diversos, por exemplo, de empresas
madeireira Precious Woods e Itautinga existentes nos limites da RDS Uatumã (IDESAM,
2008).
Neste sentido, Bentes (2005) argumenta que a legislação 21 no disposto no artigo 20,
§2°, estabelece que a RDS seja de domínio público. Todavia esta categoria de UC prevê a
desapropriação de áreas particulares em seu interior, quando for necessário. Neste sentido,
deverá ser verificado se o uso da propriedade particular nos limites da Reserva não irá colidir
com o objetivo da exploração sustentável dos recursos ambientais, identificando essa
possibilidade, o caminho é a desapropriação da área particular.
Na tentativa de evitar esses problemas, o governo do Amazonas, como mencionado
anteriormente, vem determinando nos decretos de criação das UCs, que ficam excluídas as
possíveis propriedades privadas nas reservas. Esta atitude também pode nos indicar a ausência
de um estudo anterior à criação da reserva, que versa sobre a situação fundiária do local, que
estabelece a possibilidade de existir propriedade privada, ou que seja comprovada a
titularidade da área.
No propósito aqui é registrar aspectos sociohistoricos do processo de morfologia
social da RDS Uatumã. O acesso pode ser feito por via fluvial nos trechos Manaus/São
21
A lei do SNUC, caracterizada principalmente pela ideologia conservacionista, que impregnou dispositivos
legais, que tratam sobre categorias defendidas pelo socioambientalismo. A Unidades de Conservação de uso
sustentável, por exemplo, mencionada no artigo 20, §1°, que dispõe sobre RDS, cujo objetivo básico é a
“preservação da natureza”. Conservação e preservação são vocábulos advindos da concepção conservacionista,
marcando a norma jurídica com o valor de “natureza intocada e intocável” (DIEGUES, 2001).
41
Sebastião do Uatumã ou Manaus/ Urucará, seguindo de barco estilo (voadeira). Pela via
terrestre o acesso pela rodovia BR-174, até a AM-240 de Presidente Figueiredo. A partir desta
via segue-se até a estrada da Morena localizada próximo à barragem da hidrelétrica. Uma
outra alternativa bastante utilidade é ir pela rodovia AM-010 até o município de Itapiranga. A
partir desse trecho o acesso à Reserva é feito por via fluvial pelo rio Uatumã.
O ambiente RDS Uatumã caracteriza-se pela presença de Floresta de Terra Firme,
havendo também áreas de igapó, baixio, campinas e campinaranas, mas principalmente uma
rica fauna e ambiente que favorece o extrativismo de frutos de plantas nativas, como o
cupuaçu, açaí, bacaba, castanha e outros. É importante ressaltar que a reserva é um dos
remanescentes do ambiente que foi perdido com a construção da hidrelétrica de Balbina22.
O modo de vida das comunidades rurais do Uatumã – também chamados pelo
discurso oficial de guardiões das florestas, está condicionado ao ciclo do ambiente, pois o
fenômeno da enchente e da vazante regula em grande parte o cotidiano destes grupos sociais,
de tal modo que o mundo do trabalho obedece o ciclo sazonal quando desenvolvem as
atividades de extrativismo vegetal, agricultura, pesca e caça. Na época da enchente dos rios a
cultura da roça, o cultivo da agricultura, para subsistência bem como a pesca e a caça, ficam
em grande parte comprometida (NODA et alii, 2001).
De acordo com o Plano de Gestão 23 da RDS Uatumã aprovado pela SDS em 2008 a
questão fundiária constitui um grande desafio, (a exemplo do que ocorre na maioria das
localidades na Amazônia) a situação das famílias residentes em sua totalidade não possui
documentação alguma em relação a posse de terra. Os cartórios municipais de Itapiranga e
São Sebastião do Uatumã não possuem informação sobre os títulos fundiários concedidos nas
áreas da Reserva. Até 2004 a empresa madeireira Precious Woods24 possuía uma área titulada
correspondente a 27,57% da RDS Uatumã (AMAZONAS, 2008).
22
A usina hidrelétrica de Balbina, localizada no Estado do Amazonas, teve seus primeiros indícios no início da
década de 70 e entrou efetivamente em funcionamento em 1989. A integração da Amazônia ao território
nacional foi uma das principais metas do regime implantado. A instalação dos "Grandes Projetos" na região foi
considerada o principal meio para viabilizar o objetivo. A usina hidrelétrica de Balbina é parte desse plano. Os
impactos do projeto tomaram proporções assustadoramente negativas, como, mínima capacidade de gerar
energia, por área florestal destruída e invasão de territórios das comunidades tradicionais e indígenas (THOMÉ,
1993, p. 18).
23
O Plano de Gestão é um “documento técnico e gerencial, fundamentado nos objetivos da Unidade de
Conservação, que estabelece o seu zoneamento, as normas que devem regular o uso da área e o manejo dos
recursos naturais, inclusive a implantação da estrutura física necessária à gestão da Unidade” (SEUC, 2007).
24
A Empresa madeireira multinacional Precious Woods possui uma área correspondente a 27, 57% da RDS
Uatumã, uma sobreposição de títulos de terras com a UC, esta representa uma ameaça de impacto constante na
qualidade da água pela exploração de madeira, o que aponta a necessidade de monitoramento constante
(IDESAM, 2008)
42
As atividades ligadas ao turismo encontradas na RDS Uatumã são relacionadas à
pesca, seja ela amadora, esportiva ou recreativa. O período em que se desenvolvem essas
atividades é de agosto a dezembro, época em que o nível da água está baixo e proporciona
melhor pescaria.
A RDS Uatumã possui uma população de aproximadamente 1.222 moradores,
distribuídos em 257 famílias, organizadas em 20 comunidades, conforme tabela 02:
Tabela 02 - Aspectos demográficos da RDS Uatumã.
Unidade de
Conservação
RDS Uatumã
Área
Municípios
Nº de
Comunidades
Nº de
Famílias
Nº de
moradores
424.430,75
há
Itapiranga, São
Sebastião do
Uatumã
20
257
1222
Fonte: ( FAS, 2009)
As comunidades presentes na RDS estão distribuídas ao longo dos rios Uatumã,
Jatapú e nas margens dos principais igarapés da região. Geralmente as casas são construídas
nas áreas mais altas, local onde se assenta o núcleo comunitário (centro social, igreja, escola)
que servem de espaço para os principais eventos sociais, como celebrações religiosas e
reuniões comunitárias (figura 02). No caso da RDS Uatumã, as reuniões também são
realizadas na base da administração da Reserva localizada na entrada da reserva,
principalmente quando reúnem os diferentes agentes sociais envolvidos na vida cotidiana da
UC.
Figura 02 – Local das reuniões comunitárias
43
Os dados da pesquisa indicam certa precariedade no sistema de comunicação da RDS
Uatumã. A telefonia pública é inexistente ou não funciona em todas as comunidades
envolvidas na pesquisa.
Os principais meios de transportes utilizados pelos moradores locais são o barco
popular, conhecidos como “barco de linha” que fazem o transporte para os núcleos urbanos -,
a voadeira, o barco comunitário, e o motor rabeta, utilizados geralmente para o transporte
intercomunitário. A época de maior dificuldade de acesso às comunidades concentra-se nos
meses de setembro, outubro e novembro, o período do verão amazônico e da vazante dos rios.
Na saúde, os principais problemas relacionam-se a falta de posto médico,
equipamentos e pessoal capacitado para o atendimento de doenças mais graves. Apesar da
presença de agentes de saúde em algumas comunidades, nem todas possuem seus próprios
profissionais. A incidência de malária se apresenta como principal causa de doenças na RDS,
responsável por 95% dos casos, provavelmente em função do uso da água, já que a maioria
das comunidades utiliza o rio como principal fonte de banho e captação de água. O acesso à
energia na RDS Uatumã é garantido e restrito pelo uso de geradores comunitários, movidos a
diesel ou gasolina.
Além dos grupos informais, as comunidades rurais precisam se organizar
juridicamente, através de Associações Comunitárias, principalmente a fim de garantir o
acesso a determinados benefícios sociais como o Programa Bolsa Floresta(BFA) do governo
do Estado do Amazonas. A escolha dos presidentes das Associações Comunitárias geralmente
ocorre de forma democrática, por eleição ou indicação.
Como o processo de legalização das Associações é burocrático e custoso, muitas
comunidades,
acabam
ficando
na
ilegalidade
ou
dependentes
da
atuação
de
instituições/organizações externas, que atuam na maioria das vezes no processo de
organização comunitária ou potencialização das atividades produtivas sustentáveis. Dentre as
instituições/organizações mais citadas pelos entrevistados atuantes na Reserva destacam-se:
CEUC, Fundação Amazônia Sustentável (FAS)25, Instituto de Desenvolvimento Sustentável
do Amazonas (IDESAM), Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), Fundação
de Vigilância Sanitária (FVS), Prefeitura Municipal de São Sebastião do Uatumã e Prefeitura
Municipal de Itapiranga.
25
A Fundação Amazonas Sustentável gerencia o PBF. A gestão do programa cabe à Fundação Amazonas
Sustentável, criada, nos termos do artigo 6º da Lei 3.135/2007, especificamente para fornecer suporte à
implantação da política estadual sobre mudança climática. A Fundação capta recursos privados que,
posteriormente, são investidos em fundos fiduciários, de modo que somente os rendimentos do capital aplicado
são utilizados para financiar o programa. Desta forma, o número de unidades de conservação abrangidas pelo
programa aumenta de acordo com o volume de recursos captados pela Fundação.
44
Como as condições de vida dos moradores da Reserva estão condicionadas quase
sempre pelo acesso a determinados benefícios sociais oferecidos pelos governos federal,
estadual e municipal, a maioria das comunidades está organizada legalmente em Associação
Comunitária.
1.4 - A Lei Estadual de Mudanças Climáticas:
A Lei Estadual nº 3135/2007 do Amazonas de Mudanças Climáticas e Conservação
Ambiental é tida pela mídia como a primeira lei do Brasil a estabelecer uma política para
mitigação das mudanças climáticas, aproveitando a condição de Estado com as florestas mais
conservadas da Amazônia, aliado ao fato de esta constituir-se como principal signo ecológico
do mundo contemporâneo.
Apresentada pelo governo do Estado do Amazonas com o objetivo especialmente
voltado para a redução de emissões decorrentes do desmatamento e, em menor escala, no uso
de energias renováveis, como forma de contribuir para a mitigação das mudanças climáticas.
Mas acima de tudo, pela percepção que a edição de um arcabouço jurídico voltado para
inclusão das mudanças climáticas em consonância com os interesses políticos locais26, ou seja,
aqueles reorientados a criar as condições favoráveis para obter ganhos políticos e econômicos,
principalmente, aqueles que se configuram no uso da lógica capitalista para enfrentar os riscos
de uma crise ambiental.
Esta lei tem como principal carro chefe o Programa Bolsa Floresta-PBF instituído em
seu art. 3º, um mecanismo de pagamento por serviços ambientais criado para prover
incentivos econômicos para a conservação. De fato, esta Lei projetou o Amazonas
internacionalmente, mas direcionando as atenções da opinião pública, para o fato de a referida
lei ter sido uma iniciativa do ex-governador Eduardo Carlos Braga, também tido como o
criador da Fundação Amazonas Sustentável, empresa privada, principal esteio de sustentação
da política de combate às mudanças climáticas implementada pelo Governo do Amazonas.
O governo do Estado do Amazonas apresenta nos fóruns internacionais, nacionais e
locais a referida Lei, focada na redução de emissões decorrentes do desmatamento e, em
menor escala, no uso de energias renováveis, como forma de contribuir para a mitigação das
26
No âmbito econômico, a criação desse arcabouço jurídico pelo estado permitiu a parceria da FAS e empresas
privadas, na prática, a existência de projetos de redução de emissões decorrentes do desmatamento em áreas de
proteção estaduais, de modo que os habitantes destas áreas só poderão vir a receber recursos se evitarem a
derrubada da floresta. Isto já ocorre na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Juma, na qual a cadeia
internacional de hotéis Marriott é um dos principais parceiros da FAS na remuneração dos habitantes da reserva
para que eles não promovam e não deixem que outros promovam o desmatamento na área.
45
mudanças climáticas. O que é importante assinalar é que, a geopolítica da noção de
“desenvolvimento sustentável” empregada no Estado do Amazonas expressa na edição de um
arcabouço jurídico voltado para as mudanças climáticas em consonância com os interesses
locais. Ou seja, elaboraram-se instrumentos econômicos para a gestão ambiental que
continuaram a estabelecer direitos de propriedade e valores econômicos para os bens e
serviços ambientais. (LEFF, 2010).
No artigo 5º, são criados os programas estaduais para a implementação da Política
Estadual: Programa Estadual de Educação sobre Mudanças Climáticas; Programa Bolsa
Floresta; Programa Estadual de Monitoramento Ambiental; Programa Estadual de Proteção
Ambiental; Programa Estadual de Intercâmbio de Tecnologias Limpas e Ambientalmente
Responsáveis; Programa Estadual de Capacitação de Organismos Públicos e Instituições
Privadas; Programa Estadual de Incentivo à Utilização e Energias Alternativas Limpas e
Redutoras da Emissão de Gases de Efeito Estufa (AMAZONAS, 2008).
Concordamos com a reflexão de Lefebre (2002), que no jogo das regras e normas
estabelecidadas nestas iniciativas constituem justamente uma nova estratégia do capital de
garantir sua sobrevivência. Pela mão do markenting, principalmente, na captação de recursos
privados que constitui um dos alicerces da gestão feita pela FAS do PBF, que a partir das
imagens vinculadas dos chamados guardiões das florestas ao apoio de empresas como a Cocacola Company, o Banco Bradesco S. A. e outros com o pseudo compromisso com o
desenvolvimento sustentável, mas que absorvem a sua maneira o discurso de conservação
ambiental subordinado a imagem diferenciada em um cenário de competitividade global,
trata-se de uma apropriação simbólica, no caso da “valorização da floresta em pé.”
De acordo com Roessing (2009), ainda que as ações empreendidas pelo Estado do
Amazonas, notadamente a edição do Decreto n. 26.581/2007 e da Lei Ordinária Estadual
nº 3135/2007, sejam pioneiras no Brasil, elas incluem-se num conjunto de ações que estão
sendo adotadas por entes subnacionais ao redor do mundo, notadamente nos Estados Unidos,
em decorrência da percepção de que os esforços empreendidos pelos governos nacionais e as
obrigações constantes na Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima e no Protocolo de
Quioto são insuficientes.
Ao que parece até agora a referida Lei tem se limitado ao forte marketing publicitário
e que as condições institucionais não têm viabilizado a implantação integral da Lei. A
legislação amazonense é, excessivamente, focada na redução de emissões decorrentes do
desmatamento, de modo que não há incentivos suficientes para a execução de outros tipos de
46
projetos de redução de emissões no Estado, notadamente na área de energia renovável
(AMAZONAS, 2007).
Os altos custos logísticos existentes no Estado para a implantação de tais projetos
demandariam incentivos além dos estabelecidos pela Lei 3135/2007 para que ocorressem em
maior escala. Um exemplo disso é o inventário de emissões de gases de efeito estufa no
Amazonas, que ainda não foi realizado, a despeito de previsão legal sobre sua realização
anual. A questão da neutralização de emissões decorrentes de viagens aéreas custeadas pelo
estado, prevista no Decreto n. 26581/2007, também não foi operacionalizada e mesmo
incluída na Lei 3135/2007. Ainda, os incentivos tributários para atividades econômicas que
auxiliem na redução de gases de efeito estufa ainda não foram regulamentados.
De acordo com Roessing e Rubens (2009), o Programa Bolsa-Floresta, internaliza
uma lógica de prevenção do dano ambiental, mais especificamente do desmatamento, com o
intuito de manter inalterados os serviços ambientais prestados pelas Unidades de Conservação
amazonenses, tais como manutenção do estoque de biodiversidade, regulação climáticas,
preservação da qualidade da água, sequestro de carbono atmosférico. Ainda, por meio do
programa, evita-se a emissão de gases de efeito estufa resultante do desmatamento.
Para além desta limitada visão delineada pelo discurso oficial, outro aspecto
importante e que merece destaque, diz respeito ao fato de que a Lei de Mudanças Climáticas
foi cunhada em um contexto Internacional onde a preocupação com as mudanças climáticas
globais e locais, em função da ação antrópica, passou a fazer parte da agenda política dos
elaboradores e gestores públicos.
Assim, a inquietação da sociedade quanto às questões sócio-ambientais trouxe um
alerta no estabelecimento de políticas governamentais, exercendo forte pressão de âmbito
internacional, onde o tema das mudanças climáticas ganhou espaços consideráveis nos países
nos últimos tempos, principalmente as discussões em torno de iniciativas de mercado como os
créditos de carbono, mecanismo que envolve uma série de empresas que começam a aderir de
acordo com seus interesses a metas de redução de emissões, antevendo ganhos em termos de
mercado, tecnologia e imagem. E avançam como opção para captação de recursos financeiros
sob a emblemático marketing verde que se apresenta na forma de diminuir as mudanças
climáticas causadas pelo processo civilizatório capitalista.
Desta forma, o estabelecimento da Lei Estadual de Mudanças Climáticas no
Amazonas não pode ser entendida de forma desconectada da ordem global contemporânea,
pois faz parte da moldura histórica do processo civilizatório capitalista, cujas bases do
47
processo produtivo encontram-se firmados em fontes energéticas não renováveis que, por
sua vez, retroalimentam a força motriz para modelo atual de desenvolvimento econômico.
Entende-se que este é certamente o maior produtor da crise ambiental, contudo também
entendemos que emergem na Amazônia, “novas” estratégias orientadas à necessidade de
controle de territórios e recursos naturais.
Pode-se observar que essa nova política ambiental de ordenar e gerir o Estado do
Amazonas, por meio da criação de unidades de conservação sob a roupagem do
enfrentamento das mudanças climáticas globais mas encarnado na lógica objetiva da
acumulação, desconhece as formas de produção e reprodução das comunidades rurais da RDS
Uatumã, supostamente responsáveis pelo desmatamento no Amazonas. Assim a relação entre
efeito estufa e desigualdades sociais é algo direto e local, e não apenas relacionado com
políticas globais. E está vinculado ao fato de que em uma sociedade “democrática” existem
lutas concretas pelo acesso a bens públicos, como no caso do acesso à água e a outros bens de
uso comum (KRISCHKE, 2004).
É possível afirmar a partir do argumento de Ferreira (1988), que os esforços e as
experiências que têm sido levados adiante pelas políticas públicas brasileiras em torno da
absorção das questões ambientais e sua relação com categorias como globalização e
mundialização tornam-se cada vez mais significativas para a qualificação da dinâmica
político-decisória da própria vida cotidiana, em que a consciência de que nossas
possibilidades de reprodução da vida material encontram-se inexoravelmente atreladas a
limites.
A tentativa de abordar a nova configuração de poder capaz de, com sucesso,
concretizar a tarefa de institucionalizar políticas ambientais em um momento cada vez mais
marcado pelo fato de muitas das questões políticas mais candentes e significativas estarem se
desenrolando fora da esfera política até então concebida como "oficial", ou seja, fora de um
espaço passível de ser controlado pelo Estado.
Também é patente a generalização de um “discurso verde”, expresso no discurso do
poder estatal, compartilhada por ONGs e entidades da sociedade civil no estado do
Amazonas. Contudo, a adesão destes valores ditos “verdes’ não se expressam em práticas que
possam minimamente vedar posições ambientalmente incorretas existentes mesmo na difusão
do discurso sustentabilista que muitas vezes nos cegam para o que há para ver em Programas
como por exemplo PBF (FERREIRA, 1988).
48
No entanto se mantém a estrutura dos fundamentos das relações de propriedade e de
dominação capitalistas situadas nas origens de sua relação com os recursos naturais e a
biosfera. Se destruir ou danificar gravemente o ambiente, não decorre daí que o capital ponha
em perigo suas próprias condições de reprodução e de funcionamento. Segundo nossa
compreensão, por essas destruições cada vez mais graves e, em alguns casos, irreversíveis, o
capital põe em perigo as condições de vida e até a própria existência de certas comunidades, e
até mesmo de certos países. Mas ele não coloca diretamente em perigo as condições de sua
dominação (CHESNAIS e SERFATI, 2003).
Ao observarmos o processo de institucionalização das políticas ambientais no Brasil,
é possível afirmar que estas estiveram mais fortemente associadas ao momento de
redemocratização do país na década de 1980. No momento em que os processos sociais
estariam orientados pelo respeito ao ambiente. Aliás, tal fato é perfeitamente expresso no
momento em que o Congresso Nacional promulgou uma série de leis ambientais de garantia à
proteção do ambiente e sua sustentabilidade. Entre as normas ambientais existentes no Brasil,
podem-se destacar aquelas que têm sido enfocadas como princípios de sustentabilidade
(KRISCHKE e ALEXANDRE, 2006).
Na esfera internacional as discussões sobre as mudanças climáticas ganharam força
na década 1980. Tal processo resultou na realização da Conferência das Nações Unidas para o
Meio Ambiente e Desenvolvimento – CNUMAD, realizada no Rio de Janeiro em 1992, que
gerou, entre outros documentos, a Convenção Quadro de Mudanças Climáticas - CMC.
Passados cinco anos, houve o estabelecimento do Protocolo de Quioto que, diferente da
Convenção, estabeleceu normas mais claras sobre a redução de emissões de gases de efeito
estufa e metas a serem atingidas por países que emitiram mais gases no passado.
Ribeiro (2005), argumenta que estamos diante de uma nova ordem ambiental global
que a partir dos debates das mudanças climáticas globais nas Convenções ambientais
mundiais , e, por conseguinte os riscos que o aquecimento global passou a representar à
sociedade, coube ao Estado propor ações preventivas por meio de políticas públicas. A partir
do contratualismo gerou tal expectativa, sendo um dever do Estado indicar alternativas que
possam diminuir as consequências sobre à população do Brasil, porém, não resta dúvida de
que diversas forças sociais integram o Estado. “Elas representam agentes com posições muitas
vezes antagônicas. Também é preciso ter claro que as decisões acabam por privilegiar
determinados setores, nem sempre voltados à maioria da população brasileira”.
49
A adaptação às mudanças climáticas é uma preocupação governamental recente,
embora deva ser um assunto cada vez mais presente, em especial, devido às carências sociais
brasileiras. O seu agravamento pode gerar dificuldades em diversas escalas, que devem ser
ponderadas quando se avaliam tais consequências (RIBEIRO, 2008. p.6).
A estrutura de oportunidades políticas que permite a atual constituição de uma pauta
ambientalista agora centrada no marketing verde e no âmbito das mudanças climáticas no
Estado do Amazonas se configurou a partir de uma agenda ambiental brasileira delineada
pelas mudanças no cenário internacional, com a crescente generalização de um discurso em
favor da conservação ambiental. Assim uma série de conferências da Organização das Nações
Unidas (ONU) sobre questões sociais, e particularmente a Rio-92, ilustra como o contexto
político internacional condicionou a problemática brasileira.
Este processo político de transformações gerou um espaço público que passou a
absorver as demandas ambientalistas a partir de uma nova ordem constitucional que produziu
o arcabouço jurídico-institucional regulamentando a questão ambiental no Brasil, resultando
nas agências de controle ambiental, legislação ambiental de punição de delitos ambientais
fóruns “participativos” de tomadas de decisão.
Com isso emerge a chamada arena de disputas ambientais com a participação, ainda
que limitada, de diferentes agentes sociais agora diante de uma rede institucional de controle e
fiscalização de seu cumprimento. Cabe ressaltar uma dimensão fundamental expressa sob o
ideário à inclusão do direito a um ambiente saudável como parte dos direitos “difusos”,
coletivos (BURSZTYN, 2007).
A pressão internacional para transformar a Amazônia numa grande unidade de
conservação no âmbito global e combater o desmatamento crescente e vem dando ao governo
amazonense um consenso logrado na expressão de Oliveira ( 2007, p. 16). E, ao que parece,
cabe a Fundação Amazonas Sustentável; o Programa Bolsa Floresta e seu marketing verde, dá
sua contribuição contra o desmatamento da maior floresta tropical do planeta.
Pode ser um equivoco pensar que a lei Estadual tenha nascido exclusivamente em
razão de um evento climático de uma grande seca27 que assolou o Estado do Amazonas em
2005. Consideramos esta idéia. A Lei de Mudanças Climáticas estadual é primeiramente
resultante de escolhas políticas ou econômicas feitas na esfera internacional, nacional e local
27
A seca de 2005 é tida pelo discurso oficial como a principal razão para formulações políticas direcionadas às
mudanças climáticas. Esta afetou boa parte da região Amazônica, especialmente o setor sudoeste do Amazonas e
Estado do Acre, ultrapassando os períodos de 1925-1926, 1968-1969 e 1997-1998, até então considerados os
mais intensos. Disponível em http://www.inpe.br/noticias, acessado em 30/11/2009.
50
em um processo gradativo fruto das formulações da relação sociedade e ambiente orientado
pelo processo produtivo do sistema capitalista.
Desta forma, a tentativa de sustentar uma postura ideológica do receio de que os
efeitos das mudanças climáticas acarretem ainda mais prejuízos para o Estado do Amazonas
constitui frágil consistência, uma vez que as movimentações institucionais são marcadamente
desenvolvidas para a possibilidade de obter recursos para financiamento de programas de
desenvolvimento econômico do estado. Contudo o governo estadual, por meio da Secretaria
de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - SDS, “passou a formular ações
relacionadas com as mudanças climáticas e a conservação ambiental e, por fim, estabelecer
uma política estadual para mudanças climáticas, desta forma, as seguintes ações foram
tomadas” (AMAZONAS, 2008, p. 92):
- Participação, em 2005, da COP11 em Montreal, na qual o governo do Estado
apresentou uma proposta de criação de um Mecanismo de Compensação por Redução de
Emissões de gases de efeito estufa através da conservação da cobertura florestal no
Amazonas;
- Apresentação, em 2006, na COP12, em Nairóbi, da “Iniciativa Amazonas”, uma
versão revisada e aprofundada da proposta apresentada no ano anterior;
- Organização de um evento paralelo na COP13, em Bali, em 2007, no qual foi
reapresentada a “Iniciativa Amazonas” e o próprio governador do Estado, Eduardo Braga,
divulgou as ações do Estado para a redução do desmatamento;
- Participação, por representantes do Estado, em seis eventos diferentes durante a
COP13.
Pode - se notar que as ações empreendidas nos foros de negociação do regime de
mudanças climáticas, de certa forma forneceram elementos que contribuíram para a
construção de um arcabouço jurídico específico para a questão, pois em 2007editou-se o
Decreto n. 26581, de 25 de abril de 2007, que estabeleceu critérios para uma futura política
estadual de mudanças climáticas e fixou em noventa dias o prazo para que se encaminhasse
projeto de lei instituidor dessa política para o Poder Legislativo. Posteriormente, foram
promulgadas, ambas no dia 5 de junho de 2007:
Lei Complementar Estadual n. 53, que instituiu o Sistema Estadual de Unidades de
Conservação – SEUC ;
Lei Ordinária Estadual nº 3135, que instituiu a Política Estadual sobre Mudanças
Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas. Sem
51
qualquer forma de consulta pública preliminar, o governo estadual aprovou em regime de
urgência e por unanimidade na Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas, o projeto
oriundo de mensagem governamental, que institui a Lei Estadual ordinária nº 3.135 de
05/06/2007 de Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável
do Amazonas. Esta lei estabelece a Política Estadual sobre Mudanças Climáticas e
Conservação Ambiental. Em seu interior está o Programa Bolsa-Floresta, cujo objetivo é
instituir o pagamento por serviços e produtos ambientais às comunidades tradicionais pelo uso
sustentável dos recursos naturais e incentivo às ações voluntárias de redução de
desmatamento.
Nas falas do poder, “o Programa Bolsa Floresta marca o início de um novo tempo e
de uma nova relação entre homem e natureza” no Estado do Amazonas (Jornal A
Critica14/09/2007). Nesse momento (2007), fez-se o pagamento das primeiras 100 famílias
cadastradas no Programa Bolsa-Floresta residente nas comunidades da RDS do Uatumã, que,
como observamos, objetiva instituir o pagamento por serviços e produtos ambientais às
comunidades tradicionais pelo uso sustentável dos recursos naturais e incentivo às ações
voluntárias de redução de desmatamento.
Mas o que se pode perceber, em decorrência da enchente dos rios em 2009, quando
as famílias foram afetadas na produção de suas roças e em decorrência impactou por seu
turnos as suas formas de reprodução social. Em casos como esse não se pode criminalizar as
famílias pelos possíveis, agora, ilegalismos que poderão ser praticados para suprir as suas
necessidades básicas; construindo roças e buscando outras estratégias de sobrevivência
( retirada ilegal de madeira, por exemplo ) em lugares que sempre foram considerados
naturais portanto legais. Isso significa que hoje as comunidades tradicionais vivem na linha
tênue entre o legal e o ilegal e que por isso mesmo poderá surgir uma série de ilegalismos na
apropriação dos recursos naturais.
Cabe ressaltar que após o decreto da Lei, o governador do Estado do Amazonas
assumiu uma posição de relativo destaque nacional e internacional na temática das mudanças
climáticas e Unidades de Conservação.
Nesta ação identifica-se além do caráter visivelmente sensacionalista, a reorientação
do discurso dominante do chamado capitalismo verde, que visa a assinalar o impacto e a
responsabilidade do atual modelo de produção, distribuição e consumo capitalista e vincular a
ameaça climática global com os problemas sociais cotidianos. Há de se registrar que o
Decreto de criação da Lei foi oportunamente no Dia Mundial do Meio Ambiente 05/06/2007,
52
que se iniciou uma forte campanha de marketing verde com a intenção de colocar o
Amazonas no centro das atenções nacionais e internacionais, Esta notícia foi veiculada nos
principais jornais do país, e diversas agências de notícias internacionais.
Todo este processo está marcadamente articulado com a implementação do Programa
Zona Franca Verde, e com a criação da Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Amazonas
em 2003, somada a viagens do ex-governador Carlos Eduardo Braga para conhecer o
programa de serviços ambientais da Costa Rica, e ainda da participação em diversos eventos
no Brasil e no exterior, aproveitando nessa ocasião a exposição da proposta de vincular a
redução do desmatamento ao pagamento pelas toneladas de carbono de emissão evitada
(VIANA, 2008).
Embora não expresso de forma explícita neste processo em curso no Estado do
Amazonas, porém vivenciado pelas famílias rurais residentes na RDS Uatumã o ambiente é
entendido meramente como uma variável a ser manejada, administrada e gerida, na velha
tradição racionalista burocrática, de tal forma a não obstaculizar a concepção hegemônica do
processo civilizatório capitalista de acumulação. mas as populações locais e quem as
acompanha de perto provavelmente fariam um balanço diferenciado do que há por traz do
marketing verde, pois imprime novos contornos agora no âmbito das mudanças climáticas,
podemos perceber o ambiente enquanto realidade externa à sociedade e às relações sociais,
sendo então assimiladas e equacionadas apenas como recurso para a produção. No sentido de
legitimar esse discurso oficial, muitas ONGs e movimentos ambientalistas, antes portadores
de um contra-discurso ao desenvolvimentismo, agora convidados à participação e à parceria,
ou seja, o ambientalismo de resultados incorporou a negociação como palavra de ordem
(ZOURI, 2004, p. 2).
53
CAPÍTULO II - O Programa Bolsa-Floresta: serviços ambientais e as
mudanças climáticas.
