O ENSINO QUE ATRAVESSA FRONTEIRAS Gabriela Mavignier Dácio1, Márcia Jaqueline Mendonça Maciel1 1 Centro de Mídias de Educação do Amazonas - Secretaria de Estado de Educação 69076-830 – Manaus – AM – Brasil [email protected], [email protected] Abstract. This article presents the experience of teaching in the elementary school project Mediated Technology, developed and implemented by the State Department of Education of the State of Amazonas, through the Media Center, in partnership with the Roberto Marinho Foundation. This design allows the transmission of lessons with interactivity between teachers and students in real time. It presents the methodology is carried out in the preparation and production of classes until the transmission of the classes. Currently classes of elementary school are transmitted to approximately 40,000 students in 1,700 classrooms distributed throughout the interior of Amazonas. Resumo. Este artigo apresenta a experiência de lecionar no projeto de Ensino Fundamental Mediado por Tecnologia, elaborado e implementado pela Secretaria Estadual de Educação do Estado do Amazonas, através do Centro de Mídias, em parceria com a Fundação Roberto Marinho. Este projeto permite a transmissão de aulas, com interatividade entre professores e alunos, em tempo real. Apresenta-se a metodologia realizada no âmbito de elaboração e produção de aulas, até a transmissão das aulas. Atualmente as aulas de ensino fundamental são transmitidas para cerca de 40.000 alunos em 1.700 salas de aula distribuídas por todo o interior do Amazonas. Introdução No campo educacional evidenciam-se sérios descompassos entre o avanço científico, tecnológico e produtivo no mundo contemporâneo e a qualidade do processo de escolarização. Assim, programas são criados e desenvolvidos com o objetivo de utilizar o potencial tecnológico, como recursos para promover o ensino e ferramentas que contribuam como poderoso instrumento de melhoria da educação quando usadas como facilitadoras de processos de aprendizagem e mediação do conhecimento. Precisamos urgentemente desenvolver novas formas de linguagem e, sobretudo, práticas críticas alternativas que permitam desvelar o currículo oculto da Organização e descobrir outras maneiras de ver o mundo, as escolas e sua organização. (IMBERNÓN, 2000, p. 101) Almeida (2010) afirma que com o uso da tecnologia de informação e comunicação, professores e alunos têm a possibilidade de utilizar a escrita para descrever/reescrever suas ideias, comunicar-se, trocar experiências e produzir histórias. Assim, em busca de resolver problemas do contexto, representam e divulgam o próprio pensamento, trocam informações e constroem conhecimento, num movimento de fazer, refletir e refazer, que favorece o desenvolvimento pessoal, profissional. O Estado do Amazonas, dentro de seus 1.570.745,680 km² abrange áreas de difícil acesso, levando muitas vezes dias para chegar a algumas comunidades. Assim, oferecer um ensino de qualidade se torna um grande desafio, tanto pela logística, quanto pela falta de profissionais qualificados, dentre outros fatores. Para que crianças possam ter acesso ao ensino fundamental elas precisam se deslocar quilômetros da sua comunidade para o município mais próximo, onde exista alguma escola municipal, situação esta que pode ser desde longas caminhadas, a quilômetros de barco. Assim, alinhando o uso de tecnologias e a necessidade da oferta de um ensino de qualidade para todo e qualquer cidadão Amazonense, o Governo do Estado do Amazonas implantou em 2007, o Centro de Mídias de Educação do Amazonas (Cemeam), sendo este um projeto pioneiro no país, que a cada ano é ampliado e inovado. Atualmente são ministradas aulas para o ensino fundamental, ensino médio, e educação de jovens e adultos. O ensino fundamental conta, desde 2009, com a parceria da Fundação Roberto Marinho, desenvolvendo o Projeto Igarité, utilizando a metodologia Telecurso nas aulas. Diante de tal cenário, as pesquisadoras relataram a metodologia utilizada, observando a atuação da equipe do CEMEAM, do Projeto Igarité, e da produtora para que as aulas cheguem aos alunos com a melhor qualidade pedagógica e técnica. Professores Ministrantes O quadro de professores do Centro de Mídias é composto por efetivos da rede pública estadual, profissionais estes responsáveis por ministrar as aulas dentro dos estúdios, selecionados com exames de currículo e testes de vídeo. Ao início de cada ano letivo