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AS CRIANÇAS E AS MARCAS: QUE RELAÇÃO POSSÍVEL? UM OLHAR A
PARTIR DAS MASCOTES
Children and brands, that relationship possible? A view from the mascots
Los niños y las marcas: que relación posible? Una mirada sobre las mascotas
Ana Côrte-Real1
Paulo de Lencastre2
Resumo
O presente texto tem o objetivo de apresentar as reflexões acerca das relações entre as
crianças e as marcas mediadas pelas mascotes. Para tanto foram integrados os
conhecimentos teóricos acerca das temáticas em questão por meio de Macklin (1996), Ji
(2002), Corte Real (2007), Lencastre (1997), Perez (2011), John (1999) entre outros e
dos resultados a partir da realização de grupos focais com crianças realizados na cidade
do Porto em Portugal, com o objetivo de investigar três semânticas específicas: abstrato
vs. figurativo, redondo vs. anguloso e simétrico vs. assimétrico. A síntese dos resultados
indica que as crianças mais velhas preferem e reconhecem melhor os estímulos
figurativos e, as mais novas preferem e reconhecem mais favoravelmente abstratos. Na
categoria semântica redondo vs. anguloso, verifica-se que as crianças do sexo feminino
reagem mais favoravelmente aos estímulos redondos e as do sexo masculino aos
estímulos angulosos. Ao nível da categoria simétrico vs. assimétrico as crianças do sexo
feminino preferem os estímulos simétricos e, estes são mais facilmente reconhecidos
pelas crianças mais velhas; as crianças do sexo masculino preferem os estímulos
assimétricos e estes são mais facilmente reconhecidos pelos novos.
Palavras-chave: marca, mascotes, crianças.
Abstract
1
Doutora em Marketing pelo ISCTE/Instituto Universitário de Lisboa e Mestre em Marketing pela
Universidade Católica Portuguesa. Professora do Departamento de Marketing da Universidade Católica
Portuguesa, Portugal. Coordenadora do Programa Internacional MBA Atlântico (Portugal, Brasil e
Angola) e dos programas Executive Master na mesma universidade. [email protected]
2
Doutor em Gestão e Semiótica pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica. Mestre em Gestão pela
Universidade do Porto. Professor do Departamento de Marketing da Universidade Católica Portuguesa,
Portugal. Professor visitante na ECA USP e na PUC SP. Pesquisador colaborador do GESC3 – Grupo de
Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]
SIGNOS DO CONSUMO – V.4, N.1, 2012. P. 57-65.
As crianças e as marcas: que relação possível? Um olhar a partir das mascotes
de Ana Côrte-Real e Paulo de Lencastre
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This paper aims to present the reflections about the relationship between children and
pets mediated brands. Therefore, we integrated the theoretical knowledge about the
topics concerned by Macklin (1996), Ji (2002), Royal Court (2007), Lancaster (1997),
Perez (2011), John (1999) among others and results from conducting focus groups with
children conducted in the city of Porto in Portugal, aiming to investigate three specific
semantics: abstract vs. figurative, vs round. vs. angular and symmetrical. asymmetrical.
A summary of the results indicates that older children prefer and better recognize the
stimuli and figurative, the newest recognize and prefer more abstract favorably. In
round vs. semantic category. angular, it appears that the female children react more
favorably to the stimulus round and the male to stimuli angular. At the category level vs
symmetrical. Asymmetric female children prefer symmetrical stimuli, and these are
more easily recognized by older children, children prefer male asymmetric stimuli and
these are more easily recognized by the new.
Keywords: brand, mascots, children.
Resumen
Este trabajo tiene como objetivo presentar las reflexiones sobre la relación entre los
niños y las marcas mediados por las mascotas. Por lo tanto, hemos integrado los
conocimientos teóricos sobre los temas en cuestión por Macklin (1996), Ji (2002),
Royal Court (2007), Lencastre (1997), Pérez (2011), John (1999) entre otros y los
resultados a partir de la realización de grupos focales con niños llevados a cabo en la
ciudad de Oporto, en Portugal, con el objetivo de investigar tres semánticas específicas:
Abstracto vs figurativo, redondo vs angular y simétrica vs asimétrica. Un resumen de
los resultados indica que los niños mayores prefieren y reconocem mejor los estímulos
figurativos y los más nuevos prefieren y reconocen mejor lo más abstracto. En la
categoría semántica redonda vs. angular, parece que las niñas reaccionar más
favorablemente a la redonda de estímulo y los niños a estímulos angulares. En la
categoría de nivel simétrico vs. asimétrico niñas prefieren estímulos simétricos, y éstas
son más fácilmente reconocibles por los niños mayores, los niños prefieren estímulos
asimétricos y estos son más fáciles de reconocer por los más jovenes.