Neste capitulo, realizo uma abordagem sobre as interfaces que formam o campo de
interesses no quadro das mudanças climáticas no Estado do Amazonas.
A partir da emergência do chamado socioambientalismo, mas precisamente, a partir
dos anos 80, os saberes dos grupos indígenas e comunidades tradicionais sobre o ambiente,
começaram a ser valorizados sob a luz de uma orientação proveniente do debate sobre
conservação de ecossistemas e da biodiversidade. Assim, percebe-se esses saberes e formas
de manejo pertinentes as suas especificidades culturais, como fundamentais na conservação
da biodiversidade e que lhes garantiu até hoje a produção e reprodução de seu modo de vida.
(CASTRO, 1997).
54
Até a década de 1980 a razão instrumental28 conduziu a hegemonia dominante das
sociedades ocidentais subordinando os saberes dos povos tradicionais sobre o ambiente e às
diferentes formas pelas quais o seu trabalho é realizado. Por outro lado, o processo de
acumulação de conhecimento tradicional gerou uma magnífica adaptabilidade a um ambiente
de alta complexidade, este foi realizado graças as suas formas múltiplas de atividades ligadas
a rituais sacros, de festividades e outras manifestações de acordo suas representações
simbólicas e míticas defrontadas com as capacidades e os limites dos saberes dos interesses de
cada grupo (CASTRO, 1997.)
A Convenção Sobre Mudanças Climáticas e Diversidade Biológica (CDB)29 de 1992
foi o primeiro acordo multilateral a regularizar a conservação e o acesso aos recursos
genéticos e a reconhecer o papel das comunidades tradicionais nas áreas protegidas. De
acordo com a CDB a estreita e tradicional dependência dos recursos biológicos de muitas
comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida tradicionais, sendo desejável
repartir equitativamente os benefícios derivados da utilização do conhecimento tradicional e
práticas relevantes para a conservação da diversidade biológica assim como a utilização
sustentável de seus componentes (MMA, 2000). Por esta razão, torna-se importante neste
capítulo retomar esta discussão.
2.1 – As comunidades locais e os conhecimentos tradicionais
Ao longo de décadas e séculos, as comunidades tradicionais30 vêm contribuindo para
a conservação e o desenvolvimento in situ31 de muitas espécies florestais importantes, por
meio de seu conhecimento empiricamente acumulado sobre os habitat naturais, bem como de
suas práticas agrícolas e modos de vida adequados ao ambiente local, atuando como
28
A civilização da razão científica e instrumental, efetivada com a sociedade industrial, trouxe consigo o
distanciamento do homem com o seu aspecto orgânico, em prol do desenvolvimento da tecnologia como
manipulação inorgânica. A objetificação dar-se-á junto ao desenvolvimento abrangente da atitude de dominação
materializada do homem em relação ao ambiente natural ( PELIZZOLI, 2002, p. 49).
29
A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente ou Conferência Rio 92, teve como objetivo regular a
ação humana em relação a emissão de gases que afetam o efeito estufa e o acesso a informação genética. Deste
encontro resultaram as Convenções Sobre Mudanças Climáticas e Sobre Diversidade Biológica. Esta Convenção
foi assinada no dia 04/06/1992 e ratificada pelo Senado da República 04/02/1994.Decreto Legislativo n 01,
Diário Oficial da União.
30
Optamos por utilizar o termo comunidades tradicionais, por reconhecer que a população moradora das zonas
rurais do interior do Amazonas, especificamente, na Unidade de Conservação Uatumã tem como características:
formas de organização comunitária, de unidade política administrativa e unidade produtiva, mas principalmente,
à reivindicação de terras ou outros benefícios ao Estado.
31
Os métodos in-situ referem-se à manutenção de plantas e animais em seus hábitats originais, inclusive nas
lavouras de agricultores tradicionais, no caso de variedades domesticadas. Os governos dos países tropicais têm
adotado medidas e atitudes a título desta modalidade de conservação (PEREIRA, 2003)
55
verdadeiras guardiães do patrimônio biogenético do planeta. No entanto, a conversão e a
degradação das florestas têm sido acompanhadas da desagregação dessas comunidades, de
suas práticas e de seus conhecimentos. Ou seja, à perda de biodiversidade tem também
correspondido uma significativa perda de diversidade sócio-cultural (ALBAGLI, 2006).
A luta das comunidades tradicionais pela terra e pela floresta, para assegurar seu
modo de vida, sua reprodução sociocultural busca romper com a hegemonia do paradigma
preservacionista (wilderness)32, fazendo com que projetos de conservação reconhecessem a
importante contribuição das comunidades tradicionais para a conservação e manutenção da
floresta. Os conhecimentos das comunidades tradicionais, ainda que produzidos localmente,
são objeto de discussão de nível global. É cada vez maior o reconhecimento da contribuição
que os povos tradicionais têm desempenhado na conservação e no uso sustentável da
diversidade biológica (DIEGUES, 2000).
Para Almeida (2007), os símbolos também politizam a propriedade intelectual dos
saberes tidos como “tradicionais”, que não podem ser reduzidos a uma simples oposição ao
“moderno”, alargando os tipos de reconhecimento para além das identidades regionais, que
vinculam as identidades coletivas a unidades da federação, a bacias hidrográficas, a
ecossistemas determinados e a acidentes naturais. Em suma, trata-se de uma politização da
natureza, vinculada de maneira múltipla à emergência de identidades coletivas, que nos levam
a redefinir a abrangência do significado dos movimentos sociais e das territorialidades
específicas que lhes correspondem.
A humanização dos recursos naturais pelas classificações coletivas e de parentesco
evidencia a profundidade de tal politização. Assim, alguns povos privilegiam em sua
denominação um determinado elemento destacado do quadro natural, tal como: “floresta” em
“guardiões das florestas” ou “cerrado” em “povos do cerrado” ou ainda “povos da água”.
O termo Guardiões da Floresta surge acoplado às experiências de parcerias dos
povos tradicionais com instituições governamentais e ONGs voltadas para a promoção do uso
sustentável dos recursos naturais. Tal interesse se deve ao momento em que eles percebem a
escassez de recursos naturais fundamentais para sua reprodução.
Neste sentido Muniz (2009), esclarece que a duvidosa legitimidade em ter o poder de
escolhas torna-se mais que evidente diante da rede de articulações que através de formas
desiguais de relação de poder promovem o processo de institucionalização público-privado do
32
A noção de wilderness popularizada através das discussões acerca das áreas protegidas nos Estados Unidos
contribui para uma nova fase do ambientalismo baseadas no debate entre preservacionistas e conservacionistas, o
qual foi bem sintetizado no conflito entre as propostas de Gifford Pinchot e John Muir (LEIS, 2004).
56
direito e acesso aos recursos naturais, reduzindo as populações locais a condição de atores
coadjuvantes subalternizando o direito legítimo das comunidades tradicionais aos ditames de
novas (velhas) lógicas de acesso aos bens de uso comum.
As formas de uso comum designam situações nas qual o controle dos recursos
básicos não é exercido livre e individualmente por um determinado grupo doméstico de
pequenos produtores diretos ou por um de seus membros. Tal controle se dá através de
normas específicas, combinando uso comum de recursos e apropriação privada de bens, que
são acatadas, de maneira consensual, nos meandros das relações sociais estabelecidas entre
vários grupos familiares, que compõem uma unidade social. Tanto podem expressar um
acesso estável à terra, como ocorre em áreas de colonização antiga, quando evidenciam
formas relativamente transitórias características das regiões de ocupação recente. Tanto
podem se voltar prioritariamente para a agricultura, quanto para o extrativismo, a pesca ou
para o pastoreio realizados de maneira autônoma, sob forma de cooperação simples e com
base no trabalho familiar. As práticas de ajuda mútua, incidindo sobre recursos naturais,
revelam um conhecimento aprofundado e peculiar dos ambientes locais de referência
(ALMEIDA, 2006).
Para Muniz (2009), a problematização da questão ambiental através da questão do
uso dos recursos naturais e de sua inevitável escassez atribui aos elementos da natureza uma
utilização econômica que deve considerar o controle e a proteção dos recursos naturais como
a principal via de resolução da “crise ambiental”. Essa ótica considera a gestão do ambiente
como resultante da participação de agentes sociais, da construção de sujeitos coletivos, da
constante composição e oposição entre interesses individuais e coletivos em torno da
apropriação dos bens naturais. Assim, travam-se, em torno de problemas sócio-ambientais,
confrontos entre atores sociais que defendem diferentes lógicas para a gestão dos bens
coletivos de uso comum.
De acordo com Santilli (2005), as discussões em torno do socioambientalismo no
Brasil surgiram a partir da segunda metade dos anos de 1980, em virtude de articulação do
campo de estudo dos conflitos sócio-ambientais e ações políticas entre os movimentos sociais
e o movimento ambientalista, uma tendência histórica que teve como marco inicial a
conferência sobre meio ambiente promovida pela ONU em Estocolmo, em 1972.
A referida autora ressalta que o socioambientalismo fundamenta-se na concepção de
que um novo paradigma de desenvolvimento deve promover não somente a sustentabilidade
estritamente ambiental, como também a sustentabilidade social. Parte do pressuposto de que
57
as políticas públicas ambientais somente têm eficácia social e sustentabilidade política quando
incluem comunidades locais e promovem uma repartição socialmente justa e eqüitativa dos
benefícios derivados da exploração dos recursos naturais.
Na década 1970, os seringueiros surgiram como guardiões das florestas no mesmo
momento em que intensificaram-se os conflitos de terra na Amazônia. Os Fazendeiros
imprimiram um processo de desmatamento da floresta e expulsão dos Seringueiros das
florestas da região de Xapuri no Estado do Acre. Diante disso, os seringueiros começaram a
se organizar em cooperativas e sindicatos, surgindo deste modo grandes lideranças dos
seringueiros como Chico Mendes, assassinado em dezembro 1988 pelos fazendeiros Darly e
Darcy Alves da Silva. Nestes conflitos os seringueiros se mostraram como até hoje sua
convivência com a floresta, mostrando que os povos tradicionais mantêm uma relação mais
harmoniosa com o ambiente (SOUZA, 1990).
É possível afirmar que a década de 1980 marcou significativamente os destinos da
região amazônica, seja pelo impacto do desmatamento, seja pela pressão resultante do
assassinato do líder seringueiro Chico Mendes (MMA, 1997). Torna-se relevante destacar que
a questão ambiental aparece com grande destaque em decorrência dos projetos
governamentais para a região, caso da construção da BR 364; das reservas extrativistas,
representadas pelo líder seringueiro Chico Mendes; das preocupações globais com o clima,
com a biodiversidade entre outras. Além disso, o episódio em 1987 em que Chico Mendes
havia denunciado em encontro anual do Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID, os
sérios problemas relacionados a BR- 364 e os riscos para os seringueiros se esta alcançasse o
Estado do Acre. O Banco suspendeu os financiamentos para os projeto de expansão da BR364 devido a denúncia, passando a submeter os projetos brasileiros ao crivo de equipes
especializadas em analisar impactos ambientais de tais projetos (SOUZA, 1990).
Algumas instituições governamentais a SDS, CECLIMA e outras começaram a
absorver as linguagens dos movimentos sociais, sendo perceptível, por exemplo, no Decreto
presidencial de 27 de dezembro de 2004, onde a Comissão Nacional de Desenvolvimento
Sustentável de Comunidades Tradicionais e o Reconhecimento a partir do (Decreto nº 6040,
de 7 de fevereiro de 2007), que criou a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos
Povos e Comunidades Tradicionais. Para fins deste decreto compreendem-se por povos e
comunidades tradicionais grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais,
que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos
naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica,
58
utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição. A adoção
do termo comunidades tradicionais será utilizada de modo a incluir elementos de identidade
política e reafirmação de direitos. Populações que vivem em estreita relação com o ambiente,
dependendo de seus recursos naturais para a sua reprodução sociocultural, por meio de
atividades de baixo impacto ambiental (SANTILLI, 2002).
Segundo Almeida (1994), os chamados povos e comunidades tradicionais
organizam-se em diversos movimentos sociais. A luta ecológica dos povos e comunidades
tradicionais da Amazônia tem uma dimensão marcadamente política e ideológica. A
ressignificação dessas identidades coletivas sugere a conservação dos recursos naturais,
vinculado a produção e manutenção do seu modo de vida. Enxergando no ambiente a
oportunidade de mobilizações centradas na defesa de seus territórios. Assim trata-se, antes de
tudo, de mobilizações pela manutenção de condições de vida preexistentes a projetos e
programas governamentais induzidos pelo governo e pela garantia do efetivo controle de
domínios representados como territórios fundamentais à identidade desses atores sociais.
De acordo com Almeida (2008), o conceito de tradição está mudando, ele não está
necessariamente ligado a história, ao contrário, este se tem mostrado ligado a reivindicações
contemporâneas. O referido autor destaca que o próprio termo “população tradicional está
sendo deslocado para o “povo” ou para “comunidades tradicionais”, enfatizando que o
tradicional é social e politicamente construído a partir de mobilizações e conflitos
reconfigurando as dinâmicas sociais. Assim os chamados povos tradicionais não são definidos
como uma invenção ou ainda necessariamente definidos pela origem. Mas sim, por
mobilizações que buscam reivindicar o direito de autodefinição.
O surgimento de parcerias das instituições que promovem o modelo sócio- ambiental
com as chamadas comunidades tradicionais, buscam apoiar as iniciativas de manejo dos
recursos naturais e a proteção das áreas preservadas para manter em estoques viáveis as
espécies mais importantes para sua economia familiar. Na esteira destas parcerias emergem
novas redes de mediação, políticas públicas de apoio a sistemas de manejo, movimentos
sociais articulados em torno da defesa de seus territórios com exploração regulada (LIMA,
2009).
Aqui interessa fazer algumas distinções para os caminhos desejados de nosso estudo,
pois podem existir nas parcerias (como a exemplo a parceria feita entre a ONG FAS e as
comunidades da RDS Uatumã) o emprego do socioambientalismo sob a orientação de cada
um dos parceiros, o sócio e o ambiental que muitas vezes aparecem unidos sem uma devida
59
discussão satisfatória a respeito da sua restrição à grupos sociais muitas vezes excluídas do
processo. Assim a existência da convergência de interesses, de um lado em apoiar um modo
de vida com baixo impacto ambiental e, por outro, uma tradução ecológica de reivindicações
sociais mais antigas. “Seria também a soma das resistências a uma lógica sócio-econômica
que justifica e incentiva uma exploração depredatória de ambiente” (LIMA, 2008, p. 39).
O termo “guardiões das florestas” é instrumentalizado pelo discurso governamental
no sentido de coresponsabilidade das comunidades tradicionais para cuidar da floresta e, ao
mesmo tempo, o papel que tem desempenhado desde os tempos imemoriais para a
conservação da Amazônia. Este tem sido o mote de destaque do estabelecimento do Programa
Bolsa-Floresta como veremos a seguir.
Entretanto, Loureiro e Azaziel (2006), argumentam que é crucial o entendimento que
embora o termo socioambiental tenha sido criado para se pensar à unidade entre o social e o
natural, este não pode se limitar ao interacionismo, acarretando a perda de sua unidade
dialética, posto que normalmente o social é pensado como à parte do natural, o que é
perfeitamente evidenciado no uso recorrente de palavras “entre” ou “com” a ligar os dois. A
esta dicotomia, considerada a principal quando se reflete sobre o processo de gestão, existem
outras, dentre as quais pode ser destacada a relação Estado e sociedade civil.
Neste sentido, é importante observar que os direitos que se reconhecem atualmente, a
povos tradicionais em geral se fundamentam nos serviços ambientais que eles prestam. A
exceção são os povos indígenas cujos direitos têm um fundamento diferente: baseiam-se no
fato histórico de que são eles os primeiros ocupantes. Tendo isso em mente, a definição de
povos tradicionais torna-se simples.
São os povos que aderem a uma tecnologia e a práticas semelhantes às que
vigoravam tradicionalmente e que não são lesivas ao ambiente. Assim a imagem que temos,
pré-concebida do que seriam povos tradicionais passaria por uma ressignificação passível de
ser repensada, onde o fato de terem no passado adotado essas práticas garante que o farão no
futuro? A exemplo da Bolsa de Valores, o desempenho passado não garante o futuro. Esse
futuro é garantido por um compromisso a partir do presente que a população assume. “Ser um
povo tradicional é, no fundo, um contrato, um pacto de não agressão ao ambiente, na medida
em que tem de firmar um pacto (implícito ou explícito) sobre a forma futura de uso de seu
território, são sempre neo-tradicionais” (CUNHA, 2009, p.49).
Vejamos o que significa os serviços ambientais.
60
2.2- Serviços ambientais e a utopia de manutenção da floresta em pé.
A problemática em torno da inclusão dos debates sobre os impactos das condições
climáticas da Amazônia na Atmosfera e na biosfera planetária além de ser carregada do jogo
ideológico (pessimistas ou catastrófico), de interesses que divergem e se articulam de escopo
local e global, mas que também constitui oportunidades e ameaças das chamadas novas
atividades econômicas dos serviços ambientais, neste “campo complexo de disputa dos
interesses” que ora lutam e ora são orientados pela lógica do mercado.
Para Chesnais (1991), um dos fundamentos da acumulação de capital consiste em
reduzir as "despesas supérfluas", a "externalizá-las", isto é, fazer com que outros se
encarreguem daquilo que ele só reconhece como "custos". A anarquia do modo de produção
capitalista não se manifesta somente nas crises, que são os momentos de paroxismo desse
processo. Ela se manifesta permanentemente no desperdício das forças produtivas, das quais o
capital tenta descarregar a responsabilidade e o custo sobre a sociedade. A exploração do
homem e da natureza até o esgotamento não reflete uma contradição do capitalismo, mas o
antagonismo profundo entre esse e as necessidades da humanidade. A "crise ecológica" é a
manifestação da destruição das forças produtivas, entre as quais os recursos naturais, para as
necessidades da acumulação e num contexto hoje agravado pela dominação do capital
financeiro.
Segundo Becker (2009), a idéia de manter a floresta em pé interessa a todos que
tenham um mínimo de sensatez, ou seja, torna-se extremamente forçoso reduzir a questão
ambiental, o caso do Estado do Amazonas há uma lógica maniqueísta, que carrega a face
oculta do falso dilema entre conservação e desenvolvimento econômico. Falso porque trata a
conservação como sinônimo de preservação intocável e cria uma imagem que identifica o
desenvolvimento com produção destrutiva, respaldado em um histórico de agropecuária
causador de gigantesco passível ambiental na Amazônia.
Outro elemento importante é atentarmos para o Plano de Gestão da Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Uatumã, sendo possível observar que este propõe que sejam
exploradas de forma intensiva as oportunidades advindas do arcabouço estratégico criado pelo
Programa Estadual de Mudanças Climáticas para a operacionalização de projetos baseados no
pagamento por serviços ambientais e na redução de emissões de gases do efeito estufa (GEE)
do desmatamento (IDESAM, 2008).
61
O Programa Bolsa Floresta tem o papel de um incentivo econômico para a
conservação da floresta, apresentado pela FAS como um mecanismo de remuneração pela
prestação de serviços ambientais. Entretanto, o que seria este serviço ambiental e as prováveis
implicações orientadas pelo pagamento de serviços ambientais nas realidades locais das UCs
no Estado do Amazonas.
Conforme Seiffert (2009), os Serviços ambientais são as atividades, produtos e
processos que a natureza nos fornece e que possibilitam que a vida como conhecemos possa
ocorrer sem maiores custos para a humanidade. Assim diversos são os serviços ambientais
prestados de forma natural e gratuita pelos ecossistemas para a manutenção de condições
ambientais adequadas `a vida no Planeta.
Para Izco e Burneo (2003), os serviços ambientais são toda a remuneração monetária
relativa ao pagamento de um serviço e/ou produto da própria natureza que pode ser pago para
quem explora diretamente e indiretamente seus benefícios. Assim os serviços ambientais
referem-se frequentemente às diferentes classificações existentes (usos diretos ou indiretos,
presentes ou futuros). Mas além do valor atribuído a cada espécie ou função ambiental, existe
uma realimentação permanente entre as diferentes dimensões ambientais (biodiversidade,
espécies, serviços, relações entre ecossistemas florestais e agroecossistemas).
Já Silva (2003), destaca que os recursos físicos são resultantes de ciclos naturais do
planeta. Assim, o que determina a sua classificação quanto renovável ou reprodutíveis e não
-renovável ou exaurível (petróleo e gás natural), depende da capacidade de recomposição no
horizonte de tempo humano (compatível). Desse modo, as águas, os solos, o ar, as florestas, a
fauna e a flora são considerados recursos renováveis.
É interessante perceber que a remuneração pela prestação de serviços que geram
melhorias ambientais, com consequentes benefícios ao conjunto da sociedade, ganha cada vez
mais espaço em diferentes esferas. No entanto, a delimitação do conceito de serviços
ambientais tem-se mostrado uma tarefa difícil, devido, entre outros fatores, às disputas em
torno de um mercado bastante promissor, pois:
Observa-se na Organização Mundial do Comércio (OMC) uma tendência de
enquadrar os serviços ambientais no rol dos demais serviços, vinculados a bens de
consumo tradicionais. Por sua vez, países em vias de desenvolvimento, ricos em
recursos naturais, atuam, no âmbito da organização, no sentido de vincular o
comércio internacional dos bens e serviços ambientais a objetivos de
sustentabilidade.Assim países como o México, Costa Rica elaboraram leis
específicas sobre o tema dos serviços ambientais. No Brasil este assunto ainda não
foi enfrentado. Sem uma lei que estabeleça claramente o que se considera por
serviço ambiental, quem são os provedores e/ou beneficiários, quais provedores
62
devem ser remunerados diretamente a partir de recursos públicos, quanto devem
receber segundo cada tipo e quantidade de serviços prestados, entre outros, não há
como implantar uma política sustentável de fundos para o pagamento de serviços
ambientais no Brasil (ALTAFIN e OLIVEIRA, 2009, p. 3).
No Brasil ressaltamos a experiência do projeto Proambiente33, Programa que procura
vincular a prestação de serviços ambientais a determinadas atitudes desejáveis do agricultor,
como a recuperação de nascentes e matas ciliares, e redução do uso do fogo no preparo de
áreas. Não se trata, portanto, de abandonar os sistemas de produção executados pelas famílias
em favor da implantação de florestas. Ao lado da proteção e ampliação de áreas florestadas,
deve-se buscar tornar esses sistemas familiares ainda mais diversificados, enfatizando a
função ambiental da propriedade, os serviços ambientais são entendidos como produtos
adicionais do processo produtivo da agricultura familiar. As técnicas de cultivo e de manejo
dos recursos naturais disponíveis, empregadas na unidade de produção, são vistas como
determinantes para que esta venha a ser considerada produtora de serviços ambientais ou não
(ALTAFIN e OLIVEIRA, 2009).
A falta de uma legislação específica, definindo o conceito de serviços ambientais e
autorizando o uso de recursos públicos para essa finalidade, foi apontada pela maioria dos
entrevistados como um obstáculo para o pagamento de serviços ambientais a partir do
Proambiente.
Becker (2003), argumenta que dois fatores são importantes para a crescente
valorização dos serviços ambientais: a pressão internacional para transformar a Amazônia
numa grande unidade de conservação no âmbito global e o desmatamento crescente, mas
emerge verdadeiramente enquanto oportunidade na medida em que as trocas de carbono
previstas pelo Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) não tiveram expressão na
região, assim é, que neste contexto a Fundação Amazônia Sustentável (FAS) e o estado do
Amazonas em 2008, promovem a gestão do projeto do Estado do Amazonas, que visa
33
a demanda por um novo modelo de crédito rural, que incorporasse no próprio desenho dos projetos a
preocupação com a conservação dos recursos naturais, fruto da discussão entre as Federações dos Trabalhadores
na Agricultura (FETAGs) da Amazônia Legal, da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
(CONTAG), do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), do
Movimento Nacional dos Pescadores Artesanais (MONAPE) e da Coordenação das Organizações Indígenas da
Amazônia Brasileira (COIAB). A Proposta Inicial do Proambinete foi aprovada em 2002 pelo Conselho Gestor
Nacional provisório. Instalação da Secretaria Executiva, em Brasília, com o apoio do Programa Demonstrativo
(PDA) da Secretaria de Coordenação da Amazônia (SCA/MMA). Inclusão do PROAMBIENTE no Plano
Plurianual (PPA – 2004/2007), como Programa da Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável
do MMA. Assinatura da Portaria nº 211, de 06 de maio de 2003, instituindo um Grupo de Trabalho (GT) com a
finalidade de promover a institucionalização do Proambiente.
63
introduzir de modo abrangente a valorização dos serviços ambientais na região, inserindo-se
no mercado internacional do carbono.
Contudo, a referida autora chama a atenção para alguns riscos desse processo, como
por quem é decidido e impulsionado as finanças globalizadas que são as grandes beneficiárias
desse mercado localizado fora da região e do país, pouco restando de benefícios para as
populações locais? Ou ainda, por que a globalização das finanças tem dois tipos de serviços
ambientais: um avançado, calcado na informação e gestão especializadas envolvendo as
atividades dinâmicas, e outro que perde as características de serviços, comparando-se à
comercialização de “commodities”, sem irrigar outras atividades (BECKER, 2003).
Neste sentido, Fearnside (1989), afirma que avaliando valores monetários para a
manutenção da Unidade de Conservação e suas práticas de geração de renda das populações
residentes utilizando apenas índices econômicos habituais para valorar a floresta, sem
mensurar os benefícios ambientais como a reciclagem de água na atmosfera para manter a
regularidade das chuvas, o controle climático.
Desta forma, é que o mercado de carbono é tido como um promissor e “seguro” novo
negócio, do ponto de vista econômico, haja vista o suporte das condicionantes políticas e
jurídicas em processo na modernidade, que aliás, não estão alheias à relação da produção e
reprodução de modos vida insustentáveis (na liberação de gases de efeito estufa (GEEs) na
atmosfera em decorrência, principalmente, da queima de combustíveis fósseis) que estruturam
as sociedades modernas.
Para Cunha (2010), historicamente, a visibilidade ou invisibilidade de populações
locais tradicionais dependeu muito do Estado e do mercado. Até recentemente, o que estes
viam era só a “produção” de bens, que se media no PIB e se computava nos censos. Serviços
e desserviços ambientais eram apenas o que os economistas chamam de “externalidades”,
efeitos colaterais, bons ou ruins, mas que não são computados e que não têm preço. Está se
criando um mercado do que eram as antigas externalidades, por exemplo, o da emissão de
carbono. Isso tem o efeito de as tornar visíveis. “Poluir agora tem preço, aliás despoluir
também. Mas essa visibilidade incipiente ainda é muito limitada. Os direitos que se
reconhecem hoje a povos tradicionais, em geral, se fundamentam apenas
nos serviços
ambientais que eles prestam.
De fato de as questões climáticas tornaram-se uma das formas mais globais de como
a economia intervêm no mundo, passando a abranger inúmeras problemáticas e podendo ser
tratada sob diversos enfoques. Todavia optamos pela abordagem que busca trazer para o
64
debate o processo de institucionalização e suas implicações que de alguma forma estiveram
condicionadas, de um lado, pela consciência da limitação ecológica do ambiente físico, mas,
por outro também pelo seu contexto político, econômico e social.
Ressalta-se o marketing verde em torno da criação do Programa Bolsa-Floresta tem
demonstrado que a estratégia de comprometer recursos públicos como contrapartida para
atrair recursos de terceiros, por meio de acordos, podem apresentar alto potencial para
captação de recursos internacionais no setor privado no âmbito nacional e internacional
(Coca- Cola Company e Banco Bradesco), ainda que estas últimas assumam caráter de
doação, devido ao fato de inexistirem mecanismos nacionais de incentivo 34 a investimentos
privados que se revertam em benefícios ambientais (FAS, 2008).
Entretanto, tal estratégia pode encontrar uma maior inserção em determinados nichos
de mercados, já visíveis nas iniciativas de algumas empresas dispostas a investir no segmento
dos chamados novos negócios agora com um viés na conservação de ecossistemas naturais.
“Estas experiências por sua vez tem potencializado aspirações objetivas para se consolidar
enquanto fonte de recursos para os chamados pagamentos por serviços ambientais”.
(WUNDER, 2008, p.51).
Dessa forma, acordos nacionais e internacionais entre provedores públicos ou
privados e compradores (setor privado) podem se tornar uma fonte significativa para
transações com caráter de PSA, como demonstram alguns exemplos de atuação de empresas
privadas e outras entidades na Amazônia brasileira.
No caso do Amazonas, trata-se de um estado com considerável território coberto por
florestas onde vivem indígenas e comunidades tradicionais que dependem de suas relação
com os recursos naturais para sua produção e reprodução de vida social e cultural,
particularmente vulnerável às mudanças climáticas mas que, ao mesmo tempo, possui um
grande potencial de contribuição para a conservação ambiental da floresta amazônica.
De acordo com Fearnside (2005), em 1995 e 1996, pensava-se que a floresta
amazônica pudesse ser um grande sumidouro de carbono, pois havia estudos que apontavam a
absorção de cinco toneladas de carbono por hectare. Esta informação estimulou o projeto
Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia – LBA, com este
experimento, foi descoberto que a absorção é muito menor, variando entre meia e uma
34
Atualmente tramitam sete Projetos de Lei na Câmara dos Deputados do Congresso Brasileiro Disponível em:
http<www.camara.gov.br Acesso em: 15 de dezembro de 2009.
65
tonelada de carbono por hectare de floresta, e também se constatou que a absorção de carbono
varia de acordo com o clima.
No entanto, isto não muda o fundamento da relação entre conservação da floresta e
economia de redução de emissões de gases de feito estufa. O benefício essencial permanece o
mesmo, ou seja, as florestas exercem o papel de sumidouros de carbono. Dessa forma, evitar
o desmatamento significa não emitir carbono com a queimada, e o apodrecimento da madeira
que não queima e emite mais do que a própria queimada. Deste modo, é uma falácia insinuar
que se a floresta não absorve cinco toneladas de carbono por hectare não é importante
conservá-la para o equilíbrio do clima (FEARNSIDE, 2005).
Entende-se por bens públicos ou bens comuns aqueles em que todos têm livre acesso,
isto é, por cujo uso ninguém paga, já os bens privados são aqueles que têm a característica de
serem exclusivos, isto é, o consumo de um bem é internalizado por aqueles que pagam para
tê-lo. Portanto, enquanto os bens públicos são não rivais e não exclusivos, os bens privados
são exclusivos e rivais (HERNANDES, 2009).
A continuidade ou manutenção desses serviços, essenciais à sobrevivência de todas
as espécies, depende, diretamente, de conservação ambiental, bem como de práticas que
minimizem os impactos das ações humanas sobre o ambiente. Isto é, os povos e comunidades
tradicionais, que historicamente mantiveram uma relação de uso consideravelmente
sustentável dos recursos ambientais, por conseguinte, são também responsáveis pelo
fornecimento desses serviços ambientais, são os chamados provedores de serviços ambientais.
Para efeito deste estudo se restringe a abordagem do sistema de pagamentos por
serviços ambientais relacionados ao carbono e à biodiversidade, isto por representarem as
oportunidades discutidas com maior frequência no contexto da Amazônia. Por conseguinte,
por representarem interesses que norteiam o campo de perspectivas em torno das Unidades de
Conservação do Estado do Amazonas.
