Siderurgia na Amazônia oriental brasileira e a pressão sobre a floresta primária Maurílio de Abreu Monteiro* Resumo Na década 1980, as tentativas estratégicas de modernização da Amazônia, concebidas pelo Estado nacional, foram decisivas no deslocamento de importantes atores sociais para a região, dentre os quais se incluem indústrias siderúrgicas. Para produzirem ferro-gusa, estas empresas, além do minério de ferro, usam como insumo o carvão vegetal. Em função da elevada participação do carvão vegetal nos custos de produção, estas companhias buscam adquirir o carvão vegetal cuja biomassa utilizada na sua produção seja originária da floresta primária, pois os custos são significativamente inferiores ao produzido a partir da biomassa originária da silvicultura. O artigo demonstra que duas décadas de funcionamento destas indústrias foram suficientes para sepultar o discurso empresarial e as polêmicas acerca do possível surgimento, na região, de grandes áreas reflorestadas com a finalidade de atender à demanda crescente de carvão vegetal. Indica também que, além de ampliar a pressão exercida sobre a floresta primária, a produção regional de ferro-gusa favoreceu a concentração fundiária, contribuiu com dinâmicas sociais que reforçam a caotização de diversos espaços urbanos, acirrou a concentração fundiária e intensificou os esquemas de submissão da força de trabalho à baixa remuneração e a condições de trabalho insalubres. Dinâmicas que representam brutal transferência de custos privados para a sociedade. * Professor e pesquisador do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPa. E-mail: [email protected] Siderurgia na Amazônia oriental brasileira e a pressão sobre a floresta primária Introdução A gênese da produção regional do ferro-gusa O impulso inicial para a instalação regional destas indústrias siderúrgicas está intimamente atrelado a tentativas estratégicas de modernização da Amazônia, concebidas e implementadas pelo Estado nacional na década de 1980. Foram ações cujos supostos teóricos, práticas e instrumentos de intervenção eram vinculados à chamada “economia do desenvolvimento”. A perspectiva de intervenção estatal no início daquela década se baseava em tais supostos e práticas, apesar de, naquela década, em termos mundiais sofrerem restrições crescentes, neles, apoiando-se noções como as de “crescimento desequilibrado”, “efeitos de encadeamento”, “complexos motrizes” etc. Naquele contexto, o discurso oficial anunciava o PGC como um programa integrado de desenvolvimento regional capaz de industrializar e modernizar a fração Oriental da Amazônia brasileira. (Brasil, 1981). Uma transformação social que seria estabelecida a partir de “efeitos dinamizadores em cadeia” e da “internalização das rendas” decorrentes da “base de exportação” de produtos minerais. Propugnavam os planejadores oficiais, que de tais dinâmicas decorreria a edificação de “um complexo industrial metal-mecânico” tendo como primeiro estágio as indústrias sídero-metalúrgicas. Foi previsto que “os encadeamentos para frente das atividades siderúrgicas engendrariam a criação de um parque metal-mecânico, cujo porte ensejaria a criação de pelo menos 44 mil empregos diretos no ano de 2010” (Brasil, 1989: 19). A base deste complexo industrial seria as atividades siderúrgicas. Os planos governamentais admitiam que a implantação de um parque siderúrgico acarretaria um consumo significativo de carvão vegetal, prevendo que, no ano 2000, seria consumido 1,4 milhão de toneladas só para a produção do ferro-gusa (Brasil, 1989: 242). Reconhecia-se ainda que tal demanda significaria mais um elemento de pressão sobre a floresta. Indicava-se como alternativa a utilização do coco-de-babaçu, o manejo florestal e a silvicultura como fontes de biomassa, além da utilização de métodos de carbonização que adotassem tecnologias avançadas em vez dos rústicos fornos comumente chamados de “rabo-quente”. Mesmo em número e velocidade menor do que indicava o planejamento estatal, nas últimas décadas, instalaram-se na região treze siderúrgicas voltadas tão somente à produção de ferro-gusa, sendo por isso denominadas de produtoras independentes (Fig.1) Diferentemente, portanto, das siderúrgicas chamadas de integradas, que operando em escala de produção muito ampla têm a sua produção partindo do minério de ferro e indo até o produto final, tal como chapas e tarugos de aço. Fig. 1: Tabela com indicação das siderúrgicas instaladas na Amazônia Oriental brasileira. Empresa Localização Força de Número de Capacidade trabalho alto-fornos instalada Maranhão Gusa S.A. Bacabeira – MA 96 01 108 (MARGUSA) Companhia Siderúrgica do Pindaré Mirim – MA 150 02 260 Maranhão (COSIMA) Susa Industrial Pindaré Mirim – MA 120 01 120 Companhia Siderúrgica Vale do Açailândia – MA 150 02 240 Pindaré Viena Siderúrgica do Maranhão Açailândia – MA 635 04 430 Gusa Nordeste S.A. Açailândia – MA 180 02 216 Siderúrgica do