Ele podia ter falado comigo…
Acabar com o Castigo
Corporal contra as Crianças
em Moçambique
A NOSSA VISÃO é a de um mundo em que todas as crianças conseguem
o direito à sobrevivência, à protecção, ao desenvolvimento e à participação.
A NOSSA MISSÃO é inspirar progressos no modo como o mundo trata as crianças,
e conseguir mudanças imediatas e duradouras nas vidas das mesmas.
Publicado por:
Save the Children Suécia
Gabinete Regional para a África Austral
PO Box 13993
Hatfield
Pretória, 0028
Telefone: +27 (0)12 342 0222
Fax: +27 (0)12 342 0305
Web: http://www.rb.se
Direitos de autor Save the Children Suécia
Publicado em Julho de 2010
Autor:
Deidre Kleynhans, Save the Children Suécia, Pretória
Pesquisa sabre castigos corporais conduzida pela Save the Children em Moçambique e
pela Rede Came em 2009.
Desenho de:
Save the Children Suécia
Desenhos incluídos na publicação:
Os desenhos que fazem parte desta publicação foram concebidos pelas crianças que
participaram na sondagem sobre opiniões e experiências de castigo corporal e humilhante, discutidas no capítulo 5.
ISBN: 978-0-620-46193-1
Se desejar encomendar cópias adicionais, queira por favor contactar o Gabinete
Regional da Save the Children Suécia ou a Save the Children em Moçambique.
Acabar com o Castigo
Corporal contra as Crianças
em Moçambique
“Ele podia ter falado comigo…”
Dezembro de 2009
TABELA DE CONTEÚDOS
1.
INTRODUÇÃO
3
2.
DEFINIÇÃO DE CASTIGO CORPORAL E DE OUTRAS FORMAS DE
CASTIGO HUMILHANTE E DEGRADANTE CONTRA AS CRIANÇAS
4
POR QUE RAZÃO O CASTIGO CORPORAL E HUMILHANTE
CONTRA AS CRIANÇAS ESTÁ ERRADO?
5
OS PONTOS DE VISTA DAS CRIANÇAS SOBRE O CASTIGO
CORPORAL E OUTRAS FORMAS DE CASTIGO HUMILHANTE E
DEGRADANTE
8
3.
4.
5.
AS OBRIGAÇÕES INTERNACIONAIS DE MOÇAMBIQUE
12
6.
A LEGISLAÇÃO NACIONAL MOÇAMBICANA
14
7.
ARGUMENTOS USADOS FREQUENTEMENTE PARA JUSTIFICAR O
CASTIGO CORPORAL
15
SUBSTITUTOS PARA O CASTIGO CORPORAL E OUTRAS FORMAS
DE CASTIGO HUMILHANTE E DEGRADANTE
20
A RELIGIÃO E O CASTIGO CORPORAL
22
8.
9.
10. CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES
CONTACTOS ÚTEIS
27
NOTAS FINAIS
28
ABREVIATURAS
2
24
ACRWC
Carta Africana dos Direitos e Bem-Estar da Criança
OBC
Organização de Base Comunitária
CDC
Convenção sobre os Direitos da Criança
ONG
Organização Não Governamental
OUN
Organização das Nações Unidas
1. INTRODUÇÃO
“Eu gostava que ele me tivesse perguntado por que razão eu não
tinha lavado a panela, antes de me começar a bater. Ele devia ter tentado saber
porque foi que eu não lavei a panela. Ele podia ter falado comigo…” 1
Rapariga, Maputo
Tal como em muitos outros países do mundo, em Moçambique muitas crianças sofrem castigos
corporais e outras formas de castigo humilhante e degradante, em casa, na escola e em diferentes
instituições.
Até Novembro de 2009, somente 25 países em todo o mundo tinham adoptado legislação que
proíbe o castigo corporal contra as crianças, em todas as esferas2.Também um número de países
baniu o castigo corporal contra as crianças nas escolas e noutras instituições. O movimento global
que visa inverter a cultura do castigo corporal e de outras formas de castigo humilhante e
degradante aplicado às crianças tem estado a ganhar impulso. Esse movimento assenta na
compreensão crescente de que as crianças são detentoras de direitos, e baseia-se num cada vez mais
vasto conjunto de evidência, facultado pelas autoridades relevantes das áreas da medicina, da
educação e da psicologia, o qual aponta para os efeitos negativos do castigo corporal e para a sua
ineficácia como método de disciplina.
O castigo corporal contra as crianças constitui uma violação dos seus direitos à integridade física e
à dignidade humana, consagrados na Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas
(CDC) e na Carta Africana dos Direitos e Bem-estar da Criança (ACRWC, sigla em inglês). No
seu Artigo 40, a Constituição Moçambicana determina que “[todo] o cidadão tem direito à vida e à
integridade física e moral e não pode ser sujeito à tortura ou tratamentos cruéis ou desumanos”.
Nesta referência aos cidadãos, estão incluídas as crianças.
É obrigação de todos os estados do mundo assegurar a protecção do direito das crianças a uma vida
livre de violência, incluindo o castigo corporal e outras formas de punição humilhante e
degradante. O direito das crianças a uma vida isenta de violência estende-se à vida privada e ao seu
lar.
Os apologistas do castigo corporal sugerem que as crianças são seres diferentes. Mas as suas
diferenças - a sua dependência, estado de desenvolvimento e grau de fragilidade - em nada
diminuem os seus direitos humanos, nem justificam um menor nível de protecção contra todas as
formas de violência, incluindo o castigo corporal3.