Palabras-clave: marca, mascotas, niños.
1. AS CRIANÇAS E AS MARCAS
SIGNOS DO CONSUMO – V.4, N.1, 2012. P. 57-65.
As crianças e as marcas: que relação possível? Um olhar a partir das mascotes
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Para as crianças as marcas são provavelmente o aspeto mais relevante dos
mercados (John, 1999). As crianças adquirem informação relativa ao mercado por
observação e participação (aprendizagem acidental) e por instrução. Num dos estudos
pioneiros neste domínio, Guest (1942) verificou que as crianças entre os 7/8 anos de
idade sabem um elevado número de nomes de marcas.
Mesmo antes de saberem ler, as crianças, já são capazes de reconhecer as
embalagens e as marcas. Em idade pré-escolar as crianças demonstram competências
para recordarem nomes de marcas, sobretudo se forem fornecidas pistas visuais, como
cores, imagens ou mascotes (Macklin, 1996).
À medida que as crianças crescem a notoriedade das marcas aumenta. Por um
lado, a crescente capacidade das crianças reterem as marcas está diretamente associada
à sua idade. Por outro lado, a notoriedade das marcas desenvolve-se primeiro nas
categorias de produtos direcionados para as crianças, como os cereais, snacks e
brinquedos e, mais tarde para produtos direcionados para adultos (John, 1999).
As crianças veem as marcas como algo necessário, inerente ao mercado e
fundamentais para identificar a oferta: “tudo tem que ter marca”, “não existem coisas
sem marcas” (expressões obtidas em focus groups de crianças conduzidos pela autora,
Côrte-Real, 2007). A percepção das marcas como algo de verdadeiro pode ser ilustrada
a partir da relação que as crianças estabelecem com as marcas de “amor verdadeiro” (Ji,
2002): “eu sei que tudo que é Nike é bom, por exemplo, eu já tive sapatilhas de outras
marcas, e as da Nike não têm comparação, são muito melhores”.
Para as crianças as marcas são caras. Esta associação ilustra a dimensão do
conhecimento simbólico das marcas (John, 1999) refletindo de alguma forma a marca
como algo de aspiracional. De acordo com Ji (2002) a associação expressa a relação
metafórica que as crianças estabelecem com as marcas, denominada de “admirador
secreto”. As crianças admiram as marcas, elas são boas e caras: “quando for grande
quero ter um Jeep como o meu pai, mas como é uma marca muito cara, tem que ser
quando eu for bem mais velho”.
Menos frequente, mas revelador é o fato de que para algumas crianças as marcas
representarem uma troca justa, value for money: “existem marcas que são boas e não
são caras, como a Zara”. Esta associação reflete uma relação com a marca do tipo
“bons amigos” (Ji, 2002), uma marca em quem se pode confiar.
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No âmbito das associações menos favoráveis, algumas crianças veem as marcas
como exploradoras, falsas, que enganam, que no fundo não cumprem a sua promessa:
“às vezes as coisas têm marcas e são más”. Esta é uma associação que reflete a visão
das marcas como “inimigas” (Ji, 2002), as marcas que defraudam as expectativas.
2. AS CRIANÇAS E AS MASCOTES
As mascotes representam um tipo especial de sinais do mix de identidade das
marcas que possui características humanas ou animais. A sua função é antes de mais
afetiva, na medida em que dão vida anímica às marcas, potencializam o seu consumo e
criam vínculos de relação durável sustentada em emoções (Perez, 2011).
As mascotes são também úteis para criar notoriedade porque, como são ricas em
imagens e cor, captam a atenção do consumidor (Keller, 2008). Além do mais, as
mascotes da marca podem ajudar a comunicar atributos chave do produto/organização.
Se os consumidores tiverem um sentimento forte em relação a uma mascote irão muito
provavelmente criar percepções favoráveis acerca dos produtos ou organização com os
quais aquela mascote está associada.