são realizados cursos de formação profissional, desde a abordagem técnica dos softwares e equipamentos utilizados, passando pela fundamentação pedagógica da metodologia, oficina de produção de aulas e apresentação em vídeo. O Centro de Mídias capacita seus professores, tanto os ministrantes, quanto os que são presenciais em cada sala de aula, com oficinas e cursos de atualização técnica e pedagógica, além de palestras por videoconferência. É essencial que todos os professores tenham domínio das tecnologias, tanto para saber manusear de forma eficaz os instrumentos existentes nos estúdios, quanto para envolver todos os alunos durante a transmissão das aulas. A eficácia do processo ensino-aprendizagem, bem como todo o processo educativo recai sobre o mediador do conhecimento, o professor, o qual a valorização precisa acontecer a partir desse ponto, pois são seus conhecimentos, suas habilidades e suas atitudes que vão contribuir para que o aluno seja motivado a aprendizagem. Daí é importante promover o desenvolvimento, também, do professor um olhar cuidadoso e humano na sua formação para que o processo educativo se torne significativo para todos. Em um mundo cada vez mais globalizado, utilizar as novas tecnologias de forma integrada ao projeto pedagógico é uma maneira de se aproximar da geração que está nos bancos escolares. (FERNANDES, 2010, p.12) Os conhecimentos sobre didática avançam, a necessidade de se manter atualizado com relação aos conteúdos é constante, a sociedade exige cada vez mais da escola, há um abismo entre a formação que o professor tem e a que ele realmente precisa. É necessário investir em capacitação para dar melhor condição ao educador para se desenvolver e desempenhar sua função com prazer. Os alunos estão prontos para a multimídia, os professores, em geral, não. Os professores sentem cada vez mais claro o descompasso no domínio das tecnologias e, em geral, tentam segurar o máximo que podem, fazendo pequenas concessões, sem mudar o essencial. Creio que muitos professores têm medo de revelar sua dificuldade diante do aluno. Por isso e pelo hábito mantêm uma estrutura repressiva, controladora, repetidora. Os professores percebem que precisam mudar, mas não sabem bem como fazê-lo e não estão preparados para experimentar com segurança. (MORAN, 2010) As mídias invadiram o cotidiano escolar. Assim, é preciso preparar-se. Para a utilização das mídias como ferramentas no processo de ensino e aprendizagem pelo professor, no sentido da inovação da prática pedagógica, é preciso uma mudança no perfil do professor, mas para que isso aconteça, é necessário que ele tenha conhecimento sobre as possibilidades do recurso tecnológico, a fim de poder utilizá-lo como instrumento de aprendizagem. Educar para a sociedade global, desenvolvida tecnologicamente possibilita a criação de novas formas de construção de conhecimentos nos ambientes escolares, promovendo assim melhorias significativas no padrão de qualidade da educação e modernização da gestão escolar. (MEDEIROS, 2010, p.3) Elaboração e Produção de Aulas As aulas são planejadas por professores de cada disciplina, que utilizam os mais diversos recursos, como vídeos, animações, áudio, gravações internas e externas, com visitas a museus, monumentos da cidade, ou o que mais seja necessário para a construção da aula. Todos os professores do ensino fundamental são acompanhados pela assessoria pedagógica do Centro de Mídias, e também pela equipe da Fundação Roberto Marinho, que acompanha a elaboração e produção de todas as aulas. O conteúdo de todas as disciplinas é ministrado em módulos e a carga horária é a mesma do fundamental regular, com 800 horas/aula anuais, conforme prevê a Lei 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). As disciplinas são divididas em quatro unidades, e cada unidade deve conter o número de aulas correspondente a carga horária da disciplina, assim como quatro avaliações e o Plano de Estudo, que serve como uma Recuperação Paralela. Toma-se como exemplo o componente de Ciências, que possuiu quatro unidades com 24 aulas totalizando 120 horas/aula. As aulas são ministradas no formato modular com uma disciplina por vez para cada ano do ensino fundamental. As aulas são elaboradas em formato de roteiro, elaborado pela Fundação Roberto Marinho, onde cada atividade proposta recebe um tempo específico de execução. No roteiro há os conteúdos a serem abordados no dia bem como as habilidades