Esta publicação tem por objectivo facultar informações sobre o castigo corporal e outras formas de
castigo humilhante e degradante que recaem sobre as crianças em Moçambique. Refere as
obrigações internacionais destinadas a proibir o castigo corporal contra as crianças, e o
envolvimento na educação pública. Oferece recomendações sobre as medidas que devem ser
tomadas pelo governo e pela sociedade civil, no sentido de se assegurar que a cultura do castigo
corporal e de outras formas de castigo humilhante e degradante é substituída por métodos
disciplinares positivos e não violentos, assentes no respeito aos direitos das crianças.
No âmbito desta publicação, e de acordo com a CDC, uma criança é qualquer pessoa com idade
inferior a 18 anos.
3
2. DEFINIÇÃO DE CASTIGO CORPORAL E OUTRAS
FORMAS DE CASTIGO HUMILHANTE E
DEGRADANTE CONTRA AS CRIANÇAS
O Comité dos Direitos da Criança da ONU define castigo “corporal” ou “físico” como “qualquer
tipo de castigo em que seja usada força física e cuja intenção é causar algum grau de dor ou de
desconforto, por mais leve que ele seja”4.
A maior parte dos castigos corporais envolve bater (“dar palmadas”, “dar estaladas”, “espancar”) nas
crianças, usando a mão ou um implemento - um chicote, vara, cinto, sapato, colher de pau, etc.
Porém, pode também envolver, por exemplo, o acto de dar pontapés, abanar ou arremessar as
crianças, arranhar, beliscar, morder, puxar o cabelo ou esmurrar as orelhas, obrigar as crianças a
assumirem posições desconfortáveis, queimar, escaldar ou forçar a ingestão de algo (por exemplo,
lavar a boca das crianças com sabão ou obrigá-las a engolir especiarias picantes). Na óptica do
Comité, o castigo corporal é invariavelmente degradante.
O castigo corporal e muitas outras formas cruéis e degradantes de castigar as crianças ocorrem em
muitos contextos, incluindo no seio da família, em todas as variantes de cuidados alternativos,
escolas e outras instituições educativas e sistemas da justiça - tanto como sentença dos tribunais
como punição em instituições penais e outras - em situações de trabalho infantil e na comunidade.
“Em casa, batem-me com uma vara porque eu sou muito irrequieto.”5
Rapaz, Manica
Além desses castigos, existem outros métodos de punição que não são físicos, mas que são
igualmente cruéis e degradantes e, por conseguinte, incompatíveis com a Convenção. Esses métodos
incluem, por exemplo, o acto de rebaixar, humilhar ou denegrir a criança; fazer dela o bode
expiatório; usar de ameaças, provocar o medo ou ridicularizar a criança. É importante notar que
não existe uma linha divisória bem definida entre o castigo corporal e o castigo humilhante e
degradante. Muitas vezes, as crianças encaram o castigo corporal como algo igualmente humilhante
e degradante.
“O meu pai grita comigo e diz-me que sou estúpido.” 6
Rapaz, Manica
“A minha mãe gritou comigo porque fui buscar água e atrasei-me no regresso a casa. Senti-me envergonhada
porque estavam outras crianças presentes. Ela chamou-me nomes muito feios.” 7
Rapariga, Maputo
As formas de punição não corporais, como submeter as crianças ao trabalho físico pesado ou
obrigá-las a manterem-se em posições aviltantes e que provocam desconforto, constituem também
uma forma de castigo corporal.
Um vasto conjunto de palavras diferentes é empregado para descrever o uso da força física contra as
crianças. São exemplos comuns bater, dar estaladas ou dar palmadas, 'uma boa dose de pancada', 'seis
das melhores', uma tareia, ou 'uma carga de porrada'.
4
Muitas vezes os adultos fazem afirmações do género “Apenas dei uma palmadinha ao meu filho.
Isso não é abuso infantil, porque eu sei o que é melhor para ele. Só quis corrigir o seu
comportamento”.Todas as formas de castigo corporal contra as crianças, por mais leves que elas
sejam, constituem uma violência contra a criança. O castigo corporal é uma forma de violência ou
de abuso infantil. Não é um método diferente de disciplina que os pais, professores e outros
provedores de cuidados possam usar como lhes aprouver. Na sociedade actual, a violência contra as
mulheres e os idosos não é aceite de modo nenhum. Por que razão o caso das crianças deveria ser
excepção?
Se o castigo corporal é mais visível, a punição emocional na forma de castigo humilhante ou
degradante é mais difícil de identificar e de confrontar, como variante de abuso infantil. Disciplinar
uma criança obrigando-a a ir para o exterior e a permanecer ao sol durante horas, a fim de se lhe
minar o sentido de auto-estima, ou recusar dar-lhe comida ou agasalhos, é tão prejudicial e nocivo
quanto as diferentes formas de castigo corporal.
“Quando um rapaz não trabalha na aula, o professor diz-lhe para ir buscar pedras e manda-o ajoelhar-se
nelas. Isso também acontece quando um rapaz chega atrasado à aula.” 8
Rapaz, Maputo
5
3. POR QUE RAZÃO O CASTIGO CORPORAL E
HUMILHANTE CONTRA AS CRIANÇAS ESTÁ
ERRADO?
Nestas últimas décadas, o mundo reconheceu que as pessoas são titulares legítimos de direitos
humanos básicos. As organizações internacionais e regionais como as Nações Unidas e a União
Africana desenvolveram padrões relativos ao respeito aos direitos básicos das pessoas. Bater e
humilhar deliberadamente alguém viola os seus direitos fundamentais ao respeito pela sua
integridade física e dignidade humana.
A partir do momento em que nascem, e tal como as pessoas adultas, as crianças são detentoras de
direitos humanos e têm o direito à integridade física e à dignidade humana. As crianças são apenas
seres humanos mais pequenos e mais frágeis do que os adultos. 9
O castigo corporal e outras formas de castigo humilhante e degradante vão contra os direitos
humanos fundamentais das crianças, relativos ao respeito à dignidade humana e à integridade física.