Maranhão S.A. Açailândia – MA 150 02 190 (SIMASA) 170 02 200 Ferro-gusa do Maranhão Açailândia – MA (FERGUMAR) Companhia Siderúrgica do Pará Marabá – PA 260 04 460 (COSIPAR) Marabá – PA 220 02 220 Siderúrgica Marabá S.A. (SIMARA) 96(a) 01 108 Usimar Marabá – PA Siderúrgica Terra Metais Marabá – PA 70(a) 01 54 (a) Siderúrgica Ibérica Marabá – PA 120 01 120 (a) 2.417 25 2.726 Totais (a) Estimativa. Fontes: FIEMA (1995), FIEPA (1999), JUCEPA (1998), e Asica e Monteiro (2000). Estas guseiras receberam colaboração financeira através de recursos públicos oriundos do Fundo de Investimentos do Nordeste – FINOR – e do Fundo de Investimentos da Amazônia – FINAM. Uma vez aprovados os projetos, seus signatários recebiam até 75% do valor total indicado como necessário à implantação do parque industrial e à aquisição de áreas destinadas ao desenvolvimento de supostos projetos de “manejo florestal” ou de reflorestamento. Desenhou-se, portanto, uma situação na Amazônia Oriental brasileira, na qual se tem ampliado ano a ano a produção de ferro-gusa que já ultrapassou o volume de 2 milhões de toneladas/ano (Fig. 2). 3 Figura 2: Gráfico com indicação do volume de ferro-gusa produzido na Amazônia Oriental brasileira 2200 2035 2000 1878 1800 Milhares de toneladas 1600 1341 1400 1532 1197 1200 960 1000 685 800 600 354 400 200 374 389 754 703 423 261 95 0 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Anos Fontes: Superintendência da Estrada de Ferro Carajás e Asica. A produção regional de ferro-gusa deverá ser ampliada nos anos seguintes com a construção de novos alto-fornos por empresas já em operação e da possível instalação de novas empresas. Dentre elas a CVRD que pode instalar em Marabá, PA e em Açailândia, MA, cinco alto-fornos para a produção de ferro-gusa com capacidade para produzir, anualmente, até 200 mil toneladas cada. Carvoejamento: principal elo de ligação da produção do ferro-gusa com a economia regional Após mais de duas décadas de operação, a produção da siderurgia primária da Amazônia é quase integralmente dirigida ao mercado internacional, especialmente para os EUA. Em 2002, das 2,16 milhões de toneladas exportadas, 94% foram destinados para aquele país. E a pequena parcela que se destina ao mercado nacional sofre processos de transformação industrial, que lhe agregam maior valor, em outras regiões e não na Amazônia Oriental brasileira. De tal forma que não se confirmaram, até o presente, as predições de que estas indústrias seriam capazes de propiciar os efeitos dinamizadores da economia regional e serviriam como base de um parque industrial diversificado e interligado entre si. No que tange à geração de empregos, pode-se constatar que o número de empregos diretos gerados é pequeno se comparado à população dos municípios nos quais se 4 instalaram, não sendo capaz de impulsionar significativas alterações na conformação do mercado de trabalho regional. A geração dos 2,4 mil empregos diretos (Fig. 1) evidencia uma distância enorme entre o cenário tendencial vislumbrado no Plano Diretor da Estrada de Ferro Carajás, no qual se apontava a perspectiva do surgimento de 21.658 empregos diretos no ano 2000, só no setor de siderurgia e ferro-ligas (Brasil, 1989: 392). A massa de salários gerada em decorrência da operação destes empreendimentos, também não é capaz de provocar alterações no perfil de renda da região. Os salários pagos pelas empresas siderúrgicas, além de não serem em grande número, são de baixo valor, a média salarial mensal dos empregos gerados por estes empreendimentos é de US$ 200 (Monteiro, 1998a: 126) (Fig. 3). Foto: Maurílio Monteiro Figura 3: Foto de operário de siderúrgica controlando o fluxo de ferro-gusa proveniente do alto-forno. Outro aspecto que poderia ser significativo na relação entre as produtoras de ferrogusa e a economia regional seria a receita tributária oriunda desta atividade. Contudo, as isenções fiscais sobre os lucros dos empreendimentos e sobre a comercialização de seus produtos reduzem significativamente o volume de tributos pagos por estas indústrias. Assim, o principal elo de articulação destas indústrias industriais com a sócioeconomia da região é a demanda de carvão vegetal, não só pelos valores movimentados, mas principalmente pelo surgimento de variadas e diversas estruturas sociais que passaram a viabilizar a produção do carvão vegetal. Esta demanda impulsiona transformações sociais na região. Dentre elas o surgimento de um grande contingente de trabalhadores dedicados à produção de carvão vegetal. 