A IMPORTÂNCIA DA ALIMENTAÇÃO E DO MANEJO DE VACAS LEITEIRAS EM PRODUÇÃO 1 Ricardo Dias Signoretti A atual situação econômica da cadeia produtiva do leite exige que os produtores realizem todas as atividades no sistema de produção com máxima eficiência, para manter a rentabilidade e permanecer na atividade. Os técnicos e produtores sabem que as vacas leiteiras produzem mais e melhor se submetidas a dietas balanceadas corretamente. O ponto crucial é não deixar de existir a preocupação de se fornecer alimentos de qualidade e em quantidade suficiente para todo o rebanho o ano todo. Por outro lado, se houver produtores que admitem com naturalidade que, na época seca do ano, o animal perde peso, consumindo suas reservas corporais para se manter vivo, emagrecendo rapidamente, não há como se falar em rentabilidade na atividade leiteira. O produtor que explora a atividade leiteira sempre deve estar muito atento. Mesmo uma vaca estando bem nutrida, livre de enfermidades e com infestações de parasitos controladas, poderá não ocorrer à expressão de todo seu potencial de produção, caso o ambiente não lhe ofereça conforto. Por conforto entende-se um local seco e limpo para repousar, sombreado e arejado, com ponto de água de qualidade o mais próximo possível e de fácil acesso. No entanto, na maioria das propriedades no Brasil Central, a pecuária leiteira permanece com baixa produção de leite por animal. 1 Engenheiro Agronômo graduado pela Escola Superior de Agricultura e Ciências de Machado - MG. Mestre em Zootecnia pela UFV/Viçosa-MG. Doutor em Zootecnia, Área de Concentração em Nutrição de Ruminantes pela UFV/Viçosa - MG. É pesquisador Científico do Polo Regional de Desenvolvimento Tecnológico dos Agronegócios da Alta Mogiana - Colina/SP. É Coordenador da divisão de Consultoria Técnica em Bovinocultura de Leite da COAN Consultoria. E-mail: [email protected] Existem diversos fatores que justificam este resultado, tais como: a falta de genética adequada para produção de leite, ou seja, em grande parte das propriedades situadas no Sudeste e no Centro-Oeste do Brasil ainda é freqüente a ordenha de animais com fração genética zebuína superior a 50%; o intervalo de partos próximo de 19 meses e em conseqüência a alta proporção de vacas não lactantes, quase sempre entre 30 e 50% do rebanho adulto, o que parecem indicar que a subnutrição e o maior problema. Neste sentido, a alimentação em quantidade e qualidade no rebanho explorado nestas regiões na maioria das vezes não é suficiente para suprir a demanda nutricional das vacas, que são submetidas à estacionalidade da produção forrageira e seguem a mesma rotina: no período das águas produzem mais leite e no período das secas quando não suplementadas corretamente atingem índices produtivos e reprodutivos insatisfatórios. A maior produção de leite no período das águas ocorre, muito provavelmente, em virtude do maior aporte de nutrientes aos animais (Figura 1). Esta constatação é bastante curiosa considerando-se que o maior custo alimentar por vaca por dia ocorre na época da seca, visto que acima de 80% dos produtores, qualquer que seja o volume diário de produção de leite, utiliza alimentos concentrados. Outro fato interessante é que menos de 30% dos pequenos produtores suplementam as vacas com concentrados na época das águas. Por outro lado, mais de 70% dos produtores com volume diário de produção acima de 250 litros/dia mantêm o uso de grãos e subprodutos agroindustriais no período das águas. Na maioria dos sistemas de produção, os fatos mencionados acima parecem indicar que o recurso forrageiro disponível na seca suplementada com concentrados é pior nutricionalmente que a pastagem de período das águas manejada extensivamente. Vale ressaltar que o maior limitante nutricional da produtividade ainda ocorre na seca e os técnicos e produtores devem ficar atentos e buscar a eficiência máxima na conservação e utilização destes recursos forrageiros, proporcionando a melhoria da eficiência na atividade leiteira. Figura 1 – Vacas pastejando (Período das águas) Mesmo com as deficiências levantadas anteriormente cerca de 90% dos produtores de leite adotam alguma suplementação com forrageiras na seca. A maioria dos produtores parece estar ciente da estacionalidade na produção de forragens. A baixa produção no período seco do ano (Figura 2) parece ser resultado da baixa oferta e qualidade de suplementação