UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS D E PAR TAM E N T O D E B IO LO G IA VE G E TAL ILG B N E M A TR U O D F IT O PLÂ N C T O N D O E ST UÁ RIO D O T E JO (PO RT UG A L): D IN Â M IC A SA Z O N A L , IN T E RA N UA L E PRO D UÇ Ã O PRIM Á RIA Carla Alex andra L apa Pereira G am eiro D O U TO R A M E N TO E M B IO LO G IA Especialidade: Ecologia 2009 UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS D E PAR TAM E N T O D E B IO LO G IA VE G E TAL ILG B N E M A TR U O D F IT O PLÂ N C T O N D O E ST UÁ RIO D O T E JO (PO RT UG A L): D IN Â M IC A SA Z O N A L , IN T E RA N UA L E PRO D UÇ Ã O PRIM Á RIA Carla Alex andra L apa Pereira G am eiro D O U TO R A M E N TO E M B IO LO G IA Especialidade: Ecologia Orientador: Prof. Doutora Vanda Brotas 2009 "A natureza é exactamente simples, se conseguirmos encará-la de modo apropriado. Essa crença tem-me auxiliado, durante toda a minha vida, a não perder as esperanças, quando surgem grandes dificuldades de investigação." A. Einstein À minha mãe Declaração Os resultados apresentados e discutidos nesta dissertação encontram-se incluídos nos seguintes trabalhos, publicados ou submetidos para publicação: Capítulo 4 Gameiro, C., Cartaxana, P., Brotas, V. (2007) Environmental drivers of phytoplankton distribution and composition in Tagus Estuary, Portugal. Estuarine Coastal and Shelf Science 75:21-34. Capítulo 5 Gameiro, C., Zwolinski, J., Brotas, V. Phytoplankton primary production and photosynthetic parameters in a shallow and turbid estuarine system. Aceite para revisão na revista Journal of Plankton Research. Capítulo 6 Gameiro, C. & Brotas, V. (2009) Patterns of phytoplankton variability in Tagus estuary, Portugal. Aceite na revista Estuaries and Coasts. Para efeitos do disposto no nº 2 do Art. 8º do Dec.-Lei 388/70, o autor da dissertação declara que interveio na concepção do trabalho experimental, na interpretação dos resultados e na redacção dos manuscritos enviados para publicação. Carla Alexandra Lapa Pereira Gameiro Março de 2009 ÍNDICE AGRADECIMENTOS RESUMO SIMBOLOGIA ABREVIATURAS I iii v vi CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO 1 1.1 3 INTRODUÇÃO GERAL CAPÍTULO 2 - ÁREA DE ESTUDO 2.1 2.2 O ESTUÁRIO DO TEJO CONDIÇÕES CLIMATÉRICAS 2.2.1 2.2.2 2.2.3 2.2.4 TEMPERATURA DO AR 2.3 LOCAIS DE AMOSTRAGEM VELOCIDADE E DIRECÇÃO DO VENTO CAUDAL DO RIO TEJO E PRECIPITAÇÃO IRRADIÂNCIA 9 11 16 16 18 19 20 21 CAPÍTULO 3 - MATERIAL E MÉTODOS 23 3.1 PROGRAMA DE AMOSTRAGEM 3.1.1 3.1.2 3.1.3 ESCALA TEMPORAL 25 25 25 26 26 26 26 27 27 28 28 28 28 28 28 29 29 29 29 29 29 30 30 30 31 ESCALA ESPACIAL AMOSTRAGEM DA ÁGUA 3.2 METODOLOGIAS 3.2.1 3.2.1.1 3.2.1.2 3.2.1.3 3.2.2 3.2.2.1 3.2.2.2 3.2.2.3 3.2.2.4 3.2.2.5 3.2.3 3.2.3.1 3.2.3.2 3.2.3.3 3.2.3.4 3.2.4 3.2.4.1 3.2.4.2 3.2.4.3 3.2.4.4 MEDIÇÕES NO CAMPO Profundidade da coluna de água (z), zona de mistura (zmix) e zona eufótica (zeuf) Coeficiente de extinção da luz (Kpar) Irradiância média da coluna de água PARÂMETROS METEOROLÓGICOS Irradiância atmosférica Fotoperíodo Temperatura do ar Velocidade e direcção do vento Precipitação PARÂMETROS HIDROLÓGICOS Temperatura da água Salinidade pH Caudal do rio NUTRIENTES INORGÂNICOS DISSOLVIDOS NA COLUNA DE ÁGUA Amónio (NH4+) Nitrito (NO2-) Nitrato (NO3-) Orto-fosfato (PO43-) 3.2.4.5 3.2.5 3.2.6 3.2.6.1 3.2.6.2 3.2.6.3 3.2.6.4 3.2.6.5 3.2.7 3.2.7.1 3.2.7.2 3.2.7.3 3.2.7.4 3.2.7.5 3.2.8 Silicato (SiO2) MATÉRIA PARTICULADA EM SUSPENSÃO (SPM) FITOPLÂNCTON Biomassa fitoplanctónica total (clorofila a e feopigmentos) Fotopigmentos (clorofilas e carotenóides) Desenvolvimento de culturas Abundância das classes fitoplantónicas e aplicação do ChemTax Identificação e quantificação de células da comunidade fitoplanctónica PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA Curvas de luz-fotossíntese (P-E) Metodologia laboratorial Alcalinidade e carbono inorgânico dissolvido total (Ctot) Taxa de produção primária Taxa de produção primária integrada na coluna de água ANÁLISE ESTATÍSTICA 31 31 32 32 33 34 34 35 36 36 39 41 41 42 45 CAPÍTULO 4 - INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DISTRIBUIÇÃO E COMPOSIÇÃO DO FITOPLÂNCTON 4.1 4.2 4.3 RESUMO INTRODUÇÃO RESULTADOS 4.3.1 4.3.1.1 4.3.2 4.3.2.1 4.3.3 4.3.4 4.3.4.1 4.3.4.2 4.3.4.3 4.3.4.4 4.3.4.5 4.3.4.6 4.3.4.7 4.3.5 4.3.6 4.3.6.1 4.3.6.2 4.3.6.3 PARÂMETROS HIDROLÓGICOS 4.4 Temperatura da água, salinidade e pH CARACTERIZAÇÃO DA IRRADIÂNCIA NA COLUNA DE ÁGUA Coeficiente de extinção da luz (Kpar) RAZÃO DE MISTURA CRÍTICA (Zmix:Zeuf) NUTRIENTES INORGÂNICOS DISSOLVIDOS NA COLUNA DE ÁGUA Amónio (NH4+) Nitrito (NO2-) Nitrato (NO3-) Azoto total inorgânico dissolvido (DIN) Orto-fosfato (PO43-) Silicato (SiO2) Razões N:P:Si MATÉRIA PARTICULADA EM SUSPENSÃO (SPM) FITOPLÂNCTON Biomassa fitoplanctónica total (clorofila a e feopigmentos) Fotopigmentos (clorofilas e carotenóides) Abundância das classes fitoplantónicas e aplicação do ChemTax DISCUSSÃO 47 49 50 52 52 52 54 54 55 58 58 59 60 61 62 62 65 67 68 68 73 74 78 CAPÍTULO 5 - PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS 5.1 5.2 5.3 RESUMO INTRODUÇÃO RESULTADOS 5.3.1 5.3.1.1 5.3.1.2 5.3.2 PARÂMETROS METEOROLÓGICOS E HIDROLÓGICOS Irradiância, velocidade do vento, caudal do rio e precipitação Temperatura da água, salinidade e irradiância na coluna de água NUTRIENTES INORGÂNICOS DISSOLVIDOS NA COLUNA DE ÁGUA 85 87 88 89 89 89 90 92 DIN, SiO2 e PO43Razões N:P:Si 5.3.2.1 5.3.2.2 5.3.3 5.3.3.1 5.3.3.2 5.3.4 5.3.4.1 5.3.4.2 5.3.4.3 Luz integrada na coluna de água, curvas P-E e taxa de produção primária Parâmetros fotossintéticos Taxa de produção primária 5.4 DISCUSSÃO FITOPLÂNCTON Biomassa fitoplanctónica total (Chl a) e composição taxionómica Fotopigmentos (clorofilas e carotenóides) PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA 92 93 94 94 95 98 98 102 104 106 CAPÍTULO 6 - PADRÕES GERAIS: NUTRIENTES, BIOMASSA, COMPOSIÇÃO E SUCESSÃO FITOPLANCTÓNICA 113 6.1 6.2 6.3 RESUMO INTRODUÇÃO SÉRIES TEMPORAIS 6.3.1 AMOSTRAGEM, METODOLOGIA DE CAMPO E DE LABORATÓRIO 6.4 RESULTADOS 6.4.1 6.4.2 PARÂMETROS HIDROLÓGICOS E DE QUALIDADE DA ÁGUA 6.5 DISCUSSÃO 115 116 118 119 121 121 126 129 CAPÍTULO 7 - CONCLUSÕES 135 CAPÍTULO 8 - REFERÊNCIAS 143 TEMPO DE DESENVOLVIMENTO, COMPOSIÇÃO E SUCESSÃO DO FITOPLÂNCTON AGRADECIMENTOS Por me terem ajudado na realização deste trabalho quero agradecer: Em primeiro lugar à Prof. Doutora Vanda Brotas, por ter aceite orientar esta tese, pela confiança que sempre depositou em mim e no meu trabalho, pelos ensinamentos, pela ajuda e apoio que sempre esteve disposta a prestar. Pela utilidade das suas recomendações e correcções, que na fase final foram incentivos fundamentais para a conclusão desta dissertação. Estou-lhe também muito grata pela sua amizade e estímulo sempre presentes ao longo destes anos. Ao Dr. Michel Poulin, que no momento inicial desta pesquisa tão amavelmente me recebeu no seu local de trabalho (Canadian Museum of Nature) ajudando-me na identificação taxionómica de espécies fitoplânctónicas do estuário do Tejo. Um obrigada especial ao Dr. Trevor Platt, que prontamente me transmitiu sábios conhecimentos relativos à produtividade primária, ajudando-me na interpretação de alguns resultados obtidos no estuário do Tejo. Ao Dr. João Serôdio, pelos esclarecimentos e auxílio que deu nos modelos de medição da taxa da produção primária. À Eng. Cláudia Brandão e à Eng. Fernanda Carvalho, pela informação disponibilizada referente a dados do INAG e IM, respectivamente. Aos meus colegas de trabalho, Paulo Cartaxana e Juan Zwolinski, pela cooperação científica e por terem estado sempre dispostos a ajudar-me na resolução de dúvidas científicas. A ambos pela amizade inequívoca de longa data. Ao Dr. Flemming Møhlenberg e à Dra. Hanne Kaas, do Water & Environmental Institute (DHI) e ao Dr. Peter Henriksen e ao Dr. Daniel Conley, do National Environmental Research Institute (NERI), por me terem inserido no projecto REBECCA que muito contribuiu para alargar os meus conhecimentos sobre a DQA e a monitorização do fitoplâncton numa escala Europeia. A todos os professores que trabalham no Instituto de oceanografia, em especial aos do grupo da Botânica Marinha pela simpatia e pelo contributo de conhecimentos específicos (em especial sobre o microscópio de inversão). Aos meus colegas de grupo, que me acompanharam neste longo caminho, e que sem a ajuda deles, quer no laboratório, quer no campo teria sido impossível este trabalho. Ao Bruno Jesus, pelos conselhos dados na preparação dos artigos científicos. Ao Lourenço Ribeiro, pela devoção exemplar que nunca deixou de ter para com as diatomáceas, pela sua bondade e disponibilidade em ajudar na identificação taxionómica. Ao Rafael Mendes e Tânia Anselmo, pela ajuda nas saídas de campo e na análise de centenas de amostras. À Manuela Lucas, pelas conversas e desabafos, que tantas horas passou a ajudar-me na organização do i material e que sem ela teria sido muito mais extensa a estada no laboratório. À Vera Veloso, por ter isolado e mantido, na algoteca do IO, algumas culturas de fitoplâncton do estuário do Tejo. A todos os restantes colegas do laboratório, nomeadamente à Carolina Sá, Ana Sousa, Tânia Diniz e Bernardo Duarte, pela boa disposição e interajuda que sempre existiu no laboratório de botânica marinha do IO. Ao Sr. Manuel, dono da “Nicole”, que se tornou um perito na medição da intensidade luminosa da coluna de água. À Teresa, gostaria de deixar a minha maior gratidão pela sua dedicação, bondade e pelos seus conselhos e incentivos, e que tantas horas ouviu os meus medos e incertezas. Sem ela a finalização deste trabalho teria sido quase impossível. À Rita, pelo ânimo e pelas conversas sempre constantes. Às duas pela amizade pura e simples. Ao Jorge Cruz, pela assistência preciosa na paginação e formatação deste documento. Ao Gonçalo Barata, pelos conselhos e ajuda incansável na execução gráfica dos esquemas e gráficos. Obrigada pelo design diferente da capa. À JRDESIGN, especialmente ao Sr. Guerin pela impressão da tese. E finalmente, aos meus pais, que sempre acreditaram em mim. Ao Rui, pela sua coragem e força serem uma inspiração constante. Ao Gonçalo, pelo apoio e amor incomparável que me deu em todos os momentos. Este trabalho foi financiado pelo programa POCI 2010 - Formação Avançada para a Ciência – Medida IV.3 da Fundação para a Ciência e Tecnologia através da uma bolsa de Doutoramento (SFRH/BD/13988/2003) e pelo projecto “Programa de Monitorização dos ecossistemas Terrestre e Estuarino na envolvente à CTRSU de S. João da Talha” financiado pela empresa Valor Sul. ii RESUMO A dinâmica do fitoplâncton e o efeito dos principais factores que a regulam foram estudados no estuário do Tejo (Portugal). Variações temporais e espaciais da concentração de biomassa fitoplanctónica (medida em termos de clorofila a), concentração de nutrientes, disponibilidade de luz, condições atmosféricas e hidrológicas, foram analisadas mensalmente, durante um período de 9 anos (Março 1999 a Novembro 2007) em quatro locais com pouca profundidade (~ 4 m) situados na zona média do estuário do Tejo. Concentrações médias anuais relativamente elevadas de azoto total inorgânico dissolvido (DIN) e silicatos (54,3 µM e 47,2 µM, respectivamente) foram encontradas nesta área do estuário do Tejo, em grande parte como consequência da entrada de água doce do rio Tejo. A variabilidade sazonal das condições hidrológicas (caudal do rio e sua influência na estabilidade da coluna de água) e climatéricas (temperatura e luz) foi determinante para a dinâmica do fitoplâncton e da produtividade primária do estuário do Tejo. A biomassa fitoplanctónica apresentou concentrações baixas a moderadas, com valores médios entre 1,4 µg L-1 e 7,4 µg L-1 no Inverno e no Verão, respectivamente. Apesar da existência de uma grande variabilidade interanual, encontrou-se um padrão sazonal consistente, caracterizado por um único pico anual de clorofila a (Chl a) no final da Primavera ou no Verão. As concentrações dos fotopigmentos biomarcadores revelaram uma comunidade taxionomicamente diversificada. As diatomáceas constituíram a classe de microalgas planctónicas predominantes, em termos de biomassa e com maior contribuição para a formação dos eventos de florescimento fitoplanctónico (Chl a > 10 µg L-1). Outras classes de microalgas planctónicas ocorreram também, podendo outros grupos, como por exemplo, criptófitos de pequenas dimensões, terem um papel relevante para a estrutura da comunidade em determinados períodos. A limitação de luz causada pelos índices de turbidez elevados da coluna de água pareceu afectar a produtividade fitoplanctónica do estuário do Tejo de duas formas: regulando a quantidade máxima de biomassa e estimulando a aclimatação fisiológica do fitoplâncton em condições de baixa luminosidade. Porém, a comunidade pareceu estar bem adaptada às condições físico-químicas da coluna de água, o que afectou a produtividade primária do estuário do Tejo, que se verificou ser reduzida a moderada (85 g C m-2 ano-1). O balanço anual da produtividade primária média anual do fitoplâncton foi estimado entre 18.700 t ano-1 e 27.200 t ano-1 para a área total do estuário do Tejo. Estes resultados e conclusões revelam que o estuário do Tejo é um sistema não eutrofizado, em grande parte devido à dinâmica da coluna de água, fortemente influenciada pelas marés e pela entrada de água doce. iii ABSTRACT Phytoplankton dynamics and the effect of environmental factors were investigated in the Tagus estuary (Portugal). Temporal and spatial variations of phytoplankton biomass (measured as chlorophyll a concentration), nutrient concentration, light availability, atmospheric and hydrological conditions were monthly analyzed during 9 years (March 1999 to November 2007), in four low depth (4 m in average) sampling sites located at mid estuary. Relatively high DIN and silicate concentrations (54.3 µM and 47.2 µM corresponding to the anual median, respectively) were found in this area of the Tagus estuary, mostly as a consequence of freshwater input by the Tagus river. The seasonal variability of hydrological (river inflow and its influence on water column stability) and climacteric (temperature and light) conditions was determinant to the phytoplankton and primary production dynamics of the Tagus estuary. Phytoplankton biomass presented low to moderate concentrations, average values varying between 1.4 µg L-1 and 7.4 µg L-1 in winter and summer, respectively. Although interannual variability was high, a consistent seasonal pattern was found, characterized by a chlorophyll a (Chl a) peak at the end of spring or in summer. Biomarker photopigments concentrations disclosed a taxonomically diversified community. Diatoms were the main predominating planktonic microalgae class, in terms of biomass and with higher contribution to bloom events (Chl a > 10 µg L-1). Other phytoplankton classes also occurred, with some groups as small cryptophytes, for instance, playing a relevant role in the community structure in certain periods of time. Light limitation caused by high turbidity seemed to affect phytoplankton community of the Tagus estuary in two ways: by regulating a maximum biomass quantity and by stimulating physiological acclimatation to low light conditions. However, the community seemed well adapted to physical and chemical conditions of the water column, which affected the primary production of the Tagus estuary showing low to moderate values (85 g C m-2 year-1). The annual balance of phytoplankton primary productivity was estimated as 18 700-27 200 ton year-1 for the total area of the Tagus estuary. Taken together these results show that the Tagus estuary is not eutrophicated, mostly a result of water column dynamics strongly influenced by tides and freshwater inflow. iv SIMBOLOGIA Símbolo Significado Unidades Parâmetros ambientais: D Ks Q Rf S SPM T Tw Ws Wd z zcr zeuf zmix zmix:zeuf Fotoperíodo Constante de semi-saturação Caudal do rio Precipitação média diária Salinidade Matéria particulada em suspensão Temperatura do ar Temperatura da água Velocidade do vento Direcção do vento Profundidade da coluna de água Profundidade crítica Profundidade da zona eufótica Profundidade da zona de mistura Razão de mistura crítica h µM m3 s-1 mm mg L-1 °C °C m s-1 ° m m m m - Parâmetros de luz: E E0 Ed Em Emax Epar Et Ez E(z,t) Kpar Irradiância Irradiância sub-superficial Irradiância média diária superficial Irradiância média da coluna de água Irradiância máxima diária superficial rradiância fotossinteticamente activa (400 nm-700 nm) Irradiância em função do tempo (t) Irradiância à profundidade z Irradiância em função do tempo (t) e da profundidade (z) Coeficiente de extinção da luz W m-2 µmol fotões m s ou W m-2 µmol fotões m-2 s-1 µmol fotões m-2 s-1 µmol fotões m-2 s-1 ou W m-2 µmol fotões m-2 s-1 µmol fotões m-2 s-1 µmol fotões m-2 s-1 µmol fotões m-2 s-1 m-1 -2 -1 Parâmetros químicos: A Ctot DIN NH4+ NO2NO3-, PO43POC PON SiO2 W V Alcalinidade total Carbono total inorgânico dissolvido Azoto total inorgânico dissolvido Ião Amónio inorgânico dissolvido Ião Nitrito inorgânico dissolvido Ião Nitrato inorgânico dissolvido Ião Orto-fosfato inorgânico dissolvido Carbono orgânico particulado Azoto orgânico particulado Silicato inorgânico dissolvido Massa do carbono inorgânico total Volume de amostra incubado meq L-1 meq L-1 µmol L-1 µmol L-1 µmol L-1 µmol L-1 µmol L-1 µM µM µmol L-1 mg C m-3 ml Parâmetros biológicos: Alo ß-car Chl a Chl b Clor c1+c2 Clor c3 Diad Aloxantina ß-caroteno Clorofila a Clorofila b Clorofila c1+ c2 Clorofila c3 Diadinoxantina µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 v Símbolo Diat Feo Fuc Lut Neo Per Pra Vio Zea Significado Unidades Diatoxantina Feopigmentos Fucoxantina Luteina Neoxantina Peridinina Prasinoxantina Violoxantina Zeaxantina µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 µg L-1 Parâmetros da curva P-E: αB Declive inicial da curva P-E ou coeficiente de eficiência fotossintética Parâmetro da fotoinibição ßB B Bz Ec Ek P PB PBmax Pz P(z,t) RB Biomassa fitoplanctónica Biomassa fitoplanctónica à profundidade z Irradiância de compensação Irradiância de saturação Taxa de produção primária Taxa fotossintética normalizada para a biomassa (Chl a) Taxa fotossintética máxima normalizada para a biomassa ou número de assimilação Taxa de produção primária à profundidade z Taxa de produção primária em função do tempo (t) e da profundidade (z) Taxa de respiração normalizada para a biomassa mg C (mg Chl a)-1 h-1 (µmol fotões m-2 s-1)-1 mg C (mg Chl a)-1 h-1 (µmol fotões m-2 s-1)-1 µg L-1 µg L-1 µmol fotões m-2 s-1 µmol fotões m-2 s-1 -3 -1 mg C m h mg C (mg Chl a)-1 h-1 mg C (mg Chl a)-1 h-1 mg C m-3 h-1 mg C m-3 h-1 mg C (mg Chl a)-1 h-1 ABREVIATURAS Sigla AML AGU-Chapman CTRSU DGPA DQA EC ETAR FCUL GRID HPLC IM INAG INS IO IPIMAR NAO NOAA Ramsar RET vi Significado Área Metropolitana de Lisboa Conferência da American Geophysical Union (Croácia, Outubro 2007) Central de Tratamento de Resíduos Sub-Urbanos Direcção Geral das Pescas e Agricultura Directiva Quadro da Água (2000/60/EC) Comunidade Europeia Estação de Tratamento de Águas Residuais Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa Global Resource Information Database Cromatografia Líquida de Alta Pressão Instituto de Meteorologia Instituto Nacional da Água Instituto Nacional de Estatística Instituto de Oceanografia da FCUL (recente Centro de Oceanografia) Instituto das Pescas da Investigação e do Mar (recente INIAP) North Atlantic Oscillation US National Oceanic and Atmospheric Administration Convenção sobre Zonas Húmidas de Importância Internacional (Irão, 1971) Reserva Natural do Estuário do Tejo Capítulo 1. Introdução 1. INTRODUÇÃO GERAL 1.1 Introdução geral Os estuários são zonas de transição entre o rio e o oceano, com uma dinâmica particular que, em muitos casos, é sustentada fundamentalmente pela energia das marés. Numa perspectiva estritamente humana, estes ecossistemas naturais oferecem uma variedade de serviços essenciais que, em conjunto, contribuem para o sistema de suporte à vida na Terra. Regulação dos ciclos de nutrientes, eliminação e reciclagem de resíduos, produção de alimentos, refúgio de biodiversidade e recursos genéticos são serviços prestados pelos estuários que os tornam sistemas altamente valiosos. Uma abordagem economicista dos ecossistemas mundiais, com base no valor dos serviços prestados e capital natural, colocou os estuários entre os sistemas naturais mais valiosos (25 318 biliões de euros por hectare por ano) à escala global, principalmente devido à capacidade de reciclagem dos nutrientes (Constanza et al. 1997). No entanto, a qualidade dos serviços prestados pelos estuários pode sofrer grandes oscilações devido às alterações ambientais causadas pelo crescimento da população humana, aproveitamento desmedido dos recursos naturais e utilização de tecnologias poluentes (Nixon 1995, Vitousek et al. 1997). Considerando as 32 maiores cidades do Mundo, pode-se constatar que 22 se localizam na área limítrofe de estuários (Ross 1995). Não é, portanto, surpreendente que as actividades humanas tenham vindo a contribuir para o declínio da integridade dos estuários ao longo do tempo, tornando-os zonas de grande vulnerabilidade e das mais ameaçadas entre os ecossistemas da Terra. Algumas destas actividades produzem alterações que ocorrem com rapidez alarmante (Cloern 2001). Do ponto de vista ecológico, os estuários são sistemas extremamente ricos. O gradiente salino das águas estuarinas permite o estabelecimento de comunidades vegetais e animais adaptadas a este ambiente de gradientes, que geram entre si relações muito peculiares embora difíceis de determinar e compreender. Relações tróficas complexas são típicas destes sistemas, relacionando organismos fitoplanctónicos (produtores primários) com populações de consumidores que incluem bactérias, zooplâncton, organismos invertebrados e peixes. Compreender a dinâmica estuarina depende necessariamente do estudo dos mecanismos naturais e também da variabilidade induzida pelas actividades antrópicas na produtividade, abundância e composição da comunidade fitoplanctónica, bem como das relações que se estabelecem entre fitoplâncton e processos geoquímicos e outras comunidades biológicas. A compreensão aprofundada destes processos e inter-relações conduz a uma abordagem apropriada em termos de gestão e 3 1. INTRODUÇÃO GERAL políticas de conservação e protecção dos sistemas estuarinos. Continuam ainda actuais problemas como o florescimento de algas tóxicas associado à mortalidade de peixes e a eutrofização costeira (Cloern 2001, Æetebjerg et al. 2003), cuja incidência não se restringe à escala local e se verifica continuar a aumentar à escala global. O fitoplâncton que se encontra na base da cadeia alimentar estuarina pode funcionar como instrumento adequado para avaliar estes impactos ambientais. Esta comunidade constitui um elo trófico frágil e sensível, cujas alterações, embora menos visíveis à vista desarmada, do que peixes mortos a flutuar à superfície de águas poluídas, têm repercussões que se estendem pela teia alimentar. O fitoplâncton pode pois funcionar como excelente indicador da integridade dos estuários, o que tem sido utilizado de forma crescente durante as últimas décadas no âmbito da protecção adequada destes sistemas costeiros. De facto, a Directiva da União Europeia 2000/60/EC (EC 2000) também conhecida como a Directiva Quadro da Água (DQA), que tem como objectivo atingir e manter a qualidade do meio aquático através da definição de condições de referência da qualidade da água, baseadas na avaliação de vários elementos de qualidade biológicos, além dos químicos, em que se inclui o fitoplâncton. É plenamente aceite que o fitoplâncton tem uma capacidade de resposta muito rápida e surpreendente em relação a muitas alterações ambientais devido à capacidade que as células fitoplanctónicas têm de se dividir diariamente sob condições óptimas (Fietz et al. 2005, Cloern & Jassby 2008) fazendo do fitoplâncton um bom indicador biológico. Variáveis fitoplanctónicas são fundamentais para definir e classificar o estado ecológico das águas superficiais em sistemas aquáticos, destacando-se abundância, biomassa e composição do fitoplâncton, assim como outros factores associados à dinâmica desta comunidade, como frequência, intensidade e composição dos eventos de florescimento fitoplanctónico (Domingues et al. 2008). Também o uso de índices ecológicos tem sido muitas vezes aplicado para avaliar alterações quantitativas nos sistemas aquáticos originadas pela poluição ou por stress ambiental de origem diversa (Copeland & Bechtel 1971, Cook 1976, Boyle et al. 1990). Em geral, a atenção está dirigida para a diversidade das espécies como uma medida quantitativa das alterações ocorridas na comunidade biológica devido à poluição, aceitando-se o princípio geral de que a diversidade e a poluição variam inversamente uma em relação à outra (Whilm 1967). A diversidade de uma comunidade é expressão do número e da abundância de cada espécie. Numerosas equações matemáticas têm sido propostas para expressar a diversidade de uma comunidade, combinando os índices de diversidade, informação relacionada com a abundância de cada espécie e riqueza específica 4 1. INTRODUÇÃO GERAL num único valor, que poderá ser usado para avaliar o estado da comunidade (Washington 1984). No entanto, há que ter um cuidado especial na aplicação destes índices assim como com a sua interpretação. Muitas das fórmulas matemáticas estão fortemente interligadas tornando-se redundantes (De Benedictis 1973, Stirling & Wilsey 2001) e a sua sensibilidade para discriminar níveis de eutrofização em sistemas aquáticos poderá ser nula (Arhonsitsis et al. 2003). Actualmente, este tipo de indicadores não faz parte do processo de implementação da Directiva Quadro da Água. Porém, como o objectivo final da DQA é atingir qualidade excelente dos ecossistemas, a aplicabilidade de indicadores integrados que combinam elementos de qualidade poderá ser uma ferramenta muito útil numa avaliação futura da qualidade da água (Møhlenberg et al 2007). A biomassa fitoplanctónica em sistemas estuarinos apresenta uma variabilidade considerável, particularmente em estuários em que as flutuações ambientais causadas pelas marés exercem constantemente pressões em escalas de tempo horárias, diárias e quinzenais. As variações temporais do fitoplâncton em estuários podem ser reguladas por factores abióticos como a luz e os fluxos de nutrientes e por interacções bióticas relacionadas com a cadeia trófica (Carpenter et al. 1987, Amstrong 1994, Caraco et al. 1997). O efeito destes factores na comunidade fitoplanctónica é muito complexo, particularmente devido às descargas de água doce e à energia da maré associadas a estes sistemas (Alpine & Cloern 1992, Pennock & Sharp 1994, Cloern 1996). As flutuações de frequência reduzida na comunidade fitoplanctónica são, em geral, originadas pelas variações sazonal e interanual da entrada de água doce no estuário, enquanto que a variabilidade que ocorre com frequência elevada é resultante das oscilações mareais (Aksnes & Lie 1990, Cloern 1991). O facto dos sistemas estuarinos apresentarem diferenças geomorfológicas extremamente grandes, variando entre espaços estreitos de dimensões reduzidas a bacias profundas de grandes dimensões, mais ou menos protegidos por reentrâncias da linha da costa, resulta em padrões de circulação, batimetria, gradientes horizontais e verticais e dinâmica temporal nas zonas de fronteira entre rio e mar, que se verifica serem únicos e específicos de cada sistema estuarino (Monbet 1992). Esta variabilidade acrescida impossibilita generalizações e torna muito difícil o desenvolvimento de paradigmas e modelos conceptuais aplicáveis a diferentes sistemas estuarinos. Torna-se portanto fundamental estudar e avaliar o modo como a biomassa fitoplanctónica é controlada e regulada para cada estuário em particular (Boynton et al. 1982, Cloern et al. 1989). No entanto, a luz e os nutrientes dissolvidos são parâmetros 5 1. INTRODUÇÃO GERAL considerados como fundamentais para a regulação e controle da distribuição do fitoplâncton (Tilman 1977, De Baar, 1994). Os estuários são considerados entre os mais produtivos sistemas aquáticos (Ryther 1969). O fitoplâncton contribui consideravelmente para a produtividade primária destes ecossistemas, estando na base de muitos processos biogeoquímicos e ecológicos. Por exemplo, alterações de pH, concentração de gases dissolvidos (oxigénio, dióxido de carbono), de nutrientes inorgânicos (nitrato, fosfato, silicato e amónio), de nutrientes orgânicos (aminoácidos) encontram-se associados a flutuações na produção primária do fitoplâncton. Em contrapartida, é fundamental entender o modo como a abundância de gases na atmosfera, nomeadamente o dióxido de carbono, influencia o fitoplâncton (Smetacek & Cloern 2008). Compreender como é regulada e controlada a produção primária fitoplanctónica é um dos objectivos fundamentais da investigação sobre alterações ambientais à escala global (Geider et al. 2001). No entanto, existem vários constrangimentos associados à monitorização das alterações ambientais com base no fitoplâncton, dado que as populações de espécies fitoplanctónicas podem aparecer e desaparecer à escala semanal (Silva et al. 2008 a, b), o que segundo Smetacek & Cloern (2008) obriga à monitorização dos ciclos anuais em períodos de tempo muito alargados (pelos menos superiores a trinta anos). Os estudos de longo termo sobre o fitoplâncton indicam uma forte variabilidade e contribuem também para revelar os parâmetros ambientais que estão na base dos ciclos fitoplanctónicos. A quantificação da produção primária fitoplanctónica é uma tarefa complexa, particularmente em estuários, mas que permite inferir sobre as características fisiológicas do fitoplâncton e sobre o modo como este se comporta e responde às alterações ambientais que ocorrem na coluna de água. A fotoaclimatação a níveis oscilantes de luz é uma característica do fitoplâncton que permite a optimização da utilização da luz e que consequentemente influencia os níveis de produção primária em estuários. A fotossíntese do fitoplâncton estuarino é influenciada potencialmente pela disponibilidade de luz reduzida na coluna de água e por mudanças na qualidade espectral (Krik 1994). Adaptações a intensidades luminosas diferentes são já bem conhecidas e encontram-se amplamente descritas (Falkowski 1980, Prezelin 1981). Fitoplâncton pertencente a grupos taxionómicos diferentes possui fotopigmentos com propriedades de absorção específicas que permitem à comunidade a utilização de luz de qualidade espectral variada (Jeffrey & Vesk 1977). 6 1. INTRODUÇÃO GERAL A monitorização do fitoplâncton e os processos associados a esta comunidade são portanto fundamentais para a compreensão do funcionamento dos sistemas estuarinos, à escala local, e das alterações climáticas, à escala global. Esta foi a base de partida para a realização desta tese de doutoramento. O estuário do Tejo é um estuário com uma geomorfologia muito particular, assemelhando-se a uma lagoa tidal (com influência do regime de marés), segundo a definição de Dronkers & Zimmerman (1982). O facto de se distinguir, do ponto de vista geomorfológico, de outros estuários da Europa, torna este sistema um objecto de estudo muito interessante e pertinente. A preocupação de produzir um conjunto de dados sobre o fitoplâncton e dos processos associados a esta comunidade, numa escala de tempo alargada e contínua, foi resultado das lacunas observadas a este nível para o estuário do Tejo. Existem estudos sobre variabilidade do fitoplâncton em escalas de tempo que não ultrapassam dois anos (Cabrita & Moita 1995, Cabrita 1997, Brogueira et al. 2007), e alguns estudos sobre produção primária fitoplanctónica, expressa em termos de carbono (Cabeçadas 1999) e em termos de azoto (Cabrita 1997, Cabrita et al. 1999), também em escalas de tempo mais reduzidas. Com o presente estudo, será possível contribuir para o conhecimento sobre este estuário e esperar que os resultados obtidos sejam utilizados para programas de gestão, protecção e conservação do estuário do Tejo, em particular, e dos estuários portugueses, em geral. Esta contribuição alarga-se ainda a um plano internacional, numa altura em que as solicitações de dados sobre fitoplâncton estuarino se têm verificado cada vez maiores, numa tentativa de se perceberem quais os factores que influenciam variáveis fitoplanctónicas em estuários e relacionar este conhecimento com alterações climáticas, à escala global. Um exemplo deste esforço de compreensão sobre os sistemas estuarinos foi bem visível, por exemplo, no âmbito da conferência AGU-Chapman que se espera produza resultados num futuro próximo. Assim delinearam-se os seguintes objectivos para esta tese: 1. Concretizar e cumprir um programa de monitorização para o estuário do Tejo sobre a dinâmica do fitoplâncton e dos factores que a regulam, com a duração de 7 anos (Março de 1999 a Novembro de 2005). Analisar variações sazonais, interanuais e espaciais da biomassa e da composição taxionómica da comunidade fitoplanctónica e relacioná-las com os parâmetros físico-químicos estudados: temperatura do ar e água, velocidade e direcção do vento, precipitação, caudal do rio, salinidade, pH, matéria particulada em suspensão (SPM, iniciais da expressão inglesa Suspended Particulate Matter), concentração de nutrientes dissolvidos e disponibilidade 7 1. INTRODUÇÃO GERAL de luz na coluna de água. Os resultados deste programa são apresentados no Capítulo 4 desta tese, intitulado de “Influência de factores ambientais na distribuição e composição do fitoplâncton”. 