CORREIO ECONÓMICO 3 EDIÇÃO 235 - SÁBADO DIA 11 DE OUTUBRO DE 2014 João Santos, Vice–Presidente do FED em Nova Iorque na Conferência “Desenvolvimento em Pequenas Economias” que se realizou nas Furnas “O Estado, em vez de se concentrar, divergiu as atenções, e não fez bem o que deveria ser bem feito, como por exemplo a reforma da justiça” A Delegação Regional dos Açores da Ordem dos Economistas, organizou na 5ª feira no Casino das Furnas a primeira de um ciclo de conferências que se designou Conferência das Furnas, que será organizada anualmente, e cujo tema da primeira edição foi “ Desenvolvimento em Pequenas Economias”. Um evento muito bem organizado, que contou com a presença de importantes oradores, onde se destaca o açoriano João Santos, Vice–Presidente do FED em Nova Iorque, que falou sobre os “Limites à influência do estado no crescimento económico”, Francisco Veloso Reitor da Católica Business Scholl, que falou sobre o “Desenvolvimento de clusters tecnológicos regionais em Portugal e em outros lugares”, José Tavares, professor associado de economia na Universidade Nova, que introduziu o tema “A política económica na integração institucional” e Enrico Spolaore é professor de Economia na Tufts University. Este evento, que no painel da manhã foi moderado por António Gomes de Menezes, decorreu ao longo de todo o dia, e estiveram nas Furnas mais de meia centena de participantes, cuja sessão de encerramento foi presidida pelo Bastonário da Ordem dos Economistas, Rui Leão Martinho. A primeira intervenção do dia esteve a cargo de João Santos. O Vice–Presidente da FED em Nova Iorque, apresentou algumas considerações importantes, como por exemplo a relação entre o crescimento da dívida e do produto desde 2002 para cá, período que coincidiu com a entrada de Portugal no euro, onde Portugal teve um crescimento da dívida de 150%, os Açores 170% e o crescimento do produto nos Açores foi muito inferior ao da dívida sendo de apenas 20%, ou seja similar ao continente. Referiu ainda que, o rácio da dívida sobre o produto incorporando o aumento da dívida, levaria a que o crescimento do produto nos Açores fosse para mais do dobro, e não se quedasse pelos 20%. João Santos deu exemplos de quando o Estado deve intervir na economia: Bens públicos–Ex defesa nacional, Falhas do mercado – por via de externalidades negativas, como por exemplo a poluição, externalidades negativas ocorridas em actividades não regulamentadas, dando como um bom exemplo o que foi demonstrado pelo BANIF. Fora destes universos tudo o que se deve fazer deve ter razões muitos fortes, e isto porque o Estado não tem capacidades únicas para discernir entre intervir na empresa A e não na empresa B ou no sector A e não no B. Referiu ainda que o Estado tem poderes únicos, e consegue impor as suas decisões, não tem capacidades únicas, mas tem poderes únicos, com impactos enormes. Tem que se fazer uma análise positiva dos problemas resultantes da formação de “incentivos” à economia. Deu um exemplo. ”O Governo português tem participações que não lembra ao diabo, como por exemplo a Companhia de Cervejas da Estrela”. Em suma, o Estado está a intervir e a exercer uma influência muito para além do desejável: exemplo positivo o Banif, exemplo negativo a CGD, porque o Estado não tem que ter um banco num cenário normal. “O crescimento da dívida não se reflectiu no aumento do produto” Das conclusões da sua intervenção referiu que o crescimento da dívida não se refletiu no aumento do produto. ”Este problema não é exclusivo dos Açores – na comparação das regiões autónomas entre Portugal e Espanha, na Madeira, o crescimento exponencial da dívida tem a maior divergência entre o crescimento do produto e o crescimento da dívida. As Canárias estão pior”, referiu. Como notas finais referiu que o Estado em vez de se concentrar divergiu as atenções, e não fez