PARTILHA DE JIMMY K.
NO JANTAR DO 20º ANIVERSÁRIO DE NA
em Los Ángeles, 18 de Agosto de 1973
Ou, breve história de Narcóticos Anônimos contada por um
de seus co-fundadores, membro de A.A.
O meu nome é Jimmy Kinnon, sou um adicto e um alcoólico.
Há já uma hora que estou à beira das lágrimas. Mas hoje já não
envergonho de chorar, desde que sejam vertidas por algo que valha a
pena. Já nem me lembro do que queria dizer. Na nossa Irmandade
não podemos, todavia, perder de vista o nosso principal propósito:
quer estejamos num ambiente social em nossas próprias casas, ou
num encontro como este. Aquilo de que tenho de lembrar-me,
pessoalmente, é de que estou aqui graças a pessoas que nunca aqui estarão. O recém-chegado
constitui o sangue vital desta organização; sempre o foi, sempre o será. Aqueles a quem
chamamos Servidores de Confiança de Narcóticos Anónimos, alguém que aceita um cargo
(quer seja secretário de um grupo, representante de um grupo, custódio ou qualquer outra
coisa) deve preparar-se para bastante trabalho, muitas críticas, e muito daquilo que acontece
sempre. Mas nós temos de crescer, e os nossos ombros ficam suficientemente largos para
agüentarem estas coisas, pois a vida que nos é dada faz com que tudo valha a pena. Se não
tivesse sentido e não valesse a pena, eu não estaria aqui esta noite. Se este programa não me
elevasse, não me levasse mais longe, e não me fizesse sentir melhor do que alguma coisa
alguma vez conseguiu na minha vida, eu não estaria aqui. Tenho a certeza disso! Estou aqui
sentado nesta cadeira - sempre admirei estas cadeiras e nunca pensei poder vir a sentar-me
numa.
Mas primeiro as primeiras coisas, dizem - sabem, isto é parte de um sonho tornado
realidade; e um sonho prenuncia grandes mudanças, mas o progresso requer pequenas ações.
Um sonho não se torna realidade devido a um grupo de pessoas, ou a um homem, ou a dois
homens, ou a três homens. Torna-se realidade porque nele trabalham muitas pessoas, porque
muitas pessoas põem nele esforço, porque muitas pessoas compram a idéia e levam-na por
diante. Essa é uma das razões porque estamos aqui.
A maioria de vocês reparou numas fotos ali penduradas. São algumas das fotografias
dos nossos primórdios. Nós começamos muito antes de NA se tornar uma realidade, mesmo
Página 1 de 10 em nome. Surgimos de uma necessidade. Aqueles de nós que eram membros, tinham vindo
para A.A. - e descobrimos que podíamos nos recuperar. Em AA descobrimos que muitos
adictos continuavam a seguir o trilho da degradação e da morte. E achamos que deveríamos
fazer algo. Mas, sabem, nós somos pessoas engraçadas, quanto mais coisas tentamos fazer
juntos, mais lutamos uns com os outros e mais nos magoamos uns aos outros, destruindo
justamente aquilo que tentamos construir. E essa tem sido a história de Narcóticos Anónimos
até há bem poucos anos. Destruíamos no mesmo ritmo em que construíamos. Nós somos
pessoas assim e precisamos reconhecer isso para podermos nos recuperar. Todos nós
devemos conhecer a natureza da doença, a natureza do adicto, e a natureza da recuperação.
