ESTUDO DA CONECTIVIDADE EM VIDROS POROSOS ATRAVÉS DA MODELAGEM COMPUTACIONAL S. C. dos Reis; A. M. M. dos Santos R. Prof. Mário Werneck, s/n, Belo Horizonte/ MG, CEP 30123-970 – [email protected] Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear - CDTN-CNEN RESUMO Materiais nanoporosos podem ser obtidos através de processos químicos em que a porosidade é controlada através da manipulação de parâmetros de processo. Em diversas aplicações de materiais porosos, fazem- se necessárias caracterizações estruturais que envolvem o volume de poros, a distribuição de tamanhos de poros, a morfologia de poros, a área superficial sólido- poros, permeabilidade e conectividade. A conectividade é um parâmetro importante que está diretamente associada ao processo de tr ansporte em uma matriz porosa. O desenvolvimento de uma modelagem computacional para avaliar a conectividade por volume da estrutura de poros foi realizado supondo forma geométrica cilíndrica para os braços que unem os nós da estrutura de poros. Conectividades em vidros de sílica tratados termicamente e submetidos à radiação γ com doses máximas de 1000 kGy +22 23 -3 foram avaliadas através de modelagem computacional e ficaram na faixa de 1,0.10 a 2,0.10 m . Palavras-Chaves: Modelagem Computacional, Caracterização, Conectividade. I. INTRODUÇÃO Materiais porosos envolvem propriedades microscópicas tais como forma, tamanho médio, distribuição de tamanho, conectividade e reatividade da superfície dos poros. Aplicações diversas com materiais porosos estão presentes em áreas de separação química, catálise, peneiras moleculares, reatividade para incorporação de diferentes grupos funcionais orgânicos e inorgânicos, incorporação de rejeitos, etc. Alguns processos de obtenção de materiais porosos envolvem a manipulação de parâmetros de processo que influenciam diretamente na estrutura de poros como no caso do processo sol-gel [1]. A caracterização da estrutura de poros é realizada através de parâmetros topológicos e métricos. Os métricos dependem da forma e tamanho dos poros enquanto os topológicos independem da forma e dimensão dos poros [2]. Dentre os parâmetros mais importantes para caracterização de material poroso, estão os parâmetros métricos tais como porosidade, distribuição de poros e área superficial e a conectividade como parâmetro topológico. Existem técnicas experimentais que permitem avaliar a forma e tamanho de poros, a área superficial da estrutura de poros, tais como adsorção- dessorção de nitrogênio, porosimetria com mercúrio, picnometria com hélio, microscopia eletrônica, etc., as quais são selecionadas dependendo da escala de tamanhos de poros [1]. A determinação dos parâmetros topológicos é de difícil consecução experimental, por requerer a realização de seções seriadas no material [3]. Assim, a conectividade é uma caracterização de difícil determinação. Dependendo do tamanho de poros do material pode se tornar ainda mais difícil a determinação de parâmetros topológicos. Neste caso, é necessário desenvolver modelos geométricos, que com o auxílio de ferramentas computacionais, permitem desenvolver programas de modo que, a partir de parâmetro métricos pode-se estimar parâmetros topológicos tais como a conectividade [4] [5]. 526 Neste trabalho é apresentado o desenvolvimento de uma modelagem computacional para avaliar a conectividade por volume da estrutura de poros, supondo forma geométrica cilíndrica para os braços que unem os nós da estrutura de poros. Através desta modelagem, foram avaliadas as conectividades de poros por unidade de volume em vidros de sílica nanoporosos, obtidos pelo processo sol- gel, tratados termicamente e em seguida, submetidos à radiação γ com doses máximas de 1000kGy. II. OBTENÇÃO DOS VIDROS Os géis porosos foram obtidos pelo processo sol-gel via alcóxido metálico empregando- se como precursor o tetrametil-ortossilicato (TMOS) e os ácidos nítrico (HNO3 ) e fluorídrico (HF) como catalisadores. Foram preparados sóis mantendo a razão molar água/TMOS igual a 16,0 e variando-se a quantidade de catalisador. Os sóis foram vazados em rec ipientes de plástico e mantidos à temperatura ambiente durante a gelação. Após a gelação, foram realizados o envelhecimento ao ar, durante 48 horas, à temperatura de o o 60 C, e a secagem, também ao ar, por 48 horas à temperatura de 100 C. Após esta etapa, os géis foram submetidos a tratamentos térmicos na faixa de temperatura de 500°C a 1000°C e em seguida submetidos à radiação γ com doses de 100kGy e 1000kGy. Os vidros foram caracterizados quanto a densidade volumétrica, volume de poros e área superficial sólido-poros. A