2. Medir a taxa de produção primária fitoplanctónica e investigar algumas características fisiológicas fotossintéticas, à escala mensal, durante o período de um ano (Julho de 2006 a Junho de 2007), por meio do método de aplicação do isótopo radioactivo 14 C, em dois locais considerados representativos da zona média do estuário do Tejo. Este trabalho é apresentado no Capítulo 5: “Produção primária fitoplanctónica e parâmetros fotossintéticos”. 3. Descrever e interpretar padrões gerais na concentração em nutrientes dissolvidos na coluna de água, biomassa e composição fitoplanctónica, assim como identificar e discutir os factores preponderantes para a variabilidade temporal do fitoplâncton do estuário do Tejo. Este trabalho é apresentado no Capítulo 6: ”Padrões gerais: nutrientes, biomassa, composição e sucessão fitoplanctónica”. Convém salientar que este trabalho esteve inserido no programa de monitorização dos ecossistemas terrestre e estuarino na envolvente à CTRSU de S. João da Talha, que decorre no estuário do Tejo desde 1999. Por esse motivo, os locais e o plano de amostragem ficaram condicionados aos requisitos impostos pela empresa financiadora (Valor Sul). 8 Capítulo 2. Área de estudo 2.1 O ESTUÁRIO DO TEJO 2.1 O estuário do Tejo O estuário do Tejo é uma importante fonte de riqueza económica e ambiental (Tabela 2.1). Existe no estuário do Tejo uma comunidade rica de fauna e flora que justifica a existência de uma reserva natural. A reserva natural do estuário do Tejo (RET) foi criada em 1976 e cobre uma área de 146 km2. O preâmbulo do Decreto-Lei que criou esta área protegida (Decreto-Lei nº 565/76, 19 de Julho) alude ao valor biológico do estuário e realça a sua importância como habitat de aves migradoras concluindo pela necessidade de “iniciar uma gestão racional do estuário” de modo a não “comprometer irreversivelmente as suas incontestáveis potencialidades biológicas”. Tabela 2.1: Principais características físicas, sócio-económicas e ecológicas do estuário do Tejo. Físicas 2 Área total 320 km Área total da bacia hidrográfica 80.629 km Profundidade média 10 m Amplitude média de maré a 2 2,4 m 8 3 Volume médio do estuário 19×10 m Volume médio da maré 7,5×10 m Tempo de residência da água doce 8 dias para um Q=813 m s e 26 dias para um Q=145 m s Velocidade máxima da corrente 2,0 m s Caudal anual médio do rio 8 b Descarga média anual de SPM 3 3 -1 3 -1 -1 3 343 m s -1 5 4×10 t (Vale & Sündby 1987) Sócio-Económicas 6 População em redor do estuário 1.6×10 (AML) Área agrícola e industrial 33% e 60%, respectivamente (AML) Descarga anual total de azoto 26000 t (Cabeçadas et al. 2000) Tráfego marítimo 250.000 contentores (11×10 t) Actividades piscatórias locais 316 barcos (DGPA) 6 Ecológicas a b 2 Área de sapal 21 km Peixes diádromos e residentes 44 espécies (Costa & Salgado 1999) Avifauna migratória e residente 120.000 aves (indivíduos) Reserva natural do estuário do Tejo Criada em 1976, (14.660 ha) (Ramsar) - 0,9 m em maré morta e 4,1 m em maré viva. - Média do caudal do rio Tejo (série de 25 anos). O estuário do Tejo é o maior estuário da Europa ocidental (38º44’ N, 9º08’ W) e cobre uma área aproximada de 320 km2 (Fig. 2.1), onde a influência da maré se faz sentir até Muge, a 80 km da sua foz. Porém, a intrusão salina em condições 11 2. ÁREA DE ESTUDO hidrológicas normais é menor, estendendo-se até Vila Franca de Xira, a 50 km do ponto mais a jusante do estuário. Figura 2.1: Imagem de satélite do estuário do Tejo obtida através do programa gratuito Google Earth (http://earth.google.com) (à esquerda), e o mapa de Portugal com o estuário do Tejo em evidência com a localização dos quatro locais de amostragem usados para o estudo nesta tese (à direita). Segundo Silva (1987) o estuário do Tejo poderá ser dividido em quatro áreas: 1) a área fluvial, desde Muge até ao limite da intrusão salina; 2) a área interna, que tem uma morfologia deltaíca e se estende desde Vila Franca de Xira até ao transepto Alcochete-Sacavém, representando este o limite a jusante; 3) a área intermédia, caracterizada por ser em média pouco profunda (7 m) mas com uma razão área/volume tão alta como a verificada na área interna; 4) a área terminal, também denominada “o corredor do Tejo”, caracterizada por um canal profundo e estreito, com 15 km de comprimento e 2 km de largura, com um máximo de 46 m de profundidade e onde se observam intensas correntes de maré. A área interna representa 40% do total da área do estuário e é maioritariamente caracterizada pela presença de várias ilhas, esteiros e por uma de área entre-marés de grande extensão. Tem uma profundidade média muito baixa (raramente >5 m). Esta parte tem uma grande importância piscatória e comercial assim como ecológica com a presença de quase toda a área da RET. Nas margens da zona intermédia estão localizadas variadas indústrias, as quais constituem importantes fontes de poluição. 12 2.1 O ESTUÁRIO DO TEJO É nesta zona que as travessias marítimas feitas por barcos comerciais são efectuadas. As principais fontes de entrada de água doce para o estuário são os rios Tejo, Sorraia e Trancão, tendo o Tejo a influência preponderante. O rio Tejo nasce em Espanha (onde é conhecido como Tajo) a 1593 m de altitude na serra de Albarracim, e percorre cerca de 1100 km (230 km em Portugal) até atingir o estuário por um estreito e único canal. A sua bacia hidrográfica é de 80.629 km2 dos quais 24.800 km2 (29,8%) se localizam em Portugal, sendo a segunda bacia mais importante da Península Ibérica depois da do Rio Ebro (Fig. 2.2). Durante as décadas de 80 e 90, mais de 15 barragens foram construídas na bacia hidrográfica do rio Tejo, afectando o regime de descarga de água doce no estuário. Figura 2.2: Representação da área da bacia hidrográfica do rio Tejo. Imagem retirada do Global Resource Information database-Europe (GRID) do programa ambiental das Nações Unidas. O caudal do rio Tejo está sujeito a grandes variações interanuais, assim como a uma pronunciada variabilidade sazonal Inverno-Verão. A descarga média anual pode variar entre 80-720 m3 s-1, e as suas descargas médias mensais podem variar entre 100-2200 m3 s-1 (Loureiro 1979). Por sua vez, o rio Sorraia é um afluente da vertente esquerda do estuário que apresenta a maior das sub-bacias, com 7.555 km2. No entanto, o escoamento médio anual do rio Sorraia é de apenas 40 m3 s-1 o que representa menos de 15% da descarga do rio Tejo. O Trancão (antigamente chamado de rio de Sacavém) é um rio pequeno (cerca de 29 km) do Distrito de Lisboa (nasce no município de Mafra) e tem um caudal natural muito baixo (6 m3 s-1) quando comparado com os dois anteriores. Infelizmente, o rio Trancão tornou-se célebre pelas descargas poluentes efectuadas por fábricas localizadas em ambas as margens do rio, ao longo de toda a sua extensão. No entanto, no seguimento do projecto da Expo98, foi contemplada a sua completa despoluição, processo que se vem verificando desde então, e que passou, 13 2. ÁREA DE ESTUDO nomeadamente, pela construção de uma ETAR (Estação de Tratamento de Águas Residuais) em Frielas tendo em vista a sua reabilitação. Morfologicamente, e segundo a classificação de Dronkers & Zimmerman (1982), o estuário do Tejo poderá ser caracterizado como do tipo lagunar sujeito ao efeito das marés, em que as correntes de maré na zona sul e oriental são perpendiculares ao eixo do canal principal. É um estuário mesotidal (amplitude média de maré é entre 2-4 m, NOAA), onde o regime de marés é caracterizado por uma periodicidade semidiurna (cerca de 12h 25m) e onde a amplitude de maré (em Lisboa) varia desde menos de 1 m em maré morta até 4 m em maré viva. A onda de maré é progressiva, e em maré viva, a água superficial demora, em média, 2h de Lisboa a Vila Franca de Xira. A maré é um factor muito importante no estuário, dado que o volume médio de maré (prisma de maré) é quase 50% do volume médio do estuário, 7,5×108 m3 e 19×108 m3 respectivamente (Drena 1979) (Tabela 2.1). As características da água do estuário, assim como dos processos físico-químicos que aí ocorrem, estão directamente dependentes do tempo de permanência da água doce no estuário, que pode variar entre 26 dias para um caudal do rio de 145 m3 s-1 a 8 dias para caudais da ordem dos 813 m3 s-1 (Cabrita & Brotas 2000), apresentando um valor de 23 dias quando os caudais do rio se aproximam dos 300 m3 s-1. Tão importantes como as correntes provocadas pela descarga do rio, são as correntes devidas à maré. No estuário do Tejo e em maré viva, estas correntes podem ter o valor máximo de 2 m s-1 na área terminal e 1,2 m s-1 na área intermédia (Vale & Sündby 1987). No geral, a direcção das correntes de entrada e saída de água são paralelas ao eixo longitudinal do estuário. No entanto, na parte mais a jusante da área intermédia, a direcção das correntes de entrada e saída de água são quase perpendiculares ao eixo do corredor do Tejo (área terminal) movendo a água para, e das zonas de espraiados de maré. O vento poderá ser localmente importante mas tem uma importância secundária na circulação global. Porém, os ventos dominantes no estuário são do quadrante Noroeste e Norte, especialmente no Verão. No Inverno, os ventos fortes são do quadrante Oeste, Sul e Sudoeste. Os ventos menos frequentes são os vindos de Sul, Este e Sudeste. Dependendo das interacções existentes entre o caudal do rio e a maré, a estratificação da coluna de água do estuário do Tejo, poderá ser verticalmente misturada ou parcialmente estratificada (Câmara et al. 1987). A distribuição vertical da salinidade é uniforme especialmente quando os caudais fluviais são grandes (Martins et al. 1984) e em marés vivas, mas a estratificação poderá ser parcial em condições de maré morta (Vale & Sündby 1987; Ambar & Costa 1990). 14 2.1 O ESTUÁRIO DO TEJO É sabido que os processos que envolvem o transporte de água e sedimentos no estuário são de grande complexidade. Apesar disso, a amplitude de maré parece ser, em grande escala, o parâmetro responsável pela elevada turbidez da coluna de água do estuário. Estudos de Vale & Sündby (1987) comprovaram a existência de um ciclo quinzenal de erosão-sedimentação dos sedimentos no estuário. Zonas de turbidez máxima (SPM>50 mg L-1) são inexistentes em marés mortas (1-3 m de amplitude de maré), contudo, estas vão surgindo em maior quantidade à medida que a amplitude de maré aumenta (>3 m de amplitude de maré) e em todo o estuário. Nestas zonas, a distribuição vertical da matéria particulada em suspensão é sempre estratificada, com as maiores concentrações encontradas perto do fundo. Os sedimentos do fundo do estuário são maioritariamente uma mistura de material fluvial e derivados marinhos (Oliveira 1967). A distribuição dos sedimentos parece ser resposta às mudanças das condições na corrente de maré e no fluxo do rio, como evidenciado por frequentes camadas intercaladas de lama e areia presente no fundo (Oliveira 1967). Em relação à granulometria, Calvário (1982) refere que a maior parte da zona entre marés é constituída por vasa (96% de limo e argila). Por ser um estuário mesotidal e pouco profundo, com uma profundidade (hidráulica) média de 10 m, os efeitos da maré criam no estuário uma zona de espraiados de maré muito extensa que constitui 20% a 40% da área total do estuário, em marés mortas e vivas, respectivamente (Costa & Câmara 1982). Estas áreas entre marés são na sua maior parte constituídas por sapais, antigas ostreiras e bancos de areia e vasa. O estuário do Tejo encontra-se actualmente sujeito a várias tensões como resultado de usos diversos. Este recebe efluentes de fontes agrícolas, industriais e urbanas. A exploração dos seus recursos naturais, a sua utilização como importante porto de mar, as actividades de recreio, a crescente urbanização das suas margens e a instalação de um elevado número de indústrias são alguns dos múltiplos interesses que se confrontam no estuário do Tejo. Também há regiões das suas margens que mantêm uma ocupação agrícola dos solos, de carácter mais ou menos intensivo, que provoca o arrastamento para o estuário de uma grande quantidade de pesticidas e fertilizantes pelas águas de escorrência (pluviais). O tratamento de efluentes urbanos e industriais do estuário do Tejo começou em 1990. Actualmente, existem 20 estações de tratamento a operar na área envolvente ao estuário. Contudo, e segundo Costa & Salgado (1999), dever-se-á reforçar ainda mais o sistema de ETARs, desenvolver bio-indicadores e índices biológicos para determinar e manter o nível da qualidade ecológica da água. 15 2.1 O ESTUÁRIO DO TEJO 2.2 Condições climatéricas A região do estuário do Tejo apresenta um clima com influência Atlântica e Mediterrânea, caracterizado por duas estações temperadas, o Outono e a Primavera, intercaladas com duas estações menos temperadas: o Verão, sendo quente e seco e o Inverno, com frio moderado e húmido, mas pouco chuvoso. Ao longo do ano, a precipitação ocorre sobretudo durante 2-4 meses, sendo rara no resto do ano. 2.2.1 Temperatura do ar Durante o período em estudo (1999-2007), as temperaturas do ar apresentaram um característico padrão de sazonalidade, com as temperaturas do ar mais elevadas no Verão (22,7°C) e menores no Inverno (11,2°C) (Fig. 2.3, Tabela 2.2). Figura 2.3: (a)Temperaturas do ar máximas e mínimas diárias desde Janeiro de 1999 até Junho de 2007, (b) média mensal da temperatura do ar da série histórica correspondentes a 50 anos (1940-1990), ambas para a estação do INAG, S. Julião do Tojal (20C/01). Em média o mês de Agosto representou o mês mais quente do ano (23,6°C) e Janeiro o mês com temperaturas mais frias (10,1°C). No dia 1 de Agosto de 2003 foi obtida a temperatura máxima registada (42,7°C) como também a mais alta 16 2.3 LOCAIS DE AMOSTRAGEM temperatura mínima de todo o período em estudo (25,2°C, Fig. 2.3a). Comparando as temperaturas médias mensais registadas durante este estudo com as temperaturas médias mensais da série histórica (1940-1990) podemos verificar que os Invernos de 2000, 2005 e de 2006 foram mais frios, e os Verões de 2003, 2005 e de 2006 foram mais quentes que os da série histórica (Fig. 2.3b). É de salientar que o ano de 2005 foi o mais atípico dos anos em estudo. 2005 registou o Verão mais quente desde 1931 (mais 2,4°C acima da média histórica) e ao mesmo tempo, sofreu uma onda de frio no Inverno, atingindo a menor temperatura mínima (-2,9°C em 1 de Fevereiro). Figura 2.4: (a) Média mensal das temperaturas máximas e mínimas durante o período em estudo (1999-2007) e para as verificadas na série normal climatológica de 1961-1990 para a estação de Lisboa (535) do Instituto de Meteorologia, (b) temperaturas do ar médias mensais no decorrer deste estudo (1999-2007) e temperaturas do ar médias mensais para o período compreendido entre 1940-1990. Ao confrontar as médias mensais das temperaturas máximas e mínimas verificadas ao longo deste estudo com as registadas na série de normais climatológicas (1961-1990), verificamos que em média, durante este estudo, houve um aumento na temperatura máxima em quase todos os meses do ano, com destaque para os meses de Junho e Agosto, com um aumento de 2,3°C e 1,7°C, respectivamente (Fig. 2.4a). Quanto à média mensal da temperatura mínima verificada entre 1999-2007, esta foi mais baixa que a registada na série histórica, sendo os meses de Inverno os que registam a maior diferença (Fig. 2.4a). No que diz respeito às médias mensais da temperatura do ar registadas durante 1999-2007, verificou-se que em média, quase todos os meses do ano sofreram um aumento da temperatura do ar, sendo o mês de Junho aquele que teve o maior aumento (1,2°C, Fig. 2.4b). 17 2. ÁREA DE ESTUDO 2.2.2 Velocidade e direcção do vento Durante o decorrer deste estudo, o Verão foi em média a estação que apresentou as maiores velocidades do vento (3,7 m s-1), associadas aos rumos Norte e Noroeste (Fig. 2.5, Fig. 2.6). De modo contrário, os ventos de menor intensidade foram verificados no Outono (3,2 m s-1) (Tabela 2.2). Figura 2.5: Média diária (eixo y) e média mensal (eixo yy) da velocidade do vento (Ws) durante o período em estudo (1999-2007) para a estação de Lisboa (535) do Instituto de Meteorologia. O mês de Julho revelou ser em média, o mês mais ventoso ao longo dos anos em estudo (3,9 m s-1). A velocidade média diária do vento apresentou valores compreendidos entre 0,8-9,7 m s-1 (Fig. 2.5). Figura 2.6: Valores médios da velocidade do vento organizados por rumos para todo o período em estudo (Wd) (z) e apenas para os meses de Verão (z) para a estação de Lisboa (535) do Instituto de Meteorologia. Avaliando a média diária da direcção do vento, o rumo Noroeste foi o mais frequente (27%) e os rumos vindos de Sul, Sudeste e Este foram os menos frequentes, com 3,0, 1,1 e 0,9%, respectivamente. Em média os ventos mais intensos foram os do quadrante Sul (4,1 m s-1), seguidos dos vindos de Norte (3,9 m s-1) (Fig. 2.6). 18 2.3 LOCAIS DE AMOSTRAGEM 2.2.3 Caudal do rio Tejo e precipitação Ao longo da série temporal em estudo a variação sazonal do caudal médio diário do rio Tejo acompanha as variações da precipitação diária total, apenas com excepções pontuais (Fig. 2.7, Fig. 2.8). Figura 2.7: Valores diários e médias mensais do caudal do rio Tejo para o período em estudo (1999-2007) e para a série temporal de 1973-1998 registados na estação de Almourol (17G/02) (INAG). O caudal do rio Tejo revelou um forte padrão sazonal, alternado de um caudal elevado no Inverno (727,5 m3 s-1) para um caudal reduzido no Verão (125,5 m3 s-1) (Fig. 2.7, Tabela 2.2). A variabilidade interanual do caudal do rio Tejo foi muito acentuada, variando de um ano húmido em 2001 (735,5 m3 s-1) para um valor crítico de um ano muito seco (52,8 m3 s-1) em 2005 (Fig. 2.7). No que diz respeito à precipitação verificada, o Inverno de 2001 foi extremamente chuvoso (Fig. 2.8). Nesse ano, o mês de Dezembro registou quase o triplo do valor da precipitação da normal climatológica (1961-1990) (272 mm e 108 mm, respectivamente). Em oposição, o ano de 2005 caracterizou-se por apresentar valores de precipitação muito inferiores aos valores médios da série da normal climatológica (1961-1990), classificando-se como um ano extremamente seco. Indo além da série histórica, o ano de 2005 registou o valor de precipitação mais baixo desde 1931. Desde 2003, todos os Verões têm sido extremamente quentes e a precipitação abaixo das médias históricas, com excepção do ano 2006, ocorrendo nesta área um regime de seca moderada. Em média, o mês de Outubro foi o que registou a maior quantidade de precipitação (121 mm). Por outro lado, Julho registou, em média, a menor quantidade de precipitação (3 mm). 19 2. ÁREA DE ESTUDO Figura 2.8: Valores diários e mensais da precipitação total para o período em estudo (1999-2007) e para a série normal climatológica (1961-1990) verificada na estação Lisboa (535) (IM). 2.2.4 Irradiância 1 Convertida a partir dos valores da irradiância média diária atmosférica (Ed, W m-2), a irradiância média diária fotossinteticamente activa atmosférica (Epar, µmol m-2 s-1), apresentou um padrão característico de sazonalidade, idêntico ao verificado para a temperatura do ar (Fig. 2.9). Figura 2.9: Média diária e média mensal da irradiância fotossinteticamente activa (400-700 nm) em µmol fotões m-2 s-1 registada na estação de Lisboa (IM), durante o decorrer deste estudo. O mês de Julho foi, em média, o mês que apresentou uma irradiância média diária mais elevada (503 µmol m-2 s-1). Por outro lado, Dezembro foi aquele que registou o valor de irradiância mais baixo (133 µmol m-2 s-1). Durante todo o período em estudo, a irradiância média diária (Ed) oscilou entre um máximo de 698 µmol m-2 s-1 e um mínimo de 14 µmol m-2s-1 (Tabela 2.2). 1 - Neste trabalho, a palavra irradiância vem da palavra inglesa irradiance que significa o fluxo de energia radiante, 2 1 2 proveniente de várias direcções, por unidade de superfície (em µmol fotões m s ou W m ). 20 2.3 LOCAIS DE AMOSTRAGEM Tabela 2.2: Estatística descritiva da média diária da temperatura do ar, intensidade do vento, precipitação, caudal do rio e irradiância na área envolvente aos quatro locais de amostragem, desde Março de 1999 até Junho 2007. n Média Mediana DesPad Min-Máx 17,0 22,7 15,2 11,2 16,5 16,4 22,4 15,3 11,4 16,1 3,7 2,6 4,0 2,8 5,3 9,3-32,6 16,4-31,3 5,5-26,3 4,3-20,0 4,3-32,6 3,7 3,7 3,2 3,3 3,5 3,6 3,6 3,0 3,0 3,3 1,1 1,0 1,3 1,4 1,2 1,3-8,5 1,6-6,9 0,8-9,4 0,8-9,7 0,8-9,7 1,4 0,4 3,6 2,5 2,0 0,0 0,0 0,2 0,1 0,0 4,4 2,5 8,3 6,6 6,0 0,0-55,0 0,0-41,7 0,0-69,5 0,0-55,4 0,0-69,5 Temperatura do ar (ºC) Primavera 825 Verão 758 Outono 706 Inverno 789 Total 3078 -1 Intensidade do vento (m s ) Primavera 805 Verão 754 Outono 696 Inverno 730 Total 2985 Precipitação (mm) Primavera 755 Verão 654 Outono 702 Inverno 747 Total 2858 3 -1 Caudal do rio Tejo (m s ) Primavera 810 Verão 716 Outono 641 Inverno 768 Total 2935 -2 -1 166,2 110,9 190,2 1,8-1213,4 101,2 329,9 520,5 278,8 81,3 183,6 155,3 109,1 93,2 456,2 888,3 539,3 3,8-1067,9 2,1-5197,3 2,4-5686,2 1,8-5686,2 427,8 457,3 196,6 199,8 321,4 450,0 468,7 185,8 191,8 303,6 128,3 113,4 89,7 88,8 162,2 88,6-686,1 73,3-698,0 14,4-451,3 17,8-479,4 14,4-698,0 Irradiância (µmol m s ) Primavera 803 Verão 706 Outono 690 Inverno 784 Total 2983 2.3 Locais de amostragem As colheitas de água (±1 m da superfície da coluna de água) foram realizadas em quatro locais no estuário do Tejo, três deles localizados ao longo de um eixo longitudinal (S1, S3 e S4) e um quarto situado na Cala do Norte (S2) (Fig. 2.1). Os quatro locais de amostragem, localizados num raio de 10 km circundante à CTRSU, foram escolhidos no âmbito do projecto “Programa de Monitorização dos ecossistemas Terrestre e Estuarino na envolvente à CTRSU de S. João da Talha”, pelo que a selecção dos locais ficou condicionada pelos objectivos do projecto, limitando-os à zona envolvente à CTRSU. No entanto, estes locais permitiram estudar diferenças físico-químicas específicas resultantes da sua localização longitudinal no estuário. O local S1 (38° 52’ 39,49’’ N, 9° 1’ 26,99’’ W) situa-se entre a ponta Sul do Mouchão de Alhandra e a ponta Norte do Mouchão da Póvoa. Esta estação é a que se encontra mais a montante, entre as quatro e, consequentemente, a que tem maiores influências do rio Tejo. O local S1 apresentou uma profundidade média de 21 2. ÁREA DE ESTUDO 3,0 ± 0,6 m (n = 81). O local S2 (38° 49’ 37,66’’ N, 9° 4’ 39,37’’ W) situa-se na Cala do Norte em frente à CTRSU com uma profundidade média de 3,3 ± 1,4 m (n = 76). A Cala Norte é um canal com a profundidade média de 2 m (Nunes 1993) que se desenvolve entre o aeródromo de Alverca e a Doca dos Olivais, numa extensão de cerca de 14 km. Este canal encontra-se delimitado pela margem Norte do rio Tejo e por uma ilha, o Mouchão da Póvoa. Possui uma hidrodinâmica baixa em que os seus sedimentos são essencialmente de origem fluvial (Vale 1986). A margem da Cala do Norte encontra-se fortemente industrializada, principalmente entre a Doca dos Olivais e a Póvoa de Santa Iria. É também neste troço que desagua o rio Trancão, fonte de grande quantidade de poluentes e de matéria particulada em suspensão. Situado entre o banco do Ladeiro e o Mouchão da Póvoa, encontra-se o local S3 (38° 49’ 18,45’’ N, 9° 3’ 9,63’’ W). Este local de amostragem apresentou uma profundidade média de 3,5 ± 0,5 m (n = 76). Finalmente, o local S4 (38° 46’ 35,78’’ N, 9° 2’ 29,71’’ W) é o mais próximo do estreito que permite a entrada de água do mar no estuário, sendo por isso, aquele que se localiza mais a jusante. Esta estação com uma profundidade média de 5,3 ± 1,4 m (n = 71) encontra-se a Este da Ponta do Destrói, nome dado a um banco de ostras aí existente (actualmente extinto) que fica a descoberto nas marés vazias de maior amplitude. Todos os locais de amostragem ficam a montante da ponte Vasco da Gama. Neste Capítulo foi descrita a área onde este estudo foi desenvolvido assim como as condições climatéricas observadas no decorrer deste (de Janeiro de 1999 a Junho de 2007). Também os quatro locais de amostragem foram aqui caracterizados. O programa de amostragem assim como as metodologias usadas encontram-se detalhados no Capítulo 3. 22 Capítulo 3. Material e métodos 3.1 PROGRAMA DE AMOSTRAGEM 3.1 Programa de amostragem Os estuários que sofrem uma influência forte da maré ficam sujeitos a oscilações drásticas de muitas variáveis em escalas de tempo com período semidiurno, quinzenal e anual. Os mecanismos de mistura da água doce e oceânica (caudal do rio e maré) assim como as variáveis que interferem com a interface água-atmosfera (vento, temperatura, irradiância) contribuem para a variabilidade temporal das condições físico-químicas e biológicas de um estuário. Estes mecanismos poderão ser estudados em várias escalas de tempo: horas, dias, semanas, meses e anos. Este trabalho reflecte o estudo das duas últimas escalas temporais. As restantes duas escalas não foram objecto de estudo pois não estava no propósito inicial do trabalho assim como seria muito difícil o acesso diário ou mesmo semanal à embarcação necessária para o transporte aos locais de amostragem. No entanto, existiram esporadicamente amostragens bimensais. 3.1.1 Escala temporal O programa temporal foi desenhado tomando em consideração a grande importância da dinâmica do ciclo de marés. Durante todo este trabalho, o programa de amostragem foi realizado uma vez por mês e sempre em maré morta, de modo a atenuar a influência do ciclo de marés (viva-morta). Houve a preocupação de começar sempre a amostragem à hora da maré-cheia para beneficiar de uma maior estabilidade da coluna de água. A existência de marés mortas em simultâneo com a maré-cheia ocorre invariavelmente da parte da manhã, e duas vezes por mês. Deste modo, a amostragem foi sempre antes das 11 horas da manhã e intercaladas de cerca de 30 dias da amostragem anterior, resultando assim numa colheita uniforme ao longo de todo o trabalho. Num curto período de tempo (entre Março a Maio de 2004) foi realizada uma amostragem bimensal mas sempre nas condições anteriormente descritas. O programa de amostragem desta tese iniciou-se em Março de 1999 e terminou em Novembro de 2007. 3.1.2 Escala espacial De modo a ser possível estudar a variabilidade espacial dos principais factores que contribuem para o desenvolvimento da comunidade do fitoplâncton estuarino, foram amostrados quatro locais (S1, S2, S3 e S4) na zona média do estuário do Tejo (Fig. 2.1). Os quatro locais de amostragem encontram-se no raio de 10 km circundante à Central de Tratamento de Resíduos Sólidos Urbanos (CTRSU). Estes locais foram, como referido anteriormente, escolhidos no âmbito do projecto 25 3. MATERIAIS E MÉTODOS “Programa de monitorização dos ecossistemas terrestre e estuarino na envolvente à CTRSU de S. João da Talha”, pelo que apenas esta área do estuário foi caracterizada. No entanto, os quatro locais foram mantidos para este trabalho porque eles revelaram as diferenças longitudinais de temperatura, salinidade e concentração de nutrientes a que está sujeito o estuário (Gameiro et al. 2004). 3.1.3 Amostragem da água As amostras de água destinadas à determinação da taxa de produção primária, concentração de nutrientes dissolvidos na coluna de água, clorofila a (Chl a), feopigmentos, fotopigmentos e matéria particulada em suspensão, assim como para a identificação e quantificação das espécies fitoplanctónicas, foram colhidas a ±1 m da superfície com o auxílio de um balde previamente lavado com água do local. As amostras foram imediatamente pré-filtradas com uma rede com malha de 200 µm de modo a remover o zooplâncton e outras partículas em suspensão de maiores dimensões. Seguidamente, as amostras foram armazenadas em recipientes de 10 L, opacos, a uma temperatura semelhante à registada na coluna de água no momento da amostragem, e transportadas, no escuro, para o laboratório onde foram processadas. O tempo decorrido entre a amostragem e o final do processamento e armazenamento das amostras correspondeu, em geral, em menos de 2 horas. 3.2 3.2.1 Metodologias Medições no campo A irradiância fotossinteticamente activa (Epar, µmol m-2 s-1) foi medida à superfície, sub-superfície (E0) e em intervalos de 0,5 m ao longo da coluna de água (Ez), com um radiómetro de sensor plano da LI-COR (Li-192), em cada data e local de amostragem. A temperatura do ar e da água, a salinidade e o pH à superfície foram também medidos. Amostras de água pré-filtradas, destinadas à determinação do amónio dissolvido foram imediatamente fixadas no local, com os respectivos reagentes. 3.2.1.1 Profundidade da coluna de água (z), zona de mistura (zmix) e zona eufótica (zeuf) Devido às alterações constantes da topografia do fundo estuarino, a profundidade da coluna de água (z, m) foi medida em todas as datas e locais de amostragem. A ausência de estratificação na coluna de água dos quatro locais de amostragem foi 26 3.3 METODOLOGIAS antecipadamente verificada (Gameiro et al. 2004), para condições de maré idênticas às do programa de amostragem utilizadas neste estudo. Deste modo, foi admitido que a coluna de água era homogénea em todos os locais de amostragem e que correspondia na sua totalidade à zona de mistura (zmix, m), de modo que z=zmix. Consequentemente, considerou-se que o fitoplâncton se encontrava uniformemente distribuído no total da coluna de água. A profundidade da zona eufótica (zeuf, m) foi considerada como a profundidade com 1% da irradiância fotossinteticamente activa superficial, sendo esta estimada através da medição de Kpar aplicando a fórmula 2 4,6/Kpar. A razão de mistura crítica (zmix:zeuf) obteve-se a partir de zmix/zeuf. 3.2.1.2 Coeficiente de extinção da luz (Kpar) O coeficiente de extinção da luz (Kpar, m-1), quantifica a taxa com que a irradiância superficial (E0) é atenuada ao penetrar na coluna de água, quer devido à absorção quer à dispersão por parte dos seus componentes. Este coeficiente foi determinado medindo o Epar numa série de profundidades com um intervalo de 0,5 m ao longo da coluna de água (Ez). A irradiância diminui de modo exponencial de acordo com: ⎛ ⎞ E (z) = E 0 exp ⎜⎜ − K par ∗ z ⎟⎟ ⎝ ⎠ onde, E0 simboliza a irradiância sub-superficial e Ez a irradiância à profundidade de z metros. 3.2.1.3 Irradiância média da coluna de água (Em) Considerando o decréscimo exponencial de Epar com a profundidade numa coluna de água homogénea (z=zmix), a irradiância média de toda a coluna de água (Em) pode ser calculada por: Em (µmol fotões m-2 s-1 ) = [ −K par * zmix E0 ∗ 1− e K par * zmix ] 2 - Para um Kpar constante ao longo da profundidade, temos E(z) = E0 exp (-Kpar * z), e assim z = (1/Kpar) loge [E0/Ez]. A profundidade da zona eufótica será, z = (1/Kpar) loge (100) = 4,6/Kpar também conhecida como profundidade óptica (Platt & Sathyendranath 2002). Esta é uma suposição razoável para água túrbidas e muito útil para estimar a profundidade da zona eufótica (Kirk 1994). 27 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.2.2 Parâmetros meteorológicos 3.2.2.1 Irradiância atmosférica A irradiância média diária (Ed, W m-2) e a irradiância máxima diária atmosférica (Emax, W m-2), foram obtidas para todo o período de estudo, através de dados de irradiância solar global da estação meteorológica de Lisboa (Gago Coutinho) fornecidos pelo Instituto de Meteorologia (IM). Para conversão destes valores em irradiância fotossinteticamente activa (Epar, µmol m-2 s-1) (400-700 nm) foi considerado que 31 W m-2 = 4,18 µmol m-2 s-1 e que apenas 45% da irradiância solar global incidente corresponde à irradiância fotossinteticamente activa (Kirk 1994). 3.2.2.2 Fotoperíodo A duração do fotoperíodo (D, min) foi calculado a partir das horas do nascimento e ocaso do Sol em Lisboa, fornecidas pelo Observatório Astronómico de Lisboa da FCUL. 3.2.2.3 Temperatura do ar A série da temperatura média do ar (T,°C) foi obtida da estação meteorológica automática de S. Julião do Tojal do Instituto Nacional da Água (INAG) e da estação de Lisboa (Gago Coutinho) do Instituto de Meteorologia (IM). Os dados obtidos no IM foram unicamente usados para preencher omissões nos valores disponibilizados pelo INAG. 3.2.2.4 Velocidade e direcção do vento As séries de dados de velocidade e direcção do vento (Ws, m s-1 e Wd, °, respectivamente) foram obtidas a partir da estação de Lisboa (Gago Coutinho), do Instituto de Meteorologia (IM). 3.3.1.5 Precipitação A série de dados de precipitação diária (Rf, mm) foi fornecida pelo Instituto Nacional da Água (INAG), obtida a partir da estação meteorológica automática de S. Julião do Tojal. 3 - Corresponde à energia de 1 fotão com um comprimento de onda médio (550 nm). 28 3.3 METODOLOGIAS 3.2.3 Parâmetros hidrológicos 3.2.3.1 Temperatura da água A temperatura da água (Tw,°C) foi medida com o auxílio de um termómetro de mercúrio (precisão = 0,1°C), em cada data e local de amostragem. 