que se desejam alcançar no decorrer da aula. A aula se inicia com uma problematização, levando o aluno a desvendar um questionamento despertando a curiosidade sobre o assunto proposto, o objetivo é fazer com que alunos comecem a discutir o conteúdo a partir do que eles conhecem. Depois da problematização os alunos assistem ao vídeo da Teleaula da Fundação Roberto Marinho, que contém diversas informações sobre o assunto da aula do dia, depois do vídeo os alunos são instigados a realizarem atividades que os remetam a refletir sobre o que assistiram, após o cumprimento da atividade é feita uma interatividade com o professor ministrante. A interatividade é uma das formas de comunicação entre professores ministrantes que estão nos estúdios do Centro de Mídias, professores presenciais e alunos que estão nas comunidades. Nas salas de aulas nas comunidades alunos e professores podem ser vistos e ouvidos utilizando o kit tecnológico, assim os professores ministrantes acompanham as atividades que estão sendo feitas e como estão sendo feitas nas comunidades mais remotas. Outra forma de comunicação utilizada são os chats, onde os professores presenciais e ministrantes, bem como a assessoria pedagógica do Centro de Mídias, a assessoria pedagógica da Fundação Roberto Marinho e a produtora Jobast acompanham tudo o que está acontecendo na aula, dando suporte e tirando possíveis dúvidas que possam surgir. Os alunos ainda contam com livros textos que ajudam no seu desenvolvimento intelectual, pois estes contêm figuras ilustrativas, conteúdos explicativos e questões para serem resolvidas. O livro auxilia o aluno na leitura, na interpretação de textos, na reflexão do assunto abordado, na execução de atividades e na escrita. Os alunos são direcionados a uma atividade do livro texto e depois na interatividade há a resolução e resolução das possíveis dúvidas. Para que o conteúdo da aula do dia se torne mais dinâmico os alunos são levados a utilizar nas atividades complementares diversas linguagens de aprendizagem, como: música, teatro, desenho, escrita, entre outros. Essa atividade complementar é feita após o intervalo e acompanhada na interatividade pelos professores presenciais. Os roteiros finalizam com as atividades de prazer de casa, onde o aluno vai buscar mais conhecimento sobre o assunto proposto pelo professor ministrante. Os roteiros são feitos com um período de antecedência do início das aulas pelos professores ministrantes e enviados à assessoria pedagógica da Fundação Roberto Marinho e à assessoria pedagógica do Centro de Mídias. Essas aulas são analisadas e encaminhadas à produtora Jobast. A Jobast é uma empresa que confecciona o material audiovisual através de produtos educacionais apoiados em plataformas tecnológicas. A produtora Jobast transforma o conteúdo educativo dos roteiros em cartelas, ou slides, que serão transmitidos para as salas de aulas das comunidades. A Jobast também é responsável pela gravação de entrevistas com convidados da aula e gravações externas com os professores ministrantes. As avaliações são elaboradas com base nas aulas ministradas, e são realizadas com os alunos com o acompanhamento do professor presencial. No dia da avaliação ainda é feita uma revisão para que sejam esclarecidas as dúvidas dos alunos. Levando conhecimento As aulas do Centro de Mídias são ministradas através de teleconferência de estúdios televisivos e transmitidas diariamente por satélite. As comunidades que recebem as aulas contam com antenas que recebem o sinal. O sistema de IPTV (Internet por Televisão) transmite as aulas com interatividade de som e imagens. As aulas são transmitidas diariamente em tempo real pelos professores dos estúdios do Centro de Mídias e recebida nas comunidades pelos professores presenciais e alunos. Os professores presenciais são professores formados em uma graduação de licenciatura e são responsáveis pelo recebimento dos roteiros das aulas, recebimentos das cartelas, execução das avaliações e lançamento das notas e frequências dos alunos no SCA (sistema de controle acadêmico). Além disso, os professores presenciais são importantes na interatividade dos alunos com os professores ministrantes e na execução das diversas atividades propostas em sala de aula. As salas possuem o kit tecnológico, que inclui computador, impressora, webcam, microfone, telefone, impressora, nobreak e um televisor LCD de 42″, e ainda o acesso à Internet que faz parte da Plataforma