A Complexidade e a Aprendizagem na Coordenação Pedagógica: Possibilidade de um Mecanismo de Avaliação dentro de uma Organização Escolar Luiza Alves Ribeiro (Doutoranda – UFRJ) Resumo A necessidade de uma escola pública de qualidade é um imperativo. O presente estudo procurou construir um instrumento para avaliar alguns aspectos da complexidade da condição humana e suas relações com a aprendizagem, dentro do ambiente escolar. A Análise Fatorial (Varimax) indicou uma solução de quatro fatores: Processos de Avaliação, Orientação, Oportunidades e Individualidade/Coletividade. Com uma consistência interna, Alpha de Cronbach, sinalizando um bom índice (0,911), os resultados apresentados indicam que, de uma forma geral, o Instrumento de Avaliação de Complexidade e Aprendizagem apresentou excelentes propriedades para sua utilização e aplicação, gerando uma possibilidade real de respostas no momento de medir internamente situações que podem direcionar atividades de coordenação pedagógica. Palavras-chave: Aprendizagem, Complexidade, Educação Pública, Instrumento de Pesquisa, Coordenação Pedagógica The Complexity and the Learning in the Pedagogical Coordination: Possibility of a Mechanism of Evaluation inside of School Organization Abstract The necessity of a public school of quality is an imperative. The present study it looked for to construct an instrument to evaluate some aspects of the complexity of the condition human being and its relations with the learning, inside of the pertaining to school environment. The Factorial Analysis (Varimax) indicated a solution of four factors: Processes of Evaluation, Orientation, Opportunities and Individuality/ Collective. With an internal consistency, Alpha de Cronbach, signaling a good index (0,911), the presented results indicate that, of a general form, the Instrument of Evaluation of Complexity and Learning presented excellent properties for its use and application, generating a real possibility of answers at the moment to internally measure situations that can direct activities of pedagogical coordination. One is about an instrument that if does not summarize in the pertaining to school environment, being able to be adapted for other organizations and typical sectors where it has intense relations of work and activities of pedagogical coordenation. Keywords: Learning, Complexity, Public Education, Instrument of Research, Pedagogical Coordination 1. Introdução Os processos de aprendizagem dentro do ambiente escolar acontecem de diversas maneiras e através de inúmeros mecanismos. Por trás de todos esses processos, encontramos uma enorme carga de complexidade que, interferindo ou não, proporcionam resultados positivos ou negativos na evolução do sistema educacional, principalmente, na escola pública. Sabe-se que a evolução da escola, ou melhor, da educação de um país, é medida não só pelo desempenho dos alunos, mas como este desempenho é compreendido e trabalhado por todos aqueles que o constroem e o utilizam. Na verdade, o “saber” é complexo e o “aprender” caminha por situações complexas de um grupo ou, até mesmo, de forma individual. Como menciona Pedro Demo (2002, p. 44): “Saber pensar” não é somente ver a lógica das coisas, exarar raciocínios formais corretos, mas principalmente surpreender lógicas onde aparentemente não haveria, pensar flexivelmente para dar conta de realidade flexível, decifrar o que é ambíguo e contraditório, ordenar a importância de elementos embaralhados numa situação, encontrar similaridades ou diferenças onde parece não haver, reconstruir o conhecimento anterior e formular perspectivas inovadoras. As discussões recorrentes e os estudos realizados têm produzido vários mecanismos de análise e avaliação dos processos de aprendizagem, ligados ao sistema educacional público. Tais trabalhos, como relata Veiga (2003), estão nitidamente “presos” em melhorar a qualidade da educação pública para que todos aprendam mais e melhor, focados na tríplice finalidade da educação: pessoas, cidadania e