3.2.3.2 Salinidade A salinidade da água (S) foi medida por meio de um refractómetro ATGO S/Mill-E, em cada data e local de amostragem. 3.2.3.3 pH O pH da água foi quantificado com um medidor GROCHEK HI 9813 (Hanna Instruments), em cada data e local de amostragem. 3.2.3.4 Caudal do rio Os dados de caudal diário do rio Tejo (Q, m3 s-1) foram fornecidos pelo Instituto Nacional da Água (INAG), obtidos a partir da estação automática de Almourol. Esta estação foi escolhida por disponibilizar o maior número de dados fiáveis para o período de tempo que compreendeu este estudo. O caudal do rio Sorraia não foi contabilizado para a soma total da descarga de água doce no estuário do Tejo devido a permanentes problemas técnicos nas bóias de recolha de dados do INAG. 3.2.4 Nutrientes inorgânicos dissolvidos na coluna de água Para a análise da concentração dos principais nutrientes dissolvidos na coluna de água (nitrato, nitrito, amónio, orto-fosfato e silicato), necessários para o estudo da dinâmica do fitoplâncton, foram realizados três replicados por nutriente em cada data e local de amostragem. As amostras de água foram filtradas através de filtros de fibra de vidro Whatman® GF/C (Head 1985), logo após a sua colheita e guardadas em recipientes de polipropileno (30 ml) previamente descontaminados. Para a análise de orto-fosfatos, as amostras foram guardadas dentro de frascos de vidro (25 ml), para prevenir a absorção deste nutriente pela superfície plástica. Todas as amostras, com excepção das amostras para análise do amónio, foram congeladas a -20°C, imediatamente após filtração e mantidos a essa temperatura até posterior análise. A análise do amónio processou-se sempre no dia da colheita das amostras de água. As concentrações de nitrito, nitrato, orto-fosfato e de silicato foram quantificadas no analisador FiaStarTM 5000 da Foss (Denmark), ligado a um processador com o 29 3. MATERIAIS E MÉTODOS software SoFia. Esta análise foi realizada em fluxo contínuo (FIA, iniciais da expressão inglesa Flux Injection Analysis). À soma das concentrações de amónio, nitrito e nitrato denominou-se de soma dos compostos azotados inorgânicos dissolvidos na coluna de água (DIN, iniciais da expressão inglesa Dissolved Inorganic Nitrogen). A análise da concentração de DIN foi realizada desde Março de 1999 a Novembro de 2007, enquanto que a análise de orto-fosfatos e silicatos começou em Maio 2001, terminando em Novembro de 2007. 3.2.4.1 Amónio (NH4+) A quantificação do amónio (NH4+, µmol L-1) dissolvido na coluna de água foi realizada manualmente através do método do azul de indofenol, segundo Koroleff (1969). Este método é baseado na reacção entre NH4+ e hipoclorito, numa solução ligeiramente alcalina, formando-se monocloroamina. Este composto, na presença do fenol de nitroprussiato (usado como catalizador) e de hipoclorito em excesso, forma indofenol de cor azul. Em águas salinas, são necessárias, pelo menos, seis horas para se completar a formação do azul de indofenol. As densidades ópticas do azul de indofenol foram medidas a 630 nm, num espectrofotómetro Hitachi U-3200. O limite de detecção e precisão obtidos para este método foram 0,2 µM e ±0,03 µM, respectivamente. 3.2.4.2 Nitrito (NO2-) A quantificação da concentração de nitrito inorgânico dissolvido (NO2-, µmol L-1) na coluna de água foi realizada segundo o método descrito por Bendschneider & Robison (1952). Este método é baseado na reacção entre o NO2e a sulfanilamida, numa solução ácida, formando-se o composto diazo. O composto diazo reage com a naftiletilenodiamina, produzindo-se um complexo com coloração rosa. As densidades ópticas foram medidas a 540 nm num espectrofotómetro inserido no analisador FiaStarTM 5000. O limite de detecção deste método é de 0,04 µM e precisão calculada foi de ±0,01 µM. 3.2.4.3 Nitrato (NO3-) A quantificação da concentração em nitrato inorgânico dissolvido (NO3-, µmol L-1) na coluna de água foi realizada segundo o método descrito por Grasshoff (1976). Através deste método, a obtenção da concentração de NO3- é obtida indirectamente subtraindo a concentração de NO2- à soma das concentrações de NO3- e de NO2-. O NO3- existente na amostra é reduzido a NO2- numa coluna de cádmio. O NO2- é 30 3.3 METODOLOGIAS então determinado como descrito na secção 3.3.4.2. O limite de detecção 0,4 µM e a precisão do método foi ±0,07 µM. 3.2.4.4 Orto-fosfato (PO43-) O fósforo que existe na água encontra-se quase exclusivamente sob a forma de fosfatos e orto-fosfatos, sendo esta última a forma mais abundante. Por este motivo, a quantificação deste nutriente fez-se quantificando a concentração de orto-fosfato dissolvido (PO43-, µmol L-1) na coluna de água. Esta foi realizada segundo o método descrito por Murphy & Riley (1962). O método é caracterizado pela reacção do orto-fosfato com molibdato de amónio, formando-se o ácido fosfomolibdato. Posteriormente, adiciona-se cloreto estanhoso em meio ácido, que dá origem a molibdatofosfórico, um complexo de cor azul. A intensidade da cor azul é medida a 710 nm num espectrofotómetro inserido no analisador FiaStarTM 5000. O limite de detecção é 0,03 µM e a precisão deste método ± 0,02 µM. 3.2.4.5 Silicato (SiO2) O termo silicato é usado para denotar um agregado que consiste de silício e oxigénio (geralmente como SiO2 ou SiO4), um ou mais metais e possivelmente hidrogénio. A quantificação da concentração de silicatos dissolvidos na coluna de água foi realizada avaliando a concentração em dióxido de silício, também conhecido como sílica (SiO2, µmol L-1) segundo o método descrito por Murphy & Riley (1962) e mais tarde modificado por Fanning & Pilson (1973). A amostra é colocada no sistema de fluxo e misturado com molibdato de amónia a uma temperatura de 70°C. A um pH aproximado de 1,2, o molibdato reage com a sílica, assim como com qualquer orto-fosfato que esteja presente. Ao adicionar o ácido oxálico, este destrói o ácido molibdofosfórico mas não o ácido molibdosílico eliminando a interferência vinda do orto-fosfato existente. A cor amarela produzida é reduzida pelo cloreto estanhoso resultando num complexo azul. A cor azul é mais intensa que a amarela, e é proporcional ao “molibdato reactivo” da sílica. As densidades ópticas foram medidas a 720 nm num espectrofotómetro inserido no analisador FiaStarTM 5000. O limite de detecção deste método é de 0,6 µM e a sua precisão de ±0,07 µM. 3.2.5 Matéria particulada em suspensão (SPM) A concentração de matéria particulada em suspensão (SPM, mg L-1) foi determinada por filtração das amostras de água através de filtros de fibra de vidro Whatman® GF/C (com poro irregular de ±1,2 µm), previamente pesados. Após a 31 3. MATERIAIS E MÉTODOS filtração, os filtros foram colocados na estufa a 80°C durante 48 horas. Após este período, os filtros foram novamente pesados. 3.2.6 Fitoplâncton 3.2.6.1 Biomassa fitoplanctónica total (clorofila a e feopigmentos) A biomassa fitoplanctónica total existente na coluna de água foi avaliada através da determinação da concentração de clorofila a, pelo método de Lorenzen (1967). Após chegada ao laboratório, toda a água destinada à determinação da quantidade de clorofila a (Chl a, µg L-1) e de feopigmentos (Feo, µg L-1) foi imediatamente processada. Em geral, após homogeneização da amostra, foi filtrado sob vácuo, um volume nunca inferior a 1000 ml, através de filtros de fibra de vidro Whatman® GF/F (47 mm de diâmetro), com poro aproximado de 0,7 µm. Para cada data e local de amostragem foram realizados 3 replicados. Em seguida, colocaram-se os filtros em tubos de centrifugação de plástico e armazenaram-se no congelador, devidamente etiquetados, fechados e forrados com papel de alumínio de forma a eliminar qualquer incidência de luz no filtro e deste modo evitar a degradação da Chl a até posterior análise espectrofotométrica. Para realizar a extracção de Chl a e a sua análise espectrofotométrica, os tubos de centrifugação com respectivos filtros foram retirados do congelador mas mantidos sempre no escuro e arrefecidos. A fim de se proceder à extracção da Chl a, a cada tubo adicionou-se 5 ml de acetona a 90%, seguindo-se a maceração do filtro com uma vareta de vidro, até a desagregação deste no solvente. Seguidamente, os tubos foram guardados no frigorífico (4°C), durante aproximadamente 24 horas. Após este período, os tubos foram centrifugados a 3000 rpm durante 20 minutos a 4°C. A determinação da concentração da Chl a efectuou-se logo após a centrifugação. A leitura fez-se medindo a absorvância do extracto a 664 nm e 750 nm, com o auxílio de um espectrofotómetro Shimadzu (UV-1603). Após este procedimento, adicionaram-se 12 µl de HCl (0,5 M) de modo a provocar a degradação da Chl a em Feo. Depois da acidificação, mediu-se novamente a absorvância do extracto nos mesmos comprimentos de onda (664 e 750 nm), para determinação da concentração em Feo. A partir dos valores obtidos procedeu-se ao cálculo da Chl a e dos Feo. A análise espectrofotométrica só permite quantificar o total de Feo, não os distinguindo. Ambos os cálculos foram feitos aplicando as equações de Lorenzen (1967): 32 3.3 METODOLOGIAS Clorofila a (Chl a, µg L−1 ) = [ ) ] ( A ∗ K (664 nm − 750 nm ) − 664 nm − 750 nm ∗ V a a V ∗l f Feopigmentos (Feo, µg L−1 ) = A ∗ K [ R (664a nm − 750a nm) − (664 nm − 750 nm) ∗ V ] Vf ∗ l em que: A - coeficiente de absorvância da Chl a (11,0); K - factor destinado a restabelecer a concentração inicial em Chl a partir da redução da absorvância (2,33); 664 nm e 750 nm - valores de absorvância antes da acidificação da amostra; 664a nm e 750a nm - valores de absorvância depois da acidificação da amostra; R - valor máximo da razão 664/664a, na ausência de Feo (1,75); V - volume final de acetona a 90% adicionado; l - passo da cuvette (1 cm); Vf - volume de água filtrada em litros (que neste caso foi sempre 1 L). 3.2.6.2 Fotopigmentos (clorofilas e carotenóides) A separação, identificação e quantificação dos fotopigmentos fotossintéticos existentes na coluna de água foi realizada através da técnica de cromatografia líquida de alta pressão (HPLC, iniciais da expressão inglesa High-Performance Liquid Chromatography ou High-Pressure Liquid Chromatography). As amostras foram tratadas e filtradas (filtros Whatman® GF/F, 47 mm de diâmetro) de modo idêntico ao das amostras usadas para a quantificação de Chl a por espectrofotometria. No entanto, os filtros destinados à análise por HPLC, foram armazenados em papel de alumínio a -80°C até posterior análise. Para a extracção dos fotopigmentos fotossintéticos, os filtros foram colocados numa solução fria de metanol (95%) e de acetato de amónio (2%) a -20°C durante 30 minutos, onde previamente foram macerados e sonificados por 1 minuto. Após o período de extracção, as amostras foram centrifugadas a 4000 rpm durante 15 minutos a 4°C. O extracto resultante foi filtrado numa membrana Millipore com poro de 0,2 µm e imediatamente injectado no equipamento de HPLC. Foi usado um aparelho de HPLC da Shimadzu® constituído por um distribuidor de solventes (LC-10ADVP), um sistema controlador (SCL-10AVP), um detector de fotodíodos (SPD-M10AVP) e um detector de fluorescência (RF-10 AXL). A separação por cromatografia foi realizada com uma coluna de fase reversa (C18) (Supelcosil, 0,46×25 cm, 5 µm partículas). Foi seguido o método de gradiente de solventes usado por Kraay et al. (1992) e posteriormente adaptado por 33 3. MATERIAIS E MÉTODOS Brotas & Plante-Cuny (1996). Foram injectados 100 µl de cada amostra, a uma taxa de fluxo de 0,6 ml min-1. Cada análise teve a duração de 35 minutos. Os fotopigmentos foram identificados por comparação do tempo de retenção e do espectro de absorvância com o de standards (padrões). As suas concentrações foram calculadas pelas áreas dos respectivos picos de absorvância detectados no detector de fotodíodos. Os padrões da Chl a e do β β-caroteno (β car) foram obtidos através da Sigma® e os padrões da clorofila c2 (Clor c2), clorofila c3 (Clor c3), peridinina (Per), fucoxantina (Fuc), neoxantina (Neo), violoxantina (Vio), prasinoxantina (Pra), diadinoxantina (Diad), anteroxantina (Anth), aloxantina (Alo), diatoxantina (Diat), luteina (Lut), zeaxantina (Zea) e da clorofila b (Chl b) foram obtidos no DHI (Water and Environment Institut, Dinamarca). 3.2.6.3 Desenvolvimento de culturas De modo a obter razões as fotopigmento acessório:Chl a de espécies típicas do estuário do Tejo, foram isoladas algumas células de fitoplâncton colhidas nos locais de amostragem Detonula pumila, e cultivadas cultivada em a laboratório. uma Foi isolada intensidade a luminosa diatomácea (Epar) de 80 µmol fotões m-2 s-1, num fotoperíodo de 12h de luz:12h de escuridão, em meio f/2 (Guillard & Ryther 1962) a 19°C. Duas culturas de dinoflagelados do género Scrippsiella foram mantidas em meio Gse (uma variação do meio G com a adição de 1×10-8 mol L-1 de selénio; Doblin et al. 1999) em temperatura, fotoperíodo e intensidade luminosa idênticos aos da cultura anterior. 3.2.6.4 Abundância das classes fitoplanctónicas e aplicação do ChemTax A estimativa da contribuição das classes de fitoplâncton mais abundantes para o total de Chl a foi determinada através da concentração dos diversos pigmentos fotossintéticos acessórios existentes na coluna de água. Esta avaliação foi realizada utilizado o software CHEMical TAXonomy (ChemTax) (Mackey et al. 1996). O ChemTax é um programa factorial para o cálculo das abundâncias das classes de fitoplâncton, solicitando as concentrações dos fotopigmentos (clorofilas e carotenóides) (Mackey et al. 1996, 1998, Wright et al. 1996). Este programa necessita do MATLABTM para poder funcionar, e faz uso de uma análise factorial com um algoritmo decrescente baseado numa matriz de razões fotopigmento acessório:Chl a inicial, característica de cada classe (geral), de forma a encontrar a matriz final e aquela que se encaixa melhor nos dados a analisar 34 (Tabela 3.1). Neste estudo, a matriz das razões fotopigmento 3.3 METODOLOGIAS acessório:Chl a inicial foi baseada nas razões das culturas mantidas em laboratório (uma espécie de Detonula pumila e duas do género Scrippsiella colhidas no estuário do Tejo), e de razões obtidas para espécies estuarinas publicadas na bibliografia (Schlϋter et al. 2000). A complexidade da avaliação da estrutura da comunidade depende sempre do número de classes de fitoplâncton definido a priori pelo investigador. Foi usada uma perspectiva conservadora na definição da matriz inicial, restringindo-se a resolução às classes: Cyanobacteria Bacillariophyceae (diatomáceas), (cianobactérias), Cryptophyceae Chlorophyceae (criptófitos), (clorófitos), Prasinophyceae (prasinófitos), Dinophyceae (dinoflagelados) e Euglenophyceae (euglenófitos)4. Com excepção dos Prasinophyceae (prasinófitos), detectados através do fotopigmento prasinoxantina, exclusivo desta classe, todos as outras classes de fitoplâncton incluídos na matriz foram previamente observados em microscopia (Gameiro et al. 2004). Tabela 3.1: Matriz das razões fotopigmento acessório:Chl a iniciais e razões finais geradas pelo ChemTax. * Razões fotopigmento acessório:Chl a obtidas de culturas mantidas em laboratório. Razão fotopigmento acessório:Chl a Grupos de fitoplâncton Per Fuc Alo Lut Zea Neo Vio Pra Chl b 0,639 - 0,755 - 0,392 - 0,260 0,032 - 0,099 1,620 0,157 0,104 0,043 0,082 0,072 0,011 0,012 0,497 - 0,145 0,568 0,211 0,639 - 0,560 - 0,339 - 0,196 0,032 - 0,099 1,620 0,157 0,104 0,043 0,082 0,072 0,011 0,012 0,497 - 0,188 0,568 0,211 Valor inicial Dinoflagelados * Criptófitos Clorófitos Cianobactérias Diatomáceas * Prasinófitos Euglenófitos Valor melhor adaptado Dinoflagelados * Criptófitos Clorófitos Cianobactérias Diatomáceas * Prasinófitos Euglenófitos 3.2.6.5 Identificação e quantificação de células da comunidade fitoplanctónica Após a colheita, as amostras para a contagem e identificação do fitoplâncton foram imediatamente preservadas numa solução de Lugol. Para a identificação das espécies existentes foi usado o método de sedimentação (Utermöhl 1958), usando um microscópio de luz invertida (Olympus IX70). As amostras foram homogeneizadas manualmente, por rotação dos frascos (100-200 rotações, 4 - Neste trabalho foi usada a classificação taxionómica de Tomas (1997), e optou-se por usar a denominação das classes das microalgas em português. 35 3. MATERIAIS E MÉTODOS Hasle 1978). Imediatamente após a homogeneização, foi retirada uma sub-amostra, com o auxílio de uma pipeta, para a câmara de sedimentação (Hydro-Bios®). A escolha do volume da câmara de sedimentação (entre 5-25 ml) dependeu da quantidade de matéria particulada em suspensão presente na amostra (SPM). As câmaras de sedimentação, já devidamente tapadas, foram postas longe de qualquer fonte calor e sobre uma superfície horizontal de modo a assegurar uma distribuição homogénea das partículas na base das câmaras. Esperou-se ±24 h até dar início à contagem. A contagem e identificação das células foram efectuadas sempre numa ampliação de 400×. Antes da contagem das células procedeu-se à observação das amostras para identificação das formas mais abundantes. O número total de células contabilizadas nunca foi inferior a 300. Os resultados foram expressos em número de células por litro. A quantificação e identificação da comunidade fitoplanctónica por microscopia foram realizadas em todas as datas e locais de amostragem em que se procedeu à quantificação da taxa de produção primária (Julho de 2006 a Junho de 2007). Para todas as outras datas apenas foi realizada uma análise qualitativa das células de fitoplâncton, identificando-se apenas as espécies mais abundantes. 3.2.7 Produção primária fitoplanctónica 3.2.7.1 Curvas de luz-fotossíntese (P-E) O processo da fotossíntese pode ser descrito pela equação: CO2 + H2O → CH2O + O2 onde, sob o efeito da luz, é consumida uma molécula de água e uma de dióxido de carbono (CO2), produzido um açúcar simples com a libertação de oxigénio (O2). Pelo contrário, no processo da respiração, que não necessita de luz, uma molécula de O2 é consumida e uma de CO2 é libertada. À luz, ambos os processos podem ocorrer ao mesmo tempo. Neste trabalho, a taxa fotossintética, equivalente à taxa de produção primária, foi calculada medindo a taxa de incorporação do carbono e a taxa de respiração não foi contabilizada. A medição da taxa de produção fotossintética foi normalizada em relação à Chl a. Este parâmetro é denotado de PB, onde o subscrito B -1 B indica a normalização pela -1 biomassa (P , [mg C (mg Chl a) h ]). Uma vez que a variação da biomassa é a principal causa biológica da variação na taxa fotossintética, a normalização pela biomassa produz um parâmetro de significado mais geral que P (mg C m-3 h-1). Deste modo, a variação espacial e sazonal da taxa fotossintética pode ser 36 3.3 METODOLOGIAS analisada independentemente das possíveis flutuações da biomassa. Por outras palavras, o parâmetro PB é uma propriedade intrínseca da amostra, ou da estação do ano em que é obtida. [ ] P B mg C (mg Chl a ) -1 h −1 = P Chl a A relação encontrada entre PB e a luz (Epar) corresponde a uma curva hiperbólica, que vulgarmente é denominada por curva P-E, ilustrada pela Figura 3.1. Figura 3.1: Curva típica da relação existente entre a taxa fotossintética e a intensidade luminosa (curva P-E), com representação dos parâmetros característicos (ver texto), a linha contínua vermelha representa a taxa fotossintética normalizada pela biomassa (PB). (Adaptado de Jassby & Platt 1976). A curva não passa necessariamente pela origem. O valor de RB no eixo das ordenadas é interpretado como uma medida de respiração no escuro por parte do fitoplâncton (i.e., assimilação de carbono no nível zero de luz, quando a fotossíntese é zero por definição). O ponto onde a curva intersecta o eixo das abcissas define o ponto de irradiância para a qual a fotossíntese se equilibra com o valor da respiração. Este ponto é denominado de irradiância de compensação (Ec, µmol fotões m-2 s-1). A baixas intensidades de luz e próximas do eixo das abcissas, a curva é quase linear com um declive representado por αB e denominado de declive inicial 5 (mg C (mg Chl a)-1 h-1 (µmol fotões m-2 s-1)-1. Para valores de intensidade luminosa mais elevados, a inclinação progressivamente até atingir um patamar de amplitude 5 da PBmax, curva decresce denominado de taxa - Também denominado de “eficiência fotossintética”. 37 3. MATERIAIS E MÉTODOS fotossintética máxima 6 (mg C (mg Chl a)-1 h-1). Esta representa a taxa de fotossíntese específica a uma intensidade luminosa óptima, ou também chamada de intensidade saturante (Ek, µmol fotões m-2 s-1). A partir da Fig. 3.1, verifica-se que quando RB=0, PBmax/Ek=αB, pelo que Ek=PBmax/αB. Para intensidades luminosas excessivamente elevadas, é possível resultar um decréscimo da taxa fotossintética. Este fenómeno é conhecido por fotoinibição (β). Representação matemática: Para uma completa descrição, a curva representada na Fig. 3.1 necessita de dois ou três parâmetros, dependendo da passagem ou não pela origem. Se passar pela origem (RB=0), apenas dois parâmetros são necessários. Deste modo, a curva P-E pode ser representada por uma função com uma variável (irradiância, E) e dois parâmetros (αB e PBmax). Quando a função anterior é aplicada a condições in situ para calcular a taxa de produção primária, o valor de E corresponde à irradiância de uma determinada profundidade na coluna de água num dado período do dia. Desta forma, a função PB(z)=pB (E(z); αB, PBmax) permite estimar a produção a uma dada profundidade. De entre as diversas funções propostas pela comunidade científica para a representação da relação P-E, a função utilizada no presente trabalho para especificar a função pB foi a sugerida por Platt et al. (1980) com fotoinibição: B B P B = PsB (1 − e − αE/P s ) e − βE/P s onde: PB - taxa de produção primária fitoplanctónica normalizada para a Chl a [mg C (mg Chl a)-1 h-1]; E - irradiância de incubação (µmol fotões m-2 s-1); PBs - taxa fotossintética de saturação normalizada para a Chl a na ausência de fotoinibição [mg C (mg Chl a)-1 h-1]; αB - declive inicial da curva P-E, quando E tem valores reduzidos [mg C (mg Chl a)-1 h-1 (µmol fotões m-2 s-1)-1]; βB - parâmetro de fotoinibição [mg C (mg Chl a)-1 h-1 (µmol fotões m-2 s-1)-1]. O parâmetro PBmax foi deduzido através da sua relação com PBs; 6 - Na bibliografia mais antiga este parâmetro aparece denominado de “número de assimilação”. 38 3.3 METODOLOGIAS β B max P =P B s ⎛ α ⎞ ⎛ β ⎞α ⎜⎜ ⎟⎟ ⎜⎜ ⎟⎟ ⎝ (α + β ) ⎠ ⎝ (α + β ) ⎠ A existência de fotoinibição foi assumida para valores de intensidade luminosa superiores a Ek e quando a produção primária diminuiu para taxas inferiores a 90% do valor do PBmáx (comunicação pessoal, Dr. T. Platt). 3.2.7.2 Metodologia laboratorial As incubações foram realizadas num incubador adaptado propositadamente para a avaliação da taxa de produção primária da coluna de água de dois locais de amostragem na zona média do estuário do Tejo (Fig. 3.2). Foi possível determinar taxas de incorporação do carbonato marcado (14CO32-) ao longo da coluna de água simulando no laboratório as condições existentes in situ. Figura 3.2: Esquema representativo do incubador utilizado no laboratório para a avaliação da taxa de incorporação do 14CO32- a diversas intensidades luminosas. O esquema representado na Fig. 3.2 ilustra o sistema de incubação montado no laboratório para a aplicação do método do 14 C de Steemann Nielsen (1952). A intensidade luminosa foi obtida por dois projectores equipados com lâmpadas de metal de quartzo de 400 W (HPI-T Pro da Philips®) que permitiram obter uma intensidade luminosa incidente nos frascos submersos até 700 µmol fotões m-2 s-1 (Epar). A preservação das características espectrais da irradiância emitida pelos projectores foi testada por análise espectral (Fig. 3.3). 39 3. MATERIAIS E MÉTODOS Figura 3.3: Espectro de emissão directa da lâmpada de metal de quartzo de 400 W ( HPI-T Pro da Philips) (linha preta) e através do painel de filtro preto (linha vermelha) (a) e através do painel de filtros brancos (malha de linho) (linha vermelha) (b). Os gráficos interiores representam a linearidade existente entre os dois tipos de filtros usados e a luz emitida pelos projectores. A simulação da atenuação da luz na coluna de água foi conseguida através de um painel de filtros com várias camadas de malha de linho sobrepostas. A cada compartimento do painel de filtros fez-se corresponder um nível de atenuação de luz, bastando para isso a sobreposição de mais ou menos camadas de linho para obter vários níveis de irradiância. Foi conseguido o máximo de sete valores de intensidade luminosa -2 diferentes (25, 90, 145, 200, 345, 490 e -1 560 µmol fotões m s ). As amostras foram colocadas em duplicado, ou em triplicado (consoante o espaço físico disponível no incubador), em cada nível de luz. A simulação da agitação e mistura da coluna de água foi conseguida pela rotação dos frascos de incubação, permitindo o movimento circular durante o tempo de incubação (14 rpm). A obtenção de temperatura igual à registada in situ (±0,5°C) foi conseguida com o auxílio de um refrigerador (JAD C-150) e de uma bomba de circulação. Após chegadas ao laboratório, as amostras de água foram incubadas em frascos Schott Duran® transparentes de borosilicato (50 ml). A cada uma das amostras (exactamente 50 ml) foram adicionados 100 µl de NaH14CO3, com actividade de 20 µCi ml-1 (764 kBq ml-1) (DHI). As incubações tiveram sempre uma duração de 2 horas, sendo finalizadas através de uma suave filtração através de filtros GF/F de fibra de vidro (25 mm de diâmetro). Seguidamente, os filtros foram lavados com algumas gotas de amostra de água filtrada do local, de modo a retirar o 14C que não tinha sido incorporado nas células e colocados em frascos de cintilação. Posteriormente, estes frascos foram colocados em atmosfera ácida com vapores de HCl, por um período de 20-30 minutos, de modo a garantir a remoção total do 14 C inorgânico. Os frascos foram colocados na hotte (abertos) no escuro durante 24 h. Foram também incubados amostras de controlo (sem carbono marcado), para 40 3.3 METODOLOGIAS detectar uma possível actividade específica intrínseca da amostra. A taxa de fixação do carbono marcado verificado nos frascos escuros foi subtraída à taxa verificada nos frascos submetidos à luz de modo a evitar a sobre estimação da taxa de produção primária pelo fitoplâncton devido a processos químico-sintéticos. A quantificação da actividade específica de cada amostra foi realizada sempre no dia seguinte à amostragem, num contador de cintilações líquida Beckman (Model LS 7800) usando RadySafe® como cocktail de cintilação (8 ml por amostra). 3.2.7.3 Alcalinidade e carbono inorgânico dissolvido total (Ctot) Para a análise da alcalinidade do carbonato e do conteúdo de carbono inorgânico dissolvido total das amostras de água (Ctot, CO2+HCO3-+CO32-) foi realizada segundo o método de Parsons et al. (1984). Medida a salinidade, pH e temperatura das amostras foi adicionada uma solução de HCl (0,01N) e o pH resultante foi novamente medido. O resultado foi obtido aplicando as fórmulas e utilizando as tabelas de Parsons et al. (1984). 3.2.7.4 Taxa de produção primária A taxa de produção primária em cada um dos frascos incubados foi calculada segundo a fórmula: P (mg C m − 3h −1 ) = (dpm light − dpm dark ) ∗ W ∗ 1,05 ∗ 1000 dpm total ∗ V ∗ t em que: P - taxa de carbono fixado pela fotossíntese (mg C m-3 h-1); dpmlight - actividade específica dos frascos incubados à luz; dpmdark - actividade específica dos frascos incubados no escuro; dpmtotal - actividade específica introduzida no início da incubação em cada um dos frascos; W – massa do carbono inorgânico dissolvido total presente na amostra (mg C m-3) V - volume de amostra incubado (ml); t - duração da incubação (h); 1,05 - factor de correcção do efeito de discriminação do 14C em relação ao 12C; e o valor 1000 para converter litros em m3. A actividade específica dos frascos de controlo foi subtraída tanto aos frascos submetidos à luz como aos frascos escuros. 41 3. MATERIAIS E MÉTODOS As taxas fotossintéticas medidas igualaram as taxas fotossintéticas brutas, dados os curtos tempos de incubação utilizados (2 horas) (Dring & Jewson 1982, Williams 1993). Por este facto, a função utilizada para descrever as curvas P-E passaram sempre pela origem, não sendo contabilizado o fenómeno da respiração (RB=0). 3.2.7.5 Taxa de produção primária integrada na coluna de água Para o cálculo da produção primária integrada na coluna de água foi necessário seguir os passos descritos no diagrama (Fig. 3.4) 7. Figura 3.4: Diagrama representativo dos passos necessários para o cálculo da produção primária a uma dada profundidade na coluna de água (adaptado de Platt & Sathyendranath 2002). Primeiramente, foi necessário estimar a irradiância sub-superficial nos dias em que não houve amostragem (compreendido entre 1 de Julho de 2006 e 30 de Junho de 2007). Uma vez que a irradiância superficial varia em função do tempo, esta foi definida como um integral diário ou uma série de integrais por períodos inferiores à duração de um dia solar. Assim, a irradiância diária total E(t) foi definida pelo integral: 7 - Para os dias de amostragem a irradiância à superfície (atmosférica) foi a medida in situ, não sendo necessário aplicar os passos superiores do diagrama. 42 3.3 METODOLOGIAS D E (t ) = ∫ E (t ) dt 0 0 A duração do dia (D) é função da latitude do local e data em análise. Neste trabalho, o fotoperíodo foi dividido sempre em 50 intervalos iguais (∆t). Foi assumido que a alteração da irradiância sub-superficial ao longo do dia era aproximada à função descrita por Parsons & Takahashi (1973) (Fig. 3.5): ⎛πt⎞ E 0 (t) = E max sin 3 ⎜ ⎟ ⎝ D ⎠ em que E0(t) é a irradiância sub-superficial no tempo t (µmol fotões m-2 s-1) e Emax é a irradiância máxima diária atmosférica (µmol fotões m-2 s-1). Seguidamente, por incorporação das medições efectuadas in situ da extinção da intensidade luminosa com a profundidade (Kpar) e assumindo que este coeficiente se manteve constante ao longo do dia, assim como durante o intervalo das amostragens mensais (15 dias antes e 15 dias depois da colheita), foi determinado E(z,t), a irradiância à profundidade z, no tempo t (Fig. 3.5): − ∫ K par ⎛πt⎞ E ( z , t ) = E max sin 3 ⎜ ⎟∗e 0 0 ⎝ D ⎠ z ( z ) dz Posteriormente, foi necessário inferir o perfil vertical da biomassa B(z) expresso em concentração de Chl a. Neste trabalho, a distribuição vertical de B é considerada constante dado que foi verificado a mistura da coluna de água de todos os locais de amostragem. Tendo B(z), aplicou-se então o modelo de atenuação da luz na coluna de água para calcular a irradiância em função da profundidade. Uma vez conhecidos B(z) e E(z), aplicou-se o modelo de Platt et al. (1980). Dado que a biomassa não dependeu da profundidade (z), foi possível estabelecer a seguinte relação: Pz = ∫ P(z) dz = z 1% E ∫ BP B (z) dz 0 em que z é a profundidade (à superfície z=0). O limite superior do integral foi considerado como o limite da zona eufótica (1% de E). Após este procedimento, foi necessário integrar esta taxa (P(z)) ao longo do tempo para obter a produção primária diária em profundidade (P(z,t)) e como sintetizado na Figura 3.5: 43 3. MATERIAIS E MÉTODOS D P(z,t) = 1% E ∫ ∫Bp 0 B E (z,t) dz dt 0 em que t corresponde ao valor medido desde o nascer do sol e D é o fotoperíodo. Para as integrações no tempo, admitiu-se que a alteração da biomassa durante o dia é suficientemente lenta, podendo ser considerada nula. Assim, foi suprimido o parâmetro que descreve a dependência de B em relação ao tempo. Figura 3.5: Esquema dos passos envolvidos no cálculo da produção primária diária integrada na coluna de água (adaptado de Platt & Sathyendranath 2002). Os valores dos parâmetros fotossintéticos (α e Pmax) determinados experimentalmente foram considerados constantes ao longo do dia. A integração diária da produção primária foi avaliada combinando os valores de α e Pmax resultantes e dos de irradiância ao longo da profundidade e do tempo. Assim, e com auxílio da função de Platt et al. (1980), foi possível estimar a produção primária normalizada para a biomassa (PB), em cada profundidade e hora do dia (Fig. 3.5). 44 3.3 METODOLOGIAS A produção primária foi estimada por área (m2), usando compartimentos de 0,1 m de altura na coluna de água. Depois da integração dos valores de produção, resultantes de todos os compartimentos, a produção primária de toda a coluna de água (mg C m-2 h-1) foi calculada. As taxas de produção primária para todos os dias em que não houve amostragem foram estimadas usando os valores de irradiância máxima diária (Emax) e assumindo que a biomassa, os parâmetros da curva P-E (α e Pmax) e as características da profundidade eufótica (Kpar) não se alteravam durante o intervalo das amostragens mensais (15 dias antes e 15 dias depois da colheita). 