Disciplina Evolução – Módulo II Prof. Carolina Voloch Filogenia A sistemática é a ciência que une a taxonomia, ou seja, a ciência da classificação dos organismos, com a filogenia, a ciência que traça a história evolutiva dos organismos. Assim, os sistematas fazem a taxonomia baseada na filogenia. Como a filogenia reflete a história evolutiva dos organismos e determina as relações de parentesco entre os animais ela é o traçado histórico das espécies de um determinado grupo, a divisão desse grupo em subgrupos deve ser baseada em história evolutiva também. Mais especificamente, as diferentes categorias da taxonomia, como gêneros, famílias, ordens, etc. devem conter espécies que têm uma maior proximidade evolutiva entre si do que com outras espécies de outras categorias. Para conseguirmos estabelecer quais espécies são mais próximas evolutivamente precisamos estudar as características de todas as espécies em questão. A comparação entre as características das espécies é que vai nos mostrar a proximidade entre elas e, portanto, suas relações de parentesco. Em sistemática, características são chamadas de caracteres. Os caracteres apresentam estados que nada mais são do que as variações que os caracteres apresentam nas espécies. É importante ressaltar que a escolha dos caracteres a serem usados para a sistemática de um grupo é de fundamental importância. Como nós não sabemos qual é a verdadeira hipótese de relacionamento filogenético entre as espécies podemos apenas inferir, e isto, muitas vezes, pode não se aproximar da história evolutiva real. É por isto que muitos métodos de reconstrução filogenética foram desenvolvidos. A intenção dos pesquisadores é poder chegar o mais próximo possível da história evolutiva verdadeira. Na escola cladística são feitas distinções de caracteres, e de seus estados. Os caracteres que são derivados (i.e., sinapomorfias) e são compartilhados por um ancestral e todos os seus descendentes. Estados de caracteres primitivos (i.e., plesiomorfias) são aqueles que estão presentes nos grupos ancestrais. A comparação com o grupo externo pode determinar quais estados dos caracteres analisados são derivados ou primitivos (estão presentes nos grupos externos ao seu grupo). A sinapomorfia é um conceito extremamente importante, pois ela define grupamentos monofiléticos. Porém essas noções são relativas. Por exemplo, se estivermos estudando o grupo dos marsupiais a presença de glândulas mamárias é uma plesiomorfia já que é compartilhada por todos os mamíferos. Da mesma forma, a presença de glândulas mamárias é uma sinapomorfia de mamíferos quando estamos comparando todos os vertebrados. Caracteres homoplásicos são aqueles que apareceram mais de uma vez na evolução do grupo. Estes caracteres são muito parecidos, mas não tem uma origem em comum, pois surgiram independentemente, como as asas das aves e dos morcegos e as nadadeiras de tubarões e golfinhos. Estas características têm uma mesma forma e muitas vezes a mesma função, mas tem origem diferente. Nesta atividade vamos poder praticar nosso conhecimento de sistemática filogenética e construir uma hipótese de relacionamento entre um grupo de espécies hipotéticas. Para isto, a turma deve se dividir em grupos e cada grupo lançará sua hipótese de relacionamento entre as espécies usando os métodos descritos a seguir. É muito importante que estejamos trabalhando com espécies não reais para que possamos perceber que a filogenia encontrada por cada grupo pode ser diferente dependendo das características escolhidas e seus estados. Para construir uma filogenia, o primeiro passo é a escolha dos caracteres a serem analisados. Para isso devemos fazer uma Matriz de Caracteres. Essa matriz deve descrever o estado de cada caráter observado nos organismos. Para facilitar o entendimento vamos exemplificar a diferença entre o caráter e o estado de caráter. O caráter é o foco da variação. Por exemplo, caracteres são 1) cor da barba, 2) cor do olho, 3) quantidade de membros, 4) bigode, 5) forma da mancha nas costas, 6) quantidade de manchas nas costas, etc. Por outro lado, nos mesmos caracteres acima, os respectivos estados de caracteres são os estados (=tipos) que os caracteres podem assumir em um determinado indivíduo: 1) cor de barba preta, cor de barba branca, barba loura, barba ruiva, 2) olhos azuis, olhos pretos, olhos verdes, olhos castanhos, 3) 4 patas, 6 patas, 2 patas, 4) presença de bigode, ausência de bigode, 5) forma arredondada, forma oval, 6) 6 manchas, 10 manchas, e assim por diante. Os estados de caráter devem ser em número suficiente para englobar toda a variabilidade observada em toda a diversidade a ser estudada. Ou seja, todos os tipos que cada uma das espécies apresentar devem representar um único estado de caráter. Vamos observar atentamente o exemplo que segue. Neste caso, estamos observando organismos hipotéticos (irreais), os Camináculos . Esses organismos foram especialmente desenvolvidos para estudos teóricos de filogenia por Camin no início dos anos 80. 1 2 3 4 5 Cada um desses organismos é diferente, e podemos facilmente notar o que os torna diferentes. Por exemplo, sabemos que o organismo 3 possui manchas em seu dorso e o 2 não as possui. No intuito de facilitar essa comparação entre os organismos vamos fazer agora uma matriz de caracteres, com cada uma dessas características que diferenciam os organismos. 