Dez anos do Curso de Psicologia da Faculdade Dom Bosco, Ou Reflexões sobre uma década de vida, Ou Reflexões sobre os dez anos do Curso de Psicologia da Faculdade Dom Bosco Professora Andrea Silvana ROSSI O curso de psicologia da faculdade Dom Bosco fez mais um aniversário, marcando uma década de vida. Como professora do mesmo há nove anos gostaria de compartilhar algumas palavras, uma breve reflexão, quem sabe um testemunho dessa temporada. Ao olhar para trás, vejo transformações. Mudanças dinâmicas de sua proposta e funcionamento iniciais. O corpo docente foi sendo gradativamente modificado. Vivemos momentos de despedida e luto com a saída de alguns colegas. Consequentemente, festejamos a entrada de novos membros que, com as suas contribuições produziram alterações na organização do curso. Foram construídos dois novos projetos pedagógicos do curso. Ainda, se no decorrer dos dez anos mudaram muitas coisas, também percebo que algo de essencial se manteve. A passagem do tempo e o “novo grupo” não abalaram a possibilidade de trabalho em equipe e o respeito pela diferença. Diferentes formas de pensar, diferentes abordagens teóricas, diferentes experiências práticas permitiram construir a diversidade. As discussões em espaços mais ou menos formais, desde a sala dos professores a uma mesa redonda na semana do NEPSY, trouxeram como resultado uma “sopa” rica, densa, mas nunca homogênea. Uma mistura que ao ser olhada de longe possibilita a visão de um todo, mas quando nos aproximamos permite distinguir claramente os vários elementos que a compõe. Vale destacar que a diversidade muitas vezes produz tensão, nos retira da zona de conforto. Mas, diferente não é oposto ou contrario. Com o oposto se luta para que vença o mais forte, já o confronto com a diferença permite o crescimento, desenvolvimento, emergência de algo novo. O reconhecimento e respeito pela alteridade talvez sejam as maiores ou mais importantes lições que, nós professores, pudemos transmitir no decorrer destes anos. Para todos aqueles (professores e alunos) a quem isto foi possível, a aprendizagem e aquisição de conhecimentos veio como consequência, um plus do processo ensino-aprendizagem. Ensinar e aprender, aprender e ensinar. Duas fases distintas, um todo. Um não pode ser pensado sem o outro. A vida acadêmica é dinâmica, nos mantém em constante movimento. Reinventando o nosso ser a cada matéria, em cada aula e em cada encontro. A profissão diz respeito ao ser: sou psicóloga/o. Portanto, a escolha de um curso de graduação ou de uma profissão é uma escolha narcísica. Eleição que precisa ser renovada constantemente. O questionamento a respeito de que profissional sou, quero ser ou serei precisa encontrar respostas re-atualizadas a cada momento. No que cabe ao professor, anos de práticas de ensino não garantem um maior controle daquilo que será aprendido. Ensinar é um oficio que não permite “controlar o futuro” ou mesmo atingir um ideal ou objetivo fechado de aprendizagem. Não é possível saber a priori dos efeitos de um encontro entre seres humanos. Existe uma distância entre o que se ensina e o que se aprende, pois a apreensão do conhecimento depende do repertório anterior do aluno ou interlocutor da relação. Este desencontro ou melhor, este confronto com o não saber fez com que Freud (1930) chegasse a pensar o Ensino como uma das profissões impossíveis. Ainda, impossível não significa impraticável, o impossível abre espaço para o inusitado. Porque se quem ensina “não sabe”, isso pode despertar o desejo de saber. Provavelmente por isso muitos falem que ensinar é uma “arte”. É a arte de transmitir o desejo de saber. Portanto o valor não está apenas no conteúdo/ conhecimento, mas nas vias de acesso a ele. Até porque, sabe-se que não existem enunciados completamente desprovidos de ambigüidades, nem saberes puramente objetivos. Assim, o saber sai do lugar de fetiche e passa a ocupar o lugar de algo que busca ser alcançado, portanto inapreensível. Mais do que professores buscamos ser cientistas, pesquisadores. Lembro que existe uma diferença entre o professor e o pesquisador. Lacan (1969) aponta que o professor seria o representante do “sujeito suposto saber” e, por isso, jamais o questiona. Já o cientista, mantém uma abertura para o desconhecido. A realização de pesquisas, a postura de cientista, é um ato que o retira do lugar do “sujeito suposto saber” e possibilita a construção de algo novo. De um saber que detenha a marca singular do sujeito que o enuncia. Apropriar-se do saber implica em lhe acrescentar algo de si. De produzir um saber que surpreenda porque não se dá exclusivamente pela via da reprodução, da repetição, cópia ou colagem. No curso de psicologia da Faculdade Dom Bosco as produções de pesquisa vem sendo incentivadas desde os primeiros semestres da graduação. Contamos com as oficinas de produção de conhecimento que se extendem por oito semestres do curso e que tenho o privilégio de acompanhar desde o início como professora-orientadora. As oficinas caracterizam-se pela busca do aluno em articular a reflexão teórica aos dados empíricos coletados em diversos campos de estágio básico. A cada semestre são ofertados diversos temas que poderão ser pesquisados nas diferentes modalidades metodológicas. Nesta proposta de trabalho o aluno-pesquisador formula uma questão que o interroga e irá responder com o produto da sua pesquisa. Portanto, sai de uma posição passiva para se tornar ativo no processo de busca pela aquisição de um saber. É relevante destacar que as oficinas também permitem uma preparação para os estágios profissionalizantes. Para finalizar, penso que se como professores transmitimos o respeito à alteridade e o desejo de saber, também transmitimos uma postura ética. Não se trata de uma ética aristotélica fundada no controle racional e na normatização das ações, mas de uma ética do singular, que permite uma reflexão do agir no caso a caso. Nos últimos anos tive o privilégio de testemunhar muitos alunos da casa atravessados por esses princípios. Que bom! Podemos seguir em frente e continuar com este ofício impossível, mas tão instigante! Bibliografia: FREUD (1930) O mal estar na civilização. IN : FREUD, S. Obras Completas, R.J. : Imago, 1974. LACAN, J. O seminário. Livro 15: Ato psicanalítico (1967-1968). (Versão brasileira fora do comércio)