3.2.8 Análise estatística Todos os valores usados na análise estatística dos factores climáticos do Capítulo 4 (irradiância, temperatura do ar e caudal do rio) foram processados como médias diárias dos oito dias anteriores à data da colheita. Na análise estatística da precipitação foi usada a soma dos oito dias anteriores à data da colheita. Foi usado o programa Statistica 6.0® para realizar a estatística descritiva (média, mediana, desvio padrão (DesPad), mínimo (min) e máximo (máx)), assim como para as análises de regressão. Os coeficientes de correlação de Spearman´s foram usados para encontrar possíveis correlações entre os vários parâmetros estudados. Os valores usados na análise de regressão múltipla, baseada no método de progressão gradual (stepwise), foram transformados no seu logaritmo de modo a os poder aproximar o mais possível de uma distribuição normal e reduzir a proporção das variâncias. A existência de diferenças significativas entre locais e datas de amostragem foi detectada usando a análise de variância (ANOVA). As comparações múltiplas entre pares de dados foram realizadas utilizando o t-test. No Capítulo 6, em vez da habitual média aritmética, foi usada a mediana como sendo uma medida de tendência central, parâmetro que caracteriza uma determinada variável de tal forma que a mediana de um grupo de dados ordenados separa a metade inferior da amostra, da metade superior. Mais concretamente, ½ da amostra terá valores inferiores ou iguais à mediana e a outra ½ terá valores superiores ou iguais à mediana. Devido à assimetria regularmente encontrada na distribuição dos parâmetros biológicos, o uso da mediana no Capítulo 6 vai ao encontro de esta medida representar melhor este tipo assimetria. Numa primeira fase, foi calculada a mediana para cada mês (mediana mensal), agrupando os dados de todos os quatro locais de amostragem para esse mês específico e para todo o período analisado (1980-2007), com excepção do período 1994-95 onde apenas um local foi considerado (S2). De seguida foi determinada a chamada 45 3. MATERIAIS E MÉTODOS mediana mensal regular que corresponde à mediana mensal do mesmo mês para diferentes anos (exemplo: a mediana mensal regular do mês de Junho é a mediana de todos os valores do mês de Junho de todos os anos em estudo). Seguidamente, a mediana anual foi calculada usando todos os valores obtidos para cada ano. Finalmente, os dados de todos os locais e datas foram usados para calcular a aqui denominada de grande mediana. Todos os tipos de mediana referidos anteriormente foram calculados para os diversos parâmetros biológicos (Chl a, nutrientes inorgânicos dissolvidos, razão Si:N e as razões diatomáceas:outros grupos e diatomáceas:fitoflagelados). O padrão sazonal e interanual de cada parâmetro estudado foi realçado através do desvio mensal e anual da sua grande mediana, respectivamente. O tempo necessário para obter metade da biomassa cumulativa fitoplanctónica anual (% Chl a em 365 dias) foi denominado centro de gravidade anual para o desenvolvimento do fitoplâncton. Como sugerido por Cloern (2007), todos os valores cumulativos anuais de Chl a disponíveis (1980, 1995, 1999-2007) foram agrupados, estimando-se o centro de gravidade do desenvolvimento do fitoplâncton, aqui designado como centro de gravidade médio para o fitoplâncton característico do estuário do Tejo. 46 Capítulo 4. Influência de factores ambientais na distribuição e composição do fitoplâncton Este capítulo apresenta-se numa forma similar em: “Environmental drivers of phytoplankton distribution and composition in Tagus estuary, Portugal” Gameiro, C., Cartaxana, P. & Brotas, V. Estuarine Coastal and Shelf Science (2007) 75:21-34 4.1 RESUMO 4.1 Resumo Um programa de monitorização com a duração de 7 anos (Março de 1999 a Novembro de 2005) foi desenvolvido no estuário do Tejo com o objectivo de estudar a dinâmica do fitoplâncton e os factores que a regulam, nomeadamente a concentração de nutrientes dissolvidos na coluna de água, disponibilidade de luz, condições atmosféricas e hidrológicas (temperatura, vento, precipitação, caudal do rio e salinidade). As amostras de água foram colhidas mensalmente em quatro locais de amostragem. A biomassa fitoplanctónica, analisada através da Chl a, apresentou concentrações moderadas a baixas quando comparadas com as encontradas noutros estuários mesotidais. Os valores médios interanuais da concentração de Chl a variaram entre 1,4 µg L-1 no Inverno e 8,0 µg L-1 no Verão. Foi observado um padrão sazonal consistente na variação da Chl a, caracterizado por um único acréscimo anual no final da Primavera ou no Verão. A comunidade fitoplanctónica presente no estuário foi caracterizada recorrendo às concentrações dos fotopigmentos bio-marcadores determinados através de HPLC e posteriormente tratados com o programa ChemTax. A comunidade fitoplanctónica, revelou ser dominada por diatomacéas (57,0%), incluindo ainda criptófitos (23,0%), dinoflagelados (6,8%), clorófitos (5,4%), euglenófitos (4,9%) e prasinófitos (2,6%). Este método foi capaz de detectar classes de fitoplâncton geralmente subestimadas ou mesmo negligenciadas por técnicas de microscopia óptica invertida. Anualmente, a classe das diatomáceas foi a que mais contribuiu para a formação de eventos de florescimento fitoplanctónico (Chl a >10 µg L-1). A análise de regressão múltipla (stepwise) mostrou que a temperatura do ar, o caudal do rio e a intensidade luminosa explicam conjuntamente 47% da variância da Chl a observada, ilustrando bem a importância dos parâmetros climáticos como factores chave para a variabilidade sazonal e interanual da comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo. Palavras Chave: Parâmetros ambientais; Estuário do Tejo; Fitoplâncton; Clorofila a; CHEmoTAXonomia. 49 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON 4.2 Introdução A relevância dos estudos realizados em escalas de tempo longas aplicados em programas de gestão de ecossistemas é hoje mundialmente reconhecida. O conhecimento aprofundado sobre a variabilidade natural de um determinado ecossistema é um requisito necessário para avaliar a influência antrópica que é exercida sobre ele. Os estuários são, por definição, áreas de transição, sofrendo de modo mais dramático as consequências da variabilidade climática. Porém, a variabilidade e a instabilidade são propriedades intrínsecas dos ecossistemas estuarinos. As comunidades biológicas estuarinas encontram-se bem adaptadas às diversas escalas de variabilidade temporal, e também aos gradientes espaciais de factores chave como a salinidade ou a temperatura. Quando um plano de manutenção ou de gestão ambiental é necessário ou um estudo de avaliação da saúde ambiental de um ecossistema é requerido, o fitoplâncton, como base da cadeia trófica, constitui a comunidade biológica sobre a qual se concentra uma atenção científica considerável (Monbet 1992, Cloern 1999, Sin et al. 1999). A comunidade fitoplanctónica estuarina está sujeita a escalas temporais associadas ao regime de marés e à sazonalidade do caudal de água doce, que afectam grandemente a estabilidade da coluna de água, o tempo de residência e a disponibilidade de luz e nutrientes. A homogeneização vertical da coluna de água é também grandemente influenciada por parâmetros com variabilidade mais errática, como o vento. A influência destes processos no crescimento e na produtividade do fitoplâncton constitui assunto para a literatura científica actual e tem sido alvo de debate recorrente. O conhecimento da composição taxionómica do fitoplâncton é fundamental para o estudo da dinâmica espacial e temporal da comunidade, e para a caracterização de grupos funcionais. Além disso, a mudança na composição taxionómica de uma comunidade fitoplanctónica, passando de um domínio de diatomáceas para uma comunidade constituída maioritariamente por fitoflagelados, tem sido usada como indicador de um ecossistema com sinais de eutrofização (Cloern 1996). Actualmente, a identificação e a distribuição das diferentes classes fitoplanctónicas podem ser efectuadas pela detecção dos pigmentos fotossintéticos na coluna de água, fazendo uso de técnicas analíticas como a cromatografia líquida de alta pressão (HPLC). A análise dos pigmentos feita por HPLC não tem a precisão taxionómica da observação microscópica, mas é, sem dúvida, adequada para analisar centenas de amostras, indispensáveis nos estudos ecológicos (Wright et al. 1996). Diversos métodos de análise estatística têm sido desenvolvidos 50 4.2 INTRODUÇÃO com o intuito de estimar quantitativamente as diversas classes de fitoplâncton através da concentração dos seus pigmentos bio-marcadores (Gieskes et al. 1988, Everitt et al. 1990, Letelier et al. 1993). No entanto, estes métodos são geralmente afectados por um conjunto de obstáculos que limitam a sua aplicabilidade (Mackey et al. 1996). O software CHEmical TAXonomy (ChemTax), descrito por Mackey et al. (1996) faz uso das razões fotopigmento acessório:Chl a para caracterizar as várias classes fitoplanctónicas existentes. Recentemente, tem havido um vasto número de estudos relacionados com a estrutura da comunidade fitoplanctónica aplicando a análise pigmentar e o ChemTax em águas oceânicas (Mackey et al. 1996, Rodriguez et al. 2002), mas raramente estas técnicas têm sido usadas em estuários (Pinckney et al. 1998, Ansotegui et al. 2001). A distribuição e composição do fitoplâncton do estuário do Tejo, durante o período de Maio de 2001 a Novembro de 2005, fazendo uso da análise pigmentar por HPLC e posterior aplicação do ChemTax, são descritas neste capítulo. Presentemente, a preocupação mundial relacionada com as alterações climáticas, aumentou a relevância e pertinência dos estudos interanuais. A precipitação é um agente da variabilidade climática interanual, na medida em que a descarga de água doce reflecte a quantidade integrada de precipitação, quer espacialmente (ao longo da bacia hidrográfica) quer temporalmente. A bacia hidrográfica do estuário do Tejo é a segunda maior da Península Ibérica, onde o regime de precipitação é caracterizado por uma variabilidade temporal elevada (Trigo et al. 2004). A possibilidade de processar e estudar dados do século passado, acumulados durante 75 anos, levou estes autores a avaliar a variabilidade aí observada, verificando que esta esteve relacionada com a North Atlantic Oscillation (NAO). Este trabalho ilustra a importância dos programas de monitorização plurianuais para a avaliação do efeito dos factores climáticos na dinâmica da biomassa fitoplanctónica em sistemas estuarinos, em geral, e para o estuário do Tejo, em particular. Um programa de monitorização, iniciado em Março de 1999, foi desenvolvido no estuário do Tejo. Como resultado, foi estabelecida uma base sólida de dados hidrográficos, de nutrientes, de matéria particulada em suspensão, da disponibilidade da luz ao longo da coluna de água, da concentração de Chl a e dos pigmentos fotossintéticos (fotopigmentos). Os objectivos deste Capítulo foram examinar a variação sazonal, interanual e espacial da biomassa e da composição taxionómica fitoplanctónica do estuário do Tejo e determinar a influência dos parâmetros ambientais na comunidade de fitoplâncton. Espera-se assim que a informação obtida a partir deste trabalho e de estudos semelhantes possa ser 51 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON considerada no âmbito de planos de gestão, protecção e conservação do ecossistema do estuário do Tejo a serem desenvolvidos no futuro. 4.3 4.3.1 Resultados Parâmetros hidrológicos 4.3.1.1 Temperatura da água, salinidade e pH Durante o período em estudo (Março de 1999-Novembro de 2005), os valores obtidos para a temperatura da água (Tw), salinidade (S) e pH da água nos quatro locais de amostragem (Fig. 2.1) são representados na Figura 4.1. Figura 4.1: Valores da temperatura da água (°C) (a), salinidade (b) e pH (c) registados nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março 1999 a Novembro de 2005, e os gráficos box-whiskers que representam os padrões de sazonalidade para os vários parâmetros: temperatura da água (°C) (d), salinidade (e) e pH (f) obtidos da análise feita em conjuntos aos quatro locais de amostragem. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. Durante o período de amostragem, a temperatura da água apresentou um padrão sazonal característico, com temperaturas mais elevadas nos meses de Verão e 52 4.3 RESULTADOS mais baixas no Inverno (Fig. 4.1a). Esporadicamente, S3 e S4 apresentaram valores de temperatura da água relativamente inferiores aos obtidos nos outros locais, em Setembro de 2003 e Janeiro de 2004, respectivamente. Analisando os quatro locais conjuntamente, os meses de Julho e Agosto foram os meses em que se verificaram as Tw mais quentes e Janeiro as mais frias (Fig. 4.1b). Sazonalmente, este parâmetro variou em média de 12,8°C no Inverno a 22,9°C no Verão. O valor mínimo obtido foi de 8,0°C (Jan. 2004, S3 e S4) e o máximo de 26,0°C (Jul. 2005, S1) (Tabela 4.1). Não foi encontrada variação espacial, isto é, a temperatura da água não revelou ser significativamente diferente nos quatro locais de amostragem (Fig. 4.2a). Figura 4.2: Gráficos box-whiskers que representam os padrões espaciais para os vários parâmetros: temperatura da água (°C) (a), salinidade (b) e pH (c) obtidos da análise feita com os valores obtidos de Março 1999 a Novembro de 2005. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. No que diz respeito à salinidade, foram observados padrões sazonais e espaciais (Fig. 4.1c, Fig. 4.2b). Ao longo do período em estudo e para todos os locais de amostragem, foram registados valores médios de salinidade mais elevados no Verão (24,8) e mais baixos no Inverno (16,4) (Fig. 4.1d, Tabela 4.1). O local de amostragem situado mais a montante (S1) registou salinidades mais reduzidas (média total de 15,1) sendo estas significantemente diferentes dos outros três locais (p<0,001) (Fig. 4.2b). Contrariamente, o local S4 registou valores de salinidade significantemente mais elevados (média total de 24,6) que em S1 e em S3 (p<0,0001 e p<0,05 respectivamente). Para todo o período em estudo, foi encontrada uma correlação negativa entre a salinidade e o caudal do rio (r=-0,514, p<0,001, n=261) (Tabela 4.5). Esta correlação foi ainda mais forte se apenas o ano de 2001 (muito chuvoso) for considerado (r =-0,75, p<0,001, n=35). 53 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON O pH da água mostrou ser uniforme para todo o período e em todos os locais de amostragem, não sendo possível detectar a existência de um padrão sazonal ou espacial evidente (Fig. 4.1e, 4.1f, 4.2c). O pH variou entre 6.7 e 9.0 (Tabela 4.1). 4.3.2 Caracterização da irradiância na coluna de água 4.3.2.1 Coeficiente de extinção da luz (Kpar) O coeficiente de extinção da luz calculado para a coluna de água dos quatro locais de amostragem não apresentou um padrão sazonal evidente para o período em estudo (Fig. 4.3a, 4.3b). Porém, os valores de Inverno foram em média um pouco mais elevados do que os valores da Primavera, sendo estes 2,1 e 1,7 m-1 respectivamente (Tabela 4.1). Figura 4.3: Valores do coeficiente de extinção da luz (Kpar) calculado para os quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Setembro de 1999 a Novembro de 2005 (a ausência de dados observada no início de 1999 e 2002 foi devida a uma avaria do radiómetro) (a), representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) do Kpar na coluna de água. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. Para todo o período e locais em estudo, o Kpar variou entre 0,4 m-1 e 8,0 m-1 (Tabela 4.1). A diferença espacial dos valores deste parâmetro é nítida até 2003 54 4.3 RESULTADOS (inclusive), onde S2 registou continuamente os valores mais elevados (Fig. 4.3a). No entanto, nos anos seguintes (2004 e 2005) essa tendência parece ter sido alterada dado que os valores de Kpar mais elevados passaram a ser registados em S1. Este resultado poderá ser apenas devido ao facto de, a partir de 2004, a amostragem em S2 ter sido realizada uma a duas horas depois da maré-cheia em vez de 3-4 h como nos anos anteriores. O Kpar verificado em S1 (média de 2,2 m-1) foi análogo ao obtido em S2 (média de 2,7 m-1) (Fig. 4.3c). Porém, este foi significantemente diferente do observado em S3 e S4 (p<0,0001). O local de amostragem S4 registou quase sempre os valores mais reduzidos de Kpar (média de 1,1 m-1), mas muito semelhantes aos valores obtidos em S3 (média de 1,3 m-1). O coeficiente de extinção da luz apresentou uma correlação positiva com SPM (r =0,62, p<0,001, n=222), mas não com a Chl a (Tabela 4.5), sugerindo que a turbidez da coluna de água foi devida à quantidade de partículas em suspensão e não à quantidade de células fitoplanctónicas. 4.3.3 Razão de mistura crítica (zmix:zeuf) A razão entre a profundidade de mistura (zmix) e a profundidade eufótica (zeuf) da coluna de água variou entre 0,4 (S4) e 4,1 (S2) (Fig. 4.4a). A média das razões foi semelhante em todas as estações do ano (Fig. 4.4b, Tabela 4.1). Espacialmente, o local S3 (média de 0,9) obteve uma razão zmix:zeuf significantemente diferente dos locais S1 e S2 (p<0,0001) e de S4 (p<0,001) (Fig. 4.4c). Os valores de zmix:zeuf inferiores a 1 indicam que a zona eufótica se estende por toda a coluna de água, o que ocorreu em apenas 30% das datas de amostragem. De acordo com Talling (1971) e posteriormente Cole & Cloern (1984), uma razão zmix:zeuf de 5 representa o limite superior para a possibilidade de crescimento fitoplanctónico, e consequentemente a possibilidade da existência de produção primária líquida. De todos os valores registados nos quatro locais de amostragem, a razão zmix:zeuf nunca atingiu o valor 5. Para o estuário do Tejo, a razão zmix:zeuf e Kpar apresentaram uma correlacão positiva significativa (r =0,66; p<0,001; n=222) (Tabela 4.5). 55 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON Figura 4.4: Razão zmix:zeuf obtida para os quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Setembro de 1999 a Novembro de 2005 (a ausência de dados observada no início de 2002 foi devida a avaria do radiómetro) (a), representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) da razão zmix:zeuf. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. 56 4.3 RESULTADOS Tabela 4.1: Estatística descritiva dos valores obtidos de temperatura da água (Tw), salinidade (S), pH, coeficiente de extinção da luz (Kpar) e razão zmix:zeuf para os locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4) analisados conjuntamente, de Março de 1999 a Novembro 2005. n Média Mediana DesPad Min-Máx º Temperatura da água ( C) Primavera 102 17,7 17,6 2,4 13,0-24,0 Verão 82 22,9 23,0 1,4 20,0-26,0 12,0-24,0 Outono 57 17,4 18,0 3,2 Inverno 44 12,8 13,0 2,1 8,0-18,0 Total 285 18,4 19,0 4,1 8,0-26,0 Salinidade Primavera 103 18,8 18,0 8,5 1,0-37,0 Verão 80 24,8 26,4 7,5 6,0-36,0 Outono 57 19,4 21,0 7,7 5,0-32,0 Inverno 45 16,4 16,0 9,4 2,0-32,0 Total 285 20,2 8,7 21,0 1,0-37,0 pH Primavera 91 8,1 8,2 0,3 7,1-9,0 Verão 65 8,1 8,1 0,3 6,7-8,5 Outono 47 8,0 8,0 0,2 7,3-8,4 Inverno 38 8,1 8,0 0,3 7,5-8,6 Total 243 8,1 8,1 0,3 6,7-9,0 -1 Kpar (m ) Primavera 68 1,7 1,3 1,3 0,6-8,0 Verão 63 1,9 1,5 1,2 0,4-7,7 Outono 56 1,8 1,4 1,2 0,6-6,5 Inverno 33 2,1 1,8 1,4 0,6-6,3 Total 220 1,8 1,3 1,4 0,4-8,0 zmix:zeuf Primavera 68 1,2 1,2 0,5 0,5-2,9 Verão 63 1,3 1,1 0,6 0,4-3,0 Outono 56 1,2 1,1 0,6 0,4-3,8 Inverno 35 1,4 1,3 0,7 0,4-4,1 Total 222 1,3 1,2 0,6 0,4-4,1 57 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON 4.3.4 Nutrientes inorgânicos dissolvidos na coluna de água 4.3.4.1 Amónio (NH4+) Foi possível observar um ligeiro padrão sazonal na variação média mensal da concentração de amónio na coluna de água durante o período em estudo, com as concentrações mais elevadas registadas no Outono e as menores no Verão (Fig. 4.5, Fig. 4.5b, Tabela 4.2). Figura 4.5: Concentração de amónio (NH4+) registada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março de 1999 a Novembro 2005. A linha representa a média da concentração dos quatro locais de amostragem (a). Representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) da concentração em NH4+ da água superficial. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. O valor máximo de NH4+ (78,8 µmol L-1) foi obtido em S2 (Fig 4.5a). Foi possível verificar um padrão espacial na concentração de NH4+, com S2 a apresentar concentrações significativamente mais elevadas (média de 20,1 µmol L-1) que o local S1 (p<0,01) e do que os locais S3 e S4 (p<0,0001) (Fig. 4.5c). O local S4 foi o 58 4.3 RESULTADOS que registou os valores mais baixos de NH4+ (média de 6,1 µmol L-1) apesar de não serem estatisticamente diferentes dos obtidos em S3. 4.3.4.2 Nitrito (NO2-) A concentração de nitrito dissolvido na coluna de água, nos quatro locais amostrados, revelou a ausência de um padrão sazonal (Fig. 4.6a, Fig. 4.6b). Espacialmente, todos os locais de amostragem registaram valores muito semelhantes. Embora no local S2 tenham sido observados valores médios de NO2um pouco mais elevados (3,2 µmol L-1), estes não foram significativamente diferentes dos registados nos restantes locais (Fig. 4.6c). O valor máximo atingido foi de 10,7 µmol L-1, sendo o valor médio de 2,8 µmol L-1 (Tabela 4.2). Figura 4.6: Concentração de nitrito (NO2-) registada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março de 1999 a Novembro 2005. A linha representa a média da concentração dos quatro locais de amostragem (a). Representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) da concentração em NO2-. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. 59 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON 4.3.4.3 Nitrato (NO3-) Para a área e período em estudo, foram observados padrões de variação sazonal e espacial na concentração do nitrato dissolvido na coluna de água (Fig. 4.7). Figura 4.7: Concentração de nitrato (NO3-) registada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março de 1999 a Novembro 2005. A linha representa a média da concentração dos quatro locais de amostragem (a). Representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) da concentração em NO3-. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. As concentrações de NO3- registadas no período de Inverno (67 µmol L-1) foram em média quatro vezes superiores às registadas no Verão (17 µmol L-1) (Fig. 4.7b, Tabela 4.2). S1 apresentou concentrações significativamente mais elevadas (média de 59,4 µmol L-1) do que em S2 e S3 (p<0,001) e em S4 (p<0,0001) (Fig. 4.7c). Apesar de não serem estatisticamente diferentes às concentrações obtidas em S2 e em S3, o local S4 registou as concentrações mais baixas de NO3- (média de 27,9 µmol L-1), relativamente aos outros locais de amostragem (Fig. 4.7c). 60 4.3 RESULTADOS 4.3.4.4 Azoto total inorgânico dissolvido (DIN) Tal como verificado para o nitrato, a soma da concentração dos compostos azotados inorgânicos dissolvidos na coluna de água (DIN) registou um padrão sazonal acentuado (Fig. 4.8a, Fig. 4.8b). Figura 4.8: Concentração de DIN registada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março de 1999 a Novembro 2005. A linha representa a média da concentração dos quatro locais de amostragem (a). Representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) da concentração em DIN. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. O Inverno foi a estação do ano que registou as concentrações de DIN mais elevadas, verificando-se valores três vezes superiores aos obtidos no Verão (Fig. 4.8b, Tabela 4.2). Também se fizeram notar diferenças na concentração de DIN entre os locais de amostragem (Fig. 4.8c). O local situado mais a montante (S1) apresentou significativamente concentrações mais elevadas de DIN (média de 75,3 µmol L-1) do que os locais S4 (média de 36,1 µmol L-1, p<0,0001) e S3 (média de 52,4 µmol L-1, p<0,001) (Fig. 4.8c). Porém, a concentração de DIN registada em S1 não foi estatisticamente diferente da registada em S2. Foi verificada uma correlação positiva entre DIN e o caudal do rio assim como com a precipitação 61 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON (Tabela 4.5). O nitrato foi a forma azotada que mais contribuiu para o total de DIN, correspondendo a um valor mediano de 74%. O amónio registou em média o valor de 12 µmol L-1, contribuindo assim 22,5% para o total da concentração média em DIN. Por último, o nitrito contribuiu com apenas 3,5% da contribuição relativa para o DIN. 4.3.4.5 Orto-fosfato (PO43-) A concentração de PO43- não revelou um padrão sazonal consistente. No entanto, parece ter existido uma tendência interanual, com as concentrações mais elevadas observadas nos dois últimos anos deste estudo (2004 e 2005) (Fig. 4.9a, Fig. 4.9b). Os diversos locais de amostragem revelaram concentrações de PO43- muito semelhantes, não sendo as suas diferenças significativas (Fig. 4.9c). O valor médio em PO43- registado para a área em estudo foi de 3,8 µmol L-1, em que a mediana correspondeu a metade desse valor (Tabela 4.2). Foi encontrada uma correlação negativa entre PO43- e o caudal do rio e positiva com a salinidade, colocando a descoberto um possível padrão sazonal e espacial (Tabela 4.5). 4.3.4.6 Silicato (SiO2) À semelhança do comportamento observado para a concentração de DIN, a concentração de silicatos dissolvidos na coluna de água apresentou um padrão sazonal característico (Fig. 4.10a, Fig. 4.10b). As concentrações mais elevadas em silicatos dissolvidos foram registadas no Inverno, diminuindo para valores muito reduzidos no Verão (Fig. 4.10b, Tabela 4.2). Espacialmente, não houve diferenças significativas entre locais (Fig. 4.10c). A concentração média em SiO2 foi de 65 µmol L-1 para a área em estudo (Tabela 4.2). O caudal do rio revelou uma forte correlação positiva com a concentração de silicatos, revelando a sua principal proveniência (Tabela 4.5). 62 4.3 RESULTADOS Figura 4.9: Concentração de orto-fosfatos 3- Figura 4.10: Concentração de silicatos dissolvidos (PO4 ) registada nos quatro locais dissolvidos (SiO2) registada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), desde Maio de de (a), Maio de 2001 até Novembro de 2005 (a), representação da variabilidade sazonal (b) e representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c). espacial (c). 2001 até Novembro de 2005 amostragem (S1, S2, S3 e S4), desde Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. 63 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON Tabela 4.2: Estatística descritiva relativa à concentração dos diversos nutrientes estudados na coluna de água durante o período em estudo (Março de 1999-Novembro 2005). Os diversos locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4) foram analisados conjuntamente. n Média Mediana DesPad Min-Máx Primavera 101 11,7 9,5 9,0 Verão 83 8,2 5,3 8,6 0,1-51,1 Outono 57 16,6 12,6 14,3 1,4-78,8 NH4+ (µmol L-1) 0,5-51,5 Inverno 50 14,1 11,5 10,7 1,2-59,5 Total 291 12,1 9,2 10,8 0,0-78,8 Primavera 102 2,7 2,2 2,1 0,0-10,7 Verão 83 2,6 2,3 1,7 0,0-7,8 Outono 56 2,9 2,9 0,9 0,9-4,8 NO2- (µmol L-1) Inverno 50 2,6 2,1 1,4 0,6-5,9 Total 291 2,8 2,3 1,7 0,0-10,7 Primavera 103 50,2 45,3 28,4 0,0-130,8 Verão 83 16,9 13,9 15,0 0,0-67,2 Outono 56 47,8 45,5 31,3 1,1-170,0 NO3- (µmol L-1) Inverno 50 66,8 63,2 30,5 19,7-132,4 Total 292 43,1 37,9 31,6 0,0-170,0 Primavera 102 64,8 58,6 32,1 0,2-146,3 Verão 83 27,2 26,4 19,2 0,8-123,6 Outono 57 67,0 60,3 35,5 7,7-182,4 DIN (µmol L-1) Inverno 45 84,2 78,3 32,9 32,5-142,3 Total 287 57,4 36,0 54,6 0,8-182,4 Primavera 73 3,5 3,2 1,4 2,0-8,4 Verão 61 3,9 3,5 1,6 1,8-9,2 Outono 47 4,5 3,6 3,0 1,9-19,1 PO43- (µmol L-1)a Inverno 28 3,4 3,5 1,1 1,4-6,0 Total 209 3,8 1,9 3,5 1,4-19,1 Primavera 78 47,8 42,9 32,3 3,7-135,4 Verão 62 32,1 28,8 22,2 4,6-110,6 Outono 47 73,0 56,6 49,9 15,3-258,3 SiO2 (µmol L-1)a a Inverno 30 62,3 48,0 44,8 14,3-177,5 Total 217 50,8 39,3 44,1 3,7-258,4 -dados desde Maio de 2001 até Novembro 2005 64 4.3 RESULTADOS 4.3.4.7 Razões N:P:Si A Figura 4.11 representa as razões molares padrão existentes entre os três nutrientes fundamentais para o crescimento do fitoplâncton (azoto, fósforo e sílica = N, P e Si), propostas por Redfield et al. (1963). As linhas Si:N=1, N:P=16 e Si:P=16 definem as diferentes áreas do esquema. Dentro de cada uma das áreas estão caracterizados, por ordem de prioridade, os nutrientes que potencialmente poderão limitar o crescimento do fitoplâncton (Redfield et al. 1963). Como sugerido por Dortch & Whitledge (1992), as constantes de semi-saturação (Ks) de Fisher et al. (1988) (DIN≤1, PO43-≤0,5 e SiO4≤5), foram discutidas em simultâneo com as razões de Redfield et al. (1963). Esta abordagem permitiu analisar a possível limitação em nutrientes de uma forma mais completa, tendo em conta os dois critérios. A Figura 4.11 destinou-se a facilitar a interpretação das razões obtidas para o estuário do Tejo (Figura 4.12). Para o período em que todos os nutrientes foram quantificados (Maio de Figura 4.11: Esquema indicativo das razões molares padrão existentes entre os nutrientes dissolvidos na coluna de água para o 2001 a Novembro de 2005), foi possível desenvolvimento do fitoplâncton (N, P e Si), representar as razões molares obtidas para segundo Redfield et al. (1963). A linha os tracejado representa a razão limite N:P=10 de quatro locais de amostragem (Figura 4.12). Salienta-se e discute-se os a Dortch & Whitledge (1992). valores das razões molares dos nutrientes dissolvidos na coluna de água registados no Verão por estes serem os mais relevantes para o desenvolvimento do fitoplâncton e para a ocorrência de períodos de florescimento. Geralmente, a razão N:P foi menor do que 16 (88%) nos meses de Verão. Em todo o ciclo sazonal, mas mais visível no Verão, houve uma diferença espacial clara nesta razão, onde a condição N:P<16 se verificou sempre para o local S4 enquanto que em S1 apenas se verificou em 64% das datas de amostragem. A condição Si:N<1 foi registada em 60% das ocasiões de amostragem. Esta condição revelou um padrão sazonal, tendo sido registada em 75% das amostragens realizadas no Inverno e em apenas 56% das realizadas no Verão. Espacialmente, as diferenças na razão Si:N não foram muito claras. Porém, S2 foi o local em que esta razão apresentou menor número de valores superiores a 1 (26%), exibindo os outros três locais valores semelhantes (entre 41-48%). No que diz respeito à razão Si:P, esta apresentou valores menores do que 16, em 68% do total das ocasiões, sendo o Verão o 65 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON período onde se registaram os valores mais baixos (Tabela 4.3). O local situado mais a montante (S1) apresentou razões Si:P superiores a 16 com maior frequência (44%), em oposição ao local mais a jusante (S4), com apenas 28% do total das ocasiões de amostragem. Figura 4.12: Razões molares N:P:Si registadas nos quatro locais de amostragem, de Maio de 2001 a Novembro de 2005. Os valores das razões molares durante os meses de Verão ({) e para os restantes meses do ano (z) estão em eixos logarítmicos (N:P vs Si:N). Em cada gráfico, as linhas horizontal, vertical e diagonal existentes estão definidas como na Figura 4.11. Tabela 4.3: Estatística descritiva relativa às razões molares N:P, Si:N e Si:P observadas durante o período em que todos os nutrientes foram estudados. Os quatro locais de amostragem foram analisados conjuntamente. n Média Mediana DesPad Primavera 73 19,4 17,2 11,3 Verão 61 9,2 6,5 7,4 0,8 - 32,1 Outono 47 19,6 15,5 13,5 3,0 - 61,8 Min - Máx N:P 0,1 - 54,4 Inverno 28 25,5 24,3 13,3 7,8 - 56,8 Total 209 17,3 14,5 12,5 0,1 - 61,8 Primavera 75 2,3 0,8 12,8 0,1 - 111,8 Verão 62 1,3 1,1 1,3 0,2 - 9,7 Outono 47 1,1 0,8 0,7 0,2 - 4,3 Si:N Inverno 28 0,9 0,7 0,5 0,3 - 1,9 Total 212 1,6 0,9 7,7 0,1 - 111,8 Primavera 73 15,7 14,4 11,9 1,3 - 51,8 Verão 61 9,4 7,1 8,2 1,4 - 40,4 Outono 47 17,4 13,3 10,3 7,4 - 55,4 Si:P 66 Inverno 28 24,2 14,5 21,5 3,5 - 68,6 Total 209 15,4 11,5 13,2 1,3 - 68,6 4.3 RESULTADOS 4.3.5 Matéria particulada em suspensão (SPM) A concentração de matéria particulada em suspensão na coluna de água não registou um padrão de sazonalidade claro (Fig. 4.13a, Fig. 4.13b). Figura 4.13: Concentração de matéria particulada em suspensão (SPM) registada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março de 1999 a Novembro 2005 (a). Representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) da concentração de SPM, para esse período. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. Em média, as concentrações mais elevadas de SPM foram obtidas no Verão (35,7 mg L-1) e as mais baixas na Primavera e Outono (ambos com 26,2 mg L-1) (Fig. 4.13b, Tabela 4.4). O valor mínimo de SPM foi registado em S4 (3,9 mg L-1, Março 2002) e o máximo em S1 (113,3 mg L-1, Novembro 1999). O local S2 foi o que apresentou as concentrações significativamente mais elevadas de SPM (média de 42,3 mg L-1) (p<0,0001) (Fig. 4.13c). Em média, S3 obteve as concentrações de SPM mais baixas (22,6 mg L-1), não sendo, no entanto, estatisticamente diferentes das obtidas em S4. Contudo, e em semelhança ao verificado para Kpar, parece ter havido uma diminuição generalizada de SPM em S2 a partir de 2004, provavelmente também devido à alteração na altura da amostragem em relação ao ciclo de maré. 67 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON 4.3.6 Fitoplâncton 4.3.6.1 Biomassa fitoplactónica total (clorofila a e feopigmentos) A variação temporal e a variação espacial da biomassa fitoplanctónica, quantificadas através da quantificação da concentração de Chl a, encontram-se ilustradas na Figura 4.14. Figura 4.14: Concentração de clorofila a registada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março de 1999 a Novembro 2005 (a), representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) da concentração em Chl a. