ProfMat 2014
TAREFAS PARA A SALA DE AULA DE MATEMÁTICA
Maria Helena Marques Loth
Professora da rede municipal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil.
[email protected]
Amarildo Melchiades da Silva
Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil.
[email protected]
Resumo: Nessa sessão prática pretendemos compartilhar com professores do Ensino
Fundamental um conjunto de tarefas, caracterizadas como situações-problema, cuja
estrutura matemática subjacente são a adição e subtração de números naturais . Elas
foram elaboradas e aplicadas a um grupo de alunos de 10 e 11 anos de idade durante
uma investigação, de cunho qualitativo, em um programa de mestrado em Educação
Matemática na Universidade Federal de Juiz de Fora, Brasil. Tais tarefas foram
produzidas atendendo algumas características específicas fundamentadas no Modelo
dos Campos Semânticos (MCS). O objetivo foi propor situações que pudessem ampliar
as possibilidades de produção de significados dos alunos que se dispusessem a resolvêlas. Assim, na sessão prática apresentaremos as tarefas e proporemos uma discussão e
uma reflexão sobre como uma prática referenciada teoricamente pode auxiliar as ações
docentes e, também, sugerir formas de atuar no cotidiano escolar que possibilitem não
somente ouvir o que o aluno tem a dizer, mas, principalmente, considerar suas falas
como essenciais no processo de produção de conhecimento.
Palavras-chave:
Educação
Matemática;
Educação
Aritmética;
Produção
de
Significados;Tarefas.
A proposta
O objetivo dessa sessão prática é apresentar-lhes um conjunto de tarefas
elaboradas e aplicadas a alunos de escolas públicas, resultado de um trabalho
desenvolvido em um programa de mestrado profissional na Universidade Federal de
Juiz de Fora, Brasil. O foco era analisar como uma referência teórica pode auxiliar o
professor no dia a dia escolar.
Aqui, em particular, pretendemos apresentar as tarefas e comentar o processo de
elaboração das mesmas. Como suas características foram fundamentadas no Modelo
dos Campos Semânticos (MCS) é importante dar a conhecer algumas noções essenciais
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desse modelo como: conhecimento, significado de um objeto e produção de
significados.
Para Lins (2012) “um conhecimento consiste em uma crença-afirmação ( o
sujeito enuncia algo em que acredita) junto com uma justificação (aquilo que o sujeito
entende como lhe autorizando a dizer o que diz)” (Lins, 2012, p.12). Cabe ressaltar que
nessa formulação a crença, a afirmação e a justificação são os elementos que constituem
o conhecimento. Sendo assim, se para uma mesma crença-afirmação são apresentadas
justificações diferentes os conhecimentos produzidos são diferentes.
Ao fazer uma enunciação o sujeito fala sobre algo, um objeto. Tudo que
“efetivamente se diz de um objeto, no interior de uma atividade” (Lins, 2012, p.28) é o
significado desse objeto. É importante destacar que o significado de um objeto é
atribuído por um sujeito, aquele que enuncia, portanto, está relacionado ao que foi dito e
não ao que ele poderia ter dito ou ao que gostariam que tivesse dito a respeito do
objeto (Lins&Gimenez, 1997). O objeto é, então, aquilo do que se fala seja algo
concreto ou não.
Assim, a produção de significados consiste em produzir ações enunciativas
(gestos, palavras, desenhos) a respeito de um objeto no interior de uma atividade (Silva,
2013). Dessa forma, a constituição dos objetos acontece na enunciação do sujeito
durante o processo de produção de significados.