Todas essas coisas são necessárias para crescer, para viver e para mudar. E nós começamos
com ressentimentos; os ressentimentos fizeram-nos crescer. Antes de NA havia os DFH, os
Grupos de Drogas Formadoras de Hábito. Estes eram clandestinos, havia duas ou três
pessoas que se reuniam em apartamentos, aqui e ali. Ninguém sabia onde ficavam, e eram
dominados por uma ou duas pessoas. Nós não apreciamos grandemente a autoridade, não
gostamos dela. Algumas das pessoas que eu conhecia da rua, da parte oriental de Los
Ángeles, formaram um outro grupo conhecido por Adictos Anónimos (NT.: este grupo não se
refere ao grupo com o mesmo nome formado em Lexington em 1947. Ver tópico 4)
Infringiram o nome de AA e morreram muito depressa pois estavam demasiado dominados
por um só indivíduo. Um outro grupo começou no vale (San Fernando Valley) que também
se chamava DFH e era dominado por um indivíduo. Por isso descobrimos muito cedo, e a
nossa experiência ensinou-nos que não podemos ter pessoas a mandarem, tipos importantes
em Narcóticos Anónimos. Durante uns tempos depois de nos formarmos - há muita coisa que
se passou de que não vou falar esta noite - mas devido a algumas coisas que aconteceram, e à
natureza do adicto, a natureza da nossa doença, algumas pessoas foram colocadas numa
posição em que voltaram a ser líderes, o Grande Pai Branco. Sabem, nós não podemos ter um
Grande Pai Branco ou uma Grande Mãe, isso não funciona nesta organização. E, NA morreu
mais uma vez, e os nossos amigos em A.A. nos ajudaram a levantar, e nos disseram, "Não
deixem que isso os incomode". Esses eram os nossos verdadeiros amigos no início;
membros de A.A. que acreditavam em nós, membros de A.A. que tinham também um duplo
problema e reconheciam isso - vieram e ajudaram-nos a começar de novo. Mas isso voltou
a acontecer. Uma pessoa tentava dominar todo o movimento. E sempre que acontecia nós
começávamos a morrer. Porque as Tradições vão pelo cano abaixo quando tentamos isso. E
uma das primeiras coisas que dissemos quando nos reunimos como grupo naquela casa, a
prioridade número um, era que acreditávamos que este programa de Doze Passos iria
funcionar para adictos bem como para alcoólicos. Em segundo lugar, as Tradições deverão
ser observadas se quisermos crescer, crescer como Irmandade que se mantém de pé sozinha,
sem a ajuda de Alcoólicos Anónimos. Podíamos tomar o nosso lugar enquanto Irmandade, e
não sermos dominados ou afiliados a nada nem a ninguém. E dissemos que iríamos manter
uma sala aberta durante pelo menos 2 anos, e se nesse período um ou dois adictos
Página 2 de 10 mostrassem que este programa dava bom resultado para eles, teríamos achado que havia
valido a pena. Foi basicamente assim que começamos. Mas discutimos durante cerca de seis
semanas antes de pôr aquelas orientações no papel, e depois não as quisemos. Eu achei que
quanto mais cedo nos víssemos livres das orientações, tanto melhor; pois as orientações
contidas nas Tradições são suficientes para aquilo que precisamos fazer. As Tradições irão
salvar-nos de nós próprios. E é isso que é tão necessário para uma Irmandade como a nossa.
Deste lado fica a vida - o outro caminho é a morte, tal como a conhecemos. Mas como é
difícil não voltarmos atrás! Tão difícil que é!!!
O primeiro assunto pendente que tínhamos quando nos juntamos era o nome. Eu fui o
primeiro coordenador daquilo que então se chamava - uh - nada. AANA, era assim que se
chamava, e eu disse, "Não podemos fazer isso. Vocês me elegeram como seu coordenador;
temos de arranjar outro nome, não podemos chamar-nos AANA ou NAAA”. E o Comitê que
me elegeu coordenador vetou imediatamente aquilo que eu disse. Bem, é uma boa maneira
de se começar. Na primeira noite vetaram tudo aquilo que eu disse, por isso eu achei que
tinha começado muito bem. Eu não ia aturar chatices deste tipo. Eles iam acabar por
descobrir aquilo que estava certo. E por isso o primeiro assunto pendente foi contatar
Alcoólicos Anónimos para ver se podíamos usar o seu nome; e assim descobrimos que não
podíamos. Por isso eu obtive, pelo menos, a satisfação de estar certo quanto à primeira coisa
que foi vetada. Isso me fez sentir um pouco melhor, porque vos digo, eu consigo as coisas à
minha maneira a maior parte das vezes. Sei que vocês reconhecem isso, porque o mesmo se
passa com vocês. Somos assim. Mas tivemos muitos problemas da primeira vez que nos
juntamos; porque eu sou como vocês e vocês são como eu. Vocês vão ter de me mostrar que
aquilo de que falam irá funcionar, ou eu não irei apoiá-los. E graças a Deus que somos assim.