trabalho. Segundo Engers e Morosini (2006), alguns estudiosos vêm sinalizando que a temática aprendizagem precisa ser (re)visitada. Para Silva de Araújo (2007). o momento atual propicia ao docente a revisão de seus procedimentos, da sua maneira de ensinar e aprender. Já Abádia da Silva (2003), relata que a escola pública, por ser inventiva, rompe modelos instituídos e, pela sua heterogeneidade, mostra com transparência a face de seus sujeitos e a complexidade de sua cultura. Lelis (2001) assevera que, sob matrizes diversas, o que parece ser consenso é a valorização da prática cotidiana como lugar da construção de saberes, ou seja, a relação da complexidade cultural e a heterogeneidade influenciam diretamente o momento de aprender ou o processo de construção do conhecimento. 2 Corroborando todos esses posicionamentos e, ainda sobre estudos que caminham nas relações existentes entre complexidade e aprendizagem, pode-se verificar o desenvolvido por Bernardo Loureiro (2005), que trata das teorias, metodologias, aspectos políticos e a sociedade dentro dos aspectos complexos da educação ambiental; o trabalho de Fernandes e Barbosa (2006) que menciona as mudanças educacionais, a partir das demandas instaladas com a complexidade crescente do mundo atual; Moreira (2005), que faz um histórico da aprendizagem significativa; Matias Fleuri (2003), quando relata sobre a intercultura, referindo a um campo complexo composto de múltiplos sujeitos sociais, diferentes perspectivas epistemológicas e políticas, diversas práticas e variados contextos sociais, e muitos outros que refletem um paradigma existente, ou seja, a ideia de complexidade cultural e sua influência sobre a aprendizagem. Dessa forma, torna-se imperiosa que a visão daqueles que realmente fazem parte do processo como movimentadores e fomentadores e que utilizam a educação como meio e fim de suas atividades profissionais seja, realmente, pesquisada. A relação professor-aluno é intermediada por uma coordenação pedagógica e, através da visão de um profissional que exerça essa atividade, o processo de aprendizagem pode ser afirmado como complexo ou não, à medida que sua atuação seja realmente avaliada. Assim, de acordo com Fernandes e Barbosa (2006, p. 56): Ao mesmo tempo em que escrevemos isto, nos vem à mente o quanto é paradoxal essa situação de ensino-aprendizagem, e como é difícil e complexa a tarefa de construir o conhecimento, desenvolvendo as capacidades humanas que permitam às sociedades sobreviverem e terem êxito nesta era da informação. Espera-se que os educadores construam as comunidades de aprendizagem e desenvolvam as capacidades de inovação, criatividade, flexibilidade e compromisso com as mudanças necessárias à compreensão da situação sociopolítica do século XXI. Através de uma hipótese que supõe a existência de uma opinião dos profissionais que promovem a coordenação do processo educacional em escolas, gerenciando as práticas pedagógicas e suas relações com a complexidade e os diversos mecanismos de aprendizagem empreendidos pelos sistemas públicos de educação, em busca de um ensino de qualidade e que englobe os aspectos possíveis de serem avaliados e medidos, este estudo pretende elaborar e validar um instrumento específico, baseado em pressupostos que refletem a complexidade da condição humana e sua relação com a aprendizagem dentro da escola. Para tanto, a evidência teórica e empírica, acumulada em torno do instrumento, busca identificar e analisar se o mesmo possui qualidades de medidas satisfatórias, quer na sua aplicabilidade prática, quer na sua consistência interna. 