10 "Apropriação de segmentos da arte visual por parte dos criativos de vídeo" ou Um minuto e dezasseis segundos com a imagem de Manoel de Oliveira Margarida Leão ABSTRACT This paper describes and interprets contemporary artworks that represent identity "O cinema só trata daquilo que existe, não daquilo que poderia existir. Mesmo quando mostra fantasia, o cinema agarra-se a coisas concretas. O realizador não é criador, é criatura" Manoel de Oliveira Notícias Magazine (DN) / 20040509 "APROPRIAÇÃO DE SEGMENTOS DA ARTE VISUAL POR PARTE DOS CRIATIVOS DE VÍDEO" ou Um minuto e dezasseis segundos com a imagem de Manoel de Oliveira No entanto e apesar da afirmação de Manoel de Oliveira, é assumido que a primeira função da imagem é documentar, isto é, criar algo que transporte informação e que por isso traga na sua génese a inscrição e o registo de um acontecimento observável ou verificável. As imagens funcionam assim, num contexto de espírito de recolha que informa sobre diferentes modos de documentar fatos, artísticos ou não, mas que ao serem passíveis de documentação se tornam passíveis de se tornarem objetos de arte. A vocação que o discurso antropológico ocidental possui para tudo documentar abriu o caminho para a representação cinematográfica de outros territórios e culturas. O vídeo “popularizador” podia apresentar mundos não popularizados, deixando-nos ver e sentir civilizações / atos culturais tidos como estranhos. Como afirmam Sturken e Balwart(2008): “Este medium tem atravessado décadas e tem-se misturado e confrontado, desde o seu início, com a televisão ou o cinema experimental” (2008:25) Revista Diálogos com a Arte - revista de arte, cultura e educação, n.º 3 128 Em pouco tempo (no conceito histórico) o vídeo documental e/ou experimental tornou o obsoleto mapa-mundo num mundo conhecido e familiar e sobretudo de fácil acesso e como produto da ciência e da cultura de massas, este tipo de cinema combinava as viagens com o conhecimento, as viagens com o espetáculo, e transmitia a ideia como afirmam Shohat & Stam (2002) do "mundo como exposição" (2002: 122 e 125). A necessidade de preservar em documentos visuais quer os modos culturais de comportamento humano que ainda permanecem na cultura humana e formam, por vezes, expressões diversas/divergentes/ ocasionais / únicas de capacidades humanas fundamentais, quer os documentos sobre sociedades que se modernizam informam-nos sobre um largo leque de diferentes possibilidades do desenvolvimento humano, particularmente aquelas que desempenham um papel na criação/transformação dos modelos de organização das nossas sociedades. Se recordarmos tempos mais próximos da nossa História e logo após a revolução de 75 e como se refere Dinis Guarda (2008): “tentando recuperar o tempo perdido, enveredou(se) pelo mesmo modo de híperexposição presente nas sociedades contemporâneas, fotografando-se e filmando-se como nunca, entrando de rompante pela sociedade da imagem” (2008:7) ligados às transformações sociais económicas, permitindo-nos aprofundar os nossos conhecimentos sobre a maneira como o homem se passou a integrar num novo mundo, opondo-se às suas transformações ou integrando as que ele mesmo engendrou. Estes novos modos de documentar e observar os momentos históricos da vida, tendo evoluído com a tecnologia, talvez venham a mudar mais rapidamente pois o conhecimento muito parcial da dinâmica de uma tal evolução ou do seu significado obrigar-nos-á a optar pela escolha da sua orientação, a recorrer a decisões arbitrárias mas a documentação vídeo vai permitir que tal não aconteça pois como afirmam Sturken e Balwart (1999): “A arte vídeo dos anos 60-70 surgiu numa convergência de otimismos, desde a crença recém-descoberta no poder da vanguarda até ao discurso profundamente retórico da revolução nas comunicações. Ativistas que em final da década de 60 e inícios de 70, pegavam em câmaras de vídeo e sentiam que o equipamento em si falava do seu potencial revolucionário” (1999:24). No entanto regista-se uma evolução da imagem vídeo provocada pela evolução tecnológica que evolui mais rapidamente ainda do que as culturas. A função inicial de transmissores de informação que caracteriza os primeiros vídeos de investigação torna-se narrativa nos vídeos de exposição em que se trata de expor, ou reexpor, os resultados já elaborados, isto é, no fato de que se passa para um outro média, ou para o público por meio de um outro média através de um discurso mais semelhante ao da apresentação científica. Revista Diálogos com a Arte - revista de arte, cultura e educação, n.