Prazo legal para realização da Assembleia Geral Ordinária após o término do exercício social Belo Horizonte, 24 de Abril de 2014 1. Introdução Atualmente, nos meios jurídico-empresariais, surge debates envolvendo a aplicação do artigo 132, da Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas - LSA), acerca de uma possível flexibilização e não obediência ao prazo legal de 4 (quatro) meses, contados do encerramento do exercício social, para a realização da Assembleia Geral Ordinária das Companhias. Por tal motivo, entendemos necessário uma discussão sobre a própria finalidade da realização da Assembleia Geral Ordinária no âmbito das Sociedades Anônimas, a fim de avaliarmos não apenas as consequências jurídicas do não cumprimento do prazo legal, mas também o impacto que tal descumprimento pode gerar frente a ética empresarial da Sociedade. 2. Assembleia Geral Ordinária: Conceito e Previsão Legal A Assembleia Geral Ordinária – AGO é de realização obrigatória nas Sociedades Anônimas, tem periodicidade certa e matérias próprias de sua exclusiva competência. As matérias de competência da AGO tratam-se de norma de ordem pública, portanto, é ilegal qualquer dispositivo do estatuto social que disponha em sentido contrário. O artigo 132 da LSA prevê: “Art. 132. Anualmente, nos 4 (quatro) primeiros meses seguintes ao término do exercício social, deverá haver 1 (uma) assembleia geral para: I. tomar as contas dos administradores, examinar, discutir e votar as demonstrações financeiras; II. deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição de dividendos; III. eleger os administradores e os membros do conselho fiscal, quando for o caso; IV. aprovar a correção da expressão monetária do capital social (artigo 167).” 3. Convocação da AGO A AGO precisa ser convocada para que seja devidamente instalada e possa deliberar regularmente. Assim, a convocação dos acionistas é obrigatória, a fim de que eles possam comparecer no dia e local designados no edital. A competência para convocação é, em regra, do Conselho de Administração e, na ausência desse órgão, dos Diretores. Retardando a convocação por mais de 30 (trinta) dias, o Conselho Fiscal será competente para convocar a Assembleia. Se o retardamento for superior a 60 (sessenta) dias, qualquer acionista poderá fazê-lo. Acionistas Fim do Exerc. Social 4 meses (Fim do prazo) 30dias 60dias Conselho Fiscal Prazo para:1 - Conselho de Administração 2 - Diretoria 4. Exercício Social O exercício social é o período de levantamento das contas e apuração do resultado da companhia. A anualidade do exercício social é princípio de ordem pública e, portanto, inderrogável. O encerramento do exercício social impõe à companhia a obrigação de elaborar, com base na escrituração mercantil, as demonstrações contábeis que compreendem: I. Balanço patrimonial (Artigos 178 e 185); II. Demonstração dos lucros ou prejuízos acumulados (Artigo 186); III. Demonstração do resultado do exercício (Artigo 187); IV. Demonstração dos fluxos de caixa e do valor adicionado (Artigo 188). Sociedade anônima – Convocação de assembleia geral ordinária – Inobservância do prazo legal – Admissibilidade – Reembolso das despesas com ato convocatório – Redução do valor de reembolso – Recursos providos em parte e improvido o agravo retido. Inobservado o prazo legal para convocação da assembleia geral ordinária, por mais de sessenta dias, qualquer acionista poderá convocá-la, nos termos do artigo 123 da Lei das Sociedades Anônimas. Nestes casos, o Tribunal já entendeu que as despesas devem ser suportadas pela própria sociedade empresária. (TJ/SP, Apelação nº 994.04.044312-0, de 28/10/2010) Modo de Convocação: 3 publicações, no mínimo: em órgão oficial da União ou do Estado e em outro jornal de grande circulação editado na localidade em que está situada a sua sede (art. 289); Sempre no mesmo jornal qualquer mudança será precedida de aviso aos acionistas no extrato da ata da AG. (§3º); Companhias Abertas: CVM poderá determinar que as publicações também sejam feitas em jornal de grande circulação nas localidades em que os valores mobiliários da companhia sejam negociados em Bolsa de Valores ou em mercado de balcão (art. 289, §1º). Modo de Convocação: • Companhia Fechada: 1ª convocação: 8 (oito) dias de antecedência, no mínimo, contado o prazo da publicação do primeiro anúncio. 2ª convocação: 5 (cinco) dias de antecedência. • Companhia Aberta: 1ª convocação: 15 (quinze) dias de antecedência; 2ª convocação: 8 (oito) dias de antecedência. 5. Prazo legal para a realização da AGO Tendo em vista que as companhias são obrigadas a elaborar as suas demonstrações financeiras ao fim de cada exercício social, a LSA estabeleceu a periodicidade anual da Assembleia Geral Ordinária que, nos termos do caput do art. 132, deve ser realizada nos 4 (quatro) primeiros meses seguintes ao término do exercício social. Logo, só pode ser realizada uma única AGO por ano. Ainda que a AGO seja realizada após o período de 4 (quatro) meses seguintes ao término do exercício social, ela continuará sendo uma AGO, pois a competência é estabelecida ratione materiae e não ratione temporis. 