3 Segundo os Indicadores de Qualidade na Educação (2007), a escola é um espaço de ensino, aprendizagem e vivência de valores. Nela, os indivíduos se socializam, brincam e experimentam a convivência com a diversidade humana. Em consonância a isso, o presente estudo se justifica pela necessidade de analisar o perfil que o grupo escolar responsável pela coordenação processo educacional identifica com relação às metas traçadas dentro das políticas públicas ligadas à educação e às condições em que as mesmas estão sendo implementadas, ou seja, se o processo de aprendizagem se realiza dentro da variabilidade complexa, respeitando diferenças e estimulando o desenvolvimento do homem como cidadão. De acordo com Pedro Demo (2002), avaliar a aprendizagem dos outros é profunda aprendizagem, desafio e risco, além de ser uma situação complexa em sua essência. Com isso, a criação de um processo de aprendizagem, por si só, já é uma variável complexa. Pela importância de todos os envolvidos diretamente no processo educacional, considera-se adequado que a opinião deles seja levada em conta no momento de planejamento e implementação de políticas públicas para a área. Segundo Celina Souza (2006, p. 25): As políticas públicas repercutem na economia e nas sociedades, daí por que qualquer teoria da política pública precisa também explicar as inter-relações entre Estado, política, economia e sociedade. Tal é também a razão pela qual pesquisadores de tantas disciplinas – economia, ciência política, sociologia, antropologia, geografia, planejamento, gestão e ciências sociais aplicadas – partilham um interesse comum na área e têm contribuído para avanços teóricos e empíricos. Assim, o entendimento do processo educacional deve ser feito amplamente e, pela ótica defendida neste estudo, priorizando as visões daqueles que possuem condições de realmente transformar a qualidade, à medida que as políticas públicas sejam coerentes com as necessidades expressadas. 2 - Metodologia Para ter uma validação adequada do instrumento de pesquisa e proporcionar um conjunto de informações confiável, gerou-se um limite para este trabalho, identificado por um aspecto regional, pois a Coordenadoria Regional de Educação (CRE), utilizada para a pesquisa, está situada na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro: a 8ª CRE, cuja abrangência incorpora um número de 146 unidades escolares e 21 creches, no período da pesquisa: 2008. A 8ª CRE atende aos bairros da Área de Planejamento Urbano AP 5.1, composta pelos bairros de Bangu, Campo dos Afonsos, Deodoro, Gericinó, Jardim Sulacap, Magalhães Bastos, Padre Miguel, Realengo, Senador Camará, Vila Militar. 4 Figura 1 – Mapa das Áreas de Planejamento da cidade do Rio de Janeiro Fonte: www.rio.rj.gov.br/smu Diversos instrumentos de avaliação são propagados, nos vários setores, tanto públicos quanto privados. Entretanto, na questão da educação pública, é possível haver um atravessamento político que resulte em possibilidades de deturpação ou até mesmo mascaramento de situações relevantes. Com isso, dentro dos sistemas educacionais públicos no Brasil, há vários trabalhos sérios e eficientes, gerando resultados bastante positivos. Para ilustrar essa afirmação e seu sentido, Castro (2000, p. 122) enfatiza que: A produção de dados e informações estatístico-educacionais de forma ágil e fidedigna, que retrate a realidade do setor educacional, é o instrumento básico de avaliação, planejamento e auxílio ao processo decisório para o estabelecimento de políticas para melhoria da educação brasileira. Os levantamentos abrangem todos os níveis e modalidades de ensino, subdividindo-se em três pesquisas distintas representadas pelo Censo Escolar, Censo do Ensino Superior e Levantamento sobre Financiamento e Gastos da Educação, além de censos especiais, realizados de forma não periódica, abrangendo temáticas específicas como é o caso do Censo do Professor. De acordo com a asserção acima, os dados genéricos traduzem indicadores que fomentam as políticas públicas. Entretanto, a visão da escola como um ambiente complexo, no momento da produção do conhecimento e da aprendizagem, não é medida nem avaliada e, para tal, a existência de um instrumento confiável é crucial, pois não se trata de apenas um novo mecanismo estatístico e, sim, um aglutinador de opiniões geradas através de dimensões típicas e características de uma escola idealizada por todos. Com isso, a geração de indicadores que possibilitem uma evolução sustentável de todo o processo educacional público dentro da cidade do Rio de Janeiro, à medida que possam realmente ser utilizados em sua plenitude e criarem resultados para uma execução ou aplicação prática das questões por ele levantadas, passa a ser muito importante. 