O percurso da madeira nobre americana ou uma viagem por todos os rumos das hardwoods americanas Alessandra Ferreira Das frias florestas de Massachusetts, na região nordeste dos Estados Unidos, passando pela total automação das madeireiras e o ensino interdisciplinar na graduação, até chegar aos ambientes mais sofisticados de hotéis e restaurantes do mundo inteiro. Esse percurso, onde nada escapa ao olhar e as tendências contemporâneas do mercado, que a indústria madeireira americana trabalha em tempos de crise. O setor tem procurado valorizar as suas madeiras nobres, como o carvalho americano, o walnut e o ash, mantendo fortalecida toda a cadeia produtiva. O resultado parece que tem dado resultado. Os arquitetos e designers têm mantido seus projetos, pelo menos por enquanto. “Não dá para fugir da sensação de conforto, das possibilidades de texturas e da combinação de cores que a madeira possibilita. Além disso, na tendência dos ambientes naturais, até mesmo rústicos, a combinação com outros materiais até compõem um projeto, mas as madeiras continuam sendo essenciais nos nossos trabalhos”, resume o arquiteto Willian Paley, do escritório Tonychi, de Nova York. Sua opinião encontra eco em outras vozes ouvidas durante a viagem promovida pelo AHEC (American Hardwood Export Council), um conselho que dá suporte e faz divulgação da madeira dura americana no mundo, para conhecer a cadeia produtiva da madeira nobre nos Estados Unidos. De acordo com o arquiteto, isso, no entanto, não significa uma padronização dos projetos. “Trabalhamos com arte e emoção, e por isso nunca haverá uma uniformização, pois os desejos dos nossos clientes mudam”, justifica. Isso explica porque todos os arquitetos visitados possuem negócios espalhados pelos quatro cantos dos Estados Unidos, na Europa, na China, Coréia, e a nova queridinha dos empresários, Dubai, nos Emirados Árabes. Além da madeira, obviamente que há a presença constante de outros componentes, como os espelhos e o vidro. “Esses componentes auxiliam a trazer o ambiente externo para dentro”, explica Paley, que também se utiliza das grandes janelas para proporcionar o mesmo efeito integrador. “A madeira tem cor, textura e produz um ambiente aconchegante, o que muitas vezes é o que se espera de um quarto de hotel ou restaurante”, explica Paul Bentel, do escritório Bentel&Bentel, localizado em Locust Valley, nas proximidades de Nova York. O escritório, fundado há 50 anos por Frederick Bentel, abriga toda a família de arquitetos em um lugar que impressiona também pelo aconchego e o estilo de trabalho. Eles trabalham em parceria com o Instituto de Tecnologia de Nova York, e recebem arquitetos recém-formados para estágios, o que propicia uma integração entre o tradicional e o novo. No local, além dos projetos, os profissionais têm acesso a inúmeras amostras de todos os tipos de materiais, de pedras a vidros; tapete a madeiras; pastilhas a metais; para combinar nos ambientes. As amostras são enviadas pelas indústrias, e dificilmente eles selecionam algum material que não está mais em produção. “Nos seus projetos, também há a presença de outros componentes, como o vidro, “mas ele não aconchega”, alerta Frederick Bentel. Mas se a madeira dura americana tem tido boa receptividade nos ambientes comerciais, nos teatros ela reina absoluta. Além do já citado aconchego, ela é responsável pela qualidade sonora exigido dos locais. O escritório Fisher Marantz Stone, responsável por diferentes projetos, como o teatro do Four Seasons Centre, em Toronto, no Canadá, o Arshet Centre, em Miami, ou a reestruturação do Lincon Centre e do Radio City Musican Hall, em Nova York, fazem do material seu produto principal. “A madeira permite criar um ambiente confortável e aconchegante, o que faz dela insubstituível”, comenta Joshua Dachs. Além da madeira americana, o grupo já utilizou madeira brasileira em pelo menos um projeto. “Procuramos a tonalidade e a textura, e não a nacionalidade do material”, explica. Em um dos endereços mais luxuosos e caros do mundo, um andar inteiro do Empire State, na 5ª Avenida de Nova York, está instalado desde julho um dos escritórios de design e arquitetura da BBG-BBGM. “Estamos muito felizes de estar neste novo espaço. Somos uma empresa global, por isso nós decidimos por esse endereço”, explica Amy Jakubowski, sócia do escritório. Além deste endereço, também estão instalados em Washington; Scottsdale, no Arizona; Sydney, na Austrália e Shanghai na China. Seus projetos primam pela sofisticação e nobreza dos materiais. Linhas retas, e contrastes do claro e escuro também são componentes presentes. No portfólio, endereços luxuosos comprovam a tendência: o Trump International Hotel, em Duabai, nos Emirados Árabes; o Ritz Carlton, em Nova York; Hotel Sofitel Sukhumvt, em Bangkt, na Tailândia, entre outros. A indústria americana tem interesse e criar mais espaços de consumo da sua madeira nobre. Ao contrário do Brasil, onde o discurso reinante é que a utilização da madeira sólida é politicamente incorreta, por conta da devastação das nossas florestas, nos Estados Unidos o consumo da madeira nobre chega a ser uma necessidade. De acordo com o AHEC, as florestas estadunidenses são 90% maiores que há cinqüenta anos. Atualmente elas cobrem 279 milhões de acres, a maior parte localizada na metade leste do país. O volume de madeira de lei nas florestas americanas chega a 10,5 bilhões de metros cúbicos: volume 10 mil vezes maior que o do Empire State Building. Dos 306 milhões de metros cúbicos que crescem ao ano, são colhidos 180 milhões. A maioria das florestas de madeira dura abrigam mais espécies de árvores folhosas do que qualquer outra floresta de folhosas numa zona temperada no mundo. Toda sua produção é sustentável, palavra obrigatória para o consumo de bens naturais hoje em dia. Para dar vazão a esta consciência, os cursos da Rhode Island School of Design primam por sistematizar no ensino a utilização da madeira desde o início. Nos primeiros anos do curso de design de móveis, por exemplo, os alunos utilizam poucos equipamentos, apesar de serem totalmente disponíveis. Martelo e formão são as ferramentas mais comuns encontrados nas mãos dos alunos. Segundo o professor do departamento de design de móveis, Alphonse Mattia, é preciso que eles sintam a madeira sólida, entendam seu comportamento, para só então utilizar as máquinas. “Caso contrário será a máquina que irá dominá-los e não ao contrário”, justifica. Uma relação que não acaba no outro ano da faculdade, se perpetua pelos projetos recheados de madeira sólida vistos depois em hotéis e restaurantes espalhados pelo mundo.