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. Durante os sete anos em que se desenvolveu este estudo, foi possível distinguir um padrão anual evidente na concentração de Chl a em todos os locais de amostragem (Fig. 4.14a). Este padrão foi caracterizado por concentrações reduzidas de Chl a no Inverno com um aumento significativo da biomassa fitoplanctónica (Chl a) no final da Primavera ou no Verão (Fig. 4.14b, Tabela 4.4). A variação espacial foi também observada, sendo geralmente o local S1 a exibir valores de biomassa significativamente superiores aos dos outros locais (p<0,01 (S2 e S3) e p<0,001 68 4.3 RESULTADOS (S4)) (Fig. 4.14b). A concentração máxima de Chl a foi obtida no Verão de 1999 (32 µg L-1, em S1). Os locais S2, S3 e S4 não obtiveram valores de concentração de biomassa significantemente diferentes entre si. No entanto, ao longo dos anos, o período de florescimento (Primavera-Verão) não foi idêntico em todos locais em estudo, isto é, ou a quantidade de biomassa aumentou em todos os locais em sincronia ou este foi apenas observado como um curto e singular evento num só local de amostragem. Como exemplo, destaca-se o florescimento ocorrido na Primavera de 1999, observado apenas em S4 (Fig. 4.14a). A temperatura do ar foi o parâmetro ambiental que obteve o coeficiente de correlação mais elevado com a Chl a (r =0,515; p<0,001) (Tabela 4.5). Figura 4.15: Concentração de feopigmentos registada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março de 1999 a Novembro 2005 (a), representação da variabilidade sazonal (b) e espacial (c) da concentração em Feo. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. Sendo os feopigmentos produtos de degradação da Chl a, era esperado um padrão sazonal e espacial semelhante ao registado para a Chl a (Fig. 4.15, Tabela 4.4). Assim, Julho foi o mês que registou a concentração mais elevada de Feo e o mês 69 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON de Dezembro a menor concentração (Fig. 4.15b). Espacialmente, verificou-se um decréscimo da concentração média de Feo de montante para jusante, ao longo do estuário (Fig. 4.15c). Tabela 4.4: Estatística descritiva relativa ao SPM, da Chl a e Feo na coluna de água durante o período em estudo (Março de 1999-Novembro 2005). Os diversos locais de amostragem foram analisados conjuntamente. n Média Mediana DesPad Min-Máx Primavera 103 26,2 22,0 17,6 3,9-94,9 Verão 83 35,7 32,9 15,1 13,7-82,5 -1 SPM (mg L ) Outono 57 26,2 22,1 16,9 8,3-113,3 Inverno 45 30,2 22,7 20,6 8,4-102,6 Total 288 29,6 17,7 24,4 3,9-113,3 Primavera 103 4,5 3,1 4,1 0,5-24,3 Verão 83 8,0 6,8 4,8 1,7-32,3 Outono 57 2,4 1,7 1,7 0,2-7,0 Inverno 45 1,4 0,9 1,7 0,3-8,4 Total 288 4,6 4,4 3,3 0,2-32,3 Primavera 103 1.6 1.1 1,7 0,0-10,4 Verão 83 2.0 1.5 1,6 0,3-8,5 Outono 57 1.1 0.8 0,8 0,2-5,6 Chl a (µg L-1) Feo (µg L-1) Inverno 45 0.7 0.6 0,6 0,0-2,6 Total 288 1,5 1,0 1,5 0,0-10,4 A matriz resultante dos coeficientes de correlação de Spearman’s entre os vários parâmetros estudados encontra-se representada na Tabela 4.5, realçando a relação existente entre os diversos factores climáticos, hidrológicos e biológicos estudados. Tabela 4.5: Coeficientes de correlação de Spearman’s entre os parâmetros estudados: irradiância (Epar), temperatura (T), velocidade do vento (Ws), caudal do rio Tejo (Q), precipitação (Rf), salinidade (S), matéria particulada em suspensão (SPM), coeficiente de extinção da luz (Kpar), razão zmix:zeuf, soma da concentração de compostos azotados inorgânicos dissolvidos na coluna de água (DIN), orto-fosfatos (PO4), silicatos (SiO2) e clorofila a (Chl a), de Março de 1999 a Novembro de 2005. Os coeficientes são resultantes da análise dos quatro locais de amostragem em conjunto (n=209-288 dependendo do parâmetro analisado; * = p<0,05, ** = p<0,01 and *** =p <0,001). Epar T Ws Q Rf S SPM Kpar zmix:zeuf DIN PO4 SiO2 Chl a 70 Epar T Ws Q Rf S SPM Kpar zmix:zeuf DIN PO4 SiO2 Chl a 1 *** 0,587 *** 0,327 *** -0,294 *** -0,551 ** 0,201 *** 0,655 *** -0,401 ** -0,215 *** -0,401 *** 0,385 1 *** -0,289 *** -0,418 *** 0,279 * 0,124 *** -0,534 *** -0,290 *** 0,515 1 * 0,135 *** -0,261 ** 0,196 *** -0,425 - 1 ** 0,229 *** -0,514 *** 0,401 *** -0,291 *** 0,330 *** -0,246 1 *** -0,325 ** -0,154 *** 0,399 *** 0,571 *** -0,324 1 *** 0,345 ** -0,196 *** -0,673 *** 0,281 *** -0,538 ** 0,188 1 *** 0,620 *** 0,554 ** -0,192 *** -0,319 ** 0,198 1 *** 0,655 ** 0,228 ** -0,171 - 1 * -0,155 - 1 *** 0,610 *** -0,404 1 ** 0,254 - 1 *** -0,351 1 4.3 RESULTADOS De modo a poder ter conhecimento de quais os parâmetros potencialmente mais importantes para a variabilidade sazonal da biomassa fitoplanctónica, foi realizada uma regressão múltipla gradual (stepwise) considerando todo o período em estudo e analisando os quatro locais de amostragem conjuntamente (n=272). Como resultado, verificou-se que os valores médios da temperatura do ar, caudal do rio e irradiância, por si só, conseguiram explicar 47% da variação registada na Chl a, de acordo com a expressão: ln (Chl a + 1) = − 4,729 + 1,430 × ln (T8 ) − 0,131× ln (Q8 ) + 0,376 × ln (E d 8 ) onde T8, Q8 e Ed8 representam a média da temperatura do ar, caudal do rio e irradiância média diária superficial dos 8 dias anteriores ao dia da amostragem. A escolha da série dos 8 dias anteriores à data da amostragem deveu-se ao facto de ser aquela com melhor percentagem de explicação da variabilidade da Chl a. Simultaneamente, e dado o tempo de geração das células do fitoplâncton, considerar a influência dos parâmetros que ocorrem nos 8 dias anteriores, do ponto de vista biológico, pareceu ser a opção mais correcta. A equação obtida demonstrou que os três factores ambientais são factores chave para a explicação da flutuação da biomassa fitoplanctónica para a área em estudo. O resultado directo da aplicação do modelo confrontado com os dados reais de Chl a está representado na Fig. 4.16. Figura 4.16: Variabilidade da concentração de Chl a média observada nos quatro locais de amostragem (S1, S2, S3 e S4), de Março de 1999 a Novembro 2005 (●) e prevista pelo modelo de regressão para o mesmo período de tempo (●). Verificou-se que os valores de Chl a mais elevados, como por exemplo, os ocorridos durante o período do Verão, são subestimados pelo modelo de regressão. Ao representar a relação existente entre os valores de Chl a obtidos in situ e os 71 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON previstos pelo modelo anterior, a última afirmação torna-se ainda mais evidente (Fig. 4.17). Figura 4.17: Relação entre a concentração de Chl a observada (in situ) e os previstos pelo modelo de regressão nos quatro locais de amostragem. Representação dos meses de Verão (●) e restantes meses (●). A linha a tracejado descreve a relação 1:1. Apenas foram escolhidos os locais S1 e S4 para ilustrar como o modelo se ajustou aos valores registados de Chl a (Fig. 4.18). No Verão, o modelo ajustou-se melhor às concentrações de Chl a mais baixas e sem eventos de florescimento fitoplanctónico muito intensos observadas no local S4. Pelo contrário, o ajuste do modelo foi pior no local onde foi registada a Chl a mais elevada e com florescimentos intensos (S1). Figura 4.18: Variabilidade da concentração de Chl a observada ({) e prevista pelo modelo de regressão ({) para o local S1 (a) e variabilidade da concentração de Chl a observada ( ) e prevista pelo modelo de regressão ( ) para o local S4 (b) ambas de Março de 1999 a Novembro 2005. 72 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON 4.3.6.2 Fotopigmentos (clorofilas e carotenóides) O método de HPLC usado permitiu fazer a distinção de 17 fotopigmentos, todos correspondentes a picos detectados nas amostras de fitoplâncton dos quatro locais estudados. Por limitação do método aplicado, as clorofilas c1 e c2 juntaram-se num só pico (Fig. 4.19, pico 3). A análise dos fotopigmentos feita através de HPLC começou em Maio de 2001 e terminou em Novembro de 2005. No total, foram realizadas, para este trabalho (Capítulo), 209 análises no HPLC. Figura 4.19: Exemplo de um cromatograma obtido por HPLC (λ=440 nm), indicativo do padrão de saída dos pigmentos existentes nos extractos de fitoplâncton da amostra colhida em S1, em Julho de 2005. A identificação dos diferentes picos é apresentada na Tabela 4.6. A identificação dos diversos picos, o tempo de retenção médio, os máximos de absorvância e a concentração máxima dos diversos fotopigmentos encontrados encontra-se descrita na Tabela 4.6. Através da análise por HPLC, o carotenóide mais frequente e abundante foi a fucoxantina, o principal pigmento acessório das diatomáceas. Ainda assim, a fucoxantina não é um marcador inequívoco para as diatomáceas, visto que também poderá ser encontrado nos haptófitos, crisófitos e em alguns dinoflagelados. No entanto, a ausência do pigmento 19’-butanoiloxifucoxantina, presente em haptófitos e crisófitos, juntamente com a ocorrência de outros pigmentos, normalmente presentes em diatomáceas (no caso da clorofila c, diadinoxantina e diatoxantina), são indicativas da origem da fucoxantina. A presença de outros carotenóides como a peridinina, a aloxantina e a prasinoxantina são usados como marcadores inequívocos para os dinoflagelados, criptófitos e prasinófitos, respectivamente, dado que são exclusivos destas divisões (Tabela 3.1). 73 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON Tabela 4.6: Identificação dos picos, tempo de retenção, máximos de absorvância e concentração máxima dos diversos fotopigmentos encontrados para o estuário do Tejo, de Maio de 2001 a Novembro de 2005. O local onde foi encontrada a concentração máxima desse pigmento está entre parêntesis. N° Pico Pigmento Abreviatura Tempo de retenção (min) 1 Clorofila c3 Chl c3 7,58 2 Clorofilide a 3 Clorofila c1 + c2 4 5 Máximos de absorvância (nm) 454, 586 Concentração máx. dos pigmentos encontrados (local) -1 (µg L ) 0,72 (S4) Chlide a 7,95 431, 665 3,10 (S2) Chl c1 + c2 8,69 445, 581, 630 2,95 (S1) Peridinina Per 10,48 475 1,99 (S1) Fucoxantina Fuc 11,80 448, 465 11,77 (S1) 6 Neoxantina Neo 12,71 414, 438, 466 0,25 (S3) 7 Prasinoxantina Pra 13,51 454 0,72 (S3) 8 Violoxantina Vio 14,23 417, 441,471 1,40 (S2) 9 Diadinoxantina Diad 15,45 424, 448, 477 0,22 (S1) 10 Anteroxantina Anth 16,53 424, 444, 476 0,11 (S3) 11 Aloxantina Alo 16,84 429, 454, 483 0,99 (S4) 12 Diatoxantina Diat 17,77 430, 454, 482 0,51 (S3) 13 Luteina Lut 18,24 425, 447, 475 0,26 (S1) 14 Zeaxantina Zea 18,71 430, 454, 481 0,35 (S1) 15 Clorofila b Chl b 22,97 457, 596, 646 1,20 (S3) 16 Clorofila a Chl a 25,00 430, 617, 663 23,28 (S1) 17 ß-ßCaroteno ß-Car 28,02 430, 454, 481 0,27 (S1) 4.3.6.3 Abundância das classes fitoplantónicas e aplicação do ChemTax Da análise realizada com o programa ChemTax, as diatomáceas (Classe Bacillariophyceae) surgiram como a classe de microalgas predominante em todos os locais e em todas as estações do ano, contribuindo em média com 57% para o total da concentração de Chl a (Fig. 4.20). No entanto, ocasionalmente e em particular para situações de biomassa fitoplanctónica reduzida, os dinoflagelados (Classe Dinophyceae) ou os criptófitos (Classe Cryptophyceae) foram mais abundantes. Os criptófitos foram identificados como a segunda classe dominante de microalgas, contribuindo em média com 23% para o total de Chl a. Os dinoflagelados, os clorófitos (Classe Chlorophyceae), os euglenófitos (Classe Euglenophyceae) e os prasinófitos (Classe Prasinophyceae) contribuíram em média com 6,8%, 5,4%, 4,9% e 2,6% para o total da biomassa fitoplanctónica, respectivamente. A contribuição das cianobactérias (Classe Cyanobacteria) para o total de Chl a foi muito pouco relevante (<0,1%). 74 4.3 RESULTADOS Figura 4.20: Contribuição estimada das várias classes de fitoplâncton para a total concentração de Chl a nos quatro locais de amostragem de Maio de 2001 a Novembro de 2005, determinada através da interpretação das razões de fotopigmentos acessório:Chl a obtidas por HPLC e utilizando posteriormente o programa ChemTax. No que diz respeito à variabilidade espacial, a contribuição das diatomáceas para a comunidade fitoplanctónica registou valores mais elevados em S1 e S2 (62%) do que em S3 e S4 (53%). A distribuição relativa dos criptófitos acompanhou o gradiente de salinidade. Deste modo, este grupo aumentou de S1 (20%) para S4 75 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON (27%). Os euglenófitos tiveram a sua maior contribuição em S3 e S4 (6%) do que nos outros dois locais (4%). Os clorófitos predominaram significantemente mais no local situado mais a montante, S1 (8,7%), com contribuições intermédias em S2 e S3 (5,6% e 5,0% respectivamente), e significantemente com menos importância no local S4 (2,5%). Os dinoflagelados mostraram uma maior contribuição no local S4 (9,4%) comparada com a contribuição média obtida em S1, S2 e S3. Os prasinófitos foram mais abundantes em S3 e S4 (3,7%) do que em S1 e S2 (1,5%). A variabilidade interanual das classes taxionómicas não é fácil de analisar. Porém, o aumento dos euglenófitos na comunidade de Verão de 2005 foi claro. Além disso, pareceu existir uma tendência no que diz respeito à contribuição relativa das diatomáceas para a comunidade fitoplanctónica. Esta contribuição foi mais elevada no período 2002-2003 (63%) do que no período subsequente (54%), que por sua vez foi contrabalançada por um padrão oposto verificado para os criptófitos, com um aumento da sua contribuição de 2001 (13%) para 2005 (29%). A contribuição relativa dos clorófitos foi particularmente pequena em 2001 (sem dados do Inverno) e em 2002 (2,6%), aumentando a sua contribuição nos anos subsequentes (5,5%-6,6%). A Figura 4.21 ilustra a variabilidade sazonal da contribuição de cada classe, considerando a média dos valores obtidos nos quatro locais de amostragem. As diatomáceas constituíram a classe dominante em todas as estações do ano, tendo sido observada a contribuição máxima para o total de Chl a durante os meses de Verão (65,4%). A importância dos criptófitos na comunidade fitoplanctónica manteve-se ao longo do ciclo sazonal. Esta classe representou o segundo grupo mais abundante em todas as estações do ano, com a sua contribuição máxima durante o Verão e Outono. A concentração de Chl a atribuída aos dinoflagelados foi mais elevada no Verão e semelhante durante as restantes estações do ano. Os euglenófitos e os prasinófitos foram particularmente abundantes durante o Verão e Outono, sendo quase ausentes da comunidade fitoplanctónica durante a Primavera e Inverno. Um padrão diferente foi observado para os clorófitos, com as maiores contribuições para a comunidade observadas durante a Primavera. 76 4.3 RESULTADOS Figura 4.21: Gráficos box-whiskers da variabilidade sazonal da contribuição das diversas classes -1 fitoplanctónicas para a concentração de Chl a total (µg L ), determinada através da interpretação das razões fotopigmentos acessório:Chl a obtidas por HPLC e fazendo uso do programa ChemTax (foram usados os logaritmos da Chl a). Os quatro locais de amostragem foram analisados conjuntamente para o período de Maio de 2001 a Novembro de 2005. 77 4.4 DISCUSSÃO 4.4 Discussão Os ecossistemas marinhos são influenciados por uma variedade de factores físicos, em que, a dinâmica hidrológica (incluindo a estratificação), a energia solar e a temperatura têm, de um modo geral, um papel preponderante (Wirtz & Wiltshire 2005). Além destes factores, a precipitação é um factor externo de elevada importância em ecossistemas estuarinos, influenciando a entrada de nutrientes transportados pelas águas do rio, promovendo a escorrência de fertilizantes e detritos orgânicos provenientes de campos agrícolas e das margens urbanas circundantes. A precipitação tem ainda uma influência indirecta na penetração da luz na coluna de água, através do transporte de partículas sólidas dissolvidas e da ressuspensão dos sedimentos finos depositados no fundo da coluna de água. Lehman (1992) destacou a influência da sazonalidade da precipitação e consequentemente do fluxo de água doce na densidade e composição das espécies da comunidade fitoplanctónica estuarina. O período em que decorreu o presente estudo abrangeu anos muito contrastantes no que diz respeito aos regimes climatéricos, incluindo anos muito secos (1999 e 2005) e anos muito chuvosos (2001). As variabilidades sazonal e interanual da biomassa fitoplanctónica do estuário do Tejo foram parcialmente explicadas por factores físicos. De facto, a modelação da Chl a em função da temperatura do ar, irradiância e caudal do rio permitiu prever 47% da variabilidade da Chl a numa série temporal (7 anos). O modelo foi capaz de estimar o aumento da biomassa no fim da Primavera ou no Verão, entre Junho e Agosto, e a sua posterior diminuição durante o Outono e o Inverno, de acordo com as concentrações observadas. No entanto, o modelo descrito não foi capaz de prever a ocorrência dos períodos de florescimento, considerando-se como florescimentos os eventos de proliferação rápida de biomassa fitoplanctónica, atingindo valores de Chl a superiores a 10 µg L-1 (Sin et al. 1999). Na realidade, em estuários mesotidais, como o do Tejo, a variabilidade de escalas temporais curtas (dias ou semanas) é fortemente influenciada pela energia da maré, que por sua vez, ao influenciarem a disponibilidade da luz e nutrientes na coluna de água, têm um papel fundamental na formação de períodos de florescimento, ainda que de um modo complexo. Os valores de biomassa obtidos neste estudo não podem ser considerados elevados quando comparados com os referidos por Underwood & Kromkamp (1999) ou na bibliografia citada por Monbet (1992). Ao longo deste estudo foram registados períodos de florescimento (Chl a > 10 µg L-1) em 33 datas de amostragem, em que 7 destes foram verificados no fim da 78 4.3 RESULTADOS Primavera e 15 durante o Verão. O local de amostragem com maior influência fluvial (S1) foi o que registou a maior ocorrência de períodos de florescimento (55% do total das datas de amostragem). Em oposição ao verificado em S1, o local S4 foi o que registou a menor ocorrência de florescimentos, correspondendo apenas a 9%. Consequentemente, o modelo para a previsão da variabilidade da Chl a, obtido a partir da análise de regressão, apresentou melhor ajuste para S4 e pior para S1. No que diz respeito aos nutrientes inorgânicos dissolvidos na coluna de água do estuário, seriam necessárias experiências de adição controlada de nutrientes com monitorização da biomassa fitoplanctónica para testar rigorosamente a existência de limitação em nutrientes para o crescimento fitoplanctónico. Um método mais simples para avaliar a limitação em nutrientes consiste em comparar as concentrações destes, observadas na coluna de água, com as constantes de semi-saturação (Ks) referidas na literatura para cada nutriente. O Ks representa a concentração de nutriente limitante para a qual a taxa de absorção corresponde a metade da taxa de absorção máxima. Concentrações abaixo do valor de Ks estão associadas à redução considerável nas taxas de absorção e poderão potencialmente limitar o crescimento fitoplanctónico ou a acumulação de biomassa. Deste modo, o crescimento do fitoplâncton será limitado por um dado nutriente, se a concentração desse nutriente for inferior ao seu Ks (Fisher et al. 1988). Durante este estudo, os níveis de nutrientes na coluna de água raramente foram inferiores aos valores de Ks referidos por Fisher et al. (1988) para o fitoplâncton estuarino (DIN≤1 µM, PO43-≤0,5 µM e SiO4≤5 µM). As concentrações de DIN e silicatos foram inferiores a 1 µM e a 5 µM, respectivamente, em apenas 2 datas de amostragem. A concentração de PO43- nunca foi menor que 1,4 µM. É possível ainda discutir a limitação em nutrientes em relação ao crescimento fitoplanctónico, em termos das razões molares de Redfield (16N:1P:16Si), indicadoras de uma potencial limitação em azoto (N), fósforo (P) ou sílica (Si). De acordo com Dortch & Whitledge (1992), a análise da possibilidade de limitação de nutrientes no estuário do Tejo, foi feita com base na combinação da concentração dos nutrientes inorgânicos dissolvidos e suas razões com as constantes de semi-saturação de cada nutriente indicadas para o fitoplâncton estuarino. Assim, os critérios de limitação de nutrientes usados foram: limitação de N quando N:P≤10, Si:N>1 e DIN≤1; limitação de P quando N:P>30, Si:P>3 e PO43-≤0,5 e limitação de Si quando Si:N<1, Si:P<3 e SiO4≤5. Para um determinado nutriente ser considerado limitante, as três condições têm de ser verificadas. A razão N:P verificou-se ser inferior a 10, identificando um possível défice de azoto durante a maioria das amostragens realizadas nos meses de Verão e em todos os locais de amostragem. Foi observada uma possível limitação de N 79 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON em 15% do total das datas de amostragem no local S1 e em 45% no local S4, evidenciando-se também assim uma heterogeneidade espacial. Porém, segundo os critérios de Dortch & Whitledge (1992), a limitação em N foi pouco provável no estuário do Tejo, uma vez que a concentração de DIN≤1 µM só se verificou 2 vezes em todas as datas e locais de amostragem. Durante o Inverno, o facto da razão Si:N ser inferior a 1, em grande parte das datas de amostragem, foi provavelmente devido às concentrações elevadas de N comparativamente às de Si na coluna de água e não a uma possível limitação de silicatos, visto que a concentração mínima obtida no Inverno foi de 14,3 µM, muito acima do valor de Ks (5 µM). As concentrações de Si e DIN apresentaram uma diminuição de montante para jusante, dado que a origem destes nutrientes está principalmente associada à descarga de água do rio Tejo no estuário, o que é corroborado pela forte correlação positiva existente com o caudal do rio e negativa com a salinidade. Esta relação já tinha sido observada anteriormente no estuário do Tejo (Cabrita & Moita 1995, Cabrita 1997). Ao contrário do padrão encontrado para o NO3- e NO2-, o NH4+ não esteve correlacionado com o caudal do rio, possivelmente pela sua origem estar associada aos sedimentos e a sua disponibilização para a coluna de água ser devida à ressuspensão dos sedimentos finos do fundo da coluna de água (Cabrita et al. 1999) ou às descargas pontuais de efluentes. As concentrações de NH4+ foram mais elevadas nos locais de amostragem menos profundos (S1 e S2) onde a ressuspensão de sedimentos para a coluna de água tem maior impacto. A correlação negativa encontrada entre as concentrações de PO43- e o caudal do rio e positiva entre este nutriente e a salinidade excluem a possibilidade do PO43- ter uma origem fluvial. Como conclusão, ocasionalmente e apenas durante o período de Verão, o azoto inorgânico dissolvido poderá ter sido um possível factor limitante para o crescimento fitoplanctónico sobretudo no local S4. Em estuários pouco profundos e túrbidos, as células fitoplanctónicas vivem numa coluna de água agitada, fraccionada numa zona superficial eufótica (zeuf) que assegura a fotossíntese e numa zona afótica (sem luz) onde o processo da fotossíntese não é possível (Alpine & Cloern 1988). A razão entre a zona de mistura (zmix) e a zona eufótica determina o período de tempo em que as células vivem em presença de luz e a possibilidade de ocorrer crescimento fitoplanctónico. Em sistemas marinhos, a teoria da “profundidade de mistura crítica” de Sverdrup (1953) tem sido usada para explicar o aparecimento de períodos de florescimento na Primavera. Esta teoria pressupõe que a comunidade de fitoplâncton esteja distribuída uniformemente na coluna de água, tendo em conta a dependência que a taxa de crescimento fitoplanctónico têm da luz, assim como das características da 80 4.3 RESULTADOS absorção da luz ao longo da coluna de água. Talling (1971) analisou o efeito da mistura em relação à profundidade da zona eufótica e obteve uma razão zmix:zeuf igual a 5, que considerou como o valor máximo necessário para permitir o crescimento das células. Mais tarde, Platt et al. (1991) aludiram que os critérios da teoria da “profundidade de mistura crítica” de Sverdrup (1953) eram condições necessárias mas não suficientes para o desenvolvimento de um período de florescimento fitoplanctónico, e que estes apenas conseguiam indicar a possibilidade de crescimento líquido de uma comunidade. Posteriormente, Huisman et al. (1999) demonstraram que existem dois mecanismos distintos e independentes para o desenvolvimento de períodos de florescimento fitoplanctónico; um é a teoria clássica da “profundidade de mistura crítica” de Sverdrup (1953) e o outro, é denominado de mecanismo da “turbulência crítica”, baseado na taxa de turbulência da mistura da coluna de água, em que um período de florescimento apenas se poderá desenvolver se a taxa de turbulência da mistura for inferior à uma turbulência crítica específica. Esta condição é independente da profundidade da coluna de água e demonstra que o desenvolvimento de períodos de florescimento na ausência de estratificação da coluna de água é possível. Esta última abordagem parece apropriada para sistemas estuarinos pouco profundos, onde a força da maré induz a mistura e previne a estratificação da coluna de água em escalas de tempo relativamente curtas (Mann & Lazier 1991). No estuário do Tejo, a profundidade eufótica foi inferior à profundidade de mistura, na grande maioria das datas de amostragem (70%). No que diz respeito à luz como factor limitante, os resultados deste estudo revelaram a existência de níveis elevados de Kpar, em simultâneo com concentrações elevadas de SPM. A matéria particulada em suspensão, é não só, oriunda da água doce que entra no estuário (por esse motivo o seu valor máximo ocorreu na Primavera), mas também devida à ressuspensão dos sedimentos, que, segundo Vale & Sündby (1987), é induzida principalmente pela força da maré. É de realçar que os valores do coeficiente de extinção da luz observados no Verão foram relativamente elevados, sugerindo que em períodos em que o aumento do tempo de residência da água permitiu a estabilização da coluna de água, e consequentemente, o crescimento continuado das células fitoplanctónicas, a quantidade de biomassa foi controlada sobretudo pela disponibilidade de luz. Cabeçadas (1999) descreveu a luz foi como factor principal no controlo do crescimento do fitoplâncton do estuário do Tejo, o que se verifica em muitos outros sistemas estuarinos (Cloern 1999). Não obstante, o facto dos valores de Kpar nos locais S1 e S2 terem sido mais elevados do que em S3 e S4, a média do tempo 81 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON passado pelas células fitoplanctónicas na zona eufótica (indicado pela razão zmix:zeuf) foi equivalente em todos os locais. Deste modo, a variabilidade espacial encontrada para a concentração em Chl a e para a ocorrência de períodos de florescimento, poderá ser atribuída apenas à disponibilidade de nutrientes dissolvidos e a pequenas diferenças na composição taxionómica de cada local. O local S1, onde foi observado o valor de biomassa mais elevado e a maior ocorrência de períodos de florescimentos, registou as concentrações de nutrientes mais elevadas (DIN=76 µM, SiO2=63 µM, média de todos os valores) e uma comunidade rica em espécies de água doce. O local S4 registou os valores de nutrientes mais baixos (DIN=36 µM, SiO2=42 µM) e uma comunidade constituída maioritariamente por espécies flageladas marinhas. Neste estudo, a análise da composição da comunidade fitoplanctónica foi baseada na análise qualitativa e quantitativa dos fotopigmentos. A análise pigmentar por HPLC e o uso do programa ChemTax têm sido largamente utilizados como ferramentas valiosas de monitorização em estuários, determinando relações existentes entre as variáveis ambientais e as biomassas absolutas ou relativas das classes fitoplanctónicas (Ansotegui et al. 2001, Paerl et al. 2003, Lewitus et al. 2005). Nos Estados Unidos, este método tem sido evidenciado de modo a melhorar a avaliação da composição taxionómica do fitoplâncton dos estuários (Lewitus et al. 2005), conseguindo detectar alguns taxa geralmente subestimados ou negligenciados pela utilização da técnica clássica de microscopia (Schlüter et al. 2000, Wright & van der Enden 2000, Ansotegui et al. 2001). Para se ter acesso a uma estimativa correcta da contribuição de cada classe de fitoplâncton para o total de biomassa, a correcta selecção da razão pigmento acessório:Chl a é uma etapa crucial na utilização do ChemTax (Henriksen et al. 2002, Rodriguez et al. 2002). Assim, as razões pigmentares inseridas no ChemTax deverão ser das espécies mais representativas e, tanto quanto possível, provenientes da área em estudo (Mackey et al. 1996, Lewitus et al. 2005). No presente estudo, e para a classe das diatomáceas e dinoflagelados, foram usadas razões pigmentares de culturas de espécies típicas encontradas nos locais de amostragem. Para as restantes classes foram usadas razões obtidas da literatura para espécies costeiras e estuarinas (Schlüter et al. 2000). Depois da aplicação do ChemTax, as razões inseridas inicialmente para cada classe mantiveram-se relativamente constantes e dentro dos limites registados na literatura, indicando que as razões usadas foram as adequadas. 82 4.3 RESULTADOS As diatomáceas constituíram o grupo de fitoplâncton dominante em todos os locais de amostragem e ao longo de todo o ciclo sazonal, sendo também o grupo responsável pela ocorrência dos períodos de florescimento. Em trabalhos anteriores, já tinha sido demonstrado que as diatomáceas eram o grupo de fitoplâncton predominante em estuários (Lemaire et al. 2002, Gameiro et al. 2004). As três espécies de diatomáceas mais abundantes no estuário do Tejo foram Detonula pumila, Skeletonema costatum (s.l.) e Thalassiosira minima (Gameiro et al. 2004). Os dinoflagelados, euglenófitos e prasinófitos revelaram a sua maior contribuição para a biomassa da comunidade fitoplanctónica durante o Verão, quando os tempos de residência da água foram maiores e consequentemente a turbulência da coluna de água menor. De acordo com Huisman et al. (1999), um decréscimo nos processos de turbulência da mistura, permitindo o crescimento do fitoplâncton, é o mecanismo mais importante para as espécies pelágicas flutuantes. Este tipo de espécies associa-se melhor à zona superior da coluna de água, sendo esta uma vantagem em relação às espécies que afundam. Os três grupos fitoplanctónicos acima descritos pertencem à categoria morfológica das espécies flutuantes e o aumento da sua abundância durante o Verão é coerente com a teoria de Huisman et al. (1999). Os clorófitos registaram a sua maior contribuição no local mais influenciado pelo rio (S1) durante o Inverno e a Primavera, devido ao aumento da entrada de água doce no estuário, baixa salinidade e concentrações elevadas de DIN. As diatomáceas foram mais abundantes nos locais situados mais a montante (S1 e S2), enquanto os dinoflagelados e criptófitos aumentaram a sua abundância em direcção a jusante (S3 e S4). A entrada de água doce revelou ser um factor chave na determinação da variação temporal e espacial da composição da comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo, em semelhança ao descrito para a baía de Chesapeacke (Marshall & Alden 1990) e para a baía de São Francisco (Cloern 1996). Quanto à comparação interanual, e no que diz respeito às médias da Chl a obtidas no Verão, estas foram mais elevadas em 1999 e 2005. Estes anos registaram um período de seca mais acentuada, e consequentemente, um tempo de residência da água no estuário mais prolongado e uma estabilidade da coluna de água maior. Comparando as concentrações mensais de nutrientes e de Chl a registadas durante os sete anos deste estudo, com os valores dos mesmos parâmetros obtidos em 1980-1981 (Martins & Dufferner 1982, Gameiro et al. 2004), juntamente com o acesso à composição da comunidade fitoplanctónica, poder-se-à inferir que não existe uma tendência para a eutrofização no estuário do Tejo. 83 4. INFLUÊNCIA DE FACTORES AMBIENTAIS NA DINÂMICA DO FITOPLÂNCTON Cabeçadas et al. (2000) já tinham referido que as águas costeiras do Sul de Portugal se encontravam relativamente saudáveis, grande parte devido às características hidrológicas e biológicas do sistema mas também como consequência da extinção de muitos complexos industriais nestas áreas, da instalação de novas estações de tratamento de água residuais (ETARs) e da criação de áreas protegidas. Diversos autores referidos em de Jonge et al. (2002) consideraram o tempo de permanência da água, a turbidez e a entrada de nutrientes nos sistemas estuarinos, parâmetros essenciais para classificar a sensibilidade de um dado ecossistema à eutrofização. Os resultados obtidos neste estudo permitem incluir o estuário do Tejo no grupo dos estuários considerados com nível de eutrofização reduzido, segundo a classificação dos estuários deste autor. Este Capítulo discutiu a influência de alguns factores ambientais na distribuição e composição da comunidade de fitoplâncton do estuário do Tejo. A influência destes factores na quantidade de biomassa fitoplanctónica existente na coluna de água foi de igual modo evidenciada. O Capítulo 5 caracteriza a produtividade primária e os parâmetros fotossintéticos da comunidade de fitoplâncton em dois dos locais de amostragem (S1 e S4). 