5 Siderurgia e a propensão ao consumo de carvão vegetal originário da mata nativa Se por um lado a demanda de carvão vegetal constitui o principal elo de articulação das siderúrgicas com as dinâmicas sociais e ambientais da região, por outro, estas empresas são impulsionadas a pagar o menor preço possível por este insumo. Pois a aquisição do carvão vegetal absorve parcela expressiva dos custos que envolvem a produção de ferrogusa, representam, em média, 40% dos custos operacionais relativos à produção de uma tonelada de ferro-gusa. No que se refere aos outros insumos a Companhia Vale do Rio Doce – CVRD –, além da hematita, fornece às siderúrgicas os serviços de transporte do minério, do ferro-gusa e o embarque marítimo deste. Insumos e serviços que representam aproximadamente 28% dos custos operacionais que envolvem a produção de uma tonelada de ferro-gusa por estas siderúrgicas. Em função das características do mercado, o carvão vegetal é o insumo através do qual as produtoras independentes tendem a controlar sua margem de lucro. Como o preço do carvão vegetal produzido tendo por base florestas plantadas atinge US$ 100/t, montante que é significativamente superior ao daquele carvão elaborado a partir da lenha originária de mata nativa. Assim, a utilização de carvão vegetal proveniente de silvicultura implicaria ampliação nos custos de produção do ferro-gusa que não poderia ser assimilada pelas siderúrgicas independentes, pois a tonelada de ferro-gusa foi vendida, em 2002, em termos médios, por pouco mais de US$ 103. Assim, tanto no Sudeste, como na Amazônia Oriental brasileira (Fig. 4), as siderúrgicas independentes recorrem ao carvão de mata nativa. É justamente por isto que a primeira década de funcionamento destes projetos siderúrgicos na Amazônia encarregou-se de sepultar o discurso empresarial e as polêmicas acerca do possível surgimento, na região, de grandes áreas reflorestadas, com a finalidade de atender à demanda crescente de carvão vegetal das siderúrgicas independentes. Empresas instaladas na região não cumpriram nenhum dos Planos Integrados Floresta/Indústria – PIFIs –, nos quais são estabelecidas as diretrizes e metas em relação à origem do material a ser carbonizado, especialmente no que se refere à implantação da silvicultura. Esta também é a realidade existente no Sudeste do País. Lá também, as exigências do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA – para que indústrias siderúrgicas assegurassem, até 1992, o consumo de 70% do carvão originário de reflorestamentos, uma proporção que deveria atingir 100% ano de 1995, foram sistematicamente desrespeitadas (Brasil, 1995: 25). 6 Figura 4: Mapa com a indicação da localização das indústrias siderúrgicas na Amazônia Oriental brasileira. Ac R3 ará d. B Ro R io 16 Tomé-Acu São Luís Paragominas i ru p Santa Inês Ulianópolis Rod. PA-150 Goianésia Dom Elizeu Jacundá n Tra Rod. Bacabeira Gu apim R io R io C Be lém-Brasília Ro d. Rio Tocantins Tailândia R d io Pin sa m Rodon do Pará Es a ré t ra da d e eF C rro ar aj á s Vitorino Freire az ô n ic a R o d. B Marabá R 222 São Domingos do Araguaia Parauapebas ia o gu a Ri Curionópolis Ara Companhia Siderúrgica do Pará (COSIPAR), Siderúrgica Marabá S.A. (SIMARA), Usimar, Siderúrgica Terra Norte e Siderúrgica Ibérica. Companhia Siderúrgica Vale do Pindaré, Viena Siderúrgica do Maranhão, Gusa Nordeste S.A., Siderúrgica do Maranhão S.A. (SIMASA ) e Ferro-gusa do Maranhão. Companhia Siderúrgica do Maranhão (COSIMA) e Susa Industrial Maranhão Gusa S.A. (MARGUSA) Locais onde se concetra a produção de carvão originário de resíduos de madeira serrada Terminal Portuário de Ponta da Madeira Rios, Igarapés Usinas de ferro-gusa Estrada de ferro Minas da Serra dos Carajás Estrada/Rodovia Sede municipal Fonte: Monteiro (2002) modificado. Por conseguinte, a biomassa utilizada na produção de carvão vegetal para abastecer as produtoras de ferro-gusa na Amazônia Oriental brasileira origina-se quase integralmente de madeira oriunda da mata primária, sendo desprezível a parcela originária da silvicultura ou mesmo da carbonização do coco de babaçu. A organização da produção do carvão vegetal O material lenhoso responsável pelo abastecimento de milhares de fornos onde é produzido o carvão vegetal, apesar de ser originário da mata primária é oriundo de 7 atividades distintas, daquelas que envolvem desmatamentos para implantação de pastagens ou roças; das serrarias onde utiliza aparas de madeira; e, em menor proporção, nas áreas dos denominados “manejos florestais sustentados”. Para a produção de carvão vegetal se estabelece uma variada gama de relações sociais, mas que em termos gerais quando a lenha é originária de desmatamentos para a implantação de pastagens ou para outro tipo do cultivo da terra em fazendas, em empresas latifundiárias ou mesmo em pequenas e médias propriedades rurais, os donos da terra cedem a área e nada cobram pela lenha retirada, exigindo, em contrapartida, que os fornecedores de carvão entreguem a área “limpa” para o plantio, quase sempre de capim; ou eles próprios dirigem a produção do carvão vegetal; neste caso, são na maioria fazendeiros e médios proprietários. Quando é o proprietário da fazenda quem dirige a produção carvoeira, pode contratar diretamente o serviço dos trabalhadores para a broca, que consiste