Acho que é isso que acaba por fazer este programa funcionar. Foi muito difícil encontrar um
local para nos reunir depois de nos juntar e de decidir o que fazer. Não conseguíamos
encontrar uma sala para nos reunirmos. Ninguém nos queria. Não confiavam em nós de
nenhuma forma. E é triste irmos de um lugar para outro quando se tem algo de real a
construir e ninguém nos deixa usar uma sala. Por fim acabamos por encontrar uma sala do
Exército de Salvação e eles deixaram-nos utilizá-la por cinco dólares por mês. Isso foi
bastante bom, mas não havia lá mais nada. Havia uma pia e um lavatório, e era tudo. Não
havia uma cozinha, por isso tivemos de ir comprar um pequeno fogão elétrico e uma
cafeteira, e algumas canecas - que eu ainda guardo em casa. Encontrei-as esta semana - tiveas ao longo de todos estes anos. Costumávamos dá-las uns aos outros, pois numa semana
podíamos reunirmo-nos lá em casa, e na semana seguinte noutra casa. Por isso levávamos as
canecas para podermos beber café. Nessa altura, éramos poucos que tinham mais do que duas
canecas em casa; na verdade, éramos poucos a trabalhar. As coisas eram assim. Aqui, vêem
um recorte do anúncio que publicamos num jornal informando da nossa existência. Tínhamos
uma sala, tínhamos um conjunto de orientações, e tínhamos um propósito.
Página 3 de 10 Aquele primeiro grupo pode já não existir, mas nós ainda estamos vivos. A sala do
Exército de Salvação ainda está lá - é agora uma igreja espanhola. Depois tivemos aquilo que
chamávamos "reuniões coelho", pois nunca sabíamos onde iriam acontecer. Se hoje havia 5
ou 6 de nós numa reunião, decidíamos em qual casa iríamos realizar a reunião seguinte. E
levávamos as canecas e as tigelas de açúcar e as leituras e nos reuníamos lá. Não era que nós
temêssemos as autoridades, mas os recém-chegados temiam. Fiz um cartaz e afixei-o na
porta da igreja, dizia “Reunião de NA hoje às 20h30”. E depois abríamos as portas e
tínhamos uma dúzia de alcoólicos que vinham ajudar-nos. E depois havia um carro que se
aproximava devagar e olhavam para o cartaz e fugiam. Ninguém confiava em ninguém - eles
achavam que estávamos sob vigilância. Não acreditavam quando lhes dizíamos que não. E
nós próprios acabávamos por não estar muito seguros de não estarmos. Pois como grupo
decidimos que não iríamos ter problema com as autoridades e fomos até à Divisão de
Narcóticos e dissemos-lhes, não lhes perguntamos, dissemos-lhes que íamos realizar uma
reunião de adictos. E eles levantaram as sobrancelhas, mas nós éramos cinco. Um tipo lá, já
não me lembro se era tenente ou capitão, ouviu-nos e disse, "Já não era sem tempo que isto
acontecesse. Há anos que tento ajudar adictos, sem conseguir. Eu não consigo ajudar
ninguém". E ele chamou um outro tenente para nos ouvir. E ele era um pouco antiquado que
tinha a certeza que nenhum de nós conseguiria se recuperar. E ele ouvia o outro dizer, "Gosto
desta idéia. Apoio esta iniciativa. Farei tudo o que possa para apoiá-los". Todo ele era
apoio. E acabou por manter a sua palavra. E perguntou a este tenente o que achava, ao que
ele respondeu, "Isso não vai funcionar, uma vez drogado, sempre drogado. Nunca houve
nenhum a ficar melhor. Não me importa o que você diga, não me importa o que estas
pessoas digam, isto não vai funcionar". Depois, olhou para nós e eu não sabia o que dizer.
