DESAFIOS DO GERENCIAMENTO DE
RECURSOS HUMANOS
A seção “Entrevista” inovou nesta edição, trazendo dois
entrevistados que responderam sobre as mesmas questões.
O intuito foi buscar controvérsias que estimulassem o pensar
sobre o tema, sem estabelecer um único caminho para os
assuntos tratados.
Na última edição tratou-se de dois assuntos vinculados a
recursos humanos: empregabilidade e eficácia organizacional,
o que nos levou a focar a presente entrevista nos desafios
de gerenciamento de recursos humanos. Trata-se de uma
das grandes questões da gestão contemporânea, pois as
empresas necessitam de pessoas capacitadas e engajadas e
a área de Recursos Humanos deve buscar fontes de estímulo,
recompensa e aprendizagem contínua para esses talentos.
Os entrevistados são Humberto César Costa de Souza e
José Antônio Fares. Humberto é administrador, gerente
regional de Recursos Humanos do HSBC Bank Brasil e
prestou consultoria em Recursos Humanos para várias
empresas de renome nacional. Fares é psicólogo, presidente
da Associação Brasileira de Recursos Humanos - Paraná
(ABRH-PR), responsável pela área de Recursos Humanos/
Relações Institucionais da Robert Bosch Unidade Curitiba,
vice-presidente do Sindicato das Empresas Metalúrgicas
da Região Metropolitana de Curitiba (Sindimetal) e diretor
da Associação das Empresas da Cidade de Curitiba (AECIC).
Especialistas sobre a atuação dos Recursos Humanos
nas organizações, eles buscaram nos indicar em que pontos
se avança e em quais ainda há muito o que fazer no
gerenciamento de recursos humanos. Boa leitura.
Faz
endo uma rretr
etr
ospectiv
a histórica
azendo
etrospectiv
ospectiva
da abordagem de RH nas empresas
(1930, 1950, 1970, 1990, 2002), quais
as características do modelo atual?
Humberto: O início do século foi marcado pelos
primeiros estudos da “Ciência da Administração” e, de lá
para cá, pouca coisa foi realmente criada. O que existe
hoje são adaptações, como por exemplo a Escola da
Administração Científica, que desenvolveu estudos sobre
a otimização e sistematização dos processos produtivos e
da unidade de comando; a Escola das Relações Humanas,
que focalizou seus estudos no papel das relações entre as
pessoas e na importância do trabalho do grupo; e a Escola
Behaviorista, que manteve o foco no trabalho dos grupos
e no estudo das teorias “X” e “Y”, o que vemos ainda hoje
é um misto destas escolas, com algumas empresas adotando
posturas ligadas à teoria “X”, outras adotando uma relação
excessivamente assistencialista e paternalista, outras com
seus modelos produtivos mais parecidos com o filme
“Tempos Modernos”.
Algumas empresas buscam implementar o que existe
de melhor nestas três correntes, visando garantir retorno
adequado aos acionistas mas mantendo o foco na Gestão
das Pessoas.
Outro ponto a ser considerado são ciclos que vêm e
voltam. Empresas buscam investir mais na formação de
seus colaboradores, implementam sistemas estruturados
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pela Direção e atingindo os demais
níveis.
A minha proposição definia a área de RH
como instrumentadora e facilitadora na
condução dessas relações, atuando em
conjunto com os chefes num papel efetivo
de consultoria interna.
Quanto a “executar procedimentos”,
entendido como a parte burocrática de
Humberto César Costa de Souza
processamento de admissão, folha de
pagamento, etc., considero absolutamente irrelevante o fato
De que modo estão posicionadas as áreas de estar sendo realizado por uma parte da área de Recursos
Humanos, por outra área da empresa ou de forma
de RH nas grandes empresas brasileiras?
terceirizada, desde que esteja em sintonia com os valores e
Humberto: A área de RH tem buscado um espaço maior objetivos da organização. Neste ponto, agilidade e precisão
de posicio-namento no segmento mais estratégico das são fundamentais para que não se crie um estorvo ao
empresas, o que já vem ocorrendo em algumas organizações. negócio.