A atitude das crianças face ao consumo goza de uma predominância do registo
afetivo: primeiro a criança gosta, depois formula o pedido e no final retém a alteração
cognitiva. Esta questão é determinante ao nível da comunicação da marca. As mascotes
são assim um símbolo visual da marca particularmente importante no segmento das
crianças, uma vez que permitem que elas estabeleçam uma ligação emocional com a
marca, e porque simultaneamente, favorecem a sua memorização.
Existem diferentes tipos de mascotes, bem como diferentes estratégias face à sua
denominação. Os nomes das mascotes podem ser iguais ao nome da marca, podem ter
um nome que faça alguma referência à marca sem ser exatamente igual, ou optarem por
ter um nome completamente diferente da marca.
No que respeita à tipologia das mascotes ela é muito variada. No entanto,
criamos uma taxionomia que não ambiciona de forma alguma a exaustividade da análise
dos diferentes tipos de mascotes, mas permite perceber as principais decisões a tomar
quando uma marca pretende adotar este sinal.
As mascotes são um tipo especial de personagens da marca. As personagens da
marca podem ser celebridades (como, por exemplo, Cristiano Ronaldo para Portugal ou,
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Ana Paula Arósio, para o Brasil) ou serem personagens criadas pela marca. No âmbito
das personagens criadas, elas podem ser pessoas reais (a Marta da Ok Teleseguro, o
Garoto Bombril – o ator Carlinhos Moreno), pessoas desenhadas (Betty Crocker), ou
imaginárias que denominaremos mascotes.
Dentro das mascotes, ou seja, das personagens criadas e imaginárias
antropomórficas, elas podem ser mais próximas da figura humana, e assim as
designamos de mascotes humanóides (Ronald McDonald), de figuras animais (Tigre
Tony da Frosties - Sucrillos) ou baseadas na antropomorfização de produtos (Chiquita
Banana). Esta taxionomia é representada na figura seguinte:
Celebridades
Reais
Pessoas
Personagens
Desenhadas
Criadas
Humanóides
Mascotes
Animais
Produtos
Fig. 1 - Taxionomia das personagens da marca. Adaptado de Côrte-Real (2007)
As mascotes sendo uma personagem criada, desde logo detêm determinadas
vantagens face às celebridades. Vejamos algumas delas a seguir.
Primeiro, ao criar-se uma personagem, os marketeers têm a liberdade de criar as
suas características individuais, enquanto as celebridades já detêm os seus traços, não
permitindo a manipulação pela marca. Nas personagens criadas, os marketeers podem
desenhar especificamente os traços portadores dos atributos desejados.
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Em segundo lugar, enquanto as celebridades frequentemente caucionam mais do
que uma marca, as personagens criadas são quase sempre concebidas para caucionar um
único produto ou uma única marca. Um dos princípios da eficácia das personagens
depende da sua congruência com o(s) produto(s) caucionado(s). Esta congruência é
geralmente superior quando a personagem é criada.
Nesta situação de criação de uma mascote, devemos perceber que para as
crianças as mascotes são “bonecos”, engraçados, divertidos, meigos, que podem ser
“meios homens, meios bonecos”. Efetivamente são sinais que não provocam muitas
associações negativas, embora o seu impacto dependa das características de design que
apresentam e do segmento a que se destinam.
Assim e de um ponto de vista do marketing, é importante perceber que as
marcas podem não agir, pensar ou sentir, no entanto as mascotes contribuem para que
elas se tornem vivas. Importa por isso aceitar a dimensão comportamental a que as
mascotes são associadas, na medida em que se o fizermos estaremos necessariamente a
fortalecer a relação das marcas com as crianças.
Para que este resultado ocorra é importante não esquecer que as características
de design das mascotes influenciam as respostas obtidas, que por sua vez também
dependem da idade e do gênero da criança.
Apresentamos aqui os resultados mais relevantes no que respeita a 3 categorias
semânticas particularmente analisadas na pesquisa em estética experimental: abstrato vs.
figurativo, redondo vs. anguloso e simétrico vs. assimétrico.
1.
As crianças mais velhas preferem e reconhecem melhor os estímulos figurativos
e, as mais novas preferem e reconhecem mais favoravelmente abstratos, sendo o
género da criança relativamente indiferente;
2.
No que respeita à categoria semântica redondo vs. anguloso, verifica-se que as
crianças do sexo feminino reagem mais favoravelmente aos estímulos redondos
e as do sexo masculino aos estímulos angulosos;
3.