Este facto foi confirmado por diversos instrumentos internacionais para os direitos humanos, tais
como a CDC e a ACRWC, e disposições equivalentes são encontradas na Constituição de
Moçambique (para mais informação, consulte os capítulos 6 e 7).
Em muitos casos, apesar de contrariarem a lei internacional, o castigo corporal e outras formas de
castigo humilhante e degradante continuam a ser formas de violência legalizadas e socialmente
aceites, aplicadas contra as crianças. O baixo estatuto das crianças na sociedade e a sua falta de
poder têm impedido a proibição total do castigo corporal em muitos países, entre os quais se inclui
Moçambique.
Para além de atentarem contra os direitos humanos básicos das crianças, existe vasta evidência em
torno dos efeitos negativos e nocivos do castigo corporal contra as crianças, facultada por
especialistas das áreas da medicina, educação e psicologia.
Vários estudos têm demonstrado que existe uma correlação positiva e significativa entre a
frequência da violência interpessoal vivida por uma criança e a aprovação do uso da violência
interpessoal em adulto.10 Uma sondagem nacional às famílias Sul-Africanas revelou que os pais que
concordavam com o castigo corporal contra as crianças eram provavelmente mais susceptíveis de
vivenciar níveis elevados de violência entre parceiros do que os pais que discordavam da aplicação
do castigo corporal.11 Há forte evidência de que o castigo corporal coloca as crianças em risco de
sofrerem ferimentos físicos e de virem a revelar uma saúde mental fraca, relações debilitadas com os
pais, interiorização de valores morais enfraquecida, comportamento anti-social e um nível de
adaptação mais deficiente em adulto.12
Em Moçambique, a violência interpessoal é corrente e está disseminada e os conflitos são muitas
vezes resolvidos por meios violentos. A aplicação do castigo corporal contra as crianças contribui
para que, de tenra idade, se ganhe a percepção de que a violência é uma resposta adequada aos
conflitos e à conduta indevida. Ensina-nos que é aceitável que as pessoas com poder e em posições
de autoridade possam ser violentas em relação aos mais fracos e resolvam os conflitos empregando a
violência.
Uma sondagem feita às crianças em Moçambique indicou que o castigo corporal contra as crianças
pode também incutir nelas sentimentos de agressividade. 13
6
“Eu estava atrasado quando cheguei à escola e o professor agarrou numa vara e bateu-me.
Fiquei envergonhado. Depois, senti-me zangado por ele me ter batido em frente à turma.” 14
Rapaz, Maputo
A investigação tem demonstrado que o castigo corporal não constitui uma forma eficaz de garantir
a disciplina e a mudança de comportamento nas crianças. Se o castigo corporal 'resultasse' como
factor dissuasivo, deveria então pôr fim aos comportamentos indesejáveis por parte das crianças
consideradas mais 'difíceis'.Todavia, concluiu-se que nas escolas onde o castigo corporal é aplicado
são os mesmos alunos que são castigados repetidamente por cometerem as mesmas ofensas. As
turmas que, ao longo do tempo, apresentam a menor incidência de problemas comportamentais são
lideradas por professores que defendem abordagens disciplinares não violentas na sala de aula, e as
quais se centram na criança. 15
O castigo corporal funciona contra o processo de desenvolvimento do sentido de ética. Ensina as
crianças a não se envolverem num determinado tipo de comportamento apenas porque serão
castigadas fisicamente, mas não as ensina a ponderar sobre a ética e as razões pelas quais não nos
devemos comportar de um determinado modo. 16
É ainda necessário recordar que um grande número de crianças acaba por se deixar envolver em
comportamentos indesejáveis devido a problemas de ordem prática, de que são exemplo a fome, a
sede, o cansaço por se verem obrigadas a percorrer longas distâncias até chegarem à escola, as
situações familiares abusivas e caracterizadas por stress, o terem de cuidar de um familiar doente ou
serem responsáveis pelos irmãos na sequência da pandemia do HIV e da SIDA, ou ainda por
sofrerem de problemas de saúde. Ao utilizar uma 'cura rápida', como é o caso do castigo corporal e
de outras formas de castigo humilhante e degradante, o adulto perde a oportunidade de lidar com o
problema que verdadeiramente afecta a criança.17 Essa atitude pode conduzir a uma situação em
que, para além do direito à integridade física, os direitos da criança à alimentação, cuidados de saúde
e educação estão sendo igualmente violados.
7
4. OS PONTOS DE VISTA DAS CRIANÇAS SOBRE O
CASTIGO CORPORAL E OUTRAS FORMAS DE
CASTIGO HUMILHANTE E DEGRADANTE
A investigação e as sondagens realizadas em torno dos pontos de vista das crianças e das suas
experiências de castigo corporal e de outras formas de castigo humilhante e degradante em
Moçambique são muito limitadas. A excepção é uma sondagem quantitativa e qualitativa que incide
sobre as experiências de castigo vividas por 2682 crianças moçambicanas, na família e na escola, e
que faz o levantamento dos seus pontos de vista. Porém, persiste a falta de informação sobre as
opiniões que as crianças tecem das experiências de castigo vividas em casas de abrigo e de cuidados
infantis, prisões, estações da polícia e outras instituições.