em roçar o mato baixo para facilitar a derrubada, que é a operação de derrubar as árvores e transporte da lenha, como também pode recorrer ao serviço de um empreiteiro que fará a intermediação na contratação, remuneração e administração da força de trabalho. Este empreiteiro é denominado gato. Quanto maior a área a ser desmatada, maior a freqüência de contratação da força de trabalho intermediada por um gato. Na operação de carbonização, quando ocorre em pequenas carvoarias, invariavelmente o carvoeiro recebe a lenha na “boca do forno” e tem sua remuneração baseada no volume da produção do carvão, sendo responsável pela contratação de outros trabalhadores, aos quais remunera tendo por base o pagamento por dia trabalhado, a diária. Quando o fornecedor de carvão recebe a área de um proprietário fundiário para entregá-la “limpa”, constrói uma rede de empreitadas que se inicia com a contratação de um gato, o qual será responsável pela broca; pela derrubada, ao que se segue o corte, que consiste em cortar a madeira, em conformidade a um padrão, para ser posteriormente empilhada. O transporte da lenha pode ser entregue a outra pessoa, que geralmente possui um pequeno trator de pneus, ou um caminhão. Neste caso, a remuneração vincula-se ao volume de lenha transportada, ou mesmo ao volume de carvão produzido pela carvoaria. O responsável pelo transporte, por sua vez, contrata outros trabalhadores que o auxiliarão e receberão o pagamento tendo por base os dias trabalhados (Fig. 5). 8 Foto: Maurílio Monteiro Figura 5: Foto de lenha proveniente de desmatamento, transportada para ser carbonizada. O processo de carbonização pode ser conduzido pessoalmente por aquele que recebeu a área do proprietário fundiário, contratando, neste caso, outros trabalhadores para auxiliá-lo, ou pode ser repassado a um carvoeiro, que será remunerado pelo volume do carvão produzido. Existe uma outra combinação, na qual o proprietário da fazenda constrói os fornos, cede um trator, ou um caminhão para o transporte da lenha, mas a administração de todo o processo de carbonização cabe ao carvoeiro, que recebe 15% do volume do carvão produzido pela carvoaria. Os custos com o corte e transporte da lenha são de responsabilidade do dono da fazenda, e os com a carbonização, de responsabilidade do carvoeiro. Justamente por isto não é possível, atualmente, estabelecer uma relação entre os pequenos fornecedores de carvão e os camponeses, pois, na maioria dos casos, os fornecedores utilizam lenha de propriedades alheias, que lhes é cedida. Deste modo, um pequeno fornecedor de carvão vegetal quase sempre está utilizando a lenha oriunda de um latifúndio e não necessariamente de um minifúndio. Quando se trata da produção realizada em minifúndios, no geral, não se tratam de atividades realizadas por famílias com tradição camponesa. A produção do carvão tem influência direta nos mecanismos de privatização da terra. É uma atividade que auxilia mecanismos de ocupação da terra utilizados pela grande empresa que se latifundiza e pelos fazendeiros, pois atua como uma forma de incentivo ao desmatamento para a formação de pastos, uma vez que diminui os custos do desmatamento para o plantio do capim. Favorece também a concentração fundiária por outra via, pois os 9 próprios capitais industriais latifundizaram-se, uma vez que as guseiras adquiriram grandes propriedades fundiárias destinadas à implantação de supostos projetos de manejo florestal sustentado. Já quando a biomassa a ser carbonizada é originária de aparas e de outros resíduos da madeira utilizada por serrarias, geralmente o proprietário da serraria permite a instalação dos fornos na área da própria serraria, cede os resíduos da madeira por ela descartada e em contrapartida exige que do pátio da serraria sejam retirados todos os rejeitos do beneficiamento da madeira, inclusive aqueles que não se prestam à carbonização. Há uma grande variedade de acordos estabelecidos entre os fornecedores de carvão vegetal e os proprietários das serrarias, que tem implicação direta sobre a divisão dos valores auferidos com a venda do carvão. No processo de carbonização, o fornecedor de carvão contrata um ou mais carvoeiros, que recebem pelo volume de carvão produzido e arcam com os custos da carbonização. Em alguns casos, nas pequenas carvoarias, o processo é dirigido pessoalmente pelo fornecedor, que também é o carvoeiro e contrata auxiliares que são remunerados com base em diárias. No caso da produção de carvão utilizando-se resíduos de madeira serrada, ela tende a ser desenvolvida nos terrenos das serrarias, dentro de áreas urbanas, e daquelas que quando não instaladas nos terrenos das serrarias encontram-se o mais próximo possível delas, pois os custos com o transporte da madeira até os fornos onde será carbonizada têm uma participação significativa na composição dos custos totais da produção do carvão vegetal. Assim, em função do baixíssimo