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São Paulo, sábado a segunda-feira, 12 a 14 de setembro de 2015
Especial
Fotos: Divulgação
g ç
SÃO PAULO
DE
TODOS
OS
TEMPOS
Geraldo
eraldo Nunes*
Os 50 anos do TUCA –
Teatro da Universidade Católica
Em abril de 1965, cartazes espalhados pelo campus da PUC de São Paulo anunciavam: O Tuca vem aí. O Tuca
(teatro da Pontifícia Universidade Católica), é um espaço cultural que se tornou conhecido no Brasil todo como
foco de resistência ao regime militar, completa 50 anos neste mês de setembro
ara a montagem do teatro foram feitas três contratações: Roberto Freire como diretor geral do grupo
de teatros, Silnei Siqueira, profissional vindo da TV
Record, como diretor de atores e José Armando Ferrara
responsável pela cenografia. Depois de um contrato de
liberação de verbas pela Secretaria de Estado da Cultura,
a peça escolhida para a inauguração foi Vida e Morte Severina, de João Cabral de Melo Neto.
P
tano Veloso, visto que muitos
acontecimentos na área
política e social não eram
informados à população devido à censura e as pessoas
se sentiam confusas em se
posicionar politicamente, em
especial os jovens. Aquele
ano terminaria sob a vigência
do Ato Institucional no. 5,
promulgado a 8 de dezembro
de 1968, proibindo e autorizando a repressão policial a
manifestações em lugares
públicos. Antes, porém,
Caetano cantou o que viria
e o público não entendeu.
Naquele dia do festival, Caetano precisou sair do Tuca
pelos fundos, escondido em
meio às obras de construção
do restaurante universitário
para não ser agredido pelos
estudantes.
Os motivos da escolha se deram pelo fato do autor ser
brasileiro e o tema tratava de uma realidade social que ia
ao encontro da ideologia estudantil, além do que, havia
atores interessados no texto. A música tema da peça Morte
e Vida Severina é uma composição de Chico Buarque de
Hollanda, “Funeral de um lavrador”. Ele também elaborou
as demais trilhas sonoras do espetáculo.
A censura e a repressão da
ditadura militar continuariam de olho no Tuca por muito
tempo. Henrique Suster, diretor do Teatro da Universidade Católica, entre 1969 e 1974, fala de um show de Chico
Buarque, onde ele e o artista enfrentaram a truculência
da Polícia Federal depois do espetáculo. “Eles se dirigiram
aos camarins e nos cercaram, fizeram um discurso contra
a subversão a mim e ao Chico, deram alguns empurrões e
pontapés em nós e foram embora sem prender ninguém.
O jornalista e professor universitário, Jorge Claudio Ribeiro, conta que o espaço surgiu
Outro acontecimento margraças ao esforço de várias
cante, e hoje parte da história
pessoas, em um período de
do Brasil, aconteceu em
censura e ditadura, para a
22 de setembro de 1977,
montagem de espetáculos.
quando aproximadamente
“O próprio Chico Buarque
500 policiais da tropa de
vendeu um Fusca que tinha
choque, invadiram o campara ajudar na montagem
pus da PUC, espancaram
da peça”, contou Ribeiro,
e prenderam, conforme os
ressaltando o empenho do
jornais, aproximadamente
artista na elaboração das
2 mil estudantes que partimúsicas da peça que lhe
cipavam de um ato público.
deram muito trabalho. A
Alguns foram arrastados
trama fala da viagem de um
para fora do campus e outros
retirante nordestino que
ficaram feridos a golpes de
foge da seca no sertão e vai a
“Mas é essa a juventude que quer assumir o poder?
cassetete e pontapés. Foram
Recife na busca de melhores
Vocês não estão entendendo nada!”.
explodidas cinco bombas de
condições de vida. No dia da
estreia a Polícia Federal compareceu de forma a intimidar gás e lançados vários petardos deixando 15 pessoas feridas,
o público que comparecia, mas o espetáculo transcorreu cinco delas com queimaduras de terceiro grau.
normalmente.
A operação bélica visava impedir manifestações pela
Mas não foi apenas a peça de João Cabral de Melo Neto reorganização da União Nacional dos Estudantes – UNE,
que marcou a trajetória política do Tuca nesses 50 anos. tema daquela reunião estudantil que acontecia na parte
Houve ali uma das edições do Festival Internacional da de dentro do campus universitário, local considerado
Canção, em 1968, onde Caetano Veloso entrou em discussão território independente, que não poderia mesmo naquela
com o público que o vaiava por estar cantando “É proibido época de vigência do AI-5 ser ocupado pelo Estado. O coproibir”. O público não entendeu o sentido da letra e vaiou. mandante da invasão da PUC foi o coronel Erasmo Dias,
Caetano encerrou a canção e questionando: “Mas é essa então secretário da Segurança Pública. Após a confusão
a juventude que quer assumir o poder? Vocês não estão estudantes de outras universidades anunciaram que no dia
seguinte fariam uma grande passeata pelas ruas do centro
entendendo nada!”
da cidade exigindo o fim dos atos institucionais e a anistia
Houve outras frases profundas naquele desabafo de Cae- aos presos políticos.
Não havia redes sociais,
a manifestação foi marcada para as cinco da tarde
pelos próprios estudantes
e havia o temor de que
a repressão poderia ser
ainda maior que na PUC.
A Praça da República já
amanheceu policiada pelo
Batalhão de Choque da PM.
A caminhada estudantil
teve início no horário marcado saindo dos fundos do
Teatro Municipal, subindo
a Avenida São João no
sentido República e Sé. O
policiamento era grande,
mas a passeata transcorreu
sem incidentes, apesar das
palavras de ordem e provocações ao regime militar
que preferia agora não dar
alarde ao exterior que havia
de fato repressão no país.
Tais acontecimentos se somaram a outros que levaram o
governo a promover uma abertura política. Mesmo assim,
o Tuca ainda seria vítima de outro atentado no dia 22 de
setembro de 1984: um incêndio considerado criminoso destruiu quase que completamente o teatro. Uma campanha de
reconstrução mobilizou a sociedade para reabri-lo de forma
precária, quatro anos depois. No primeiro espetáculo após
a volta ainda não havia poltronas e só em 2003 o prédio
seria modernizado por completo, mantendo nas paredes,
as marcas do fogo, de forma a mostrar às novas gerações
a importância do Teatro da PUC no engrandecimento da
cultura nacional e na conquista da volta das liberdades
democráticas.
Tudo isso é parte da história do Tuca, uma referência
para o país.
Desde 2006 existe um Centro de Documentação e Memória
do teatro e para conferir as novidades do cinquentenário,
acesse o portal (www.teatrotuca.com.br).
(*) Geraldo Nunes, jornalista e memorialista, integra a Academia Paulista de
História. ([email protected]).
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