Olhei para os outros, ninguém sabia o que dizer, até que o Pat, que estivera sempre calado,
abriu a boca e disse, "Tenente, o meu nome é fulano de tal, nasci e cresci em tal lugar, fui
preso pela primeira vez em tal lugar, e fui condenado a tantos anos. E gostaria, por isso, que
fosse confirmar o meu cadastro. Já estive em todas as penitenciárias federais do país, exceto
uma. E não uso drogas há 18 anos. Há 18 anos que não conheço as cadeias. E este
programa funciona para mim. Agora o senhor vá confirmar isso, pois eu nunca estive fora
da prisão desde muito pequeno até ter encontrado este programa". E o tipo não sabia o que
dizer. Não sei se o tipo foi confirmar tudo isto, mas a verdade é que o departamento da
polícia e a Divisão de Narcóticos mantiveram a sua palavra. E nunca nos vigiaram, nunca
fizeram nenhuma rusga, nunca nos apanharam na ida ou na volta das reuniões. E, pelo nosso
lado, mantivemos a nossa palavra, tomamos conta de nós próprios e seguimos as Tradições o
melhor que pudemos. E foi basicamente isso que nos fez crescer nos últimos doze anos. Foi
em 1960 que voltamos a nascer, com cerca de quatro pessoas. E começamos o grupo de novo
de acordo com o conceito original; os Passos para o indivíduo e as Tradições para os grupos.
E desde então temos crescido devagar mas consistentemente. Acho que temos crescido
principalmente porque não temos sido dominados por nenhum grupo de pessoas. Essa é a
Página 4 de 10 principal razão para a grande diferença. Mais o fato de cada vez mais adictos conhecerem o
valor da prática dos Doze Passos. Costumávamos não ter adictos para responderem as
chamadas de ajuda. Aconteciam coisas estranhas, quando 8 a 10 adictos num grupo caíam
sobre um pobre drogado que estava quase morrendo num quarto dos fundos da casa da sua
mãe. E caíamos sobre ele como vespas. Toda a gente apanhava um susto - tínhamos de ir em
grupos porque ninguém ia sozinho ou aos pares. Todos tínhamos medo de usar se fossemos
abordar outro adicto. Esse era outro dos mitos que havia sobre nós - que não podíamos
conversar com outra pessoa que estivesse usando, sem que usássemos também. Uma das
maiores mentiras de todos os tempos. Sabem que não tem uma ponta de verdade. E essa é
uma das razões porque crescemos. Mais o fato de nós seguirmos, possivelmente, a melhor
coisa que qualquer um de nós sabe fazer, estarmos dispostos a ouvir.
Uma vez demiti-me de coordenador de NA por não estarmos seguindo as Tradições. É
uma coisa estranha. Não queria falar disto esta noite, mas vou falar mesmo assim. Pois
embora passados quatro anos com reuniões, Narcóticos Anónimos ainda não existia. Como
tínhamos dito que nos chamaríamos NA enquanto usássemos os Passos e as Tradições;
quando isto se tornou território particular de um só indivíduo, na realidade deixou de haver
NA. Digo isto por duas razões; porque as coisas morreram e só ficamos alguns de nós, mas
também porque mostra que este programa, quando começamos a vivê-lo, não podemos largálo, pois ele volta a crescer. Este programa não vai morrer, mesmo que todos nós nesta sala
falhássemos, pois essa é a própria natureza da recuperação: que uma vez plantada a semente
do conhecimento de que algo pode resultar, essa semente nunca mais irá perder-se. Alguém
pegará nela e continuará o caminho. O nosso percurso já é longo. Como diz aquele anúncio
de cigarros, "O teu caminho já é longo, querida, para teres chegado onde chegaste".