Em 2009, foi realizada a referida sondagem junto de rapazes e raparigas moçambicanos, com idades
compreendidas entre os 6 e os 18 anos, a qual investigou experiências, pontos de vista e os
sentimentos das crianças em relação ao castigo corporal e a outras formas de castigo humilhante e
degradante. A investigação consistiu de uma componente quantitativa, a qual incluiu 2682 crianças
oriundas de três províncias, e uma componente qualitativa, que compreendeu 168 crianças, também
provenientes de três províncias. A componente quantitativa da investigação oferece informação
sobre a prevalência do castigo corporal e humilhante, sobre os níveis de inaceitabilidade dessas
formas de castigo, e sobre os métodos disciplinares que são preferidos pelas crianças. A parte
qualitativa da investigação, por outro lado, fornece informação mais detalhada sobre o assunto,
apresentada nas palavras das próprias crianças, e ajuda a interpretar os dados quantitativos. As
conclusões extraídas desta sondagem são complexas, apresentando variações no modo como as
crianças vivem estas formas de castigo, como as percepcionam e como reagem, dependendo de
factores como o estatuto socio-económico, a idade e o género. No âmbito desta complexidade
existem, porém, algumas tendências claras. 18
Deve-se ter em mente que a investigação em referência analisou as experiências de castigo corporal
e outras formas de castigo humilhante e degradante vividas pelas crianças num espaço de duas
semanas. Este factor não deve ser descurado quando se proceder à comparação destas conclusões
com as conclusões de outros estudos que, porventura, tenham dado preferência a um período de
tempo diferente.
Deste estudo ficou claro que, em Moçambique, muitos rapazes e raparigas de todas as idades sofrem
elevados graus de castigo corporal e outras formas de castigo humilhante e degradante, tanto na
família como na escola. Apesar da directriz emanada pelo governo que proíbe o castigo corporal
nas escolas, o castigo corporal - que em muitos casos assume a forma de uma tareia severa aplicada
com um objecto - é mais vezes reportado pelas crianças em relação à escola do que em relação ao
lar. 19
Trinta e sete por cento das crianças confessaram que tinham sido sujeitas a castigo corporal na
família, num espaço de duas semanas. As crianças reportaram que lhes tinham batido com as mãos,
varas e cintos. 20
8
“Bateram-me com um cinto e depois com uma vara. Naquele dia, mandaram-me lavar a loiça.” 21
Rapariga, Maputo
Os rapazes dos 6 aos 8 anos confessaram que tinham sido agredidos por manifestarem
comportamentos que são aceites para crianças desta idade, como ser-se muito vivo ou ter menos
capacidade de coordenação motora. Na maior parte das vezes, os rapazes mais velhos são vítimas de
castigos corporais quando contrariam ordens de permanecer em casa, ou por chegarem tarde a casa,
por lutar, ou por partir algo, por exemplo uma janela, enquanto brincam.Tudo indica que as
raparigas com idades entre os 6 e os 12 anos são castigadas fisicamente por partirem objectos em
casa e por não fazerem as tarefas domésticas. As crianças são também alvo de agressões físicas
quando são acusadas de desperdiçar recursos. 22
“Batem-me com uma vara em casa porque sou muito
irrequieto.” 24
Rapaz, 6 a 8, Manica
“A minha mãe bateu-me com uma vara. Eu não tinha
varrido.” 25
Rapariga, Sofala
Relativamente à escola, 35% das crianças declararam que
tinham sido alvo de castigo corporal aplicado com a
mão e 41.2% divulgaram terem sido castigadas com a
ajuda de um objecto, num espaço de duas semanas. Na
maior parte das vezes, as crianças são agredidas na escola
com a mão, uma vara, uma régua ou com o apagador do
quadro.
Para além das formas de castigo corporal e de castigo humilhante e degradante mais tradicionais,
emerge nesta sondagem um novo método de punição que não envolve bater ou espancar, mas que
é intencionalmente concebido para provocar simultaneamente dor física e humilhação, consistindo
no trabalho físico bastante pesado, ou no posicionamento corporal desconfortável, e por período de
tempo prolongado, em que a criança é forçada a ajoelhar-se nas pedras ou a sentar-se como um
sapo. 25 Este tipo de actividades constituem exercício físico excessivo e, de acordo com a definição
de castigo corporal, tal como ficou definida no capítulo 2, são actividades reconhecidas como uma
forma de castigo corporal contra as crianças. 26
“Outro professor bate-nos enquanto nós estamos
'pendurados'.
O que queres dizer com 'pendurados'?
Alguém segura nas nossas mãos, e outra pessoa segura-nos
nas pernas. Enquanto estamos pendurados, o professor batenos com uma vara.” 27
Rapaz, Maputo
“O professor mandou-me abrir um buraco com 3 metros de
profundidade. Eu não tinha feito o meu trabalho de casa.
Levou-me muito tempo a abrir a vala. Eu não consegui
chegar aos 3 metros, então o professor gritou comigo.” 28
Rapaz, Sofala
9
Quarenta e três por cento das crianças reportaram que tinham sido expostas a castigo humilhante
na família, enquanto 42.4% teriam sido sujeitas a esse tipo de castigo na escola. Os exemplos de
castigo humilhante relacionaram-se com abusos verbais, ser-se posto em xeque e sentir-se
envergonhado, sobretudo quando os colegas se riam porque a criança estava a ser castigada. 29
“Os professores fazem troça dos alunos que são de PC (uma área). Quando erramos alguma coisa, eles
dizem que é por sermos de PC. Uma pessoa sente-se muito mal.” 30
Rapaz, Maputo
As crianças provenientes de ambientes de renda mais baixa normalmente sofrem mais castigos
corporais e outras formas de castigo humilhante e degradante do que as crianças pertencentes a
ambientes que beneficiam de rendimentos mais elevados. 31
Uma das explicações que foram avançadas prende-se com o facto de se registar um nível de stress
mais acentuado nos lares de rendimento baixo; e também se tornou aparente que o stress e os
problemas relacionais que lhe estão associados funcionam como indicadores de castigo corporal em
todos as famílias, independentemente do escalão de rendimento.