Um elemento de grande importâcia na análise dos processos de ensino e
aprendizagem é a visão de processo comunicativo que, para Lins (1999), é composto de
três elementos: autor, texto e leitor. O autor é aquele que faz uma enunciação em uma
direção em que pressupõe a existência de “um leitor” que produzirá significado para o
que foi enunciado. Da mesma forma, “o leitor” constitui “um autor” ao produzir
significado para o enunciado proposto. Nessa perspectiva, para Lins o enunciado é um
resíduo de enunciação, “algo com que me deparo e que acredito ter sido dito por
alguém” (Lins, 2012, p. 27), que se transforma em texto quando para ele “um leitor”
produz significado. Ele ressalta: “Dizemos resíduo, e não detrito. O resíduo é o que
resta de um processo. Um resíduo de enunciação não é nem menos, nem mais
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importante que uma enunciação: ele é de outra ordem”. (Lins, 2012, p. 27, grifos do
autor).
No caso particular das tarefas apresentadas neste texto os enunciados são
resíduos de enunciação para os quais pretende-se que os alunos produzam significados.
De modo semelhante, a análise das falas dos alunos constituem a produção de
significados do professor para suas enunciações.
É importante esclarecer que, ao adotar os pressupostos do MCS assume-se que o
conhecimento não pode ser transmitido por livros ou professores. É no processo de
produção de significados que o sujeito produz conhecimento.
A seguir são apresentados os objetivos, as características e os enunciados de
duas das tarefas.
As tarefas
Ao elaborar o conjunto de tarefas consideramos algumas características mais
gerais e outras mais específicas. A intenção era propor tarefas que pudessem estimular a
produção de significados dos alunos, ampliando as possibilidades de estratégias de
resolução e que, provocassem a discussão de elementos do pensar matematicamente
como o desenvolvimento das estratégias de resolução de problemas. Da perspectiva
docente buscamos situações que permitissem ao professor observar os significados
profuzidos pelos alunos e deixar claro que estes e os significados oficiais da matemática
são alguns dentre os diversos que podem ser produzidos para aquela tarefa. Além disso,
queríamos que significados matemáticos e não-matemáticos pudessem estar presentes
no mesmo espaço comunicativo.
Uma análise dos livros didáticos mais adotados no Brasil mostrou que os
problemas de aritmética que apresentam são formulados em diversos contextos. Além
disso possuem textos curtos e perguntas muito objetivas. Essas características foram
consideradas, por nós, como limitadoras do processo de produção de significados. Isso
nos levou a identificação de algumas caracteríticas norteadoras do processo de
elaboração das tarefas como: as tarefas deveriam ser elaboradas dentro de um único
contexto que permitissem a aprendizagem da matemática produzindo significados que
vão além da matemática e exigir dos alunos a leitura de textos e, ainda, possibilitar aos
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alunos experienciar situações-problema que não possuíssem resposta única, exingindo
que tomassem decisões. Não menos importante, cuidamos para que as tarefas fossem
familiares e não-usuais. Silva (2003) esclarece que uma tarefa é familiar quando permite
que as pessoas falem a partir do seu enunciado e não-usual quando sua resolução exige
algum esforço cognitivo.
O conjunto de tarefas contém um texto introdutório, que tinha o objetivo de
colocar o aluno em contato com o tema, seguido de 4 situações-problema cuja estrutura
matemática subjacente era a adição e sutração de números naturais. O contexto
escolhico foi água.
A seguir são apresentados os enunciados das tarefas.
Texto inicial - Água: os números do desperdício
Nós moramos no planeta Terra, mas ele bem que poderia se chamar planeta
água, já que ele possui mais água do que terra.
Fonte:
http://plantasuculentasefolh
agensornamentais.blogspot.
com/2010/04/planeta-agua22-de-abrildia-da-mae.html
Figura 1 - Imagem do planeta Terra
Porém, de toda água do planeta, só um pouquinho dela é boa para a gente beber
ou utilizar em casa, porque ou ela está congelada nos pólos, ou é salgada, ou é
imprópria para o uso.
Por isso, não deveríamos desperdiçar água em nossas casas. Muitas vezes,
jogamos água fora por causa de alguns hábitos que temos como: tomar banho
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demorado, escovar os dentes com a torneira aberta, não fechar bem a torneira e deixá-la
pingando.