84 Capítulo 5. Produção primária fitoplanctónica e parâmetros fotossintéticos Este capítulo apresenta-se numa forma similar em: “Phytoplankton primary production and photosynthetic parameters in a shallow and turbid estuarine system” Gameiro, C., Zwolinski, J. & Brotas, V. Aceite para revisão no Journal of Plankton Research 5.1 RESUMO 5.1 Resumo A taxa de produção primária fitoplanctónica foi medida usando o método do 14 C, em dois locais situados na área média do estuário do Tejo (Portugal), mensalmente e durante um ano (Julho-2006 a Junho-2007). Nesta área do estuário, onde a coluna de água é túrbida, pouco profunda e não estratificada, a zona eufótica variou entre 1,9 e 6,0 m. A fonte de entrada de água doce mais importante no estuário (rio Tejo) teve um efeito directo nas condições físicas e na concentração de nutrientes na coluna de água, bem como na comunidade fitoplanctónica. A biomassa fitoplanctónica registou valores reduzidos durante o período em estudo -1 (0,6-9,9 µg L ), sofrendo um acréscimo na Primavera-Verão induzido pelo aumento de luz e temperatura. Estes dois parâmetros ambientais, simultaneamente com a estrutura da comunidade fitoplanctónica, foram ainda responsáveis pela variação sazonal observada na -1 produção primária diária do fitoplâncton -1 (1,0-8,4 mg C (mg Chl a) h) ). Adicionalmente, a variação sazonal da taxa de produtividade máxima (PBmax) e da eficiência fotossintética (αB), obtidas a partir das curvas P-E, verificou-se estar associada a gradientes de luz e temperatura. Valores relativamente reduzidos de PBmax e de intensidade de luz saturante (Ek) em simultâneo com valores de αB elevados sugerem que a comunidade de fitoplâncton do estuário do Tejo se encontrava fotoaclimatizada às baixas intensidades luminosas. De facto, a limitação de luz causada pelos índices de turbidez elevados da coluna de água pareceu afectar a produtividade fitoplanctónica do estuário do Tejo de duas formas: regulando a quantidade máxima de biomassa e estimulando a aclimatação fisiológica do fitoplâncton a condições de pouca luminosidade. A fotoinibição, considerada ocorrer apenas na camada superficial da coluna de água e durante um curto período do dia (± a meio do fotoperíodo), fez diminuir em 8% a estimativa da taxa de produção primária anual do estuário do Tejo. A produção primária anual média foi estimada em 85 g C m-2 ano-1 para a área em estudo, sendo comparável com as taxas obtidas para outros estuários túrbidos considerados pouco ou moderadamente produtivos. Considerando a área total do estuário e deduzindo-lhe a área de espraiados de maré, estimou-se a produção primária média anual do fitoplâncton do estuário do Tejo entre 18.700 t ano-1 e 27.200 t ano-1. Palavras Chave: Curvas P-E; Aclimatação a baixas intensidades luminosas; Estuário do Tejo. 87 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS 5.2 Introdução Em sistemas estuarinos com turbidez elevada, apenas uma pequena fracção da luz consegue penetrar a coluna de água e ser usada pelo fitoplâncton para realizar a fotossíntese. A rápida atenuação da luz na coluna de água resulta numa zona fotossintética diminuta que normalmente corresponde a uma zona eufótica (zeuf) pouco profunda em relação à profundidade total. Outros parâmetros ambientais, como temperatura (Williams 1996), nutrientes inorgânicos dissolvidos (D’Elia et al. 1986), estrutura da comunidade fitoplanctónica (Côté & Platt 1983) e herbivoria por parte do zooplâncton (Verity 1986), podem ter um papel fundamental no controlo da variabilidade da produção primária em estuários. A limitação de luz pode estimular a eficiência fotossintética das comunidades de fitoplâncton que habitam um meio onde esta condição impera. Em ambientes onde a disponibilidade de luz é altamente variável, a comunidade fitoplanctónica tem a capacidade de ajustar a intensidade da irradiância de saturação (Ek) de forma a conseguir manter o equilíbrio entre as reacções da fase escura e clara da fotossíntese (Sakshaug et al. 1997). O fitoplâncton é assim capaz de optimizar a taxa de crescimento em condições sub-óptimas através de um ajuste fisiológico às alterações diárias e sazonais da intensidade luminosa que ocorrem continuamente na coluna de água. Este ajuste fisiológico celular, denominado aclimatação, poderá também ajudar a limitar os danos que poderão sobrevir como consequência do excesso de luz (Geider et al. 1998). A relação que existe entre a taxa fotossintética e a intensidade luminosa (curva P-E, Fig. 3.3) tem sido a via preferencial para compreender a variabilidade da produção primária, uma vez que os parâmetros daí obtidos podem variar de modo significativo com os parâmetros ambientais (Sakshaug et al. 1997). A observação das curvas P-E de uma comunidade poderá indicar o modo como a luz é utilizada pelos produtores primários e consequentemente, revelar a existência de fotoinibição, caracterizar a eficiência fotossintética e a fotoaclimatação das comunidades fotossintéticas (Platt & Jassby 1976). A produção primária fitoplanctónica tem sido pouco estudada no estuário do Tejo. Cabeçadas (1999) estimou a produção primária bruta diária da área inferior do estuário do Tejo em 71 mg C m-2 d-1, apenas para o início da Primavera, não contemplando variabilidade espacial ou temporal. O objectivo principal deste estudo foi investigar a produtividade primária do fitoplâncton do estuário do Tejo e as suas características fisiológicas fotossintéticas durante um ano, na zona média do estuário. Foi calculada a variabilidade sazonal da taxa de produção primária e dos 88 5.3 RESULTADOS parâmetros fotossintéticos do fitoplâncton de Julho de 2006 a Junho de 2007, em dois dos locais (S1 e S4), com amostragem mensal. De entre os 4 locais analisados no Capítulo 4, a escolha do local S1 e S4 neste estudo, foi devida a estes terem revelado as maiores diferenças longitudinais na salinidade, concentração de nutrientes, Chl a e composição taxionómica (Fig. 2.1). No local S4 não foram realizadas amostragems nos meses de Julho, Outubro e Novembro de 2006, devido às condições atmosféricas adversas. 5.3 5.3.1 Resultados Parâmetros meteorológicos e hidrológicos 5.3.1.1 Irradiância, velocidade do vento, caudal do rio e precipitação Tanto a irradiância superficial como a velocidade do vento apresentaram padrões sazonais característicos da região em estudo, isto é, valores baixos no Inverno e elevados no Verão (Fig. 5.1a). Figura 5.1: Parâmetros ambientais para a zona média do estuário do Tejo, de Julho de 2006 a Junho de 2007. (a) Valores médios mensais de irradiância superficial (Epar) e de velocidade do vento (dados do IM), (b) valores médios mensais do caudal do rio Tejo (medido em Almourol) e do total mensal da precipitação (dados do INAG). A média mensal da irradiância fotossinteticamente activa à superfície da coluna de água (Epar) variou entre 135 µmol fotões m-2 s-1 (Dezembro e Janeiro) e 470 µmol fotões m-2 s-1 (Julho). A velocidade do vento mais elevada foi atingida em Agosto (1,6 m s-1) e a mais baixa em Novembro (0,6 m s-1) (Fig. 5.1a). O caudal mádio do rio Tejo variou entre um valor extraordinamente elevado no início do Inverno (1450 m3 s-1, Novembro) e um relativamente baixo durante a Primavera (80 m3 s-1, Abril) (Fig. 5.1b). O padrão sazonal do caudal do rio Tejo acompanhou o 89 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS padrão da precipitação total mensal. A precipitação registou o valor máximo em Novembro (240 mm) e o mínimo em Julho (2 mm) (Fig. 5.1b). 5.3.1.2 Temperatura da água, salinidade e irradiância na coluna de água Seguindo o padrão sazonal característico das zonas temperadas, a temperatura da água registou valores mais elevados no Verão (21°C-26°C) e mais baixos no Inverno (média de 12°C) (Tabela 5.1). Tabela 5.1: Valores de temperatura da água (°C), salinidade, coeficiente de extinção da luz da coluna de água (Kpar, m-1), profundidade da zona eufótica (zeuf, m), razão de mistura crítica (zmix:zeuf) e irradiância média da coluna de água (Em, µmol fotões m-2 s-1) obtidos em S1 e S4, de Julho de 2006 a Junho de 2007. Temp. água Data Salidade (ºC) S1 Jul * Ago Set * Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Kpar zeup (m ) -1 (m) zmix:zeup Em (µmol fotões m-2 s-1) 26,3 24,0 21,5 19,1 18,0 12,2 11,0 14,0 13,7 20,5 19,0 21,5 10 11 15 17 5 4 11 4 10 10 15 15 2,5 1,4 1,9 1,3 2,3 2,1 1,6 1,7 2,0 1,8 1,7 1,9 1,9 3,0 2,5 3,0 2,0 2,3 3,0 2,7 2,3 2,6 2,7 2,4 1,9 1,0 1,5 1,0 1,8 1,6 1,0 1,3 1,5 1,4 1,3 1,5 252 150 131 93 119 64 65 195 200 97 165 121 S4 Jul Ago 21,8 Set 21,1 * 18,9 Out Nov Dez * 12,0 Jan Fev 14,0 * 14,5 Mar * 20,0 Abr May 18,8 Jun 20,7 * - toda a zmix é zeuf 31 30 34 20 14 23 27 32 26 1,2 1,0 0,8 1,2 1,1 0,7 0,6 0,9 1,7 4,0 4,8 4,0 3,5 4,3 6,0 5,0 5,1 2,8 1,4 1,1 1,0 1,0 1,4 1,0 1,0 1,0 2,2 197 175 98 90 248 102 71 181 225 A temperatura da água não revelou ser significantemente diferente em ambos os locais de amostragem (p<0,396). A salinidade mais baixa foi obtida em Fevereiro e a mais elevada em Outubro, sendo os valores registados em S1 sempre inferiores aos obtidos para S4 (Tabela 5.1). Em S1, a média da salinidade nos meses de Inverno foi de 6 e nos meses de Verão de 12, enquanto o local S4 registou valores médios de 17 e 31 nesses períodos, respectivamente. Foram observadas 90 5.3 RESULTADOS desigualdades espaciais e sazonais consideráveis no teor salino, sendo a última mais evidente no Verão (p<0,0001) (Tabela 5.1). Uma correlação negativa entre o caudal do rio (valores médios dos 15 dias anteriores à colheita) e a salinidade foi observada em ambos os locais (r=-0.79; p<0,05; n=10 em S1 e r=-0,86; p<0,05; n=7 em S4). Em ambos os locais, o pH da água não apresentou qualquer padrão sazonal nem espacial. A amplitude dos valores obtidos foi relativamente pequena, situando-se entre 7,25 e 7,99. O coeficiente de extinção da luz (Kpar) variou sem, no entanto, apresentar um padrão sazonal claro (Tabela 5.1). Os níveis de Kpar registados em S1 foram significativamente mais elevados do que os observados em S4 (p<0,0001). Este parâmetro variou entre o valor máximo de 2,5 m-1 em S1 (Julho) e o valor mínimo de 0,6 m-1 em S4 (Abril). Consequentemente, a profundidade da zona eufótica (zeuf) aumentou em direcção a jusante, registando-se uma média anual de 2,5 m e de 4,4 m em S1 e S4, respectivamente. A média da razão zmix:zeuf foi superior a 1 (1,4 e 1,1 para S1 e S4, respectivamente), indicando que, na maior parte das datas de amostragem, nem toda a coluna de água era zona fotossintética (Tabela 5.1). Foi encontrada uma correlação negativa entre Kpar e salinidade (r=-0,76; p<0,0001; n=21). No momento em que as amostras foram recolhidas, a irradiância média da luz na coluna de água (Em) variou entre 64-252 µmol fotões m-2 s-1 no Inverno e no Verão, respectivamente (Tabela 5.1). Com excepção do mês de Abril, S1 obteve sempre os valores menores de intensidade média de luz na coluna de água. 91 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS 5.3.2 Nutrientes inorgânicos dissolvidos na coluna de água 5.3.2.1 DIN, SiO2 e PO43A concentração azotados em compostos inorgânicos dissolvidos (DIN) apresentou um padrão sazonal claro, com valores mais baixos no Verão e mais elevados no Inverno (Fig. 5.2a). O DIN 36-158 µmol L-1 variou em entre S1 e 14-98 µmol L-1 em S4. O nitrato contribuiu em média para uma percentagem superior a 65% do total do DIN durante todo o período de estudo e em ambos os locais. À semelhança do padrão de sazonalidade obtido para o DIN, também a concentração de silicatos dissolvidos na coluna de água apresentou concentrações baixas no Verão e altas no Inverno (Fig. 5.2b). A concentração silicatos foi -1 17,4 µmol L de mais 21,3 µmol L-1 em respectivamente. baixa S1 O de e e S4, local S1 apresentou concentrações significati- Figura 5.2: Concentração de nutrientes dissolvidos vamente mais elevadas de DIN e de na coluna de água com o respectivo desvio padrão silicatos (p<0,01 e p<0,05, respectiva- para os dois locais de amostragem, S1 (●) e S4 ({) mente), que em S4. O ciclo sazonal desde Julho de 2006 a Junho de 2007. (a) DIN; (b) da concentração em orto-fosfatos silicatos e (c) orto-fosfatos. revelou a existência de concentrações mais elevadas no Verão e início do Outono, sendo o oposto verificado durante o Inverno e Primavera (Fig. 5.2c). A menor concentração deste nutriente foi de 2,8 µmol L-1, observada em S1, em Novembro. 92 5.3 RESULTADOS 5.3.2.2 Razões N:P:Si De um modo semelhante ao realizado no Capítulo 4, as razões molares dos nutrientes foram analisadas segundo os critérios clássicos de Redfield et al. (1963). Em simultâneo, foram também aplicados os critérios de Fisher et al. (1988) de limitação fitoplanctónica de nutrientes para uma análise mais completa, segundo Dortch & Whitledge (1992). Figura 5.3: Razões molares de N:P:Si (N:P vs Si:N em eixos logarítmicos) registadas na coluna de água dos dois locais de amostragem (z)-S1 e ({)-S4, de Julho de 2006 a Junho de 2007. A definição da linha horizontal, vertical e diagonal é igual à da Fig. 4.11, a linha a tracejado representa a razão limite N:P=10 de Dortch & Whitledge (1992). Assim, os critérios de limitação de nutrientes usados foram: limitação de N quando N:P≤10, Si:N>1 e DIN≤1; limitação de P quando N:P>30, Si:P>3 e PO43-≤0,5 e limitação de Si quando Si:N<1, Si:P<3 e SiO4≤5. Para que cada nutriente seja considerado limitante, as três condições têm de ser verificadas. Limitação em compostos azotados parece não ter ocorrido, uma vez que N:P≤10, Si:N>1 e a concentração de DIN ter sido sempre acima de 36 µM e 14 µM nos locais S1 e S4, respectivamente (Fig. 5.3). Analogamente, a concentração de silicatos foi sempre superior a 5 µM e a razão Si:P sempre <3, indicando a ausência de limitação de silicatos em ambos os locais. Apesar da razão Si:P>3 ter sido constantemente observada, a concentração mais baixa de PO43- foi de 2,8 µM, indicando a ausência de limitação de orto-fosfatos. 93 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS 5.3.3 Fitoplâncton 5.3.3.1 Biomassa fitoplanctónica total (Chl a) e composição taxonómica Em ambos os locais, a biomassa fitoplanctónica (Chl a) revelou uma variação sazonal muito pronunciada (0,6-9,9 µg L-1) (Fig. 5.4). Figura 5.4: Variabilidade sazonal da biomassa fitoplanctónica em termos de Chl a (µg L-1) e em termos de número de células por litro de cada grupo de microalgas estimado por microscopia nos dois locais de amostragem: S1(a) e S4(b) de Julho de 2006 a Junho de 2007. Note-se que a escala do eixo do y é diferente para os dois locais. Foi observado um pico de Chl a no Verão (Julho) e outro na Primavera (Abril), ambos em S1 (Fig. 5.4a). Durante o restante período de amostragem, as concentrações de Chl a obtidas foram < 4 µg L-1. As concentrações de Chl a foram sempre mais elevadas no local S1 do que em S4. De igual modo, as maiores abundâncias fitoplanctónicas, em termos de células, foram encontradas no local localizado mais a montante (0,71-2,85 × 106 células L-1) e as menores no local situado mais a jusante (0,35-3,91 × 106 células L-1), excepto em Agosto (Fig. 5.4). As células fitoplanctónicas encontradas pertenciam sobretudo ao grupo das diatomáceas e dos criptófitos, contribuindo para uma média de 84% do total das células contabilizadas para ambos os locais (Fig. 5.4, Tabela 5.2). No local S1, as principais espécies de diatomáceas presentes pertenciam ao género Chaetoceros com espécies de pequenas dimensões, com menos de quatro setae por célula (Chaetoceros subtilis var. abnormis f. simplex e Chaetoceros throndsenii var. throndsenia) e Navicula, assim como às espécies Cylindrotheca closterium, Cyclotella meneghiniana, 94 Leptocylindrus minimus e Skeletonema costatum 5.3 RESULTADOS senso lato8. Estas espécies constituíram a maior parte da comunidade nos meses de Agosto, Dezembro, Abril e Junho. Durante os restantes meses, a composição fitoplanctónica foi dominada por células do grupo dos criptófitos (Fig. 5.4a), na sua maioria pelas espécies: Rhodomonas salina, Teleaulax acuta e Plagioselmis sp. atingindo o maior número de células em Novembro (0,42 × 106 células L-1). A composição taxonómica do local S4 foi semelhante à encontrada em S1 com excepção para os meses de Setembro, Outubro e Abril, onde o género Pyramimonas contribuiu consideravelmente para a comunidade fitoplanctónica de S4. Durante o período em estudo, os clorófitos representaram em média apenas 4% do total de células de S4, atingindo a sua abundância máxima em Fevereiro (19%) (Fig. 5.4b, Tabela 5.2). As espécies flageladas pertencentes ao grupo dos prasinófitos e dos euglenófitos obtiveram o seu maior número de células neste local (Fig. 5.4b). Tabela 5.2: Percentagem de abundâncias de cada grupo de microalgas estimada por microscopia nos dois locais de amostragem (S1e S4) de Julho de 2006 a Junho de 2007. % Jul Ago Set Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Diatomáceas Dinoflagelados Clorófitos Criptófitos S1 S4 S1 S4 S1 S4 S1 S4 35,5 46,6 41,3 24,4 10,4 39,4 32,3 41,4 32,6 51,2 39,3 53,2 35,4 19,6 23,0 24,1 27,9 10,0 20,1 8,0 28,9 0,9 0,0 1,8 0,0 0,0 0,0 0,0 0,4 0,0 0,2 0,2 0,0 0,3 0,0 4,0 0,0 5,4 0,0 0,3 0,0 0,0 19,1 2,0 3,1 7,4 31,1 3,6 8,5 18,3 16,1 4,2 1,6 1,7 0,0 0,5 0,3 1,8 18,9 10,0 1,2 0,0 0,0 44,1 43,9 46,2 53,1 51,4 35,2 56,5 33,1 39,6 43,3 55,3 42,8 61,8 48,2 48,8 60,7 44,1 79,1 70,2 87,9 68,6 Crisófitos Euglenófitos Prasinófitos Flagelados não identificados S1 S4 S1 S4 S1 S4 S1 S4 0,0 3,0 0,0 0,0 0,0 9,1 2,4 1,2 0,0 0,2 1,0 0,0 0,3 4,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 1,1 0,0 0,4 0,5 5,8 0,8 0,8 1,2 0,0 2,0 11,7 0,9 1,0 0,7 2,2 2,0 2,5 0,0 1,8 1,0 0,9 1,1 2,5 0,0 4,0 1,8 0,5 1,2 0,0 0,0 3,2 0,0 0,0 1,4 1,7 0,0 15,1 21,1 13,4 1,8 0,0 7,3 1,7 0,0 0,0 0,0 0,0 13,8 5,2 11,5 0,4 0,4 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 10,6 0,3 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 5.3.3.2 Fotopigmentos (clorofilas e carotenóides) A Figura 5.5 apresenta a razão entre os fotopigmentos existentes e o total de Chl a durante o período em estudo. Para algumas das razões a presença de um padrão sazonal foi clara, nomeadamente para Chl c1 + c2:Chl a, Lut:Chl a e Zea:Chl a (Fig. 5.5). Em ambos os locais e durante todo o período em estudo, a razão Fuc:Chl a foi a que obteve os valores mais elevados. No local S1, e no final do Outono e Inverno, o aumento da razão Lut:Chl a e Zea:Chl a realça uma possível maior contribuição para a biomassa total das classes fitoplantónicas que contêm os 8 - Recentes estudos revelaram que a diatomácea cosmopolita Skeletonema costatum (s. l.) é composta por várias espécies morfológica e geneticamente distintas (Zingone et al. 2005, Kooistra et al. 2008). Os últimos autores estudaram a diversidade biogeográfica das espécies de Skeletonema e concluíram que estirpes de Skeletonema originárias de Lisboa pertencem na realidade ao taxon S. marinoi. 95 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS pigmentos luteina e zeaxantina, i.e, clorófitos e cianobactérias, respectivamente. Pela observação da Figura 5.5, pode ver-se que os clorófitos e as cianobactérias contribuiram mais para o total da biomassa em S1 e que os criptófitos contribuiram mais para a biomassa total em S4. Figura 5.5: Variação sazonal da razão entre a concentração dos diversos fotopigmentos existentes (Chl b, Chl c1 + c2, Alo, Fuc, Diad, Per, Vio, Neo, Lut, Diat, Zea e Pra) e a Chl a para o local S1 (z) e S4 ({) desde Julho de 2006 a Junho de 2007. A distribuição taxionómica dos diversos grupos de fitoplâncton foi distribuída consoante o teor de pigmentos fundamentais (>10% do total). A diatoxantina é um pigmento vestigial em todos os grupos que a possuem (<1% do total). A relação existente entre a análise microscópica e a concentração de fotopigmentos obtida por HPLC para caracterização de comunidade fitoplanctónica, foi verificada utilizando análises de regressão (Fig. 5.6). Foi encontrada uma correlação entre o índice de biomassa fitoplanctónica (Chl a) e o número total de células contabilizado por microscopia (Fig. 5.6a). De igual modo, foi verificada uma relação linear entre o total de células identificadas para uma dada classe e o seu pigmento distintivo (Fig. 5.6b, 5.6c, 5.6d). O carotenóide mais frequente e abundante, a fucoxantina, evidenciou uma correlação com a abundância em diatomáceas (Fig. 5.6b). 96 5.3 RESULTADOS Analogamente, as concentrações de aloxantina e de luteina demonstraram uma correlação com a abundância dos criptófitos e clorófitos, respectivamente (Fig. 5.6c, 5.6d). Uma correlação significativa foi encontrada entre a soma da concentração de Alo + Per + Pra + Zea + Chl b e o número total de células contabilizado excluíndo as pertencentes à classe das diatomáceas (Fig. 5.6e). Por último, os fitoflagelados (criptófotos + dinoflagelados + prasinófitos) revelaram uma relação linear com a soma da concentração de Alo, Per e Pra (Fig. 5.6f). Figura 5.6: Relação linear entre o total de células contabilizado por microscopia (× 106 L-1) e a -1 concentração de Chl a obtida por HPLC (µg L ) (a), entre a concentração de Fuc, Alo e Lut e o número de células identificadas como diatomáceas, criptófitos e clorófitos, respectivamente (b, c e d), entre o total de células excepto as diatomáceas e a soma da concentração de Alo, Per, Pra, Zea e Chl b (e) e entre o total de células identificadas como fitoflagelados e a soma da concentração de Alo, Per, Pra (f). 97 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS 5.3.4 Produção primária fitoplanctónica 5.3.4.1 Luz integrada na coluna de água, curvas P-E e taxa de produção primária B -1 -1 Figura 5.7: Distribuições da luz e da taxa de produção primária (P , mg C (mg Chl a) h ) integradas na coluna de água e ao longo do fotoperíodo (coluna da esquerda e direita, respectivamente) e curvas P-E obtidas nos dois locais de amostragem (S1 e S4), durante as amostragens realizadas no Verão (coluna do meio). 98 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS As distribuições de luz e da taxa de produção primária (PB) integradas no fotoperíodo e ao longo da coluna de água, assim como as curvas P-E resultantes em cada dia e local de amostragem encontram-se representadas nas B Figuras 5.7-5.10. A taxa fotossintética normalizada para a biomassa (P ) mais elevada foi observada no período do Verão (em 21 Julho de 2006 no local S1), com o valor de 8,4 mg C (mg Chl a)-1 h-1 (Fig. 5.7). A fotoinibição foi verificada em todas as 21 curvas P-E realizadas (Fig. 5.7-Fig.5.10, coluna central). A percentagem de fotoinibição no total das curvas P-E foi em média 32%, sendo os valores maiores observados no Inverno (>52%). Figura 5.8: Distribuições da luz e da taxa de produção primária (PB, mg C (mg Chl a)-1 h-1) integradas na coluna de água e ao longo do fotoperíodo (coluna da esquerda e direita, respectivamente) e curvas P-E obtidas nos dois locais de amostragem (S1 e S4), durante as amostragens realizadas no Outono (coluna do meio). 99 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS Figura 5.9: Distribuições da luz e da taxa de produção primária (PB, mg C (mg Chl a)-1 h-1) integradas na coluna de água e ao longo do fotoperíodo (coluna da esquerda e direita, respectivamente) e curvas P-E obtidas nos dois locais de amostragem (S1 e S4), durante as amostragens realizadas no Inverno e início da Primavera (coluna do meio). 100 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS Figura 5.10: Distribuições da luz e da taxa de produção primária (PB, mg C (mg Chl a)-1 h-1) integradas na coluna de água e ao longo do fotoperíodo (coluna da esquerda e direita, respectivamente) e curvas P-E obtidas nos dois locais de amostragem (S1 e S4), durante as amostragens realizadas na Primavera (coluna do meio). 101 5.4 DISCUSSAO A conjugação dos valores do modelo da atenuação da luz na coluna de água com os parâmetros fotossintéticos obtidos nas curvas P-E, possibilitou modelar a taxa de produção primária em profundidade e ao longo do fotoperíodo para todo o período amostrado. Observou-se que as taxas de produção primária mais elevadas foram obtidas abaixo da superfície (>0,5 m). A meio do fotoperíodo foi estimada pelo modelo uma diminuição da taxa de produção primária (fotoinibição) na camada superficial da coluna de água (<0,5 m), sendo esta mais evidente no local S4 (Fig.5.7-5.10). 5.3.4.2 Parâmetros fotossintéticos Foi encontrado um padrão sazonal claro na variação dos parâmetros fotossintéticos PBmax, αB, Ek e βB (Fig. 5.11). Figura 5.11: Variação sazonal dos parâmetros fotossintéticos resultantes das curvas P-E para os locais S1 (barras pretas) e S4 (barras brancas); (a) taxa máxima de fotossíntese normalizada pela B biomassa (PBmax), (b) declive inicial da curva P-E (α ), (c) intensidade de luz saturante (Ek) e (d) o parâmetro que caracteriza a fotoinibição (βB). Os valores de PBmáx e αB mais elevados foram observados no Verão e na Primavera. Com excepção dos meses de Setembro e Abril, os valores de PBmáx e de αB foram muito semelhantes entre si em ambos os locais (Fig. 5.11a, Fig. 5.11b, Tabela 5.3). Analisando conjuntamente os dois locais, a média obtida para o PBmáx foi de 4,3 mg C (mg Chl a)-1 h-1), variando entre 1,0-8,4 mg C (mg Chl a)-1 h-1 (Dezembro e Julho, respectivamente) (Fig. 5.11a, Tabela 5.3). A eficiência 102 5.4 DISCUSSÃO (αB) fotossintética mais elevada foi observada em Maio com 0,088 mg C (mg Chl a)-1 h-1 (µmol fotões m-2 s-1)-1 (Fig. 5.11b), sendo a sua média muito semelhante em ambos os locais (Tabela 5.3). Tabela 5.3: Parâmetros fotossintéticos (média ± DesPad) obtidos nos dois locais de amostragem (S1 e S4) durante o período em estudo (Jul 06-Jun 07). * α B * β ** P B *** B max Ek S1 S4 0,048 ± 0,021 0,051 ± 0,020 0,637 ± 0,224 0,592 ± 0,148 4,3 ± 2,5 4,4 ± 1,9 84 ± 27 86 ± 18 * -1 -1 -2 -Unidades em mg C (mg Chl a) h µmol fotões m s -1 -1 -Unidades em mg C (mg Chl a) h *** -2 -1 -Unidades em µmol fotões m s -1 ** Os valores de Ek variaram entre 50 e 140 µmol fotões m-2 s-1, em Dezembro e Julho, respectivamente (Fig. 5.11c). O valor de βB foi semelhante em ambos os locais e variou sazonalmente, apresentando os valores mais elevados durante o Inverno e os mais baixos durante o Verão e Outono (Fig. 5.11d, Tabela 5.3). Os parâmetros PBmáx e αB revelaram estar fortemente correlacionados (Tabela 5.4). Uma correlação significativa foi encontrada entre a temperatura e o Ek (r=0,92; p<0,0001; n=21) (Fig. 5.12a, Tabela 5.4). Tabela 5.4: Coeficientes de correlação obtidos entre os diversos parâmetros fotossintéticos (αB, βB, B P max e Ek) e os parâmetros ambientais (Tw no momento da colheira e Ed do dia da amostragem) (n=21; ns=não significativo; *p<0,05; **p<0,01 e ***p<0,001). Os dois locais foram analisados conjuntamente. B β B 1 - B - - α β B α B P P B max Ek Tw Ed - - - - - - - - 0,862*** -0,743** 1 - - - Ek ns -0,961*** 0,734** 1 - - Tw 0,512* -0,943*** 0,831*** 0,924*** 1 - Ed 0,566* -0,529* 0,724** 0,568* 0,624* 1 max A relação existente entre PBmax e a temperatura foi explicada através de uma função exponencial (R2=0,83, p<0,0001, n=21) (Fig. 5.12b). Grande parte da variabilidade encontrada nos parâmetros Pmax e α pode ser atribuida às flutuações observadas na 103 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS biomassa fitoplanctónica, dada a elevada correlação existente entre a Chl a e ambos os parâmetros (Pmax e α) (r =0,95 e r =0,96, respectivamente para p<0,001). Figura 5.12: (a) Relação linear registada entre a temperatura da água e a intensidade de luz saturante (Ek) e (b) regressão exponencial da temperatura da água vs taxa máxima de fotossíntese normalizada pela biomassa (PBmáx). A razão Em:Ek revelou ser superior ao valor 1, com excepção dos meses de Outubro (S4) e Abril (em ambos os locais) (Fig. 5.13). Figura 5.13: Razão entre a irradiância média diária (Em) e a intensidade de luz saturante (Ek) durante o período em estudo em S1 (barras pretas) e S4 (barras brancas). A linha a picotado (Em:Ek=1) corresponde ao limite superior da existência de limitação pela luz. 5.3.4.3 Taxa de produção primária Seguindo o esquema da Figura 3.5, foi estimada a taxa de produção primária diária integrada na coluna de água para cada dia do período em estudo (Jul-06 a Jun-07) (Fig. 5.7-5.10, coluna da direita). A presença de fotoinibição, estimada pelo modelo, foi menos acentuada na Primavera (19%) (Fig. 5.9, Fig. 5.10) do que no Inverno (75% e 53% em S1 e S4, respectivamente) (Fig. 5.9). A Figura 5.14 apresenta a 104 5.4 DISCUSSÃO estimativa da possível variação em profundidade (superfície, meio e fundo) da taxa de produção primária diária no dia 21 de Junho de 2007 nos dois locais de amostragem. Frequentemente, a taxa de produção primária diária foi muito reduzida ou mesmo nula à profundidade de 3,25 m (Fig. 5.7-5.10, Fig. 5.14). Neste modelo, a existência de fotoinibição, a meio do fotoperíodo, é clara na camada superficial da coluna de água (0,25 m), acompanhada por uma diminuição acentuada da produtividade primária (Fig. 5.10, Fig. 5.14). Figura 5.14: Estimativa da variação em profundidade da taxa de produção primária diária (fotoperíodo). (a) dia 21/06/2007-S1 à superfície (0,25 m), a meio da coluna de água (1,75 m) e perto do fundo (3,25 m) e (b) dia 21/06/2007-S4 à superfície (0,25 m), a meio da coluna de água (2,75 m) e a 3,25 m. A média da produção primária diária e a integração da taxa de produção primária mensal na zona eufótica da coluna de água e durante o fotoperíodo revelou uma variabilidade sazonal evidente, com as taxas mais elevadas observadas durante o período do Verão, em ambos os locais (Fig. 5.15). O dia mais produtivo de todo o período em estudo foi o dia 5 de Julho de 2006 no local S1 com o valor estimado de produção primária de 778 mg C m-2 d-1. A taxa anual da produção primária foi estimada em 92 g C m-2 ano-1 e 77 g C m-2 ano-1 para os locais S1 e S4, respectivamente. Deste modo, a taxa de produção primária média anual para a área em estudo foi estimada em 85 g C m-2 ano-1. 105 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS Figura 5.15: Variação sazonal da média da produção primária diária em cada dia de amostragem -2 -1 (mg C m h ) (a), e da produção primária mensal integrada na zona eufótica da coluna de água e durante o fotoperíodo estimada através da soma das taxas de produção primária diárias para todo o -2 -1 ano em estudo (g C m mês ) (b), para os locais S1 e S4. 