E acho que vou ficar por aqui, pois já estou a levitar, quase batendo no teto. Nós
estamos crescendo mais depressa do que nunca. Estamos em mais estados, em mais países, e
existem mais oportunidades para cada um de nós encontrar o seu lugar em Narcóticos
Anónimos e transmitir a mensagem de recuperação a adictos em todo o mundo. Já não é
possível nos restringir à Califórnia ou aos Estados Unidos. Mas são precisas todas as nossas
forças para nos mantermos neste programa. Não é um programa para quem desiste logo. Mas
se formos adictos nós não desistiremos assim sem mais nem menos, senão não estaríamos
aqui. Vamos nos agarrar naquilo que temos e tornarmo-nos pessoas melhores. Tenho dito
muitas vezes que um homem sem um sonho é só metade de um homem, e uma Irmandade
sem uma visão é uma farsa. E ainda acredito que podemos realizarmo-nos vivendo um dia de
cada vez. E um dia de cada vez a nossa visão e a nossa Irmandade podem tornar-se uma
realidade maior. Sou aquilo por que ainda me interesso. Há dois anos, numa convenção,
disse que enquanto fosse vivo usaria a minha voz e todas as minhas forças para prosseguir
nos objetivos de Narcóticos Anónimos e dessa outra irmandade maravilhosa a que
pertenço, Alcoólicos Anónimos. E tenciono fazer isso. Mas vai exigir tudo de mim, e vai
exigir tudo de vocês, e de todos aqueles com quem falarem e de todos aqueles a quem
Página 5 de 10 transmitirem a mensagem, para tornar isto uma realidade maior. Há pessoas por todo o
mundo morrendo da nossa doença e, quer acreditemos ou não, somos os únicos que podemos
verdadeiramente ajudá-los. Não nos esqueçamos disso. Através da nossa doença foi-nos dado
- pelo sofrimento - um talento para ajudar outros seres humanos como nós. Não nos
esqueçamos que a temos e que somos responsáveis perante outros. Mas devemos
principalmente ser responsáveis perante nós próprios e - eu raramente falo sobre Poderes
Superiores, o conceito particular que eu tenho de um Poder Superior, mas acreditem que
tenho um. E não sei quantas pessoas estão aqui hoje, 100, 110, 112, mas acima de todos nós,
e através de todos nós, existe um poder que não há em mais nenhum lugar do mundo. É disso
que se trata Narcóticos Anónimos. É disso que sempre irá tratar-se. E não estou brincando este é um programa de vida e de viver. Mas já estou sério há demasiado tempo e espero que
nos divirtamos todos esta noite, pois é disso que se trata: viver. Muito obrigado.
Para saber mais
James Patrick Kinnon Jr., nasceu em 05 de abril de
1911 em Paisley, Escócia; seus pais, James Patrick Kinnon Sr.
e Elizabeth Carrick.
Quando tinha sete anos, ele ajudava um vizinho a quem
se referia como, Sr. Crookshank e costumava encontrá-lo
bêbado e espancado. Um dia, ao vê-lo caído e desacordado,
Kinnon correu para pedir ajuda. Nas semanas seguintes
Kinnon não viu o Sr. Crookshank e após inúmeros pedidos,
sua mãe o levou para ver o seu amigo. Kinnon e sua mãe
foram à instituição onde Crookshank estava internado e ele
ficou impressionado ao ver seu amigo numa cadeira de rodas e
falando coisas desconexas. Ao deixar as instalações Kinnon disse à sua mãe que quando ele
crescesse iria se dedicar a cuidar e ajudar pessoas como o Sr. Crookshank.
Com 12 anos de idade, ele e seus pais se mudaram para os Estados Unidos onde
chegaram a Ellis Island (1) em 08 de agosto de 1923. Por razões médicas, e ainda na ilha,
ele foi separado de seus pais durante três dias e meio. Ele fez amizade com uma família
alemã, enquanto ele estava à espera de sua irmã para ser inocentado de uma questão médica.
Quando a família se reuniu eles se mudaram para Filadélfia. Morando na Filadélfia, Kinnon
foi inscrito em uma escola privada e tinha planos de entrar no sacerdócio. Ele começou a
ficar em apuros devido ao uso de álcool e drogas e nunca seguiu adiante com sua meta de se
tornar um sacerdote.