densidade volumétrica foi obtida por picnometria com hélio (Quantachrome, modelo Multipycnometer), o tamanho médio de poros e área superficial sólido- poros através da adsorção-dessorção de nitrogênio (Quantachrome, modelo Autosorb 1C). A par tir dos resultados destas caracterizações foi aplicado um modelo para estimar a conectividade por volume (CV) dos poros, conforme descrito a seguir. III. MODELAGEM COMPUTACIONAL A modelagem computacional foi baseada no modelo desenvolvido por Reis, S.C. [6], em que estruturas aleatórias de poros são simuladas a partir de parâmetros métricos microestruturais. Este modelo foi implementado através do desenvolvimento de um programa de computador, utilizando-se o aplicativo AutoCAD para visualização tridime nsional das estruturas de poros. O programa de computador foi desenvolvido em ambiente amigável de fácil execução. Na implementação das etapas de representação e projeto, foi utilizado o ambiente de programação Delphi , baseado na linguagem de programação Object Pascal, o que permitiu a elaboração de algoritmos de baixo custo computacional. Na etapa de visualização foi usado o programa AutoCAD como ambiente de computação gráfica e modelagem de sólidos. Para a modelagem considerou- se a estrutura do material na escala microestrutural, sendo os elementos microestruturais de interesse os poros e o parâmetro topológico a ser avaliado a conectividade desses poros. Nesta modelagem, o objetivo foi simular estruturas de poros em que é possível determinar o número, dimensão e a coordenação dos poros. Isto foi possível através de suposições que consideram os nós da estrutura com forma esférica e as conexões entre eles os braços, de forma cilíndrica. O diâmetro dos nós, Dn, e o diâmetro dos braços, Db, são considerados iguais e calculados a partir da seguinte equação: Dn = Db = 4.Vtp Stp (1) onde Vtp é todo o volume associado aos poros e Stp é toda a área associada aos poros. O número de braços, Nb, de uma estrutura pode ser calculado em função do número de nós desta estrutura, Nn, segundo a relação descrita na equação (2), onde K1 pode ser calculado através da equação (3), 527 Nb = Nn.K 1 , 2 (2) K1 = 4.Pnc 4 + 3.Pnc3 + 2.Pnc2 + Pnc1 , (3) de forma que Pnc4, Pnc3 , Pnc2 e Pnc1 são os percentuais de nós conectados a 4, 3, 2 e 1 nós vizinhos respectivamente. A altura média dos braços cilíndricos, Hm, pode ser estimada através da equação (4) ou da equação empírica (5), a qual foi obtida através de diversas simulações computacionais onde foram calculadas as médias das somas das 4 menores distâncias entre pontos dispostos aleatoriamente em um volume cúbico de aresta igual a Dim. Hm = 2.Stp 2 Nn. K1..π .4.Vtp (4) Hm = Dim.0,986. Nn −0 ,3594 (5) Igualando-se as equações (4) e (5) e explicitando Nn obtém- se: 1 0 ,6406 2. Stp 2 Nn = Dim. 0, 986. K 1.π .4.Vtp (6) A área total associada aos poros, Stp, pode ser obtida através da superfície específica (Sg); o volume total dos poros, Vtp, obtém-se através das densidades volumétrica ( ρ v) e teórica do material (ρ t); a variável Dim depende apenas da densidade volumétrica. As equações (7), (8) e (9) descrevem estas relações, onde m é a massa do material. Stp = Sg.m ( m2 ), Vtp = (7), m( ρ t − ρ v ) ρt .ρ v 3 ( m ), (8) Dim = 3 e m ρv (m). (9) Substituindo- se (7), (8) e (9) em (6) tem- se a massa do material dada por: m = 2 0 ,986 . K 1 .π . 4 . (ρ t − ρ v ) Nn 0 , 6406 4/3 2 .Sg 2 . ρ t . ρ v 3 (10) A conectividade C pode ser obtida através da Eq. (11) [7], C = Nb − Nn + Np (11) onde Np é o número de partes da estrutura de poros. Para materiais obtidos através do processamento sol-gel pode-se considerar que todos os poros estão interligados ou seja, Np = 1. Fixando-se o número de nós a serem modelados em 500, Nn = 500; tem- se pela equação (11) que: Cv = 501/(m500 ρv ) (12) onde Cv é a conectividade por volume e m500 é a massa de material que contém 500 nós. 528 Fazendo-se na equação (10) Nn = 500 e considerando- se também e que os nós estão conectados a 4 vizinhos, Pnc4 = 1, logo K1 = 4, obtém-se: 501ρ v Cv = 2 1327,6.( ρ t − ρ v ) Sg 2 . ρ . ρ 4 / 3 t v (13) 3 A densidade volumétrica, q v, pode ser obtida através da densidade teórica do material, qt , e do volume total de poros por unidade de massa, Vtg , conforme equação (14). ρv = ρt 1 + (Vtg ⋅ ρ t ) (14) Substituindo (14) em (13) temos finalmente que a conectividade por volume, Cv , pode ser obtida pela equação (15); Cv = 0, 01036 ⋅ Sg ⋅ ρt 3 3 Vt g ⋅ (1 + Vt g ⋅ ρ t ) 3 3 (15) IV. