16/04/2013 O que há por detrás da 'santíssima trindade' corporativa Por Andrea Licht | De São Paulo "Sonho Grande", livro da jornalista Cristiane Correa, é um manual de negócios. Mapeia a estratégia de gestão aplicada pelo trio de míticos empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira há mais de quatro décadas em negócios tão diversos como o Banco Garantia, uma lenda no mercado financeiro, e a cervejaria AB Inbev, surgida da fusão entre a belga Interbrew e a brasileira Ambev. Cristiane Correa, autora de livro sobre Lemann, Telles e Sicupira No entanto, não há apenas negócios no império construído por Lemann, Telles e Sicupira. Há simplicidade, sangue-frio, tropeços e genialidade. Boa parte do livro (a melhor) é construída a partir das versões e depoimentos de quase cem entrevistados, entre as quais o megainvestidor - e sócio - Warren Buffett. O trio não deu entrevistas. São bastidores de negócios bilionários protagonizados por homens experimentados no mundo, mas que também hesitam, intuem e erram. Uma viagem de Lemann pelo deserto de Gobi, no norte da China, em maio de 2008, marca o início do livro. Acompanhado de Susanna, sua mulher, e dos amigos Ruth e Fernando Henrique Cardoso, o empresário ouvia o celular tocar insistentemente. A situação era urgente: havia meses ele e seus sócios Telles e Sicupira, controladores e membros do conselho de administração da cervejaria InBev, planejavam em absoluto sigilo a compra da americana Anheuser-Busch, dona da marca Budweiser. O motivo da ligação era avisar Lemann que o segredo havia vazado em um blog do "Financial Times". O passeio pelo deserto continuou. Lemann só evitou responder ao e-mail de Busch IV, herdeiro da cervejaria americana, que pedia explicações após ler a notícia na internet de que a empresa fundada por sua família estava à venda. Não sabia o que dizer? O silêncio era sua estratégia? Tinha medo de azedar a negociação? Difícil saber. Depois de seis meses da notícia no "Financial Times" e de muitas reuniões envolvendo mais de 500 pessoas entre acionistas, advogados e banqueiros, a operação foi concluída. Os negócios feitos pelo trio são grandiosos, como a compra por US$ 28 bilhões da fabricante de catchup Heinz, anunciada em fevereiro e considerada a maior transação da história no setor de alimentos. Mas são feitos sem alarde. Há mais de três anos o 3G Capital - fundo de private equity do trio - acompanha os resultados da companhia. Em dezembro, Alexandre Behring, sócio do 3G, sugeriu a Lemann que a firma adquirisse o controle da empresa americana. Lemann gostou da ideia. O assunto prosperou nos dias que se sucederam em um encontro do empresário com o megainvestidor e amigo Warren Buffett. Tornariam-se sócios. A cada tacada, a impressão que fica é a de que os negócios fluem facilmente. Os sucessos mais recentes nas áreas de alimentos e bebidas não escondem um dos maiores erros do passado. A venda do Banco Garantia, a semente que deu origem à cultura e à sociedade. Em 1998 ele foi comprado pelo Credit Suisse First Boston, na avaliação da autora não em virtude, principalmente, da crise econômica internacional, mas "porque seus sócios se afastaram do negócio e a nova geração estava mais interessada em engordar seu patrimônio pessoal do que em perpetuar a instituição". Talvez pela ética protestante, baseada na frugalidade, que forjou o garoto carioca filho de pai suíço, talvez por opção, a simplicidade é uma tônica na história de Lemann - e também de Telles e Sicupira. E como diz o consultor Jim Collins, que assina o prefácio do livro, os três sempre usaram a riqueza para simplificar a vida. E a estratégia da simplicidade foi também para os negócios: tenha gente boa, dê a esse pessoal coisas grandes para fazer e sustente uma cultura meritocrática. O trio não está satisfeito em ter a maior cervejaria do mundo, uma das maiores varejistas do Brasil, uma rede de fast-food com presença no mundo inteiro e uma secular fabricante de molhos. As empresas controladas por eles valem, juntas, US$ 160 bilhões. Mas Lemann, Telles e Sicupira continuam à caça de oportunidades para avançar. Além disso, existe uma preocupação - e o treinamento - para que os herdeiros estejam preparados para assumir seu papel. As mulheres dos três têm aulas de contabilidade e os filhos mais jovens têm lições de como lidar com dinheiro com a ajuda de um economista. O sonho grande, como diz o título do livro, é valor maior para esses homens. E o dinheiro acumulado, uma consequência. "Sonho Grande - Como Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira Revolucionaram o Capitalismo Brasileiro e Conquistaram o Mundo" De Cristiane Correa. Editora Sextante, 246 págs., R$ 39,90 Leia mais em: http://www.valor.com.br/cultura/3087462/o-que-ha-por-detras-da-santissima-trindadecorporativa#ixzz2TJpBxO00