Em 12 de abril de 1934, aos 23 anos casou-se com Agnes Cragin, de 22 anos, com
quem teve cinco filhos. Aos trinta anos, em 1941, Kinnon mudou-se para Sun Valley, na
Califórnia. Lá ele trabalhou como carpinteiro e pintor, mas era perseguido pela dependência
Página 6 de 10 do álcool e das drogas. Quando começou a ter convulsões e alucinações, ao que se juntou
uma serie de detenções por encrencas e porte e uso de entorpecentes, Kinnon tomou a
decisão de parar de usar drogas e álcool.
Ingressou em Alcoólicos Anônimos no dia 2 de fevereiro de 1950, e nunca mais
voltaria a usar drogas ou bebidas alcoólicas. Em A.A. ele conheceu outros membros que
vinham lutado com a dependência de outras substâncias além do álcool. Mantendo-se fiel à
unicidade de propósito – 3ª e 5ª Tradições (2), A.A. desencorajava seus membros a falar nas
suas reuniões de outros problemas além do álcool e Jimmy K. começou a frequentar um
grupo chamado DFH - Drugs Forming Habit - algo como Drogas Formadoras de Hábito
(3). Porém não se deu bem e acabou por desistir desse grupo.
Depois de uma série de correspondências com Danny Carlson (4), de Nova York,
que havia tentado implantar um grupo com o nome NA-12, sendo NA de Narcóticos
Anônimos e 12 de Doze Passos, mas não teve sucesso. A partir 17 de agosto de 1953, Jimmy
K. junto com Frank Carnahan, Doris Carnahan, Guilda Krause, Paul Rosenbluth e Steve
Ryan, membros do Grupo de A.A., começaram a realizar suas próprias reuniões, um misto de
associação de A.A. com NA que eles chamaram de AANA ou NAAA. Jimmy K., consultou o
Escritório de Serviços Gerais de A.A. em nova York – GSO, a respeito da conveniência
dessa associação de nomes. Em 14 de setembro de 1953 receberam um comunicado da
Irmandade de A.A. dizendo que poderiam usar o programa dos Passos e das Tradições de
A.A., mas não seu nome. Mesmo já existindo Al-anon como Irmandade independente, desde
1951, utilizando o programa de A.A., esta foi a primeira manifestação oficial e documentada
de A.A. em relação ao uso de seu nome baseada nas recém homologadas Doze Tradições –
em julho de 1950, na Convenção de Cleveland, especificamente a Sexta Tradição.
Substituiriam, então, as palavras alcoólico por adicto, alcoolismo por adicção e beber por
usar. A partir daí o Grupo passou a denominar-se Grupo Vale de San Fernando de
Narcóticos Anônimos e sua primeira reunião documentada ocorreu no dia 5 de outubro de
1953, com a presença de 17 pessoas.
Desde o início, ao contrário de muitas outras tentativas para formar grupos de ajuda
mútua para adictos, Narcóticos Anônimos se manteve fiel aos princípios concebidos por
Alcoólicos Anônimos, os Doze Passos e as Doze Tradições, adaptados às necessidades
específicas de NA.
Conhecido apenas como “Jimmy K” em respeito ao princípio do anonimato adotado
por NA, Kinnon é uma figura chave na história de Narcóticos Anônimos, por várias razões.
Ele escreveu várias partes do Livreto Branco, que formaram a base para o texto básico NA,
publicado em 1983 sob o título de Narcóticos Anónimos. Kinnon também desenhou o
logotipo de NA e atuou como gerente voluntário no Escritório de Serviços Mundiais de NA a
partir do momento em que começou até 1983.
James Patrick Kinnon morreu em 09 de julho de 1985, em Los Ángeles, Califórnia,
depois de ficar limpo por 35 anos. Antes de sua morte, ele pediu a uma filha sua para
Página 7 de 10 escrever em sua lápide: "Tudo que fizemos foi plantar algumas sementes e trabalhado para
que nós e os outros pudéssemos viver em paz, na liberdade e no amor”
(1) A Ilha Ellis (em inglês: Ellis Island) é uma ilha na foz do Rio Hudson que foi ao
longo do século XIX e no começo do século XX
a principal entrada de imigrantes nos Estados
Unidos.
