17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas
Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis
Um método a ser pesquisado: a intervenção com o processo artístico
Nelyse Ap. Melro Salzedas
Pós-Graduação da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação – UNESP/Bauru
Pedro Luiz Padovini
Pós Graduação da Faculdade de Dracena – SP – Estudos de Arte e LinguagemUNIFADRA/Dracena
Resumo
Críticos e artistas desde o século VIX vêm discutindo os processos metodológicos da
arte. Alguns através da meta linguagem de seus trabalhos propõem uma metodologia
que eles mesmos desenvolveram. Alguns livros de críticos como Argan e Kandinski
perfilam uma metodologia. Nos últimos tempos Panovisky trabalha com os métodos
iconográficos e iconológicos Richard Wollheim através do livro pintura como arte
também no capítulo quarto retomando alguns teóricos da intertextualidade opera com
as apropriações e textualidades citando como exemplo Manet, Picasso e nós,
seguindo seu pensamento, Rodin
Palavras chave: Método; Mimeses; textualidade e apropriações.
Abstract
Critics and artistes century since the VIX has been discussing the processes of art
methodology. Some of the target language, through their work propose a methodology
that developed themselves. Some books by critics as Argan and Kandinski profiles a
metologia. Recently Panovisky work with the methods and iconographic iconológicos
Richard Wollheim through the book as art painting also in the fourth chapter of
resuming some theoretical intertextuality e operates with the appropriations and
Textuality citing as an example Manet, Picasso and we follow his thinking, Rodin
Key words: Method; Mimeses; Textuality and appropriations.
Algumas pinturas e esculturas consideradas pela crítica estética como
obras-primas resultam de um processo interativo mimético-referencial de outras
telas, esculturas e textos, igualmente eleitos obras-primas. Esse processo vem
acontecendo desde tempos remotos, registrados por Richard Wollheim, em seu
livro Pintura com Arte, documentando Poussin, Goya, Manet e Picasso. Nesse
trabalho, acrescentaremos também Rodin.
Em nosso estudo separamos análises de um considerado conjunto de
obras cujos artistas Pablo Picasso e Rodin dispensam comentários. Entre as
pinturas de Pablo Picasso selecionamos Almoço sobre a relva; Massacre na
Coréia; Nu sentado secando os pés e As meninas. Entre as esculturas de
Rodin vamos dirigir nosso olhar para a obra A porta do inferno (figura 1) para
569
17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas
Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis
analisá-la, apoiamo-nos no catalogo Rodin Museum Philadelphia, 2004. Essa
escultura, além da produção interativa, assenta-se na intertextualidade da
Divina Comédia, de Dante Alighieri; e em O juízo final de Miguel Ângelo, tendo
por modelo Lorenzo Ghiberti (1425-1452), porta norte do batistério (figura 2),
na cidade de Florença, Itália, chamada por Miguel Ângelo, Porta do Paraíso.
Pretendemos, a partir dessas considerações preliminares, refletir sobre o
processo mimético criador tal qual Aristóteles e Horácio e também sobre
iconografia contemporânea explicitada por Norval Baitello Jr.
Entendemos que mimese não é cópia, mas imitação do modelo; do autor
ou do estilo; por referencialidade, a obra de arte, como objeto a ser re-lido,
interpretado nos moldes iconológicos.
A iconofagia, proposta por Baitello Jr, pode ser vista na obra Almoço
sobre a relva pintada por Manet apropriando-se de Giorgione: almoço sobre a
relva. O mesmo processo acontece quando Manet pinta a tela O fuzilamento
(figura 4) baseando-se na tela de Goya O Fuzilamento de 3 de maio (figura 3).
Já Picasso, apropriando-se de Manet e seu Almoço sobre a relva, produz um
conjunto de tela, desenvolvido em quatro seqüências, apropria-se da tela de
Goya, O fuzilamento de 3 de maio e pinta o Massacre na Coréia. Rodin, por
sua vez, torna visível o Inferno de Dante e mimetiza a porta de Lorenzo
Ghiberti do batistério florentino. Enfim, a produção artística caracteriza-se por
esse processo iconofágico e de apropriações. Retomando o texto de Wollheim
(2002), “A pintura como arte”, precisamente no capítulo quarto “Pintura,
textualidade e apropriações”, a proposta metodológica documenta-se com telas
de Poussin, Manet e Picasso. O nosso texto substitui Poussin por Rodin.
