PARECER N° 13.170 BENS PÚBLICOS. USO ESPECIAL POR PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO . FORMALIZAÇÃO DE LIAME JURÍDICO A SER CONSUMADO ENTRE ESTADO E CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO DE TELECOMUNICAÇÕES. LICITAÇÃO, PRAZO E REMUNERAÇÃO . REGULARIZAÇÃO DE RELAÇÕES DE NATUREZA FÁTICA JÁCONSTITUÍDAS. RECOMENDAÇÕES. 1. Os Senhores Secretários de Estado da Administração e dos Recursos Humanos e da Justiça e da Segurança encaminham a esta Procuradoria-Geral, solicitando exame e pronunciamento, expedientes administrativos versando sobre a utilização de bens públicos para a instalação de equipamentos de telefonia celular . A consulta é articulada através de quesitos, assim deduzidos: "I - o instituto jurídico a ser adotado para o uso do espaço público por parte das concessionárias de telefonia móvel (estão em foco os institutos da servidão, os' da autorização e da cessão de uso, sem prejuízo de outros a serem apontados pela PGE) ; “II - O prazo pelo qual poderão ser firmados os termos (com a observação de que, segundo Maria Sylvia di Pietro, na servidão a cláusula de prazo é inócua se persistir a utilidade pública, que parece-nos configurada por tratarmos de concessionária de serviço público - havendo, inclusive, previsão no Código de Águas relativamente a servidão para as concessionárias de energia elétrica; e a de que o prazo manifestado como sendo o ideal, para que o investimento privado seja compensado, foi o de cinco anos); “III- o preço que será cobrado das empresas de telefonia (reportamonos ao estudo anexado, onde há detalhamento dos estudos empreendidos pelo Departamento de Patrimônio); "IV- necessidade ou não de competitório público para a destinação de espaços, bem como a possibilidade de uso simultâneo dos próprios estaduais por mais de uma concessionária ; " V - a regularização das áreas do Estado já ocupadas por empresas de telefonia móvel ( a .forma como deverá dar-se, prazo, requisitos que deverão ser exigidos para a regularização ou prazo para desocupação, etc.) ". Acompanham o processo administrativo principal cinco outros, tendo estes por objeto o ressarcimento de valores devidos pela instalação já existente de antenas de telefonia móvel em próprios do Estado. Inicialmente distribuído em caráter ordinário, foi agora solicitada urgência no tratamento do caso, regime com que passa a ser enfrentado. É o relatório. 2. A temática proposta foi segmentada em tópicos e como tal será apreciada. " I - O instituto jurídico a ser adotado para o uso do espaço público por parte das. concessionárias de telefonia móvel (estão em foco os institutos da servidão, os da autorização e da cessão de uso, sem prejuízo de outros a serem apontados pela PGE)" A definição do correto instituto jurídico a revestir 8 a relação que se estabelece entre o Estado do Rio Grande do Sul e as concessionárias de serviço de telefonia móvel passa pelo conhecimento da categoria de bem público que se pretende utilizar . Consoante se depreende dos autos administrativos em exame, os imóveis do Estado em que já existem antenas de telefonia celular são todos de uma só espécie, qual seja, edifícios aplicados a serviço da Administração. Esses bens, destinados à consecução dos objetivos do Estado, tais como os em que se encontram instaladas suas repartições públicas ou onde se desempenham algumas de suas atividades precípuas ( escolas, hospitais, fortificações, canhões e outras armas, exemplifica Pontes de Miranda (1), constituem seu patrimônio indisponível e, na classificação quase centenária da Lei Civil Brasileira, recebem a denominação de bens de uso especial. Essa noção se faz importante porquanto os bens de uso especial, por submeterem-se a regime de direito público (assim como os bens de uso comum do povo), não se podem reger por institutos de direito privado. 