5 Como mencionam Siqueira e Wechsler (2006, p. 23): De forma geral, o processo envolvido para a obtenção de um objetivo de pesquisa envolve: a construção do instrumento, de acordo com pressupostos teóricos; a aplicação num número adequado de sujeitos (considerando-se o formato do instrumento, número de itens, etc.); (...) a realização de uma Análise Fatorial para a composição dos itens nos fatores que determinaram o formato final do instrumento e, por fim o estudo da estabilidade temporal (...). Dentro do sistema educacional público da cidade do Rio de Janeiro, há controles do desempenho escolar dos alunos e participação de Conselhos diversos em situações específicas do universo escolar. Entretanto, tais mecanismos não fornecem dados suficientes como geradores de parâmetros para uma criteriosa avaliação das atividades de coordenação pedagógica relacionando a aprendizagem através de uma observação das diversas complexidades existentes, além de não serem divulgados, amplamente de forma adequada, para toda população. Assim, um instrumento de pesquisa que busque reunir, além do já observado pela escola pública da cidade do Rio de Janeiro (desempenho dos alunos e atuação dos Conselhos existentes), fatores que também precisam ser analisados para que realmente possam definir se os processos de aprendizagem, construção do conhecimento e dinamização pedagógica estão proporcionando níveis de qualidade de uma escola idealizada por todos. 2.1 – Participantes A população-alvo do presente estudo compreende os professores que desempenham a função de Coordenadores Pedagógicos e atuam junto às escolas e creches abrangidas pela 8ª Coordenadoria Regional de Educação. Participaram do estudo 45 indivíduos, 100,00% mulheres, correspondendo a 36,88% do total de Coordenadores Pedagógicos lotados no órgão. A média de idade dos participantes, por ocasião da pesquisa, foi de 43,44 anos (DP = 6,21), variando de 28 até 57 anos. Entre os que responderam ao instrumento de pesquisa, a média de anos trabalhados no sistema educacional é de 20,96 anos (DP = 6,20) e o tempo médio na função de Coordenador Pedagógico é de 5,04 anos (DP = 2,87). Quanto ao grau de formação profissional, 22,20% possui especialização, 53,30% possui nível superior completo, 15,60% ainda está cursando o nível superior e 8,90% possui apenas o Curso de Formação de Professores. 2.2 – Instrumento O questionário de pesquisa utilizado desenvolveu-se através de afirmações, teorias e questões sobre os conceitos de Aprendizagem e Complexidade, expostos especificamente por 6 Pedro Demo (2002) e Humberto Maturana (2001) e as relações destes conceitos com o mundo escolar. Para tanto, o questionário foi composto com 16 questões distribuídas através de uma escala Likert de 5 pontos, variando de “Discordo totalmente, Discordo, Indiferente, Concordo e Concordo totalmente”. Para facilitar o trabalho e a forma de mencionar o questionário, o mesmo passou a ser denominado Instrumento de Avaliação de Complexidade e Aprendizagem e se solidifica numa visão multidimensional que busca informações sobre quatro dimensões (fatores): Processos de Avaliação, Orientação, Oportunidades e Individualidade/Coletividade. Para cada dimensão, há um grupo de itens que busca validar o instrumento e enfatizar, de forma clara e objetiva, as assertivas potencialmente válidas, ligadas ao contexto aprendizagem e complexidade dentro do ambiente escolar, pois de acordo com Kramer e Nunes (2007, p.49): Buscar a unidade do sistema diante da diversidade, aceitar e conviver com diferenças sem tornar o sistema disperso e/ou excludente, compreender e conceber o espaço educativo, com o envolvimento, discussão e formação dos profissionais que nele atuam, exige do sistema ações político-pedagógicas e administrativas consistentes, objetivas e que tenham continuidade. Cabe ressaltar, ainda, que as denominações dos fatores que surgiram pela análise e desenvolvimento do Instrumento de Avaliação de Complexidade e Aprendizagem foram escolhidas com base no conteúdo teórico que apoiaram a presente pesquisa. 