Este processo analítico proposto afigura-se como a ciranda de
Drummond, ou usando um termo mais próprio, à uma figura serpentinata, pois
o que acontece é que uma tela liga-se a outra por tema, personagens. É a
mimese que referencia o assunto e o modelo, ou apropria-se das imagens
criadas por outras obras-primas.
Vejamos a ciranda pictórica: da tela Betseba (1654) de Rembrandt,
Manet produz A Ninfa Surpreendida (1850-60), e A Saída do Banho (1800); de
uma Escultura Helenística de Crísipo, desenha O homem sentado (1862); em
1863 pinta o Almoço sobre a relva, apropriação do Concerto Campestre, de
Ticiano (1540).
570
17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas
Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis
Quanto a Picasso, podemos citar alguns desenhos e telas, apropriados
de Manet, que, por sua vez, se apropriou de Ticiano (1540): Dejeuner Sur
L’Herbe, em agosto de 1930 (desenho); outra em março de 1960; outras duas
em 1961; outra em julho de 1961; mais dois desenhos de 1961.
A série obras de Picasso tematizada sobre O Almoço sobre a relva,
consiste de duzentos desenhos, vinte e sete pinturas e cinco lineogravuras.
O livro Pablo Picasso (2005) de Elhe Linda Buchholz e Beate
Zlbermann, dedica dois capítulos sobre “O compromisso político de Picasso” e
versões novas de antigos mestres, o que nos permite colocar O Massacre da
Coréia(figura 5) nos dois, uma vez que tematicamente enquadra-se no âmbito
político e nas versões de antigos mestres, mas apropria-se do modelo de Goya
e Manet. É um óleo sobre madeira chapada à contra fibra 109,5x209,5cm
localizada no Museu de Picasso em Paris. Apropriando-se das telas O
fuzilamento, dos autores já citados, contrariando a sua predileção formal,
dedica a mensagem ao confronto político, concessão feita ao partido
comunista. Entretanto, as mulheres aparecem desnudas e indefesas, e os
homens tem rosto de máquinas de guerra, despidas de humanidade.
Possivelmente, o pintor malaguenho tenha lido os homens sem rosto das telas
de Goya e Manet, e os visto como robôs programados para matar. E assim foi
feita a sua apropriação de antigos mestres.
Separamos Rodin, de Manet e Picasso, por se tratar de uma
investigação nossa, cujo objeto de estudo é A porta do inferno (figura 1)(18801917), bronze-2,50mx1,58mx 33’e 3/8.
A porta do Inferno (figura 1), com a qual, Rodin ocupou-se de 1880 a
1917, ano de sua morte, é uma mistura de textos e imagens. Textos
mitológicos e literários, como A Divina Comédia de Dante Alighieri, imagens de
O Juízo Final, de Miguel Ângelo: escultura de A Porta do Paraiso de Ghiberti,
bronze (por vezes dourado) 5,21m X 3,21m, relevos cada 0,80m x 0,80m, em
1425-1452. As duas portas do batistério concebidas por Ghiberti são temáticas.
A primeira delas (1403-1424) assenta-se sobre o Novo Testamento: vida e
morte de Jesus; os evangelistas e quatro Santos: Ambrósio, Jerônimo,
Gregório e Agostinho. A segunda, objeto de Rodin, trabalha o Velho
Testamento: A criação, o Dilúvio, Abrão e Issac; Isaú e Jacó; José; Moisés;
Josué, David e Salomão. A porta de Rodin, obedece ao primeiro volume do
571
17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas
Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis
texto de Alighieri, Inferno, incorporando os dramas e os personagens, porém,
carnavalizando a narrativa da imagem, como Miguel Ângelo o fez em O Juízo
Final.
Nesse grande painel tridimensional cabem a Alma (theshade); O
Pensador; Eva; Paolo e Francesca; O Conde Ugolino, os personagens
mitológicos gregos; O Beijo, e outros tantos, quase 186 figuras, segundo Rodin
Museum of Philadelphia.