1 – Tratado de Direito Privado, T. II. Borsoi, R.J., p. 155, 1954 Disso se infere que o uso de bens do domínio público de uso especial dar-se-á mediante a autorização, a permissão ou concessão de uso, títulos jurídicos públicos, e não privados, como o são a locação, o arrendamento e a enfiteuse, por exemplo. Com a exclusão dos institutos de direito privado, há condições de se adentrar no estudo da servidão e da cessão de uso, hipóteses jurídicas cogitadas pelo consulente, além da autorização, permissão e concessão já citadas. No que concerne à primeira delas, a servidão, existe um imperativo lógico a vedar sua aplicação na espécie: é modo de limitação da propriedade que recai sobre bem privado . Com efeito, ao conceituar a servidão, com propriedade anota Rafael Bielsa: "Um direito público real constituído por uma entidade pública sobre um bem privado, com o objeto de que é servir ao uso público, com uma extensão ou dependência do domínio privado." (2) (Grifou-se). Referindo também à natureza do bem sobre o qual incide a servidão, leciona Eros Roberto Grau: " A servidão administrativa ou pública e consubstancia um direito limitativo do Estado, definindo-se como uma restrição imposta ao particular quanto ao exercício de seu direito de propriedade sobre determinado bem. Daí dizermos que a servidão administrativa ou pública incide sobre a propriedade privada” (3) Servidão, portanto, não se harmoniza à relação jurídica em tela, haja vista serem públicos os bens de que se ora questiona. A cessão de uso, de outra banda, encerra diverso óbice a embargar sua aplicação. É o que se extrai da conceituação mesma do instituto, formulada por Hely Lopes Meirelles, como se vê: 2 . Apud Marcelo Figueiredo, in “Utilização de Subsolo para Passagem de Equipamentos Públicos – Aspectos Gerais e Desafios do Uso Compartilhado – Resenha Doutrinária e Jurisprudencial”, Revista Trimestral de Direito Público, nº 26, Malheiros, S.P., p. 188, 1999. 3“ Concessionária de Serviço Público – Bens Públicos – Direito de Uso”, Revista de Direito Administrativo, nº 218, R. J., p. 348, 1999. 3“ Concessionária de Serviço Público – Bens Públicos – Direito de Uso”, Revista de Direito Administrativo, nº 218, R. J., p. 348, 1999. "Cessão de uso é a transferência gratuita da posse de um bem público de uma entidade ou órgão para outro, a fim de que o cessionário o utilize nas condições estabelecidas no respectivo termo, por tempo certo ou indeterminado. É ato de colaboração entre repartições públicas, em que aquela que tem bens desnecessários aos seus serviços cede o uso a outra que deles está precisando. E prossegue: "Também não se confunde com qualquer das modalidades pelas quais se outorga ao particular o uso especial de bem público (...)” (4). (Grifou-se). Assim sendo, não se prestando a servidão e a cessão de uso aos fins colimados pelas partes, remanescem a autorização, a permissão e a concessão de uso, ao início referidas, como alternativas a serem estudadas. A autorização de uso, pela transitoriedade acentuada que a carateriza, bem assim por contemplar interesse privado do particular, mostra-se desde logo inservível àqueles misteres. Nessa direção, observa com acuidade Celso Antônio Bandeira de Mello: " Autorização de uso é o ato administrativo unilateral e discricionário, pelo qual a Administração consente, a título precário, que o particular se utilize de bem público com exclusividade. "( ...) A utilização não é conferida com vistas a atividade pública, mas no interesse privado do utente. Aliás, essa é uma das características que distingue a autorização da permissão e da concessão." (5)(Grifou-se). Certo, a exploração de serviços de telecomunicações por concessionária da União não guarnece interesses .predominantemente privados. Por isso mesmo, extreme de dúvidas, autorização de uso aqui não se terá. Restam, destarte, a permissão de uso e a concessão de uso. Diferentemente da autorização, a permissão de uso volta-se à finalidade pública da utilização do bem. 4 – Direito Administrativo Brasileiro, 26ª ed. Malheiros, S. P. p. 487, 2001 5 – Curso de Direito Administrativo, 8ª ed. Atlas, S. OS., P. 446, 1997. É o que ensina Maria Sylvia Zanella di Pietro, verbis: "Permissão de uso é o ato administrativo unilateral, discricionário e precário, gratuito ou oneroso, pelo qual a Administração Pública faculta a utilização privativa de bem público, para fins de interesse público. "( ...) Sendo ato precário, revela-se mais adequado nos chamados usos anormais em que a utilização privativa, embora conferida com vistas a fim de natureza pública, está em contraste com a afetação do bem ou com sua destinação principal." (6) (Grifos originais). De plano, emerge a permissão de uso como a alternativa que mais atine aos propósitos ora almejados, uma vez que o serviço de telecomunicações concedido é de interesse público e se concretiza através da tresdestinação do bem utilizado . Sucede, todavia, que em virtude de sua inerente transitoriedade, a permissão não se ajusta à prestação de serviço público de caráter permanente, como o é o de telecomunicações. Dela