XI C ON G R ES SO D E E D U C AÇ Ã O DO NORT E PI ON EI R O Educar para a Emancipação: a Reorganização da Escola e do Espaço Pedagógico U E NP -C C H E -C L C A– C A M PU S J A C AR E ZI N HO A N AI S – 2 0 1 1 I SS N – 1 8 0 8 -3 5 7 9 A SINTAXE EM FOCO: CONFRONTOS ENTRE AS VISÕES FUNCIONALISTA E TRADICIONAL ACERCA DOS PROCESSOS DE SUBORDINAÇÃO E COORDENAÇÃO Luiz Antonio Xavier Dias (CLCA-UENP/CJ) RESUMO Pesquisas atuais, impulsionadas por novos paradigmas teóricos, têm objetivado revisitar e ampliar os temas abordados na Gramática Tradicional (GT). Entre eles, a inconsistência teórica na formulação dos conceitos acerca dos processos sintáticos: a coordenação e a subordinação. Diante disso, novos posicionamentos têm surgido, a fim de minimizar a insuficiência dos critérios semânticos empregados pela Gramática Tradicional na descrição de fenômenos linguísticos. Por esta razão, pretendemos apresentar uma breve análise sobre alguns conceitos apresentados nas gramáticas tradicionais, bem como a visão funcionalista sobre esses processos e verificar a pertinência de cada enfoque, a fim de comprovar se são suficientes para a compreensão semântica do leitor. Palavras-chave: Gramática semântica do leitor. Tradicional. Visão funcionalista. Compreensão ABSTRACT Current research, driven by new theoretical paradigms, have pursued revisit and expand the topics covered in Traditional Grammar (WG). Among them, the inconsistency in the formulation of theoretical concepts about the syntactic processes: coordination and subordination. Therefore, new positions have arisen in order to minimize the failure of the criteria employed by the semantic description of Traditional Grammar in linguistic phenomena. For this reason, we intend to present a brief analysis of some concepts presented in traditional grammars as well as the functionalist view on these processes and assess the relevance of each approach in order to prove whether they are sufficient to understand the semantics of the reader. Key-words: Traditional Grammar. Functionalist view. Semantic comprehension of the reader. 1 Introdução Pesquisas atuais, impulsionadas por novos paradigmas teóricos, têm objetivado revisitar e ampliar os temas abordados na Gramática Tradicional (GT). Entre eles, a inconsistência teórica na formulação dos conceitos acerca dos processos sintáticos: a coordenação e a subordinação. Diante disso, novos posicionamentos têm surgido, a fim de minimizar a insuficiência dos critérios semânticos empregados pela Gramática Tradicional na descrição de fenômenos linguísticos. 88 XI C ON G R ES SO D E E D U C AÇ Ã O DO NORT E PI ON EI R O Educar para a Emancipação: a Reorganização da Escola e do Espaço Pedagógico U E NP -C C H E -C L C A– C A M PU S J A C AR E ZI N HO A N AI S – 2 0 1 1 I SS N – 1 8 0 8 -3 5 7 9 Por essa razão, pretendemos apresentar uma breve análise sobre alguns conceitos apresentados nas gramáticas tradicionais, bem como a visão funcionalista sobre esses processos. 2 As perspectivas tradicional e funcionalista da gramática Na perspectiva da Gramática Tradicional, Rodolfo Ilari afirma em Linguística Românica (1999) que comumente essas gramáticas fundamentam seus conceitos a partir de exemplos recortados de obras literárias dos grandes autores brasileiros ou portugueses, adotando uma versão uniforme entre a norma e o uso, explicando as relações das orações complexas que são classificadas em processos de coordenação e subordinação. A organização das palavras em enunciados, segundo os conceitos dessa gramática, resulta relações de “igualdade sintática” ou de “dependência sintática”, ou seja, relações de coordenação ou de subordinação, respectivamente. A coordenação e a subordinação são processos sintáticos analisados dentro do período composto, em que podem ocorrer três tipos básicos de orações, ou seja, a principal, a subordinada e a coordenada. Em Gramática em 44 lições, Francisco Platão Savioli (1999) afirma que (i) oração