O pagamento por serviços ambientais (PSA) são definidos como pagamentos diretos
aos provedores de serviços, por sua vez os PSA internacionais, um país ou entidade
administrativa receberia pagamentos para implementar políticas voltadas à provisão de
serviços ambientais sob seu domínio. Atualmente, os pagamentos por serviços ambientais
estão sendo discutidos como medidas para o desmatamento evitado ou Redução de Emissões
por Desmatamento e Degradação Florestal – REDD (WUNDER, 2008).
66
Dada a concepção crítica das condições necessárias para o sistema de pagamento por
serviços ambientais, que Wunder (2008), defende em seus trabalhos, a definição de serviços
ambientais caracteriza-se pelos seguintes critérios:
1) uma operação voluntária, onde bem definidos (serviço ambiental) está sendo
comprada por um período mínimo de um comprador 2) a partir de um mínimo de
um prestador de serviços ambientais, e somente se o prestador de serviço ambiental
assegura a prestação do serviço. Enfatiza ainda que a maior freqüência dos
pagamentos por serviços ambientais existentes compreende aos serviços ambientais
associados a uma das quatro categorias distintas representadas pela: a). retenção ou
captação de carbono; b) conservação da biodiversidade;c) conservação de serviços
hídricos e d) conservação de beleza cênica( WUNDER, 2008, p.12).
Dessa forma, dentre as disposições assumidas pelo referido autor, merece atenção
para nossos propósitos, a importância dos incentivos econômicos enquanto núcleo
estruturante dos pagamentos por serviços ambientais. Ou seja, se considerarmos a presença de
prestadores de serviços ambientais pouco motivados pelo recebimento de pagamentos ou
mesmo considerá-los socialmente inadequados, então o sistema de pagamento por serviços
ambientais pode comprometer seus objetivos de funcionamento e eficiência. (WUNDER,
2008).
A relação dos pagamentos por serviços ambientais e seus reais efeitos sobre seus
participantes no caso as populações rurais requerem atenção especial com o alicerce do modo
de vida destas comunidades assim como a justa distribuição de seus ganhos, ou seja, a relação
da cultura de subsistência com os recursos naturais para manutenção e reprodução do seu
modo de vida. As povos que habitam nas áreas rurais da Amazônia são desprovidos e sofrem
de um descaso público/estatal desde os tempo da colonização.
Neste sentido, durante 11ª Conferência das Partes – COP 1135sobre as Mudanças
Climáticas de 2005, em Montreal as Partes Papua Nova Guiné e Costa Rica propuseram a
inclusão da Redução de Emissões pelo Desmatamento e Degradação em países em
Desenvolvimento (REDD) ao Protocolo de Quioto como alternativa para evitar o
desmatamento em países tropicais em desenvolvimento.
De acordo com Higuchi et all (2009), a modalidade REDD foi baseada no fato que o
desmatamento em países em desenvolvimento contribui com uma quantidade significativa de
emissões de GEEs partindo das seguintes premissas:
35
Em de dezembro de 2005, foram realizadas em Montreal, Canadá, a 11ª Conferência das Partes na ConvençãoQuadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 11), Ficou decidido que serão iniciados dois
processo de discussão sobre o futuro: um processo para o estabelecimento de novas metas de redução pós-2012
das emissões de GEE para os países desenvolvidos dentro do Protocolo de Quioto. Disponível em:
<http://www.m.ma.gov.br> Acesso em 12de dezembro de 2009.
67
- A Convenção do Clima é omissa em relação à redução de emissões por meio do
desmatamento;
- Não há como os países em desenvolvimento se engajarem ao Protocolo de Quioto
para reduções de suas emissões;
- Na ausência de rendas para florestas em pé, as comunidades e os governos de
países em desenvolvimento têm pouco incentivos para impedir os desmatamentos;
- As nações em desenvolvimento estão preparadas para estimar suas contribuições à
estabilidade do clima global baseado no acesso junto e igual aos mercados de emissões de
carbono;
- A estabilidade climática da expansão igual dos sistemas de mercados iniciados pelo
Protocolo de Quioto devendo facilitar e integrar a participação dos países em
desenvolvimento.
De acordo com Lopes (2002), dois conceitos são fundamentais para elaboração do
REDD36: linha de base e adicionalidade. Sendo esta última, o cenário que representa, de
forma razoável, o possível cenário de emissões que ocorreria na ausência das atividades do
projeto proposto. Comumente, utilizam-se os termos “cenário de referência”, ou “cenário sem
projeto”. Adicionalidade consiste na redução de emissões de gases de efeito estufa ou no
aumento de remoções de CO2 de forma adicional ao que ocorreria na ausência de tal
atividade.
É importante ressaltar que a resistência dos países desenvolvidos em avançar nas
negociações no campo dos serviços ambientais se explica pelas profundas assimetrias no
comércio mundial de bens e serviços ambientais. O tamanho expressivo do mercado
ambiental global, estimado em US$550 bilhões em 2003, podendo ser superior a US$ 600
bilhões em 2010, está concentrado nos países desenvolvidos, que perfazem cerca de 90%
desse mercado. Mas o potencial de crescimento nos países em desenvolvimento é mais alto do
que nas nações industrializadas;( OLIVEIRA; ALTAFIN, 2008, p.18).
De acordo com a Tacconi e Mahanty (2009), a abordagem dos diversos aspectos do
pagamento por serviços ambientais está relacionada às experiências concretas existentes em
curso. Assim, os fundamentos econômicos necessários para compreender a questão, e mesmo
o papel dos chamados guardiões da florestas (indígenas, quilombolas, seringueiros) devem ter
36
O REDD voltou a ser considerado como uma importante opção de mitigação no quarto relatório do IPCC,
conseqüentemente, a ONU criou o UM-REDD Programe, isto é, o Programa REDD da Organização das Nações
Unidas (ONU), em setembro de 2008. Este programa é uma iniciativa de três agências da ONU: Organização
para a Agricultura e Alimento (FAO), Programa da ONU para o Meio Ambiente (UNEP) e Programa da ONU
para o Desenvolvimento. A declaração do Sr. Ban Ki-moon, secretário geral da ONU expressa claramente a
campanha para a inclusão do REDD no pós- Quioto a partir de 2013(HIGUCHI, 2009).
68
num sistema de pagamento de serviços a distribuição justa dos ganhos destes recursos e os
impactos que esses esquemas têm sobre aqueles tidos como guardiões das florestas, contudo
tais questões estão muitas vezes subsumidas nos discursos governamentais em curso na
esfera local e global.
Outro ponto que merece destaque está associado à quantidade de dinheiro
apresentada como necessária para financiar esquemas de REDD e pagar a compensação aos
países, é altamente variável, mas apoiadores do REDD sugerem que grandes recompensas
pelo desmatamento evitado poderiam existir. “Conforme um estudo solicitado pelo Relatório
do Stern37 que envolveu oito países responsáveis por 70% das emissões resultantes da
mudança no uso da terra, o custo de oportunidade de renda a partir de usos alternativos de
terra seria na ordem de US$ 5-10 bilhões anualmente, isto se houvesse uma paralisação total
do desmatamento” (GRIFFTINS, 2008, p.132).
Ainda que questão social e de redução da pobreza apareçam na maioria das propostas
de desmatamento evitado, elas geralmente são deficientes em termos de detalhes sobre como
os direitos dos guardiões das florestas serão integralmente respeitados e garantidos, ou seja,
os discursos sob o ideário de novas oportunidades econômicas encobrem muitas vezes a
maneira (o método) que o mecanismo REDD, dependendo das escolhas políticas, podem
realmente assegurar os benefícios em locais de vulnerabilidade social. Os esquemas de
pagamento por serviços ambientais propostos inserem-se espaço de disputas (muitas vezes
desiguais) de “interesses” que têm aumentado de certa forma o controle estatal sobre florestas,
e por sua vez, aumentado intervenções governamentais apartadas dos sistemas de produção e
reprodução do modo de vida material e social, de posse da terra e manejo de recursos naturais
(GRIFFTINS, 2008).
Os intermediários desempenham um papel importante nos sistemas de pagamento
por serviços ambientais uma vez que tais serviços ambientais são normalmente mal-definidos
e muitas vezes têm a características de bens públicos e, portanto, exigem a intervenção de um
mediador para regular o uso e estabelecer os preços que não são definidos pelo mercado
(WUNDER, 2008).
37
O relatório Stern propõe que uma medida chave que a comunidade internacional deve tomar para frear as
mudanças climáticas, é enfrentar as “emissões não-energéticas” compensando países em desenvolvimento por
reduções no desmatamento. O relatório prevê que emissões de desmatamento podem alcançar 40 gigatoneladas
de dióxido de carbono (CO2) entre 2008-2012, aumentando a concentração de CO2 na atmosfera em 2 partes por
milhão. O relatório declara que:“As emissões não-energéticas somam um terço de todas as emissões de gases de
efeito estufa; enfrentar essas emissões será uma contribuição importante. Uma grande quantidade de provas
sugere que ações para prevenir a continuidade do desmatamento seriam relativamente baratas comparadas com
outros tipos de mitigação, se as políticas e estruturas institucionais certas fossem implementadas (GRIFFTINS,
2008).
69
Se é possível captar os sistemas de serviços ambientais como parte das estratégias de
conservação da Amazônia, é necessário evocar a discussão das consequências onde estas
atividades possam ter, principalmente, os impactos sobre os meios de subsistência rural, seja,
restringindo o acesso da população rural aos recursos florestais, seja integrando as
comunidades locais às formas subalternas de um mercado de carbono com ideário de controle
social.
Quando nós falamos de sistemas de pagamento de serviços ambientais, alguns
acabam por sobrepor a questão ambiental como ela não fosse social. Neste sentido, a obra o
desmatamento evitado e os direitos dos povos indígenas e comunidades locais de Griffittim
(2008), demonstra no exame de experiências concretas dos efeitos dos esquemas de serviços
ambientais sobre as comunidades locais, os riscos para os povos indígenas e comunidades
locais que dependem da floresta, no momento em que as florestas se tornem parte de um
esquema internacional para reduzir emissões de gás de efeito estufa do desmatamento, entre
eles destacamos:
- A maioria das propostas REDD existentes faz menção à necessidade de
“participação” comunitária e ao fornecimento de benefícios locais para comunidades da
floresta. Contudo, ocorre que em muitos países, a exemplo do Equador com florestas
tropicais, os Estados falham em reconhecer os direitos costumeiros coletivos dos povos
indígenas sobre suas terras ancestrais, ou apenas reconhecem uma pequena porção de suas
terras tradicionais – definindo legalmente as florestas restantes como “terra do Estado”. Este
assunto é de uma importância crucial, porque provavelmente o zoneamento de florestas de
acordo com qualquer esquema de pagamento REDD pode ser, em parte, determinado pela
posse de terra e direitos de propriedade. Existe o receio de que governos, empresas e ONGs
de conservação poderão “zonear” florestas através da demarcação de áreas protegidas,
reservas florestais e zonas de manejo florestal sustentável (desmatamento certificado) para
receber pagamentos de desmatamento evitado, excluindo ou prejudicando povos indígenas e
comunidades tradicionais.
- Há também o perigo que taxas de compensação por hectare de floresta
relativamente lucrativas, possam estimular a especulação de terra nas fronteiras das florestas e
até em áreas mais remotas de floresta. Assim, estes esquemas de REDD correm o risco de
incentivar a expropriação de terras tradicionalmente ocupadas.
- Outra questão são as iniciativas de inclusão das Florestas dentro dos esquemas
REDD de demarcação, geralmente são feitos de cima para baixo, sem medidas cuidadosas
70
para assegurar benefícios eqüitativos em áreas rurais, pagamentos de desmatamento evitado
podem criar rachas entre as comunidades ou famílias que recebem pagamentos e aquelas que
são excluídas. “Essas últimas podem incluir comunidades sem o título legal das suas terras.
Em outras palavras, compensação de desmatamento evitado pode incrementar a desigualdade
em áreas rurais florestais e corre o risco de criar conflitos dentro e entre comunidades”
(GRIFFTTIM, 2008).
Assim existem questões éticas em relação aos povos indígenas e comunidades
tradicionais quando se trata de receber renda através de empresas e do mercado global de
carbono, primeiro porque estes vêm se processando em sua grande maioria em pagamentos de
créditos de carbono, que guardam em sua origem dos mesmos interesses corporativistas e
industriais que continuam a extrair combustíveis fósseis em outros lugares, às vezes em terras
ancestrais de povos indígenas – fortemente à custa do seu ambiente, bem-estar e saúde. Na
realidade, estas mesmas empresas transnacionais de energia têm se envolvido com o comércio
de carbono, sobretudo para comprar direitos para continuar poluindo (op cit , 2008).
Ainda que em muitos casos seja demasiado cedo para chegar a resultados
conclusivos sobre os prováveis efeitos dos programas de pagamento por serviços ambientais,
nos interessa os aspectos estruturais significativos dos argumentos de Norton Griffttin para
explicação dos aspectos socioeconômicos e políticos de outro, ou seja o fio condutor que leva
o esclarecimento de questões que não estão postas no contexto das propostas de pagamento de
serviços ambientais na Amazônia.
Se pensarmos a partir do âmbito regional, as informações do Documento intitulado
Carta de Belém em 03 de outubro de 2009 é uma valiosa posição neste campo de interesses
em torno dos serviços ambientais na Amazônia: A legítima reivindicação dos povos
tradicionais, no sentido de que o governo brasileiro rejeite a utilização do REDD como
mecanismo de mercado de carbono e que o mesmo não seja aceito como compensação às
emissões dos países do Norte. Vejamos o que diz a carta de Belém.
Rechaçamos os mecanismos de mercado como instrumentos para reduzir as
emissões de carbono, baseados na firme certeza de que o mercado não é o espaço
capaz de assumir a responsabilidade sobre a vida no planeta. A Conferência das
Partes (COP) e seus desdobramentos mostraram que os governos não estão dispostos
a assumir compromissos públicos consistentes, transferem a responsabilidade prática
de cumprimentos de metas, além do que notoriamente insuficientes, à iniciativa
privada. Isso faz com que, enquanto os investimentos públicos e o controle sobre o
cumprimento de metas patinem, legitima-se a expansão de mercado mundial de
CO2, que aparece como uma nova forma de investimento de capital financeiro e de
sobrevida a um modelo de produção e de consumo falido. (BELÉM, 2009).
71
De acordo com Bourdieu (2001), o poder dos agentes e dos mecanismos que
dominam atualmente o mundo econômico repousa em uma concentração extraordinária de
todos os tipos de capital, econômico, político, militar, cultural, científico, base estruturante de
uma dominação simbólica através do controle das mídias pelas grandes agências
internacionais.
Se pensarmos do ponto de vista do uso social dos serviços ambientais, esta posição
que se expressa sob o ideário identitários e de lutas políticas e se justifica por perceber que as
propostas de REDD em debate não diferenciam florestas nativas de monoculturas extensivas
de árvores, podendo permitir aos atores econômicos, que historicamente destruíram os
ecossistemas e expulsaram as populações que vivem neles – encontrarem nos mecanismos de
valorização da floresta em pé maneiras de continuar a fortalecer seu poder econômico e
político em detrimento dessas populações. Além disso, apontam para o risco de que os países
industrializados não reduzam drasticamente suas emissões pela queima de combustíveis
fósseis e mantenham um modelo de produção e de consumo insustentáveis. Outra posição que
merece ser ressaltada neste documento argumenta:
Para o Brasil, as negociações internacionais sobre clima não podem estar focadas no
debate sobre REDD e outros mecanismos de mercado e sim na transição para um
novo modelo de produção,distribuição e consumo, baseado na agroecologia, na
economia solidária e numa matriz energética diversificada e descentralizada, que
garantam a segurança e soberania alimentar.(BELÉM, 2009).
O documento que dá voz às comunidades tradicionais através de suas instituições
representativas emerge na luta a partir de premissas de um núcleo duro que afirma as
condições estruturantes para que o mecanismo de redução do desmatamento e degradação seja
dimensionado a partir de políticas públicas e fundos públicos voluntários que possam
viabilizar seus direitos de cidadania.
Na verdade, essas de disposições assumidas constituem em um só tempo visões
diferentes de desenvolvimento, território e economia, e um campo dinâmico estruturado de
regras e agentes que adotam diferentes estratégias de controle da dimensão simbólica da
dominação (BOURDIEU, 2000).
O Programa Bolsa-Floresta é considerado pelos gestores (coordenadores dos
componentes do PBF) entrevistados, um serviço ambiental. Primeiro, porque é baseado no
modelo da experiência de Costa Rica, ao mesmo tempo em que também é um
reconhecimento do papel dos guardiões das florestas; mas acima de tudo, uma alternativa de
72
renda em detrimento das práticas agrícolas de degradação. É um apoio ao extrativismo e desta
forma, um novo modelo de serviços ambientais.
2.3 - O Programa Bolsa-Floresta na RDS Uatumã e a manutenção da floresta em pé.
Em 05 de junho de 2007, no âmbito da discussão sobre as mudanças climáticas e a
pressão internacional cria-se a Lei Estadual de Mudanças Climáticas nos seus considerandos
reconhece a importância da conservação das florestas diante das atividades antrópicas que
provocam efeitos nocivos da mudança global do clima. Por isso, o governo estadual assume,
naquele momento, o compromisso com o desenvolvimento sustentável da economia, do meio
ambiente, da tecnologia e da qualidade de vida das presentes e futuras gerações. Reconhece e
valoriza ainda as populações tradicionais em suas lutas pela conservação das florestas (DO
04/09/2007). Razão para instituir o Programa Bolsa-Floresta - PB que objetiva a um só tempo
compensar financeiramente as comunidades tradicionais pelo uso sustentável dos recursos
naturais e incentivo às ações voluntárias de redução de desmatamento comunidades das
Unidades de Conservação – UC, com a intenção de manutenção da floresta em pé, nos
territórios mais conservados da chamada Amazônia profunda, caracterizada por baixo índice
de desmatamento.
Em setembro de 2007 foram pagos as primeiras compensações do PBF aos
moradores da RDS Uatumã. A Fundação Amazonas Sustentável (FAS), desde dezembro de
2007 passou a ser responsável pelo Programa Bolsa Floresta, iniciando formalmente suas
atividades em março de 2008, recebeu inicialmente doações do Governo do Estado do
Amazonas e o Banco Bradesco S.A.
A Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uatumã foi à primeira UC a receber o
processo de implementação do Programa Bolsa-Floresta, e está localizada na área focal
escolhida pelo governo do Amazonas para a execução do programa, esta corresponde a parte
mais conservada da região, a chamada “Amazônia profunda” dentro da qual está situada a
maior parte do Estado do Amazonas, sendo uma região caracterizada por baixa taxa de
desmatamento, grande número de áreas protegidas (Terras indígenas e Unidades de
Conservação) presença de comunidades tradicionais e etnias indígenas e dificuldades de
acesso por estradas (VIANA, 2007), conforme a figura4 na pagina 96.
73
No entanto, os estudos de Soares Filho et al.(2006), afirmam a possibilidade de
ocorrência de desmatamento, segundo o modelo de simulação SimAmazônia I38, o
posicionamento geográfico da RDS do Uatumã a coloca como porta de entrada do
desmatamento provindo do nordeste do Estado do Amazonas.
Como vimos anteriormente, o Programa Bolsa-Floresta que concede o credito de
R$50,00 (cinquenta reais), atualmente a 365 famílias na RDS Uatumã não pode ser visto
como mera vitória dos populações que lá vivem, mas sim, de um lado,
deve ser
compreendido como produto das relações contraditórias entre as diferentes esferas da
produção e reprodução social do capital, e, de outro lado, a re-definição de novos elementos
norteadores das políticas socioambientais. Estas, por sua vez, envolve mediações complexas
sócio-econômicas, políticas, culturais, sujeitos políticos e forças sociais que se movimentam
e disputam hegemonia nas esferas estatal, pública e privada (FALEIROS, 1986).
Atualmente, a Fundação Amazonas Sustentável (FAS) garante que a evolução do
Programa Bolsa-Floresta em quatro modalidades tidas como parte integrante de um sistema
mais amplo de compensação ambiental, como se pode observar na tabela 03 correspondentes
aos valores de PBF Renda, Social e Associação referem-se ao total em realização durante o
período de junho/2009 a junho/2010.
Tabela 03: componentes do Programa Bolsa-Floresta
UC
FAMILIAR
RENDA
SOCIAL
ASSOC.
TOTAL
RDS Anamã
258.450,00
116.900,00
116.900,00
20.040,00
512.290,00
RDS Amapá
RESEX Catuá –
166.200,00
87.000,00
88.300,00
47.580,00
389.080,00
Ipixuna
127.800,00
78.050,00
78.050,00
52.565,00
336.465,00
RDS Mamirauá
1.063.650,00 628.700,00
628.600,00
127.840,00
2.448.790,00
RDS Juma
184.700,00
118.375,00
118.350,00
52.080,00
473.505,00
RDS Cujubim
8.250,00
46.399,00
186.823,00
61.256,00
302.728,00
RESEX Rio Gregório 59.850,00
41.000,00
159.600,00
58.098,00
318.548,00
RDS Rio Negro
160.650,00
78.000,00
103.580,00
60.660,00
402.890,00
RDS Uacari
135.250,00
114.000,00
111.400,00
58.060,00
418.710,00
38
As taxas regionais produzidas por esse modelo são então passadas para um simulador de mudanças espaciais –
dinâmica. Esse modelo corresponde a um sistema de informação geográfica (SIG) de caráter dinâmico, o qual
utiliza mapas de infra-estrutura (rodovias, estradas vicinais, estradas de ferro, gasodutos, canais fluviais e
portos), unidades administrativas (estados, países e macrorregiões), áreas protegidas (unidades de conservação
federal e estadual e terras indígenas), e aspectos biofísicos (vegetação, solo e topografia) para localizar as áreas
mais prováveis a serem desmatadas (Soares-Filho et al., 2004) e assim reproduzir os padrões de progressão do
desmatamento a través do território amazônico (Soares-Filho et al., 2005).
74
RDS Uatumã
RDS Piagaçu
205.750,00
115.342,00
117.795,00
45.940,00
484.827,00
Purus
322.100,00
118.234,00
-
-
440.334,00
FLOREST Maués
339.800,00
154.000,00
222.000,00
60.154,00
775.954,00
RDS Canumã
57.200,00
-
-
-
-
RDS Rio Madeira
366.300,00
-
-
-
-
TOTAL
3.455.950,00 1.696.000,00
1.931.398,00
644.273,00
7.727.621,00
Fonte: FAS, (2010).
De acordo com (FAS, 2008), existem outros componentes do PBF, como:
- O Bolsa-Floresta Renda (BFR) possui o objetivo de incentivar a inserção das
populações locais nas cadeias produtivas de produtos florestais sustentáveis, óleos, castanhas,
madeira, frutas e outros. Os investimentos do Bolsa-Floresta Renda, equivalem , em média, a
cento e quarenta mil reais (R$ 140,000) por Unidade de Conservação ao ano. Contudo, é
possível afirmar que quando consultados, as lideranças comunitárias demonstraram um
profunda desinformação quanto a aplicabilidade e transparências dos recursos destinados a
esse componente.
- O Bolsa-Floresta Social (BFS) deve ser direcionado a investimentos locais como
educação, comunicação, saúde, transporte. No que se refere à educação a totalidade dos
entrevistados consideraram uma das principais demandas, pois o acesso ao ensino médio é
considerado uma grande dificuldade que os jovens enfrentam tendo que se deslocarem para o
município mais próximo, de acordo com a localização da comunidade ou ainda da
disponibilidade de parentes que lá residem.
- O Bolsa-Floresta Familiar (BFF) é apresentado como uma recompensa mensal,
paga às mães das famílias que residem nas Unidades de Conservação já cadastradas e que
assumiram o compromisso de não desmatar a floresta. Quanto a este componente, é possível
dizer que é considerado uma pequena ajuda, mas que não garante que quando necessário
algumas pessoas continuam com atividades ligadas a lógica mercantil do desmatamento,
também é relevante mencionar a ineficiente ou ausente fiscalização das regras então
estabelecidas pelo Programa.
- O Bolsa-Floresta Associação (BFA), equivale a 10% da soma de todas as Bolsas
Floresta Familiar, destinado a promover o associativismo no sentido de promover a
organização social a partir das associações dos moradores das Unidades de Conservação para
fortalecer o controle social do programa.
75
Destacamos ainda que ao compararmos cada componente apresentado pelo discurso
institucional da FAS, com a observação direta nas comunidades do Uatumã, pudemos
observar que em certa medida aquilo que está sendo divulgado enquanto planejamento e
execução passa por um processo de pulverização desde a implementação e execução do
Programa, por exemplo, o Bolsa-floresta Associação apresenta-se em um processo
incompleto, caminhando contrariamente a retórica de uma existência eficiente de organização
social. Ora, não basta apenas proporcionar cursos sob o ideário da capacitação, que na
contramão da criação das desejáveis condições de vida nas comunidades, desconhece a
história da organização social local e tão pouco busca reconhecer os conflitos que se
apresentam da vida cotidiana do local. Seja nos interesses que condicionam as regras que
restringem o acesso das populações locais, seja nas formas de interação social entre as
comunidades e sua relação com as lógicas do mercado.
Trata-se da titularidade do pagamento ou não do que a floresta produz.
Antecipadamente afirmamos que efetivamente “ninguém está pagando nada a ninguém”, se
levarmos em consideração que esta floresta é pública e que são legítimos os direitos sociais
das populações que vivem na RDS Uatumã.
Assim, emergem as controvérsias relativas à possibilidade do ambiente natural vir a
ser um produto como outro qualquer, as teorias que estão por trás do uso do ambiente
enquanto um produto ou mercadoria que pode ser comercializado. Assim, é crucial fazer a
distinção entre bens públicos e bens privados. Segundo o Art. 1º do Código Florestal (Lei nº
4771 de 15/09/65) as florestas existentes no território nacional e as demais formas de
vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a
todos os habitantes do país, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a
legislação estabelece (HIGUCHI et al. 2009).
Segundo O’Connor (2002), existe um forte movimento em curso a idéia de bem
-comum, e dando especial atenção à história da comunidade, mas se atentarmos para as
principais correntes ambientalistas em curso, e aqui nos interessa aquela por detrás do PBF,
estas estariam aliadas a interesses nacionais e internacionais, no máximo, reformistas. A
estrutura própria do capitalismo, sustenta o referido autor mascara suas crises, pela
progressiva externalização dos custos sociais e ambientais, e, ao mesmo tempo, depende delas
para aumentar seus lucros e ampliar seus mercados, contradizendo diretamente os requisitos
ambientais. Além desse motivo, está diretamente relacionado ao capitalismo.
76
Para Cunha e Coelho (2003), o desenvolvimento de ações voltadas para gestão dos
recursos naturais, que objetivam o controle e a superação dos conflitos de interesse de acesso
e uso pelos diferentes agentes, não deve ficar apenas nas mãos de uma instituição (como por
exemplo a FAS) especializada do Estado. Mas permitir a possibilidade de uma contínua
participação das comunidades diretamente envolvidas pela dependência do ambiente para sua
reprodução social, ou seja, sociedade civil em parceria com essas instituições públicas, nos
processos de implementação das políticas ambientais.
Na Amazônia, no âmbito das mudanças climáticas globais e especialmente no Estado
do Amazonas, as transformações que se processam em campos, esferas e tempos diferentes,
de acordo com os interesses de poder sobre o acesso aos recursos naturais, aqui se encaixa o
conceito de “campo ambiental”, inspirado na noção de campo (Bourdieu, 2002), agregam um
confronto entre representações e classificações enunciadas por agentes sociais distintos. Este
campo ambiental que se configura é constituído por empresas internacionais, bancos,
entidades ambientalistas, comunidades atingidas, assessorias, empresas de consultoria, e
aqueles agentes que procuram angariar os “méritos” políticos da obra e que procuram se
beneficiar dos investimentos e do poder simbólico.
De acordo com O’Connor (1998), temos de um lado, a natureza apropriada como
significados da reprodução do capital e, do outro, significados da reprodução das sociedades,
transportando para a esfera local, a RDS Uatumã estaria fundada na simplificação da
pluralidade de usos fundadas tradicionalmente nas especificidades do ambiente e da cultura.
Contudo os sentidos que são dados para os usos destes espaços (comunidades) podem
manifestar o caráter conflitivo da questão ambiental, cujos agentes sociais participariam de
uma luta política pela:
Redistribuição do poder sobre os recursos territorializados, pela
legitimação/deslegitimação das práticas de apropriação da base material das
sociedades e/ou de suas localizações. As lutas por recursos ambientais são, assim,
simultaneamente lutas por sentidos culturais (ACSELRAD, 2004, p. 19).
Para uma breve reflexão sobre o conceito de comunidade, Max Weber nos informa
que a comunidade funda-se em qualquer tipo de ligação emocional, afetiva ou tradicional,
portanto a organização sociopolítica de uma comunidade baseia-se na orientação da ação
77
social que se articula com as atividades produtivas, praticas socioambientais locais e no
atendimento das necessidades básicas. Assim, para o referido autor, comunidade:
É uma relação social na medida em que a orientação da ação social, na média ou no
tipo ideal, baseia-se em um sentido de solidariedade: o resultado de ligações
emocionais ou tradicionais dos participantes (WEBER, 1987, p. 77).
É importante o trato dado ao conceito de comunidade por Tonnies (1947), o sentido
de comunidade estaria em oposição à sociedade. Entende-se a comunidade como um tipo de
grupo social em convivência real e orgânica, cujas ações seriam frutos da tradição, dos
costumes, enquanto que a sociedade tem outro sentido de agregado mecânico e artificial, cujas
metas e ações, oriundas de uma convenção, de uma lei, são definidas através das formas de
adequação dos meios ao fim.
Pode-se perceber que o argumento de Tonnies sobre o conceito de comunidade, em
parte, está presente nas contribuições de Weber, mas que, em certa medida imprime alterações
no que se refere abrir mão da exigência de uma territorialidade comum por parte dos
indivíduos, valorizando o caráter corporativo, o sentimento de comunidade e os interesses
Outra contribuição para o debate sobre comunidade é o argumento central de Fraxe
(2004, p.19), pois destaca que as comunidades “ribeirinhas” estabelecem uma multiplicidade
de trocas materiais e simbólicas com o centro urbano, ela afirma que: “As manifestações das
práticas culturais do mundo ribeirinho espraiam-se pelo mundo urbano”.
Para Florestan Fernandes (1972, p. 56), a definição de comunidade possui como
referência os fatores intrínsecos de estabilidade física, mas argumenta que se considerarmos a
comunidade como uma cidade, um bairro, estabelecendo novos elementos ao conceito, a
exemplo do espaço físico e da dinâmica dos padrões, pode-se depreender dessa posição que a
comunidade se estabelece como um sistema vivo, mutável e variável, que possui um sistema
de interrelações de sistemas menores, podendo vir a ter uma configuração geográfica e
funcional. A especificação geográfica compreende o povo de uma vila, de um bairro. A
comunidade funcional se expressa pelas pessoas que têm interesses comuns.
Segundo Almeida (1994), os chamados povos e comunidades tradicionais, passaram
se organizar em diversos movimentos sociais, contudo tem tido maior destaque a crise
ecológica e este desafio das comunidades tradicionais da Amazônia tem uma dimensão
marcadamente política e ideológica. Trata-se, antes de tudo, de mobilizações pela manutenção
de condições de vida pré-existentes a projetos e programas governamentais induzidos pelo
78
governo e pela garantia do efetivo controle de domínios representados como territórios
fundamentais à identidade desses atores sociais.