distingue-se substancialmente, todavia, a concessão de uso, que se dá quando o uso do bem público tem por fito a execução de atividade também pública, porém com outros contornos, como assenta a mesma autora: " A concessão é o instituto empregado, preferentemente à permissão, nos casos em que a utilização do bem público objetiva o exercício de atividades de utilidade pública de maior vulto e, por isso mesmo, mais onerosas para o concessionário. Este assume obrigações perante terceiros e encargos financeiros elevados, que somente se justificam se ele for beneficiado com a fixação de prazos mais prolongados, que assegurem um mínimo de estabilidade no exercício de suas atividades. Em conseqüência, a forma mais adequada é a contratual, que e permite, mediante acordo de vontades entre concedente e concessionário, estabelecer o equilíbrio econômico-financeiro do contrato e fixar as condições em que o uso se exercerá, entre as quais a finalidade, o prazo, a remuneração, a fiscalização, as sanções." (7) (Grifou-se). Dúvida não há, exige a prestação de serviços públicos de telecomunicações vultoso aporte de capital por parte da pessoa jurídica de direito privado que vier a explorá-la. Daí porque não poderá ficar esta à mercê de um vínculo excessivamente precário com o Estado, seja pela necessária amortização dos investimentos pela mesma realizados, seja pelo comprometimento da própria atividade fim que lhe compete desempenhar .Devendo obediência cogente ao princípio da continuidade do serviço público, a formação de um vínculo dotado de maior estabilidade é verdadeira condição de exequibilidade das obrigações contraídas pela concessionária de serviço. 6- Direito Administrativo, 8ª ed. Atlas, p. 446/1997 7 – Id, ib, p. 449 Exsurge a concessão de uso, pois, notadamente a concessão acessória de uso, assim denominada por se vincular a uma outra concessão, que é a de serviço, como a solução mais consentânea à relação aqui retratada. Talo que se depreende, ainda uma vez, do expendido pela aludida autora: "Pode-se falar, ainda, em concessão autônoma ou acessória, conforme seja ou não conjugada com uma concessão de serviço público; na acessória, o concessionário só pretende o bem como condição material da montagem de um serviço público, como se verifica na concessão da via pública ou do espaço aéreo para colocação de postes e lançamento de fios ou cabos, aéreos ou subterrâneos, de instalações elétricas de interesse público, bem como na concessão de águas públicas para aproveitamentos hidráulicos de interesse público." (8)(Grifou-se). Este, em síntese, o modelo jurídico que mais se afeiçoa ao objeto perseguido pelos interessados. II - O prazo pelo qual poderão ser firmados os termos (com a observação de que, segundo Maria Sylvia di Pietro, na servidão a cláusula de prazo é inócua se persistir a utilidade pública, que parece-nos configurada por tratarmos' de concessionária de serviço público -havendo, inclusive, previsão no Código de Águas relativamente a servidão para as concessionárias de energia elétrica; e a de que o prazo manifestado como sendo o ideal, para que o investimento privado seja compensado, foi ode cinco anos). Considerando-se, por evidente, prejudicado o questionamento no que diz com a servidão, tem-se aqui indagação cuja resposta veio de ser tangenciada no questionamento anterior. A concessão de uso, como visto, é geralmente firmada por longo prazo para resgatar o capital invertido na exploração da atividade pública. Esse prazo encontra uma primeira exigência no Estatuto das Licitações e Contratos, que textualmente dispõe: " Art. 57 - A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos: "(...) § 3° -É vedado o contrato com prazo de vigência indeterminado." (Grifou-se). Não prevê a lei, entretanto, um prazo especial para os contratos de uso de bens públicos. Na ratio da própria utilização, pois, poder-se-á defini-lo. _____________________ 8 – Id, ib, p. 450 Atente-se para o fato de que nos bens onde hoje se localizam e nos quais se pretende instalar outros equipamentos de telefonia móvel o Estado desenvolve atividade tipicamente pública ( o Presídio Madre Peletier, v.g., no qual já existe em funcionamento uma antena da Companhia Telefônica Celular). O uso intentado pela empresa, da mesma sorte, finalísticamente público será. Nessa ordem, a determinação do prazo deverá conjugar essa duplicidade de interesses, convencionando as partes aquele que lhe mais se afigurar conveniente. Por