Consórcio de milho com braquiária: produção de forragem e palhada para o plantio direto
Carlos Alexandre Costa Crusciol1 & Emerson Borghi2
(1)
(2)
Eng. Agro. Professor Adjunto Departamento de Produção Vegetal – Faculdade de Ciências Agronômicas/UNESP - Caixa Postal 237,
CEP 18610-307, Botucatu, SP. E-mail: [email protected]
Pós-Graduação em Agricultura, Departamento de Produção Vegetal – Faculdade de Ciências Agronômicas/UNESP - Caixa Postal 237,
CEP 18610-307, Botucatu, SP. E-mail: [email protected]
Recentemente, o interesse pelo cultivo consorciado de plantas produtoras de grãos com forrageiras tropicais em sistema
plantio direto tem aumentado significativamente, por parte de técnicos e produtores das regiões caracterizadas com inverno
seco. As explicações para esse fato podem ser atribuídas a duas características: 1) a baixa produção de palhada, no período
de outono/inverno e inverno/primavera, das espécies utilizadas para adubação verde e cobertura do solo, em razão de
condições climáticas desfavoráveis, notadamente baixa disponibilidade hídrica; 2) a alta probabilidade de insucesso das
culturas de safrinha, levando muitos agricultores a optarem em não cultivar suas áreas nesse período, permanecendo ociosas
durante até sete meses do ano e com baixa cobertura vegetal.
Assim, devido à rápida decomposição da palhada das culturas de verão, especialmente soja, feijão e algodão, a viabilidade e
a sustentabilidade do sistema plantio direto tornam-se comprometidas.
Nesse panorama, o cultivo consorciado do milho com braquiária pode ser uma excelente alternativa para solucionar o
problema.
No consórcio do milho com braquiária, a forrageira pode ter dupla finalidade, servindo como alimento para a exploração
pecuária, a partir do final do verão até início da primavera, e, posteriormente, para formação de palhada no sistema plantio
direto. Existe a possibilidade também da utilização da forrageira exclusivamente como planta produtora de palhada,
proporcionando cobertura permanente do solo até a semeadura da safra de verão subseqüente.
A forrageira, nesse sistema, pode ser semeada simultaneamente com a cultura produtora de grãos. Para isso, as sementes
são misturadas ao adubo e depositadas no compartimento de fertilizante da semeadora, sendo distribuídas na mesma
profundidade do adubo. Assim, o mesmo adubo usado na cultura produtora de grãos será utilizado pela forrageira, que, no
caso do consórcio com a cultura do milho, apresentará desenvolvimento lento até a colheita dos grãos. Somente após a
colheita, a braquiária iniciará seu pleno desenvolvimento e se beneficiará do adubo residual deixado pela cultura anual. Uma
outra forma de implantação desse sistema é a semeadura da forrageira no momento da aplicação do fertilizante de cobertura,
ambos misturados, podendo ser utilizado até com formulados.
O consórcio do milho com a braquiária é possível graças ao diferencial de tempo e espaço no acúmulo de biomassa entre as
espécies. Os resultados de pesquisas envolvendo o cultivo consorciado de milho com Brachiaria brizantha demonstram a
viabilidade deste sistema de produção. Em algumas situações, pesquisadores relatam que a presença da forrageira não
afetou a produtividade de grãos de milho, porém, em alguns casos, houve necessidade da aplicação de nicosulfuron em
subdoses para reduzir o crescimento da forrageira, garantindo pleno desenvolvimento do milho.
A redução do espaçamento entrelinhas de 90 cm para 45 cm não tem refletido em grandes incrementos de produtividade de
grãos, sendo mais importante no consórcio à modalidade de cultivo, conforme Figura 1. O cultivo consorciado da braquiária
simultaneamente à semeadura do milho na linha + entrelinha acarreta em redução da produtividade de grãos em função da
maior competição entre as espécies. Caso o agricultor opte por essa modalidade, haverá a necessidade da aplicação de
subdoses de herbicida para reduzir o desenvolvimento da forrageira. Porém, o agricultor pode fazer uso da consorciação na
linha ou na entrelinha no momento da semeadura da cultura do milho. Essas modalidades podem proporcionar em alguns
casos produtividades maiores que o cultivo tradicional (milho solteiro).
Figura 1: Produtividade de grãos de milho consorciado com Brachiaria brizantha cv. Marandu em diferentes modalidades de cultivo. Fonte:
Borghi & Crusciol (2007).
Nessas modalidades (Figura 1) a semeadura da forrageira foi realizada por meio de semeadora adubadora para plantio direto
adotando densidade de semeadura da Brachiaria brizantha de 2,5 kg ha-1 de sementes puras viáveis, sendo misturadas ao
adubo e acondicionadas no compartimento de fertilizante da semeadora, e distribuídas na profundidade de 8 cm, localizandose desta forma abaixo da semente de milho.