preço do carvão, a localização das carvoarias o mais próximo possível das madeireiras é uma das condições para reduzir os preços de produção do carvão vegetal, embora isto implique na poluição de áreas urbanas. Ampliando, assim, o nível de caotização de núcleos urbanos na região. A oposição por parte dos moradores que residiam próximo às serrarias, à instalação de fornos destinados à carbonização dos resíduos da madeira em áreas urbanas surgiu com os primeiros fornos instalados, e em diversos municípios se logrou êxito na transferência da produção de carvão para áreas mais afastadas dos núcleos urbanos. Isto se fez por intermédio da construção de centrais de carbonização. A pressão de moradores e a ampliação do número de guseiras e, conseqüentemente, da demanda de carvão impeliu algumas destas empresas a organizar centrais de carbonização. Elas são estruturas que envolvem pelo seis dúzias de fornos e ficam situadas próximas aos locais nos quais há concentração de serrarias. Neste caso, as empresas 10 siderúrgicas realizam a montagem de toda estrutura de fornos, infra-estrutura de apoio e logística de transporte. Transferindo, posteriormente, a responsabilidade pela sua condução a um fornecedor de carvão que terá deduzido o custo de montagem da estrutura de produção nos pagamentos do carvão por ele entregue à companhia. Trata-se de medida que tem como fundamento fidelizar grandes fornecedores de carvão e responder às pressões de moradores alguns municípios atingidos pelos impactos ambientais da produção de carvão vegetal, pois a carbonização, na maioria dos casos, é realizada nos terrenos das próprias serrarias, instaladas em áreas urbanas. Em todos as modalidades indicadas, a unidade básica da carvoaria é a bateria, composta por seis fornos (Fig. 6). Este número está relacionado com o ciclo da carbonização, que tem a duração de seis dias - um dia para encher o forno, um dia e duas noites para a carbonização, dois dias para o resfriamento e um para a descarga -, assim, cada dia, ter-se-á pelo menos um forno no qual se colocará madeira para ser carbonizada, outro para ser descarregado e quatro outros fornos aos quais devem ser dado acompanhamento ao processo de carbonização. Foto: Maurílio Monteiro Figura 6: Foto com visão parcial de baterias de fornos onde se carboniza lenha originária de desmatamento. Monteiro (1998a: 149) estimou que os custos operacionais que envolviam a produção de uma tonelada de carvão vegetal orbitavam em torno de US$ 30. Tal composição de custos permitiu o estabelecimento de um mercado de carvão vegetal na Amazônia Oriental brasileira no qual os preços são inferiores aos praticados em Minas Gerais, Estado onde se concentram as indústrias produtoras de ferro-gusa. 11 Além disso, o carvão consumido no sudeste paraense e no leste do Maranhão ainda procede de locais bem mais próximos das usinas se comparados às distâncias percorridas pelo carvão consumido no Sudeste do País, onde normalmente é transportado por distâncias superiores a 800 quilômetros. Um estudo que analisou a formação do mercado de carvão vegetal e abarcou os mais de 800 fornecedores deste insumo para a COSIPAR nos anos 1989, 1990 e 1991, indicou que em torno de 2/3 do carvão consumido por aquela empresa provinha da utilização de resíduos de madeira serrada, e que 70% do carvão que utilizava lenha proveniente de desmatamentos provinha de carvoarias instaladas a até 1980 quilômetros daquela usina, e que, aproximadamente 50% de todo o carvão que a abastecia também era originário de carvoarias instaladas naquele perímetro (Monteiro, 1998b: 208). Entretanto, nos anos 1990, foi perceptível o estabelecimento de duas tendências: a redução na proporção do carvão vegetal originário de lenha proveniente de fazendas em relação ao originário de resíduos de madeira serrada; e o distanciamento crescente e progressivo das fontes de biomassa para a produção do carvão em relação às usinas. No que se refere a esta primeira tendência, ela parece estar relacionada à ampliação da demanda do carvão em ritmos superiores à formação de grandes áreas de atividades agropastoris. Em relação ao afastamento entre as áreas de produção do carvão vegetal e as usinas, esta é uma tendência que também marca o abastecimento das siderúrgicas independentes no Sudeste do Brasil. O Programa Nacional do Meio Ambiente indica que a Bahia é, atualmente, um importante produtor e fornecedor de carvão vegetal ao parque siderúrgico de Minas Gerais, a partir da lenha retirada da Mata Atlântica realizadas no extremo sul daquele Estado, ocorrendo também a produção no oeste baiano. Isso realça, no Sudeste do Brasil, o deslocamento crescente das fontes de biomassa para a carbonização e suprimento das siderúrgicas (Brasil, 1995: 53). Na Amazônia Oriental brasileira já é comum o transporte de carvão vegetal ser realizado por trechos superiores a 400 km para o abastecimento das indústrias siderúrgicas. A produção carvoeira já abarca o norte de Tocantins e toda a região sudeste do Pará. No Maranhão, ela amplia a pressão sobre algumas grandes áreas de floresta da pré-Amazônia maranhense, como também sobre áreas de cerrado no leste daquele Estado (Fig. 4). Os agentes sociais envolvidos diretamente na produção carvoeira Tendo por base a organização da produção, é possível se estabelecer alguns tipos sociais diferenciados, seja pela propriedade, ou não, dos instrumentos de produção, ou ainda pelo domínio de técnicas que os diferenciam internamente. 