É inegável o destaque que a representatividade das comunidades tradicionais
constituem elemento central em um só tempo, nas tomadas decisões relacionadas ao acesso de
recursos naturais e nos contornos das políticas públicas, pois o conhecimento dos espaços e
lugares que habitam e trabalham são fundamentais em qualquer atitudes de órgãos
governamentais. Sendo preciso reconhecer, que estas comunidades inventaram e reinventaram
formas adaptativas diante das condições adversas, sendo importante salientar que tais formas
já existiam antes mesmo da criação da RDS Uatumã (FRAXE, 2006).
Para uma entrevistada que mora com seu marido e mais seis filhos na comunidade
Jacarequara da RDS Uatumã , sua vida cotidiana pouco mudou do ponto de vista das
condições básicas de vida a partir do Programa Bolsa- Floresta. Apesar de estabelecer regras
como o cultivo da roça agora restrita a dois hectares de floresta, ainda enfrenta a ausência de
serviços básicos: como saúde, educação, comunicação, acompanhamento técnico agrícola,
desde que passou a receber o valor de R$50,00 (cinquenta reais) por mês, assinou um contrato
com a FAS, com compromisso de não abrir nenhum tipo de atividade na floresta que desmate,
nas suas palavras:
Eu acho que mesmo com o Bolsa-Floresta continuamos dependendo da floresta para
sobreviver, enfrentando enchentes, ainda falta muita coisa para melhorar nossa vida,
aqui não temos um serviço de saúde descente, tenho que mandar meus filhos
maiores estudar fora da reserva, o que a gente recebe do governo (cinqüenta reais)
não mudou quase nada. (C.S.G. 39, em fevereiro de 2010).
De acordo com um dos gestores entrevistados o PBF tem como objetivo manter a
floresta em pé a partir da remuneração pela prestação de serviços ambientais feito diretamente
as comunidades que residem nas florestas, especificamente as Unidades de Conservação.
Tenta-se prover uma alternativa econômica ao desmatamento, de modo a reduzir as emissões
de gases de efeito estufa dele decorrentes.
Assim o PBF é tido como um serviço ambiental, baseado na experiência de Costa
Rica, ao mesmo tempo que também é um reconhecimento do papel dos guardiões das
florestas, mas acima de tudo no que se refere a RDS Uatumã, uma alternativa de renda em
detrimento às praticas agrícolas de degradação, é um apoio ao extrativismo, que pretende nas
palavras do entrevistado uma espécie de “novo modelo de serviços ambientais”. Deve ser
levado em consideração o entendimento da FAS representado por coordenador geral a relação
do PBF e as mudanças climáticas:
79
“um dos grandes responsáveis pela emissão de gases são as queimadas
(desmatamento na Amazônia), e as queimadas oriundas pela agricultura em pequena
escala têm sua parcela de contribuição. Nosso desafio manter a atividade de quem
utiliza agricultura exclusivamente para subsistência, e substituir a atividade de quem
utiliza agricultura pra subsistência gerando o excedente pra comercialização, pois
entendemos que este precisa desmatar um pouco mais para vender. Assim, Ou seja
nosso desafio é manter a floresta em pé. Se nós conseguirmos substituir essa
agricultura que gera excedente para comercialização por uma outra atividade com
rentabilidade e com um esforço menor, poderemos evitar o desmatamento e dessa
forma manter a floresta em pé” (F. P. 34. entrevistado em dezembro de 2009)
Atualmente o Programa Bolsa-Floresta possui na RDS Uatumã 365 famílias
cadastradas e 322 que já recebem a quantia de R$50,00 (cinqüenta reais). Embora a Fundação
Amazonas Sustentável tente deixar bem claro em seus informativos o propósito de diminuir o
índice de desmatamento, não estão explícitas as ações de substituição da base produtiva
agrícola ou pecuária por uma base extrativista baseada na estratégia instrumental que se
utilize a floresta mais mantendo a em pé, por sua vez no combate das questões das mudanças
climáticas.
Se realmente o propósito do PBF é reconhecer o papel dos chamados guardiões das
florestas, por que não construir as condições estruturantes que possam garantir o legítimo
direito de acesso aos recursos naturais, assim como o as garantias fundamentais que
compreende a cidadania? Até que ponto as populações rurais da RDS Uatumã são mais
responsáveis que os países desenvolvidos pela histórica emissão de gases poluentes,
comprovadamente causados em sua totalidade pela civilização movida pelos combustíveis
fóssil?
Um dos fatos que marcaram o PBF, momentos depois de seu lançamento na RDS
Uatumã, foram as críticas direcionadas a natureza de sua criação, supostamente com vestes
eleitoreiras e de cunho oportunista dos interesses locais que norteiam o cenário político do
Estado do Amazonas. Estes entram em cena de acordo com seus interesses como salvadores
(com distribuição de ranchos) ora na cheia ou no período de seca, mas inteiramente omissos,
principalmente no sentido de negligenciar as condições objetivas e subjetivas para a inserção
social das populações rurais que historicamente esteveram excluída dos projetos
desenvolvimentistas, ou seja, sem a possibilidade de alcance de uma autêntica política pública
que lhes permitisse acesso aos direitos constitucionais garantidos na Constituição de 1988, são
previstos no Art.6 os direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a
moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a
assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
80
Ainda que os aspectos estruturantes da implantação do Programa Bolsa-Floresta
tenham passado pela definição técnica que envolveu grupos de trabalhos com representantes
das Ong Greenpeace, Amigos da Terra, Conservation Brasil e do Instituto Nacional de
Pesquisas (INPA), Universidade do Estado do Amazonas, é possível dizer que estes critérios
podem não nortear as especificidades locais de cada realidade vivida e muitas vezes podem
estar alheias às escolhas tradicionais das populações das UCs.
Neste sentido é necessário destacar que as diretrizes e ideológicas, da empresa FAS
podem ser lidas a partir de um problema epistemológico como, por exemplo: como resultado
das restrições estruturais impostas pela lógica política e de acumulação da modernidade
capitalista ou como ajuste gradual da “learning institutional” da modernização ecológica.
Cabe ressaltar que este não é nosso ponto de chegada da análise, mas como um ponto de
saída: ter como objeto a própria incapacidade da política, ou melhor, sua produção e
manutenção. Seu caráter conflitivo da apropriação social dos recursos naturais, e portanto, a
sua função de recurso de poder o que o torna objeto de disputas e lutas sociais e políticas,
inclusive e sobretudo nas instâncias institucionais que atribuem significados e regulamentam
estas formas de apropriação (BORINELLI, 2008).
O estabelecimento do componente Bolsa-floresta social sinaliza para indicarmos este
momento como o início da absorção de apenas uma das reivindicações dos moradores da RDS
Uatumã, de universo mais amplo das demandas sociais facilmente identificadas, sendo
concretizado
no
componente
social
o
transporte
para
atendimento
emergencial,
disponibilizando uma lancha em comunidades estrategicamente localizadas (chamados pólos
comunitários), contudo cabe salientar que a ausência de escolas de ensino médio, e a
inexistência de atendimento médico local são apontados como problemas sociais. Outro
aspecto é que até agora o PBFS não conseguiu realizar a instalação de serviço de
comunicação como divulgados, e tidos pelas comunidades como fundamentais para
interlocuções na RDS Uatumã.
Destaca-se como mais emblemática ação do Programa a transferência de renda,
atribuída à Bolsa-Floresta familiar, porém este por si só não tem sido capaz de estimular,
promover ou concretizar receita eficiente para reprodução social, ou para o enfrentamento
das mudanças climáticas, nem tampouco garantir o desenvolvimento de ações geradoras de
renda baseadas no trabalho tradicionalmente ligado a terra e ao rio.
É possível identificar em propostas como o PBF, em curso na Amazônia, diretrizes
de controle disciplinar do acesso aos recursos naturais. Ao passo que ao contrário do que
81
parece, existem manifestações locais de um entendimento que o Bolsa-Floresta é apenas mais
uma tentativa de controle dos recursos naturais orientadas pelos interesses em um campo
político e ambiental complexo, compreende como sua expressão legítima o relato de um
morador da comunidade Bom Jesus:
“Eu entendo o pagamento dos 50,00 reais como uma maneira do governo controlar
nossas práticas, a própria criação da RDS Uatumã, de certa forma também tem o
mesmo propósito, como se sabe, com essa imagem o governo vem recebendo
recursos para conservar a mata” (M.T. 52 entrevistado em março de 2010).
O Programa Bolsa Floresta, em sua modalidade Associação, como vimos tem como
objetivo fortalecer a organização, ao mesmo tempo em que fortalece a base comunitária
estimula o controle social do Programa em termos de cumprimento de suas regras e
compromissos assumidos. Se isso é inovador e interessante, coloca, a nosso ver, uma
dificuldade. As formas de organização comunitária dos povos tradicionais em outros tempos
são outras... E agora parece ter-se instituído, sem pretensão de exagerar um poder disciplinar,
uma vigilância que disciplina não só as ações do presidente da Associação Agroextrativista
que sofre cobrança pela proteção da floresta, de um lado, pelos gestores da UC para que
atuem diretamente na fiscalização da Unidade, coibindo a pesca predatória e a retirada ilegal
de recursos naturais madeireiros e não-madeireiros. E, de outro, dos moradores que buscam
nos recursos naturais suas formas de reprodução social.
Este tem demonstrado ineficiência na promoção do desenvolvimento da organização
e participação das associações, especialmente a atuação da Associação Agroextrativista das
Comunidades da Bacia do Rio Uatumã - AACBU reconhecida como representante das demais
associações comunitárias da RDS Uatumã. De acordo com o presidente da Associação, o
número de comunitários que contribuem com a taxa da Associação é praticamente
inexpressivo, seja pela ausência de participação direta nas decisões, seja porque anteriormente
a Associação não desfrutava de legitimidade representativa. Assim, diante do quadro exposto,
torna-se necessário um recorte sobre a forma e concepção da apropriação do associativismo
nas relações entre o seio da produção rural familiar das comunidades da RDS Uatumã e a
instituição responsável pelo PBF, partindo da perspectiva de um exame das formas de uso dos
recursos naturais, percebendo como ocorrem as manifestação do capital social que se dá nas
formas de organização das comunidades da RDS Uatumã.
Em uma breve digressão o conceito de capital social pode ter diversas acepções
ajustando-se às mais variadas orientações teóricas e metodológicas, mas que nos interessa diz
82
respeito a sua utilização sociológica, ou seja, a abordagem sistemática que tem como foco as
estratégias de reprodução ou mudança de posição na estrutura social (BOURDIEU, 1980).
Putnam (2007), entende o capital social com ênfase na organização política e no
processo de ajuda mútua que se baseiam na regra de reciprocidade e na confiança, sendo esse
um dos caminhos para a manifestação e compreensão deste conceito. É importante também
considerar-se a cooperação espontânea, a participação e organização social como mecanismos
para acionar esse capital, que se materializa, dentre outras instâncias, na vida associativa.
Deste modo, pode-se perceber uma diferença entre as considerações de Putnam
(2007) e Bourdieu (1998)39 no que se refere ao capital social, pois a primeira abordagem
considera que a dimensão do político não deve ser sobreposta pela econômica para acionar e
entender o capital social. Já Bourdieu discute o capital em suas expressões (econômica,
histórica, simbólica, cultural e social) com possibilidades de se projetar sob variados aspectos
no capitalismo ou em outro modo de produção limitado as circunstâncias de sua produção.
Apesar das nuanças conceituais, o capital social apresenta impactos em todas as esferas
sociais e na capacidade dos cidadãos de criarem e desenvolverem suas redes de relações
possibilitando a fluidez da informação de forma coletiva, dando abertura para a cooperação,
visando sua reprodução futura.
Assim é perceptível, que ambos tratam de forma particular o capital social desde as
questões simbólicas, a exemplo da confiança mútua. Mas, a lacuna na abordagem de Putnam
estaria na ausência de sua estrutura de análise do capital social o enfoque da noção de conflito
(desigualdade) na acumulação de capital social como afirma Bourdieu (ABRAMOVAY, 2000
e MILANNI, 2003).
O conceito de capital social na sua forma instrumental está centrado nos benefícios
que são obtidos pelos indivíduos em função de sua participação em grupos e sobre a
construção deliberada de sociabilidade com o objetivo de criar este recurso:
O capital social é o conjunto de recursos atuais ou potenciais que estão ligados à
posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de
interconhecimento e de inter- reconhecimento ou, em outros termos, à vinculação a
um grupo, como conjunto de agentes que não somente são dotados de propriedades
comuns (passíveis de serem percebidas pelo observador, pelos outros ou por eles
39
Pierre Bourdieu destaca também a criação do capital social através do conceito de habitus - as atitudes,
concepções e disposições compartilhadas pelos indivíduos pertencentes à mesma classe – que configura redes
sociais de relacionamentos entre os agentes. O volume de capital que um indivíduo possui depende então da
extensão da rede de relações que ele pode efetivamente mobilizar e do volume do capital (econômico, cultural ou
simbólico) associado a cada um daqueles a quem está ligado ( BOURDIEU 1980).
83
mesmos), mas também são unidos por ligações permanentes e úteis (BOURDIEU,
1980, p. 67).
A partir das vozes de lideranças comunitárias da RDS Uatumã, é possível apontar o
distanciamento dos dirigentes da Associação Agroextrativista em relação a certas
comunidades, isto devido a problemas de natureza
internas e externas acumulados em
conflitos que já são históricos conforme relatos:
A associação sempre teve como problema a ausência de apoio e participação, e até
mesmo de direção, quando era utilizada em beneficio pessoal, isso com certeza
causou desconfiança e diminuiu o interesse das pessoas de fazer crescer a
associação. Agora que com o novo presidente eleito, um rapaz ativo que tem nos
colocado mais a par das mudanças na RDS, as informações chegam, mas ainda com
certas limitações (C. M. 51, entrevistado em março de 2010).
As relações estabelecidas entre a associação e seus associados e não associados,
podem nos levar a observar que o capital social que se materializa ou não a partir das relações
construídas entre a Associação Agroextrativista, os comunitários e produtores rurais têm
reflexos na organização política e econômica das comunidades da RDS Uatumã. Refere-se à
idéia de que são os fatores culturais que explicam porque as sociedades se diferenciam em
seus desempenhos econômicos e políticos. E assim, a existência de horizontalidade nas
relações entre indivíduos, estão desenvolvidas de acordo com as particularidades locais
através de uma tradição comunitária, determinaria a maior propensão para o envolvimento dos
agentes em ações coletivas capaz, então, de potencializar o uso do capital material e do capital
humano da coletividade. Ao contrário, relações hierárquicas calcadas em clientelismo,
ausência de confiança, inibiriam o engajamento cívico, levando a uma performance inferior.
(PUTNAM, 2007).
De acordo com Giddens (2002), essa tendência de enfatizar a organização é a maior
característica da sociedade moderna. No entanto, “Dizer modernidade é dizer não só
organizações mas acima de tudo “organização”, ou seja, o controle regular das relações
sociais dentro de distancias espaciais e temporais indeterminadas.” Seria então, a
obrigatoriedade de existência de uma Associação AACBU representativa um reflexo da
modernidade, como também um mecanismo de controle do Estado acerca dessas
comunidades rurais? Por via dos discursos apresentados por representantes dos governos
municipais, estaduais e federal, é possível entender esse encaminhamento.
Quando um agrupamento se autodefine comunidade tradicional ou mesmo assume a
identidade representativa de guardiões das florestas, torna-se prioridade nas linhas dos
84
recursos públicos. Assim, as políticas públicas têm sido uma busca por parte das populações e
uma forma de controle dos donos do poder dos chamados guardiões das florestas. Isso
promove uma mudança de comportamento social. As coisas mudam com uma velocidade
jamais antes sentida. A moderna percepção da relação tempo e espaço promove, portanto, um
rearranjo coletivo, mas que também atua sobre o indivíduo. (GIDDENS, 2002).
No Programa Bolsa-Floresta o termo comunidade é uma unidade política, que de
preferência deve se organizar também como uma unidade produtiva, na medida em que um
dos objetivos do Programa é incentivar o desenvolvimento sustentável da comunidade. No
entanto, essa unidade não se mostra assim tão definida que possa seguir critérios objetivos
pré-determinados, fazendo-se sempre necessária uma certa maleabilidade para adequar caso a
caso às demandas do programa. As comunidades nem sempre são unidades pré-existentes,
organizadas em torno de questões ambientais de produção, ainda que tenha uma liderança
política instituída. Assim, as especificidades das formas de organização das comunidades
necessitam estabelecer negociações para que seja definido como deve ser desenvolvido o
Programa Bolsa- Floresta de acordo com a comunidade.
Deste modo, se considerarmos a articulação do Programa Bolsa-Floresta associação e
o poder controle por parte do poder governamental do acesso dos recursos naturais no âmbito
do associativismo40, encontraremos uma forma coercitiva em curso pelo Estado no sentido de
organizar a população da RDS Uatumã em instituições de classe como associações de acordo
com seus interesses.
De acordo com relatos, as comunidades, nos últimos anos, vêm amargando
problemas causados por um distanciamento dos tomadores de decisão e, em particular de
problemas de estrutura política, econômica e social interna que exigem um forte capital social.
A representatividade da Associação Agroextrativista da RDS Uatumã concentra-se
na identidade de principal interlocutora nas relações com a Fundação Amazonas Sustentável.
Mas também é relevante chamar atenção para a necessidade de um envolvimento direto dos
agentes sociais (Presidentes de associação) na criação e desenvolvimento de associações sem
estarem tão dependentes as amarras do Estado ou ainda instituições privadas como a FAS.
De acordo com um dos o coordenadores (institucionais) do Programa Bolsa-Floresta são
os moradores que decidem quem deve ser seu representante junto ao programa, principalmente
40
Para melhor entender o associativismo, há dois momentos marcantes para compreender-se o associativismo no
Brasil. O primeiro diz respeito ao período que abrange as décadas de 1960 e 1980, quando a busca era o
reconhecimento identitário das organizações alternativas pelo Brasil, como sindicatos e associações e outros.
Nos anos 1990, sob a égide da globalização, eram emergentes as formas institucionais conjugadas na busca de
uma participação cooperativa, atreladas as parcerias entre o Estado, Ong´s e o mercado, originando perfis
diferenciados de associativismo dentro de concepções e funcionalidades diferenciadas (WARREN, 1998 2005).
85
naquelas situações em que existem comunidades com mais de uma associação, por exemplo, na
RDS Uatumã, que possui mais de uma associação, é Associação Agro-Extrativista das
Comunidades da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã, a atual responsável
por atuar em toda a reserva. Esta associação foi formada em 2007 com a intervenção e apoio
de agentes externos, como CEUC, IDESAM e Manaus Energia, devido a necessidade de a
Reserva ter um representante interlocutor entre as demandas comunitárias e os governos
atuantes na região (IDESAM, 2008). Em alguns relatos de comunitários sobre a organização
das comunidades no que tange os assuntos como o PBF, expressaram a visão das associações,
como responsabilidade única e exclusiva do presidente, nas palavras do comunitário:
Sinto que a associação ainda faz pouco, mas agora começou a melhorar com o atual
presidente, até que ele tem lutado por nós junto ao governo, mas tem conseguido
muito pouco, eu acho que ele até se esforçado, está dando conta do recado, da
associação (S.M.42 entrevistado em março, 2010).
O modelo de associativismo induzido no PBFA pela FAS na RDS Uatumã resulta em
desenvolver como prática organizativa, o poder de interlocução do presidente da AACBU nas
manobras para adquirir recursos. É claro que isso também implica, sobretudo, no seu
reconhecimento político, que se expressa no poder de pressão e nos resultados das
articulações junto aos órgãos oficiais (FAS, INCRA, SDS e outros). Contudo, também,
observa-se que este poder tem baixa representatividade, observando-se a centralização das
decisões na diretoria, que tende a concentrar poder e informações. Deste modo, a
predominância da relação de dominação e dependência entre a Associação Agroextrativista do
Uatumã, FAS e o Estado limita o poder de negociação da associação.
É perceptível que a partir do processo de estabelecimento do Programa BolsaFloresta houve um considerável aumento de poder das lideranças comunitárias que
representam as Unidades de Conservação contempladas pelo programa, a exemplo, o
presidente da Associação no Uatumã, uma vez que é este quem se responsabiliza por
monitorar as famílias em relação ao cumprido de obrigações, como não desmatar a floresta
para fazer roças ou pastos.
A associação pode fazer a denúncia a FAS do não cumprimento das regras pela família
que participa do PBF, no entanto, se uma família é desligada do programa, os valores destinados a
associação diminui. Com isso espera-se como atitude da liderança comunitária, no caso o
presidente da Associação Agroextrativista das Comunidades da Bacia do Rio Uatumã, que
dialogue e convença o responsável pelo desmatamento no sentido de que este não repita tal ação
novamente.
86
Neste sentido, os dispositivos de controle e disciplina41 em curso em programas e
planos socioambientais, a exemplo do PBF na Amazônia nos remete as abordagens de
Foucault em Vigiar e Punir (1987). Uma das idéias é que as sociedades modernas podem ser
definidas como sociedades disciplinares. Assim, temos no Bolsa-Floresta Associação uma
vigilância hierárquica, onde existe um sistema de poder sobre o corpo alheio, integrado por
redes verticais de relações de controle, exercidas por dispositivos/observatórios que vão desde
reformulações do capitalismo quando incorpora e se apropria do enfrentamento das mudanças
climáticas, nas parcerias entre instituições governamentais e não governamentais, até o
monitoramento das comunidades da RDS Uatumã pelas lideranças comunitárias. Esta
reprodução de vigilância geram efeitos de poder, como ocorre nas fábricas, por exemplo:
permite o controle contínuo dos processos de produção e, assim, funciona como operador
econômico inseparável do sistema de produção, da propriedade privada e do lucro.
Associação Agroextrativista que sofre cobrança pela proteção da floresta, de um
lado, pelos gestores da UC para que atuem diretamente na fiscalização da Unidade, coibindo a
pesca predatória e a retirada ilegal de recursos naturais madeireiros e não-madeireiros. E, de
outro, dos moradores que buscam nos recursos naturais suas formas de reprodução social.
Aí parece residir, possivelmente, uma enorme dificuldade que se expressa pela falta
de política pública no que se refere a infra-estrutura no interior da RDS. O presidente da
Associação argumenta que ainda não conta com um sistema de comunicação (do qual o mais
viável seria a radiofonia) e muito menos o Luz Para Todos. No caso acima anunciados é
impossível notificar a tempo ao Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas
(IPAAM) ou IBAMA a ocorrência de infrações.
Em vista disso, reclama que, por viver em áreas do conflito e denunciar atividades
ilegais e não contarem com proteção policial, sofrem risco maior que os servidores do Centro
Estadual de Unidades de Conservação CEUC da Secretaria da Desenvolvimento Sustentável
e do IPAAM nas atividades de fiscalização, colocando em perigo inclusive membros de sua
41
O estudo do conceito de disciplina, como política de controle e domínio da energia produtiva individual nas
sociedades modernas, é estruturado por elementos e princípios específicos. Na linguagem de Foucault, os
elementos da disciplina são os seguintes: a) a distribuição dos corpos, conforme funções predeterminadas; b) o
controle da atividade individual, pela reconstrução do corpo como portador de forças dirigidas; c) a organização
das gêneses, pela internalização/aprendizagem das funções; d) a composição das forças, pela articulação
funcional das forças corporais em aparelhos eficientes. Os princípios da disciplina são constituídos pelo método
de adestramento dos corpos: a vigilância hierárquica, a sanção normalizadora e o exame. A disciplina é uma
anatomia política do “detalhe”, é dispositivo tático de poder, sustentado por uma racionalidade econômica ou
técnica. A disciplina torna-se arte e técnica de compor forças para obter um aparelho eficiente, no interior do
qual o “corpo se constitui como peça de uma máquina multisegmentar” (FOUCAULT, 1987:148).
87
família. Além disso, mesmo com o Plano de Manejo, enfrenta dificuldades por exemplo na
discussão de acordos de pesca e a divulgação de regras mais claras para o uso dos recursos
naturais da RDS Uatumã. Fica evidente, que cabe aos guardiões a enorme responsabilidade,
também, de dar conta da segurança da reserva. Dever este que deveria ser, sobretudo, de
responsabilidade de guardas/polícia florestais, em sentido estrito e do Estado de suas
responsabilidade clássicas de segurança com a fronteira territorial.
Se do ponto de vista institucional a Associação-AACBU ainda não tem recebido a
devida atenção, especialmente da FAS do ponto de vista político o Presidente registra um
outro desafio: a participação dos comunitários nas Associações, nesse início de uma nova
gestão na RDS. Nessa fase de reestruturação, segundo ele, busca-se dar mais força a
organização social. Importa aqui registrar que, esse poder disciplinar está em descompasso
com as formas centenárias de organização comunitária nos beiradões da Amazônia baseadas
em princípios da solidariedade e do coletivismo, das práticas tradicionais do ajuri, do mutirão,
nas formas de produção para a subsistência e venda do excedente. E de outras instâncias de
organização como o grupos de catequistas, grupo de jovens e clube de mães.
De acordo com Cruz (2006), a existência de organizações estruturadas verticalmente
não contribui para o estabelecimento de práticas democráticas, onde o princípio é exatamente
o oposto, o estabelecimento de relações mais igualitárias. No caso da RDS Uatumã, a
experiência histórica vivenciada pela população pode estar sendo a assimetria das relações em
todas as esferas da vida social, reforçada pela centralização do poder, estimulando um
comportamento apático e desinteressado politicamente.
De acordo com um dos coordenadores do PBF tal como ocorre nos programas de
transferência de renda, uma das contrapartidas para aqueles que recebem o benefício BolsaFloresta Familiar é manter os filhos na escola, no caso específico da RDS Uatumã o controle
tem sido feito pela fiscalização de técnicos da FAS através da freqüência em consulta com os
professores das escolas que existem nas comunidades. Em muitas UCs ainda está em fase de
articulação com as secretarias de educação dos municípios. Contudo, tanto a fiscalização da
freqüência dos filhos daqueles que recebem o valor da Bolsa-Floresta, como
o
monitoramento de áreas de plantio que não podem ultrapassar dois hectares para plantio,
geralmente fica nãos mãos do presidente da associação agroextrativista.
Os recursos oriundos do Programa Bolsa-Floresta Renda e Associação devem ser
investidos de acordo com as demandas discutidas nas assembleias gerais das comunidades.
Esta decisão passa pelo crivo técnico da FAS, tal escolha deve possuir viabilidade, ter
88
potencial na comunidade, e aceitação no mercado. Depois disto a Fundação compra e entrega
os equipamentos necessários, sendo feito um monitoramento do uso destes equipamentos
trimestralmente.
Para O’connor (2002), a maior ou menor ação em favor ou contra a degradação
ambiental e o empobrecimento se referem sempre a busca de sustentabilidade do capitalismo
para fazer frente a essas contradições. A diferença a se manifestar aí será sempre a ação
política, de modo que os movimentos sociais e ambientalistas consigam tornar a
sustentabilidade um problema político, porque geradora e produto de clivagens sociais e
desequilíbrios ambientais. O quadro relacional do PBF e as mudanças climáticas globais
podem ser resumidas da seguinte maneira, segundo um dos chefes de família da comunidade:
“aqui eu escolhi viver e criar meus filhos e antes das pessoas aparecerem por aqui
falando em cuidar da floresta ou mesmo da criação da reserva, já vivíamos
conscientes da importância da natureza, plantamos para nosso sustento e colhemos
aquilo que Deus nos dá, mas sei que a natureza está mudando, pois eu vivo aqui e
em toda minha vida não tinha visto cheia tão grande, e somos nós é que sofremos
com esta historia do clima, sendo que não somos os grandes responsáveis pela
destruição da mata ou da mudança do clima. A vida aqui ainda é difícil,
principalmente para os mais jovens, o dinheiro do PBF não cobre nem o mínimo das
nossas necessidades, mas não podemos recusar esta oportunidade ( D. A. p. 34.
entrevistado em março de 2010)
É interessante observar que a Fundação Amazonas Sustentável tenta deixar claro em
seus informativos o propósito de diminuir o índice do desmatamento, embora não esteja
explícito a substituição da base produtiva agrícola ou pecuária por uma base extrativista
baseada na cultura que se utilize a floresta mais mantendo-a em pé, por sua vez estaremos
ajudando no combate às questões das mudanças climáticas.
Conforme Karl Marx (2004), o que define o caráter de um modo de produção é a
articulação existente entre as forças produtivas e as relações sociais de produção. Essa
articulação visa a assegurar a própria reprodução do modo de produção. Com isso, podemos
dizer que os modos de produção até hoje existentes se definem pela presença de classes
sociais complementares e antagônicas que resultam da articulação entre determinado estágio
de desenvolvimento das forças produtivas e suas correspondentes relações sociais de
produção.
No capitalismo, este processo implica o fato de que: a) todo produto social toma a
forma de mercadorias (e não apenas uma fração excedente); b) a própria força de trabalho é
uma mercadoria; c) o capital, que é uma relação social, cristaliza-se em meios de produção
que são também mercadorias. Este processo possibilita a extração da mais-valia como
89
apropriação privada do valor gerado pelo trabalho social e potencializa a circulação do capital
em base ampliada. Ou seja, o que define o capitalismo não é simplesmente a produção de
mercadorias, mas, precisamente, o fato de que: As mercadorias são produto do capital; a
produção capitalista é a produção de mais-valia 3) é, no fim de contas, produção e reprodução
do conjunto da relação, e é através disso que este processo imediato de produção se
caracteriza como especialmente capitalista” (MARX, 2004, p. 37).
Com base nesta definição geral, pode-se dizer que as comunidades rurais do Uatumã
aparecem sob a luz da teoria marxista como uma “exploração parcelar”, ou seja, que produz
em uma parcela restrita de terra e que estão integrados parcialmente ao processo de divisão
social do trabalho. A maior parte de sua produção é utilizada como meio de subsistência,
logo, possui apenas valor de uso e não valor de troca, ao contrário do agricultor, que depende
totalmente da venda de seu produto, que é mercadoria.
Para Marx, o surgimento de formas estatais não está ligado à necessidade de
perpetuar a luta de classes, como queria Engels. Para Marx, como dissemos, o Estado é uma
forma de instituição que nasce naturalmente das necessidades das comunidades semi agrárias,
ou recém-assentadas, de organizar as obras de produção e reprodução da vida material
imediata.
Assim, do ponto de vista de Marx, o Estado deixou de ser esta entidade comunal
originária, organizadora das obras de necessidades mais imediatas para tornar-se uma
entidade privada, ou seja, uma “entidade comunal” resguardadora dos interesses comuns de
apenas uma parte da sociedade, contra os interesses de outra parte desta mesma sociedade,
como pensava Engels, somente a partir do momento em que as riquezas da sociedade já não
mais eram propriedade da entidade comunal originária, mas sim teriam se tornado já
propriedade privada daquela pequena parcela da comunidade que controlava já, efetivamente,
a entidade comunal. Segundo Marx, o Estado, como forma de entidade já contraditória, mas
que ainda cumpre um papel apenas de mediador da luta entre as classes antagônicas e que
evolui para a forma de entidade gerenciadora e organizadora dos interesses de uma única
classe contra as classes expropriadas da riqueza social, caracterizaria o processo histórico
ocidental clássico ( MARX, 2004).