6. Arquivamento da AGO feito fora do prazo legal As Juntas Comerciais não podem recusar ao arquivamento da AGO realizada fora do prazo, pois a Lei das S.A. não estabelece nenhuma sanção para hipótese de ser esse prazo ultrapassado. Nesse sentido, vejamos a previsão da Instrução Normativa do Departamento Nacional de Registro do Comércio - DNRC nº 100/2006, no seu item 2.2.6: “2.2.6 - AGO REALIZADA FORA DO PRAZO DE 4 MESES É admissível o arquivamento da ata de assembleia geral ordinária realizada fora do prazo legal.” Ainda, explana o Parecer CVM/SJU nº 051/1978: “Quanto ao Registro de Comércio, é manifesto que este não pode recusar o arquivamento da AGO realizada fora do prazo legal. A lei não comina nenhuma sanção especial para a hipótese de ser aquele prazo ultrapassado. Segue-se, então, que o prazo tem por objetivo apenas, conforme já mencionado, precisar a data em que, após o seu decurso, começa a definir-se a responsabilidade civil dos administradores.” 7. JUCEMG Entendimento 056 - Assembleia Geral Ordinária: Realização extemporânea. É admissível o registro de assembleia ordinária realizada fora do prazo legal. A apreciação do retardamento da realização da AGO é matéria de exclusiva competência dos acionistas. Forma de arquivamento: AGO ou AGE? SOCIEDADE ANÔNIMA – Assembleia Geral Ordinária – Não convocação no prazo legal – Realização posteriormente como ordinária – Impossibilidade – Convocação que deveria ser a forma de extraordinária – Ata não arquivada pela Junta Comercial – Legalidade – Segurança cassada – Inteligência do art. 132 do Código Comercial – Declarações de votos vencedor e vencido. Se não se reunir regularmente a assembleia geral ordinária, nos quatro meses seguintes ao término do exercício social, aquela matéria somente poderá ser discutida e cotada por assembleia geral extraordinária. - TJ/SP, APELAÇÃO CÍVEL Nº 170.527-1, de 30.04.1992. “(...) a falta de realização das assembleias gerais ordinárias não acarreta consequências, salvo a responsabilidade dos administradores frente aos acionistas.” “(...) apresentar as contas em exercício posterior significa fazê-lo de forma extraordinária, mesmo porque, no mesmo exercício, outras contas deverão ser ordinariamente apresentadas.” Mas compreenda-se, se não se reunir regularmente a assembleia geral ordinária, nos quatro primeiros meses seguintes ao término do exercício social, aquela matéria somente poderá ser discutida e votada por assembleia geral extraordinária. (REQUIÃO, Rubens. Curso de direito Comercial. Ed. Saraiva., 1977, V II. Pg. 156.) “Nossa lei vigente estabelece o critério de competência, e não o temporal, para distinção entre assembleia ordinária e extraordinária. Dessa forma, mesmo convocada fora do prazo estatutário ou do quadrimestre, para deliberar sobre assuntos de sua competência, será sempre considerada assembleia geral ordinária. Portanto, a convocação dentro dos quatro meses seguintes ao encerramento do exercício não se refere à qualificação da assembleia nem à sua validade, mas apenas à responsabilidade dos administradores.” (Modesto Carvalhosa) “Ainda que a assembleia geral ordinária seja realizada após o período de 4 (quatro) meses seguintes ao término do exercício social, ela continuará sendo uma assembleia geral ordinária, pois a competência é estabelecida ‘ratione materiae’ e não ‘ratione temporis’.” (Nelson Eizirik) 8. JUCERJA Enunciado N° 14 - Sociedade Anônima – Realização de Assembleia Geral Ordinária fora do Prazo Legal Embora a lei determine a realização da Assembleia Geral Ordinária ("AGO") em até 4 (quatro) meses contados do encerramento do exercício social da Sociedade Anônima, é admissível o registro na Junta Comercial da ata de AGO realizada após o decurso do prazo legal. Parágrafo Único - A AGO realizada fora do prazo continuará sendo denominada "AGO", sem necessidade de considerá-la AGE. Se, entretanto, for designada AGE, poderá igualmente ser registrada. 9. JUCESP 11. SOCIEDADE POR AÇÕES – REALIZAÇÃO DE ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIA FORA DO PRAZO LEGAL Embora a lei determine a realização da assembleia geral ordinária (AGO) em até 4 (quatro) meses contados do encerramento do exercício social da sociedade por ações, é admissível o registro na Junta Comercial da ata de AGO realizada após o decurso do prazo legal. A AGO realizada fora do prazo continuará sendo denominada AGO, sem necessidade de considerá-la assembleia geral extraordinária (AGE). Se, entretanto, for designada AGE, poderá igualmente ser registrada. 10. Consequências do não cumprimento do prazo legal A única consequência que pode advir da extemporaneidade é a responsabilização dos administradores que retardaram a convocação da Assembleia pelos danos resultantes do atraso. A LSA prevê em seu artigo 158, §2º: “Os administradores são solidariamente responsáveis pelos prejuízos causados em virtude do não cumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funcionamento normal da companhia, ainda que, pelo estatuto, tais deveres não caibam a todos eles”. 11. Referências • CARVALHOSA, Modesto. Comentários à Lei de Sociedades anônimas. Vol. II. São Paulo: Saraiva, 2011 • EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada. Vol. II – Arts. 121 a 188. São Paulo: Quartier Latin, 2011. • EIZIRIK, Nelson. Sociedades Anônimas - Jurisprudência. Rio de Janeiro: Renovar, 1996. • GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Manual das Companhias ou Sociedades Anônimas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. • BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Disponível em: http://planalto.gov.br. Acesso em: 18 jun. 2013 • BRASIL. Lei nº 6.385, de 05 de dezembro de 1976. Disponível em: http://planalto.gov.br. Acesso em: 18 jun. 2013 • CVM. Instrução nº 480, de 07 de dezembro de 2009. Disponível em: http://cvm.gov.br Acesso em: 18 jun. 2013