conseguinte, à falta de vedação legal, nada elide a que seja dito prazo fixado em cinco anos, nos moldes propostos pelo consulente, se for este o lapso temporal tecnicamente mais adequado à atividade desenvolvida. A determinação desse prazo não será inócua, adite-se, como se dá na servidão, até porque, precisamente em conseqüência dos interesses públicos visados, poderá ser prorrogado. "III - O preço que será cobrado das empresas de telefonia (reportamonos ao estudo anexado, onde há detalhamento dos estudos empreendidos pelo Departamento de Patrimônio)" O quantum a ser fixado pela utilização dos bens públicos em apreço guarda, por igual, características sobremodo peculiares. Isto porque não se trata, frise-se, de uma exploração comercial típica, na qual o Poder Público viesse a auferir espécie de vantagem pecuniária em sentido estrito. Não. Há, aqui, reprise- se, a utilização de bem público como meio para a prestação de serviço também público. Nesse passo, não pode a cobrança efetuada pelo Estado visar lucro, pena de repercutir na tarifa cobrada do usuário final dos serviços. Por esta razão é que Lúcia Valle Figueiredo, analisando a matéria sob a ótica da utilização de bens do Município, com acerto leciona: "Os valores seriam definidos levando em conta que as tarifas, que serão pagas pelos usuários, devem, em decorrência dos princípios constitucionais (Emenda n° 19/98) e determinação legal (Lei n° 8.987/95, art. 6°, § 1º), ser módicas. Portanto, os custos da passagem devem ser razoáveis. ______________________ 9 – “Telecomunicações e Infra-Estruturas: Arts. 73 e 74 da Lei nº 9.472/97”, Boletim de Direito Administrativo, nº 6, jun. NDJ, p. 425-428, 2001 “A cobrança será feita por preços públicos, e não por taxas. As taxas serão devidas, conforme já acentuamos, somente em função do poder fiscalizatório (licença de edificação e de instalação das infra-estruturas)."(9) ( Grifou-se ) . Na mesma senda, observa Vanêsca Buzelato Prestes, consignando: " A cobrança decorrente da utilização da via pública, das calçadas, do mobiliário urbano ou de outro espaço público por terceiros é preço público, sendo que este deve ser atribuído com razoabilidade e fundamentação, de modo que não seja vil ou extorsivo." (Grifou-se). O preço público exigível da concessionária de serviço público, pois, não encerrando teleologia tributária, representará retribuição com supedâneo no art. 68 do Diploma Civil Brasileiro. Sua determinação deverá ser feita através de legislação estadual (lei e decreto regulamentador), na qual serão definidas a utilização dos bens do Estado, os instrumentos, os prazos e outras condições afetas ao uso remunerado, podendo-se adotar como parâmetro para tal a Lei n° 8.712/01, editada no Município de Porto Alegre (v. doc. em anexo). Essa regra, saliente-se, vale não apenas para a fixação dos valores a serem cobrados nas concessões a serem ora firmadas, mas, do mesmo modo, deve nortear a definição das importâncias devidas pela já utilização de bens públicos. Tal é o que será abordado em "V" infra. " IV -necessidade ou não de competitório público para a destinação de espaços, bem como a possibilidade de uso simultâneo dos próprios estaduais por mais de uma concessionária" A necessidade de realização de certame licitatório decorre da viabilidade ou não de competição entre os potenciais interessados no uso dos bens em foco. No particular, a Lei n° 9.074, de 07.07.95, Lei Geral de Telecomunicações, garante ao concessionário o uso de bens necessários à execução de serviço ou de obra pública, prevendo até mesmo a possibilidade de desapropriação de bens móveis e imóveis para esta finalidade, como se vê: _____________________ 10 – “As Redes e Infraestrutura Aéreas e Subterrâneas e a Relação com o Poder Local – Obrigatoriedade de Licenciamento e Possibilidade de Cobrança pela Utilização do Bem Público”, Interesse Público, nº 7, Nota Dez, p. 179, 2000. " Art. 100 -Poderá ser decretada a utilidade pública, para fins de desapropriação ou instituição de servidão, de bens imóveis ou móveis, necessários à execução do serviço, cabendo à concessionária a implementação da medida e o pagamento da indenização e das demais despesas envolvidas." (11) Assim sendo, inexiste a possibilidade de qualquer entidade pública simplesmente impedir a instalação de equipamentos para o funcionamento daquele serviço público federal concedido. Não podendo fazê-lo, tem-se que deverá receber a todos quantos se apresentarem como e