Em outras, infelizmente, ela ainda é vista como um “mal
Fares: Acredito no modelo de consul-toria interna. Ele
necessário”, que atrapalha o negócio.
torna a participação do RH mais forte e efetiva dentro da
Depende muito da postura dos profissionais de realmente organi-zação, pois facilita a tomada de decisões, melhora
buscar este posicionamento, demonstrando que estão o contato entre as pessoas e possibilita maior troca de
voltados ao negócio e podem atuar num esquema de parceria
informações entre o RH e demais áreas do negócio. A
efetivamente produtivo.
administração já é feita de rotinas na maior parte das
Fares: As organizações já conseguem perceber que a empresas, por uma estrutura bem menor, pois a tecnologia
área de RH é uma grande aliada para a definição de facilitou muito as atividades. A médio prazo, somente os
estratégias, reestruturação de conceitos e implementação especialistas que enriquecerem suas atividades deverão
de novas tecnologias. O RH pode facilitar a criação de permanecer na área.
ambientes capazes de suportar mudanças e preparar
gestores para lidar com o capital intelectual, competência E quanto à formação e desenvolvimento
cada vez mais exigida no mundo organizacional.
do pr
of
issional de RH?
prof
ofissional
e bem aceitos de remuneração e práticas
de gestão, e então vem uma crise
econômica e grande parte do que foi
construído é perdido, voltando à busca
desenfreada pela otimização dos
processos produtivos, baseado única e
exclusivamente no que pregava a teoria
da Administração Científica do início do
século e deixando a preocupação com o
indivíduo em quarto ou quinto plano.
Entrevista
do profissional de RH?
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Como vocês vêem a tendência da área
de RH: atuando em consultoria interna
ou e
xecutando pr
ocedimentos?
ex
procedimentos?
Humberto: Esta resposta está intimamente ligada à
pergunta anterior. Em 1994, publiquei artigo em jornal com
o título Vamos tratar Gente como Gente, em que colocava
a responsabilidade pela Gestão de Pessoas nas mãos de
todos aqueles que tinham um cargo de chefia, começando
Humberto: Infelizmente os profissionais de RH estão
acordando tardiamente para os aspectos ligados a sua
formação e desenvolvimento. Notadamente aqui em
Curitiba, somente há pouco tempo vejo alguns profissionais
buscando o seu desenvolvimento. A maioria deles aguarda
que a empresa se encarregue desse processo, deslocando
para fora de si essa responsabilidade.
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Nos últimos oito anos participei de sete congressos da
American Society for Training and Development nos Estados
Unidos e, em alguns casos, mesmo com a empresa pagando
os custos do investimento, alguns profissionais encontravam
desculpas para não participarem.
Há algum tempo eu trabalhava em uma empresa
nacional e, juntamente com um grupo de gerentes,
contratamos uma professora de inglês para aprimorar
nossa habilidade de conversação. Fui procurar um colega
e perguntei se ele estaria interessado em participar. Sua
resposta foi: “Se a empresa quer que eu fale e leia em
inglês, que trate de pagar um curso para mim”. Foi um
fato isolado, mas que monstra o descaso das pessoas com
seu desenvolvimento. Só espero que quando elas
acordarem não seja muito tarde.
Fares: A formação do profissional de RH deve ser
sustentada por um tripé: conhecimento do negócio,
conhecimento de práticas de recursos humanos e
conhecimento em administrar mudanças.
Tendo o conhecimento do negócio e possuindo
informações financeiras, tecnológicas e organizacionais,
ele sabe onde, quando e como sua empresa atua e, assim,
pode atuar de forma cada vez mais participativa dentro
da organização.
O conhecimento de práticas de RH deve ser sistematizado e rico em conceitos. A gestão de pessoas é o negócio
da área de RH e a credibilidade e respeito tendem a
aumentar sempre que este conhecimento é solidificado
na implementação de novas práticas.
A capacidade de administrar mudanças também é
importante. O fluxo de informações torna-se cada vez
mais ágil, a globalização, as novas tecnologias, tudo
acontece concomitantemente, e estar preparado para
ajudar gestores e equipes a transpor e adaptar-se a
situações novas é fundamental.
De que modo a área de RH tem
subsidiado os gestores na identificação
das necessidades de qualificação e
desenvolvimento das pessoas?
Humberto: Felizmente, em muitas empresas a área
de RH tem procurado entender o negócio da empresa e
promover programas de desenvolvimento que melhor
capacitem o seu quadro funcional, tanto do ponto de vista
de processos em andamento quanto aqueles ligados ao
futuro da organização.
Esses programas não estão se restringindo à parte
técnica, mas estão voltados também à parte comportamental,
que influi decisivamente na obtenção de resultados de curto,
médio e longo prazos.