principal é aquela na qual se encaixa uma subordinada; e (ii) oração subordinada, aquela em que se encaixa uma outra oração, que desempenha alguma função sintática em relação à principal; já a (iii) oração coordenada é aquela que se coloca ao lado de outra, sem desempenhar função sintática alguma. Assim, coordenam-se termos (palavras ou expressões) de mesma função e subordinam-se termos (palavras ou expressões) de diferentes funções sintáticas (SAVIOLI, 1999). Em Moderna Gramática Portuguesa, Evanildo Bechara (2003) afirma que subordinadas são as orações que, independentemente do ponto de vista sintático, sozinhas têm um sentido completo, ou seja, constituem um texto. Entretanto, reconhece que nada é engessado, cristalizado. Ele explica a relação das orações complexas (subordinadas) pelo fenômeno de estruturação das camadas gramaticais conhecido por hipotaxe ou subordinação. Aqui, a oração passa a uma camada inferior e funciona como membro sintático de outra unidade. Ainda segundo Bechara (2003), coordenadas são as orações sintaticamente independentes entre si e podem se combinar formando grupos oracionais ou períodos compostos. 89 XI C ON G R ES SO D E E D U C AÇ Ã O DO NORT E PI ON EI R O Educar para a Emancipação: a Reorganização da Escola e do Espaço Pedagógico U E NP -C C H E -C L C A– C A M PU S J A C AR E ZI N HO A N AI S – 2 0 1 1 I SS N – 1 8 0 8 -3 5 7 9 Dessa forma, a coordenação está ligada à independência sintática e a subordinação, à dependência. Contudo, a utilização desses critérios para a classificação das orações complexas é insuficiente, na medida em que ao analisar dados empíricos observamos que somente a relação de (in)dependência não é suficiente para explicar a relação sintática, e nem a presença ou não de conector é fator preponderante para a classificação em um tipo ou outro de oração, como veremos a seguir. 2.1 A visão funcional da linguagem Em Que Gramática estudar na escola: norma e uso da língua, Maria Helena de Moura Neves (2004) afirma que a gramática funcional, entendida como “uma teoria da organização gramatical das línguas naturais procura integrar-se em uma teoria global da interação social”, pois não só se ocupa da análise da estrutura interna da língua, mas também, mormente, da análise da situação comunicativa, a qual encerra o propósito do evento de fala, os participantes desse evento e o contexto discursivo. De acordo com a perspectiva da teoria Funcionalista, Marcuschi (2008) afirma em Produção textual, análise de gêneros e compreensão, que a visão funcionalista da linguagem teve seu início na Escola de Praga (1890 – 1938), com estudos de Louis Hjelmslev (1899-1965) e em 1970 o surgimento da gramática sistêmico-funcional, que propõe um funcionamento baseado em formas regulares relacionando contexto social e forma linguística com base nas funções da linguagem e na sua realização nos mais variados registros e gêneros textuais, essa visão funcionalista da linguagem leva em consideração o contexto, a relação interpessoal e textual. 2.2 Parataxe, hipotaxe e subordinação Hopper & Traugott, em Gramaticalização (1993, p.170) classificaram as orações complexas em três tipos, nos quais os múltiplos núcleos podem ser 90 XI C ON G R ES SO D E E D U C AÇ Ã O DO NORT E PI ON EI R O Educar para a Emancipação: a Reorganização da Escola e do Espaço Pedagógico U E NP -C C H E -C L C A– C A M PU S J A C AR E ZI N HO A N AI S – 2 0 1 1 I SS N – 1 8 0 8 -3 5 7 9 justapostos, o que indica uma relação gramatical entre eles, na medida em que há uma combinação entre as cláusulas núcleo e as marginais: (i) Parataxe, ou relativa independência, uma vez que, pragmaticamente, fazem sentido e são relevantes; (ii) Hipotáticas, ou interdependentes, uma vez que há um núcleo e uma ou mais cláusulas que estão ligadas a ele, numa relação de dependência; (iii) Subordinação, ou, em sua forma extrema, embedding (encaixada), ou em outras palavras, dependência completa, já que as cláusulas