2.3 - Procedimentos De acordo com Bandeira et al (1999, p.4): O processo de validação pode ser entendido como um conjunto de procedimentos estatísticos cujo objetivo fundamental é produzir escores observados o mais próximo possível dos escores verdadeiros da realidade pesquisada. A fidedignidade é definida como a capacidade de apresentar, ao longo do tempo e uso, medidas consistentes nas pesquisas. Assim, primeiramente foi executado um teste preliminar com um grupo de cinco professoras que não exercem a função de Coordenação Pedagógica, de diferentes funções dentro da escola, idade e nível de formação, de maneira a verificar se o vocabulário do questionário a ser utilizado estaria adequado para todos. Tal procedimento é definido por Pasquali (1999) como análise semântica dos itens. Durante esta atividade preliminar, não se observou nenhuma dificuldade ou dúvida quanto às questões no tocante à linguagem utilizada. A coleta de dados definitiva foi realizada nos meses de novembro e dezembro de 2007, com o consentimento da Secretaria Municipal de Educação da cidade do Rio de Janeiro, 7 através de um termo de autorização do Departamento Geral de Ensino (DGED) 1 daquela Secretaria. Os questionários foram distribuídos pelas diversas escolas da 8ª CRE e, também, em encontros ou reuniões, nos quais houve a participação dos Coordenadores Pedagógicos. O preenchimento do questionário foi de caráter voluntário e sempre foram mencionadas as intenções e características do mesmo, sendo garantido sigilo absoluto sobre a identidade do respondente. Não houve nenhum questionário eliminado por incorreções no preenchimento nem por quaisquer outros motivos. 3. Resultados As análises estatísticas principais para caracterizar a consistência interna a estabilidade do instrumento foram utilizadas e, para tais, aplicou-se o programa SPSS versão Windows. Após a coleta dos dados e como início da análise estatística dos mesmos, recomendado por Malhotra (1996), buscou-se uma verificação da adequação da amostra, através do Teste KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) dos itens da escala e o resultado obtido de 0,728 indicou a adequação dos itens para a análise fatorial, pois para Morgan e Griego (1998), Malhotra (1996) e Machado (1999), a existência de uma medida KMO > 0,70 já justifica o uso de técnicas multivariadas de pesquisa estatística. Em prosseguimento, realizou-se, de acordo com a recomendação de diversos autores, entre eles, Churchill (1979) e Spector (1992), um exame da consistência interna dos dados através do coeficiente Alpha de Cronbach e tal índice identificou um valor de 0,911, representando uma boa consistência interna para todos os itens do questionário, segundo os mesmos autores. Uma Análise Fatorial foi utilizada para permitir uma perfeita investigação da validade do constructo e possibilitar a composição dos fatores possíveis para o Instrumento de Avaliação de Complexidade e Aprendizagem, pois de acordo com Dancey e Reidy (2006, p.422): A forma usual de executar uma análise de fatores é construir uma amostra de pessoas, na qual cada uma tem um conjunto de valores resultados de um certo número de variáveis observadas, por exemplo, poderiam ter sido submetidas a uma bateria de testes ou respondido algum questionário. 1 O Departamento Geral de Educação (DGED) da Secretaria Municipal de Educação da Cidade do Rio de Janeiro, em 2009, passou a denominar-se Coordenadoria de Educação e ainda permanece com a função de avaliar e autorizar as pesquisas realizadas nas escolas e demais órgãos sob sua administração. 