5.4 Discussão A biomassa e as taxas de produção primária fitoplanctónica do estuário do Tejo revelaram uma importante variabilidade temporal. Verificou-se que os dois parâmetros estavam correlacionados entre si e ambos revelaram ser controlados pela luz e temperatura. Os seus valores foram reduzidos durante a maior parte do ano, atingindo valores máximos na Primavera e Verão. Igualmente induzido pelo aumento da luz e temperatura, a ocorrência de um único acréscimo anual de Chl a no fim da Primavera-Verão tem sido referido para o estuário do Tejo (Capítulo 4). Porém, temperaturas elevadas atípicas são vulgares em Portugal, ocasionando picos adicionais de Chl a, nomeadamente o ocorrido no Outono de 1995 (Cabrita 1997), no Inverno de 2005 (Capítulo 4), e na Primavera de 2007 (presente Capítulo). As concentrações de nutrientes dissolvidos foram elevadas durante todo o período de amostragem, em particular as concentrações de DIN e silicatos nos meses de Inverno. Neste período, estes nutrientes foram transportados pelas águas fluviais para o interior do estuário, fenómeno previamente descrito para o estuário do Tejo (Gameiro et al. 2004, Capítulo 4). De acordo com os critérios de Redfield et al. (1963) e Fisher et al. (1988), as concentrações de nutrientes excederam largamente as concentrações consideradas como limitantes para a produção primária. O aumento de diatomáceas em ambos os locais de amostragem foi provavelmente a causa da redução na concentração de silicatos observada em Agosto, contudo, a limitação de silicatos nunca foi detectada. A comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo, analisada por microscopia, revelou ser constituída principalmente por células de pequenas dimensões 106 5.4 DISCUSSÃO (<10 µm) pretencentes ao grupo dos criptófitos, sendo as diatomáceas o segundo grupo mais abundante (em células) apenas ultrapassado pelos clorófitos quando o fluxo de água doce no estuário foi elevado. De facto, os clorófitos atingiram 31% do total de células fitoplanctónicas em S1, durante o período em que o caudal do rio Tejo foi mais elevado (Novembro). A caracterização da comunidade fitoplantónica resultante da análise microscópica (Julho de 2006 a Junho de 2007) esteve directamente relacionada com aquela que foi obtida recorrendo ao uso do HPLC-ChemTax (Capítulo 4) e ao HPLC-concentração dos fotopigmentos existentes (presente estudo). O facto de os criptófitos dominarem a comunidade, em termos de número de células, não significa que representem uma maior biomassa, dadas as suas pequenas dimensões celulares. No entanto, foi encontrada uma relação entre o número de células desta classe e a concentração do seu pigmento característico, corroborando o uso da aloxantina como marcador inequívoco dos criptófitos. De igual forma, a utilização da concentração de fucoxantina e de luteina como marcadores das diatomáceas e dos clorófitos, respectivamente, provou-se ser sensata. Como verificado por Silva at al. (2008a), as correlações obtidas entre a concentração do pigmento biomarcador e o total de células da classe taxionómica correspondente constituíram um resultado relevante para futuros estudos de monitorização da comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo. A necessidade requerida nestes estudos, de analisar uma grande quantidade de amostras num curto período de tempo, faz da análise da concentração de fotopigmentos, uma base de partida para o estudo da composição e sucessão da comunidade fitoplanctónica. Foram observadas diferenças na biomassa e na produção primária do fitoplâncton entre S1 e S4, os valores mais elevados registados em S1 estiveram provavelmente associados à concentração mais elevada de nutrientes dissolvidos aí encontrados. Esta relação tem sido encontrada em vários outros estuários (Malone et al. 1988, Conley & Malone 1992, Mallin et al. 1993, Selmer & Rydberg 1993). Como em muitos sistemas estuarinos túrbidos, a disponibilidade de luz na coluna de água teve um papel essencial na taxa de produção primária do estuário do Tejo. A intensidade luminosa disponível para a produção primária num sistema aquático depende da luz incidente à superfície da água, da extinção da luz na coluna de água e da sua profundidade. Embora a luz incidente à superfície da água varie sazonalmente, a atenuação da luz na coluna de água não apresentou qualquer sazonalidade. A precipitação e o caudal de água doce foram os factores físicos considerados potencialmente importantes para o aumento da atenuação da luz na coluna de água, através do transporte de partículas e matéria dissolvida a 107 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS jusante. Como tal, e como também descrito para o estuário do rio Schelde (Kromkamp & Peene 1995), a penetração de luz foi significativamente menor na zona mesohalina (S1) do que o resto da zona polihalina (S4). Através das curvas P-E foi possível verificar que ambos os locais de amostragem revelaram respostas fotossintéticas idênticas. Tal similitude poderá ser atribuída à semelhança na composição taxonómica dos dois locais, uma vez que a constituição da comunidade fitoplanctónica e o volume celular têm um papel importante na regulação dos parâmetros fotossintéticos (Côte & Platt 1983). Sendo muitas espécies pertencentes ao grupo dos criptófitos conhecidos por fotossintetizarem em condições de baixas intensidades luminosas (Hammer et al. 2002), poderá ficar justificada a elevada presença deste grupo num estuário como o do Tejo. Todos os parâmetros fotossintéticos variaram sazonalmente. O parâmetro usado para caracterizar a fotoinibição (βB) apresentou valores mais elevados no Inverno. Durante este período, as células fitoplanctónicas estão aclimatizadas a intensidades luminosas reduzidas, consequentemente, quando são expostas a uma luz mais elevada em laboratório, resulta numa maior percentagem de fotoinibição. O intervalo de variação -1 de PBmáx obtido para o estuário do Tejo -1 (1,0-8,4 mg C (mg Chl a) h ) foi semelhante ao encontrado em outros estuários (Tabela 5.5). Os valores de αB foram próximos do limite superior do intervalo de variação, o que revela que a comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo evidenciou uma eficiência fotossintética elevada quando comparada com a de outros estuários (Tabela 5.5). No que diz respeito a estes dois últimos parâmetros, o mesmo resultado foi anteriormente encontrado no trabalho de produção primária realizado numa baía interior na margem Sul (Seixal) do estuário do Tejo (Cabeçadas 1999) (Tabela 5.5). O valor de luz saturante Ek, um índice útil para investigar o estado de fotoaclimatação (Talling 1957), foi consistentemente reduzido (50-140 µmol fotões m-2 s-1) ao longo do período de estudo, quando comparado com valores obtidos noutros trabalhos (Tabela 5.5). Regressões lineares múltiplas significativas foram observadas entre os parâmetros fotossintéticos, Pmáx e α e ambos com a Chl a. No total, 89% da variação sazonal do Pmáx e 90% da variação do α foi explicada por este índice de biomassa. A temperatura teve uma pequena contribuição para a variabilidade do Pmáx. Em concordância com o encontrado em diversos sistemas estuarinos (Côté & Platt 1983, Keller 1988), a dependência do PBmáx com a temperatura era esperada devido às enzimas envolvidas nas reacções fotossintéticas serem controladas pela temperatura. Taxas de produtividade por unidade de Chl a elevadas são geralmente encontradas em células de pequenas dimensões quando 108 5.4 DISCUSSÃO comparadas com células maiores (Geider et al. 1986, Raven 1998). O valor elevado de α poderá ser resultante da presença de espécies pequenas de criptófitos, clorófitos e diatomáceas (<10 µm) que consistentemente dominaram a comunidade de fitoplâncton do estuário do Tejo durante o período de estudo. Table 5.5: Intervalo de variação dos parâmetros fotossintéticos característicos de alguns estuários e zonas costeiras da Europa e dos Estados Unidos da América (USA): B [P máx, (mg C (mg Chl a)-1 h-1)], -2 [αB, [mg C (mg Chl a)-1 h-1 µmol fotões m-2 s-1]] e -1 [Ek, (µmol fotões m s )]. B Pmax αB Ek Baía de Marennes-Oléron 5,1-13,5 0,011-0,066 182-773 Estuário Scheld 0,5-18,8 0,002-0,080 - Mar Waddden 0,8-9,9 0,007-0,039 67-538 Tillmann et al. 2000 Estuário do Tejo 2,4-4,0 0,100-0,200 14-60 Cabeçadas 1999 1,0-8,4 0,018-0,089 50-140 Este estudo Baía da California 0,5-11,3 0,004-0,028 102-917 Aguirre-Hernández et al. 2004 Estuário de Delaware 1,0-22,7 0,020-0,064 61-218 Pennock & Sharp 1986 Golfo do México 3,0-22,1 0,008-0,045 125-1268 Estuário do rio Neuse 0,1-33,9 0,001-0,012 <393 Referências EUROPA Struski & Bacher 2006 Kromkamp & Peene 1995 USA Lohrenz et al. 1994 Boyer et al. 1993 A correlação positiva existente entre Ek e a irradiância média diária indica uma aclimatação do sistema fotossintético à intensidade de luz existente. Os resultados obtidos parecem evidenciar que a variação sazonal no comportamento fisiológico da comunidade fitoplanctónica representa meramente uma mudança de espécies presentes. Esta conclusão é devida à existência de uma sucessão na composição taxionómica da comunidade para o período estudado. Assim, é possível que a variação sazonal das características fotossínteticas do fitoplâncton seja atribuída essencialmente à alteração na composição das espécies, i.e, devida a uma aclimatação fenótipica. No conjunto, os reduzidos valores de PBmáx e de Ek e o valor elevado de αB, sugerem que a fotoaclimatação a baixas intensidades luminosas e a elevada eficiência fotossintética fitoplanctónica do são estuário (8.4 mg C (mg Chl a)-1 h-1) -1 foi características do um Tejo. terço O específicas valor do mais valor da elevado limite comunidade de superior PBmáx teórico -1 (25 mg C (mg Chl a) h ) estabelecido por Falkowski (1981) e relativamente mais baixo que os valores máximos encontrados para outros sistemas estuarinos (Tabela 5.5). De acordo com Sakshaug et al. (1997), viver em ambientes marinhos 109 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS com pouca disponibilidade de luz, como acontece na coluna de água do estuário do Tejo, estimula um aumento da eficiência fotossintética do fitoplâncton enquanto o máximo da taxa fotossintética normalizada pela Chl a é reduzida. De igual modo, os baixos valores de Ek e a sua dependência da irradiância superficial corroboram o facto de que a comunidade de fitoplâncton estava bem aclimatizada às condições de luminosidade reduzida, sendo capaz de ajustar o valor de Ek de forma a manter o equilíbrio entre as reacções da fase escura e clara da fotossíntese. A intensidade média da luz na zona eufótica (Em) foi frequentemente maior que a luz saturante (Ek), o que significa que a luz disponível na coluna de água foi suficiente para atingir PBmáx. Deste modo, é assim razoável concluir que o fitoplâncton do estuário do Tejo mostrou estar bem aclimatizado a um meio com pouca disponibilidade de luz. In situ, a fotoinibição apenas foi estimada para uma pequena fracção superficial da coluna de água e durante um período limitado do dia. A fotoinibição raramente é referida para comunidades fitoplanctónicas estuarinas podendo mesmo ser considerada um artefacto do método usado para o estudo da produção primária em águas túrbidas (Grobbelaar 1985). É possível que o grau de fotoinibição seja amplificado pela extensão do período de incubação, o que não é o caso do presente estudo, uma vez que o tempo de incubação nunca excedeu as duas horas. No presente trabalho, a existência da fotoinibição foi definida para valores de intensidade luminosa superiores a Ek e quando a produção primária diminuiu para taxas inferiores a 90% do valor do PBmáx (comunicação pessoal, Dr. T. Platt). Apesar da coluna de água do estuário do Tejo ser misturada, e consequentemente as células fitoplanctónicas não permanecerem imóveis à superfície, é sensato admitir no modelo a constante presença de células à superfície (<0,5 m) durante o período de tempo suficiente para haver fotoinibição. A taxa anual de produção primária do estuário do Tejo (85 g C m-2 ano-1, média dos dois locais) correspondeu a um valor típico de um estuário túrbido, colocando este sistema dentro da categoria dos estuários com baixa a moderada produtividade fitoplanctónica (Tabela 5.6). Importante para a produtividade fitoplanctónica global do estuário do Tejo é, sem dúvida, a elevada turbidez, actuando como um importante factor limitante. No entanto, taxas anuais de produção primária mais elevadas poderão ser obtidas, uma vez que a ocorrência de grande variabilidade interanual dos factores que regulam a produção (tempo de residência da água no estuário, luz, temperatura, herbivoria, entre outros) tem sido descrita para o estuário do Tejo (Capítulo 4). A média da percentagem de fotoinibição diária foi estimada em 8%, oscilando entre 0 a 17% para o total do período de estudo. Se a fotoinibição fosse eliminada do modelo utilizado para 110 5.4 DISCUSSÃO estimar a produtividade anual do estuário do Tejo, esta seria estimada em 92 g C m-2 ano-1. A pequena diminuição na taxa de produção primária anual causada pela fotoinibição demonstra que a irradiância à qual o fitoplâncton do estuário do Tejo fotoinibe raramente foi alcançada na coluna de água, dando assim mais força à hipótese da aclimatação da comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo. Table 5.6: Estimativas médias da produção primária fitoplanctónica anual (g C m-2 ano-1) para alguns estuários e baías da Europa e USA. Produção anual -2 Referências -1 (g C m ano ) EUROPA Baía de Arcachon Canal de Bristol 103 Glé et al. (2008) 7-165 Joint & Pomroy (1981) Mar de Büsum Wadden 152 Tillmann et al. (2000) Estuário Colne 8.9 Kocum et al. (2002) Baía de Marennes-Oléron 185 Struski & Bacher (2006) Estuário Marsdiep 150-385 Cadée & Hegeman (1993) Estuário Schelde 100-300 Kromkamp & Peene (1995) Estuário do Tejo 26 Cabeçadas (1999) 85 Este estudo USA Baía Chesapeake Estuário Delaware 347-662 307 Harding et al. (2002) Pennock & Sharp (1986) Estuário Hudson 70-220 Cole et al. (1992) Baía Narragansett 160-619 Oviatt et al. (2002) Estuário Neuse 395-493 Boyer at al. (1993) Baía de San Francisco 95-150 Cole & Cloern (1984) Delta de São Joaquim 70 Jassby et al. (2002) Estudos anteriores estimaram a produção primária média anual do microfitobentos do estuário do Tejo em 113 g C m-2 ano-1 resultando numa produção de 11.000 toneladas de carbono por ano (Brotas & Catarino 1995). Posteriormente, Brotas (2002) chegou a uma estimativa inferior de 7.200 t ano-1, valor mais próximo do resultado de 4.265 t ano-1 obtido por Serôdio & Catarino (2000). Considerando que 220 km2 da área total do estuário está permanentemente submersa e que 100 km2 de espraiados de maré se encontram emersos (sem produção fitoplantónica) durante metade do tempo, podemos estimar a produção primária média anual do fitoplâncton entre 18.700 t ano-1 e 27.200 t ano-1. Estudos futuros contemplando a variabilidade interanual da produção primária e dos parâmetros fotossintéticos são essenciais para obter uma imagem completa da produção primária fitoplanctónica do estuário do Tejo. 111 5. PRODUÇÃO PRIMÁRIA FITOPLANCTÓNICA E PARÂMETROS FOTOSSINTÉTICOS Este Capítulo apresentou valores de produtividade primária, assim como caracterizou os parâmetros fotossintéticos da comunidade de fitoplâncton do estuário do Tejo. A caracterização global da qualidade da água do estuário do Tejo, feita através do estudo dos padrões na concentração em nutrientes, biomassa e composição fitoplanctónica do estuário do Tejo é apresentada no Capítulo 6. 112 Capítulo 6. Padrões gerais: nutrientes, biomassa, composição e sucessão fitoplanctónica Este capítulo apresenta-se numa forma similar em: “Patterns of phytoplankton variability in theTagus estuary, Portugal” Gameiro, C. & Brotas V. Aceite na revista Estuaries and Coasts 6.1 RESUMO 6.1 Resumo Este capítulo analisa dados colhidos mensalmente no estuário do Tejo por diversos autores e em condições de amostragem e métodos similares, cobrindo um período temporal de 27 anos. Foi efectuada uma compilação de todos os estudos disponíveis de monitorização da dinâmica da comunidade fitoplanctónica realizados na zona média do estuário do Tejo. Padrões gerais e factores principais da variabilidade da concentração de nutrientes, biomassa e composição da comunidade fitoplanctónica para os períodos de 1980, 1994-95 e 1999-2007 são apresentados. Anos muito húmidos e outros excessivamente secos foram registados. Os compostos azotados inorgânicos dissolvidos (DIN) assim como os silicatos revelaram um padrão sazonal claro, com o valor máximo registado durante o período Inverno-Primavera, evidenciando a sua origem fluvial. Ainda que o tratamento das águas residuais da zona envolvente ao estuário tenha começado em 1990, não foram detectadas diferenças significativas em termos de DIN e P entre 1980 e 2007. O presente trabalho revela que o caudal do rio se encontrava fortemente ligado à abundância fitoplanctónica, pois concentrações elevadas de biomassa fitoplanctónica foram obtidas em anos muito secos. Para os anos analisados, a mediana anual da concentração da Chl a variou entre 1,8-7,6 µg L-1 correspondendo a 3,5 µg L-1 como grande mediana. O padrão sazonal encontrado para a biomassa, com os valores máximos registados no período Primavera-Verão, é semelhante ao descrito para outros estuários temperados com forte influência do ciclo de marés. Apesar das diferenças interanuais existentes, na concentração de Chl a ou na ocorrência de picos, foi possível identificar um padrão constante na sazonalidade da biomassa fitoplanctónica. Para todo o período analisado, o tempo médio necessário para obter metade da biomassa cumulativa fitoplanctónica anual foi de 163 dias (correspondendo ao dia 12 de Junho), variando entre 129-206 dias (9 Maio-26 Julho). Não foram encontradas diferenças relevantes na estrutura da comunidade fitoplanctónica, as diatomáceas foram sempre a classe dominante, sendo os criptófitos consideravelmente abundantes durante o período de Outono-Inverno. Desde 1969, as espécies dominantes do estuário do Tejo permaneceram essencialmente as mesmas. A forte influência das marés na coluna de água estuarina parece diminuir o risco de eutrofização do estuário do Tejo. A ausência de grandes alterações, quer ao nível de nutrientes, quer ao nível da abundância e composição do fitoplâncton, comprovadas pelos resultados, é uma conclusão nova e relevante, o que nunca antes tinha sido relatado para este ecossistema. Em estuários fortemente modificados, a estabilidade destes 115 6. PADRÕES GERAIS parâmetros é, sem dúvida, uma contribuição singular para o estudo da variabilidade natural versus consequências antrópicas. Palavras chave: Séries temporais longas; Variabilidade sazonal; Nutrientes dissolvidos; Fitoplâncton. 6.2 Introdução A qualidade da água das zonas costeiras tem sido um assunto de interesse global crescente. O aumento da actividade humana produz mudanças ambientais ainda por conhecer na sua totalidade (Smith et al. 1999, Cloern 2001, Rabalais & Nixon 2002). A caracterização da comunidade de fitoplâncton é um dos elementos de qualidade requeridos pela DQA para a avaliação do estado ecológico das zonas costeiras e estuarinas. A monitorização das alterações sofridas pelo fitoplâncton nestas zonas é um passo necessário para avaliar o estado destes ecossistemas. De facto, o fitoplâncton tem um papel fundamental na taxa de produção primária, na cadeia alimentar, no ciclo dos nutrientes, causando impacto directo na qualidade da água e respondendo rapidamente a alterações ambientais. Segundo a DQA, a avaliação do estado do fitoplâncton deverá ser baseada na biomassa, frequência e duração dos períodos de florescimento e composição e abundância da comunidade. Deste modo, a quantificação da biomassa fitoplanctónica através da quantificação da Chl a é um parâmetro indispensável para a avaliação da qualidade de um sistema costeiro. A relação directa entre a concentração de Chl a e de nutrientes dissolvidos na coluna de água tem sido descrita extensivamente para ecossistemas costeiros e estuarinos (Nixon 1995, Richardson & Jørgensen 1996; Cloern 2001, Nedwell et al. 2002, Nielsen et al. 2002, Smayda 2004). Contudo, nem todos os ecossistemas revelaram relações idênticas entre produção primária e nutrientes. Em muitos estuários, a elevada taxa de descarga de nutrientes conduz a um aumento claro na produção primária fitoplanctónica e consequentemente à eutrofização do sistema (Richardson & Heilmann 1995). Outros estuários apresentam uma relação distinta entre estes dois parâmetros, sendo implícita uma interacção de factores complexa. Monbet (1992) concluiu que os estuários com uma amplitude de maré >2 m evidenciam grande tolerância ao enriquecimento em nutrientes. Outros factores físicos, como a disponibilidade de luz na coluna de água, poderão ser muito importantes na limitação da produção primária, particularmente em estuários túrbidos como acontece no estuário Ems-Dolard (Colijn 1984), na Baía de São Francisco (Cloern 1987) e no estuário do Tejo (Capítulo 5), controlando assim naturalmente o risco de eutrofização. 116 6.2 INTRODUÇÃO Simultaneamente, a dinâmica dos nutrientes, assim como outras pressões químicas e físicas que afectam a diversidade do fitoplâncton não são ainda completamente conhecidas dado que as interligações que se estabelecem não são compreendidas na sua totalidade. Séries temporais com, pelo menos, uma década de colheita de dados e com uma taxa de amostragem sazonal poderão fornecer uma base útil para a identificação e conhecimento da variabilidade natural, padrões e possíveis alterações sofridas pelo fitoplâncton em sistemas costeiros e estuarinos. Um passo essencial para a compreensão, investigação e interpretação da dinâmica do fitoplâncton nos ecossistemas costeiros marinhos a nível Europeu foi a implementação de um quadro de acção no domínio da política da água (DQA, 2000/60/CE), em 23 de Outubro de 2000. Dos múltiplos projectos que surgiram para o desenvolver, ressalta-se aqui o projecto REBECCA (SSPI-CT-2003-502158) 9 onde dados do estuário do Tejo conjuntamente com os de outros países (Bélgica, Estónia, Dinamarca, Finlândia, França, Holanda, Irlanda, Itália, Noruega, Portugal, Roménia, Suécia e Reino Unido) foram analisados. A realização da conferência AGU-Chapman (American Geophysical Union), na Croácia, em Outubro de 2007 10, teve o propósito de localizar, avaliar e compilar séries temporais longas de variabilidade fitoplanctónica reunidas a partir das mais variadas partes do globo. A dinâmica e a composição do fitoplâncton do estuário do Tejo foram integradas na conferência AGU-Chapman sob forma de uma série temporal longa não contínua (27 anos), com o auxílio de todos os estudos de fitoplâncton disponíveis já realizados neste estuário. Este Capítulo apresenta dados de vários autores ao longo de um período de 27 anos (1980, 1994-95 e 1999-2007) de concentração em nutrientes, biomassa e composição fitoplanctónica para a zona média do estuário. A análise conjunta de todos os estudos envolvendo parâmetros físico-químicos e fitoplanctónicos do estuário do Tejo nunca tinha sido realizada anteriormente. Os objectivos deste estudo foram descrever e interpretar padrões de concentração em nutrientes, biomassa e composição fitoplanctónica, assim como identificar e discutir os factores preponderantes da variabilidade e alteração da comunidade do fitoplâncton. Importante será referir que neste capítulo, a apresentação dos resultados e a discussão dos mesmos foi criteriosamente pensada de modo a poderem ser 9 - “REBECCA: Relationships between ecological and chemical status of surface waters” implementação da Directiva Quadro da Água (Water Framework Directive–WFD). www.environment.fi/syke/rebecca 10 - American Geophysical Union Chapman Conference (2007) Long-time series observations in coastal ecosystems: comparative analysis of phytoplankton dynamics on regional to global scales. Rovinj (Croatia), 8-12 Outubro. 117 6. PADRÕES GERAIS facilmente comparados com outros ecossistemas participantes na conferência AGU-Chapman. Os resultados obtidos são de grande importância local mas, com certeza, serão de grande relevância numa perspectiva de conhecimento global da dinâmica de estuários. 6.3 Séries temporais A série temporal longa não contínua (1980-2007) analisada neste estudo incluiu dados referentes aos seguintes períodos: 1) de Janeiro a Dezembro de 1980 (Moita 1982, Martins & Duffner 1982); 2) de Março de 1994 a Dezembro de 1995 (Cabrita 1997, Cabrita et al. 1999); 3) resultantes do estudo do Capítulo 4 desta tese que abrangem o período que vai desde 1999 a 2005 (Gameiro et al. 2004 e Capítulo 4); e 4) posteriormente colhidos desde Janeiro de 2006 até Novembro de 2007 (Capítulo 5 e presente estudo) (Fig. 6.1). Figura 6.1: Mapa de Portugal com ampliação da área do estuário do Tejo. A área sombreada representa zonas de espraiados de maré (cinza claro), sapais (cinza escuro) e os símbolos indicam a localização dos locais de amostragem; ● - os locais de Gameiro et al. (2004), Capítulos 4, 5 e presente estudo (1999-2007); - local S2 em Cabrita (1997) e Cabrita et al. (1999); ▲ - locais 2.0, 2.7 e 3.8 em Martins & Duffner (1982) e Moita (1982); ▼ - local I em Sousa e Silva et al. (1969). * - Locais em Brogueira et al. (2007). 118 6.3 SÉRIES TEMPORAIS De forma a manter a comparabilidade dos resultados deste Capítulo, foram apenas seleccionados locais situados na zona média do estuário, de entre os diversos locais de amostragem disponibilizados pelos estudos anteriores a esta tese, nomeadamente os locais 2.0, 2.7 e 3.8 durante 1980 e local S2 em 1994-1995 (Fig. 6.1). Os estudos realizados por Sousa e Silva et al. (1969) e Brogueira et al. (2007) nos locais I e 4-10, 18 e 19, respectivamente, foram apenas considerados para a avaliação da composição taxionómica. Segundo Braunschweig et al. (2003), todos os locais de amostragem utilizados estão localizados na mesma massa de água, classificada segundo as suas características físicas e biológicas. 6.3.1 Amostragem, metodologia de campo e de laboratório Houve o cuidado de verificar se a colheita e os métodos utilizados pelos diversos estudos tinham sido análogos (Tabela 6.1). A colheita de água foi realizada mensalmente, sempre a ±1 m abaixo da superfície da coluna de água, em todos os locais e períodos analisados. As amostras de água foram sempre colhidas durante a maré-cheia das marés mortas, de forma a atenuar a influência do ciclo quinzenal de marés. Os dados de caudal do rio Tejo foram obtidos através do INAG para todos os períodos em estudo. A composição da comunidade fitoplanctónica, em termos de classes taxionómicas, foi determinada através da determinação da análise de pigmentos fotossintéticos realizada por cromatografia líquida de alta pressão (HPLC), para o período de 2002-2007. Tendo em conta todo o conhecimento prévio sobre a composição da comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo, analisada através da técnica de HPLC (Capítulo 4), a fucoxantina (Fuc) foi usada como índice de abundância em diatomáceas. A soma da concentração de Aloxantina (Alo), peridinina (Per), prasinoxantina (Pra), zeaxantina (Zea) e clorofila b (Chl b) foi utilizada como indicador de todas as restantes classes de fitoplâncton identificadas para o estuário do Tejo. A razão Fuc:(Alo + Per + Pra) foi considerada como a razão diatomáceas:fitoflagelados. 119 6. PADRÕES GERAIS Tabela 6.1: Período de amostragem, profundidade dos locais de amostragem, caudal do rio, parâmetros analisados, métodos analíticos e referências usadas para cada período das séries temporais. Período Jun 67-Mai 68 Locais (prof., m) Caudal* (min-max) (m3 s-1) I (4 m) - Jan 80-Dez 80 2.0 (11 m) 2.7 (7 m) 3.8 (6 m) 22-632 (n=366) Jan 95-Dez 95 Parâmetros Composição Preservação em formol taxionómica (Utermöhl 1958) Grasshoff (1976), Strickland and DIN (NO3- + NO2- + NH4+) Parsons (1972), Tinsley (1950) DIP Rodier (1976) APHA, AWWA and APCF Si (1971) Fluorometria Chl a (Strickland and Parsons 1972) DIP Grasshoff (1976), Bendschneider and Robison (1952), Koroleff (1969/70) Murphy and Riley (1962) Si Fanning and Pilson (1973) DIN (NO3- + NO2- + NH4+) 11-1472 (n=273) S2 (3.0 m) Jul 06-Jun 07 Cabrita (1997) DIN (NO3- + NO2- + NH4+) Grasshoff (1976), Bendschneider and Robison (1952), Koroleff (1969/70) DIP Murphy and Riley (1962) Si Fanning and Pilson (1973) Chl a Espectrofotometria (Lorenzen 1967) 66-160 (n=31), 43-213 (n=31), 64-323 (n=30) Composição taxionómica Preservação em lugol (Utermöhl 1958) Brogueira et al. (2007) 3-2016 (n=1302) Fotopigmentos HLPC Gameiro et al. (2007) 2-5197 (n=546) Composição taxionómica 0-5686 (n=2339) 1 (3.0 m) 2 (2.5 m) 3 (3.5 m) 4 (5.5 m) 1 (3.0 m) 4 (5.5 m) Jan 06-Nov 07 1 (3.0 m) 2 (2.5 m) 3 (3.5 m) 4 (5.5 m) 2-5197 (n=693) * - ver também a Fig. 6.2. Cabrita (1997) Cabrita et al. (1999) Gameiro et al. (2004) Gameiro et al. (2007) Preservação em lugol (Utermöhl 1958) Grasshoff (1976), Bendschneider DIN and Robison (1952), Koroleff (NO3- + NO2- + NH4+) (1969/70) DIP Murphy and Riley (1962) Si Fanning and Pilson (1973) Espectrofotometria Chl a (Lorenzen 1967) Fotopigmentos 120 Moita (1982) Preservação em lugol (Utermöhl 1958) 3-1032 (n=397) 1 (3.0 m) 2 (2.5 m) 3 (3.5 m) 4 (5.5 m) Jan 02-Nov 05 Martins and Duffner (1982) Composição taxionómica 1 (3.0 m) 2 (2.5 m) 3 (3.5 m) 4 (5.5 m) 5-10, 18,19 Sousa e Silva et al. (1969) Composição taxionómica Mar 99-Nov 05 Jul 01, Mai 02, Jun 03 Referências Espectrofotometria (Strickland and Parsons 1972) Preservação em lugol (Utermöhl 1958) Chl a Mar 99-Mar 00 Métodos HPLC presente trabalho presente trabalho 6.4 RESULTADOS 6.4 6.4.1 Resultados Parâmetros hidrológicos e de qualidade da água A série temporal longa do caudal do rio Tejo revela e existência de uma forte variabilidade interanual, abrangendo a totalidade de cenários hidrológicos (Fig. 6.2). Figura 6.2: Série longa do caudal diário do rio Tejo (m3 s-1) (1980-2007) e média mensal da concentração em Chl a para a região superior do estuário do Tejo desde: Janeiro a Dezembro de 1980 (Moita 1982), Junho de 1994 a Dezembro de 1995 (Cabrita 1997), Fevereiro de 1999 a Novembro de 2005 (Gameiro et al. 2004 e Capítulo 4) e de Janeiro de 2006 a Novembro de 2007 (Capítulo 5 e presente estudo). Anos de seca extrema, assim como anos de grandes cheias foram observados durante o período 1980-2007. A média de Inverno do caudal do rio Tejo variou entre um mínimo de 63 m-3 s-1 em 2005 e um máximo de 2217 m-3 s-1 em 2001. Similarmente, foram detectadas grandes flutuações sazonais no caudal do rio, sendo cada ano caracterizado por uma estação pluviosa (Dec-Mar) e uma estação seca (Jul-Set). A biomassa fitoplanctónica foi relativamente mais elevada durante 1980 e 1995 (11,4 µg L-1 e 8,3 µg L-1 de média anual, respectivamente) do que a verificada no período posterior (1999-2007), apresentando um máximo na Primavera e outro no início do Outono (Fig. 6.2). Desde 1999, a concentração de biomassa fitoplanctónica foi persistentemente mais baixa (2,6-6,2 µg L-1, intervalo da média anual). Para esse período, verificou-se regularmente um máximo de Chl a no final da Primavera ou no Verão (Fig. 6.2). Excepcionalmente, foram observados picos de Chl a durante o Outono (Outubro) de 1995 e no Inverno (Fevereiro) de 2005 (Fig. 6.2). Em 2004 e 2007, o florescimento da Primavera foi observado mais cedo. A grande mediana da temperatura da água foi de 19°C para a zona em análise, não sendo relevantes os desvios anuais deste valor (Fig. 6.3a). Para todos os anos em 121 6. PADRÕES GERAIS estudo, a temperatura da água manteve constante o seu intervalo de variação anual. A salinidade mostrou uma grande variabilidade em redor da sua grande mediana (22,5) (Fig. 6.3b). O maior desvio foi verificado em 1995, onde salinidades elevadas foram observadas durante a maior parte do ano. Figura 6.3: Gráficos box-whiskers que representam a variação da temperatura da água (°C) (a) e da salinidade (b) para os períodos em análise. Nos gráficos box-whiskers, cada caixa contém os valores desde do percentil 25-75, onde no seu interior, a linha horizontal representa o valor mediano, a linha mais grossa representa a média, a barra de erro contém o percentil 5 e 95. Os valores extremos (outliers) estão representados por círculos. O desvio da mediana anual da concentração em Chl a em relação à grande mediana revelou flutuações anuais entre 1980 e 2007 (Fig. 6.4). Essa variação foi de ±2,0 µg L-1 ano-1 com um outlier de +5,4 µg L-1 ano-1 devido à elevada concentração de Chl a observada em 1980. No geral, a variabilidade interanual foi menor que 60% do valor da grande mediana (3,5 µg L-1 ano-1). Figura 6.4: Desvios dos valores das medianas anuais da Chl a, em relação à grande mediana (µg L-1 ano-1). O desvio do valor da mediana anual dos nutrientes inorgânicos dissolvidos na coluna de água da respectiva grande mediana está representado na Fig. 6.5a. Para o orto-fosfato inorgânico dissolvido (DIP), as diferenças anuais foram ínfimas. Em 122 6.4 RESULTADOS semelhança ao observado para a concentração de Chl a, houve uma flutuação da concentração em compostos azotados (DIN) e silicatos dissolvidos ao longo da série temporal. A variação observada foi de 37% e 57% em volta da grande mediana, para o DIN e silicatos, respectivamente. A excepção ocorreu em 2007, onde foi alcançado o máximo afastamento da grande mediana em ambos os nutrientes (+26 µM ano-1 e +53 µM ano-1, respectivamente) (Fig. 6.5a). A variação anual do desvio da mediana da razão Si:N relativamente à sua grande mediana revelou ter sofrido desde 2002 um aumento positivo constante (Fig. 6.5b). Note-se que o valor da grande mediana para a razão Si:N foi idêntico ao valor da razão de Redfield (=1). Figura 6.5: Desvios anuais da mediana da concentração dos nutrientes dissolvidos na coluna de água -1 (µM ano ) (a) e da razão Si:N da respectiva grande mediana (b). Os padrões sazonais da concentração dos nutrientes e da biomassa fitoplanctónica (Chl a) estão representados através do desvio da mediana mensal em relação às respectivas grandes medianas (Fig. 6.6). Os desvios das medianas mensais do DIP foram inferiores a 0.6 µM, com o máximo desvio positivo observado no Verão e início do Outono (Fig. 6.6a). Os desvios da mediana mensal dos silicatos e DIN e revelaram um padrão paralelo, com valores negativos durante o final da Primavera e Verão, atingindo valores mínimos em Julho (-14 µM e -27 µM, respectivamente) (Fig. 6.6b e Fig. 6.6c). Em oposição, o desvio das medianas mensais da concentração em Chl a apresentou um padrão exactamente inverso ao verificado para o DIN e silicatos, com os maiores desvios positivos alcançados em Julho (Fig. 6.6d). Em conformidade, correlações negativas significativas foram 2 encontradas entre as concentrações de Chl a e DIN (r =0,14, p<0,0001, n=426) e entre a Chl a e os silicatos (r2 =0,15, p<0,0001, n=337). 123 6. PADRÕES GERAIS Figura 6.6: Desvios mensais da mediana da concentração dos nutrientes inorgânicos dissolvidos -1 na coluna de agua estudados; DIP (a), Si (b) e DIN (c) em µM e da Chl a (d) em µg L das respectivas grandes medianas assinaladas junto de cada gráfico. A relação negativa encontrada entre a biomassa fitoplanctónica e a concentração em compostos azotados foi salientada através da representação gráfica dos valores das médias anuais da concentração em Chl a em função das médias anuais em DIN (Fig. 6.7). Os valores do período de 1980 não se ajustaram ao modelo de regressão linear anterior. Envolvendo todos os valores da série temporal em análise (1980-2007), a concentração em DIN e em silicatos mostrou uma correlação positiva com o caudal do rio Tejo (r2 =0,15, p<0,0001, n=401 e r2 =0,10, p<0,0001, n=319, respectivamente). A Tabela 6.2 exibe dados resultantes da estatística descritiva feita aos diferentes parâmetros ambientais estudados, físico-químicos e biológicos, envolvendo o período de amostragem tratado no Capítulo 4 (1999-2005), em simultâneo com o período subsequente (2006-2007). 