bem feito o que deveria ser feito, por exemplo a reforma da justiça. Existem limites ao papel do Estado no crescimento económico? Sim existem e a realidade portuguesa demonstra–o, ou seja, o patamar de intervenção deve ser muito mais elevado e a forma de o fazer muito mais bem pensada e desenhada bem como a celeridade das decisões. Na próxima edição falaremos das restantes intervenções. Com a colaboração de Luciano Melo «Comprando gato por lebre»: Compra e Venda, Penhora e Execução Por: Rui Melo Cordeiro* 1. Descendo a Rua dos Mercadores o “Zé Colmeia” cruza-se com o seu amigo «Tó Não Acredito em Milagres” e diz-lhe: “Fiz um belo negócio! Comprei um apartamento por «meia dúzia de patacos»!”. 2. O Tó, admirado, perguntou: “Como?, Quais as condições do negócio? Onde fica?” . 3. “Eh pah, fica ali «Para lá de Sol posto», num condomínio fechado com box,vista para o mar, campo de golfe e tem, vê lá tu, um observatório de estrelas e naves espaciais!”. 4. “Parabéns”, rematou o Tó, desconfiado! 5. “Só tem um problema”, disse o Tó: “tem uma penhora registada a favor do “Banco Marciano”, no valor de 2.000,00€. Mas resolvi tudo na hora. Paguei o apartamento ao proprietário, fiz a escritura pública e para a semana vou ao “Tribunal Espera lá que já vês” pagar este dinheiro a fim de libertar o prédio da penhora! 6. “E isso não vai dar chatice”, disse o Tó, cada vez mais, desconfiado! 7. “Cá nada! É tranquilo”, disse o Zé Colmeia, cheio de moral. 8. Chega a 2ª feira e lá vai o Zé Colmeia com os 2.000€, ao “Tribunal Espera lá que já vês” para pagar a dívida do anterior proprietário. 9. Qual não é o seu espanto quando é informado pela funcionária do Tribunal que a dívida era, a final, de 55.000,00€ 10. E agora? 11. Resulta do disposto nos artºs 817º e segs. do Código Civil, que, em caso de incumprimento da obrigação pecuniária, o credor tem o direito de executar o património do devedor. 12. Através da penhora o exequente adquire o direito de ser pago com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior, por exemplo a hipoteca. 13. Assim, penhorado o imóvel por comunicação do solicitador de execução à Conservatória de Registo Predial, é inoponível à execução a venda posteriormente efectuada pelo executado. 14. É o que reza o disposto no art. 819º do Código Civil: “sem prejuízo das regras do registo, são ineficazes em relação ao exequente os actos de disposição, oneração ou arrendamento dos bens penhorados”. 15. O valor da penhora era meramente indicativo! 16. O Zé Colmeia apenas poderia fazer cessar a execução, requerendo a liquidação da responsabilidade do executado, ao abrigo do disposto nos artºs 916º a 919º e sempre sem prejuízo do disposto no artº 920º, todos do Código de Processo Civil então aplicável. 17. Sucede que o Banco Marciano tinha várias execuções cumuladas para o pagamento de várias dívidas contra o vendedor do imóvel (cumulação sucessiva com base no mesmo título – sentença – correspondendo a execução cumulada à parte da indemnização entretanto liquidada). Ou seja, teria de ser pago o valor de 55.000,00€ relativo à quantia exequenda, juros e custas processo... 18. Não era possível levantar a penhora sem o pagamento do total da dívida! 19. Moral da história e «atalhando que se faz tarde»: para a próxima quando o Zé Colmeia quiser comprar um imóvel, além da consulta da certidão do registo predial e da caderneta predial urbana que aproveite o passeio com a família à cidade, compre no comércio tradicional, dê um «saltinho» ao Tribunal e pergunte, como «quem não quer a coisa», qual o valor em dívida do proprietário do imóvel. 20. Não faça com o Zé Colmeia: não vá como muita sede ao pote. Se parecer que é bom demais para ser verdade, regral geral, é porque não é verdade. 21. Prefira um banho no pesqueiro do que uma «banhada» nas poupanças! *Advogado. MGRA & Associados. [email protected]