O castigo corporal é também usado mais frequentemente contra as crianças mais novas (6 a 8 anos)
do que contra as crianças mais velhas (9 a 12 anos e 13 a 18 anos). As crianças mais velhas (13 a 18
anos) foram mais vítimas de castigo humilhante e degradante do que as crianças mais novas. 32
O estudo revelou ainda que a aplicação do castigo corporal na família se atribui geralmente às
mães. A razão principal para tal deve-se provavelmente ao facto de, no dia-a-dia, as mães assumirem
maior responsabilidade pelas crianças. Na escola, o castigo corporal é mais frequentemente aplicado
por professores. 33
Embora o estudo tenha concluído que não existe diferença estatisticamente significativa entre
rapazes e raparigas, registou-se uma tendência ligeira, porém consistente, para os rapazes serem
submetidos mais vezes ao castigo corporal que as raparigas. Analisando os dados qualitativos, tornase aparente que os rapazes recebem mais castigos associados com o trabalho laboral pesado do que
as raparigas. Igualmente aparente é o facto de as raparigas mais velhas serem vítimas de abuso verbal
em maior quantidade do que os rapazes. 34
Se as próprias crianças pudessem escolher, elas optariam por serem disciplinadas de um modo não
violento e não humilhante. Cerca de 84% das crianças sentem que o castigo corporal em casa e na
escola é inaceitável. Foi revelado um sentimento idêntico em relação ao castigo humilhante, sendo
que 87% das crianças o considerou inaceitável. 35
A maioria das crianças gostaria que os pais e os professores falassem com elas e lhes explicassem o
que fora feito de errado, ao invés de recorrerem ao castigo corporal e a outras formas de castigo
humilhante e degradante. De acordo com o estudo em causa, um total de 82% das crianças
gostariam que os adultos lhes falassem, enquanto 11% das crianças revelaram preferência por
medidas disciplinares não violentas, como a permanência no próprio quarto, a elaboração de um
trabalho escrito, ou a detenção. Estes resultados indicam que a maior parte das crianças (93%) deseja
ser tratada com respeito; pretende que os adultos prestem atenção ao que elas dizem e lhes
ofereçam a oportunidade de melhor compreenderem o que fizeram de errado. 36
10
“O meu pai devia ter-me dito para não sair sem primeiro avisá-los lá em casa,
e podia ter explicado porquê.” 37
Rapaz, Sofala
“Eu gostava que ele me tivesse perguntado por que razão eu não tinha lavado a panela,
antes de começar a bater-me. Ele devia ter tentado saber porque foi que eu não lavei a panela.
Ele podia ter falado comigo…” 38
Rapariga, Maputo
Sete por cento das crianças preferiram o castigo corporal como forma de disciplina. Esta opção foi
mais apontada pelas crianças provenientes de ambientes de renda baixa. 39 Uma explicação trágica
para esta percepção poderá estar associada ao facto de as crianças viverem em ambientes onde as
formas violentas de disciplina constituem a norma. Estas crianças estão tão habituadas a formas
violentas de disciplina que não estão capacitadas para conceber outras soluções que não por via da
violência. Uma outra explicação possível está ligada à percepção de que o castigo corporal é menos
doloroso e enfadonho do que a punição que obrigue ao trabalho laboral muito pesado.
As crianças expressaram um conjunto de sentimentos e de reacções comportamentais ao castigo
corporal e a outras formas de castigo humilhante e degradante. O estudo determinou que a tristeza,
o remorso e a ira são os sentimentos mais comuns que as crianças mencionam quando se referem às
reacções ao castigo corporal e a outras formas de castigo corporal e humilhante. A ira é a reacção
mais comum na escola, quando o castigo é percepcionado como tendo sido injusto. Outras reacções
referidas foram “não fazer nada”, isolamento, sentimento de culpa, choro, solidão, depressão,
infelicidade, dor física e perda de apetite. As crianças também têm tendência para aceitar melhor as
medidas disciplinares quando essas são aplicadas por uma pessoa mais idosa. 40
“A minha mãe bateu-me com uma vara.
Eu parti um prato enquanto lavava a loiça.
Doeu muito. Eu chorei.” 41
Rapariga, Manica.
“O meu professor bateu-nos porque estávamos a fazer
barulho na sala de aula, mas não estávamos todos a fazer
barulho.Tive vontade de me vingar por ele me ter batido
porque o professor não foi justo.” 42
Rapaz, Maputo
O facto de um número de alunos ter reportado
sentimentos de agressividade como reacção aos
castigos corporais que receberam constitui motivo
de forte preocupação. 43
11
5. AS OBRIGAÇÕES INTERNACIONAIS DE
MOÇAMBIQUE
A Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU (CDC)44 é uma convenção internacional que
abrange os direitos específicos das crianças com idades inferiores a 18 anos. A CDC foi ratificada
por todos os países do mundo, exceptuando os Estados Unidos da América e a Somália. Ao fazê-lo,
as nações comprometeram-se a aplicar, nos seus respectivos países, todas as obrigações previstas na
CDC. Em 1994, Moçambique ratificou a Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU.
O Artigo 19 da CDC oferece protecção às crianças contra todas as formas de violência física e
mental. Essa medida determina que os países:
“…adoptarão todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e educacionais adequadas à
protecção da criança contra todas as formas de violência física ou mental, dano ou sevícia,
abandono ou tratamento negligente, maus tratos ou exploração, incluindo a violência sexual,
enquanto a criança se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles, dos representantes
legais ou de qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada”.
Ainda o Artigo 37(a) prevê que “…nenhuma criança seja submetida a tortura nem a outros tratamentos ou
penas cruéis, desumanos ou degradantes. Não será imposta a pena de morte nem a prisão perpétua sem
possibilidade de livramento por delitos cometidos por menores de dezoito anos de idade”.