Tecnológica. Além de todo esse aparato tecnológico há ainda uma rede social em que alunos e professores se comunicam e discutem sobre assuntos relacionados à educação, é o SEDUC.NET, que foi considerada a maior rede social do Brasil voltada para a educação. Índices de Aprovação, reprovação e abandono Sabe-se a necessidade de conhecer quantitativamente a aprovação, assim como a reprovação e o abandono dos alunos atendidos pelo Centro de Mídias. Tais índices são obtidos anualmente mediante análise das notas e freqüência dos alunos lançadas pelos professores presenciais no Sistema de Gestão Escolar do Amazonas. Diante dos gráficos, percebe-se que os índices de aprovação se mantêm em torno de 80% desde o ano de 2008, chegando a 90% no ano de 2011. O maior índice de reprovados foi no ano de 2008, com 14 %, sendo o menor em 2012, com 2%. O abandono teve a taxa mais alta no ano de 2012, alcançando 10%, sendo o menor índice no ano de 2008, com 2%. Os índices apresentam equilíbrio entre os anos, sendo que o alto abandono em 2012 pode ser atribuído a forte cheia que atingiu todo o Estado do Amazonas, forçando a paralisação das aulas por um mês, uma vez que os alunos não conseguiam chegar às salas de aula, com comunidades alagadas, forçando muitos as abandonarem os estudos. Ano 2008 90% Ano 2009 100% 84% 80% 90% 70% 80% 70% 60% 60% 50% 50% 40% 40% 30% 30% 20% 14% 10% 20% 2% 0% Abandono Ano 2011 100% 89% 90% 80% 80% 70% 70% 60% 60% 50% 50% 40% 40% 30% 30% 20% 10% 5% Aprovados Reprovados Abandono Ano 2010 90% 8% 10% 0% Aprovados Reprovados 100% 87% 8% 90% 20% 3% 0% 10% 5% 5% 0% Aprovados Reprovados Abandono Aprovados Reprovados Abandono Ano 2013 Ano 2012 100% 100% 88% 90% 90% 80% 80% 70% 70% 60% 60% 50% 50% 40% 40% 30% 30% 20% 10% 10% 2% 0% 88% 20% 10% 9% 3% 0% Aprovados Reprovados Abandono Aprovados Reprovados Abandono Conclusão Diante dos novos desafios que se põem à educação, o que inclui utilizar o grande potencial tecnológico a favor da melhoria do processo ensino-aprendizagem, soma-se a necessidade de transformar o cotidiano escolar, o trabalho pedagógico desenvolvido na escola, em redes de conhecimento que propiciem contínua renovação metodológica e que facilite o trabalho do professor e a construção do conhecimento destes em parceria com seus alunos. A dinamicidade própria do cotidiano escolar e o trabalho pedagógico requerem que o professor possua parceiros no desenvolvimento de sua docência. Seus pares, o gestor, o pedagogo, seus alunos, dentre outros, são constituintes de sua equipe de trabalho. O uso da tecnologia na educação caminha no sentido da produção compartilhada de conhecimento, favorecida pela resolução de problemas ou desenvolvimento de projetos, nos quais a escrita, por meio da tecnologia, induz à liberdade de expressar e comunicar sentimentos, registrar percepções, ideias, crenças e conceitos, refletir sobre o pensamento representado e reelaborá-lo. O Centro de Mídias de Educação do Amazonas proporciona a educação através de tecnologias que chegam até as comunidades mais longes da capital Manaus, por meio de aulas interativas e IPTV. As aulas proporcionam aos alunos a possibilidade de continuar no ensino regular e acompanhar o processo de ensino-aprendizagem, sem precisar se deslocar para tão longe de sua moradia. Os alunos são contemplados com uma educação de qualidade que prioriza a formação dos professores através de formações presenciais e mediadas por tecnologia regularmente. Referências Almeida, Maria Elizabeth Bianconcini de. Tecnologia na Escola. Disponível em <http://www.tvebrasil.com.br/salto/boletins2001/tec/tec0.htm>. Acesso em 20 de junho de 2010. Fernandes, Elisângela. A tecnologia precisa estar na sala de aula. . Revista Nova Escola, Edição 233. Editor Abril. São Paulo, 2010. Imbernón, Francisco. Formação Docente Profissional: formar-se para a mudança e a incerteza. São Paulo: Cortez, 2000. Medeiros, Maria Cristina Vasconcelos Tenório de. Incorporação dos recursos das tic: a tecnologia como mediador do processo ensino-apredizagem. 2010. 14 f. Monografia (Pós-Graduação). Centro de Educação, Universidade Federal de Alagoas, Alagoas, 2010. Moran, José Manuel. A integração das Tecnologias na Educação. Disponível em <http:// http://www.eca.usp.br/prof/moran/integracao.htm> Acesso em: 01 out. 2010. Moran, José Manuel. Mudanças na comunicação pessoal: gerenciamento integrado da comunicação pessoal, social e tecnológica. São Paulo: Paulinas, 1998.