8 A Análise Fatorial dos principais componentes, com rotação Varimax, foi realizada para minimizar o número de variáveis, agrupando os itens em fatores, tornando mais fácil e compreensível a interpretação dos mesmos, já que cada fator estará representando variáveis com, ao menos, uma característica em comum, de acordo com Child (1978). Para a realização desta técnica, foram retidos todos os itens, uma vez que os mesmos apresentaram carga fatorial igual ou superior a 0,300. O diagrama de declividade (Scree Plot) apresentou uma solução interpretada como de dois a quatro fatores, entretanto a solução considerada a mais adequada foi a de quatro fatores, os quais explicaram 69,37% da variância total do instrumento. Autovalor Quadro 1 – Diagrama da declividade dos fatores Número do componente (questões) Fonte: Análise da Pesquisa Na criação dos quatro fatores, o fator 1, denominado de Individualidade/Coletividade foi constituído da seguinte maneira: Tabela 1 – Composição do Fator 1 Descrição – Individualidade/Coletividade Carga Fatorial Q7 - A escola permite oportunidades garantidoras de aprendizagem. 0,619 Q8 - Sempre ocorrem reflexões e atividades relacionadas com a compreensão dos direitos humanos, respeito, ética e moral. 0,820 Q10 - Existe um tratamento diferenciado para os alunos com a finalidade de estimular a aprendizagem individual. 0,632 Q12 - As diversidades culturais, regionais e econômicas são utilizadas nos momentos de aprendizagem. 0,706 Q15 - A ideia de discriminação e marginalização de grupos é combatida. 0,508 Q16 - Atividades coletivas de aprendizagem são estimuladas. 0,859 Fonte: Análise da pesquisa (SPSS) 9 O fator 2, denominado de Processos de Avaliação, ficou definido da seguinte forma: Tabela 2 – Composição do Fator 2 Descrição – Processos de Avaliação Carga Fatorial Q1 - Os mecanismos de avaliação de aprendizagem existentes são produtivos e eficientes 0,749 Q2 - Existe uma influência sobre os alunos no sentido libertador, ou seja, fomenta a criatividade e a liberdade de aprender e agir. 0,600 Q9 - O sistema de avaliação existente se compromete com a aprendizagem do aluno. 0,775 Q11 - As realizações pessoais e sociais são estimuladas. 0,708 Q13- O sistema de avaliação existente permite o desenvolvimento do aluno com relação ao saber pensar e agir. 0,752 Q14 - Existem orientações para a aprendizagem das normas e valores sociais. 0,570 Fonte: Idem Na sequência, construiu-se o fator 3, denominado de Orientação: Tabela 3 – Composição do Fator 3 Carga Fatorial Descrição – Orientação Q4 – Há respeito pelas características individuais de cada um nos processos de aprendizagem. 0,660 Q6 – As motivações e anseios dos alunos são sempre levados em consideração e respeitados. 0,785 Fonte: Idem O fator 4, denominado de Oportunidades, está composto da seguinte forma: Tabela 4 – Composição do Fator 4 Descrição – Oportunidades Q3 – As condições existentes na escola permitem oportunidades iguais aos alunos. Q5 – O modelo de apresentação dos resultados das avaliações, quantitativas ou qualitativas, é satisfatório. Carga Fatorial 0,545 0,886 Fonte: Ibidem Por fim, foi calculado o Coeficiente de Correlação de Pearson que buscou a existência de um relacionamento entre variáveis, a partir dos agrupamentos gerados pela definição e criação dos fatores. 10 Procurou-se, dessa forma, um relacionamento entre os quatro fatores classificados e agrupados através das médias de suas variáveis. Como mencionam Dancey e Reidy (2006, p.185), o grau de um relacionamento linear entre duas variáveis é medido por uma medida estatística chamada coeficiente de correlação, também conhecido como r, que varia entre 0 e 1 e de 0 a 1. A análise das correlações existentes entre os fatores da pesquisa identificou uma correlação positiva e de um aspecto moderado, para o nível de significativa de 0,01. Tabela 5 – Cálculo do Coeficiente de Correlação Linear de Pearson entre os fatores Correlações Fator1 Fator2 Fator3 Fator4 Fator1 Correlação de Pearson 1 0,704** 0,558** 0,396** Fator2 N Correlação de Pearson 45 0,704* Fator3 N Correlação de Pearson 45 45 0,558** 0,524** Fator4 N Correlação de Pearson 