Podemos observar as coisas da lógica do processo de acumulação do capital a partir
dos efeitos residuais da política estadual para o ambiente no Amazonas, pois nota-se que os
discursos econômicos de apelo social, fundadores da proposta do chamado neo
institucionalismo de escolha racional firmados na maximização da função utilitarista pelos
90
agentes sociais. Estes encontram sua expressão maior nas escolhas públicas, isto é, a
intervenção do Estado não pode corrigir as externalidades negativas geradas pelas ações dos
agentes sociais sem causar outras externalidades proporcionalmente indesejáveis, por
exemplo: a apropriação de bens públicos (ANDREWS, 2005, p. 5).
A relação entre a Fundação Amazonas Sustentável e o governo do Estado do
Amazonas tida como única forma de dar continuidade ao PBF, expressando-se na forma de
coerção, por meio de incentivos ou da imposição de sanções. O foco estaria no problema na
ação coletiva do uso dos recursos naturais de acesso comum, desta forma a existência da
Fundação Amazonas Sustentável e sua legitimidade em regular o uso de bem comum de
modo a serem sustentáveis. Um relevante ponto de partida é o conhecido artigo de Garret
Hardim, “The Tragedy of the Commons” ( na língua portuguesa A tragédia dos Comuns), no
qual o autor afirma que a racionalidade da ação de cada indivíduo no uso dos recursos
naturais compartilhados levaria necessariamente ao esgotamento dos mesmos, ou seja o
argumento de Hardin pode ser sintetizado da seguinte maneira: a ação coletiva não seria
possível exceto em pequenos grupos só acontecendo por meio de coação externa (ANDREWS
apud, OSTROM, 1997).
É possível identificar nas argumentações institucionais do Programa Bolsa-Floresta
um forte apelo em manter a floresta em pé, mas do ponto de vista sociológico corresponde ao
modelo da “tragédia dos comuns”, ou seja, a um modelo chamado por “Dilema do
Prisioneiro” a partir da cooperação poderia deixar todos em melhor situação, mas isso não
ocorre devido a incerteza que cada agente (comunitário da RDS Uatumã) tem em relação ao
comportamento do outro, desta forma podendo produzir um resultado coletivo negativo
(ANDREWS apud, OSTROM, 1997).
De fato, os pressupostos destas teorias têm consequências para as políticas públicas
uma vez que ao se referir a situações ambientais como a tragédia dos comuns, problemas de
ação coletiva que envolve os recursos de propriedade comum, onde o Programa BolsaFloresta invoca uma imagem que internaliza uma imagem de indivíduos incapazes, enredados
em um processo de destruição dos recursos naturais que necessitam para produzir e reproduzir
deu modo de vida.
Segundo Ostron (1997), a partir de tal concepção sobre o comportamento dos
indivíduos, duas prescrições políticas geralmente são apresentadas. A primeira corresponde ao
modelo de coerção externa exercida por instituições governamentais. A segunda diz respeito a
privatização que considera que essas recomendações são contraditórias e excludentes.
91
Os indivíduos têm a capacidade de se organizarem para implementar objetivos
comuns, para compreender tal constatação empírica, seria necessário desenvolver uma nova
teoria da ação coletiva. Neste sentido o quadro referencial do PBF incorpora normas de
interação social(oficinas de capacitação)como elementos muitas vezes coadjuvantes, faz essa
incorporação sem qualquer menção ás diferentes orientações que estão subjacentes a questão,
ou seja, as variáveis típicas de analises econômicas como custos, benefícios expressas em
termos quantitativos sendo verificadas segundo a perspectiva que ignora a base interpretativa
das interações sociais ( ANDREWS apud HABERMAS 1984, p. 10).
Nessa conjuntura, a (re) discussão do espaço público e espaço privado e sua relação
com o ambiente ainda que preliminarmente, constitui um passo importante para entender que,
o Estado do Amazonas não está apartado das transformações vivenciadas pelo mundo
contemporâneo, entre as quais se destacam a mudança do papel Estado e a ausência de uma
distinção de espaços públicos e legitimidades dos espaços privados para discussão dos problemas
locais, assim como no delineamento e na discussão da realização de políticas públicas. A
emergência e o crescente número de atividades privadas relacionadas ao Estado e, de outra parte,
a intervenção do Estado em atividades privadas, permite que, atualmente, afirme-se a realização
de uma publicização do privado e uma privatização do público.
Neste sentido, o Programa Bolsa Floresta, empregado no Estado do Amazonas, (não
especificamente na RDS Uatumã), pode ser tomado como um mecanismo de PSA. Com base
numa autorização constante nos artigos 6º a 10º da Lei Estadual n. 3135/2007, o estado do
Amazonas instituiu, juntamente com parceiros privados, a Fundação Amazonas Sustentável
(FAS), com o objetivo de desenvolver e administrar programas voltados para as mudanças
climáticas; ainda, a FAS está autorizada a comercializar os serviços e produtos ambientais.
Outra contradição identificada nesta abordagem da instituição responsável pela
implementação, execução e planejamento do PBF, explora os efeitos discriminatórios, que ao
sugerir que o controle e poder dos recursos naturais de bem comuns, deixa claro o conflito de
interesses inerentes às questões distributivas, esta abordagem prega que as instituições podem
ser entendidas em termos de seus benefícios sobre segmentos específicos da comunidade.
Aqui, a imposição dos interesses dominantes, logo, necessários à sua manutenção, moldam as
políticas para o ambiente no estado do Amazonas de tal forma que a adaptação do
comportamento às mudanças nos ambientes social e econômico se torna não mais uma opção,
mas uma necessidade ( BORINELLI, 2008).
O aprofundamento das restrições dos recursos naturais na RDS Uatumã podem fatal
mente afetar mais as comunidades tradicionais, esta privação do acesso ao ambiente aos
92
moldes do institucionalismo que de uma situação muito diferente da pintada na publicidade
do verde politicamente correto, inviabiliza os desejos e perspectivas dos modos de vida das
comunidades da RDS Uatumã.
A dicotomia entre espaço público e espaço privado se transformou no transcurso
histórico, sendo que, na contemporaneidade, verifica-se um estreitamento do seu significado.
Na atualidade, público e privado tendem a se confundir de modo crescente ao mesmo tempo
em que os significados e anseios comuns compartilhados pelos membros da sociedade são
cada vez mais esquecidos (TESSMANN, 2006, p.25 ).
2.4 - O Programa Bolsa-Floresta: política governamental
Para além das discussões sobre os reais e comprovados efeitos locais das mudanças
climáticas, é um fato que vivemos sob o signo das contingencias: catástrofes, doenças e crises.
A força que a idéia dos direitos sociais passam a se orientar pela lógica “pessoas que recebem
alguma coisa do estado tem que pagar”, principalmente no sentido de substituir o direito de
receber um serviço pelo mérito.
Assim, o PBF constitui, a exemplo dos programas de transferências de renda,
mínimos sociais com o objetivo de contribuir para o atendimento de necessidades sociais
básicas da população da RDS Uatumã, ou seja, a busca da autonomia, que não se limita às
necessidades biológicas, mas a necessidades entendidas como “a capacidade dos indivíduos
do individuo eleger objetivos e crenças, de valorá-los com discenimento e de pó-los em
pratica sem opressões (PEREIRA, 2000. p. 70).
Neste campo político e ambiental encontramos divergências existentes entre os
grupos e interesses que envolvem o direito de acesso aos serviços públicos sociais. Refiro-me
ao PBF, PZFV e aos ganhos com a imagem das famílias que moram nas UCs e as
perspectivas de lucros com os serviços ambientais. Estes elementos fazem parte da política
ambiental do estado do Amazonas de enfrentamento das mudanças climáticas. Um campo
desigual, onde temos de um lado a parcela da sociedade (grupos donos do poder como
mecanismos de acumulação do capital) que tira de inúmeras formas proveito dos recursos
naturais, por ter a propriedade dos bens naturais e por poder adquirir os produtos e serviços,
ao passo que do outro lado resta a parcela (povos tradicionais cujo principal referencial
compreende o acesso aos recursos naturais) que, além de não alcançar tal plenitude de acesso,
ainda é obrigada a arcar com o passivo ambiental alheio.
93
Os fatores antrópicos relacionados às mudanças climáticas são hoje objeto de grande
importância nas pautas políticas locais e internacionais, na maioria das vezes sem o
reconhecimento das responsabilidades históricas diferenciadas, e no sentido de defender
maior responsabilidade dos que historicamente contribuíram para a referida crise ambiental.
A distribuição justa de benefícios oriundo de esforços de redução de emissões de
gases de efeitos estufa por desmatamento no Brasil, especialmente às comunidades rurais e
extrativistas residentes nas áreas protegidas pode esbarrar naquilo que chamamos de graves
divergências existentes entre os diversos grupos e interesses que fazem parte deste suposto
campo político e ambiental de inclusão das mudanças climáticas globais e seus efeitos locais.
Configuram-se dinâmicas sociais próprias e mais amplas e muitas vezes contraditórias, na
relação do global/local (BOURDIEU, 2007).
Conforme a idéia de justiça ambiental proposta por Alier (2003), o direcionamento
dos riscos das mudanças climáticas que procuramos mostrar que as comunidades tidas como
guardiões das florestas são as verdadeiras vítimas das reformulações do desenvolvimento
conservador que se inscreve na modernidade. Neste sentido, Guillermo Foladori expõe o
seguinte:
De acordo com o controle que uma classe tenha sobre os meios de produção, tanto o
acesso à natureza e sua utilização quanto a responsabilidade sobre os resultados
imprevistos por seu uso serão diferentes. Na sociedade capitalista, o acesso à
natureza por quem representa a propriedade da terra e das fábricas e por quem
somente dispõe de sua força de trabalho para viver não é o mesmo. As
possibilidades de transformar o meio ambiente de modo planetário, como se
colocam hoje em dia, estão nas mãos dos donos das fábricas que poluem a
atmosfera, que fabricam automóveis movidos a energia fóssil, que produzem
alimentos e matérias-primas utilizando insumos tóxicos e não biodegradáveis, que
produzem armamento, que obtêm seus lucros com a geração de energia nuclear, que
saqueiam os mares para incrementar seus lucros (FALADORI, 2001, p. 207).
Pereira (2000), atribui à dificuldade do estabelecimento de necessidades universais ter
sido contornada com a identificação, na prática, a partir daquilo que estas classes têm em comum
no sistema capitalista, ou seja, à violação de suas necessidades básicas e dos direitos
correspondentes à satisfação dessas necessidades.
Diante das tendências contemporâneas da política social enquanto conceito
polissêmico estaríamos diante de um programa de reformulações de políticas cerceadoras e
reguladoras que pune os povos, onde a relação de estado e sociedade e que estão em
descompasso, pois o primeiro tem a visão muitas vezes limitada de uma mera distribuição de
serviços sociais enquanto que a sociedade busca uma legítima política pública, que não se
94
baseia no caráter punitivo ou mesmo tendo o foco no controle do direito de acesso dos
recursos naturais.
No estudo sobre necessidades humanas e os contenciosos que envolvem seus
significados e conteúdos, para Pereira (2000), reportando-se a Len Doyal e Ian Gogh, autores
da obra A theory of human need, em que a partir de diálogos com inúmeras concepções
convencionais envolvidas com os significados dessas necessidades tratam de estabelecer com
rigor a diferenciação entre o que são necessidades e o que se desenvolve no campo das
vontades, dos desejos, “do querer para ser”, destaca:
A chave da distinção entre necessidades básicas e as demais categorias mencionadas
repousa num dado fundamental que confere às necessidades básicas (e somente a
elas) uma implicação particular: a ocorrência de “sérios prejuízos” à vida material
dos homens e à atuação destes como sujeitos (informados e críticos), caso essas
necessidades não sejam adequadamente satisfeitas (PEREIRA, 2000, p.67)
Outro ponto importante de ressaltar sobre políticas públicas pressupõe o olhar sobre
interesses comuns, interesses conflitantes, jogos de poder, instituições, intervenções. Para
tanto, lançaremos mão do conceito de campo simbólico nas abordagens feitas por Pierre
Bourdieu (2007), esta dimensão simbólica é por excelência o campo da subjetividade onde
ocorre parte significativa dos conflitos humanos, isso aparece por vezes explícita e
implicitamente na contemporaneidade, nas disputas entre grupos sociais na arena imediática.
Ou seja, a questão ambiental ou mais especificamente a sua dinâmica da política ambientalista
encontra nesse pressuposto de relações instituintes, um lugar social para sua ação.
Os conflitos resultantes da produção da ordem legítima não estariam centrados nas
interações entre agentes individualizados (ou particulares), mas nos campos sociais
relacionais. Campos de força que se configurariam por um arbitrário cultural, produto das
relações entre o habitus42, - isto é, o sistema de disposições e posições sociais -, a ordem
simbólica e o poder de nomeação por onde se impõe uma visão legítima do mundo social.
É nesta arena imediática que os grupos sociais buscam elevar suas demandas
particulares ou pessoais transformado-as em problemas sociais, influenciado nas agendas
públicas, através de discursos, textos e imagens veiculados sob a máscara da objetividade dos
fatos, apenas divulgados pela mídia, esta luta de imposição de uma visão de mundo particular,
42
Aprimorado por Bourdieu (2004) como conjunto de disposições duráveis com o qual o homem lida com o
mundo, incorpora valores e imprime costumes a outros homens.
95
pela visão (e divisão) do mundo social segundo os parâmetros de determinados grupos sociais
(BOURDIEU, 1989).
Enfatizando as novas ou recorrentes demandas, percebe-se que as problemáticas
ambientais atualmente têm sido objeto da agenda pública no momento de formulação,
implementação e gerenciamento de políticas públicas. Neste sentido a abordagem das
políticas públicas para os propósitos de nosso estudo indica ao mesmo tempo a natureza das
estruturas das intervenções do Estado, e o conjunto de atores da sociedade civil presentes ou
não (ONG, grupos empresariais, comunidades, entidades internacionais e outros), estas
devem, necessariamente, contemplar um determinado fim ou uma área específica da realidade
cotidiana (COUTINHO, 1989).
A perspectiva generalista ignora a historiografia das realidades localizadas. No caso
da Amazônia, implica o desafio de romper com o peso da visão colonial homogeneizante.
Assim, o poder de construir políticas públicas está relacionado com as estratégias na disputa
de poder dos diferentes interesses pretéritos e futuros responsáveis por marcas profundas nos
processos históricos e políticos da região amazônica, isto é, o processo de ocidentalização do
planeta conduzido pelos eixos civilizatórios em várias partes do mundo esteve ligado de
maneira orgânica através da imposição de identidades reconfiguradoras. Num primeiro
momento, pela colonização europeia e as companhias de comércio e suas formas de
exploração, no momento subsequente e ainda em curso a imposição de formas de integração
nacional pelos projetos carregados de imagens etnocêntricas e obsoletas, submetendo a todas
as formas de exploração e violência os povos, classes e etnias (SILVA, 2004).
Desta forma, não se pode refletir a relação Estado e políticas para Amazônia como
um dado da realidade a histórica, e sim assumir o entendimento que o processo de formulação
de políticas públicas tenha adquirido maior visibilidade com a emergência da sociedade
moderna a partir do século XIX, com as tomadas de decisão sobre a gestão dos recursos
naturais em curso na Amazônia. Estes guardam em sua configuração residual uma estreita
relação com as condições pretéritas e presentes do processo civilizatório no qual nos
inserimos atualmente materializado pelos fluxos globais, relações de dependência e
interdependência, entrelaçamentos da economia capitalista mundial (SILVA, 2004).
Para Bouschetti (2008), a principal marca definidora do conceito política pública 43
reside no fato de esta ser “uma coisa publica”, ou seja, de todos e, por isso, constitui a
43
Política pública é tida como o significado moderno da política social, o termo em sua versão denominada
política pública, surge no segundo pós guerra, para entender a dinâmica entre governos e cidadãos, extrapolando
o apego as analises de caráter empírico limitadas as ausências de avaliações mais densas da estrutura da maquina
estatal (BOUSCHETTI, 2008).
96
presença e o compromisso tanto do Estado quanto da sociedade. Cabe esclarecer que não se
trata de um sinônimo de política estatal ou mesmo que tenha identificação exclusiva com o
Estado ou ainda com grupos particulares. O seu caráter público é explicado pelo fato de
significar um conjunto de decisões e ações, resultado de, a só tempo, de ausências e
ineficiências do Estado e da sociedade, mas que visa a materializar direitos sociais garantidos
nas leis.
Assim, para entendermos os desafios postos sobre as políticas sociais, em que pese
aquelas foco de nosso estudo, desenvolvidas no capitalismo contemporâneo é necessário
entender a articulação existente entre as políticas sociais e a política econômica. É exatamente
neste cenário que emerge o papel do Estado na sua relação com os interesses das classes
sociais, para identificar se ele privilegia as políticas econômicas em detrimento das políticas
sociais. Além disso, torna-se importante identificar as forças políticas que se organizam no
âmbito da sociedade civil e que interferem na formulação da política social. Contudo é parte
também importante chamar a atenção para existência da dimensão cultural que está
relacionada à política, uma vez que os agentes políticos são portadores de valores que
interferem na formatação de políticas sociais (BOUSCHETTI, 2008).
Quando transportamos esta idéia para o cenário do Estado do Amazonas, pode-se
perceber que esta, embora não conquistada pela sociedade, somente encontra aplicabilidade
via políticas públicas, que, por sua vez operacionalizam-se por meio de programas, projetos e
serviços sociais. Contudo, não poderíamos esquecer-nos de enfatizar que toda e qualquer
proposta de política pública concreta possui como núcleo matriz os serviços sociais, essa
característica guia-se pelo princípio do interesse comum ou público, isto é, contrariamente aos
interesses particulares, especialmente, aqueles orientados pela dinâmica do capitalismo.
O processo de escolha desta estratégia de ação pensada, planejada e avaliada envolve
Estado e sociedade em permanentes relações de reciprocidades e antagonismos ao mesmo
tempo, aliás, podendo ser materializados na Amazônia, por exemplo, com o suposto problema
da presença de grupos humanos em áreas protegidas.
Para além de uma definição limitada e parcial de política pública como resultado de
uma atividade política dos governos, torna-se relevante destacar o caráter universal dos bens
públicos, com funções de consolidar direitos conquistados pela sociedade, incorporados nas
leis e alocados na distribuição bens públicos.
Em uma breve digressão também é interessante identificar a política social pública
na sua classificação enquanto produção de arenas de conflito: a) arena regulamentadora
97
caracteriza-se pela política que consiste em ditar regras autoritárias que afetam o
comportamento dos cidadãos, remete-se ao Estado que obriga e proíbe coercitivamente. Desta
forma, a personificação dos interesses pessoais encontram comodidade nos decretos, que
restringem as liberdades individuais; b) da arena distributiva, refere-se a política que busca
melhor distribuição dos bens caracterizado-se pela situação em que o poder público estabelece
critérios que permitem vantagens a casos ou pessoas em detrimento de outros. “É claro que
dependendo daquilo que está em jogo, assim como dos custos para o confronto dos atores
envolvidos, torna-se possível haver uma situação em que um lado não ganhe tudo e o outro
lado não perca tudo, ou seja, cada um cede um pouco para resolução do conflito. É claro que
sem grandes enfrentamentos, a acomodação pode ser uma estratégia com o objetivo de adiar o
confronto para outro momento mais favorável a correlação de forças para o ator interessado”
(BOUSCHETTI, apud RUA 2008).
Ao retomarmos a década de 70, pode ser considerado o momento de maior
frequência da expressão política pública que passou a se impor no discurso oficial e nos textos
das ciências sociais, recobrindo o mesmo espaço empírico antes ocupado pela noção de
planejamento estatal. “o termo política refere-se a:
“Um conjunto de objetivos que formam determinado programa de ação
governamental e condicionam sua execução”. Implica desta forma, a idéia de
orientação unitária quanto as fins a serem atingidos. Também supõe uma certa
hierarquia entre as diversas dimensões empíricas a serem presumidamente atingidas,
pelo menos a nível dos benefícios que adviriam de sua implementação. A direção
para a qual aponta e os objetivos que orientam a referida política manifestar-se-iam,
de forma clara, no interior dos projetos e atividades que a constituem. Além disso,
denotaria um conjunto articulado de decisões de governo, visando fins previamente
estabelecidos a serem atingidos através de práticas globalmente programadas e
encadeadas de forma coerente” (AUGUSTO, 1989, p.106).
Já no momento subseqüente Ferreira (1998), identifica dois novos momentos em que
se processa a configuração de institucionalização das chamadas políticas ambientais no Brasil:
a) o momento em que muitas das questões políticas mais candentes e significativas estarem se
desenrolando fora da esfera política até então concebida como “oficial”, ou seja, fora de um
espaço passível de ser controlado pelo Estado. Assim empresários movimentos sociais,
sociedades científicas, sindicatos, politizam e tornam públicas questões antes vistas seja como
próprias dos âmbitos privados sejam como próprias única e exclusivamente do aparato
político-administrativo oficial; b) outro momento refere-se ao fato das emergentes demandas
sociais desafiarem os até então adequados códigos e instrumentos de gestão da vida pública,
até não muito tempo capazes de proporcionar medidas de proteção aos cidadãos.
98
Aqui é importante destacar diante dos propósitos deste estudo que a formulação e a
execução de programas sociais pelo Estado do Amazonas têm feito prevalecer os interesses
econômicos sobre metas de maior equidade social: sua intervenção nessas áreas vem se
fazendo, prioritariamente, através da articulação do aparelho governamental com o setor
privado produtor de serviços ou bens. Como, por exemplo, a responsabilidade que o governo
do Estado do Amazonas transferiu à empresa privada FAS, no que diz respeito ao poder de
escolhas, do direito de acesso a bens de uso comum. Transformando e subordinando as
necessidades da população local (UCs) de acordo com os interesses individuais dos
imperativos da reprodução do capital. (AUGUSTO, 1989 apud KOWARICK, 1985).
Um dos mais importantes momentos do processo decisório de uma política pública é
quando se colocam claramente as preferências dos atores envolvidos a partir das
manifestações de seus interesses. Nesse momento em que ocorre o confronto de diversas
preferências, que por sua vez dependem das vantagens e desvantagens para cada ator em
relação às diferentes alternativas propostas para solucionar um determinado problema. “As
vantagens e desvantagens não se restringe a custos econômicos, mas por sua vez envolvem
também elementos simbólicos, enquanto prestígio; elementos políticos, como ambições de
poder e ganhos ou perdas eleitorais” (RUA, 1998, p.24,).
Quando se trata de políticas com características de programas como o Programa
Bolsa Floresta, é importante reconhecer que o fenômeno sobre o qual a ação incidirá requer
negociação e compromisso, considerando que muitas políticas representam compromissos
entre valores e objetivos conflitantes, ou ainda envolvem compromissos com interesses
poderosos dentro das estruturas de implementação (exemplo: as políticas que ignoram os
impactos das forças econômicas) podendo assim afetá-las e até mesmo comprometer a sua
implementação. A implementação como formulação em processo, porém nem todas as
decisões relevantes são tomadas durante a fase de formulação. Fica visível que diversas
razões para que essas decisões tenham sido feitas ainda na sua implementação: a existência de
conflitos que não foram resolvidos ainda no processo de formulação; o conhecimento limitado
sobre o impacto efetivo das novas medidas (RUA, 1998).
Por outro lado, existem atitudes de agentes públicos que ignoram todas as atitudes
acima, Assim, muitos daqueles que decidem supõem que o fato de uma política ter sido
definida, garante automaticamente, seja implementada, ou mesmo supõe-se que a
implementação resume-se em executar o que foi decidido, logo, é apenas uma questão de os
executores fazerem o que deve ser feito para implementar a política, tendo como
99
conseqüência a implementação é vista como uma atividade de menor importância e
desprovida de conteúdo político.
Na verdade, a concepção tradicional de planejamento, também chamada de “linear”
predominou em todo mundo ocidental até pelo menos 1980 e, ainda hoje, é bastante
generalizada em toda América Latina. Como se pode verificar, a realidade conhecida é muito
mais complexa. As ausências e deficiências dos agentes públicos envolvidos têm como
resultado último apenas algumas partes da política implementada contraditoriamente a
decisão de seus objetivos, ou seja, podem ter partes implementadas diferentes daquela
inicialmente prevista (MMA, 2005).
De fato, nesse estágio mais recente do capitalismo, as políticas sociais continuam a
se constituir em ação estatal estratégica na reprodução ampliada da força de trabalho, com
vistas a reverter à queda tendencial da taxa de lucro capitalista. A diferença entre os anos de
Estado neoliberal e os anos de Estado de bem-estar social, no que tange às políticas de
reprodução ampliada da força de trabalho, consiste na redefinição da natureza de sua
intervenção, e não na sua desobrigação.
Quando o Estado produtor direto do aumento da produtividade da força de trabalho
se transforma em Estado gestor da reprodução ampliada do capital e do trabalho, no
capitalismo neoliberal, ele se desobriga da execução direta de parcela significativa das
políticas sociais e amplia consideravelmente o número de parceiros na sua execução,
garantindo a sua presença, ainda que indiretamente, pela direção e gestão das parcerias, nesse
importante segmento de sua política econômica.
Assim, com a privatização das políticas sociais a partir das intervenções da FAS, a
legitimidade do direito a cidadania das populações que vivem nas UCs no estado do
Amazonas não passou a configurar uma desobrigação do Estado pela questão social, mas sim
uma ação do Estado capitalista neoliberal de reprodução ampliada do capital. A privatização,
consubstanciada em empresariamento dos serviços sociais, se constitui concomitantemente
em contra tendência à queda da taxa de lucro, no que tange à desvalorização de parcela do
capital, e em aumento da produtividade do trabalho pelo incremento da superexploração da
força de trabalho (POULANTZAS, 1986).
O empresariamento dos serviços sociais em geral responde a importantes
determinações político-ideológicas: 1) contribui para consolidar a ideologia neoliberal de
liberdade de escolha dos consumidores dos serviços; 2) sedimenta a hierarquização e a
desigualdade na prestação de serviços, diante dos novos imperativos técnicos e éticopolíticos
100
de expansão da cobertura; 3) reforça a ideologia do individualismo como valor moral radical;
4) prepara novos intelectuais orgânicos da nova sociabilidade do capital; e 5) auxilia
decisivamente para concentrar a ação estatal nas políticas sociais focais (POULANTZAS op
cit.).
Assim, é possível afirmar que reduzem o patamar mínimo da responsabilidade estatal
com a preservação da liberdade individual e a justiça social. Essas políticas vêm se
constituindo ainda em instrumentos eficazes de cooptação molecular e de grupos ao projeto
social e de sociabilidade das classes dominantes, por se constituírem em oportunidades de
emprego e de remuneração em tempos de precarização das relações de trabalho e de
desemprego funcional.
Elas contribuem, ainda, para reduzir a participação política coletiva da classe
trabalhadora ao nível econômico-corporativo mais elementar de defesa dos interesses
específicos de natureza localista e, assim, inversamente, tornar mais efetiva a hegemonia do
capital monopolista sob a direção intelectual e moral do capital financeiro em escala mundial.
Nessa perspectiva, o Estado neoliberal, cujas funções econômicas se reduziram a
gerir a privatização, a fragmentação e a focalização das políticas sociais, para investir mais
diretamente nas políticas de reprodução e de rearticulação das várias frações do capital, vai se
constituindo em “Estado necessário” (GIDDENS, 1996).
Segundo Poulantzas (1980), em sua obra “Poder Político e Classes Sociais”, o Estado
capitalista se difere de outros Estados (históricos)44 pelo fato de não possuir sujeitos enquanto
agentes de produção. Difere-se, pois, do feudalismo já que não possui estamentos que formam
a engrenagem do modo de produção. O Estado aparece como um Estado – nacional – popular
- de - classe. A dominação política não se coloca pelas instituições, já que são organizadas em
torno dos princípios de igualdade e liberdade dos indivíduos. A legitimidade do Estado
provém justamente da soberania popular, do voto, da “vontade geral”. A lei e sua
racionalidade (o sistema jurídico) substituem a ordem divina. A racionalidade abstrata e
normativa da lei forma o “Estado de Direito”.
Para este referido autor, no Estado capitalista moderno existe uma ideologia de
representação, isto é, o Estado apresenta-se como representativo de um “interesse geral”, mas
44
Ao examinar alguns textos históricos de Karl Marx, Poulantzas observa que antes do processo de produção
capitalista, isto é, no sistema feudal, os indivíduos “livres” estavam situados como “indivíduos nus”. Tais
indivíduos tinham somente a força de trabalho e estavam fora dos direitos do Estado. Em contraste, no sistema
capitalista aparece o “trabalhador livre” como “sujeitos-jurídicos”. Isso foi possível pelo fato de no Estado
capitalista aparecer uma estrutura jurídica, política e ideológica, determinadas, em última instância, pela
estrutura do processo de trabalho e aplicadas nos agentes de produção a fim de mascarar suas relações enquanto
relações de classes.
101
na verdade negligencia o seu papel de interesse de classe (classe dominante). O Estado
obscurece sistematicamente, ao nível das instituições políticas, o seu caráter classicista: trata
de sua autenticidade de ser um Estado popular nacional de classe. “Este Estado apresenta-se
como a encarnação da vontade popular do povo-nação, sendo povo-nação institucionalmente
fixado como conjunto de cidadãos, “indivíduos”, cuja unidade o Estado capitalista representa,
e que tem precisamente como substrato real esse fato de isolamento que as relações sociais
econômicas dos meios de produção capitalista manifestam” (POULANTZAS, 1986, p.129)
Assim, Poulantzas esclarece, que não há uma intenção racional de dominação de
classe imposta, uma ideologia de dominação de classe. Ao contrário, são o modo de produção
capitalista e a “individualização” dos agentes de produção que definem a forma do Estado. A
instância ideológica decorre das relações de produção e não o contrário. A superestrutura 45
jurídico-política do Estado germina da estrutura das relações de produção. A separação entre
o produtor direto e os meios de produção transforma agentes de produção em sujeitosjurídicos, em indivíduos-pessoas políticos. Forjam-se contratos de trabalho e a propriedade
jurídica formal.
Para além do Estado como simples instrumento de dominação de classe pela classe
dominante. É preciso entendê-lo como resultado das relações do modo de produção capitalista
que ao atomizar os agentes econômicos, retirar sua identidade de classe e transformá-los em
agentes concorrentes; deslocam o caráter de sujeito da história ao conceito de povo-nação,
que o Estado representa. Os interesses da classe dominante são, então, apresentados como
interesses de Estado, gerais, nacionais, populares; não como interesse de classe. E mais do
que simples forma de apresentação, o Estado é assim sentido. Aqui, o conceito de
hegemonia46 de Gramsci melhor ilustra esse sentimento.
45
Entende-se por superestrutura a partir do estudo do sistema produtivo que é tão importante na visão marxista
de vida social que os que dominam o sistema econômico são considerados também como dominando outros
aspectos d a vida social, à sua imagem e interesse. As mais importantes dessas áreas são as superestruturas da
sociedade, do Estado das instituições, meios de comunicações de massa, que desempenham um papel vital na
criação da consciência coletiva. Isso é feito através de crenças, valores, normas e atitudes que juntos
proporcionam a matéria- prima para a construção e interpretação da realidade social (JONHSON, 1997, p. 26)
46
Ver a obra de Gramsci: A hegemonia indica uma situação histórica em que a dominação de classe não se dá
simplesmente pelo uso da coerção, da violência, da força; mas seu componente essencial é uma função
ideológica particular pela qual a relação dominantes-dominados se baseia em um “consentimento ativo” das
classes dominadas.
