SENDO QUE ... NÃO EXISTE!
José Luiz da Silva Braga
Advogado
“A Carta Magna dispõe que: “A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (art. 196),
sendo que o “atendimento integral” é uma diretriz constitucional das ações
e serviços públicos de saúde (art.198).
Certo? Não: errado! A locução SENDO QUE não existe em linguagem
formal. Deve ser substituída por outra construção. Confira-se: “A Carta
Magna dispõe que: “A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (art. 196). O
“atendimento integral” é uma diretriz constitucional das ações e serviços
públicos de saúde (art.198).
Veja que esta segunda redação é mais clara, simples e objetiva e não
prioriza o abuso do gerúndio (sendo que). Confira este outro exemplo:
“Maria Regina reside com a mãe, sendo que trabalha, ganhando em média
R$ 510,00 mensais”.
Correto: “Maria Regina reside com a mãe, trabalha e ganha em média R$
510,00 por mês.”
Outros exemplos:
1. O réu tem dois filhos, sendo que o mais velho é estudante.
Correto: O réu tem dois filhos, o mais velho estudante.
2. Havia vários processos em pauta, sendo que nem todos foram
julgados.
Correto: Havia vários processos em pauta; nem todos foram
julgados.
3. Encontrei-me com um grupo de advogados, sendo que três deles
eram meus conhecidos.
Correto: Encontrei-me com um grupo de advogados, dos quais
três eram meus conhecidos.
CONCLUSÃO
A regra geral é substituir o “sendo que” por ponto e vírgula,
ou por “e”, ou por outra construção, como nos exemplos acima.
Como bem ensina Geraldo Amaral Arruda, “sendo que” é uma
locução que tem valor de conjunção causal, mas vem sendo usada
como maneira fácil de “esticar a frase”. O seu uso exagerado, fora do
sentido de relação causal, prejudica a clareza da frase e o estilo.1
Curiosidade: também não se devem usar expressões como “sendo
certo que”, “sendo justo que”, “sendo razoável que”.
Gramaticalmente falando
O uso da expressão “sendo que” deve ser evitada porque o
verbo “sendo” é o verbo ser no gerúndio, tendo como função iniciar
uma oração reduzida de gerúndio, não havendo assim a necessidade
de usar a palavra “que”.
Há muitas orações subordinadas que podem aparecer
abreviadas ou simplificadas, sem conectivo (conjunção ou pronome
relativo) e com verbo em uma das formas nominais: gerúndio,
infinitivo ou particípio. As orações abreviadas se chamam “orações
reduzidas”.
Compare:
- Penso que estou preparado.
- Penso estar preparado.
Na segunda construção, a oração subordinada se apresenta
sem o conectivo (elemento de ligação) da primeira (que) e tem o
verbo em um das formas nominais (infinitivo), é uma oração
reduzida. O emprego das orações reduzidas assegura à linguagem
concisão e elegância.
Há três tipos de oração reduzida:
1. De infinitivo (falar, escrever, partir).
2. De gerúndio (falando, escrevendo, partindo)
3. De particípio (falado, escrito, partido)
1
“A linguagem do juiz”, Saraiva, 1996, p. 109)
O fundamental não é saber se uma oração reduzida de
infinitivo, de gerúndio ou de particípio é subordinada adverbial,
adjetiva ou substantiva, mas sim usá-las com acerto, na pratica
forense.
Bibliografia
- CUNHA, Celso. Nova gramática do português contemporâneo.
Celso Cunha/ Luis F. Lindley Cintra. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lexikon
Informática, 2007.
- BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. Edição
revista e ampliada. Editora Lucerna.
- CEGALLA, Domingos Paschoal. Novissima gramática da língua
portuguesa. Ed. 48. Companhia Editora Nacional, 2009.
- CIPRO NETO, Pasquale. Gramática da língua portuguesa.
Pasquale Cipro Neto/Ulisses Infante. São Paulo, 2003.
- TERRA, Ernani. Gramática, literatura e redação para o ensino
médio. Ernani Terra/José de Nicola. São Paulo: Scipione, 1997.
- TERRA, Ernani. Curso prático de gramática. Ernani Terra:
supervisão pedagógica José de Nicola. São Paulo: Scipione, 2006.
- NICOLA, José de e INFANTE, Ulisses. Gramática
contemporânea da língua portuguesa. São Paulo: Scipione,1994.
- MAZZAROTTO, Luiz Fernando. Manual de gramática: guia
prático da língua portuguesa. São Paulo: DCL, 2000.
- www.tjsp.jus.br - TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE Desembargador Alexandre Moreira Germano
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