A Porta do Inferno
A influência de Dante, ao se ler a porta, de cima para baixo, é marcada
pela Alma, posta à entrada, com os dizeres: “Abandonai a esperança, vos que
entrais”, o que foi mais tarde removido. Uma outra escultura, O Pensador,
colocada acima do tímpano, presente no O Juízo Final de Miguel Ângelo, é o
próprio Dante vendo (eu prefiro ver a olhar) o processo da criação.
Em os pilares da Porta, Rodin encaixa em um grupo Paolo e Francesca,
bem como Ugolino e seus filhos, aqueles amantes foram posteriormente
batizados com O Beijo. Em relação aos outros processos intertextuais, citamos
mais duas esculturas: Eva e a Serpente que recebeu a influência de Salambo,
de Flaubert e Mulheres Condenadas, inspirada em poemas de Baudelaire e em
outros pintores como Degas e Coubert.
A porta do inferno (figura 1) de Rodin entra no modelo da textualidade e
de apropriação, segundo a proposta de Wollheim (2002), pois o Inferno, da
Divina Comédia de Alighieri, presentifica-se nas esculturas de Rodin, tem-se,
por conseguinte a textualidade e no modelo de Lorenzo Ghiberti, a Porta do
Paraíso e no de Miguel Ângelo, no Juízo Final – o pensador e a carnavalização
das imagens naquela pintura da Capela Sixtina. Assim, ganha um conteúdo e
significado visual, do Inferno de Dante (textualidade) e um conteúdo histórico,
ao tomar como modelo Lorenzo Ghiberti, da arte renascentista (apropriação).
Segundo o texto “A Pintura Como Arte” (WOLLHEIM, 2002: p.1987), Rodin
apropriou-se do modelo, porém a obra identificou-se pelas formas e movimento
de suas esculturas. Logo a mimese, de uma certa forma, foi do modelo de
Ghiberti, interpretando-se através do texto de Dante Alighieri e tomando como
modelo emprestado para identificar-se.
572
17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas
Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis
Figura 1 - A porta do inferno : Apropriações Rodin, Museu
Rodin, Paris. Em gesso.
Figura 2- A porta do paraíso: Ghibert
(Firenze, Battistero, 1425ca.)
573
17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas
Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis
574
17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas
Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis
O Fuzilamento de 3 de maio, Goya, 1814, Madrid,
Museu do Prado (figura 3).
O fuzilamento, Manet, 1867, Musem of Fine Arts, Boston e
Stadtische Kunsthalle, Mannheim (figura 4)
O Massacre da Coréia, Picasso, 195, Paris, Musée Picasso. (figura 5 )
Referências
WOLLHEIM, Richard. A pintura como arte. Cosac & Naify edições. São Paulo. 2002
Philadelphia Museum RODIN, 2004
BUCHHOLZ, Linda Elke. Pablo Picasso. Könemann. Madri.. 2004
Mini Currículo
Nelyse Aparecida Melro Salzedas
Graduada em Letras pela PUC-Campinas/SP
Mestre e Doutora em Letras pela USP/SP
Livre Docência pela UNESP – Assis/SP
Docente em curso de graduação, especialização, mestrado e doutorado.
Coordenadora no Programa de Pós-Graduação em Poéticas Visuais da FAAC-UNESP
-Bauru/SP.
Chefe de Departamento de Artes - FAAC-UNESP -Bauru/SP.
Diretora acadêmica do Instituto Municipal de Ensino de São Manuel
Coordenadora Pedagógica da UNIFRADRA – Dracena/SP
Orientadora de Mestrado e Doutorado.
Trabalhos internacionais
Livros publicados
575
17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas
Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis
Pedro Luiz Padovini
Graduado em Educação Artística – FAAC – UNESP – Bauru/SP
Mestre em Comunicação - FAAC-UNESP -Bauru/SP.
Professor efetivo de Artes na Rede de Ensino Público do Estado de São Paulo
Professor efetivo no curso de Pedagogia – IMESS – São Manuel/SP
Professor efetivo no curso de Artes – UNIFADRA – Dracena/SP
Coordenador do curso de Educação Artística – UNIFADRA – Dracena/SP
Professor do curso de Especialização Letras/Artes – UNIFADRA – Dracena/SP
Coordenador do curso de Especialização – UNIFADRA – Dracena/SP
Orientador de Graduação e Especialização nas áreas Letras, Artes e Pedagogia
576
Download

Um método a ser pesquisado: a intervenção com o