Um dos lugares em que mais se desperdiça água é em nossas casas. E o lugar de
nossa casa em que mais jogamos água fora é o banheiro.
Hoje vamos conhecer a quantidade de água que jogamos fora diariamente. Para
diminuir o desperdício, é necessário mudança de hábitos; por isso, você é convidado a
pensar ações que podem ajudar a salvar a água do planeta. Eliminar o desperdício é o
primeiro passo para garantir água limpa a todas as pessoas.
Não fique olhando a água do planeta indo embora pelo ralo! Feche as torneiras e
dê sua contribuição para garantir água potável a todos!
Fonte:
http://www.monica.com.br/
parques/shopeld/agua.htm
Figura 2 – O desperdício de água
Nas tarefas que faremos, existem informações sobre a água que gastamos para
suprir nossas necessidades básicas de higiene, de consumo e para manter nossa saúde.
Vamos fazer alguns cálculos. Os resultados poderão nos ajudar a pensar sobre nosso
consumo e sobre os hábitos que poderemos adquirir para contribuir com a preservação
da água.
Mas antes de começarmos, pense nas seguintes perguntas:
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De que maneira desperdiçamos água em nossas casas?
Quais hábitos das pessoas podem levar a um grande consumo de água?
Tarefa 1: Torneiras Pingando
Veja a quantidade de água que é desperdiçada com as torneiras pingando. A figura
mostra o gasto de água durante um mês.
Fonte:
http://www.uniagua.
org.br/publichtml/we
bsite/default.asp?tp
=3&pag=dicas.htm
Figura 3 – Suporte da tarefa 1
Vamos calcular:
a) Se em sua casa há três torneiras pingando, qual a quantidade de água que elas estão
desperdiçando?
b) Se você fechar a 1ª torneira de modo que ela não pingue, quantos litros de água serão
desperdiçados?
c) Se você fechar a 1ª e a 2ª torneiras de modo que elas não pinguem, quantos litros de
água serão desperdiçados? E economizados?
d) Qual é a quantidade de água que a 3ª torneira gasta mais que a 2ª torneira?
e) Se você conseguir fechar totalmente a 3ª torneira e apertar a 2ª torneira de forma que
ela fique pingando como a 1ª, quantos litros de água serão desperdiçados? E
economizados?
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Tarefa 2: Consumo de água em atividades diárias
Pedro e Daniel possuem alguns hábitos parecidos e outros diferentes. Por
exemplo, toda manhã Pedro toma banho, mantendo o chuveiro aberto por 15 minutos.
Durante os 5 minutos em que escova os dentes, não fecha a torneira e ao fechá-la,
sempre a deixa pingando. Ao usar o vaso sanitário, joga papel no seu interior e aperta a
descarga por longo tempo.
Daniel também toma banho de manhã, porém mantém o chuveiro fechado
enquanto se ensaboa. Com esse hábito, 5 minutos de chuveiro aberto lhe bastam.
Enquanto escova os dentes, a torneira da pia fica fechada. E quando dá descarga, aperta
a válvula o suficiente para limpar o vaso, pois se lembra de seu pai recomendando para
não desperdiçar água.
Veja na tabela o consumo de Pedro e Daniel em algumas atividades diárias:
Tabela 1: Consumo de água em atividades cotidianas de Pedro e Daniel
Consumo de água
Banho
Escovação dos dentes
Acionamento da descarga
Pedro (15 min)
45 L
Daniel (5 min)
15 L
Pedro
12 L
Daniel
4L
Pedro
15 L
Daniel
6L
Vamos fazer as contas:
a) Complete a tabela e calcule a quantidade de água, em litros, que cada um dos dois
meninos gasta numa manhã.
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Tabela 2: Consumo de água de Pedro e Daniel em uma manhã
Pedro
Daniel
Banho
Escovação
Descarga
Total
b) Qual dos dois meninos gasta mais água em uma manhã? Quantos litros a mais?
c) Pela tabela, que quantidade de água Pedro gasta a mais que Daniel durante o banho,
em dois dias?
d) Quantos litros de água Pedro gasta a mais que Daniel para escovar os dentes e ao
apertar a descarga?