1 2 3 4 5 Não Sim Sim Não Não A) Presença de chifre B) Presença Não Sim Sim Sim Não Não Não Sim Sim Não Não Sim Sim Não Não Não Sim Sim Não Não 1 2 2 1 2 de mãos C) Manchas nas costas D) Cotovelo arqueado E) Garras nas pontas dos dígitos dos membros superiores F) Quanidade de pernas Quanto mais características possuir a matriz mais precisa será a construção da árvore. Construída a matriz é hora de reconstruir a filogenia. Nesta atividade você irá construir árvores filogenéticas através do algoritmo da Parcimônia. Escolheremos apenas quatro organismos para analisarmos, com a finalidade de diminuir o universo de árvores possíveis. Devem ser construídas todas as árvores possíveis. O número de passos para cada característica deve ser contado em cada árvore. A(s) árvore(s) que apresentar(em) o menor número de passos no total deve(m) ser escolhida(s). Por exemplo pegaremos apenas as espécies 1, 2, 3 e 4. O universo de árvores possíveis é apresentado na figura 1. Figura 1: 1 2 1 2 1 3 4 1 3 3 4 2 1 3 4 2 2 1 4 2 3 1 4 3 2 2 4 1 4 2 3 4 3 3 4 2 1 3 4 1 3 2 1 4 2 4 1 3 3 1 2 4 2 4 3 1 3 4 1 2 Analisaremos primeiro as características A, D, E e F (Figura 2). Observe que estas quatro características apontam para a mesma relação entre as espécies em questão, ou seja, estão presentes nas espécies 2 e 3, e não estão nas espécies 4 e 1 (veja tabela). Por isso, podemos analisa-las ao mesmo tempo. IMPORTANTE: você só poderá analisar em conjunto características que indiquem a mesma relação entre as espécies!!! Analisemos agora a característica B. Perceba que esta característica separa o organismo 1 dos demais. Chamamos esse tipo de característica de Singleton. Isso porque, como pode ser observado na figura 3, independentemente da posição do organismo 1 nas árvores, essa característica sempre corresponderá a um passo no ramo terminal desse organismo. Isso significa que independente da topologia, essa característica não alterará o número de passos na árvore, pois em todas as possibilidades o número de passos relacionados a essa característica é sempre um. Como a parcimônia diferencia as árvores pelo número de passos, essa característica não será informativa para o método de parcimônia. Características como A, C, D, E, e F, que agrupam os organismos em dois grupos cada um deles contendo pelo menos dois representantes são chamadas de Informativas para Parcimônia. Quando o objetivo é a construção de uma árvore filogenética por parcimônia devemos nos preocupar em ter o máximo de características informativas possível. Pois, são essas características que irão alterar o número de passos nas diferentes topologias. A figura 4 mostra a análise da característica C. Figura 2: Análise das características A, D, E e F. 1 1 2 2 3 4 1 4 1 3 4 2 7 4 2 4 1 4 3 3 2 3 3 2 13 4 1 3 3 2 2 3 4 2 1 2 1 4 1 2 4 4 1 2 12 4 1 3 3 14 4 2 9 11 4 4 6 1 2 10 1 2 8 3 1 3 5 2 1 3 15 4 3 1 3 Figura 3: Análise da característica B 1 1 2 2 3 4 1 4 1 3 4 2 7 4 2 4 1 4 3 3 2 3 3 2 13 4 1 3 3 2 2 3 4 2 1 2 1 4 1 2 4 4 1 2 12 4 1 3 3 14 4 2 9 11 4 4 6 1 2 10 1 2 8 3 1 3 5 2 1 3 15 4 3 1 3 Figura 4: Análise da característica C 1 1 2 2 3 4 1 4 1 3 4 2 7 4 2 4 1 4 3 3 2 3 3 2 13 4 1 3 3 2 2 3 4 2 1 2 1 4 1 2 4 4 1 2 12 4 1 3 3 14 4 2 9 11 4 4 6 1 2 10 1 2 8 3 1 3 5 2 1 3 15 4 3 1 3 Para finalizar devemos escolher a(s) árvore(s) que apresenta(m) o menor número de passos. Para isso devemos somar o número de passos para cada característica em cada uma das árvores. Como resultado desse exemplo temos 5 árvores igualmente parcimoniosas (figura 5). Isso quer dizer que todas elas exigem o mesmo número de passos para explicar a evolução das características analisadas. Figura 5: Árvores mais parcimoniosas 3 B 1 ADEF C 4 8 ADEF C 2 3 C B C 2 3 10 ADEF 4 1 3 C C B 2 1 4 13 ADEF C BC 1 9 ADEF B 4 2 3 1 C C 4 3 2 Agora vamos construir uma hipótese de relacionamento entre outros camináculos usando a mesma abordagem do exemplo. O primeiro passo é a construção de uma matriz de caracteres. Para isto faça um quadro com todos os seis camináculos, selecione as características a serem usadas e determine seus estados. É importante usarmos pelo menos 10 caracteres (no mínimo 5 caracteres informativos para a parcimônia). Para a analise de parcimônia serão usadas apenas quatro camináculos, são elas: 1, 3, 4 e 6. Depois de construir a matriz de caracteres, utilize o quadro a seguir para indicar nas árvores possíveis a presença dos caracteres que você criou. Some o número de passos verificado para cada uma das árvores. Escolha a(s) árvore(s) com menor número de passos como foi mostrado no exemplo. Depois de construídas as árvores comparem seus dados com os dados dos outros grupos e vejam se existe alguma discrepância. Estas diferenças encontradas serão devido à escolha dos caracteres pelos grupos. Note que o mesmo acontece quando fazemos a filogenia de espécies reais. Esta mesma matriz de caracteres (com seis camináculos) será usada para o cálculo das distâncias e a construção da matriz de distancias usada para a construção pelo método do UPGMA. 1 6 1 6 1 3 4 1 3 3 4 6 1 3 4 6 6 1 4 6 3 1 4 3 6 6 4 1 4 6 3 4 3 3 4 6 1 3 4 1 3 62 1 4 6 4 1 3 3 1 6 4 6 4 3 1 3 4 1 6