102
CAPÍTULO III - A RDS Uatumã: as comunidades e o Bolsa-Floresta
Para além da noção de comunidade empregada no sentido de cunho conservador
utilizada no PBF, que, aliás, pode-se dizer refere-se a uma imagem pré-concebida do que
seriam povos tradicionais. Ao verificarmos as estratégias de produzir e viver destas
comunidades poderemos confrontá-las com aquilo que o Programa Bolsa-Floresta apresenta,
ou seja, como dados de uma realidade construída pelo governo e pela mídia, e como dados de
um trabalho de campo realizado nas comunidades Nossa Senhora do Livramento, Nossa
Senhora do Perpétuo Socorro do Maracaranã e Jaquereguara na RDS Uatumã. Buscamos
aqui neste capítulo aproximar e desvelar o modo de viver e produzir das comunidades e sua
relação com o programa. A escolha das comunidades se explica pelo fato de estas reuniren em
poder elementos de afirmação ou mesmo de negação da rede de relações sociais, como por
exemplo, a implantação dos componentes do PBF em diferentes estágios, que podem ser
percebidas nas demais comunidades.
3.1-Comunidade Santa Luzia do Jacarequara
Localização e infraestrutura
A comunidade Santa Luzia do Jacarequara está localizada nos paralelos (S 02° 26’
4”/ W 58° 16’ 7”) na margem esquerda do Rio Uatumã, no município de Itapiranga, sendo
uma das mais antigas, fundada por volta da década de 1980. Na comunidade predomina o solo
arenoso. Esta fica próxima à Serra Itapuca, sendo possível encontrar uma área de terra preta
de índio47, onde se pode encontrar fragmentos de cerâmica ( IDESAM, 2008).
A maioria das residências é construída com madeira, cobertas por telhas de amianto
ou alumínio e, ainda, possuem áreas com quintais. As residências estão localizadas próximas a
47
A Terra Preta Antropogênica ou Terra Preta de índio é uma unidade de solo de origem antrópica, existente na
Amazônia, solos que foram enriquecidos em nutrientes, pelo manejo dos restos orgânicos do fogo pelas
populações pré-colombianas, são solos de coloração escura, altos teores de substancias húmicas, fragmentos de
cerâmica e artefatos indígenas incorporados a matriz superficiais do solo, o que originou a terminologia Terra
Preta de Índio (COSTA, 1997)
103
igreja ou a sede social da comunidade, A disposição das casas reflete o ambiente físico,
especialmente, o ciclo hidrológico anual da cheia e da vazante.
No que diz respeito aos serviços públicos essenciais à comunidade, esta não possui
acesso à rede contínua de energia elétrica. Ainda assim, a comunidade possui um gerador de
energia, com uma promessa de previsão no Plano de Gestão da RDS do Uatumã no SubPrograma de Apoio à Qualidade de Vida do Governo estadual o desenvolvimento de projetos
para a implantação de sistemas alternativos de geração de energia, mais adequados à realidade
das comunidades da Reserva (AMAZONAS, 2008).
104
Nº
Comunidade
Tabela
04- Comunidades
com o numero
famílias por pólos
Conhecida
como
No.dedeFamílias
Bela Vista
20
3
Maracaranã
28
3
São Benedito
13
3
Maanaim
12
3
Flechal
06
3
Abacate
06
2
Caranatuba
11
2
Pedras
14
9
Nossa Senhora do P. Socorro de Maracarana
São Benedito do Araraquara
Maanain
Nossa Senhora de Aparecida do Flechal
Santa Helena do Abacate
Santa Luzia do Caranatuba
Ebenezer (das Pedras)
Cesaréia
2
Cesaréia
04
10
São Francisco das Chagas do Caribi
2
São Francisco
15
11
Nossa Senhora do Livramento
2
Livramento
13
12
Santa Luzia do Jacarequara
1
Jacarequara
22
13
Bom Jesus do Angelim
1
Bom Jeus
10
14
Nova Jerusalém do Amaro
1
Amaro
09
15
Deus Ajude – Boto
1
Boto
14
16
Nossa Senhora de Fátima do Caioé Grande
1
Caioé
18
17
18
Monte das Oliveiras
Monte Sião – Leandro Grande
2
1
Monte das Oliveiras
Leandro Grande
10
11
19
Nossa Senhora Aparecida do Lago do Arara
1
Arara
17
20
Emanuel da Serra do Jacamim
2
Jacamim
04
2
3
4
5
6
7
8
Total
9
3
Bela Vista
105
1
Pólo
1
Figura 04: Localização das Comunidades da RDS Uatumã
Fonte: IDESAM, 2008.
257
106
105
Fonte: IDESAM (2008)
106
Com relação à educação a comunidade dispõe de uma escola, construída pelos
próprios moradores com apoio da prefeitura do município de Itapiranga, que oferece
ensino de 1ª a 9ª série do ensino fundamental.Conforme o depoimento de uma das
moradoras mais antigas, os jovens, na maioria das vezes, se veem obrigados a continuar os
estudos no município de Itapiranga.
Como as demais comunidades do Estado do Amazonas, os moradores apresentam
queixas que são comuns. Entre elas as principais estão à falta de um atendimento eficiente
de saúde e de uma rede de comunicação externa, o único atendimento que dispõe cabe a
um agente de saúde que realiza somente atendimentos básicos, portanto, problemas mais
graves somente são tratados no município de Itapiranga ou Manaus. Desta forma, a
ausência de serviços públicos de saúde na comunidade é evidente, pois tem atendimento
médico permanente, restringe-se a um agente de saúde. As casas não possuem fossa
céptica, a água utilizada nos afazeres domésticos vem diretamente do rio com o uso
esporádico de hipoclorito, é importante ressaltar alguns relatos de proliferação de
endemias.
Atualmente a comunidade Santa Luzia do Jacarequara possui cerca de 22 famílias
que possuem entre 4 (quatro) a 10 (dez) membros vivendo em casas com dois ou no
máximo três cômodos. A maioria das famílias reside na comunidade há mais de 10 anos
(50%), conforme a figura 05:
Figura
05-
Tempo
de
moradia
das
famílias
entrevistadas.
Sobre a origem das primeiras famílias na comunidade, D. Lourdes e Sr. Antenor
afirmam que eram de outras localidades da própria região amazônica. Contudo não
pudemos reconstituir isso com clareza tendo em vista que muitos já não moram mais na
107
comunidade e os que ficaram não sabem informar com precisão sobre a origem dos que se
foram. No entanto, podemos afirmar que é possível que os primeiros moradores tenham
sido mesmo da própria região amazônica. Não apenas do município de Presidente
Figueiredo e da Vila de Balbina, mas de outros municípios dos interiores da Amazônia.
Notamos que, pelo menos os primeiros moradores que permaneceram em Santa
Luzia do Jacarequara, de fato, eram naturais do Amazonas e do Pará. Atualmente, a
comunidade é formada, principalmente, por famílias vindas dos interiores da Amazônia, e
também de uma porção significativa de famílias vindas de outras regiões do Brasil,
sobretudo do nordeste. São famílias de mobilidade urbana rural que não advém de
experiência com o universo rural, encontravam-se insatisfeitos com as possibilidades das
cidades de origem; passaram antes por Manaus, e/ou outras cidades como Santarém, por
exemplo, sem conseguir também fixar-se com satisfação, assim acreditaram na
possibilidade de uma vida melhor e de serem donos de suas terras.
Desta forma é possível notar que os moradores de Santa Luzia do Jacarequara
expressam em suas relações cotidianas os interesses daqueles que escolheram residir na
comunidade, através da obtenção do tão sonhado pedaço de terra (40%), logo depois outro
motivo que predomina é o convite de amigos, como demonstra a figura:
Figura 06 - Motivos dos moradores da comunidade tidos como condicionantes
para residir na comunidade.
A organização familiar na comunidade é estruturada no poder patriarcal, onde os
chefes das famílias são os homens, no entanto algumas mulheres também desenvolvem as
tarefas de agricultura e pesca. Os filhos mais velhos também desenvolvem atividades
108
domésticas, cuidam dos filhos e da casa. Pai e filhos mais velhos trabalham no cultivo da
roça, as famílias muitas vezes compartilham a casa de farinha para o processo de
preparação da farinha de mandioca. Os membros mais velhos de cada família são fonte de
conhecimento do ambiente local, das áreas produtivas da floresta, além disso, no seio
familiar é notória a sociabilidade das crianças com os mais velhos, há indícios de deterem
o conhecimento tradicional das propriedades místicas e curativas de tratamentos com base
em várias ervas medicinais. É possível afirmar que sua cultura e modos de vida são
marcados de saberes associados ao tempo e aos ciclos da natureza. “Essa tradição, herdada
dos antepassados, é constantemente re-atualizada e transmitida às novas gerações pela
oralidade. (...) Os saberes tradicionais sobre os seres do rio e da mata desempenham papel
fundamental na construção de sistemas de manejo da natureza, muitos deles marcados por
grande engenhosidade.” (DIEGUES, 2004).
É interessante notar o elo que une a comunidade santa Luzia do Jacarequara,
presente principalmente, nas relações de vizinhança, parentesco, as tradições religiosas e
culturais, algumas que continuam sendo mantidas por seus moradores e outras que são
redimensionadas ou substituídas, como por exemplo, a criação da festa que comemora a
soltura de quelônios.
Tomando como base de análise os dados de uma representação da realidade local
da comunidade, já se podem identificar as possíveis mudanças e efeitos dessa política
governamental no modo de vida das famílias de Santa Luzia do Jacarequara, que de certa
forma não foi material, mas sim identitária. Ao utilizarmos o conceito de identidade nos
termos propostos por Hall (2005): como uma estratégia organizativa, um modo de
construir sentidos que influencia e organiza nossas ações e a concepção que temos de nós
mesmos.
Pode-se perceber, entre os moradores de santa Luzia do Jacarequara, que eles
guardam em sua maneira de viver certo sentido de bem comum, principalmente dos
recursos naturais, pois é responsável pela sustentação de uma espécie de rede de
sociabilidade na repartição da pesca e da caça. Contudo a comunidade, segundo relatos,
vem passando por transformações socioculturais, como a mudança nas atividades
produtivas de agricultores para pescadores, e outros que criavam gado e agora buscam o
extrativismo.
Contudo, aí parece residir, possivelmente, uma enorme dificuldade que se
expressa pela falta de política pública no que se refere à infraestrutura. Cabe lembrar que o
Bolsa-Floresta na sua modalidade Família é responsável pela recompensa econômica
109
mensal às mães das que residem nas Unidades de Conservação já cadastradas e que
assumiram o compromisso de não desmatar a floresta. Essas famílias recebem há dois anos
a quantia de RS 50,00. Desta forma podemos identificar logo na sua estrutura a contradição
das condições já identificadas em relação à infraestrutura para o estabelecimento das regras
do PBF.
Tais contradições não aparecem diante da visão míope das proposições do PBF
muitas vezes respaldadas pela mídia, em que a Fundação Amazonas Sustentável deixa bem
claro em seus informativos o propósito de diminuir o índice desmatamento, muito embora
não esteja explícito a substituição da base produtiva agrícola ou pecuária por uma base na
cultura extrativista que se utilize a floresta mas mantendo-a em pé, por sua vez associado
ao enfrentamento das questões das mudanças climáticas globais.
A existência de dificuldades socioeconômicas na comunidade Santa Luzia do
Jacarequara somam-se a ausência de ações do plano de manejo, diante da falta de
condições básicas para seus moradores alcançarem uma vida digna. Nota-se que a
implementação do PBF assim como algumas ações consideradas socioambientais atravessa
ou naturalizam de maneira livre e desordenada dos problemas sociais
A organização política da comunidade Jacarequara ocorre principalmente através
da Associação Comunitária Jacarequara, entidade de caráter político, porém sem
regularização legal, principal mecanismo na rede de relacionamentos que a comunidade
mantém com organizações não-governamentais e com o IDESAM, FAS, a prefeitura de
Itapiranga, Associação Agroextrativista e outras comunidades próximas.
O Sr. A. S. mantém o cargo de presidente da Associação dos moradores de Santa
Luzia do Jacarequara desde o ano 2000. Atualmente é o professor da Comunidade quem
exerce atividade de tesoureiro. Na apresentação da proposta de pesquisa, como em outras
ocasiões similares, percebi que o Sr. Antenor é sempre consultado sobre as decisões
coletivas da comunidade. Portanto, ele possui liderança na esfera política.
A comunidade é formada em sua maioria por adeptos da religião católica. A única
igreja da comunidade possui o nome da comunidade, Igreja de Santa Luzia. Interessante
característica é o fato de haver um espaço aberto para relações com outras igrejas
evangélicas. O principal líder religioso da comunidade é o padre que não mora na
comunidade, sendo que no momento de nossa visita estava no município de Itapiranga.
Em entrevista com a principal liderança da comunidade e com algumas famílias,
revelou-se que as atividades geradoras de renda são: agricultura com o cultivo de banana e
ainda atividade de pesca, existem aqueles que também recebem aposentadorias e pensões.
110
Na agricultura, cada família desenvolve o plantio itinerante de mandioca geralmente em
áreas de várzea, utilizando a técnica da coivara48. Primeiramente, escolhe-se uma área para
plantio para posterior derrubada e queimada do “mato”, trabalho que geralmente é
realizado pelos homens de forma individual ou em ajurí49. Em seguida, as mulheres ajudam
no plantio de maniva de mandioca e durante o período de desenvolvimento da roça os
homens praticam a limpeza do roçado.
De acordo com professor da comunidade a comercialização de seus produtos é
dificultada pela falta de transporte, dependendo de intermediários. A comunidade não
dispõe de qualquer tipo de financiamento bancário para a produção da farinha e banana,
situação esta que se reflete na negligência por parte dos dirigentes estatais por não
proporcionar o acesso a apoio técnico ou mesmo ter uma estratégia frente a cheia dos rios
no ano de 2009. A produção de farinha ficou comprometida pela cheia dos rios. Diante da
escassez até mesmo de manivas de mandioca para o plantio do ano 2010 foram atingidas a
base da alimentação e a renda da totalidade das famílias residentes no Jacarequara, como
nos esclarece um comunitário
“por causa do prejuízo da cheia tivemos que complementar a renda com outras
atividades... alguns encontraram trabalho fazendo pequenos serviços para
aqueles que recebem aposentadoria ou outro beneficio” (A. S.52, fevereiro de
2010).
Na comunidade Santa Luzia do Jacarequara não há energia elétrica proveniente do
Programa do Governo federal “Luz Para Todos”. Há, a nosso ver, uma enorme (in)
sustentabilidade social na comunidade. Contudo algumas famílias reconhecem que após a
implantação do Programa algumas coisas melhoraram como, por exemplo, a obtenção de
ambulanchas, que serve para transportar moradores em caso de acidente e doenças graves
para sede do município mais próximo, muita coisa ainda precisa ser feita do ponto de vista
das políticas públicas.
Com a ausência de apoio institucional e a vulnerabilidade das formas de obtenção
de renda as famílias se veem diante, muitas vezes, no desafio do cumprimento das regras
estabelecidas pelo plano de gestão e manejo da RDS Uatumã. É importante lembrar que
48
A definição dicionarizada de coivara, refere-se à palavra de origem tupi-guarani que designa a técnica de
origem indígena, ainda hoje empregada no interior do Brasil, que consiste em pôr fogo em restos de mato,
troncos e galhos de árvores para limpar o terreno e prepará-lo para a lavoura (CUNHA, 1998, p.111).
49
O ajuri é uma prática tradicional dos povos caboclos e indígenas da Amazônia, conhecida por muitos como
"mutirão", na qual grupos e indivíduos se unem em solidariedade para, por exemplo, "limpar" o terreno para
a nova roça.
111
quando se deu a assinatura do contrato entre as partes, ou seja, o governo e as famílias,
contudo foram estabelecidos regras, dentre as quais a mais lembrada é que a roça agora
limita-se a dois hectares por família, ficando proibido ainda a extração de madeira ilegal
para venda. A partir do recebimento do PBF os moradores não deixaram de extrair os
produtos da floresta ou mesmo plantar e cultivar a roça, porque a quantia recebida não
supre as necessidades básicas tanto matériais, culturais e simbólicas das famílias. A esse
respeito a pesquisa de opinião sobre o PBF nas RDS Rio Negro, Uatuma e Juma
disponível na página da Fundação da Amazônia Sustentável mostra que a grande maioria
entrevistada indica que deveria aumentar o valor do Bolsa Floresta Familiar.
(Disponível:http://www.fas-amazonas.org / pt/ acessado em agosto de 2010).
As grande maioria das famílias da comunidade Jacarequara participa do Bolsa
Floresta Família há 2 (dois) anos, e são compensados por não desmatar com a a quantia de
R$50,00 (cinqüenta reais) por mês. Para retirar tal quantia, existe um alto custo com
transporte, pois a agencia bancária mais próxima está localizada no município de
Itapiranga há cerca de 190 km de distância da comunidade Jacarequara, assim, muitos
moradores optaram por receber a cada três meses como uma forma de otimizar os ganhos
no processo, como se pode notar na figura.
Figura 07: Dificuldades apontadas pelos moradores para recebimento do B.F.
Os entrevistados afirmaram que o Programa Bolsa-Floresta mudou muito pouco a
vida deles em termos de qualidade de vida, principalmente se levado em conta as
perspectivas lançadas na fase preliminar de lançamento do PBF, Assim é possível dizer
que a vida na comunidade sofreu alterações que até agora, não foram capazes de
112
transformar ou modificar positivamente as fragilidades e demandas para melhorar as
condições de vida na RDS Uatumã.
Considero uma ajuda, mas é uma ajuda de pouco alcance, muito restrito, pois
qualquer família com sete ou oito pessoas não pode ficar dependente da quantia
de apenas R$50, 00 reais, acho que muita coisa ainda permanece na mesma, a
saúde e a educação, por exemplo, são os maiores problemas enfrentados em
nossa comunidade. O governo poderia fazer mais para melhorar nossa vida, por
isso ainda existem aqueles que mesmo recebendo a quantia de
R$50,00(cinquenta reais), precisa de outras atividades que muitas vezes podem
desmatar, mas fazem isso para dar o pão de cada dia para sua família (M. S. 34
entrevistada em março de 2010).
Se retomarmos a discussão a quem interessa a floresta em pé, fica claro que o alvo
são as populações locais, as implicações do PBF assim como seus argumentos
homogeneizadores, tanto do enfrentamento das mudanças climáticas quanto no que diz
respeito a valorizar o papel das comunidades tradicionais se limitam ao discurso oficial
que acompanhado de um grande marketing verde. A busca do poder e o controle dos
recursos naturais estão na base do discurso da floresta em pé.
A partir do momento em que o discurso do poder assumiu o compromisso político
com o chamado desenvolvimento sustentável50, e, ao que tudo indica, embora não tenha
ficado devidamente claro aos olhos da mídia local e para além das fronteiras regionais,
para o governo amazonense os povos tradicionais têm a sua parcela de contribuição no
desmatamento da floresta. Razão para se reconhecer e valorizar esses povos que habitam
no interior das UC que passaram a ser denominados sugestivamente de Guardiões da
Floresta. Há de se pontuar que até agora não se viu nenhuma iniciativa ou discussão, de se
criar uma política pública que impedisse a ação dos grileiros, das madeireiras e do
agronegócio, considerados, também, os grandes desvastadores das florestas na Amazônia.
Desta forma o Estado se desobriga de suas responsabilidades para com as
populações que vivem da relação de interação com ambiente e joga a responsabilidade para
os guardiões das florestas.
Os moradores da comunidade Santa Luzia do Jacarequara dependem diretamente
da relação do seu modo de vida com os recursos naturais, demonstram nitidamente que não
são os grandes responsáveis diretos pelo desmatamento, e até mesmo após estabelecimento
do PBF as comunidades enfrentam os sérios problemas de infraestrutura, ou seja, ainda
não foram criadas as condições estruturais para que os moradores de Santa Luzia de
Jacarequara abandonem completamente as atividades produtivas (que na visão da FAS
50
Cf. Viana, Virgilio. As florestas e o dês-envolvimento sustentável na Amazônia. Manaus: Editora Valer,
2007.
113
pode causar desmatamento) que muitas vezes garante o mínimo de sobrevivência,
especialmente diante de severas variações do ciclo hidrológico na região.
A Fundação Amazonas Sustentável estabelece que a principal condicionalidade
do PBF é o compromisso das famílias com a conservação ambiental e o desenvolvimento
sustentável, combatendo o desmatamento nas Unidades de Conservação ( FAS, 2009.
p.33 ).
As regras estão estabelecidas entre a FAS e as famílias que moram na comunidade
Jacarequara, mas até o momento da realização da pesquisa, ainda não se dão de forma
clara, pode-se notar a ausência de fiscalização das mesmas, seja diretamente pela FAS ou
ainda pela AASRN, como por exemplo, aquela em que a família envolvida com o PBF tem
que manter os filhos freqüentando a escola. Fica claro que a fundação parece transferir a
fiscalização das regras para o Presidente da AACBU. De acordo com o presidente a
Associação de moradores de Santa Luzia do Jacarequara:
Até agora a fiscalização mais próxima que tivemos, foi a do presidente a
AACBU, mais de vez em quando, mas eu sei que não podemos aumentar o
roçado mais que dois hectares, embora todo mundo saiba que quando as coisas
estão difíceis que muitos moradores de outras comunidades que não são do
Jacarequara acabam por retirar madeira para vender ( S. A. 62 fevereiro de
2009).
Uma enorme dificuldade não expressa pelos dados do discurso oficial do PBF é
que tal política compensatória não tem sido capaz de minimizar as desigualdades
socioambientais no Estado do Amazonas, ressalta-se também que os agentes em parceria
precisam estar exercendo seus papéis legítimos para que, de fato, essas parcerias não
acabem por subordinar essas populações em face à apropriação do discurso ambiental, falta
de aprovação do plano de manejo florestal limita a potencialidade florestal e extrativista de
prover renda para os moradores da RDS do Uatumã, que aguardam com ansiedade a
oportunidade de poder praticar a atividade florestal sustentada e gerar renda de forma
digna através da floresta.
Dentre as atividades consideradas proibidas pelos moradores de Santa Luzia do
Jacarequara, a mais lembrada refere-se a extração de madeira ilegal para venda e os limites
para o cultivo da roça em dois hectares conforme a figura 8. Mesmo com a compensação
do PBF, os moradores não deixaram de extrair os produtos da floresta ou mesmo plantar e
cultivar a roça. Fato que não alterou de forma significativa a ausência de realizações do
governo local em relação à infraestrutura na comunidade.
114
115
Figura
08: Atividades agroextrativista proíbidas a partir da implementação do B.F.
Fonte:
(Jander, 2010).
Na medida em que começamos a conhecer o universo sociocultural e as demandas
sociais notamos que as muitas informações surgiam em descompasso com o marketing
oficial, uma delas compreende a reivindicação de informações sobre a não contemplação
do Bolsa-Floresta Renda (destinado ao apoio da produção de produtos, a arranjos
produtivos e certificação de produtos que aumentem o valor recebido pelo produtor), pois
este componente, apesar de integrar a 2anos o PBF ainda não fora realizado51na
comunidade.
Neste momento, surgem os primeiros indícios de ações incompletas na
implementação do programa e que ao mesmo tempo, contradizem os objetivos tão
propagados pela mídia, como por exemplo, a promoção e desenvolvimento do
associativismo nestas comunidades. Porém estas estão ausentes em algumas realidades
específicas na RDS Uatumã. Outro exemplo que acompanha o componente Associação é o
componente Social que ainda não fora capaz de dar respostas relevantes as demandas
apontadas pelos moradores tanto na saúde, como também na organização social no sentido
de proporcionar melhores condições de vida na comunidade Santa Luzia do Jacarequara.
Ao Observarmos que em algumas reuniões realizadas na Comunidade pelo Ceuc,
o associativismo um dos esteios estruturantes do PBF, apresentam-se restritos a lideranças
formais controladas pelas instituições de gestão governamentais. Assim no associativismo,
51
As informações colhidas no trabalho de campo compreendem o período de fevereiro de 2010.
116
ainda que muitas falas dos moradores da comunidade Jacarequara confirmem a
participação na Associação Comunitária, esta se dá de forma restrita a reunião mensal, ou
em oficinas de manejo realizadas pela SDS.
Há a percepção por parte dos moradores entrevistados de que as atividades
econômicas que estão sendo produzidas na comunidade como roças, plantio de frutas,
extrativismo de castanha, não contribuem para o desmatamento (conforme a figura 09) e
que, com a proibição de atividades que antes gerava renda, como a criação de gado, a
extração de madeira já fazia parte do modo de vida que até agora foi responsável pela
manutenção da floresta. Contudo, as ações de desmatamento têm sua raiz não no pequeno
produtor rural, mas nas lógicas de produção e reprodução do capital, como esclarece a fala
de uma das moradoras da comunidade:
Em nossa comunidade vivemos principalmente da roça e do plantio de frutas,
mas quando a situação fica difícil, principalmente, em períodos de seca, muitos
buscam outras rendas como a pesca e o extrativismo, mas eu sei que em outras
comunidades existem aqueles que retiram madeira ilegal para poder obter
renda(M. J.36 março de 2010).
117
Figura 09: atividades que são permitidas segundo os entrevistados da comunidade
Jacarequara.
3.2 Comunidade Nossa do Senhora do Livramento
Localização e infraestrutura
A comunidade Nossa Senhora do Livramento está localizada próxima ao
município de São Sebastião do Uatumã nos paralelos S 02° 22’ 02” W 58°15’ 07” na
margem esquerda do rio Uatumã, cerca de 9 km da foz do Rio Caribin, possui 12 famílias.
A agricultura representa a principal atividade produtiva, pode-se citar o cultivo da
mandioca, banana, milho e melancia. Os moradores vivem em casas feitas de madeira e
têm o teto coberto com telha de zinco/alumínio apenas algumas possuem áreas com
quintais. Estão localizadas próximas da igreja evangélica e da sede social. A paisagem
desta comunidade caracteriza-se por uma escada que dá acesso a três pequenos chapéus de
palha que fornecem sombra logo na entrada da comunidade.
Os moradores entrevistados relataram a existência de fragmentos de cerâmica e
outros materiais na chamada “terra preta”, facilmente verificada na decoração da sala em
uma das casas visitadas. Muitos moradores são oriundos do município de Urucará foram
atraídos pelo desejo do tão sonhado pedaço de terra, pela fertilidade do solo local e por
vínculos afetivos de parentes que já residiam na área.
Como apresentado anteriormente há uma forte presença de pequenos agricultores,
que em sua maioria pratica a agricultura de subsistência, baseada pelo plantio e cultivo da
mandioca, banana e outras frutas. De acordo com a liderança da comunidade o Sr J. M 48 a
pesca de subsistência e eventualmente comercial é feita em pequena quantidade e a
extração de madeira atende as necessidades de melhorias das moradias, construção de
escolas, também enfatizou que antes da implementação do Bolsa-Floresta algumas pessoas
da comunidade comercializavam de maneira ilegal para grandes madeireiras.
118
Se compararmos a comunidade Nossa Senhora do Livramento à comunidade
Santa Luzia do Jacarequara notaremos problemas enfrentados semelhantes, mas com
organização social distinta. A grande dificuldade enfrentada pelos entrevistados que têm
filhos em idade escolar é a ausência de escola de ensino médio, fazendo com que muitos
jovens deixem a comunidade para estudar no município de Itapiranga ou Urucará
dependendo das condições de vínculos de parentesco existente.
A comunidade também não conta com atendimento médico permanente, o único
tratamento se restringe àqueles contra a malária, vísitas sazonais de agentes de saúde e
endemistas, que trabalham com analise de lâminas e fornecimento de medicamentos para
malária.
A comunidade Nossa Senhora do Livramento está envolvida em um projeto da
empresa Manaus Energia “Monitoramento e preservação de quelônios”, onde são
protegidos tabuleiros de desova e utilizados berçários para aumentar a taxa de
sobrevivência desses animais. No mês de Março a comunidade se prepara para um dia
festivo que comemora a soltura de quelônios que também abrange outras atividades, de tal
maneira que ao longe percebe-se que a comunidade está pronta para receber os visitantes e
as outras comunidades, conforme a figura10:
Figura 10 - Vista da comunidade do Livramento.
Foto: Jander Cardenes (março/2010)
Geralmente no mês de fevereiro/março é realizado um evento festivo que envolve
a mobilização dos moradores, recebendo barcos de outras comunidades e representantes da
119
Manaus Energia e convidados. A comunidade está envolvida no projeto de Preservação de
Quelônios da empresa Manaus Energia. Em setembro, os quelônios começam a chocar
ovos. Os ninhos estão marcados e anotados em um caderno. Em aproximadamente 40-60
dias os ovos eclodem e são recolhidos para o berçário por um período de 4 a 5 meses.
Neste dia, a comunidade visivelmente assume uma identidade e organização em
torno da conservação, ocorre uma mobilização dos moradores na confecção de adereços
geralmente relacionados ao tema do evento (Amar, Respeitar e Preservar). A comunidade
Livramento recebe os visitantes com um café da manhã regional. Neste dia também são
realizadas pela empresa Manaus Energia em parceria com outras instituições como o
SENAI, oficinas de nutrição, corte de cabelo, torneio de futebol e apresentações culturais
para os visitantes conforme apresenta a figura 11.
Figura
11 –
Festa cultural comemorativa da soltura dos quelônios.
Foto: Jander Cardenes, (março/2010)
Numa breve análise, este tipo de evento representa um momento de evidência da
mobilização local, ao mesmo tempo em que expressa o espaço de uma espécie de
identidade coletiva do grupo social local. Contudo, observamos neste momento que
compreende a soltura dos quelônios nas chamadas “praias de quelônios” envolve um
particular campo de interesses em torno do capital simbólico que vai desde o momento de
120
entrega de certificados a personalidades que contribuíram com o projeto até o espaço
destinado a filmagem e fotografia.
Neste campo de interesses diversos que envolvem a presença de representantes,
jornalistas, gestores e lideranças comunitárias da RDS, (Manaus Energia, SDS, IDESAM),
conforme ilustra a figura 12.
Com isso, queremos dizer que a noção de comunidade se constrói a partir da
história e que é ela que nos ajuda a reconhecer a identidade característica de cada local
comunitário. Mas é a história também que deixa claro, ao mesmo tempo, que essa
identidade está em constante movimento e, portanto, a própria definição da comunidade
não existe como um dado pré-existente como previsto na concepção no PBF.
O processo organizativo de comunidades como a Nossa Senhora do Livramento
na modernidade constitui relaborações identitárias e culturais “celebração móvel” formada
e transformada continuamente em relação as formas pelas quais somos representados ou
interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. Na medida em que os sistemas de
significação e representação cultural que rodeia a comunidade se multiplicam, também é
possível estes assumirem uma multiplicidade de identidades possíveis, ainda que sejam
temporariamente. (HALL, 2005).
Ao longo da história da Amazônia é possível afirmar a grosso modo que a
imposição de identidade reconfiguradoras
deram-se no primeiro momento, pela
colonização européia e as Companhias de comércio com suas formas de exploração; no
momento subseqüente e ainda em curso as formas de integração nacional pelos projetos
carregados de imagens obsoletas e do mito dos espaços vazios, subalternizando a todas as
formas de exploração e violência dos povos, classes e etnias (SILVA, 2004).
121
Figura 12 - Moradores da comunidade Maracanarã e a soltura de quelônios.
Outro fato que também merece menção corresponde à fala de um dos moradores
de maneira discreta, mas com a legitimidade de quem viveu o episódio do processo de
construção da hidrelétrica de Balbina:
Esta empresa , hoje, responsável por Balbina, agora está aqui promovendo a
soltura, mas também foi responsável pela criminosa inundação, contudo agora
eles têm que ajudar a preservar o que ainda resta. ( A. G. 58, entrevistado em
março de 2010).