Neste caso, a quantidade de sementes de braquiária é a mesma das modalidades anteriores, sendo depositada no solo por
meio de adubador de disco no momento da adubação de cobertura do milho (Figura 2). Comparando as épocas de
consorciação, constata-se resultados mais promissores com o estabelecimento do consórcio das duas espécies, na
semeadura simultânea, em relação ao consórcio efetuado por ocasião da adubação de cobertura (Figura 2). Mais uma vez,
constata-se que a consorciação, desde que adequadamente implementada, pode incrementar a produtividade de grãos do
milho. Esse resultado é frequentemente constatado quando o consórcio é implementado pela primeira vez na área de
produção. Contudo, os pesquisadores ainda não conseguiram explicar o porquê da maior produtividade de grãos no cultivo
consorciado.
Figura 2: Produtividade de grãos de milho consorciado com Brachiaria brizantha cv. Marandu em diferentes épocas de estabelecimento do
consórcio. Fonte: Borghi & Crusciol (dados não publicados).
A técnica de implantação de forrageiras por meio da mistura de sementes com fertilizantes é uma prática antiga, muito
empregada na implantação de pastagens, com o uso, principalmente, de fertilizantes fosfatados, visando à utilização do
adubo como via de distribuição. Recomendava-se que nas misturas com adubos fosfatados, a semeadura fosse imediata,
evitando danos na qualidade fisiológica das sementes.
O conhecimento do tempo em de permanência da mistura das sementes das forrageiras com os mais diversos fertilizantes
minerais é suma importância para a expansão desse sistema de produção, uma vez que dependendo da logística da
propriedade rural há a necessidade de fazer essa mistura e armazená-las por determinado período para posteriormente
serem utilizadas. Os resultados obtidos até o momento, ainda que preliminares, são animadores, possibilitando a mistura de
grandes volumes utilizando diferentes fertilizantes (fertilizantes minerais fosfatados, cloreto de potássio e formulado farelado)
com sementes de Brachiaria brizantha cv. Marandu para serem utilizadas até 96 horas após a mistura, sem afetar
significativamente a germinção da forrageira em condições de solo com umidade adequada (Figuras 3a, 3b, 3c e 3d).
Figura 3: Efeito de fontes e períodos de contato de fertilizantes e germinação de sementes de Brachiaria brizantha cv. Marandu. Fonte:
Mateus et al. (2007).
Por segurança, a recomendação quando se utiliza a mistura de fertilizante com Brachiaria brizantha cv. Marandu deve ser de
no máximo 48 horas. Esse tempo pode ser considerado adequado para facilitar a logística das propriedades, independente
do tamanho, não havendo necessidade de realizar a mistura todos os dias. No entanto, o produtor deve avaliar a umidade do
ar, pois os fertilizantes com maior poder de higroscopicidade podem limitar a utilização da mistura em razão da ocorrência de
"empedramento".
A pastagem formada após a colheita do milho será de boa qualidade, pois as espécies de braquiárias são amplamente
adaptadas e disseminadas nas regiões com inverno seco, ocupando 85% da área com pastagem no cerrado brasileiro. Devese ressaltar que as forrageiras tropicais possuem sistema radicular vigoroso e profundo, e elevada tolerância à deficiência
hídrica, sendo eficientes na produção de cobertura morta, desenvolvendo-se em condições ambientais em que a maioria das
culturas produtoras de grãos e das espécies utilizadas para cobertura do solo, semeadas em outono/inverno e
inverno/primavera não apresentaria tal característica.
Em razão dessas características é possível a obtenção de elevada produção de forragens durante o período da seca e com
qualidade suficiente para incrementar a produtividade dos rebanhos (Figuras 4 e 5).
Figura 4: Produtividade de massa seca da forragem de Brachiaria brizantha cv. Marandu quando consorciada com milho simultaneamente à
semeadura, determinadas em diferentes épocas após a colheita de grãos, no período de outono-primavera dos anos agrícolas de 2002/2003
e 2003/2004.
Figura 5: Valores percentuais de proteína bruta na forragem de Brachiaria brizantha cv. Marandu nos meses de maio (quando ainda
consorciada com o milho) e setembro (120 dias após a colheita de grãos). Fonte: Borghi (2004).
A produção de palhada para a semeadura da safra seguinte, após a retirada dos animais da área, tem resultado, na média,
em 8.000 a 12.000 kg ha-1 de cobertura morta sobre o solo. A quantidade de palha produzida vai depender da altura de
pastejo, do tempo de vedação e das condições climáticas. A grande vantagem da palhada de braquiária é a relação C/N
elevada, que mantém o solo coberto até o fechamento da entre linha das culturas, resultando ao final do ciclo da soja, por
exemplo, em 4.000 kg ha-1 de palhada.
