Legislação
"Quanto mais burocracia, mais corrupção"
Essa é a afirmação do jurista Ives Gandra, que analisa o pacote anticorrupção apresentado
pela presidente Dilma Rousseff junto com o advogado mineiro Sacha Calmon
João Paulo Martins - Revista Encontro
Publicação:25/03/2015 13:12 - Atualização:25/03/2015 13:33
Em protesto contra a corrupção, em março deste ano, vários 'sacos de dinheiro' foram colocados na grama do
Congresso Nacional
O pacote anticorrupção enviado pelo governo ao Congresso Nacional no dia 18 de março
deste ano foi uma resposta às manifestações populares que eclodiram em diversas cidades
do Brasil no domingo dia 15 de março. Entre as propostas apresentadas pela presidenta
Dilma Rousseff estão a tipificação do crime de caixa 2 e a elaboração de um projeto de lei
que institui a obrigatoriedade de ficha limpa para todos os servidores públicos dos poderes
executivo, legislativo e judiciário.
Pelo pacote anticorrupção, quem for condenado pelo crime de caixa 2 após a aprovação
da proposta pelo Congresso poderá ficar preso de três a seis anos. A tipificação do crime
consiste, segundo a proposta do governo, na tentativa de fraudar a fiscalização eleitoral,
com a inserção de elementos falsos ou omissão de informações para ocultar a origem, o
destino ou a aplicação de bens, valores ou serviços da prestação de contas de partido
político ou de campanha eleitoral.
O pacote ainda prevê a regulamentação da Lei Anticorrupção, por meio de decreto que já
foi assinado pela presidente, com incentivo à adoção de programas de integridade
(compliance) por empresas privadas, com códigos de ética e de conduta, políticas e
diretrizes para detectar desvios e irregularidades contra a administração pública.
"Foi uma resposta imediatista a um clamor popular contra a corrupção, por motivos
óbvios. Nós já temos no plano das empresas, e que entrou em vigor no ano passado, uma
lei anticorrupção bastante dura, que imita a legislação americana. Executivos chegaram
a ficar preocupados porque poderiam ser responsabilizados pelas ações dos entes
jurídicos", diz o advogado mineiro Sacha Calmon, que atua na área há 50 anos.
Para ele, o Código Penal e o Código de Processo Penal são muito "lenientes". "Não apenas
em relação à corrupção, mas em relação a crimes contra a administração pública, ou seja,
peculato, concussão, corrupção ativa e passiva. As penas são muito pequenas, como
também os são os crimes automobilísticos, os sequestros seguidos de morte, o latrocínio
etc.", reclama o jurista.
Sacha Clamon lembra ainda que as penas brasileiras favorecem os criminosos, já que são
limitadas a 30 anos e permitem a progressão da pena – quando o acusado consegue ser
solto com anos de antecedência. "Existe ainda um resquício regaliano da época do rei: os
indultos natalinos e as solturas em qualquer festa. Está comprovado que 60% dos
bandidos não voltam", afirma o advogado.
Para ele, a lei deveria levar em conta o grau de importância política da pessoa que esteja
cometendo o crime. "Um juiz corrupto é a coisa mais horrenda que se pode imaginar. Um
ministro do executivo ou do judicionário corrupto é um crime hediondo. Se você está
usando de seu cargo para roubar a nação, o povo, o bem público, seja prefeito, vereador,
ministro, presidente, a pena tem de ser altíssima, que não permita progressão, nem
facilidades na cela", completa Sacha Calmon.
O jurista paulista Ives Gandra Martins: "Quanto maior e adiposa e esclerosada for a máquina
pública, maiores ainda serão as obrigações, e, assim, haverá mais corrupção"
Burocracia
Já o jurista Ives Gandra Martins – que é um dos apoiadores da campanha nacional pela
volta da moralidade, lançada pelo Clube Militar – vê com bons olhos o pacote
anticorrupção apresentado pelo governo. "Considero bom o pacote, mas é apenas uma
explicitação do que já está no Código Penal desde 1940. Sua eficácia vai depender da
capacidade daqueles que vão aplicá-la. O que é muito difícil numa máquina pública
extremamente
adiposa
como
a
nossa",
explica
o
advogado
paulista.
Para ele, o grande problema de nosso país é o excesso de burocracia. "Se ela fizesse um
pacote de enxugamento da adiposidade da máquina administrativa seria mais eficaz e não
teria de fazer a repressão, Além disso, a corrupção diminuiria pela descomplexidade da
máquina burocrática. Estou convencido de que a corrupção dominante no Brasil decorre
do excesso de burocracia. A presidente Dilma possui 113 mil funcionários não
comissionados, ou seja, que não prestaram concurso para a administração federal. Já o
Obama, possui 4 mil, e Angela Merkel, na Alemanha, apenas 60", conta Ives Gandra.
Além do pacote anticorrupção, o jurista diz que é muito importante que o governo
reconheça a inflação da máquina pública e faça sua "descomplexidade". "Quanto mais
complexa for a legislação, mais obrigações existem sobre o cidadão. Quanto maior e
adiposa e esclerosada for a máquina pública, maiores ainda serão as obrigações, e, assim,
haverá mais corrupção. Quanto mais burocracia, mais corrupção", finaliza o advogado
paulista.
(com Agência Senado)
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"Quanto mais burocracia, mais corrupção"