Neste sentido Thomé (1993), argumenta que a instalação da usina hidrelétrica fez
parte de um plano de integração da Amazônia ao território nacional. Foi uma das principais
metas do regime implantado. A instalação dos "Grandes Projetos" na região foi considerado o
principal meio para viabilizar o objetivo. Os impactos do projeto tomaram proporções
assustadoramente negativas, como, mínima capacidade de gerar energia, por área florestal
destruída e invasão de territórios indígenas.
Assim, neste momento emergem as lembranças de um momento histórico da
região que apontam experiências traumáticas vividas por aqueles que testemunharam a
construção da barragem de Balbina, ou seja, a construção do represamento da hidrelétrica
de Balbina deixou marcas profundas nos modos de vida do local, sendo possível dizer que
mesmo ausente nos discursos principais de projetos (como o de “preservação de
quelônios’), reside por trás daquela ação (soltura de quelônios) uma considerável (dívida
do Estado) história social marcadamente esquecida pelas ações conservacionistas, mas
presente na memória coletiva daqueles que tiveram e ainda têm que se adaptar aos efeitos
causados aquele ambiente.
A totalidade dos moradores já recebe há dois anos o chamado pagamento do
Bolsa-Floresta no valor de cinquenta reais a exemplo da comunidade anterior (Santa Luzia
do Jacarequara). A maior dificuldade é o alto custo para ir até Urucará ou São Sebastião do
Uatumã. Isto devido a distância, em torno de 205 km. Todos os entrevistados fizeram
questão de frisar que a quantia recebida é insuficiente para suas necessidades básicas,
sendo direcionadas como complemento para custear a compra do material escolar das
crianças ou apenas um complemento mínimo de sua alimentação, conforme o relato do
morador:
Apesar da ajuda não se pode negar... o valor pago é muito pouco, mal dá para
comprar cadernos e material escolar das crianças, ou mesmo para ajudar custear
122
os estudos dos filhos que vão estudar no município de Urucará ou São Sebastião
em virtude da falta de escola de ensino médio( L. M. 30 entrevistado em março
de 2010).
É possível observar que algumas criações de animais na comunidade Nossa
Senhora do Livramento têm apresentado os primeiros resultados com o investimento do
Bolsa-Floresta Renda, a partir da criação de animais como carneiro e galinhas. No entanto
foi interessante o relato de alguns casos específicos de moradores que têm encontrado
grandes dificuldades de levar adiante a criação de carneiros e até mesmo de galinhas.
Como uma forma de mudar de atividade econômica resolvi criar carneiros e
galinhas, mas infelizmente tive que retirar o que sobrou da criação de carneiros
para vender na cidade pois a onça devorou treze só este mês, se não fizesse algo
não iria restar nenhum e teria um prejuízo maior ainda (Sr. J. M. 48).
Aqui ressaltamos que mudanças na atividade econômica muitas vezes desprezam
as especificidades do ambiente, ou seja, a Unidade de Conservação que agora inclui a
temática das mudanças climáticas desconhecem a relação da fauna e do modo de vida das
famílias que se organizam produtivamente a partir da disponibilidade dos recursos naturais.
No que concerne o associativismo a forma de organização social tem como
principal desafio a mínima participação ativa dos residentes da comunidade do livramento,
contudo o atual presidente da comunidade demonstra o interesse em participar em todos os
momentos assuntos que dizem respeito a RDS desde antes de sua criação. Tal fato é
notório e aparece na crítica quanto ao caráter internalizado nas ações do governo que
historicamente não pareciam bem claras no local, ou seja, a ausência ou ineficiência de
ações caracterizadas pelos moradores como promessas oportunistas que se revelam em
época de eleições.
A esposa do líder da comunidade exerce liderança entre as mulheres da
comunidade, com postura questionadora revela sua insatisfação quanto aos canais de
participação no Programa Bolsa-Floresta e as reduzidas informações dos números
orçamentários, o valor destinado e o que realmente foi utilizado pela comunidade, por
exemplo, do Bolsa-Floresta Renda e Bolsa-Floresta Associação.
Quando o programa iniciou prometeram céus e terra, vieram muitas pessoas,
políticos, com o passar do tempo, começamos a notar que o movimento
diminuiu, mas eu penso que nas reuniões, há pouca participação, tipo algumas
coisas já chegam até nós, decididas... cabendo a nós escolher de acordo com as
escolhas já feitas pelo pessoal do bolsa-floresta, ou seja, são apenas
apresentadas a nós (C. M. 34, entrevistado em março de 2010).
123
Os moradores da comunidade demonstram pouco entendimento e revelam a
existência de poucas informações que são muitas vezes imprecisas a respeito do BolsaFloresta Renda e Bolsa-Floresta Associação, como por exemplo, a liderança da
comunidade desconhece o que sobrou ou mesmo o que realmente foi investido pelo BolsaFloreta Renda referente ao ano de 2008. Neste ano ocorreu uma espécie de mudança na
escolha da atividade econômica, ou seja, a primeira escolha da comunidade mostrou-se
inviável para a geração de renda dada a realidade específica da comunidade, ficando os
recursos aguardando uma nova escolha.
Quanto ao componente Bolsa-Floresta Familiar, os moradores afirmam que a
quantia recebida ajuda relativamente, pois não dá pra suprir suas necessidades autenticas e
que após o recebimento do Bolsa-Floresta Família, algumas atividades foram proibidas
como extração de madeira e aumento da área do roçado e que muitos deixaram a criação de
gado, (mesmo as pequenas criações) tida como uma espécie de poupança por ser um
produto de grande liquidez. Uma das moradoras mostrou-se descontente com alguns
aspectos da vida na comunidade, relatou que foram prejudicados com a cheia que
praticamente arrasou com a produção da farinha (para consumo e venda do excedente) até
mesmo a maniva de mandioca necessária para o plantio estava escassa e tinha alto custo.
Quando resolvi receber a quantia de R$50, 00 (cinquenta reais) pensei que
aumentaria o valor do BF, também pensei que o governo ajudaria também a
desenvolver aquilo que a gente planta, ou então quem sabe aumentar o valor do
Bolsa-Floresta para um salário mínimo...eu sei que está vindo muito dinheiro de
fora para ajudar a preservar a floresta com tudo que agente ouve falar sobre o
aquecimento global, é fácil dizer que nós que moramos no interior sem as
condições básicas de saúde para não desmatar, mas eu queria ver também na
pratica um maior apoio para nós aqueles que vivemos e dependemos
diretamente da natureza (M.O. 53entrevistada em março 2010).
A assistência técnica para a produção agrícola encontrada na região está limitada a
programas governamentais de doação de sementes pelo IDAM , que nem sempre chegam
nas mãos comunitárias dentro do período de plantio, muitos agricultores precisam se
deslocar até aos centros urbanos, visto a dificuldade logística para a prática da extensão
rural nas comunidades.
Merece nossa observação que o repasse do PBF Renda, em um primeiro momento
fora direcionado de acordo com a decisão da comunidade Nossa Senhora do Livramento e
124
por conseguinte ao pólo a que pertence52, ou seja, seria investido em equipamentos para
construção de uma movelaria na RDS Uatumã. Contudo, apesar da aquisição de alguns
equipamentos mostrou-se em descompasso com a predisposição; enquanto outros pólos
como o da comunidade Nossa Senhora do Perpétuo Socorro do Maracaranã já tinha
concretizado a instalação de tanques para criação de peixes. No momento seguinte, o pólo
da comunidade Livramento optou pela criação de pequenos animais a partir do
entendimento que seria uma atividade mais viável. Mas para muitas famílias a criação de
pequenos animais como carneiros e galinhas esbarrou na ausência de apoio técnico, como
nos esclarece o depoimento de uma das moradoras da comunidade Nossa Senhora do
Livramento:
Estavamos empolgados logo no início quando chegaram os primeiros pintinhos
para começar nossa criação, mas houve muita demora para recebermos a ração, o
que acabou comprometendo o tamanho dos frangos, tornando seu preço muito
baixo para comercialização.(E. M. 37 março de 2010).
Estes e outros depoimento revelam os limites e alcances do processo de
implementação do PBF Renda, este não vem atingindo seus objetivos. Se a meta é
promover arranjos produtivos sustentáveis e assim promover atividades que não produzam
desmatamento, faz-se necessário não se limitar aos planejamentos técnicos concebidos e
implantados de cima para baixo, direcionados para endossar o discurso da floresta em pé,
negligenciando ou pondo em último plano, qualquer abordagem rigorosa que de atenção as
especificidades e dinâmicas socioculturais, assim como aos interesses e conflitos sociais
envolvidos em cada comunidade envolvida do PBF Renda.
3.3 Comunidade Nossa Senhora do Perpetuo Socorro do Maracaranã
A comunidade Nossa Senhora do Perpetuo Socorro do Maracaranã está localizada
nos paralelos S 02° 13’ 03” e W 58° 50’ 06” setor sul da reserva Uatumã, na margem
esquerda do rio Uatumã, possui 28 famílias que residem em casas construídas nas áreas
mais altas, local onde se assenta a sede social, a igreja (católica) e a escola de 1ª a 9ª série
do ensino fundamental. As casas do comunitários estão localizadas próximas da igreja
católica e da escola, conforme a disposição apresentada na figura 13 e 14 respectivamente:
Os moradores da comunidade contam com alguma estrutura para criação de
animais como curral, galinheiro e chiqueiro ; possuem casa de farinha, possuem ainda um
tipo de barracão onde são feitas reuniões ou para receber visitantes.
52
sete comunidades integram o Pólo 2: Nossa Senhora do Livramento, Santa Luzia do Caranatatuba,
Ebenezer, Cezaréia, São Francisco das chagas do Caribi, Monte das Oliveiras, Emanuel da Serra do Jacamim.
125
Fig
escola da comunidade Maracaranã.Foto: JanderCardenes, março/2010.
ura 13- Igreja e
Figura-14: vista da entrada da comunidade Nossa Senhora do Perpetuo Socorro do
Maracaranã, as casas estão localizadas na parte mais alta da comunidade em terra
firme.
Foto: Jander Cardenes, (março/2010)
A distribuição espacial das casas da comunidade Nossa Senhora do Perpetuo
Socorro do Maracaranã ocorre nas áreas mais altas em terra firme. Comparada às
comunidades abordadas anteriormente (Santa Luzia do Jacarequara e Nossa Senhora do
Livramento), esta se configura com melhor infra-estrutura, possui associação de moradores
devidamente legalizada, gerador de energia, poço artesiano em funcionamento, clube de
mães, sede social e posto de saúde com agente de saúde. Contudo, a ausência de programas
do Governo Federal como o Programa Luz para Todos ainda não ultrapassou os limites de
promessa pelo governo local, principalmente, em períodos de campanha eleitoral.
O cotidiano na comunidade de Maracaranã está associado ao mundo rural
amazônico representado pelas particularidades locais que misturam atividade da
agricultura com atividade extrativista como a pesca, ou ainda com a criação de animais em
126
pequena escala, mas acima de tudo com uma profunda e intensa relação com a floresta de
acordo com o regime das águas dos grandes e pequenos lagos da bacia do rio Uatumã.
A comunidade está situada na entrada do lago Maracaranã que faz parte de um
complexo de seis lagos, utilizando-os apenas para pesca de subsistência dos comunitários e
pesca esportiva realizada pelos turistas que visitam a comunidade no verão.
Uma empresa de turismo adquiriu uma área irregular e montou uma pousada
próxima à comunidade após o decreto de criação da RDS do Uatumã. A empresa mantém o
comunitário que vendeu a terra para ela como zelador, empregando sua esposa e filhos no
período da pesca esportiva no auxílio a manutenção da estrutura, na cozinha e lavanderia, e
desenvolve atividades turísticas na região dos lagos, como podemos observar na figura15.
Figura 15 - pousada Tucuna localizada na Comunidade Nossa Senhora do P. do
Maracaranã
Fonte: ( IDESAM, 2008).
Além da ligação dos moradores com lago Maracaranã para pesca de subsistência,
a comunidade também recebe visita de barcos de turistas para pesca esportiva no verão. A
caça é praticada para obtenção de proteína alternativa ao pescado, e a tradicional captura de
quelônios. Porém foram relatados alguns casos de venda para restaurantes dos municípios
próximos da RDS, desta forma são atividades para o consumo local e eventual
comercialização.
De acordo com o presidente da Associação dos moradores da comunidade existe a
proposta do Governo Federal da construção de uma mini usina em Maracaranã, e que a
empresa Manaus Energia informou que o projeto ainda está no Dep. de Engenharia da
127
UFAM e que está sendo articulado pelo Programa Luz para Todos do Governo Federal.
Ressalta ainda a preocupação em relação ao Projeto se este vai impactar a cachoeira
próxima ao local de instalação.
Muitos dos moradores da comunidade entrevistados são oriundos de outras
comunidades, municípios e estados diferentes, dentre eles Itacoatiara, Paraná da Eva e Vila
de Balbina e do estado do Pará, e vieram para a comunidade em busca de terra. Podemos
observar tal distribuição na figura 16.
Figura 16 - motivos condicionantes para residir na comunidade Maracaranã.
É preciso destacar que na comunidade Maracaranã, observa-se um melhor nível
de organização social que em outras comunidades, principalmente na luta pelos seus
interesses e necessidades. Por exemplo, os moradores desta comunidade são contrários a
invasão de seus territórios por pescadores de fora, entendem que as pessoas que entram na
reserva para retirar madeira ilegal ou praticar pesca intensiva estão roubando os recursos
naturais que as famílias da comunidade dependem para sobreviver.
Desta forma, antes mesmo da implementação do Programa Bolsa-Floresta os
moradores da comunidade em sua totalidade já tinham o comprometimento com o manejo
sustentável na maioria das vezes sem o apoio do governo local. Isto é provado em
depoimentos de pessoas que voluntariamente fiscalizavam os lagos, principalmente por
conta da grande incidência de “barcos comerciais de pesca” Ou seja, já enxergaram a
necessidade da conservação dos recursos da região e de seu uso de uma forma, acima de
tudo, sob controle da comunidade, conforme o relato de um dos comunitários:
128
Nós sempre nos preocupamos com a invasão de embarcações pesqueiras ou de
pessoas que retiravam madeira de maneira ilegal na reserva. Antes mesmo do
Programa Bolsa-Floresta, já estávamos cuidando do lugar onde moramos e da
floresta (M. S. 41, entrevistada em março de 2010).
A organização política da comunidade Maracaranã ocorre principalmente através
da Associação dos moradores de Nossa Senhora do P. Socorro do Maracaranã, entidade de
caráter político e com CNPJ regularizada e que realiza suas reuniões a cada segundo
domingo do mês. Os cargos da associação comunitária são divididos hierarquicamente em
presidente e vice-presidente, além dos tesoureiros, tendo a participação de mulheres como
membros da diretoria. O atual presidente da associação destaca-se por sua capacidade de
liderança caracterizada por suas decisões baseada na consulta aos outros membros da
comunidade, exemplo disso, corresponde ao momento de explicação de nossa pesquisa e
solicitação de sua permissão que se deu a partir da consulta dos membros de sua
comunidade.
Sem dúvida, a Associação é o principal mecanismo articulador na rede de
relacionamentos que a comunidade mantém com as organizações governamentais
( INCRA, Prefeitura de Presidente Figueiredo, Manaus Energia) e não-governamentais,
(IDESAM, FAS, SDS , Associação Agroestrativista e outras comunidades). A exemplo
das demais comunidades abordadas o principal setor econômico existente é agricultura de
subsistência com roças de macaxeira, mandioca e frutas, do extrativismo animal, com
relevância da pesca e caça, e do extrativismo vegetal não madeireiro com extração da
castanheira-do-Brasil, andiroba, e cipós entre outros, a qual nem sempre é suficiente para o
sustento da casa. Geralmente o complemento da renda se dá através da aposentadoria ou do
benefício como Bolsa Família oferecido pelo Governo Federal.
No que se refere às atividades produtivas permitidas na RDS Uatumã, os
moradores entrevistados apontam as roças (desde que não ultrapassem dois hectares, 33%)
manejo de áreas para obtenção de madeira, extrativismo (da castanha,17%), pesca
comercial (8%) destacados na figura 17 :
129
Figura 17- Atividades produtivas permitidas na RDS Uatumã.
Contudo, é possível observar que até o momento de nossa abordagem na
comunidade o plano de manejo da RDS Uatumã ainda não tinha sido aprovado, e que em
determinadas situações, principalmente aquelas em períodos de seca, alguns moradores
aproveitavam as áreas que ultrapassavam os limites de dois hectares, uma que vez que na
época de coivara estes limites não são obedecidos.
É interessante destacar que a exemplo das comunidades abordadas anteriormente
(Santa Luzia do Jacarequara e Nossa Senhora do Livramento), a produção de farinha de
mandioca também ficou comprometida devido a cheia de 2008. No entanto, ocorre uma
pequena diferença na comunidade, a disponibilidade de manivas para o plantio estava
garantida. Outra especificidade distintiva é a relação com a prefeitura de Presidente
Figueiredo que possui proximidade com a comunidade e que mantém o apoio em alguns
serviços básicos educação, saúde e transporte para o escoamento dos produtos destinados à
venda.
A totalidade das famílias desta comunidade recebe o pagamento de R$50,00
(cinquenta reais) referente ao Bolsa-Floresta Família há pelo menos dois anos. Para receber
o pagamento de tal quantia, utiliza-se o transporte destinado para venda de produtos no
município de Presidente Figueiredo.
De acordo com o relato dos moradores entrevistados demonstra que a utilização
do dinheiro proveniente do PBF serve para pagar a taxa mensal da Associação dos
Moradores, sendo o restante investido em benefício da família na forma de compra do
130
material escolar para os filhos (29%) remédios (14%) e complemento da alimentação
(43%), como demonstra a figura 18.
Figura 18 - Gastos do valor recebido do BF Família.
Segundo o presidente da Associação dos Moradores do Maracanã os reflexos do
Programa Bolsa-floresta na melhoria da comunidade começam a serem sentidos pelo
motivo já terem encontrado as condições materiais, estas anteriores a seu estabelecimento.
O Bolsa-Floresta renda com certeza ajuda, mas ajuda muito pouco...o Bolsa
Floresta Associação nem sabemos como é investido, mas o que realmente
precisamos é de apoio do governo para obter a energia elétrica, apoio e
acompanhamento técnico para agricultura e melhores condições de serviços
públicos como educação e saúde. Na verdade as condições para dar dignidade
para moradores que realmente ajudam a conservar a floresta (C. S. 61
entrevistado em março de 2010).
A menção feita anteriormente à ajuda limitada refere-se a quantia recebida do
Bolsa-Floresta Família, que ao mesmo tempo que é tida como uma ajuda também é
percebida por um dos chefes de famílias, como uma espécie de controle do governo sobre
as atividades na comunidade, conforme nos informa o comunitário:
Minha vida está na comunidade Jacarequara, até agora fico pensando como as
pessoas que não moram ou mesmo nunca estiveram na RDS Uatumã, tam pouco
em nossa comunidade podem criar regras que afetaram , por exemplo, na
minha renda, que antes era um pouco maior devido a poupança que tinha na
forma de criação de gado... é claro que embora minha mulher receba o valor de
R$ 50,00 (cinqüenta reais), preciso trabalhar com plantio que muitas vezes não
traz ganho nenhum como foi o caso da enchente que acabou com meu roçado
(N.O. 45 entrevistado em março de 2010).
131
De acordo com um dos coordenadores da Fundação Amazonas Sustentável a
partir do momento em que as famílias se inserem no Programa Bolsa-Floresta ficam
proibidas algumas atividades, que segundo os moradores são: aumentar o roçado para além
de dois hectares53 (30%), a extração de madeira ilegal (40%) para venda e ampliar o pasto
destinado a criação de gado (30%) como se pode observar na (figura 19). No entanto,
também foi relatado que as atividades desenvolvidas no local, de certa maneira são
destinadas a subsistência muito antes da chegada do PBF.
Figura 19 - As atividades que foram proibidas a partir da implantação do Bolsa-Floresta
na Comunidade Maracaranã.
Podemos afirmar o componente BF Familiar é sempre o mais lembrado, isto se
deve pelos entraves de implantação dos demais componentes que muitas vezes ainda
sequer foram materializados nas comunidades, ao contrario do que se propaga no discurso
oficial um exemplo claro é a realização da melhoria da infraestrutura e da comunicação
entre as comunidades, tão propagados pela mídia na forma do marketing verde. Há
diferenças específicas de cada componente do PBF, observadas principalmente nas
comunidades aqui estudadas. A comunidade Jacarequara possui indícios inexpressivos do
PBF Associação e Renda, enquanto que a comunidade Maracaranã o componente BFR
53
Um hectare de terra mede 10.000 m^2 , cabe ressaltar que de acordo com o Plano de Manejo elaborado
pela SDS e IDESAM, que ainda não foi aprovado, estabelece as regras de utilização da RDS do Uatumã, é
permitido o uso de até 3 (três) hectares por ano por família para áreas de roçado, sendo que a utilização de
áreas acima de 3 hectares deverá ser aprovada pelo conselho deliberativo e autorizada pelo órgão gestor
(AMAZONAS, 2008, p. 247).
132
possui contornos de maior perspectivas por parte de alguns moradores da comunidade,
caracterizado pela implantação de tanques redes, para piscicultura e aguarda ainda os
benefícios do ano referente a 2009. Esta ação tem encontrado entusiasmo em alguns
moradores responsáveis pelos cuidados a quem mesmo se refere, conforme o relato do
morador:
O PBF Renda apesar de está ainda em fase inicial, acho que é muito bom poder
contar com este projeto, sinto que aqueles que realmente participam tendo como
responsabilidade o cuidado e a alimentação dos peixes vão ter sucesso, mas falta
mais informações sobre os direitos e investimentos feitos na comunidade (A.O,
28 entrevistado em março de 2010.)
O
grande
nó
das
perspectivas
que
estão
por
detrás
do
discursos
e
disciplinarização/controle de grupos do poder que propogam o lema: “valorizar a floresta
mantendo-a em pé” está no reconhecimento do aporte e na repartição dos benefícios. Alguns
entrevistados afirmaram que são diretamente interessados em manter a floresta em pé, contudo,
a utilização dos recursos naturais na comunidade orienta-se pelo modo de vida, e ainda que
existam atividades de extração de madeira, estas são conduzidas pela lógica mercantil da
região amazônica que, de certa maneira, explora a condição de vulnerabilidade por aqueles que
não conseguem encontrar alternativas para o sustento de sua família e acabam por retirar
madeira de maneira ilegal para vender a pessoas ligadas a grandes madeireiras, nas palavras do
morador:
Vi meus filhos nascerem e crescerem na comunidade, sempre ensinei de que
precisamos da floresta e do rio para viver. A tarefa de utiliza-la de forma correta
não é porque as pessoas são boas ou más. Desmatar a floresta não é nosso
interesse, por exemplo, conheço pessoas ( não desta comunidade) que para ter
renda dependem exclusivamente da agricultura ou da venda de banana ou
farinha, mas perderam toda plantação devido a enchente de 2008 que inundou os
roçados (A. G. 61. entrevistado em março de 2010).
De acordo com um dos representantes da diretoria da associação Maracaranã não
houve uma melhoria diretamente na vida da comunidade, contudo pode ser apontada como
avanço significativo a aquisição feita a partir do Bolsa-Floresta Social de uma
ambulancha54 que possui base no local. Contudo, o comunitário considera que em dois
anos de Programa, pouco foi realmente efetivado, e a ausência de informações referente a
quantia a ser investida na comunidade, por exemplo, nem mesmo nos anúncios
publicitários veiculados na mídia ou no discurso do governo do estado, possuem
informações sólidas quanto ao repasse do Bolsa-Floresta Associação. Assim, demonstra-se
54
O termo ambulancha refere-se ao barco destinado exclusivamente para transporte em casos de emergência,
a Associação é quem arca com as despesas do combustível.
133
não só uma imprecisão de informações que ainda não parecem claras, como os próprios
alcances deste componente.
“o que eu sei sobre o PBF é que muito foi prometido e ainda não existe,
permanece uma espera por melhorias, eu já chequei a pensar se não é melhor
ficar sem receber os R$50,00, eu sei que é humilhação de tão pouco que é para
deixarmos outras atividades que garantiam em momentos difíceis uma certa
renda, mas ainda espero que melhore, as condições de vida, a saúde, educação,
mas até agora, o que agente fica sabendo é muito pouco a respeito da
manutenção ou qualquer mudança nos valores a que temos direito, falta melhor
comunicação por parte deles” (C.G. 41 entrevistado em março de 2010).
A exemplo das outras comunidades estudadas esta demonstra pouca informação
do processo dinâmico que envolve os componentes do Programa, sendo que a totalidade
dos entrevistados afirmaram a ausência e/ou limitações do acesso a informações
institucionais sobre as transformações em torno do Programa Bolsa-Floresta Associação.
Cabe ressaltar que outro grande problema enfrentado a exemplo de todas outras
comunidades do Uatumã, é a precariedade e ausência de comunicação 55 entre as
comunidades da RDS Uatumã e o governo local assim como a rede de instituições
governamentais e não governamentais.
Nota-se nas comunidades abordadas especialmente na comunidade Nossa Senhora
do P. Socorro do Maracaranã uma espécie de fragmentação dos componetes do PBF. É
também relevante observar que nesta comunidade, dentre os entrevistados, dois moradores
afirmaram ter conhecimento de algumas famílias da RDS Uatumã (referia-se outra
comunidade) que continuaram ampliando as áreas de roçado através de queimadas, que
ultrapassavam os limites do estabelecido nas regras do Programa BF que embora de
maneira isolada existiam casos de pessoas que não moram na reserva, no entanto mantém
casas na comunidade e recebem o BFF.
Esta comunidade também realiza projeto de preservação de quelônios,
trabalhando com apoio técnico da empresa Manaus Energia, na vigilância de tabuleiros de
quelônios, criando os filhotes em berçários e cuidando dos mesmos até que atinjam o
tamanho mínimo para retornarem aos rios. Neste mesmo dia, paralelo a soltura de
quelônios, também são realizadas atividades que promovem a interação de outras
comunidades e visitantes, como café da manhã coletivo, torneio de futebol e oficinas
promovidas pela empresa, conforme se pode observar na figura 20.
55
Até o momento da execução da pesquisa observamos a inexistência de qualquer aparelho tecnológico que
permitisse a comunicação entre as comunidades.
134
ura
Oficina de educação na comunidade Maracaranã
Fig
20 -
Foto: ( Jander Cardenes, Jan/2010)
Ao longo da observação direta notou-se que a comunidade Maracaranã
desenvolve entre seus comunitários laços afetivos com o lugar, que geralmente decorrem
de anos de vivências e experiências de adaptabilidade ao ambiente, atribuídas as relações
humanas, conforme o depoimento de um dos moradores de Maracaranã:
“Quando saí de Santarém não tinha um lugar e cheguei na comunidade encontrei
um pedaço de terra para viver, encontrei a tranquilidade que não tinha na cidade,
este foi o lugar que escolhi para viver, mas isto antes da criação do reserva, aqui
enfrentei muitos problemas, mas continuo a viver com minha família.” (J. A 54.
Entrevistada em março de 2010).
Se compreendermos a noção de lugar na perspectiva proposta por Tuan (1983),
como um mundo de significados organizados, perceberemos como é possível o
estabelecimento dessas relações que se firmam na medida em que os homens recobrem de
sentimentos, de afetividade, a comunidade em que habitam e constroem suas vidas.Este
autor trata a relação entre espaço e tempo na construção do lugar. O lugar é uma área que
foi apropriada afetivamente, transformando um espaço indiferente em lugar, o que por sua
vez implica na relação com o tempo de significação deste espaço em lugar.
Assim o lugar permite aos homens a acolhida, o reavivamento da memória, a
recriação dos sonhos, a satisfação de necessidades, a construção e reconstrução da
identidade, a percepção das especificidades, a realimentação das crenças e valores, dentre
outros aspectos. Em outras palavras, o lugar está permeado de subjetividade, não se limita
135
apenas a circunscrição física, mas um conjunto de relações sociais, de elementos
econômicos, de histórias, de sonhos, de valores, de crenças, de subjetividades, não se
restringindo, unicamente, aos limites geográficos (TUAN,1983).
Embora nosso estudo exigisse maior aproximação daquilo que Bourdieu (2004),
denominou de habitus, dentro dos limites das diversas realidades sociais existentes no
cotidiano, observou-se que existem laços simbólicos e materiais ainda que menos visíveis
aos olhos das instituições governamentais e não governamentais, mas que existem estão
presentes nas relações comunitárias, produtivas e familiares, seja na socialização dos
recursos naturais, seja na maneira de se organizarem diante das regras de controle, ou do
acesso aos serviços públicos básicos, mas principalmente na visão de mundo, do ambiente
da RDS Uatumã.
As comunidades Santa Luzia do Jacarequara, Nossa Senhora do Perpetuo Socorro
do Maracanarã e Nossa Senhora do livramento assumem comportamentos e condutas a
partir da dinâmica de seus aspectos culturais com diferenças específicas, mas que estão em
contato com os postulados impostos pela modernidade como: dívida social, déficits de
cidadania, ilegalismos/legalismo/poder disciplinar, lealdade e sacrifícios, desserviço
ambiental, alcance das Metas do Milênio da ONU.
A relação do processo de enfrentamento das mudanças climáticas e o crescente
debate em torno do reconhecimento que os serviços ambientais e que as populações rurais
prestam, estão ancorados na visão ambientalista, no caso do PBF abrange somente na
retórica (dos donos do poder) a dimensão cultural e a inclusão social das comunidades da
RDS Uatumã.
Estamos diante de um novo panorama que emerge na Amazônia com antigas
lógicas institucionais a serviço da acumulação do capital, que historicamente mantiveramse sob novas versões dos processos que configuram e reconfiguram as identidades dos
sujeitos sociais, envolvidos nos conflitos do enfrentamento das mudanças climáticas.
Assim, temos neste panorama a disputa pelo poder de controle dos recursos naturais,
serviços ambientais, e o modo de vida das comunidades que vivem na RDS Uatumã. Além
disso, não podemos deixar de mencionar que ao situarmos a inclusão de discussões das
mudanças climáticas na gestão das Unidades de Conservação no Estado do Amazonas,
estaremos tratando de uma visão de ambiente como algo objetivo e externo às relações
sociais, formalizadas diretamente pelo trato técnico das ações e parcerias socioambientais.
136
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Amazônia constitui o principal signo ecológico do mundo contemporâneo e o
estado do Amazonas parece ter assumido no cenário ambiental brasileiro o lugar de
destaque no imaginário daqueles que naturalizam as questões sociais, emerge uma espécie
de referência para a mídia nacional e estrangeira no tema mudança climática. Contudo, este
mantém em suas ações a contradição de enfrentar a crise climática a partir da mesma
lógica que o causou.