º 3 129 O vídeo documental ou experimental transmite e expõe com maior clareza, veemência e eficácia determinados aspetos da atividade humana do que o fariam um texto ou um discurso oral. Daí que se possa afirmar, como faz Nuno Aníbal Figueiredo (2008) que: “Falar em “vídeoarte” é pois, uma desculpa como outra qualquer para abordar o trabalho que os artistas fazem usando o vídeo como forma de expressão artística.” (2008:20) Temos de reconhecer nos vídeos documentais características não só de qualidade instrumental, mas também de natureza simbólica com a utilização de sistemas de símbolos e modo de estruturação, "gramática das imagens" (modos de construção da mensagem, caráter apelativo das imagens) que se vão mostrar úteis à pesquisa e à comunicação científica como confirmam Sturken e Balwart (1999): “De qualquer dos modos, enquanto dispositivo, o vídeo transforma-se em meio de expressão, em arte.” (1999:21) Na grande maioria dos vídeos o modo expositivo de representação pretende transmitir a impressão de objetividade, de racionalidade fundamentada, de uma necessária tendência para a generalização imposta pelo comentário e fundamentada nos exemplos concretos presentes pela imagem. O fato de usarem uma economia de linguagem para esquematizar a problemática em discussão permite apresentar questões de modo sucinto e simultaneamente enfático, ao eliminar a referência ao processo através do qual se produz, organiza e regula o conhecimento. Quando o elemento de criação artística surge na produção do vídeo liberta-o do caráter de registo, de instrumento da história que a televisão e o cinema de alguma forma lhe impuseram. Daí que Dinis Guarda (2008) afirme: "Se o vídeo como um meio artístico tem futuro é uma questão irrelevante. Contudo, atitudes artísticas que experimentam novos meios e envolvem a arte em estruturas sociais contemporâneas parecem feitas para durar. As preocupações dos artistas ficam desenquadradas à medida que novos meios surgem e estruturas são transformadas. O desenvolvimento de novos formatos e canais de distribuição para o trabalho artístico sugere que a nova tarefa para os artistas se prenderá progressivamente com a questão da interatividade, usando principalmente as possibilidades do digital e da internet, bem como os arquivos de imagens que se tornaram mais acessíveis do que nunca anteriormente na história.” (2008:58 e 59) Conclui-se, assim que é esperado que o espetador nutra expetativas, julgando-se perante um mundo com uma única racionalidade e com um conjunto de lógica causa-efeito, antecedente-consequente, e diante da solução para um problema ou enigma que ainda não se levantara no seu espírito… BIBLIOGRAFIA Avila, Renato Nogueira Perez, A Arte do Vídeo Digital, Brasport (8574521469) Ella Shoat e Robert Slam (2002). “Narrativizing visual culture. Towards a polycentric aesthetics”. In Nicholas Mirzoeff (ed.) The visual culture reader. Londres e Nova Iorque: Routledge Revista Diálogos com a Arte - revista de arte, cultura e educação, n.º 3 130 Figueiredo, Nuno Aníbal, Video arte em jogo in Videoarte em Portugal e Filme de Arte e Ensaio em Portugal - Um Projecto, Número – Arte e Cultura com Concepção e Direção de Dinis Guarda, Gráfica Maiadouro ISBN: 978-972-97705-8-6 (pg 20 a 23) Haller, A. Robert, Art in Cinema, Documents Toward a History of the Film Society Final Selection, Editing, and Introduction by Scott MacDonald Original Idea and Selection of Material, Temple University Press,1601 North Broad Street, Philadelphia PA 19122 Manoel de Oliveira dances with Sweet and Tender http://www.youtube.com/watch?v=NDFDpXITOoA&feature=player_embedded - acedido em 05/11/2012 Mello, Christine, Extremidades Do Video, Senac, 2008 Mourinha Jorge, Journal de France, o diário em imagens do fotojornalista Raymond Depardon in Publico pg 31, em 26/10/2012 Silva, Henrique, As novas tecnologias na arte, Maio 2005 –http://www.ateliergondar.com/escritos.html- acedido em 11/11/2012 Silva, Henrique, Da Evolução das Imagens e Conceitos, Julho 2007 http://www.ateliergondar.com/escritos.html - acedido em 11/11/2012 Sturken, Marita, Glaciant Balwart, Vídeo Art in the 1960s/1970s, Fundação de Serralves, 1999. http://www.memoriafutura.org/temas/memorias_futuras/ acedido em 17/11/2012 Videoarte em Portugal e Filme de Arte e Ensaio em Portugal - Um Projecto, Número – Arte e Cultura com Concepção e Direcção de Dinis Guarda, Gráfica Maiadouro ISBN: 978-972-97705-8-6 Revista Diálogos com a Arte - revista de arte, cultura e educação, n.º 3 131