forrageira, em muitos casos, suplementada de maneira tecnicamente incorreta com concentrados. Vale ressaltar que somente 30% dos pequenos produtores têm fornecido concentrados proporcionalmente à produção do animal. Nosso produtor optou pela estratégia de baixo risco financeiro e de necessidade mínima de tempo de trabalho na produção de forragens acoplada à compra de concentrados na seca, quando o leite é mais bem remunerado ao invés de investir em fertilidade e manejo de solo para obter forrageiras de qualidade e com alta produtividade. A conseqüência desta mentalidade foi à disseminação do uso de algumas espécies forrageiras colhidas uma vez por ano durante a seca, péssima nutricionalmente, mas de risco baixo. Figura 2 – Vacas pastejando (Período das secas) Outro fator importante, mesmo aqueles que utilizam concentrados nas dietas das vacas leiteiras realizam de forma errada, principalmente na composição e consequentemente no custo. Para isso é preciso investir. Tanto melhor é a ração quanto maior o número de ingredientes e maior a capacidade de adquirir componentes certificados e baratos. A homogeneidade dos subprodutos é outra questão delicada, pois seus teores variam muito. O caroço de algodão, por exemplo, se estiver muito úmido, apresenta problemas de armazenagem. Com tudo isso, o proprietário rural tem de pensar que quando opta por formular rações na fazenda aumenta sua responsabilidade. Manejo alimentar no período pós-parto Com relação ao balanceamento da dieta, o produtor deve ser bem orientado para o fornecimento aos animais de todos os nutrientes, incluindo proteínas, carboidratos, vitaminas e macro e microminerais. Primeiro, as vacas usam a energia da dieta para manter-se e produzir leite; depois, o que resta é dirigido para a reprodução. Além disso, não se pode esquecer das bactérias do rúmen. Esta é chave para os animais alcançarem produções cada vez mais altas. Em seguida ao manejo correto no período seco da vaca e, principalmente, na fase de transição. O período pós-parto deve ser corretamente manejado evitando-se riscos de insucesso na atividade. Para tanto, a vaca lactante dever ser manejada em quatro fases do seu ciclo lactacional (Figura 3): Figura 3 – Fases do ciclo lactacional de vacas leiteiras A primeira é aquela que começa no parto e continua até duas ou três semanas após, caracterizada por alta produção de leite. O fator-chave de gerenciamento dessa fase é a habilidade de monitorar e observar os animais para assegurar a manutenção de sua saúde quando passarem para o alto grupo (dietas de alto valor nutricional). A ração dessas vacas deve ser intermediária entre a de vacas em gestação e aquelas em final de lactação. Dietas de alto valor nutricional e instalações adequadas são recomendas. Para vacas de alta produção nesta fase, pode ser adotada a seguinte estratégia: alimentação com um a três quilos de forragem de alta qualidade (feno), para manter a função ruminal; utilização de mistura que contenha proteína não-degradável e fibras digestíveis (como farelo de soja ou polpa cítrica) como fontes de energia; incremento da concentração de nutrientes na ração, para ajustar a baixa ingestão de alimento; adição de tamponantes, para estabilizar o pH do rúmen; etc. A fase seguinte, de início de lactação, corresponde ao período de 14 a 100 dias após o parto. Nela, as vacas alcançam o pico de produção de leite, há queda de peso (isto exige fonte adicional de energia) e a ingestão de matéria seca é mais lenta. O tipo e o nível de proteína são críticos para que se alcance o pico de produção de leite. Limitar a quantidade de gordura suplementar é recomendável para manter o consumo de matéria seca. As estratégias de alimentação para vacas de alta produção nesta fase envolvem: fornecimento de forragem de alta qualidade para aumentar o consumo de matéria seca; provimento de fontes de ingestão de proteína não-degradável, incremento gradual de energia proveniente de grãos (máximo de 0,45 kg por dia); limitação da quantidade de gordura suplementar a 0,6 kg. Na terceira fase – intermediária (70 a 200 dias após o parto ou até as vacas secarem) - as vacas declinam à produção de leite. O pico de ingestão de matéria seca tem sido alcançado com ganho de peso. Quando a produção de leite ou os componentes declinam muito rapidamente, é sinal de que as necessidades nutricionais não estão sendo atingidas. O que garante o sucesso