12 Os donos da lenha são os proprietários das fazendas e das serrarias. Este grupo geralmente cede a lenha para ser explorada por um terceiro que, em contrapartida, realiza a limpeza da fazenda ou do pátio da serraria. Em alguns casos, em função da localização privilegiada da serraria ou da fazenda, os donos da lenha são remunerados com certo percentual do total produzido na carvoaria. Este segmento pode assumir a condição de fornecedores, na medida que em que passe a conduzir a produção do carvão. Os intermediários são, geralmente, proprietários de caminhões que compram o carvão diretamente nas carvoarias para, posteriormente, revendê-lo às siderúrgicas. Os fornecedores de carvão são os responsáveis pelos empreendimentos, proprietários dos meios de produção (fornos, tratores, caminhões, etc.) contratam gatos, carvoeiros e demais trabalhadores. Recebem da guseira o pagamento pelo fornecimento do carvão e dirigem a rede de atividades que envolve a produção. Os gatos são responsáveis pela arregimentação, controle, distribuição, gerenciamento e remuneração da força de trabalho em algumas etapas da produção, no geral, são proprietários de motosserras, ferramentas e, em alguns casos, de caminhões. Os carvoeiros são trabalhadores que, por dominarem a técnica de carbonização, ocupam um lugar diferenciado na produção; são remunerados em relação ao volume de carvão produzido e, algumas vezes, têm participação percentual na venda do carvão. Geralmente, lhes cabe a responsabilidade pela remuneração da força de trabalho envolvida no processo de carbonização. Em alguns casos, assumem a condição de pequenos fornecedores. Os peões são a grande massa de trabalhadores que desenvolvem as mais variadas atividades, quase invariavelmente remunerados por diárias (Fig. 7). Além de terem descontados de sua remuneração o valor da alimentação, seja pela sua condição de arranchado - termo com o qual é usualmente denominado o trabalhador que tem suas refeições fornecidas diariamente pelo gato - ou pelo fornecedor de carvão ou pelo fato de terem suas compras “aviadas” pelo fornecedor ou pelo gato. Os motoqueiros, como são chamados na região, distinguem-se dos demais trabalhadores por terem o domínio de uma técnica de operarem as motosserras; quase sempre são remunerados por sua produção, além de serem, algumas vezes, responsáveis pela remuneração do trabalhador auxiliar, que é conhecido como bebe-óleo. Trabalham na condição de arranchados ou têm suas compras aviadas pelo fornecedor ou pelo gato. 13 Foto: Maurílio Monteiro Figura 7: Foto de “peões” descarregando lenha na boca do forno para ser carbonizada. Os parceiros são aqueles que possuem um pequeno caminhão ou um tator de pneus, ou mesmo, recursos para construção de fornos. Eles integram-se à rede de agentes envolvidos na produção do carvão e são remunerados com percentuais variados em relação ao volume total produzido pela carvoaria, ou mesmo pelo volume produzido na etapa da produção sob sua responsabilidade. No interior da produção, se constrói uma cadeia de relações sociais, fundamentadas na propriedade, ou não, dos meios de produção, como também em função nos lugares ocupados no interior da cadeia produtiva. O sistema é articulado de forma que se consiga exercer o controle sobre a força de trabalho, impondo-lhe um ritmo de trabalho que dificulte a ociosidade, estimulando alguns indivíduos a maximizarem seus esforços. Os trabalhadores, ocupantes de lugares no interior da produção que são determinantes para o estabelecimento da intensidade do trabalho, são remunerados por produção e não por dias trabalhados. Assim, é constituída dentro da unidade produtiva, uma estrutura que viabiliza a fiscalização e a pressão em relação ao desempenho da força de trabalho. Percebe-se que o gato, ao ser remunerado pelo volume da área brocada e desmatada, se encarrega de fiscalizar e pressionar para que haja aumento no ritmo de produção dos trabalhadores envolvidos nessas atividades, na medida que sua remuneração vincula-se diretamente ao volume produzido por esses trabalhadores. O motoqueiro quando trabalha no corte da lenha recebe por produção, ditando o ritmo e fiscalizando as atividades do auxiliar. O mesmo mecanismo repete-se em relação ao transporte da lenha até os fornos, em que o responsável pela tarefa geralmente recebe por produção e, os 14 auxiliares, por diária. Na operação