124 6.4 RESULTADOS Figura 6.7: Regressão linear obtida entre a média da concentração anual em Chl a (µg L-1) e a média da concentração anual de DIN (µM) para os períodos de 1994-95 e 1999-2007. As linhas a tracejado representam os intervalos de confiança da regressão (95%). Tabela 6.2: Estatística descritiva realizada aos valores obtidos nos diferentes parâmetros ambientais, físico-químicos e biológicos estudados; média da irradiância diária (Ed), temperatura do ar, caudal do rio, temperatura da água, salinidade, pH, coeficiente de extinção da luz (Kpar), matéria particulada em suspensão (SPM), profundidade da zona eufótica (zeuf), concentração dos nutrientes dissolvidos na coluna de água (DIN, PO4, SiO2), dos feopigmentos (Feo) e da Chl a dos quatro locais de amostragem para o período compreendido entre Março 1999 e Novembro de 2007. n Média Mediana 365 341,0 351,0 88,2-633,7 Temp. ar (ºC) 370 17,4 18,0 10,0-26,3 a Caudal rio (m3 s-1) 353 273,2 130,6 2,5-3340,1 b Precipitação (mm) 369 12,3 3,2 0,0-89,5 Temp. água ( C) 372 18,2 19,0 8,0-26,3 Salinidade 372 20,4 21,0 1,0-37,0 pH 324 8,0 8,0 6,7-9,0 -1 Kpar (m ) 304 1,7 1,4 0,2-8,0 SPM (mg L-1) 375 29,6 26,7 3,9-113,3 zeuf (m) 304 3,5 3,3 0,6-21,2 DIN (µM) 375 59,4 54,3 0,2-182,4 (µM) 329 4,6 3,8 0,1-19,1 SiO2 (µM) a Irradiância Min-Máx (µmol fotões m-2 s-1) a ° c PO43- d 294 59,6 47,2 3,7-258,4 -1 375 1,5 1,0 0,0-10,4 -1 375 4,3 3,1 0,2-32,3 Feo a (µg L ) Chl a (µg L ) a -resultante da utilização da média dos valores dos 8 dias antes da colheita, -resultante da utilização da soma dos valores dos 8 dias antes da colheita, c -desde Maio de 2000 a Novembro de 2007, d -desde Abril de 2001 a Novembro de 2007. b 125 6. PADRÕES GERAIS 6.4.2 Tempo de desenvolvimento, composição e sucessão do fitoplâncton A análise dos anos estudados em separado mostrou que o tempo necessário para obter metade da biomassa cumulativa fitoplanctónica anual (denominado centro de gravidade para o desenvolvimento do fitoplâncton) variou entre 129-206 dias (9 de Maio a 26 de Julho) (Fig. 6.8). Figura 6.8: Curva sigmóide estimada para a biomassa fitoplanctónica cumulativa (Chl a em %) em função do dia Juliano para cada ano em estudo (1 ano=365 dias). O centro de gravidade para o desenvolvimento para o fitoplâncton é obtido quando se atinge metade da biomassa cumulativa anual. O tempo médio do centro de gravidade para o desenvolvimento do fitoplâncton do estuário do Tejo foi de 163 dias, correspondendo ao dia 12 de Junho (Fig. 6.9a). 126 6.4 RESULTADOS Este dia é considerado como o centro de gravidade médio para o fitoplâncton do estuário do Tejo. O centro de gravidade iniciou-se mais cedo do que 12 de Junho nos anos: 1980 (22 dias), 1995 (5 dias), 2002 (14 dias), 2004 (7 dias) e em 2007 (34 dias) sendo a média de 18 dias. Começou mais tarde em 2000 (44 dias), 2003 (27 dias) e 2006 (23 dias) sendo a média de 31 dias. Finalmente começou muito próximo da média em 1999 (1 dia), 2001 (0 dias) e 2005 (2 dias) (Fig. 6.9b). Figura 6.9: Curva sigmóide estimada para a biomassa fitoplanctónica cumulativa (Chl a em %) em função do dia Juliano, utilizando todos os anos em estudo (a). O dia Juliano nº 163 (12 de Junho) é o centro médio de gravidade médio para o fitoplâncton. Desvio do período do desenvolvimento fitoplanctónico do centro de gravidade médio característico do estuário do Tejo (b). A Figura 6.10a representa a variação sazonal da razão diatomáceas:outros grupos de fitoplâncton, em relação ao valor da grande mediana (2,66). A predominância das diatomáceas sobre todos os outros grupos de fitoplâncton identificados no estuário do Tejo é clara durante todo o ano, sendo a Primavera e o Verão os períodos onde essa dominância é mais evidente (Fig. 6.10a). Figura 6.10: Desvio da variação sazonal da razão diatomáceas:outros grupos da sua grande mediana (2,66) (a), e o desvio da variação interanual da razão diatomáceas:fitoflagelados da sua grande mediana (4,02) (b). 127 6. PADRÕES GERAIS As diatomáceas Skeletonema costatum (s.l.)11, Cylindrotheca closterium, Detonula pumila e a pequenas espécies do género Thalassiosira (<10 µm) foram as espécies fitoplanctónicas mais comuns no estuário do Tejo durante o período compreendido entre 1967-2007 (Tabela 6.3). Os criptófitos foram consideravelmente abundantes durante as estações do Outono e Inverno, em particular as espécies Rhodomonas salina e Teleaulax acuta, contribuindo em grande parte para o decréscimo da razão diatomáceas:outros grupos encontrada de Setembro a Janeiro (Fig. 6.8a). Durante os meses de Inverno, o grupo dos clorófitos típicos de água doce foi frequentemente observado nos locais situados mais a montante, nomeadamente os géneros Ankistrodesmus, Monoraphidium, Pediastrum e Scenedesmus. Tabela 6.3: Grupos taxionómicos e espécies de fitoplâncton dominantes no estuário do Tejo. Período Jun 67-Mai 68 Primavera Local I Verão Mar-Out 95 S2 Grupos taxionómicos e espécies dominantes Diatomáceas (Cyclotella sp., Nitzchia closterium, Coscinodiscus inflatus, Melosira granulate, Skeletonema costatum s.l.); Pequenos flagelados. Diatomáceas (Gyrosigma fasciola, G. acuminatum, Mastogloia sp., Pleurosigma spp. Skeletonema costatum s.l.); Dinoflagelados (Gymnodinium sp., Gyrodinium sp.) Pequenos flagelados; Clorófitos filamentosos. Diatomáceas (Asterionella japonica, Skeletonema costatum s.l.); Clorófitos (Scenedesmus quadricauda); Dinoflagelados (Protoperidium brevipes); Euglena sp. Referências Sousa e Silva et al. (1969) Cabrita et al. (1999) Mar 99-Mar 00 1,2,3,4 Diatomáceas (Asterionellopsis glacialis, Cylindrotheca closterium, Detonula pumila, Navicula cryptocephala, Nitzchia sigma, Skeletonema costatum s.l., Thalassiosira minima); Criptófitos (Rhodomonas marina); Pequenos flagelados. Gameiro et al. (2004) Jul 01, Mai 02, Jun 03 4-10,18,19 Diatomáceas (Asterionellopsis glacialis, Cheatoceros socialis, C. subtilis, Cylindrotheca closterium, Detonula pumila, Melosira moniliformis, Skeletonema costatum s.l., Thalassionema nitzschioides); Criptófitos (Plagioselmis sp.). Brogueira et al. (2007) Jul 06-Jun 07 1,4 Diatomáceas (Chaetoceros subtilis var. abnormis f. simplex, C. throndsenii var. throndsenia), Cylindrotheca closterium, Ditylum brightwelii, Leptocylindrus minimus, Navicula sp., Skeletonema costatum s.l.); Criptófitos (Rhodomonas salina, Teleaulax acuta); Clorófitos (Ankistrodesmus falcatus, Monoraphidium contortum); Pequenos flagelados. Capítulo 5 O desvio da variação interanual em relação à grande mediana não revela a existência de um padrão na razão diatomáceas:fitoflagelados para o período estudado (2002-2007) (Fig. 6.10b). 11 Ver nota 8 do Capítulo 5. 128 6.5 DISCUSSÃO 6.5 Discussão A compilação dos dados obtidos nos diversos trabalhos já realizados no estuário do Tejo permitiu estudar padrões e mecanismos da dinâmica do fitoplâncton e dos nutrientes de um ecossistema costeiro temperado, mesotidal e pouco profundo (10 m em média). A observação de padrões sazonais e interanuais associados à ocorrência de anos extremamente pluviosos ou secos, típicos do clima português, fornecerá uma contribuição útil para a compreensão da dinâmica natural dos estuários do sul da Europa fortemente influenciados pela energia da maré. Nos últimos 27 anos, as concentrações dos nutrientes inorgânicos dissolvidos observadas na coluna de água do estuário do Tejo não sofreram grandes alterações sendo semelhantes às encontradas na Baía de São Francisco, considerada rica em nutrientes (Cloern 1996). A expectativa seria encontrar mudanças na concentração em compostos azotados e em fosfatos na coluna de água ao longo dos 27 anos analisados. Até à década de 1980, o estuário do Tejo recebeu efluentes agrícolas, industriais e urbanos minimamente tratados ou mesmo sem qualquer tratamento, sendo drenados directamente para o estuário (Wood 1986, Fiadeiro 1987). O tratamento de efluentes na área envolvente ao estuário do Tejo começou em 1990 e tem sido crescente o número de ETARs (estação de tratamento de águas residuais) construídas nas suas margens, contando actualmente com 20 unidades. Um aumento considerável na densidade população humana em redor do estuário do Tejo ocorreu durante os anos 70 e início dos anos 80, atingindo 2 milhões de habitantes. Nos últimos 25 anos, a densidade populacional aumentou menos de 13% (310 771 habitantes) (http://www.ine.pt). No entanto, as concentrações de DIN e DIP não sofreram grandes alterações ao longo dos 27 anos em estudo. Esta estabilidade poderá ser atribuída a duas razões: a maior parte dos nutrientes presentes no estuário são de origem fluvial, isto é, 65% são devidos à descarga de N e 46% à descarga de P (Ferreira et al. 2003) e o sistema de tratamento terciário (aquele que removeria os compostos azotados e fosfatados mais eficazmente do que o tratamento secundário) ainda não está a funcionar na maioria das ETARs existentes. Em 2003, 15% da descarga de azoto no estuário era originária de efluentes tratados, enquanto que 20% estava associada a efluentes não tratados (Ferreira et al. 2003). A nível sazonal, os compostos azotados e os silicatos seguiram o padrão sazonal do caudal do rio, correspondendo os valores mais baixos, ocorridos no final da Primavera e Verão, à menor entrada de água doce no estuário. Corroborando o mencionado anteriormente (Capítulo 4), o caudal do rio Tejo é um factor 129 6. PADRÕES GERAIS fundamental para a dinâmica dos nutrientes no sistema (principalmente no que respeita a N e Si). A variabilidade sazonal da concentração de N e P no estuário do Tejo foi semelhante à observada em Roskilde Fjord (Dinamarca), na Baía de Brest (França), na Baía de Delaware (USA) e na Baía de Chesapeake (USA), onde N diminuía grandemente durante o Verão e P diminuía na Primavera (Conley 2000). O factor comum a estes estuários é que todos eles sofrem um acentuado padrão sazonal de estrada de água doce no sistema. Os compostos azotados dissolvidos na coluna de água estão sempre presentes em maiores quantidades durante o Inverno e Primavera. Perdas de N ocorrem, sobretudo, devido à absorção pelo fitoplâncton e pelo microfitobentos ou devido a desnitrificação. Cabrita & Brotas (2000) estimaram a remoção de N através da desnitrificação nos sedimentos dos espraiados do estuário do Tejo em 3-9%, com um valor máximo de 35% observado no Inverno, concluindo que a absorção de N pelo microfitobentos foi comparativamente mais importante. A absorção de N pelo fitoplâncton foi responsável pela remoção de 27% do DIN da coluna de água (Cabrita 1997), podendo a diminuição de N estar associada aos períodos de crescimento do fitoplâncton. Frequentemente, os sedimentos estuarinos são locais de acumulação de P (Caraco et al. 1990). As concentrações mais elevadas de P observadas no Verão estão associadas à ligação directa existente entre a temperatura e a libertação de P a partir dos sedimentos (Nixon et al. 1980), o que poderá explicar a variabilidade sazonal de P no estuário do Tejo. Repetindo a análise de regressão aplicada no Capítulo 4 aos dados deste estudo, 49% da variabilidade sazonal da biomassa fitoplanctónica entre 1999 e 2007 puderam ser atribuídas a factores ambientais como a temperatura do ar, irradiância e caudal do rio. Os stocks de nutrientes inorgânicos dissolvidos na coluna de água nunca atingiram níveis tão baixos que pudessem restringir o crescimento do fitoplâncton, contudo a grande mediana da biomassa foi apenas de 3,5 µg L-1 (com um valor médio de 5,3 µg L-1) para todo o período em análise. A biomassa fitoplanctónica relativamente baixa observada e a ocorrência de um único aumento anual de Chl a no final da Primavera-Verão são características específicas do fitoplâncton do estuário do Tejo. Em concordância com van Spaendonk (1993), a ocorrência de um único pico de Chl a no Verão é vulgarmente observada em estuários túrbidos, severamente limitados pela luz. Para a área em estudo, a concentração média de SPM foi de 30 mg L-1 e o coeficiente de extinção da luz foi de 1,7 m-1, sustentando a hipótese de que a restrição de luz foi um factor regulador do crescimento da comunidade fitoplanctónica. 130 6.5 DISCUSSÃO As concentrações de Chl a em 1980 e 1995 foram mais elevadas do que as registadas no período 1999-2007. Em ambos os anos (1980 e 1995), os caudais do rio reduzidos observados durante a Primavera-Verão levaram consequentemente a tempos de residência elevados e à estabilidade da coluna de água, aumentando as condições de equilíbrio para o desenvolvimento do fitoplâncton. Condições idênticas de caudais de rio e de concentrações em DIN reduzidos foram observadas em 1999 e 2005, onde se verificaram as maiores concentrações de Chl a da série temporal 1999-2005 (Fig. 6.7). Na Primavera-Verão, o caudal do rio reduzido e os longos tempos de residência da água no estuário possibilitam a permanência e assim, o crescimento das células fitoplanctónicas. Usando a relação entre o caudal do rio e o tempo de residência de Martins et al. (1984), o tempo de residência médio para o período de 1980-2007 foi estimado em 33 e 65 dias no Inverno e na Primavera, respectivamente. O tempo de residência da água no estuário nos períodos de Verão em que a Chl a atingiu os seus máximos anuais (média dos 3 dias antes da colheita) foi de 73 dias, correspondendo possivelmente às condições de equilíbrio da coluna de água adequadas ao desenvolvimento do fitoplâncton. Outros sistemas estuarinos apresentam padrões de desenvolvimento fitoplanctónico idênticos aos verificados no estuário do Tejo, tais como a área superior da Baía de São Francisco, os estuários de Neuse, Westerscheld e Oosterscheld (Cloern 2007). Monbet (1992) foca o papel fundamental do regime de marés no controlo da quantidade de biomassa fitoplanctónica obtida em função da entrada de nutrientes na área estuarina. Este último autor verificou que os estuários em que a amplitude média de maré é >2 m sofrem frequentemente períodos de instabilidade caracterizados por um aumento da taxa de mistura da coluna de água e elevados níveis matéria particulada em suspensão, gerando uma diminuição da concentração da Chl a, mesmo quando os nutrientes estão presentes em concentrações não limitantes. De igual modo, a restrição de luz como consequência de uma coluna de água túrbida poderá ser essencial para explicar os reduzidos valores de biomassa fitoplanctónica encontrados nestes ecossistemas (Wofsy 1983). Monbet (1992) concluiu que os ecossistemas estuarinos em que a amplitude média de maré é >2 m, geralmente exibem uma elevada tolerância à poluição causada por compostos azotados, sendo isto possivelmente o que acontece no estuário do Tejo. A fracção Norte da Baía de São Francisco (Cloern 1996) nos Estados Unidos, os estuários de Westerschelde (van Spaendonk et al. 1993, Kromkamp & Peene 1995), Colne (Kocum et al. 2002) e Gironde (Irigoien & Castel 1997) entre outros estuários Europeus, vulgarmente excedem os níveis limite dos nutrientes 131 6. PADRÕES GERAIS inorgânicos dissolvidos, e apesar disso, a reduzida disponibilidade de luz na coluna de água resulta numa baixa concentração em Chl a. No estuário do Tejo, o volume médio da maré é aproximadamente 50% do volume total de água estuarina (Drena 1979), permitindo diariamente uma forte renovação da coluna de água, ao mesmo tempo que as correntes causadas pelas marés promovem a suspensão dos sedimentos e a elevada turbidez da coluna de água. Sendo um estuário mesotidal (±2,4 m), exibe uma resposta, em termos de Chl a, semelhante à encontrada em muitos sistemas estuarinos ricos em nutrientes (Borum 1996). Através da quantificação dos pigmentos fotossintéticos (por HPLC), a predominância das diatomáceas sobre todos os outros grupos de fitoplâncton identificados para o estuário do Tejo foi uma observação constante para o período compreendido entre 2002 e 2007. Em termos de biomassa, todos os estudos precedentes realizados no estuário do Tejo mostraram o predomínio das diatomáceas sobre os outros grupos (Sousa e Silva et al. 1969, Cabrita et al. 1999, Gameiro et al. 2004, Brogueira et al. 2007). É comum a variação de grupos funcionais ser associada a alterações nas razões de nutrientes, na medida em que algumas espécies de fitoplâncton ganham vantagem competitiva sob condições específicas (Officer & Ryther 1980, Egge & Aksnes 1992). Como já referido anteriormente, não houve uma alteração significativa nos níveis de DIN e DIP no estuário do Tejo ao longo dos últimos 27 anos, sustentando a estabilidade da estrutura da comunidade fitoplanctónica. No entanto, um aumento da razão Si:N foi observado nos últimos anos. Este aumento foi devido ao incremento de silicatos dissolvidos na coluna de água e não a uma redução da concentração em N, não sendo as suas causas conhecidas. Alterações na importação/exportação do Si associadas a actividades antrópicas, que poderiam explicar este aumento, não são conhecidas para o estuário do Tejo. Um aumento do conteúdo em nutrientes e/ou uma mudança nas suas razões poderá causar eutrofização e com isso alterar a estrutura da comunidade de fitoplâncton. Nesses casos, uma diminuição de biomassa relativa às diatomáceas simultaneamente com um aumento da biomassa pertencente aos fitoflagelados é frequentemente observada (Escaravage et al. 1999, Smayda 2004). No entanto, e sempre recorrendo à análise dos fotopigmentos (cuja adequação foi demonstrada no Capítulo 5), não foram registadas alterações na razão diatomáceas:fitoflagelados ao longo dos anos em estudo. No que diz respeito à variabilidade sazonal, detectou-se uma alteração na intensidade do domínio das diatomáceas na comunidade. Apesar das diatomáceas dominarem todo o ano, a sua predominância foi mais evidente durante a Primavera e Verão. A concentração 132 6.5 DISCUSSÃO de silicatos dissolvidos nunca atingiu níveis susceptíveis de poder vir a restringir o crescimento das diatomáceas, mesmo durante o período de maior predomínio. Espécies potencialmente (ex. Ceratium fusus, nocivas, de acordo com Pseudonitzschia cf. seriata, Moita & Vilarinho (1998) Scrippsiella trochoidea, Thalassiosira gravida) nunca foram encontradas em abundâncias consideradas alarmantes no estuário do Tejo (Cabrita 1997, Moita & Vilarinho 1998, Gameiro et al. 2004, Brogueira et al. 2007 e o presente estudo). Durante as últimas décadas, diversas mudanças têm sido detectadas em níveis mais elevados da cadeia trófica do estuário do Tejo, tais como a dramática diminuição da abundância da Faneca (Trisopterus luscus), do Lembique-de-cinco-barbilhos (Ciliata mustela), do Ruivo (Trigla lucerna), da Solha-das-pedras (Platichthys flesus) (Costa & Cabral 1999) e o desaparecimento da população de ostras (Crassostrea angulata) associado aos altos níveis de TBTs existente nos sedimentos nos finais dos anos 1970 (Bettencourt et al. 1999). Tais acontecimentos associados ao conhecimento da comunidade de zooplâncton (dados ainda não publicados, Valor Sul), poderão contribuir para uma explicação futura sobre as flutuações observadas na biomassa fitoplanctónica, nomeadamente em relação aos valores elevados observados em 1980. Através da análise dos nutrientes inorgânicos dissolvidos e da Chl a ao longo dos últimos 27 anos, não existem evidências de eutrofização no estuário do Tejo. Contudo, a não existência de informações disponíveis sobre o fitoplâncton nas condições originais (sem influência humana) ou mesmo sob condições anteriores aos anos 60, dificulta a obtenção de conclusões sobre a evolução da abundância e estrutura da comunidade do fitoplâncton ao longo do tempo. Num estudo palinológico, Amorim & Dale (2006) analisaram comunidades de quistos de dinoflagelados existentes numa amostra vertical de sedimento colhido na Baía de Lisboa, concluindo que a maior alteração ambiental ocorreu por volta do início do século XX. As pequenas mudanças na concentração de nutrientes e de Chl a ao longo dos 27 anos são, em grande parte, devidas às características hidrológicas intrínsecas do sistema. A alteração para os níveis actuais deverá ter ocorrido à mais de 100 anos, em concordância com os registos palinológicos. A ausência de alterações na variabilidade da concentração de nutrientes e na abundância de fitoplâncton ao longo do período analisado é uma conclusão nova e relevante. Em estuários tão alterados antropicamente, como o caso do estuário do Tejo, esta é, sem dúvida, uma contribuição relevante para a questão da variabilidade natural versus consequências antrópicas, considerada premente no âmbito actual do pensamento da comunidade científica. 133 Capítulo 7. Conclusões 7. CONCLUSÕES O presente trabalho permitiu compreender numa perspectiva dinâmica, aspectos sobre a comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo. Foi identificado o papel dos parâmetros ambientais, responsáveis pela regulação e controle da variabilidade do fitoplâncton e da produção primária, associado a esta comunidade. O conjunto de resultados obtido no âmbito deste estudo, contribuiu para o conhecimento da dinâmica do fitoplâncton e para a compreensão do funcionamento do estuário do Tejo, em particular, e dos sistemas estuarinos, em geral. O presente estudo, contribuiu igualmente, para a avaliação do papel do fitoplâncton como indicador de alterações climáticas, à escala global. A dinâmica do estuário do Tejo verificou-se ser sustentada fundamentalmente pela energia da maré e pelas flutuações da entrada de água doce no ecossistema. Esta conclusão veio corroborar o que já tinha sido observado anteriormente no âmbito de outros estudos realizados na coluna de água do estuário do Tejo, tais como Vale & Sundby (1987), Cabrita & Moita (1995), Cabrita (1997), Cabrita et al. (1999), entre outros. De facto, as flutuações, constantes e periódicas, no volume de água estuarina e a variação nas contribuições em água doce de origem fluvial e salgada oriunda do oceano, são responsáveis pela grande variabilidade existente em termos de luz disponível, salinidade e concentração de nutrientes dissolvidos na coluna de água. Gradientes longitudinais destes parâmetros ambientais têm sido observados desde a zona superior do estuário, correspondente à zona de entrada do rio Tejo, até à zona inferior, perto do farol do Bugio (Cabrita & Moita 1995, Cabrita 1997), sendo mesmo detectáveis numa escala espacial mais restrita, como a zona média estuarina onde se desenvolveu o presente trabalho. Na zona média do estuário, onde a coluna de água é pouco profunda e não estratificada. O coeficiente de extinção da luz (Kpar) variou espacialmente (entre 0,2 m-1 e 8,0 m-1). Concentrações medianas anuais relativamente elevadas de compostos azotados (DIN) e de silicatos dissolvidos na coluna de água, (54,3 µM e 47,2 µM, respectivamente) foram encontradas para a zona estudada, em grande parte como consequência da entrada de água doce transportada pelo rio Tejo, e sempre mais elevadas a montante do que a jusante. A influência das condições hidrológicas reflectiu-se, por sua vez, na composição da comunidade fitoplantónica. A comunidade fitoplanctónica do estuário do Tejo, em termos de biomassa, foi dominada por diatomáceas, incluindo ainda criptófitos, dinoflagelados, clorófitos, euglenófitos e prasinófitos. Esta estrutura da comunidade já tinha sido observada anteriormente (Sousa e Silva et al. 1969, Cabrita et al. 1999, Gameiro et al. 2004, Brogueira et al. 2007). No entanto, nos períodos de maior entrada de água doce, a contribuição de clorófitos em relação às outras classes de microalgas planctónicas 137 7. CONCLUSÕES aumentou, sem, no entanto, afectar a predominância de diatomáceas que se verificou ser um padrão característico desta comunidade estuarina. Em termos de biomassa, concentrações consistentemente mais elevadas foram sempre encontradas a montante do que nos outros locais localizados mais a jusante. Estes padrões espaciais são comuns em sistemas estuarinos, tendo sido observados em vários estuários da Europa e dos Estados Unidos da América (Malone et al. 1988, Conley & Malone 1992, Mallin et al. 1993, Selmer & Rydberg 1993). As variações temporais das condições hidrológicas foram determinantes para a dinâmica do fitoplâncton e da produtividade primária no estuário do Tejo. Durante um período de sete anos (Março de 1999 a Novembro de 2005), a biomassa fitoplanctónica, avaliada em termos de Chl a, verificou-se ser moderada a baixa, quando comparada com as concentrações determinadas noutros estuários mesotidais (Heip et al. 1995). Concretamente, os valores médios interanuais (1999-2007) da concentração em Chl a oscilaram entre 1,4 µg L-1 (n=66) durante os meses de Inverno e 7,4 µg L-1 (n=109) durante o Verão. No final da Primavera ou no Verão, ocorreu um aumento de biomassa único e anual, contribuindo para um padrão de variação sazonal consistente, em relação a este período de tempo. As diatomáceas constituíram a classe de microalgas planctónicas com maior contribuição para a formação dos picos de biomassa considerados como eventos de florescimento fitoplanctónico (Chl a > 10 µg L-1). A intensidade luminosa, a temperatura do ar e o caudal do rio foram os factores ambientais considerados fundamentais para a explicação da variabilidade sazonal e interanual da comunidade fitoplanctónica, durante o período de amostragem correspondente a sete anos (1999-2005). Quando se analisam os dados obtidos no âmbito desta tese, em conjunto com dados obtidos em estudos anteriores realizados no estuário do Tejo, no sentido de se identificarem padrões e tendências na variabilidade da biomassa e composição fitoplanctónica, numa escala mais alargada de tempo (27 anos), verificou-se um padrão idêntico ao verificado na série de 1999-2005. Isto é, uma concentração de biomassa fitoplanctónica (Chl a) persistentemente baixa (3,5 µg L-1 como mediana anual), apresentando anualmente um acréscimo regular de concentração máxima no final da Primavera ou Verão. Este comportamento é típico de muitos ecossistemas temperados que sofrem a influência da maré. Estes picos de biomassa fitoplanctónica ocorrem durante períodos de maior estabilidade da coluna de água, quando o caudal do rio é relativamente reduzido e a intensidade luminosa e temperatura são concomitantemente elevadas. Estes parâmetros já se tinham revelado como elementos chave das variações sazonal e interanual, no âmbito dos 138 7. CONCLUSÕES dados obtidos durante o programa de monitorização desenvolvido para o estuário do Tejo durante sete anos (1999-2005). Em termos de variação sazonal, foi calculado o dia correspondente ao centro de gravidade para o desenvolvimento do fitoplâncton do estuário do Tejo, determinado como o dia 12 de Junho, e que para uma série temporal de 27 anos sofreu desvios surpreendentemente pequenos (0-38 dias). Estes desvios relativamente diminutos mostram consistência e robustez neste conjunto de dados e, consequentemente, nos padrões de variabilidade da biomassa fitoplanctónica do estuário do Tejo. A ausência de variação relevante na estrutura e composição da comunidade fitoplanctónica poderá também ter contribuído para a manutenção deste padrão de variabilidade consistente, ao longo deste período de tempo alargado. Foi importante observar que, apesar de serem detectadas ocasionalmente espécies potencialmente nocivas, estas nunca ocorreram em abundâncias elevadas. Ao longo deste trabalho, a variabilidade sazonal e espacial da composição da comunidade fitoplanctónica foi avaliada recorrendo a três modos distintos: análise da concentração de fotopigmentos, aplicação do ChemTax como estimativas de biomassa e análise microscópica para identificação e quantificação do número de células presentes em cada classe taxionómica. Os três procedimentos revelaram-se complementares. Apesar da caracterização da comunidade fitoplanctónica resultante da análise microscópica se referir à contagem de células, os fotopigmentos acessórios principais mostraram estar relacionados com a abundância das classes que os contêm, nomeadamente no que diz respeito às diatomáceas, criptófitos, clorófitos e fitoflagelados. Estes resultados corroboraram a análise realizada no Capítulo 6, sendo deste modo possível a caracterização da comunidade de fitoplâncton do estuário do Tejo para um maior período de tempo (2002-2007). Foi possível concluir que o estuário do Tejo, à semelhança de outros estuários túrbidos, é um estuário pouco ou moderadamente produtivo em termos produção primária fitoplanctónica. De facto, a produção primária anual foi estimada em 85 g C m-2 ano-1 para a zona média do estuário do Tejo onde foi realizado este estudo. Podemos ainda estimar a produção primária média anual do fitoplâncton entre 18.700 t ano-1 e 27.200 t ano-1 para a área total do estuário do Tejo. In situ, a fotoinibição apenas foi estimada para uma pequena fracção superficial da coluna de água e durante um período limitado do dia, correspondente aproximadamente ao meio do fotoperíodo. No estuário do Tejo, a fotoinibição é responsável por uma diminuição da estimativa da produção primária anual de apenas 8%. Foi possível concluir que a variação sazonal da produção primária diária do fitoplâncton 139 7. CONCLUSÕES (1,0-8,4 mg C (mg Chl a)-1 h–1) foi controlada pela luz e temperatura, em simultâneo com a própria estrutura da comunidade fitoplanctónica, em que espécies de criptófitos, clorófitos e diatomáceas de reduzidas dimensões (<10 µm) tiveram um papel relevante. A informação obtida das curvas P-E mostrou que a variabilidade sazonal da taxa de produtividade máxima (PBmax) e da eficiência fotossintética (αB) estiveram, em grande parte, associadas a gradientes de luz e temperatura. A comunidade de fitoplâncton do estuário do Tejo pareceu estar fotoaclimatizada a baixas intensidades luminosas, o que é sugerido pelos valores relativamente baixos de PBmax e da intensidade de luz saturante (Ek) em simultâneo com valores elevados de αB. De facto, a limitação de luz causada pelos índices de turbidez elevados da coluna de água parece afectar a produtividade fitoplanctónica do estuário do Tejo de duas formas. Por um lado, regula a quantidade máxima de biomassa e, por outro, estimula a aclimatação fisiológica do fitoplâncton às baixas condições de luz. Resumindo, o estuário do Tejo é um ecossistema cuja coluna de água é dominada por uma comunidade fitoplanctónica que, embora não atingindo teores de biomassa elevados comparativamente a outros estuários mesotidais, é diversificada do ponto de vista específico. Observa-se a predominância, em termos de biomassa, de diatomáceas. Porém, outras classes de microalgas planctónicas também ocorrem, podendo mesmo em alguns períodos outras classes, como, por exemplo, os criptófitos de pequenas dimensões, terem um papel relevante para a estrutura da comunidade. Esta comunidade floresce principalmente entre a Primavera e o Verão, não atingindo valores considerados elevados para sistemas estuarinos. Factores como luz, temperatura e estabilidade da coluna de água estão na base das flutuações temporais do fitoplâncton. Esta comunidade encontra-se bem adaptada às condições de físico-químicas da coluna de água, o que afecta a produtividade primária do estuário do Tejo, que se verificou ser moderada a reduzida. Estes resultados e conclusões revelam que o estuário do Tejo é um sistema não eutrofizado. A realização desta tese de doutoramento permitiu compreender o que é relevante estudar num futuro próximo. Apresentam-se seguidamente algumas sugestões de trabalho futuro que se consideram pertinentes. Seria interessante determinar a variação da produção primária em termos de carbono, em escalas de tempo relevantes em relação aos ciclos de variação da maré, nomeadamente ciclo diário e quinzenal de maré. O tratamento de dados relativos a parâmetros e variáveis estuarinas passa tradicionalmente pelo uso de médias do conjunto de valores obtidos. Uma alternativa interessante, sugerida pelo Dr. J. Cloern, no âmbito Conferência AGU-Chapman, foi a utilização de medianas como medida de 140 7. CONCLUSÕES tendência central que permite a caracterização de uma determinada variável. O uso da mediana é assim uma medida mais representativa devido à assimetria típica encontrada na distribuição de parâmetros e variáveis estuarinas. Apesar da investigação sobre estuários ter aumentado grandemente durante as últimas décadas, a variabilidade intrínseca destes sistemas torna difíceis as generalizações e o desenvolvimento de paradigmas e modelos conceptuais. A contribuição contínua e actualizada em termos de monitorização dos parâmetros ambientais em estuários, é pois fundamental para a gestão e políticas de conservação e protecção destes sistemas. Antes que a utilização humana destas zonas privilegiadas conduza a desequilíbrios irreversíveis e na impossibilidade de regresso às condições prístinas destes sistemas, torna-se indispensável a compreensão contínua da influência de factores ambientais sobre variáveis fitoplanctónicas (níveis de biomassa e composição taxionómica) em estuários e relacionar este conhecimento com as alterações na descarga de nutrientes, à escala regional e com alterações climáticas, à escala global (Borkman et al. 2009). Este trabalho é singular pela utilização de uma série de amostragem temporal real (in situ), longa, sólida e constante, tornando credíveis as conclusões e possíveis as generalizações apresentadas para o estuário do Tejo. 141 Capítulo 8. Referências 8. REFERÊNCIAS A Aguirre-Hernández, E., Gaxiola-Castro, G., Nájera-Martínez, S., Baumgartner, T., Kahru, M., Mitchell, B.G. 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