desta fase é a otimização da ingestão de matéria seca, devendo ser adotados, ainda, os seguintes procedimentos: início da reposição das condições corporais perdidas; elevação de gordura suplementar até os níveis desejáveis e revisão da necessidade de aditivos. A última fase pode começar 200 dias após o parto e terminar quando as vacas secarem, havendo possibilidade de não ser alcançada por alguns rebanhos e por animais de alta produtividade. Elas estão prenhes, ganham peso (0,450 a 0,700 kg por dia), e a produção de leite declina de 6% (vacas primíparas) a 9% ao mês (vacas multíparas). A estratégia de alimentação deve abranger: incremento de proporção de forragens na ração; possível diminuição de fontes suplementares de proteína nãodegradável; remoção de fontes suplementares de gordura; eliminação de aditivos; reposição das condições corporais perdidas; estabelecimento de níveis de condições corporais de 3,25 a 3,75 quando seca e redução do custo diário de alimentação por vaca. Agrupamento de vacas em lactação: Existe grande variabilidade na curva de lactação entre vacas, principalmente quanto à taxa de aumento na produção de leite do parto ao pico de produção e a persistência de lactação. O ideal seria o balanceamento de dieta para cada vaca do rebanho, pois a exigência nutricional é uma característica individual, na prática isso seria impossível do ponto de vista logístico e econômico. No entanto, muitos produtores de leite ainda utilizam uma única dieta para todos os animais em lactação, isto simplifica as tarefas, mas pode levar a superalimentação e ganho excessivo de condição corporal de animais menos produtivos. Além disso, seria utilizada maior quantidade de concentrado por kg de leite produzido, aumentando significativamente o custo alimentar por kg de leite. Neste sentido, agrupamentos bem feitos pode ser uma maneira eficaz de reduzir o custo alimentar (concentrado) na atividade leiteira. Além disso, o agrupamento não é uma ferramenta de manejo somente para rebanhos de alta genética. Estudos demonstraram que esta prática tende a ser mais eficiente em rebanhos menos produtivos. A resposta financeira e produtiva quando se aumenta o número de dietas é curvilíneo (cada unidade de incremento no número de grupos de alimentação resulta em resposta cada vez menor). Para atingir a eficiência máxima tem-se sugerido ao redor de três dietas. O tamanho e o número de grupos de alimentação dependem, principalmente, do espaço disponível no cocho, ou seja, do comprimento do cocho, do tempo de acesso ao alimento e do sistema alimentar. Nas fazendas que utilizam pastagem na alimentação de vacas em lactação ocorre alta competição devido à dieta ser fornecida em curral de alimentação e ao baixo tempo de acesso diário. Assim, o espaço linear no cocho dever variar de 0,75 a 1,00 m por vaca. Por outro lado, no caso do fornecimento de dieta completa, 0,60 m linear por vaca parece ser suficiente para um bom manejo do cocho. O principal objetivo do agrupamento de vacas é reduzir a variabilidade na exigência nutricional das vacas dentro do grupo e aumentá-la entre grupos. A meta é formar grupos homogêneos em requerimentos nutricionais por unidade de matéria seca da dieta. Neste sentido, se o produtor de leite entender os quatro fatores que influenciam as necessidades nutricionais (produção de leite, componentes do leite, ingestão de matéria seca e perda de peso), várias fases de alimentação podem ser desenvolvidas, ou seja, agrupamento, pelo menos, de acordo com a produção e a condição corporal. Na prática o produtor pode não necessitar de todas, mas precisará gerenciar as mudanças economicamente (considerando produção de leite versus custo de alimentação – o mais oneroso é o concentrado para faixa de produção acima de 500 litros de leite por dia - Figura 4). Se conseguir “controlar” a transição dos programas de alimentação, problemas metabólicos podem ser minimizados e a produção de leite, otimizada. A escolha do sistema de alimentação deve servir a essas exigências nutricionais identificadas, em cada caso específico. Figura 4 - Evolução dos principais itens em diferentes faixas de produção Se estas técnicas forem aplicadas corretamente, as vantagens na atividade leiteira serão evidentes, tais como: equilíbrio na condição corporal, melhora da produtividade, melhor eficiência reprodutiva e, conseqüentemente, redução do custo de produção.