Fares: Proporcionando o desenvolvimento efetivo e
constante dos gestores, estimulando a troca de feedback
entre pares, subordinados e gestores. A área de RH deve
ser um suporte para as ações do corpo gerencial, criando
situações que possam contribuir para o aumento da
percepção que o gestor tem de si mesmo e da equipe.
Qual é a opinião de vocês sobre as
ferramentas tidas como modismos em RH?
Humberto: Tenho realmente muito medo de modismos,
principalmente aqueles que prometem a salvação do mundo.
Acredito muito mais em estudos sérios, embasados em
pesquisas e cuja implementação seja bem alicerçada em
teorias consistentes. Tenho profunda admiração por autores
como Peter Drucker, Waren Bennis, Mary Parker Follett
(falecida em 1933), Ken Blanchard, Rosabeth Moss Kanter,
Peter Senge, entre outros, que se preocupam com soluções
muito mais de longo prazo do que com receitas milagrosas.
Fares: Nem tudo podemos considerar como modismo.
As mudanças rápidas e freqüentes que vivemos impulsionam
a criação de novos instrumentos. As ferramentas surgem
com o objetivo de atender demandas decorrentes das políticas
e práticas de recursos humanos, bem como necessidades de
gerenciamento de processos que precisam de freqüentes
revisões e constante aprimoramento. Precisamos estar
prontos para rever conceitos e adaptar metodologias. O
importante é perceber o que cabe dentro da cultura organizacional em que estamos inseridos.
Quais as tendências da Gestão de
Pessoas nos próximos anos?
Humberto: Acredito que a área deve estar muito mais
próxima da cúpula diretiva das empresas, com forte
atuação em consultoria interna, antecipando-se às
necessidades dos negócios.
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Fares: A gestão de pessoas tende a ser cada vez mais
valorizada, pois o que faz uma organização é o seu capital
intelectual. O ambiente organizacional atual exige respostas
e ações imediatas. Dentro dessas condições, a gestão de
pessoas tem um papel importantíssimo no alcance de metas.
Entrevista
Como vocês vêem a interatividade
entre o Planejamento Estratégico
Organizacional e o de RH nas empresas?
Dentre as ferramentas disponíveis para
o desenvolvimento de pessoas
(Universidade Corporativa, e-learning,
Gestão do Conhecimento, etc.), quais
têm maior aplicabilidade e sucesso nas
organizações modernas?
Humberto: Em primeiro lugar o e-learning, pois,
implementado corretamente, é uma ferramenta poderosíssima
no desenvolvimento das pessoas e como facilitador na busca
de resultados.
A seguir, a Gestão do Conhecimento, que não precisa
estar, necessariamente, dissociada do elearning, muito pelo contrário, ambas
podem e devem andar juntas.
Humberto: Quando o planejamento estratégico da
empresa está dissociado das práticas de
RH, a tendência é de falha em quase
100% dos casos. Não há como separar
ou não considerar o RH no Planejamento
Fares: Acredito que tais ferramentas devam
Estratégico, pois um depende
andar em paralelo. As Universidades
fundamentalmente do outro. Afinal, quem
Corporativas devem ter foco na educação
implementa a Visão, Missão e Valores
de pessoas, educação na essência, proporda organização são as pessoas em todos
cionando o desenvolvimento – intelectual e
os níveis, e o papel da área de RH é dar
moral –, adequando, reformulando e desensuporte a essa imple-mentação.
volvendo competências importantes para a
Por outro lado, acompanhei casos de
organização.
empresas em que a área de RH não
Vejo o e-learning como um instrumento
concordava com o planejamento estracapaz de levar o conhecimento de forma
tégico e fazia o seu planejamento em
José Antonio Fares
mais rápida e, num segundo momento,
outra direção. O resultado foi caótico.
A área de RH pode até não concordar com algum ponto mais barata, a um número cada vez maior de pessoas. É
do planejamento estratégico, mas deve ter comprometimento um recurso que vem auxiliar no processo de educação.
A Gestão do Conhecimento é um dos grandes desafios,
com o que foi combinado e implantar ações coerentes com o
hoje, para as organizações. Consiste na sistematização de
rumo que a organização decidiu implantar.
Mesmo nos pontos em que ela não concorde, deve todo o conhecimento útil que é gerado dentro da organização,
basear seu planejamento de forma que os resultados a colocando-o à disposição das pessoas, para aplicação no
serem buscados sejam os melhores possíveis dentro desenvolvimento da empresa.
daquelas condições.