Outros artigos relevantes da CDC para a protecção das crianças contra o castigo corporal e outras
formas de castigo humilhante e degradante são:
Artigo 3, que estabelece que o interesse maior da criança deve ser considerado,
primordialmente, em todas as acções relativas às crianças,
Artigo 6, que requer que os estados assegurem ao máximo a sobrevivência e o
desenvolvimento da criança,
Artigo 28, que exige que os estados adoptem todas as medidas necessárias para assegurar que a
disciplina escolar é ministrada de maneira compatível com a dignidade humana da criança e em
conformidade com a Convenção, e
Artigo 40, que requer que as crianças envolvidas com o sistema de justiça penal sejam tratadas
de um modo consistente com a promoção do sentido de dignidade e de valor da criança.
O Comité dos Direitos da Criança, a mais alta autoridade internacional para a interpretação e
monitorização da CDC, interpretou a Convenção como determinando que todas as formas de
castigo corporal contra as crianças atentam contra a CDC, seja esse castigo aplicado no seio da
família, nas escolas, ou noutras instituições. Perante este facto, o Comité solicitou aos estados que
procedessem a uma reforma legislativa profunda de modo a proibir todas as formas de castigo
corporal. O Comité propôs igualmente que essas reformas na lei fossem acompanhadas de
campanhas educativas e de sensibilização em torno de uma disciplina positiva, destinadas a aumentar
o nível de consciencialização dos pais, professores e demais interessados. Os estados que ratificaram a
CDC têm a obrigação de apresentar relatórios ao Comité sobre o modo como estão a aplicar a
Convenção. 45
12
Tendo estudado o primeiro relatório de Moçambique sobre a aplicação da Convenção, o qual fora
submetido em 2002, o Comité solicitou ao governo moçambicano que decretasse a proibição do
recurso ao castigo corporal nas escolas, assim como nas instituições de acolhimento de crianças e no
seio das famílias. Para além disso, o Comité instou Moçambique a reforçar as campanhas públicas de
sensibilização com vista a promover formas de disciplina positivas, participativas e livres de violência
em substituição do castigo corporal, e aplicáveis a todos os níveis da sociedade. 46
A Carta Africana dos Direitos e Bem-Estar da Criança (ACRWC), que é a carta regional específica
a África, protege igualmente as crianças contra todas as formas de abuso físico e mental, proibindo,
por conseguinte, todas as formas de castigo corporal e humilhante das crianças. O Artigo 16 da
ACRWC prevê que:
“Os Estados Partes da presente Carta adoptarão medidas legislativas, administrativas, sociais e
educativas específicas para a protecção da criança contra todas as formas de tortura, tratamento
desumano ou degradante e especialmente contra o dano físico ou mental, tratamento negligente e
maus tratos, incluindo o abuso sexual…”.
O Artigo 7 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos foi interpretado pela Comissão
dos Direitos Humanos como visando a protecção das crianças contra o castigo corporal. 47
Ao ter ratificado a CDC e outras convenções internacionais de direitos humanos, Moçambique
assumiu o compromisso não só de legislar a proibição de todas as formas de castigo corporal contra
as crianças, no seio da família, escolas, instituições de cuidados infantis e no sistema de justiça penal
juvenil, como também se comprometeu a desenvolver campanhas educativas e de consciencialização
direccionadas para a promoção de práticas positivas e de não violência para que melhor se criem as
crianças no país.
13
6. A LEGISLAÇÃO NACIONAL MOÇAMBICANA
A Constituição de Moçambique protege os direitos civis e políticos das pessoas, assim como os seus
direitos sociais e económicos. Em conformidade com as obrigações internacionais de Moçambique,
o Artigo 40 da Constituição garante que todos os cidadãos, incluindo as crianças, estão livres de
serem sujeitos à tortura ou a tratamentos cruéis e desumanos ou a outros tratamentos afins. No seu
Artigo 47, a Constituição prevê, de forma explícita, o direito das crianças à protecção. Os direitos
previstos na Constituição têm carácter judicial, o que significa que qualquer cidadão poderá mover
uma acção judicial se os seus direitos forem violados.
Por conseguinte, todas as formas de castigo contra as crianças - ocorram elas no seio da família, na
escola ou noutras instituições - provavelmente infringem os direitos das crianças à protecção contra
a tortura e contra o castigo desumano e degradante, conforme está estipulado na Constituição
moçambicana.
Em Moçambique, a proibição do castigo corporal na família, nas escolas e em instituições
alternativas de cuidados infantis, está ainda por cumprir. Não existe um “direito” específico na lei
que permita aos pais aplicarem castigos corporais, mas a actual protecção legislativa para as crianças,
contra os maus tratos e o abuso, não está a ser interpretada como proibindo todo o tipo de castigo
corporal por parte dos pais. As disposições contra a violência e o abuso, que constam no Estatuto de
Assistência Jurisdicional aos Menores (artigo 108), na Constituição (2004) (artigo 40), no Código
Penal (artigos 359 e 367), na Lei de Família (2004) e na Lei da Criança (aprovada em Outubro de
2008) (artigos 4, 7, 17 e 20) não têm sido interpretadas como proibindo todo o tipo de castigo
corporal durante o processo de criar e educar as crianças. 48 Até Junho de 2009, o Código Penal e
o projecto de Lei contra a Violência Doméstica encontravam-se sob revisão na Assembleia da
República para aprovaão. No mesmo modo, não existe uma proibição explícita do castigo corporal
nos centros de cuidados alternativos, nem tão-pouco nas instituições de cuidados infantis. O castigo
corporal como método de disciplina é aceite e posto em prática, de modo muito disseminado, e
por essa razão se torna necessário que a legislação deixe bem claro que nenhum tipo de castigo é
aceite, nem é legítimo e, por conseguinte, não deve ser aplicado, nem pelos pais, nem por qualquer
outro adulto que exerça funções de autoridade relativamente às crianças. 49
O castigo corporal nas escolas de Moçambique é contrariado por directrizes do governo e com ele
se lida no Plano Nacional de Acção para a Criança, mas não existe na lei uma proibição explícita
relativa à aplicação do castigo corporal como método de disciplina nas escolas. A Lei da Criança
obriga a direcção da escola a divulgar quaisquer maus tratos a que os alunos tenham sido sujeitos,
mas não proíbe, de forma explícita, o castigo corporal nas escolas. 50
Contudo, no âmbito dos sistemas penais, como sentença por crime e medida disciplinar, o castigo
corporal contra as crianças é proibido pela Constituição (artigo 40) e pela Lei da Criança (artigo
64). 51
14
7. ARGUMENTOS USADOS FREQUENTEMENTE
PARA JUSTIFICAR O CASTIGO CORPORAL
Quando se põe em questão o castigo corporal, surgem determinadas 'defesas' que são normalmente
citadas pelos pais, provedores de cuidados e professores. Este capítulo tem por objectivo oferecer
respostas a esses argumentos, os quais são apresentados com frequência. 52
O castigo corporal é parte integrante e necessária do processo de criação e de educação das crianças.