45 45 45 0,396** 0,495** 0,614** N ** A correlação é significativa em 0,01 Fonte: Análise da pesquisa (SPSS) 45 45 1 45 45 45 0,524** 0,465** 45 1 45 45 0,614** 45 1 45 A correlação positiva e significativa, obtida entre os fatores do Instrumento de Avaliação de Complexidade e Aprendizagem, indica sua adequação para utilização tanto de forma unifatorial, como multifatorial. Dessa forma e para e para reforçar a consistência interna do instrumento, foram calculados o Alpha de Cronbach dos fatores, isoladamente, conforme valores demonstrados na Tabela 6. Tabela 6 – Grau de consistência do Instrumento Alpha de Cronbach Fator 1 Fator 2 Fator 3 Fator 4 0,878 0,859 0,732 0,474 Fonte: Idem 4. Discussão Preliminarmente, o instrumento criado para o proposto no objetivo geral deste estudo, surgiu com 16 itens dentro do pressuposto pela teoria original para sua criação e, após a 11 análise fatorial exploradora, o número de itens permaneceu o mesmo, sendo distribuídos em quatro fatores que, através de suas intercorrelações, consegue explicar as covariâncias das variáveis, de acordo com Siqueira e Wechsler (2006, p.28). Diante das questões específicas observadas no ambiente pesquisado e dos resultados obtidos com o Instrumento de Avaliação de Complexidade e Aprendizagem, pode-se constatar que o fator 1 (Individualidade/Coletividade) possui condições de refletir uma preocupação constante nas questões relacionadas com o respeito pela individualidade, ao mesmo tempo que procura resgatar a vivência coletiva do indivíduo, conforme menciona Demo (2002, p 142): A formação do sujeito exige a solidão consigo mesmo também, mas há um nível necessariamente coletivo, porque o sujeito só pode ser definido, vivido e desempenhado em sociedade. A vida exige-nos autonomia, mas essa autonomia é sempre socialmente dependente. Nesta mesma linha, Maturana (2001) esclarece que argumentos sobre respeito, ética, solidariedade e direitos humanos só possuem sentindo se pensados em grupo, ou seja, a partir do momento em que tais princípios são vistos por indivíduo, podem gerar disputas e injustiças. E, ainda sobre o fator 1, Demo (idem, p. 120) confirma sua importância quando menciona: Nesse contexto, surge a dialética complexa dos processos emancipatórios. Ninguém se emancipa sozinho. Entretanto, emancipar-se inclui, necessariamente, saber andar sozinho, com pernas próprias. Somos seres sociais: um depende do outro inevitavelmente. Todavia, é preciso distinguir sempre entre dependência que expressa a reciprocidade e outra que redunda em humilhação. Porque suas fronteiras não são lineares, tanto é possível confundir os lados, quanto inventar separações estanques. De certo modo, temos diante de nós sempre o desafio permanente de como depender dos outros sem sucumbir nessa dependência, ou de como não depender dos outros sem imaginar que possamos tornar-nos totalmente independentes. Já sobre o fator 2 (Processos de Avaliação), existe uma ênfase nos aspectos relacionados com a avaliação da aprendizagem no seu todo, ou seja, a importância social e individual do conteúdo e o que ele pode propiciar ao indivíduo. Não se trata simplesmente de uma medição que procura rotular em níveis de supostos sucessos ou insucessos. É necessário, também, avaliar o próprio processo. Como menciona Damiani (2006), as concepções e práticas dos professores precisam ser avaliadas no tocante à influência que exercem sobre o desempenho escolar de seus estudantes e, até mesmo, o discurso pedagógico exercido sobre este mesmo desempenho e que também possa estar sendo influente. 