de carbonização, quando o carvoeiro assume sozinho o processo, é remunerado em função do volume produzido, e quando conta com trabalhadores que o auxiliam, geralmente estes são remunerados com base em diárias. O sistema de remuneração feito desta forma impele alguns indivíduos a buscarem maximizar a produção do seu trabalho, bem como o daqueles que lhes são diretamente subordinados. Cabe ainda ressaltar, que o aumento do nível de produção é sempre buscado através do prolongamento da jornada de trabalho. As estruturas sociais da região estavam conformadas por relações sociais que serviram de base para formas aparentemente novas ou ampliadas, sob as quais se apóiam os empreendimentos de produção do carvão vegetal. O regime de empreitada, a atuação do gato e do empreiteiro na intermediação da contratação da força de trabalho, a remuneração através de diárias e o aviamento já faziam parte do mundo do trabalho dos peões da região. Os rendimentos salariais dos trabalhadores envolvidos diretamente na produção do carvão variam entre US$ 52 e US$ 113 mensais correspondendo a uma jornada de trabalho nunca inferior a 8 horas diárias (Monteiro, 1998a). Tratando-se de empregos de péssima qualidade, na medida em que as condições de trabalho e moradia são extremamente precárias (Fig. 8), as contratações são temporárias, estes trabalhadores dificilmente contam com garantias previdenciárias e trabalhistas além de estarem sujeitos a mecanismos coercitivos de imobilização da força de trabalho. Foto: Maurílio Monteiro Figura 8: Foto de Cabana típica onde moram os trabalhadores que se dedicam à produção de carvão vegetal cuja lenha é originária de desmatamentos. 15 A existência de grande número de desempregados, o fato de que as atividades relativas ao corte da lenha, em maior grau, e as outras atividades vinculadas à produção do carvão são caracterizadas pela alta rotatividade conduz à dispersão dos trabalhadores e, conseqüentemente, limita sua possibilidade de organização, tornando difícil a pressão organizada e sistemática e a emergência de qualquer mobilização pela elevação da remuneração, ou por melhoria das condições de trabalho. Carvoejamento e pressão sobre a mata primária na Amazônia Para produção de uma tonelada de ferro-gusa são necessários, em termos gerais 875 kg de carvão vegetal (CEMIG, 1988: 150), cuja produção, por sua vez, requer a utilização de pelo menos 2.600 kg de madeira seca, que em termos médios tem uma densidade de 360 kg/m3, o que implica – quando se utiliza lenha originária de matas nativas – necessidade de se recorrer a um desmatamento de pelo menos 600 m2 de matas primárias, se esta possuir um potencial madeireiro útil para a carbonização orbitando em torno de 120 estéreos por hectare (st/ha). Pelas técnicas utilizadas, nem todo o material lenhoso é aproveitado para a produção de carvão vegetal. Para a carbonização, utiliza-se somente a lenha cujo diâmetro não seja inferior a 5 cm e nem superior a 50 cm. Estas limitações vinculam-se principalmente ao fato de que as árvores com diâmetro superior a 50 cm implicam dificuldades de transporte bem como de carbonização, e o desdobramento em pedaços menores consumiria uma quantidade de energia que torna a sua utilização antieconômica. Há que se lembrar que nestas áreas, geralmente, a madeira útil às empresas madeireiras também já foi previamente retirada. As variações em relação aos parâmetros anteriormente citados podem ser significativas. A literatura traz diversas e diferenciadas indicações acerca do potencial madeireiro, útil à carbonização, em um hectare da mata primária, mesmo porque é significativa a diferenciação das florestas tropicais que a Amazônia Oriental abriga (SUDAM, 1974: 36), como também a intensidade da atividade madeireira que invariavelmente antecede a produção carvoeira. Assume-se aqui que um hectare fornece, em termos médios, 44 toneladas de lenha seca útil para a carbonização. Outro parâmetro bem amplo refere-se à proporção em que ocorre a conversão de madeira em carvão, uma vez que esta proporcionalidade vincula-se, por um lado, à umidade presente na madeira e por outro, ao tipo de forno no qual é carbonizada. 16 No que se refere aos resíduos de madeira serrada que são descartados no processo de beneficiamento pelas serrarias e que é carbonizada, é possível inferir que a utilização de um hectare de mata produz até 24,7m3 de resíduos em relação ao material serrado (Vidal et. al., 1997: 15), que são parcialmente utilizados, carbonizando-se somente a madeira que tenha largura superior a 5 cm. Estimando-se que, a partir de 1999, é consumido anualmente pela siderurgia na Amazônia Oriental brasileira 1,9 milhão de toneladas de carvão vegetal; supondo-se que 40% seja produzido tendo por base lenha oriunda de desmatamentos para a formação de pastagens ou de projetos de “manejo florestal sustentado” e que os 60% restantes sejam provenientes de resíduos de madeira