A ilha, situada
no porto de Nova
Iorque, é um símbolo
da imigração para os
Estados Unidos. De 1892 a 1954, era o primeiro lugar que os
imigrantes provenientes da Europa pisavam, após uma longa
viagem em navios a vapor. Quase 12 milhões de pessoas
chegaram a essa ilha à procura de uma oportunidade no novo
mundo, a América.
Em 1990, o edifício que durante essa época serviu como
posto de exame dos imigrantes que chegavam da Europa foi
transformado em museu, albergando tanto materiais originais,
como documentos e fotografias, materiais audiovisuais de apoio,
distribuídos pelos 3 andares do edifício. A ilha de Ellis faz parte do monumento da Estátua
da Liberdade, sendo possível chegar até ele por meio da mesma balsa.
A fotografia à direita, de 1973, época do 20º aniversário de NA, retrata Jimmy K. na
Ilha Ellis, com a estátua da Liberdade ao fundo, onde ele tinha aportado 50 anos atrás, em
1923.
(2) O respeito às Tradições, tanto de NA quanto de A.A. sempre foi a bandeira de
Jimmy K., e deixado como legado próprio para o crescimento das duas Irmandades dentro de
seus propósitos e respeitando suas diferenças.
Um comunicado do Boletim #13 de © NA World Service (1985, revisada em 1996),
traz a seguinte recomendação: “O foco de A.A. está no alcoolismo, e devemos respeitar o
direito de A.A. de proteger suas Tradições, entre elas a de admitir unicamente alcoólicos e
assim se identificarem, independentemente de outros problemas que possam ter. Se não
pudermos utilizar uma linguagem coerente com as Tradições de A.A., não devemos ir a suas
reuniões para deteriorar seu ambiente. Da mesma forma, nós membros de NA, deveremos
respeitar o nosso propósito primordial e nos identificar nas reuniões de NA simplesmente
como adictos e fazer nossa partilha de uma forma que mantenha nossa mensagem clara”.
Em fevereiro de 1958, após comprovar a experiência bem sucedida de NA, que o
programa de recuperação de A.A. oferecia bons resultados para pessoas com outros
Página 8 de 10 propósitos que não o alcoolismo e que decidissem se associar em grupos ou Irmandades
independentes de A.A., Bill W. escreveu um artigo na Grapevine definindo como deveria ser
a relação da Irmandade com as pessoas que a procuravam com outros problemas além do
álcool. Deste artigo resultou o folheto com o título “Outros problemas além do álcool”,
onde explica com mais clareza o requisito concebido na Terceira Tradição para se tornar
membro de A.A. O folheto está disponível nos ESL´s com o código 220 ao preço de R$ 2,00.
O capítulo seguinte referente aos frutos do programa de A.A. foi a criação, em Washington,
DC, EUA, em 3 de fevereiro de 1964, da Irmandade de Neuróticos Anônimos - N/A, pelo
psicólogo Grover Boydston (1924 – 1996). Grover era membro de A.A. desde 1956.
(3) Em 11 de março de 1954, Bill W., co-fundador de A.A., escreveu uma carta a
Betty Thom, fundadora do movimento independente até então mais bem sucedido para a
dependência de drogas e que seguia a orientação dos Doze Passos; ficava em Vista,
Califórnia e atendia pela sigla DFH (Drugs Forming Habit) - algo como, Drogas
Formadoras de Hábito:
“Cara Betty:
Um milhão de graças por me manter atualizado sobre o progresso com os
toxicodependentes. Acho tudo isso maravilhoso. Nesta fase, tenho certeza que a qualidade
conta mais que a quantidade. É evidente que você tem feito um trabalho de tal qualidade que
inspirou outros a fazerem o mesmo.
O que você pode-me dizer sobre o andamento dos outros grupos em Lexington e aqui
no Leste que atendem pelos nomes de Adictos Anônimos e Narcóticos Anônimos?