concessionários, a bem de se lhes facultar o uso de bens necessários à prestação de tais serviços. É dizer, em outras palavras, no tocante a telecomunicações, que a todo concessionário de serviço é assegurado utilizar-se, na qualidade de concessionário de uso, de bens públicos pertencentes ao Distrito Federal, aos Estados e aos Municípios. Não se forja, em conseqüência, como regra, disputa entre os concessionários a justificar a realização de procedimento licitatório para a entrega de bens a um só. Estudando a matéria em comento, Rogério Favreto refere o descabimento da licitação, apontando o caminho a ser adotado: "Destaca-se, ainda, a incidência de inexigibilidade de licitação para a concessão ou permissão de uso na utilização de espaços públicos, concretamente porque o Município, enquanto poder permitente, não pode estabelecer concorrência entre os interessados, já estes, na condição de concessionários de serviços públicos possuem o direito de a passagem. Entretanto, subordinam-se sempre, ao regramento .local que deve disciplinar por onde e a forma de passagem das redes de infra-estrutura, sem contudo inviabilizá-las, a fim de compatibilizá-las com o meio urbano. Logo, inviabilizada a competição, mas recomendável que o poder público, mormente quando esteja realizando ou qualificando determinada obra em via pública, faça convocação por edital publicado na imprensa oficial, a fim de oportunizar isonomicamente a todos os interessados e induzir a instalação consorciada (...).” (12)(Grifou-se). A inviabilidade de competição, em suma, com fulcro no caput do art. 25, combinado com o art. 26 da lei de regência, é a pedra de toque desta inexigibilidade de licitação. Em havendo, ao revés, convergência de interesses sobre um mesmo bem -por sua privilegiada e localização, v.g. -, bem este que não possa ser por ambos utilizado, compulsória será a instauração do competitório. ___________________________ 11 – Note-se que o mandamento alcança não apenas a bens públicos, como a bens privados – o que autoriza tecnicamente a referência à servidão. 12 – Redes de Infra-estrutura e Gestão Municipal”, artigo produzido para Seminário realizado em 13 e 14 do corrente em Porto Alegre. Quanto ao uso simultâneo de bens estaduais por mais de uma concessionária, tem-se configurada alternativa não somente viável, como até mesmo estimulada reflexamente pela já citada Lei Geral das Comunicações. É o que se flagra no precitado texto, ao disciplinar o compartilhamento de estruturas entre as prestadoras de serviço público: " Art. 147 -É obrigatória a interconexão às redes de telecomunicações a que se refere o art. 145 desta Lei, solicitada por prestadora de serviço no regime privado, nos termos da regulamentação. " "(...) Art. 150- A implantação, o funcionamento e a interconexão das redes obedecerão à regulamentação editada pela Agência, assegurando a compatibilidade das redes das diferentes prestadoras, visando à sua harmonização em âmbito nacional e internacional." Nesse diapasão, aduza-se, a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), a Agência Nacional de Energia Elétrica CANEEL) e a Agência Nacional do Petróleo CANP), editaram a Resolução Conjunta n° 001, de 24.11.99, aprovando o Regulamento Conjunto para Compartilhamento de Infra-estrutura entre aqueles setores, que em seu Anexo assim estatui : " Art. 4° - O agente que explora serviços públicos de energia elétrica, serviços de telecomunicações de interesse coletivo ou serviços de transporte dutoviário de petróleo, seus derivados e gás natural, tem direito de compartilhar infra- estrutura de outro agente de qualquer destes setores, de forma não discriminatória e a preços e condições justos e razoáveis, na forma deste Regulamento." "(...) Art. 7° -As infra-estruturas e os correspondentes itens passíveis de compartilhamento ficam divididos em três classes, da seguintes forma: “(...) II - Classe 2 dutos, condutos, postes e torres; (....)” (Grifou). " V - a regularização das áreas do Estado já ocupadas por empresas de telefonia móvel ( a forma como deverá dar-se, prazo, requisitos que deverão ser exigidos para a regularização ou prazo para desocupação, etc.)" Essa questão estende-se ao contido nos expedientes anexos ao principal, ao início referidos. A regularização das situações pretéritas, assim consideradas aquelas em que as empresas de telefonia celular de longa data servem-se de bens do Estado (mais precisamente os prédios em que funcionam a Secretaria da Justiça