Gangnam Style Monica Baumgarten de Bolle Economista, Diretora do IEPE/Casa das Garças e Professora da PUC-Rio (Publicado no Globo a Mais de 02/10/2012) Se você não é uma das 320 milhões de pessoas que já assistiram ao vídeo de PSY, o rapper coreano que acabou de entrar para o Guinness, está na hora de se atualizar. A batida contagiante, a música que gruda no ouvido, embora não seja possível entender patavina do que o cantor diz – ele canta, obviamente, em coreano – o visual bregachique-moderninho, a coreografia cômica, elementos que o tornaram o mais bemsucedido entre os bem-sucedidos integrantes do K-Pop, como é conhecido o ultradinâmico movimento de cultura popular do país asiático. Entre aparições em programas de ampla divulgação no Ocidente, como o norte-americano Saturday Night Live, e como fonte de inúmeras análises no Wall Street Journal, no Financial Times e em outros periódicos de grande circulação, PSY virou um fenômeno global. Mais que isso, PSY é, como já foram outras figuras do K-Pop, o símbolo da marca coreana, do “made in Korea”. Comprar produtos coreanos é legal, é hip. Está na moda. É a indústria criativa dando uma mãozinha para a indústria tradicional... A Foreign Affairs, a prestigiada revista norte-americana que trata de assuntos de política externa criada na década de 20, acaba de publicar um longo artigo sobre o “Gangnam Phenom”. Há vários relatos interessantes. Como se sabe, a Coreia do Sul é líder na produção e na exportação de diversos produtos eletrônicos e de tecnologia de ponta, além de possuir uma portentosa indústria naval. Pois bem. Uma pesquisa recentemente conduzida pela Câmara de Comércio da Coreia com cerca de 300 companhias sediadas no país concluiu que mais de 50% consideram o K-Pop fundamental para as suas vendas. Outra pesquisa feita pela Associação de Comércio Internacional da Coreia com consumidores de países do leste asiático, excluindo a Coreia, apurou que cerca de 80% dos indivíduos incluídos na enquete são diretamente influenciados pelo K-Pop. Estas pessoas compram mais bens com o rótulo “made in Korea” por associarem a marca à modernidade, à inovação, ao estilo, enfim, à moda. Diante destas evidências, o Ministério da Cultura, do Esporte e do Turismo da Coreia uniu forças com a Federação das Indústrias Coreanas para formar a Secretaria da Diplomacia Cultural. A ideia é promover as exportações do país no mundo todo, sobretudo na Ásia, onde a Coreia já ultrapassou os EUA como o principal país exportador para a China. Como diz o artigo da Foreign Affairs, a Coreia, um país pequeno, com uma língua que ninguém fala, virou moda e converteu isso em ganhos comerciais de uma forma incrivelmente eficaz. Por lá, a indústria não sofre, embora o won, a moeda coreana, tenha se valorizado contra o dólar bem mais do que o real desde o início do ano. A indústria coreana vai muito bem, obrigada. Agora, imaginem. Dadas as nossas origens africanas e ibéricas, somos um país musical. E tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza. Em fevereiro, tem Carnaval. Uma festa recentemente revigorada pela espontaneidade dos blocos de rua, que, é verdade, espantam muitos moradores da cidade maravilhosa devido aos arroubos de incivilidade e falta de educação que às vezes acometem os foliões... bem, mas isso é outro assunto. A música brasileira é mundialmente reconhecida. Disso ninguém discorda. O “made in Brazil” tinha tudo para ser hip, moderno, cool. Mas, infelizmente, falta-nos a capacidade de vender essa imagem. Não temos Gangnam Style. Não temos Style. Temos lobbies industriais, grupos que pressionam o governo por medidas protecionistas e autoridades que se comprazem em aquiescer a estes pedidos. Temos, como destacou recentemente Miriam Leitão em sua coluna, mais de um milhão e meio de jovens analfabetos no País. Analfabetos. Jovens que não sabem ler. Jovens que poderiam ser a nossa esperança de um B-Pop, um movimento cultural legítimo, nascido da melhoria educacional. Um B-Pop que pudesse suplantar o modelo ultrapassado de lobbies e protecionismo para salvaguardar a nossa indústria. Não, não temos isso. Como, se entre 2009 e 2011 caiu o número de jovens adolescentes matriculados nas escolas? A Coreia tem um dos melhores sistemas educacionais do mundo, e está constantemente entre os primeiros lugares do PISA, o exame internacional que avalia o desempenho dos alunos no ensino médio. É assim que eles produzem engenheiros navais, engenheiros eletrônicos, profissionais das áreas de ciências exatas e, também, muita gente criativa. A criatividade não brota apenas do talento inato. A criatividade é desenvolvida e aprimorada pelo conhecimento. Excelentíssima Presidente Dilma Rousseff, por favor, veja o vídeo de PSY. É fácil, está aqui: http://www.youtube.com/watch?v=9bZkp7q19f0. E não deixe de ler o artigo da Foreign Affairs. Depois converse com o seu Ministro da Indústria, do Comércio e do Desenvolvimento e com o seu atual Ministro da Educação. Ele também é economista. Decerto vai entender a mensagem. P.S.: Inclua a nova Ministra da Cultura apenas se ela conseguir aprender a coreografia de Gangnam Style...até os marinheiros tailandeses já aderiram.