Quando se lhes dá uma palmada ou uma tareia, as crianças aprendem a respeitar os seus pais e
professores, assim como a fazer a distinção entre o bem e o mal, a obedecer às regras e a trabalhar
diligentemente. Sem castigo corporal, as crianças tornam-se mimadas e indisciplinadas.
As crianças necessitam de disciplina, e necessitam particularmente de aprender o que é a autodisciplina. Mas o castigo corporal é uma forma de disciplina extremamente ineficaz. A pesquisa tem
demonstrado, consistentemente, que o castigo corporal raramente motiva as crianças a mudarem de
comportamento, porque não lhes faculta a compreensão do que deveria ser feito, nem tão-pouco
oferece qualquer recompensa por se portarem bem. O facto de os pais, professores e demais
interessados muitas vezes terem de repetir o castigo corporal para a mesma conduta indevida pela
mesma criança é prova da sua ineficácia. Dar estaladas, espancar ou dar tareias são substitutos
deficientes para as formas positivas de disciplina, as quais, muito longe de habituar mal as crianças,
asseguram que elas aprendem a pensar nos outros e a medir as consequências dos seus actos. Nos
países onde o castigo corporal foi erradicado por intermédio da reforma na legislação e pela
adopção de uma educação pública adequada, não há evidência que prove que os distúrbios nas
escolas ou na família, causados por crianças rebeldes, tenham aumentado: o céu não cai na cabeça
de ninguém se deixar de bater nas crianças. O castigo corporal pode levar as crianças a terem receio
dos pais e dos professores, em vez de os respeitarem. Será que realmente desejamos que as crianças
aprendam a 'respeitar' aqueles que utilizam a violência para resolver problemas ou conflitos?
O castigo corporal pode estar errado, mas essa questão é trivial quando comparada a aspectos mais
importantes sobre os direitos da criança, como, por exemplo, proteger as crianças contra o HIV e a
SIDA, a pobreza e a violação sexual. Então, por que razão a erradicação do castigo corporal deveria ser
uma prioridade?
Nas regiões onde há milhões de crianças que sofrem com falta de comida suficiente, falta de abrigo,
ausência de cuidados médicos e de educação, até mesmo aqueles que mais se preocupam com os
direitos das crianças poderão argumentar que o castigo corporal é um problema relativamente
menor, que pode esperar por uma resolução. Mas as questões dos direitos humanos não se prestam a
abordagens sequenciais, tal como a CDC já reconheceu. A pressão para acabar com o castigo
corporal deve ser parte integrante da defesa e promoção de todos os direitos das crianças.
Impedirmo-nos de magoar as crianças e de as humilhar não consome recursos, nem distorce a
aplicação dos mesmos. Ao serem questionadas, as crianças apontam a erradicação do castigo
corporal como uma questão da maior importância para elas. Do mesmo modo que confrontar a
violência rotineira contra as mulheres tem constituído o ponto central da luta pela igualdade,
também o mesmo se aplica às crianças. Desafiar, pondo em questão o castigo corporal, é
fundamental para que se consiga melhorar o estatuto das crianças enquanto pessoas, e afirmar os
seus direitos de participação e protecção.
15
No nosso país, muitos pais estão a criar os seus filhos em condições desesperantes, e os professores e
demais pessoal estão debaixo de fortes pressões devido ao número excessivo de alunos e à falta de
recursos. Proibir o castigo corporal vai fazer aumentar o nível de stress e essa proibição deve esperar até
que estejam criadas melhores condições.
Este argumento é a admissão tácita de uma verdade óbvia: o castigo corporal é muitas vezes um
escape para as tensões e sentimentos acumulados dos professores, em vez de ser uma tentativa de
educar as crianças. Em muitas famílias e instituições, os adultos necessitam urgentemente de mais
recursos e apoios, mas por mais reais que os problemas sejam não se justifica descarregá-los sobre as
crianças. Por que motivo as crianças têm de esperar que lhes seja concedida esta protecção básica?
Ninguém discute que seria necessário aguardar até termos uma taxa de 100% de emprego e que as
condições de vida dos homens tenham sido melhoradas antes de confrontarmos a violência
doméstica contra as mulheres. De qualquer modo, bater nas crianças é uma forma ineficaz de aliviar
as tensões. Muitas vezes, os adultos que batem quando estão enfurecidos sentem-se culpados;
aqueles que aplicam castigos corporais na sequência de uma estratégia consciente apercebem-se de
que têm de lidar com crianças que estão sentidas ou zangadas e ressentidas. muitas famílias e
instituições onde o castigo corporal tenha sido substituído por uma disciplina mais positiva, a vida
apresenta-se muito menos tensa para todos.