Tarefa 3: Mudando hábitos para economizar
Ser uma pessoa consciente pode ajudar muito na economia em casa, tanto de
água quanto de dinheiro.
Para evitar o desperdício, Juliana toma um banho de 10 minutos, fechando o
chuveiro ao ensaboar; gasta com banho 450 litros de água por mês. Sempre fecha a
torneira enquanto escova os dentes gastando, por mês, uns 90 litros de água. Não utiliza
o vaso sanitário como lixeira e aciona o suficiente a descarga para limpá-lo,
consumindo cerca de 900 litros de água por mês. E, principalmente, Juliana não deixa
as torneiras de sua casa pingando e evita, com isso, o desperdício de água.
1o – Adotando esses hábitos, quantos litros de água Juliana gasta mensalmente com sua
higiene pessoal?
2 o – Fazendo uma estimativa do consumo de água mensal de três amigos Mateus, Alan
e Nilo, obteve-se o resultado da tabela abaixo.
Tabela 3: Consumo mensal de água de Alan, Mateus e Nilo
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Alan
Mateus
Nilo
Banho
2 250 L
4 050 L
1 350 L
Escovar os dentes
1 080 L
90 L
1 180 L
Uso da descarga
1 440 L
720 L
780 L
Total
a) Complete a tabela com o consumo mensal total de cada um dos três.
b) Qual dos três amigos tem maior gasto de água? Ele gasta quantos litros a mais que
cada um de seus colegas?
c) Qual é a diferença de consumo de água entre Juliana e cada um dos meninos acima?
d) Quantos litros de água Alan gasta a mais que Nilo?
e) Que sugestão você daria a cada um dos três meninos para economizarem água?
Tarefa 4: O consumo de água nos países
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), cada pessoa necessita de 110
litros de água por dia para atender às necessidades de consumo e higiene. No Brasil, no
entanto, o consumo médio por pessoa chega a ser de 200 litros/dia e na Escócia 430
litros/dia. Já em Moçambique cada pessoa tem disponíveis 20 litros de água por dia.
Responda:
a) O que você pode dizer sobre os números informados pela ONU?
b) Quantos litros de água um brasileiro gasta a mais que o necessário de acordo com a
ONU? E um escocês?
c) Em quantos litros/dia deveria ser aumentada a oferta de água ao cidadão
moçambicano para que se atinja a quantidade recomendada pela ONU?
d) Qual é a diferença entre o consumo diário dos escoceses e dos brasileiros?
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e) Quantos litros/dia os escoceses devem diminuir no seu consumo para se atingir o
patamar recomendado como saudável pela ONU?
Referências bibliográficas
Lins, R. C. (2012) O Modelo dos Campos Semânticos: estabecimentos e notas de terorizações.
In C. L. Angelo ...[et al]. (Eds.) Modelo dos Campos Semânticos e Educação
Matemática: 20 anos de história (pp. 11-30) São Paulo: Midiograf.
Lins, R.C. (1999) Por que discutir teoria do conhecimento é relevante para a Educação
Matemática. In: Bicudo, M.A.V. (org). Pesquisa em Educação Matemática: concepções
e perspectivas. São Paulo: editora da Unesp, pp. 75 – 94)
Lins, R. C. ; Gimenez, J. (1997) Perspectivas em aritmética e àlgebra para o século XXI.
Campinas: Papirus, 1997 (Coleção perspectivas em Educação Matemática).
Silva, A. M. (2013) Sobre a dinâmica da produção de significados para a Matemática. JIEEM –
Jornal Internacional de Estudos em Educação Matemática, v 6(2) 30 p.
Silva, A. M. da. (2003). Sobre a dinâmica da produção de significados para a Matemática.
Tese de Doutorado. Rio Claro, Brasil: UNESP.
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