e da Segurança, situados nas Avenidas Pátria, n° 1358, e Sete de Setembro, n° 666, pelo Presídio Madre Peletier, na Av. Teresópolis, n° 2727, e pelo Instituto Geral de Perícias, nas Avenidas Presidente Roosevelt, n° 88, e Farrapos, s/nº, terá como requisito o respectivo pagamento por quem deles fez uso sem a correspondente contraprestação. Essa contraprestação, esclareça-se, não terá por fundamento a concessão de uso -que então formalmente inexistia -, mas se dará a título de indenização pela utilização já operada. Para tanto, cumpre adequar-se os ternos de ressarcimento já lançados nos expedientes sob exame (ressarcimento este que não se dará a título de "cessão de uso remunerada", como neles consta, pela óbvia razão de que inocorreu tal outorga pela Administração ), ternos que devem conter expressamente o período no qual houve a utilização anterior do bem e o correspondente valor indenizatório . Essa contraprestação, sublinhe-se, bem como a que será posteriormente estipulada para a concessão de uso, radica na limitação da fruição plena do bem por seu titular ou, como quer Celso Antônio Bandeira de Mello, na sobrecarga acarretada ao bem público pela utilização concorrente do particular . Nesse sentido, calha trazer à colação o magistério de Diogo do Amaral Freitas, cujo excerto do trabalho " A utilização do domínio público pelos particulares" vem por Adilson Abreu Dallari mencionado: "O fundamento deste dever de pagar uma quantia em dinheiro como retribuição do direito à utilização do domínio público é simples de entender e não se afasta, no essencial, daquele que alicerça idêntica obrigação a propósito dos usos comuns extraordinários. A sua justificação encontra- se luminosamente condensada nas palavras de Jèze, sublinhando que o particular no uso privativo não usa a coisa como todos os outros mas para seu proveito pessoal, esclarece: seria injusto que de uma utilização privativa de certa coisa pública, construí da e conservada com o dinheiro de todos os contribuintes, uma pessoa só extraísse vantagens exclusivas".(13) E, acresce, imediatamente a seguir , Adilson Abreu Dallari: "Essa situação não se altera absolutamente quando o uso especial é feito por uma empresa privada exploradora de serviço público. Nem mesmo haveria de ser gratuito se o serviço fosse operado diretamente por pessoa jurídica de direito público diferente daquela titular do domínio, pois os patrimônios públicos são diferentes, afetando diferentemente diferentes contribuintes."(14) (Grifou-se). _____________________ 13 – In Adilson Abreu Dallari, “Uso do Espaço urbano por Concessionárias de Serviços de Telecomunicações, Revista de Direito Administrativo”, nº 223, jn/mar., Renovar, R.J., p. 50-51, 2001. 14 – Id, ib, p. 51 Por derradeiro, não se pode olvidar que a desocupação do bem pelo concessionário (assim entendida a desocupação por inadimplemento reiterado da contraprestação já devida) não parece ser solução conforme ao regime legal incidente na relação discutida. Havendo trânsito assegurado ao concessionário de serviços relativamente à utilização de bens públicos, melhor se coaduna com a lógica do sistema recorram as partes à via judicial, dado que o ponto nodal da contenda não seria o usoocupação do bem -garantido por lei com vista a assegurar a prestação do serviço de telecomunicações -, e sim a satisfação do valor devido por quem dele se aproveita. Em conclusão, entendendo-se elucidadas todas as questões formuladas, tem-se que a concessão de uso é o instituto jurídico mais ajustado in casu, o qual deverá ter prazo fixado a termo certo, mediante a contraprestação de preço público razoável e, como regra, sem necessidade de prévio competitório. No que respeita ao uso não formalizado de bens imóveis do Estado, assume o ressarcimento caráter de indenização, quantificado nos mesmos parâmetros da concessão a ser ulteriormente celebrada. É o parecer . Porto Alegre, 03 de outubro de 2001. MARIA DENISE FEIX DE VARGAS, Procuradora do Estado Ref. Exp. Adm. nº 1678-24.00/01.5, 2017-12.00/00.7, 2018-12.00/01.0, 2019-12.00/01.2, 2020-12.00/01.0, 0138-12.00/00.9 Processo nº 000138-12.00/01.7 Acolho as conclusões do PARECER nº 13.170, da Procuradoria do Domínio Público Estadual, de autoria da Procuradora do Estado Doutora MARIA DENISE FEIX DE VARGAS. Encaminhe-se o expediente ao Excelentíssimo Senhor Secretário de Estado da Justiça e da Segurança. Em 23 de novembro de 2001. Paulo Peretti Torelly, Procurador-Geral do Estado.