Fares: O planejamento estratégico organizacional e o Vocês acr
editam que a A
valiação
acreditam
Av
RH deveriam andar juntos, o que nem sempre acontece. de 360 graus pode ser aplicada
As atividades de RH vão desde a administração de em todos os nív
eis hierár
quicos e
níveis
hierárquicos
processos à administração de pessoas. Estar em sintonia com todos os envolvidos nos
com o planejamento estratégico e com a visão de futuro pr
ocessos or
ganizacionais?
processos
org
da organização é fundamental para a implantação de novas
políticas, mudança de tecnologia, realocação de recursos
Humberto: Sim, desde que as pessoas sejam
e adequação da cultura existente para cumprir metas e efetivamente treinadas no uso da ferramenta, que haja
alcançar os resultados desejados.
adaptações das questões abordadas entre os diversos níveis
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e que o processo seja realmente confidencial e confiável.
Não pode haver caça às bruxas e os resultados devem
ser objeto de uma análise muito cuidadosa, para que as
pessoas que estejam caminhando na direção que a
organização deseja sejam valorizadas e incentivadas, bem
como efetivamente coibidas ou corrigidas as ações que
estejam em desacordo com as políticas da empresa.
Fares: Mais importante do que o nível hierárquico é o
nível de maturidade em que a Avaliação de 360 graus é
aplicada. O sucesso desse tipo de avaliação passa pelo
envolvimento das pessoas no processo, pelo conhecimento
e aceitação desse modelo de avaliação, que pode ser um
instrumento muito rico de desenvolvimento, tanto para o
gestor como para a equipe.
Quais são os obstáculos da cultura
organizacional que freqüentemente
impedem o efetivo desempenho na
área de RH?
Humberto: A priorização de resultados de curto prazo,
que dificultam ações de RH cujos resultados demoram a
aparecer. Por outro lado, a área de RH não está muito
habituada a ações mais pontuais que atendam às necessidades
do negócio. Se conseguirmos um meio termo entre estes
extremos, a cultura organizacional vai facilitar bastante o
desempenho da área.
Fares: A cultura das organizações é conseqüência
direta das ações, que na grande maioria estão baseadas
em valores e crenças. Implementar mudanças, propor
modelos mais ousados de gestão é uma grande dificuldade,
porém um dos papéis de RH é estimular as pessoas a
reflexões que possam facilitar mudanças necessárias, para
que as organizações possam se desenvolver ou se manter
em meio a tantas diversidades.
Qual o papel da área de RH nos
Pr
og
esponsa
bilidade
Prog
ogrramas de R
Responsa
esponsabilidade
Social nas empresas?
Humberto: A decisão da empresa em participar desses
programas deve ser do principal executivo, que dará as linhas
mestras de onde e como atuar. Cabe à área de RH um
papel de assessoria na implantação dos programas,
garantindo o engajamento das pessoas e o efetivo
comprometimento com o que vai ser buscado.
Não adianta a área de RH tentar lutar sozinha nesse
processo, que acabará sendo visto como mais um projeto
que não gera resultados efetivos para a organização, ao
passo que, respaldadas pela decisão do presidente, as ações
de RH podem ser muito mais efetivas.
Uma parte fundamental do papel de RH é não deixar
que as ações sejam meramente assistencialistas, e sim
implementar projetos que tragam efetivo retorno para a
sociedade. Doar agasalhos e alimentos às populações
carentes é apenas um pequeno passo se comparado a
projetos que possibilitem aumentar o nível de escolaridade
e empregabilidade dos envolvidos. Os resultados serão
muito mais consistentes e duradouros.
Projetos ligados à conservação da natureza têm também
impactos de longo prazo e benefícios que podem não
aparecer de imediato mas que serão sempre lembrados
como importantes e fundamentais em prazos mais longos.
Fares: Na maior parte das empresas essa atividade
recai sobre a área de RH até porque historicamente é
ela que têm facilidade no trato com pessoas. Acredito
que temos aí uma oportunidade de desenvolvimento bem
maior do que muitas vezes é percebido. Estruturar as
ações a serem desenvolvidas, de maneira que estejam
dentro de um contexto maior da organização, pode facilitar
vários processos de mudanças, em que o modelo de gestão
pode ser mais participativo e as relações pensadas de
maneira mais ética.
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