...Eu também estou interessado em saber quantas pessoas você acha que realmente
entraram no caminho da recuperação que sejam alcoólicos e usuários de outras drogas e
aqueles que são unicamente usuários de outras drogas sem estar envolvidos com o álcool.
...Entretanto, o principal canal de transmissão aos adictos poderão ser os membros
de A.A. que também sofreram pela adicção. Aos adictos (não alcoólicos) não deverá ser
colocado impedimento à sua presença nas reuniões abertas de A.A. Só mais uma pergunta:
Será que alguns de seus recuperados não-alcoólicos encontra dificuldade em identificar-se
com outros membros de A.A.? Acho que eu lhe disse que tenho notado em muitos alcoólicos
uma marcada aversão por adictos e vice-versa.
Eu gostaria de lhe escrever uma carta tão longa quanto você merece, mas minha
mesa esta empilhada.Entretanto, Deus ama muito todos vocês.
Devotadamente, Bill Wilson.
(4) Em 1933, nos estertores da Lei Seca (vigorou nos EUA desde 16/01/1920 até
05/12/1933), o Serviço de Saúde Pública dos EUA, permitiu a criação de um programa de
reabilitação para narcodependentes que previa internação para desintoxicação no hospital da
Prisão Federal de Lexington, Kentucky; o programa chamava-se Narco e dele podiam
Página 9 de 10 participar pessoas adictas de fora do presídio desde que encaminhadas por órgãos
competentes. Em 1947, Houston Sewell, alcoólico e também adicto, membro do grupo de
A.A. de Lexington, se interessou por esse programa e pediu a uma pessoa que tinha passado
por aquele tratamento que o apresentasse ao Dr. Victor Vogel, médico responsável pelo
programa na prisão o qual permitiu que Houston inicia-se um Grupo na instituição baseado
nos Doze Passos de A.A.
A primeira reunião aconteceu em 16 de fevereiro de 1947, e ao grupo foi dado o nome
de Adictos Anônimos. Nesse mesmo ano retornou ao tratamento nessa instituição pela sétima
vez Daniel Carlson. Além de fazer o tratamento, ingressou no Grupo de Adictos Anônimos,
onde ele percebeu que poderia haver uma saída. Após uma estadia de seis meses retornou a
Nova York e procurou uma sua conhecida, a Major Dorothy Barry do Exército da Salvação,
comprometida em ajudar as pessoas pobres, moradores de rua e adictos em particular. Em
1948, Daniel, Dorothy e uma mulher de nome Rae López, iniciaram um Grupo nos moldes
da Prisão de Lexington na Prisão Federal de Nova York com o nome de NA-12, sendo NA,
Narcóticos Anônimos e 12 de Doze Passos. Este Grupo durou pouco tempo. Entretanto, o
“Modelo Lexington” baseado nos Doze Passos, foi sendo adotado pelo Sistema Prisional
Federal em vários Estados e obteve a adesão e grande divulgação por parte do Exército da
Salvação e da YMCA (Young Men's Christian Association ou, Associação Cristã de Moços).
Assim, de 1950 a 1953, houve vários grupos surgindo em diferentes partes do país. Em
Nova York e Chicago, orientados pelo Exército da Salvação. Nas prisões federais de Nova
York, Kingston, Texas, Virgínia, etc. Estes grupos utilizaram-se de vários nomes: Adictos
Anônimos, Narcóticos Anônimos, grupo Narc, NARCO, Lorton, Notrol, DFH, etc.
Fontes: http://www.na-history.org/history_of_na_scott.html
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ilha_Ellis
http://www.findagrave.com/cgi-bin/fg.cgi?page=gr&GRid=40868281
http://en.wikipedia.org/wiki/Jimmy_Kinnon
http://www.bosewell.com/Scott%2520A%2520and%2520Phil%2520%2520History%2520and%2520Jimmy%2520K.htm&ei
http://anonpress.org/faq
www.na.org/
www.na.org.br/
www.neuroticsanonymous.org/
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