marginais estão completamente incluídas dentro das cláusulas nucleares. Segundo a visão funcionalista da linguagem, constata-se pela prática em sala de aula que a visão tradicional do ensino da sintaxe dá-se através da metalinguagem; que é a linguagem definindo a própria linguagem com seu arcabouço de terminologias. No entanto, o que deve ser posto em prática são as atividades epilinguísticas – que priorizam os efeitos de sentido trazidos para o leitor, considerando o uso da língua. Um exemplo da visão tradicional ao classificar o período composto por coordenação é fazer a classificação pela nomenclatura das conjunções, simplesmente expondo tais nomenclaturas, sem demonstrar ao aluno através de atividade de substituição o significado da relação estabelecida. Tomando como exemplo a classificação da oração “Ou compro um carro ou ando a pé”, conforme a GT teríamos um período composto por coordenação, ligadas pela conjunção ou – que é essencialmente coordenada alternativa, essa é uma classificação meramente metalinguística, que não leva o aluno a compreender a macroestrutura do enunciado. Uma análise que formaria um leitor mais crítico é dizer: se substituíssemos ou por nem a oração manteria o mesmo sentido? Por quê? Assim, na visão funcionalista da linguagem poderíamos classificá-la como parataxe – que gera um efeito de sentido entre orações mais completas ligadas pela conjunção ou. Em Gramática descritiva do português, Mário A Perini (2003) assim como em Princípios de Linguística Descritiva (2006) o autor faz uma análise do período composto por subordinação. Segundo Perini sequências como “A menina disse que o cachorro está doente” costumam ser analisadas como período composto 91 XI C ON G R ES SO D E E D U C AÇ Ã O DO NORT E PI ON EI R O Educar para a Emancipação: a Reorganização da Escola e do Espaço Pedagógico U E NP -C C H E -C L C A– C A M PU S J A C AR E ZI N HO A N AI S – 2 0 1 1 I SS N – 1 8 0 8 -3 5 7 9 de duas orações: “a menina disse” e “que o cachorro está doente”. Perini opõe a essa análise uma outra, coerente com definições das próprias gramáticas. Uma gramática não diria que “a menina disse” é oração, porque o verbo “dizer” exige o objeto direto. Portanto, essa não pode ser oração no período, muito menos sua oração principal. Perini propõe o óbvio: que a oração principal inclua a subordinada e o elemento “que”, que a introduz. Ou seja: é todo o período. A subordinada não pode ser “que o cachorro está doente”, pois “que o cachorro está doente” não é oração (ninguém diz que o cachorro está doente”). “O cachorro está doente” é oração, é sequência que pode ser ouvida e tem sentido. Portanto, essa é a oração subordinada. Não sendo oração, “que o cachorro está doente” deve ser outra coisa. Perini propõe que seja considerada um sintagma nominal, que inclui uma oração (substantiva), já que pode funcionar como nome: ser sujeito, objeto, complemento nominal, percebemos que é simples coerência. 3 Falsas coordenadas Outra situação não muito bem classificada pela gramática é o ponto em comum entre a coordenação e subordinação, trazendo assim certa dificuldade ao classificar coordenação e subordinação, uma vez que só o sentido trará uma correta classificação, tal estudo já foi visto por Débora Marques (2010), artigo intitulado: A coordenação e a subordinação nas perspectivas tradicional e funcionalista: confrontos. Abaixo seguem alguns exemplos de peças publicitárias que fazem referência às falsas orações coordenadas, pois num primeiro momento o leitor a classificará como oração coordenada, mas pelo sentido dará uma nomenclatura mais condizente com o sentido, ou seja, oração subordinada. (iii) “Mude para a Tim e ganhe mais créditos no seu pré-pago” (Propaganda Publicitária Tim, Revista Época, 20/04/2006). Aqui, um possível desdobramento seria: se você mudar para a Tim, você vai ganhar mais créditos no seu pré-pago. Diferentemente do esperado, já que a sentença é ligada por uma conjunção