O cultivo consorciado do milho com braquiária tem refletido diretamente na fertilidade do solo (Figuras 6a, 6b. 6c, 6d e 6e),
reduzindo a acidez e aumentando os teores de matéria orgânica, fósforo, potássio, cálcio e magnésio, com reflexo direto na
CTC (capacidade de troca catiônica) e na saturação por bases (V%), quando comparado às áreas sob sistema plantio direto
com cultivo exclusivo de milho no verão e pousio no período de outono/inverno/primavera, ou milho/aveia. Esses resultados
são decorrentes do grande aporte de palhada somado ao grande volume de raízes em profundidade proporcionados pelas
braquiárias e evidenciam o fato das espécies forrageiras serem mais eficientes no aproveitamento do P do solo do que as
culturas anuais.
Figura 6: Alterações na fertilidade do solo após dois anos de cultivo consorciado de milho com Bachiaria brizantha cv. Marandu. (a) pH; (b)
matéria orgânica; (c) fósforo; (d) potássio; (e) saturação por bases. Fonte: Crusciol et al. (2006).
Na literatura há relatos de menor adsorção de P em solos cultivados com forrageiras em relação aos cultivos com culturas
anuais de grãos. Isso é decorrente da oxidação de grande parte da matéria orgânica, liberando os sítios de adsorção dos
óxidos. Assim, quanto maiores os teores de matéria orgânica, maior é a redução da adsorção de P. O aumento do teor de K
trocável no solo pode ser explicado pela grande capacidade de absorção e acúmulo de K que as braquiárias possuem,
reciclando o nutriente. Assim, a presença da forrageira na área no período de outono/inverno/primavera, na forma de
pastagem, proporcionou grande reciclagem do nutriente, incrementando os teores nas camadas superficiais, mediante a
decomposição do material orgânico remanescente na área, após sua dessecação.
Também tem sido constatado efeito na qualidade física do solo, com amento da porosidade do solo e do armazenamento de
água e diminuição da densidade do solo.
Assim, o cultivo de Brachiaria semeada em consórcio com o milho na linha de semeadura, tem promovido melhorias nas
qualidades físicas e físico-hídricas do solo em profundidade, provavelmente em decorrência do grande aporte de matéria
seca radicular no perfil do solo por essa forrageira perene. Em camadas mais superficiais, como de 0 a 20 cm, o cultivo de
Brachiaria não surte tanto efeito na melhoria da qualidade estrutural do solo, devido, provavelmente, à grande colonização
das raízes de milho nessa profundidade (Tab. 1 e Figuras 7a e 7b).
Tabela 1. Valores médios de densidade do solo (Ds), resistência à penetração (RP), macro, micro e porosidade total, das amostras coletadas
no centro das camadas de 0 a 20 e 20 a 40 cm de profundidade. Fonte: Crusciol et al. (2007).
(1) RP = Resistência mecânica do solo à penetração com água retida na tensão de 0,01 MPa.
Figura 7. Variação do Intervalo Hídrico Ótimo nos dois sistemas de manejo (milho solteiro e MBL – milho consorciado com Brachiaria na
linha de semeadura) nas camadas de 0 a 20 cm (A) e 20 a 40 cm (B) de profundidade. Fonte: Crusciol et al. (2007).
Referências bibliográficas
BORGHI, E.; CRUSCIOL, C. A. C. Produtividade de milho, espaçamento e modalidade de consorciação com Brachiaria
brizantha no sistema plantio direto. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 42, n. 2, 163-171, fev. 2007.
BORGHI, E. Integração agricultura-pecuária do milho consorciado com Brachiaria brizantha em sistema de plantio
direto. 2004. 102f. Dissertação (Mestrado em Agronomia/Energia na Agricultura)–Faculdade de Ciências Agronômicas,
Universidade Estadual Paulista, Botucatu.
CRUSCIOL, C. A. C.; BORGHI, E.; GUARAGNA, J. G.. Alterações na Fertilidade do Solo após Dois Anos de Integração
Agricultura – Pecuária. In: XXVII REUNIÃO BRASILEIRA DE FERTILIDADE DO SOLO (FERTBIO). Bonito, 2006. Resumos...
Bonito: Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, 2006. (CD-ROM).
CRUSCIOL, C. A. C.; CALONEGO, J.C.; BORGHI, E. Atributos físicos e físico-hídricos do solo com o cultivo de milho solteiro
ou consorciado com braquiária. In: XXXI CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO. Gramado, 2007. Resumos...
Gramado: Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, 2007. (CD-ROM).
MATEUS, G. P.; BORGHI, E.; MARQUES, R. R.; VILLAS BÔAS, R. L.; CRUSCIOL, C. A. C. Efeito de fontes e períodos de
contato de fertilizantes em sementes de Brachiaria brizantha. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, v. 31, p. 177183, 2007.
Revista Plantio Direto, edição 100, julho/agosto de 2007. Aldeia Norte Editora, Passo Fundo, RS.
Download

Consórcio de milho com braquiária: produção de forragem e