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Tabela I são apresentados resultados obtidos em vidros de sílica relativos à superfície 2 3 específica, Sg [m /g], volume total de poros por unidade de massa, Vtg [cm /g] e densidade teórica, ρ t 3 a a a [g/cm ]. Os dados apresentados nas 2 , 3 e 4 colunas desta tabela, foram utilizados como dados de entrada no modelo descrito acima, equação (15), para determinar a conectividade por volume, Cv, dos a vidros de sílica. Os valores encontrados para conectividade por volume estão listados na 5 coluna desta mesma tabela. Também, a partir desses dados, foi possível visualizar a estrutura de poros em diferentes ângulos de visão, como visto na Figura 1, através do programa desenvolvido por [6], que permite exportar dados estruturais de uma estrutura simulada para o aplicativo AutoCAD. Nessa figura, observam- se diferenças nas conectividades e diâmetro médio dos poros em vidros irradiados e não irradiados do tipo 041. A equação (15) calcula a conectividade por unidade de volume de amostras considerando que toda estrutura de poros está conectada e que cada nó da estrutura possui coordenação igual a 4, ou seja, está ligado a quatro vizinhos. Essa equação também considera que 500 nós da estrutura foram modelados, Nn = 500. Estas condições de contorno são consideradas adequadas para vidros de sílica obtidos via processamento sol-gel, na faixa de temperatura investigada [8]. Na Figura 2, letras (a), (b) e (c), são mostrados resultados de conectividade por unidade de volume através do modelo descrito acima, em vidros de sílica tratados termicamente e irradiados com raios γ. Nessas figuras, observam- se diferenças nas conectividade à medida que a temperatura aumenta e, também com a radiação gama. TABELA I. Dados experimentais e conectividades de vidros porosos de sílica. Amostra Tipo 025 Superfície Específica m2/g 244,7 248,3 271,4 211,7 224,2 Volume dos Poros cm3 /g 0,9407 0,7797 1,146 1,325 1,247 Densidade Teórica g/cm3 2,30 2,19 2,17 2,15 2,15 CV 1022 m-3 10 17 8,3 2,7 3,8 529 159,1 216,2 210,6 252,9 236,8 182,2 144,8 265,8 237,8 244,7 245,5 268,8 273,4 033 041 0,8826 1,396 1,396 1,230 1,218 1,156 0,5782 1,272 1,392 1,216 1,236 1,187 1,180 2,03 2,03 2,05 2,14 2,10 2,09 2,15 2,13 2,12 2,13 2,22 2,15 2,14 3,1 2,5 2,3 5,6 4,6 2,4 6,7 5,9 3,3 5,2 5,1 7,3 7,8 (a) (b) Figura 1 – Estrutura de poros, com cotas de diâmetro médio, para as amostras tipo 041, (a) não irradiada e (b) irradiada. -3 Conectividade, 10 m 025 - 0 kGy 025 - 100 kGy 025 - 1000 kGy 20 15 041-0 kGy 041-100 kGy 22 Conectividade, 1022 m-3 30 10 0 10 5 0 0 200 400 600 800 o Temperatura, C (a) 1000 1200 0 200 400 600 800 0 1000 1200 Temperatura, C (b) 530 -3 22 Conectividade, 10 m 10 033 - 0 kGy 033 - 1000 kGy 8 6 4 2 0 0 200 400 600 0 800 1000 Temperatura, C (c) Figura 2 - Conectividade de poros em vidros de sílica em função do tratamento térmico. IV. CONCLUSÃO Uma avaliação da conectividade por unidade de volume, em vidros de sílica obtidos pelo processo sol-gel, é possível através de modelagem geométrica computacional. Verificou-se ser adequada a utilização do ambiente de programação para execução o aplicativo Delphi e de visualização o aplicativo AutoCAD . Foi desenvolvida uma equação que utiliza diretamente medidas experimentais de volume específico de poros, de densidade teórica e de superfície específica. REFERÊNCIAS [1] C.J. BRINKER, G.W. SCHERER, Sol- Gel Science: the Physics and Chemistry of Sol- Gel Processing (Harcourt Brace & Company, San Diego, 1990). [2] KINGERY, W. D., BOWEN,H. K. and UHLMANN, D. R. 2 ed. Toronto, Canada: A Wiley – Interscience Publication, 1975. [3] AIGELTINGER, E. H. and DeHOFF, R. T. Metallurgical Transactions A, v.6A(10): 1853- 62, 1975. [4] MANN, R., ALLAMY, A. and HOLT, A. Transactions of The Institution of Chemical Engineers, v.73A:147-53, 1995. [5] VASCONCELOS, W. L. and HENCH, L. L. 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An equation relating experimental parameters as density, specific surface area and specific pore volume was obtained where quantitative evaluation of pore connectivity in nanoporous silica glass was possible. The computer modeling was developed through Delphi software and Autocad software were utilized to show three-dimensional pore image. Silica glasses are synthesized through sol- gel processing employing tetramethylorthosilicate (TMOS) as precursor. The pore connectivities were estimated in glasses heat treated in an open to air oven at temperatures ranging from 0 0 60 6 700 C to 1000 C and after irradiated with Co to an absorbed dose of 10 Gy. The connectivities per -3 volume were in the range of 2,3E+22 to 1,7E+23 m . Key-words: computer modeling, characterization, connectivity . 532