coordenada aditiva “e”, aqui temos um 92 XI C ON G R ES SO D E E D U C AÇ Ã O DO NORT E PI ON EI R O Educar para a Emancipação: a Reorganização da Escola e do Espaço Pedagógico U E NP -C C H E -C L C A– C A M PU S J A C AR E ZI N HO A N AI S – 2 0 1 1 I SS N – 1 8 0 8 -3 5 7 9 exemplo de falsa coordenada, pois a proposição relacional estabelecida entre as sentenças não é a de adição, mas pode ser de condicionalidade, causa-consequência. Um outro exemplo: (iv) “Falou. Ganhou.” (Propaganda da operadora de telefonia móvel Claro, outdoor, Juiz de Fora, maio/2006). Neste exemplo, quanto à proposição relacional, ocorre o mesmo que no exemplo (iii), já que aqui a relação é de causa-conseqüência, já que você falou, ganhou e também de condicionalidade, se você falar, você vai ganhar. A diferença entre (iii) e (iv) reside no fato de que, numa análise tradicional, as sentenças em (iv) seriam enquadradas como justapostas, dado que não há a presença formal de nenhum conector entre elas. Porém, é possível percebermos a relação de subordinação que há entre estas orações. Nos exemplos (v) e (vi) a seguir, podemos visualizar falsas coordenadas: (v) “Publique em um jornal com 178 anos de tradição e faça parte da história”.(Propaganda Jornal do Comercia Brasil, Revista Época, 22/03/2006). Aqui, sob a perspectiva da GT, análises que atribuíssem às duas cláusulas a classificação de coordenadas seriam assim: a primeira, “Publique em um jornal com 178 anos de tradição”, seria classificada como assindética; e a segunda “faça parte da história”, sindética aditiva. Entretanto, sabemos que nesse caso temos uma relação de condição, que, pela fixidez da classificação, não é percebida nas análises tradicionais. Em o mesmo ocorre, uma falsa coordenada que traz em si a relação de condição: “Dê um boticário no dia das mães e transforme a sua numa linda mulher”.(Propaganda para o dia das mães d’Boticário, outdoor, Juiz de Fora, abril/2006). Tais exemplos confirmam a noção de que se deve observar o discurso/contexto, para que as definições e reais funções no que tange à coordenação e à subordinação sejam, efetivamente, mais próximas da intenção enunciativa dos falantes, descartando as noções engessadas das gramáticas tradicionais. 93 XI C ON G R ES SO D E E D U C AÇ Ã O DO NORT E PI ON EI R O Educar para a Emancipação: a Reorganização da Escola e do Espaço Pedagógico U E NP -C C H E -C L C A– C A M PU S J A C AR E ZI N HO A N AI S – 2 0 1 1 I SS N – 1 8 0 8 -3 5 7 9 4 Considerações Finais Observando o enfoque das gramáticas tradicionais e da funcionalista acerca dos estudos sobre subordinação e coordenação, chegamos à conclusão de que a tentativa de elaboração de um conceito, realmente, eficaz, deve ser extraída da reflexão sobre as duas perspectivas. No que concerne às classificações, a GT apresenta caminhos que se mostram fixos e que, como exposto no desenrolar do texto, esbarram-se com exemplos limitados entre coordenação e subordinação e que, portanto, devem ser revisitados. Desse modo, o que se percebe é que as terminologias da GT e da visão funcionalista da linguagem se completam, uma vez que uma preza a metalinguagem e a outra os efeitos de sentido produzidos pelo leitor. Assim, complementar a GT com a visão do uso, possivelmente se terá uma melhor compreensão desses processos e um ensino mais eficaz de língua. 5 Referências BECHARA,Evanildo.Gramática escolar da língua portuguesa.Rio de Janeiro: Lucerna, 2003. CUNHA, Celso ; CINTRA, Luís L. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. HOPPER, Paul J. & TRAUGOTT, Elizabeth C. Grammaticalization. Cambridge: Cambridge University Press, 1993. ILARI, Rodolfo. Linguística românica. São Paulo: Ática, 1999. MARQUES, Débora. 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Anais...UENP – Universidade Estadual do Norte do Paraná – Centro de Ciências Humanas e da Educação e Centro de Letras Comunicação e Artes. Jacarezinho, 2011. ISSN – 18083579. p. 88 – 95. 95