utilizada pelas serrarias, já que as outras fontes de biomassa não são praticamente utilizadas; considerando-se provável a interseção entre as áreas das quais se extrai madeira para serrarias e as que são desmatadas com finalidades agropecuárias, pode-se deduzir que, anualmente, os resíduos que convergem para a produção carvoeira originam-se de uma área que atinge 570 mil hectares (Fig. 9). Evidentemente, que, no processo de destruição da floresta nestas áreas, o carvoejamento é uma força auxiliar e secundária, mas nem por isso pode ter sua importância eximida. Figura 9: Tabela Estimativa da dimensão da área da qual anualmente origina-se biomassa para suprir a produção de carvão vegetal que abastece a siderurgia na Amazônia brasileira. Dimensão da Origem Lenha utilizada Carvão Carvão área de vegetal vegetal na procedência produzido demandado carbonização (103 ha) (a) (t/ha) (t/ha) (103t) Resíduos de 6 (b) 2 serrarias Desmatamentos Totais 44 (c) - 1140 570 14,6 760 52 - 1900 622 (a) Há possibilidade de sobreposição das áreas. (b) De 1 ha de floresta, em termos médios, extraem-se 30 toneladas de madeira útil para serrarias, das quais, em média, 2/3 convertem-se em resíduos. Destas 20 toneladas de resíduos, em média, apenas 6 são utilizadas na produção de carvão. (c) De 1 ha de floresta, em termos médios, recolhem-se 44 toneladas de lenha seca útil para a carbonização. Uma vez que, pelas técnicas utilizadas, só se carboniza aquela lenha cujo diâmetro seja superior a 5 cm e inferior a 50 cm. Fonte: Monteiro (1998a: 114) modificado. Além da pressão exercida sobre a mata primária, a implantação das empresas síderometalúrgicas na Amazônia Oriental brasileira favoreceu também a concentração fundiária por duas vias: uma é que a produção de carvão vegetal reduz significativamente os custos da “limpeza da área”, o que tem influência direta nos mecanismos de privatização da terra uma vez que facilita a implantação de pastagens; e a outra, é que todos os 17 empreendimentos adquiriram grandes propriedades fundiárias destinadas à implantação de projetos de “manejo florestal sustentado” ou de reflorestamento. Uma lista parcial dos imóveis rurais adquiridos pelas empresas sídero-metalúrgicas aponta para uma área cuja somatória é superior a 130 mil hectares. O que reforça as distorções da estrutura fundiária regional e estabelece uma relação profundamente conservadora entre as indústrias siderúrgicas e segmentos sociais da região, que têm como fonte de poder o latifúndio (Monteiro, 1998a: 207). Muitas das aquisições de terras por parte dos empreendimentos metalúrgicos são sustentadas por mecanismos como a grilagem (Shiraishi Neto, 1995: 68) e a violência contra posseiros, o que contribui de forma decisiva para aprofundar o quadro de tensão social presente em diversas áreas. Considerações finais A produção siderúrgica na Amazônia não foi capaz de produzir o propalado entrelaçamento de linkages mercantis e não-mercantis nem de fomentar o surgimento de relevantes relações interindustriais. De tal forma que as principais alterações na socioeconomia da região, decorrentes da operação desses empreendimentos, não derivam dos empregos por eles gerados, do impulso ao surgimento de novas atividades fabris, ou mesmo da arrecadação tributária, mas sim, da demanda do carvão vegetal, principal elo de articulação das plantas industriais com a socioeconomia da região. As dinâmicas estabelecidas para produção carvoeira possibilitam a utilização, em grande escala, da mata primária viabilizando a barata produção do carvão vegetal, fundamental para estes empreendimentos. Conformaram-se, assim, a partir da siderurgia e do carvoejamento, novos esquemas de mobilização, apropriação e valorização de estoques de recursos naturais que se apoiaram em estruturas e relações sociais já existentes na região — como o latifúndio e a peonagem da dívida. Assim, em que pese a produção siderúrgica, ainda hoje estar presente no discurso de diversos e amplos segmentos sociais como elemento de modernização regional, ela cumpre um papel distinto, conquanto amplia a pressão sobre a mata primária, caotiza diversos espaços urbanos; reforça segmentos sociais que articulam a sua lógica produtiva à exploração predatória dos recursos naturais, como os madeireiros, ou com grupos sociais para os quais a grande propriedade fundiária é fonte de poder social, como os fazendeiros; amplia as tensões no campo e os conflitos fundiários; e intensifica os esquemas de submissão da força de trabalho à baixa remuneração e a condições de trabalho insalubres. 18 Referências bibliográficas BRASIL. 1981. Ministério de Minas e Energia. Programa Grande Carajás Brasília. 38p BRASIL. 1989. Secretaria de Planejamento da Presidência da República. Programa Grande Carajás. Secretaria Executiva. Plano-diretor do Corredor da Estrada de Ferro Carajás. Brasília, NATRON. 536p. 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