Está problemática está inserida de diferentes formas nos discursos científicos, agora
no âmbito das discussões das mudanças climáticas globais e seus efeitos locais, que
norteiam novos postulados para parcerias socioambientais caracterizadas por formas
emblemáticas e restritas a visão biologizante que ofusca e tende naturalizar os aspectos
sociais do modo de vida nas Unidades de Conservação no estado do Amazonas. Esta visão
é pratica corrente nas entrelinhas dos discursos como “fazendo valer a floresta em pé” e
tem encontrado espaço nas fontes de financiamentos e de acordos feitos em nome dos
povos tradicionais. Neste sentido, a polêmica sobre as prováveis causas do desmatamento e
a polêmica que gira em torno dos principais responsáveis pelo aquecimento global encobre
o pano de fundo dos debates sobre as mudanças climáticas que trata da apropriação e
distribuição dos recursos naturais pelos mecanismos da lógica da acumulação capitalista,
ou seja, a apropriação estatal ou privada dos recursos ambientais comunitários, em nome
137
do fardo desproporcional de desmatamento e contaminação promovida, historicamente
nesta importante região mundial (SILVA, 2000 e ALIER, 2007, p.256).
Na Amazônia, os povos tradicionais estiveram e permanecem esquecidos pelas
políticas públicas, como dizia Berta Becker, em vários momentos da historia da Amazônia,
atravessando a ditadura até os dias Atuais, continuaram esquecidas. Ainda é cedo, para
avaliar as ações em processo do PBF, mas em se tratando de um governo que oito anos
com total descaso pelo as áreas rurais onde lhe falta tudo não pode ser considerado
moderno quando o foco está em sobrepor a questão ambiental como ela não fosse social.
Porque o “núcleo duro” do desmatamento esse o governo estadual faz vista
grossa. Se a opção pelo desenvolvimento sustentável, conceito este em si tão desgastado
politicamente, em suas cinco facetas – o social, o cultural, o ecológico, o econômico e o
político, continuam sendo um imperativo se quiser manter ilhas de sanidade que
sobreviverão ao caos que o modelo atual de desenvolvimento está instalou no planeta.
O debate desencadeado pela inclusão das mudanças climáticas na gestão das UCs
no Amazonas acabam envolvendo diretamente o modo de vida das famílias rurais,
especialmente aquelas que moram RDS Uatumã. Assim para além das questões que
envolvem os aspectos morfoclimáticos, Becker (2009), defende que a Amazônia requer um
novo padrão de desenvolvimento, e tem condições de realizá-lo contando com seu
patrimônio natural, destacando-se os serviços ambientais. Para tanto, terá que superar
desafios científicos e, sobretudo, políticos quanto à decisão de como valorá-los. Neste
sentido, é importante assinalar que os serviços ambientais só contribuirão para o
desenvolvimento regional se superarem o padrão histórico de exploração de seus recursos.
A proposta de livre regulamentação do mercado de serviços supõe a acentuação das
desigualdades relativas à distribuição das vantagens econômicas, impactos e riscos
ambientais decorrentes dessa modalidade de organização do capital.
Pode-se constatar que o Programa Bolsa-Floresta tem contribuído para modificar
a lógica das estruturas de produção rural no Uatumã, muitas vezes passando por cima das
especificidades culturais e da legitimidade de escolhas tradicionais geralmente ligadas a
terra e ao rio. Contudo, no plano político o que realmente está em jogo é a titularidade, ou
seja, trata-se do pagamento ou não do que a floresta produz. Assim, ninguém está pagando
nada, ou muito menos dando solidariamente fragmentos de serviços sociais, que são
direitos garantidos constitucionalmente às populações da Amazônia junto ao Estado. Mas,
está em jogo um potencial atividade econômica, os serviços ambientais. Neste sentido a
inclusão das mudanças climáticas ganharam tamanha força enquanto estadualização do
138
tema expresso na ampliação das UCs no Amazonas, e a criação das condições jurídicas
atendem aos interesses individuais com o propósito de obtenção de lucros futuros, em um
campo de poder extremamente desigual, uma das exigências da disseminação de uma
política de desregulamentação capaz de subtrair quaisquer barreiras aos movimentos dos
grandes grupos do capital privado (CHESNAIS, 1991).
Observamos que a apropriação ambientalista das pessoas que vivem na RDS
Uatumã e que dependem do ambiente para produzir e reproduzir seu modo de vida tende a
apagar a situação de exploração econômica e dominação política que estes grupos sofreram
durante as últimas duas décadas para concebê-los como potenciais parceiros nos novos
projetos de desenvolvimento sustentável, sendo o Programa Bolsa-Floresta a perfeita
expressão deste modelo. A partir disso, fica claro que não podemos perder de vista,
portanto, que os moradores da RDS Uatumã são também fruto de processos históricos,
governamentais de exploração da Amazônia, sendo relegados à margem das economias
nacionais e internacionais.
As abordagens críticas respeito do processo de implantação dos componentes do
Programa Bolsa-Floresta trazem à luz do conceito de políticas públicas, profundas
ausências e ineficiências das ações do poder governamental local. Outro aspecto que pode
ser relacionado as transformações que se processam no Estado do Amazonas corresponde a
legitimidade do setor privado expresso na cadeia de sustentação e manutenção da FAS,
fato que diretamente implica uma série de determinantes sociais que envolvem os efeitos
do Programa Bolsa-Floresta na RDS Uatumã, assim sendo possível identificar uma espécie
de rede de diferentes agentes que lutam e configuram um campo ambiental, onde a
formulação e execução de Programas sociais, como o Programa Bolsa-Floresta tem feito
prevalecer os interesses econômicos sobre as metas sociais diante das demandas sociais
que vivem na UC do Uatumã.
O debate ainda a ser devidamente desenvolvido sobre o direito de uso da floresta
enquanto um bem de uso comum e essencial à qualidade de vida, principalmente daquelas
que dependem diretamente para sua produção e reprodução social e cultural. Assim, do
ponto de vista sociológico apontamos a fragilidade da legitimidade das chamadas parcerias
que emergem nas questões ambientais na Amazônia e particularmente no estado do
Amazonas, assim instituir verticalmente regras de acesso e utilização dos recursos naturais
para aqueles que historicamente estiveram invisíveis para as políticas públicas dos planos
de desenvolvimento econômico no Estado do Amazonas
139
Outro aspecto aparece na forma da inclusão dos debates das mudanças climáticas
globais e aqueles que começam a alcançar as dimensões locais, onde as estratégias
consistem na ampliação das Unidades de Conservação no estado do Amazonas, levando as ao status de principal instrumento de conservação das florestas pelos organismos
nacionais e internacionais. Contudo este processo ainda encontra-se preso na camisa de
força de suas diretrizes ideológicas que orientam e reorientam o controle da fiscalização,
partindo da perspectiva da “naturalização” da sociedade local das UCs e assim se limita à
implantação de técnicas produtivas adequadas aos objetivos da conservação. Com isso, os
problemas decorrentes das práticas de uso dos recursos naturais da população local sobre a
conservação foram reduzidos aos efeitos negativos das primeiras sobre a segunda.
A face do Programa Bolsa-Floresta mais evidente em todo este panorama na RDS
Uatumã mostrou-se centrado na obtenção do valor direcionado a famílias que antes de
assumirem qualquer identidade de cunho “ecoverde” nas imagens veinculadas na rede de
mídia global, que, aliás, tem sido o principal mecanismo do ponto de vista institucional, o
carro chefe da política ambiental no estado do Amazonas.
Todos os processos engenhosamente planejados pelos tomadores de decisão que
emergiram no estado do Amazonas a partir do ano de 2003 e que postularam o PBF
tiveram dentre outros objetivos criar as condições políticas do Programa Zona Franca
Verde, que por sua vez fortaleceu e ampliou o sistema estadual de unidades de conservação
absorveu as linguagens da pauta mudanças climáticas . Consideramos que existe uma
espécie de zona obscura e pouco clara em torno das questões ambientais do Estado do
Amazonas, principalmente com a inclusão das mudanças climáticas e os recursos
disponíveis para o enfrentamento do mesmo que lança mão de um grande aparato
publicitário que e do forte “marketing verde” ancorado na imagem dos chamados
guardiões das florestas e da visão emblemática dos defensores da Amazônia.
Também constata-se que o ideário de desenvolvimento sustentável da política
ambiental do Estado do Amazonas permanece no estágio dos limites discursivos, pois até
agora não se traduzem nas ações praticas, resguardando a lógica de intervenções
governamentais pretéritas que ainda se mantém estruturalmente viciadas em atender aos
interesses individuais locais em detrimento do acesso aos direitos coletivos.
A chamada parceria entre FAS e as comunidades da RDS Uatumã tão divulgada
nos sites e informes publicitários preconizam uma unidade entre o social e o natural, mas
na realidade concreta apresentam profundas dicotomias, a principal delas, parte do
princípio que os aspectos sociais são pensados como a parte do natural no processo de
140
gestão do PBF, aliás, fato presente nas ações de projetos das instituições que atuam nas
UCs no Amazonas.
Outro fato importante para o entendimento do debate em torno dos serviços
ambientais tem sido a constatação de experiências onde o Estado falhou em reconhecer os
direitos coletivos dos povos indígenas e comunidades tradicionais, demonstrando que os
mecanismos de mercado são incapazes de assumir a responsabilidade sobre a vida no
planeta.
Pode-se dizer que por vezes a organização comunitária de algumas comunidades
da RDS Uatumã assume a identidade ambiental frente as fontes de acesso e de promoção
dos serviços básicos, historicamente negligenciados pelo poder governamental estadual e
nacional nas ausências ou ineficiências das políticas sociais no Estado do Amazonas.
É possível afirmar que as diretrizes ideológicas da Fundação Amazonas
Sustentável-FAS acomoda em seus alicerces a dicotomia do espaço público-privado
tomando lugar ou assumindo a natureza decisória do Estado que verticaliza as tomadas
decisórias, pensando as políticas publicas de maneira generalista ignorando a historiografia
e as especificidades culturais de cada comunidade envolvida no Programa Bolsa-Floresta
na RDS Uatumã.
Emergem instituições que se auto intitulam uma espécie de Hobin Hood verde da
modernidade, que tira dos ricos para dar aos pobres, pelo menos é como o discurso oficial
através do marketing verde apresenta o Programa Bolsa-Floresta. Contudo, esta
representação fictícia da realidade, está o entendimento de enfrentamento das mudanças
climáticas, existe uma transferência do ônus das degradações para os países e classes
sociais mais vulneráveis, subordinadas ao poder de controle dos recursos naturais pelos
donos do poder local, resultando em uma distribuição desigual dos impactos e riscos
decorrentes das atividades produtivas (CHESNAIS e SERFATI, 2003).
Diante da perspectiva de situar o PBF no cenário das políticas sociais, entendemos
que na articulação entre as políticas sociais e a política econômica, esta última vem sendo
privilegiada, no caso do PBF deixa de ser uma ação exclusiva do Estado. Este
empresariamento ou privatização das políticas sociais responde a importantes
determinações político-ideológicas. Contudo, não se configura em uma desobrigação do
Estado pela questão social, mas uma ação do Estado capitalista neoliberal de reprodução
ampliada do capital que contribui para hierarquização e a desigualdade na prestação de
serviços, mas principalmente, reforça a ideologia do individualismo como valor moral
radical.
141
Foi possível perceber que os componentes do Programa Bolsa-Floresta ainda
estão distantes da concepção de política pública, pois já nasceram comprometidas em sua
base, pois o trato da coisa pública, ou seja, compromisso do Estado que são contrários aos
interesses particulares orientados pela lógica da dinâmica capitalista. Apesar de que o
Programa Bolsa-Floresta mostrou-se na observação in lócus em contraste com as imagens
bastante veinculadas a mídia, e apesar de ter iniciado o seu estabelecimento há mais de três
anos, apresenta-se ainda em fase de implantação e funcionando em algumas comunidades
de maneira incompleta.
Se tomarmos o componente Bolsa-Floresta Associação, por exemplo, este
visivelmente ampliou o poder do cargo de liderança representativa da AACBU, porém
ainda não tem sido capaz de promover a participação direta dos moradores da RDS
Uatumã, ou mesmo de projetar a organização social de acordo com suas especificidades
culturais, sendo preciso identificar que algumas comunidades se organizam em torno da
produção rural e nem sempre organizam-se em torno de questões ambientais. Com isso
necessitam estabelecer negociações para uma definição mais maleável de acordo a cada
caso a implementação do Programa Bolsa-Floresta.
Torna-se importante destacar a existência de um certo grau de associativismo nas
comunidades Livramento, Jacarequara e Maracanarã, mas não necessariamente leva ao
estabelecimento de relações de reciprocidade e confiança com o órgão gestor do Programa
Bolsa-Floresta e as demais instituições governamentais e não governamentais que se
articulam na RDS Uatumã. Também foi possível notar o distanciamento de algumas
comunidades em relação a interlocução com dirigentes da AACBU, em razão a problemas
de natureza pessoal e familiar, envolvendo a disputa entre famílias pelo poder de dirigir a
Associação.
Assim, o que seria um ponto de chegada em nosso estudo torna-se, na verdade,
apenas um ponto de partida para novos estudos, que embora exista um grande número de
entidades organizadas não significa uma sociedade articulada ou que a colaboração faça
parte das atividades empreendidas. Dessa forma, os resultados da pesquisa empírica
desmentem que o engajamento em associações gere virtudes cívicas, mas mostram que não
necessariamente virtudes como cooperação, reciprocidade e confiança são construídas pelo
simples fato de se criar organizações. Ademais, os resultados empíricos obtidos vãos na
contramão do que diz Putnam, quando este destaca que uma das formas de se gerar
relações recíprocas baseadas na confiança seria através de sistemas de participação cívica,
este último representado pelas associações voluntárias.
142
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ABRAMOVAY, R. Funções e medidas da ruralidade no desenvolvimento
contemporâneo. Rio de Janeiro: IPEA. Texto para discussão n.702, 2000.
ACSELRAD, H. As Práticas Espaciais e o Campo dos Conflitos Ambientais. In:
ACSELRAD, H. (org.) Conflitos Ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará,
2004.
ALBAGLI, Sarita. Convenção sobre diversidade biológica: uma visão a partir do Brasil.
In: BECKER, Bertha. GARAY, Irene (orgs.). Dimensões Humanas da Biodiversidade.
Petrópolis: Vozes, 2006.
ALEXANDRE, A. F. Ambientalismo político, seletivo e diferencial no Brasil. 2003.
Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina. Disponível em:
<hhptt/www.cfh.ufsc.br/~dich> Acesso em: 20de março de 2009.
___________A. F. e KISCHKE, P. J. Aspectos das Políticas de institucionalização das
políticas de Sustentabilidade no Brasil. Revista Internacional Interdisciplinar Interthesis,
Vol.3, Nº 2, Florianopolis, 2006.
ALLEGRETTI, M. H. Reservas extrativistas: parâmetros para uma política de
desenvolvimento sustentável na Amazônia. In: ANDERSON, A. (et al.). O destino da
floresta: reservas extrativistas e desenvolvimento sustentável na Amazônia. Rio de Janeiro:
Relume-Dumará, 1994. p. 17-47
ALMEIDA, Alfredo Wagner B de. “Localismo Universalização e Localismo:
Movimentos Ssociais e a Crise dos padroes tradicionais de relação política na
Amazonia”. CESE Debate nº 3. Ano 4. 2007. p. 21-41.
143
ALIER, Martínez, Joan. O Ecologismo dos pobres: conflitos ambientais e linguagens de
valoração. São Paulo: Contexto, 2007.
ALTAFIN e OLIVEIRA. Uma Política de Pagamento de Serviços Ambientais no
Brasil. In; XLVI Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia Rural Brasília, 2008.
AMAZONAS. Lei Estadual Nº 3.135 de 05/06/2007. Institui a Lei de mudanças
Climáticas do Estado do Amazonas. Diário Oficial do Estado do Amazonas de 05 de dez.
2007. Disponível em: <http://www.segov.am.gov.br/programas> Acesso em:19de
novembro de 2008.
__________. Seminário “mercado de Oportunidades para o Conhecimento das
Unidades de Conservação Estaduais do Amazonas”. Manaus: SDS\CPMA. 2008.
_________ . Coletânia: Leis, Decretos e Portarias vinculados ao Sistema Estadual de
Unidades de Conservação do Amazonas. 2003.
ALIER, Martínez, Joan. O Ecologismo dos Pobres: Conflitos Ambientais e Linguagens
de Valoração. São Paulo, Contexto, 2007.
ANDREWS, Christina W. Implicações teóricas do novo institucionalismo: uma
abordagem habermasiana. Dados, v. 48, n. 2, abr./june 2005. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=s0011>. Acessado em: 05 de junho de 2010.
ARAÚJO, Marcos Antônio Reis. Unidades de conservação no Brasil: da república à
gestão de classe mundial. Belo Horizonte: SEGRAC, 2007.
ARRUDA, Rinaldo. Populações tradicionais e a proteção dos recursos naturais em
unidades de conservação. Revista Ambiente e Sociedade, ano 2, n. 5, 1999.
AUDIBERT, Eduardo Antonio. Preservar com ou sem presença humana? a
problemática ambiental no contexto de áreas protegidas, 2004. Tese (Doutorado)Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS).
AUGUSTO, Maria Helena Oliva. Políticas públicas, políticas sociais e política de saúde:
algumas questões para reflexão e debate. Tempo Social, Revista de Sociologia da USP,
São Paulo, v. 1, n. 2, 1989.
BARBIERI, José Carlos. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e
instrumentos. São Paulo: Saraiva, 2004.
BARRETO FILHO, H. T. Da Nação ao planeta através da natureza. In: Serie
Antropologia, n. 222. Brasília: UnB, 1997.
BECKER, Bertha K. Amazônia: nova geografia, nova política regional e nova escala de
ação. Rio de Janeiro: Garamond, 2005.
BECKER, Bertha K. Novas territorialidades na Amazônia: desafios às políticas
públicas. Rio de Janeiro: UFRJ, 2010.
_____________ . Serviços ambientais e possibilidades de inserção da Amazônia no
século XXI. Revista T&C Amazônia, Manaus, ano 6, n. 14, jun. 2008.
144
________Bertha K. NOBRE A.C. et. all.
uma via para a Amazônia
Jornalonline,FolhadeS.Paulo.disponívelem.http>notíciaisdaamazonia.com.br/2059.Acessad
o em 05/03/2010.
_________Amazônia. Geopolítica na Virada do III Milênio. 2º edição Garamond.
2006.
BENTES, R. M. A Zona Franca e o Processo Migratório para Manaus. 1993.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Pará, Belém.
BORGES, Sérgio Henrique. et al. Uma análise geopolítica do atual sistema de unidades
de conservação na Amazônia Brasileira. Revista Política Ambiental, Belo Horizonte,
n.4, ago. 2007.
BORINELLI, Benilson. Instituições e política ambiental: notas teóricas e metodológicas.
IEncontroAnnpas.Disponívelem:<http://www.anppas.org.br/encontro_anual/gt/teoria_mei
o_ambiente/BenilsonBornelli.pdf,2002> Acesso em: 18 de novembro de 2009.
BOSCHETTI, Ivanete (Org.). Política social no capitalismo: tendências contemporâneas.
São Paulo: Cortez, 2008.
BOURDIEU, Pierre O capital social: notas provisórias. In: Nogueira, M. A. e CATANI,
A. (orgs.) Pierre Bourdieu: escritos de educação. Petrópolis,(RJ): Vozes, 1998.
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. 10 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil:
Promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2004.
BRASIL, Decreto nº 6.263 de 21 de novembro de 2007. Plano Nacional de Mudança do
Clima. Brasília: Diário Oficial, 2007.
BRASIL. Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, que instituiu o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação. Brasília: Diário Oficial, 2000.
BRASIL. Projeto de Lei n. 792/ 2007. Define serviços ambientais e prevê a transferência
de recursos, monetários ou não, aos que ajudam a produzir e conservar estes serviços.
Câmara
dos
Deputados.
Disponível
em:
//http:www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id> Acesso em: 30 de agosto de 2008.
CASTRO, E.; PINTON, Florence. Território, biodiversidade e saberes de populações
tradicionais. In: Castro, E.; PINTON, Florence. Faces do Trópico Úmido. Belém: CEJUP.
1998.
CHESNAIS, François; SERFATI, Claude. “Ecologia” e condições físicas da reprodução
social: alguns fios condutores marxistas. Revista Crítica Marxista, nº16, 2003.
_________________. Mundialização do Capital.
Liberalismo, São Paulo, UNESP, 1991.
A Hora do Mercado: Crítica do
145
CRUZ, P. R. Governança e gestão de redes na esfera pública municipal: o caso da rede
de proteção à criança e ao adolescente em situação de risco para a violência em Curitiba.
2006. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba,
2006.
CUNHA, S. B. GUERRA, A. J. (Org.). A Questão Ambiental: diferentes abordagens.
2ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. p. 43-79.
DIEGUES, A. C. (Org.) Etnoconservação: novos rumos para a proteção da natureza nos
trópicos. São Paulo: Hucitec, 2000.
DIEGUES, A. C. O Mito moderno da natureza intocada. São Paulo: Hucitec, 2001.
DUPAS, Gilberto. Tensões contemporâneas entre o público e o privado . São Paulo:
Paz e Terra, 2003.
FEARNSIDE, Philip M. Desmatamento na Amazônia: dinâmica, impactos e controle.
Revista Acta Amazônica, Manaus: INPA, 2002, Disponível em: <http: www.scielo.br>
Acesso em: 26 de outubro de 2009.
FEARNSIDE, M. Philip. Serviços Ambientais como base para o uso sustentável de
florestas tropicais na Amazônia Brasileira. Manaus: INPA, 2006.
FERREIRA, Leila da Costa. A Questão ambiental: sustentabilidade e políticas públicas
no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 1998.
FIORI, José Luís. Os Moedeiros Falsos: neoliberalismo e políticas públicas. Petrópolis:
Vozes, 1997.
FOLADORI. Guillermo. Limites do desenvolvimento sustentável. São Paulo: Unicamp,
2001.
FONSECA, I. F. e BURSZTYN, M. Mercadores de Moralidade, A retórica
ambientalista e prática do Desenvolvimento Sustentável. Revista Ambiente e Sociedade
Vol.10, Nº2 Universidade de Brasília. 2007.
FRANCO, José Luiz de Andrade A Primeira conferência brasileira de proteção à
natureza e a questão da identidade nacional. Revista Varia História, Belo Horizonte, v.
26, 2002.
FREITAS, Marcilio de. Fragmentos de utopias do século XXI: projeções e controvérsias.
In: FREITAS, Marcilio (org). A ilusão da Sustentabilidade. Manaus: EDUA, 2003
_____. Amazônia e desenvolvimento sustentável: um diálogo que todos os brasileiros
deveriam conhecer. Petrópolis (RJ): Vozes, 2004.
FUNDAÇÃO AMAZONAS SUSTENTÁVEL. Relatório de Gestão. Manaus: FAS, 2010.
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e
Científicos, 1989.
146
GIDDENS, Anthony. As Consequências da modernidade. São Paulo: UNESP, 1991.
GUIMARÃES, Mauro. Sustentabilidade e Educação Ambiental. In: CUNHA, S. B.;
GUERRA, A. J. (orgs.). A Questão ambiental: diferentes abordagens. 2. ed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2005.
HABERMAS, Jürgen. Técnica e ciência como ideologia. Lisboa: Edições 70, 1987.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz Tadeu
da Silva e Guacira Lopes Louro. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.
IRVING, Martha de Azevedo (org.) Áreas Protegidas e Inclusão Social: Construindo
Novos Significados. Rio de Janeiro: Aquarios, 2006.
INSTITUTO CHICO MENDES DE PROTEÇÃO DA BIODIVERSIDADE. Quadro
Geral das Unidades de Conservação. Disponível em: <http://www.icmbio.gov.br>
Acesso em: 28 de agosto de 2009.
INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO AMAZONAS. Plano de
Gestão da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uatumã. Manaus: IDESAM, 2008.
KRISCHKE, Paulo José.; ALEXANDRE Agripa Faria. Aspectos da institucionalização
das políticas de sustentabilidade no Brasil. INTERTHESES. Revista Internacional
Interdisciplinar de Florianópolis, v.3, 2006.
LEFF, Enrique. Ecologia, capital e cultura: racionalidade ambiental, democracia
participativa e desenvolvimento sustentável. Blumenau: Furb, 2000.
LEFF, Enrique. Epistemologia ambiental. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
LIMA, Debora. De M. Ciência, Saberes e Populações tradicionais na Amazônia. In:
NORONHA, Nelson e ATHIAS, Renato: Indivíduos, Coletividades e Etnias. Recife.
UFPE. 2008.
LITTLE, P. E. Territórios sociais e povos tradcionais no Brasil: por uma antropologia
da territorialidade. Brasília: UnB, 2002.
MACEDO, José Alberto C. Avaliação da gestão participativa dos parques estaduais da
Bahia. 2008. Dissertação (Mestrado) - Universidade de Brasília.
MARX, Karl. O Capital: crítica a economia política. Livro 1, v.1. 11. ed. São Paulo:
Difel, 1987.
MARX, Karl. Capítulo VI: inédito de o capital. Trad. Klaus Von Puchen. 2. ed. São
Paulo: Centauro, 2004.
MEDEIROS, Rodrigo et al. Áreas Protegidas no Brasil: Interpretando o contexto
histórico para Pensar a Inclusão Social. In: Irving, Martha de Azevedo (org.) Áreas
Protegidas e Inclusão Social: Construindo Novos Significados. Rio de Janeiro: Aquarios,
2006, p. 15-40.
147
MILANI, C.; SOLINES, G. Democracia e governança mundial: que regulações para o
século XXI? Porto Alegre: UFGS, 2002.
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Unidades de conservação do Brasil. Brasília:
Secretaria de Biodiversidades e Florestas, 2007.
_______________________________.
Dialogos de Política social e Ambiental.
Conselheros de Meio Ambiente no Brasil. Brasília Disponível em
<HTTP.www.ma.gov.br> acesso em 7 de novembro 2005.
MOURA. L. A. Qualidade e Gestão Ambiental. Editora Juarez. São Paulo.2002
MUNIZ, L. M. Ecologia Política: o campo de estudo dos conflitos sócio-ambientais.
Revista Pós Ciênciais Sociais.UFMA.Vol.6 São Luis –MA. 2010.
NASCIMENTO, Isaura Rodrigues, A Estadualização das políticas públicas no
Amazonas. 2000. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Amazonas, Manaus.
NODA, Sandra do N. et al. Utilização e Apropriação das Terras por Agricultura Familiar
amazonense de Varzeas. In: DIEGUES, Antonio Carlos.; MOREIRA, André de C. Espaços e
Recursos Naturais de Uso Comum. São Paulo: NUPAUB/USP, 2001.
O´CONNOR, J. La producción política de las condiciones de producción. Ecologia
Política, vol.16. 1998.
_________ Es Posible El capitalismo sostenible? En publicacion Ecolog?a Pol?tica.
Naturaleza, socyedade y utopia.Universidad California, 2002.
OLIVEIRA, Francisco de e RIZEK, Cibele (org.). A era da indeterminação. São Paulo:
Boitempo Editorial. 2007.
OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O trabalho do antropólogo. São Paulo: Unesp, 2000.
OSTROM, Elinor. Governing the commons: the evolution of Institutions for Collective
Action. New York: Cambridge University Pres, 1997.
PÁDUA, Maria Tereza Jorge. Unidades de conservação: muito mais do que atos de
criação e planos de manejo. In: MILANO, Serediuk.(org.). Unidades de Conservação:
Atualidades e tendências. Curitiba: Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, 2002.
PEREIRA, Henrique dos Santos. Ações governamentais federais para proteção da
floresta Amazônica. Manaus: Consulado Geral do Japão em Manaus/INPA, 2009. 22
slides, color.
POULANTZAS, Nicos. Poder político e classes sociais. São Paulo: Martins Fontes, 1986.
PUTNAM, Robert D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. 5. ed.
reimp. Rio de Janeiro: FGV, 2007.
148
_____. E Pluribus Unum: diversity and community in the twenty-first century the 2006
Johan Skytte Prize Lecture.Scandinavian Political Studies, New York, v.30, n. 2, 2006.
RICKETTS, T. "Indigenous Lands, Protected Areas, and Slowing Climate Change".
Disponível em português em http://www.ipam.org.br/noticias. Acessado em 20/06/2010.
RIBEIRO, Wagner Costa. A Ordem ambiental internacional. 2.ed. São Paulo: Contexto,
2005.
_____. Políticas públicas ambientais no Brasil: mitigação das mudanças climáticas.
Scripta Nova, Revista Eletronica de Geografia y Ciencias Sociales, Barcelona, v.12, n.270,
2008.
_____. Mudanças climáticas: realismo e multilateralismo. Terra Livre, São Paulo, v. 18,
n. 1, 2002.
RUA, Maria das Graças. Análise de políticas públicas: conceitos básicos. In: RUA, Maria
das Graças; CARVALHO, Maria I. V. (orgs) O Estudo da política, tópicos selecionados.
Brasília: Paralelo 15, 1998.
SANTILLI, J. Socioambientalismo e novos direitos: proteção jurídica à diversidade
biológica e cultural. São Paulo: Editora Peirópolis, 2005.
_____.Agrobiodiversidade e o Direito dos agricultores. 2009. Tese (Doutorado)Universidade Católica do Paraná, Curitiba.
SEIFFERT, Mari E. B. Mercado de carbono e Protocolo de Quioto: oportunidade de
negócios na busca da sustentabilidade. São Paulo: Atlas, 2009.
SILVA, Marilene Corrêa da. Metamorfoses da Amazônia. Manaus: EDUA, 2000
______ . o Paíz do Amazonas. Manaus. Valer, 2004.
SINGER, Paul. Economia política da urbanização. 14. ed. São Paulo: Contexto, 1998.
Sistema de Información de Los Recursos Forestales de Costa Rica. Disponível
em:<http://pndf.sirefor.go.cr/pndf.html>. Acesso em: 14 de outubro de 2009.
SOLOMON, S. et al. Climate change 2007: the physical science basis. fourth assessment
report of the Intergovernmental Panel on Climate Change Working Group I. Cambridge
Cambridge University, 2007 Disponível em:<http://www.ipcc.ch/ipccreports/ar4wg1.htm.> Acesso em: 22 de junho de 2010.
SOUZA, Márcio. O Embate contra Chico Mendes. 2. ed. São Paulo: Marco Zero, 1990.
TESSMANN, Erotides K. Sociedade civil e (re)construção do espaço público: gestão
democrática ambiental para reflexão na esfera pública. Revista Compendi, São Paulo, v. 5,
2005.
Tönnies, F. (1947). Comunidad y sociedad. Buenos Aires, Argentina: Losada. (Original
publicado em 1887).
149
WEBER, Max. Conceitos Básicos de Sociologia. Editora. Morales. São Paulo, 1987.
WUNDER, Sven (Coord.). Pagamentos por serviços ambientais: perspectivas para a
Amazônia legal. Série estudos 10, Brasília, MMA, 2008. Disponível em:<http://
www.gov.br/sitio/índex.php?
ido=publicação.publicaçõesPORSecretaria&idEstrutura=171&tipo=2>. Acesso em: 25 de
setembro de 2009.
ZOURI, Andréa. Revista Ambiente & Sustentabilidade nº 2. Vol. 7. Campinas. Associação
Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade (Anppas), 2004.
ANEXO 01- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
CONSENTIMENTO PÓS-INFORMAÇÃO
Acredito ter sido suficientemente informado e esclarecido sobre o estudo que será
realizado. Voluntariamente e livremente concordo em participar desta pesquisa.
_________________________
Nome do participante
_________________________
Assinatura do participante
Declaro que obtive de forma apropriada e voluntária o Consentimento Livre e
Esclarecido deste aluno para a sua participação neste estudo.
_________________________
Assinatura do pesquisador
150
(Documento em duas vias)
151
152
Download

o programa bolsa - floresta: a recompensa - PPG