Ao nível da categoria simétrico vs. assimétrico as crianças do sexo feminino
preferem os estímulos simétricos e, estes são mais facilmente reconhecidos pelas
crianças mais velhas; as crianças do sexo masculino preferem os estímulos
assimétricos e estes são mais facilmente reconhecidos pelos novos.
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Numa análise conjunta representada na figura 2 verificamos que o abstrato é
mais jovem, o figurativo é mais adulto; o redondo é mais feminino, o anguloso é mais
masculino. Em termos afetivos o simétrico é mais feminino, o assimétrico é mais
masculino; mas em termos cognitivos, o simétrico é mais adulto e o assimétrico é mais
jovem.
Redondo
Rapariga
étr
m
Si
Figurativo
Abstracto
ico
é
sim
As
c
tri
o
Rapaz
Anguloso
Mais novos
Mais velhos
Afecto
Reconhecimento
Fig. 2 - A atitude das crianças face às características de design. Côrte-Real, 2007
Podemos perceber que a clássica vantagem da figuratividade (Lencastre, 1997),
e também da simetria, apenas se acentuam com o evoluir da idade, pelo que as crianças
mais jovens aceitam muito bem as mascotes mais abstratas e assimétricas.
Podemos também perceber que as crianças do sexo feminino estão mais
próximas do ideal clássico, associado à simetria, ao equilíbrio, à harmonia e suavidade.
Por sua vez as crianças do sexo masculino aceitam mais favoravelmente as formas
associadas ao conflito, à dureza, as formas que criam maior agitação e tensão.
3. ORIENTAÇÕES PARA A PRÁTICA DAS MARCAS
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Da pesquisa realizada podemos concluir algumas grandes orientações para a
prática da utilização das mascotes na comunicação das marcas com as crianças:
1.
As crianças são especiais, são exigentes como consumidoras, sensíveis às
marcas, entendem-nas e classificam-nas: umas marcas tornam-se amigas, outras
admiradas, outras são consideradas justas, mas algumas, as que defraudam as
expectativas, são inimigas.
2.
O desafio do marketing infantil está relacionado com o facto de a criança centrar
toda a sua resposta num único estímulo. Se gostarem desse estímulo,
desenvolvem uma resposta favorável à marca; no caso contrário, rejeitam-na. A
questão que se coloca é: qual será o estímulo? a embalagem? a cor? o nome da
marca? o produto em si? a mascote? ...
3.
As mascotes das marcas são o sinal mais relevante da marca junto do target
infantil. No entanto o seu impacto depende das características de design das
mascotes e do segmento a que se destinam, nomeadamente o género e a idade.
4.
O abstrato é mais jovem, o figurativo é mais adulto. O redondo é mais feminino,
o anguloso é mais masculino. Em termos afetivos o simétrico é mais feminino, o
assimétrico é mais masculino; mas em termos cognitivos, o simétrico é mais
adulto e o assimétrico é mais jovem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CÔRTE-REAL, Ana (2007), As Atitudes das Crianças face às Mascotes das Marcas.
Lisboa: Instituto Universitário de Lisboa, Tese de Doutoramento.
Guest, Lester P. (1942), The Genesis of Brand Awareness, Journal of Applied
Psychology, 26: 800-808.
JI, Mindy F. (2002), Children´s Relationships with Brands: “True Love” or “One Night
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JOHN, Deborah R. (1999), Consumer Socialization of Children: A Retrospective Look
at Twenty-Five Years of Research, Journal of Consumer Research, 26 (3): 183-213.
KELLER, Kevin L. (2008), Strategic Brand Management: Building, Measuring and
Managing Brand Equity, Upper Saddle River: Prentice-Hall.
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LENCASTRE, Paulo de (1997), L`Identification de la Marque, un Outil de Stratégie
Marketing: le Lom de la Marque, le Logotype et la Mémorisation (A Identificação da
Marca, um Instrumento da Estratégia de Marketing: o Nome da Marca, o Logotipo e a
Memorização), Louvain-la-Neuve: Université Catholique de Louvain, Tese de
Doutoramento.
MACKLIN, M. Carole (1996), Pre-schooler Learning of Brand Names from Visual
Cues, Journal of Consumer Research, 23: 251-261.
PEREZ, Clotilde (2011), Mascotes: Semiótica da Vida Imaginária, São Paulo: Cengage
Learning.
Artigo recebido: 04/2012
Artigo aprovado: 06/2012
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