12 Sobre esta mesma ótica, Demo (2002, p. 139,140) esclarece que: ...como a única razão de ser da avaliação é o compromisso com a aprendizagem do aluno, precisa ser feita de modo que colabore na aprendizagem: quando o trabalho avaliado é considerado insuficiente, é mister detalhadamente aduzir os argumentos da avaliação, tanto para que o avaliado possa reagir, contestar, quanto para que possa melhorar...Para avaliar habilidades reconstrutivas e políticas da aprendizagem, é mister lançar mão de métodos qualitativos, que, sem dispensar expressões quantitativas, concentram-se na intensidade do fenômeno, tais como: capacidade de argumentar, fundamentar, definir e distinguir; habilidade de reconstruir texto com alguma originalidade própria; virtude interpretativa e criativa. A análise do fator 3 (Orientação) trata especificamente da relação existente entre o respeito às características individuais, anseios e motivações do indivíduo, na medida em que estas complexidades existem e se manifestam indistintamente. Tal situação requer uma observação maior para que caminhos sejam expostos e avaliados, através de uma orientação responsável. Como menciona Demo (idem, p. 141): Orientar é convidar à emancipação. É gesto de fora que precisa ser puxado de dentro. É extrema a complexidade dessa situação humana: pode ser muito efetiva, até mesmo rápida, como pode perder-se no tempo e jamais realizarse. Perscrutar as motivações do aluno, entender seus anseios, tocar as cordas corretas da emoção, provocar sem oprimir, admoestar sem imbecilizar, é fina arte, sensibilidade sutil, perspicácia a toda prova. Tem sempre a vantagem de evitar o tratamento unificado de pessoas tão diversificadas, provocando contextos mais flexíveis e alternativos de socialização: ao mesmo tempo que é mister encaixar-se nas normas e valores sociais, cada aluno tem direito a tornar-se sujeito próprio, inconfundível. Com relação ao fator 4 (Oportunidades) verifica-se que as variáveis que fazem sua composição retratam situações de democracia de informações e oportunidades iguais para todos os indivíduos. Tais fatores são extremamente importantes no sistema educacional público. Segundo Demo (2002), o direito de aprender pode confundir-se também com o direito ao desenvolvimento, tomando-se o desenvolvimento como oportunidade ou como qualidade de vida. 5. Conclusão Como objetivo geral deste estudo está em elaborar e validar um instrumento específico, baseado em aspectos que refletem a complexidade da condição humana e a aprendizagem, dentro de um ambiente escolar, espera-se que as informações aqui contidas e no instrumento apresentado, possam gerar, ao menos, uma contribuição para ampliar o conhecimento sobre este assunto e sua aplicabilidade dentro das organizações educacionais. 13 A utilização de instrumentos válidos e fidedignos permite a realização de estudos mais aprofundados, inclusive com o uso de recursos estatísticos mais sofisticados. No caso do presente estudo, procurou-se demonstrar a simplicidade do processo de validação de um instrumento de pesquisa e a potencialidade de que possíveis seguidores deste estudo poderão ter em um aprofundamento de suas pesquisas. Ao término do estudo, frente aos resultados obtidos em conjunto e partindo da consistência interna dos fatores, o Instrumento de Avaliação de Complexidade e Aprendizagem possui boas propriedades para aplicação como um instrumento de pesquisa. Conforme menciona Bandeira et al (1999, p. 12): O modo como se apresentam as conclusões tem como escopo demonstrar que a pesquisa terminou com resultados consistentes e avaliados como fidedignos e representativos da realidade estudada. A forma criteriosa da análise estatística representa a preocupação do pesquisador com a cientificidade da pesquisa, garantindo credibilidade à linha comportamental de investigações. Pesquisas que tenham o mesmo objetivo, poderão se valer da utilização do presente instrumento, adicionando novos procedimentos, principalmente, ampliando o número de participantes e abrangência do sistema educacional, ou seja, incluindo a rede privada de ensino. 6. Referências Bibliográficas ARAUJO, M. S. de. 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Desenvolve pesquisas nas áreas de Educação e Linguagem, Formação de Professores e Políticas Públicas relacionadas à implementação de atividades relacionadas à formação continuada dos professores e melhoria dos indicadores de qualidade da Educação. E-mail: [email protected] 16