Bateram-me quando era criança e não me fez mal nenhum. Pelo contrário, eu não seria hoje quem sou,
se os meus pais e professores não me tivessem castigado.
Como pode estar certo de que não teria sido capaz de chegar onde chegou se os seus pais nunca
lhe tivessem batido? Nenhum de nós sabe o que teria acontecido se os nossos pais nunca nos
tivessem batido ou humilhado. E quantas pessoas, que hoje declaram que o castigo não as
prejudicou, estão de facto a negar a dor que sentiram quando os adultos mais chegados acharam
que só as podiam ensinar causando-lhes dor?
Geralmente, os adultos que batem nas crianças alegando que estão a discipliná-las começaram por
fazê-lo porque eles próprios foram vítimas de castigo corporal na infância. Embora a investigação
demonstre que, muitas vezes, os adultos se sentem culpados depois de castigar a criança, eles não
deixam de bater nela, especialmente quando estão a sentir-se desesperados. De nada serve culpar as
gerações passadas, pois elas actuavam de acordo com o que ditava a cultura do seu tempo. Mas está
errado resistir à mudança porque temos receio de que pareça que estamos a criticar os nossos pais.
Os tempos mudam e as sociedades avançam. O reconhecimento de que as crianças são detentoras
de direitos exige acção que ponha fim à legalidade e aceitação da violência contra as crianças, do
mesmo modo que as sociedades agiram no sentido de acabar com a aceitação da violência contra as
mulheres.
Algumas pessoas declaram: “Apanhei quando era criança e estou bem.” Mas há pessoas que foram
sujeitas a todo o tipo de experiências más enquanto cresciam e que hoje, já adultos, “estão bem” - e
ninguém poderia dizer que aquilo que elas viveram foi agradável. Muitas vezes é o modo como elas
lidaram com as suas experiências e como inverteram o seu percurso, e não as experiências em si,
que lhes permite afirmar que estão “OK”.
As escolas necessitam do castigo corporal como último recurso - um dissuasor que desencoraje o mau
comportamento e incentive o bom trabalho.
Se o castigo corporal estiver disponível como sanção, ele será utilizado. E porque não é eficaz, a
tendência será aplicá-lo repetidas vezes numa minoria de alunos. Se for então olhado como 'um
último recurso', é possível que os alunos passem a considerar de pouca importância as outras formas
de disciplina positiva, as quais, por conseguinte, deixarão de surtir efeito. O castigo corporal não
ensina nada de positivo às crianças, nem sobre o modo como os adultos gostariam que as crianças
se comportassem. Pelo contrário, é uma lição convincente de mau comportamento. As crianças não
16
aprendem bem quando estão sob ameaça e tem sido demonstrado que o castigo corporal conduz
ao aumento significativo das taxas de abandono escolar.
Os direitos dos pais de criarem os filhos como lhes aprouver só devem ser desafiados em casos
extremos.
A Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU substituiu o conceito de direitos dos pais por
“responsabilidades paternais” (que obviamente contém certos direitos), incluindo a responsabilidade
de proteger os direitos das próprias crianças. Para aqueles que se habituaram a pensar que as
crianças são simples haveres dos pais, a reivindicação dos direitos das crianças poderá parecer uma
intromissão indevida, mas a verdade é que se reconhece que as crianças, como todas as pessoas, são
indivíduos a quem cabem padrões de direitos. Os direitos humanos não ficam à porta da casa da
família. Outras formas de violência doméstica - incluindo a violência de parceiros - estão já sujeitas
ao controlo social e são consideradas ilegítimas em quase todas as sociedades. É errado que as
crianças, as pessoas mais pequenas e vulneráveis, tenham de ser os últimos a receber protecção.
Tendo em conta as atitudes tradicionais para com as crianças, muitos pais sentem-se ameaçados por
qualquer tentativa que pretenda mudar o status quo. Esta é a razão pela qual qualquer alteração na
legislação necessita de se fazer acompanhar por educação pública e parental com vista a promover
formas disciplinares positivas e isentas de violência.
Há uma grande diferença entre dar uma tareia a uma criança e dar-lhe uma 'palmadinha amorosa'.
Não será que proibir o castigo corporal é levar as coisas demasiado longe?
Uma tareia dada a uma criança pode magoar mais que uma “palmadinha”, mas ambas se situam
numa linha contínua de violência e ambas abrem uma brecha nos direitos que as crianças também
têm de usufruir de respeito e de integridade física. As sociedades não traçam limites nem tentam
justificar nível algum de violência quando se questiona a violência contra as mulheres, ou contra os
idosos. Por conseguinte, por que razão fazê-lo quando se trata de crianças?
E os perigos em se fazer qualquer associação entre amar e magoar alguém devem ser óbvios. Uma
“palmadinha amorosa” constitui uma das contradições mais sérias. O termo aparentemente
inofensivo é uma espécie de véu por trás do qual se podem esconder as violações dos direitos.
Algumas pessoas argumentam que “há uma enorme diferença entre abuso infantil e uma leve
palmada”, focando menos na intenção “amorosa” da violência e mais no grau de violência que é
usado. Mas, uma vez mais, seja qual for o grau de severidade do acto de bater, certo é que este
atenta contra o direito da criança ao respeito e à sua integridade física. E, à face da lei, todo o gesto
de bater que seja considerado legítimo reflecte a violação do direito das crianças à protecção contra
a agressão.
Tradicionalmente, os legisladores e os governos têm feito a distinção entre “abuso infantil” e
“castigo corporal”, mas a maior parte do abuso é castigo corporal - os adultos agridem as crianças
para as castigarem a ganharem controlo sobre elas. Um limiar semelhante não é proposto no caso da
violência contra a mulher, em que uma tolerância-zero transmite claramente a mensagem de que
todo o tipo de violência é inaceitável. Mas, já no que diz respeito às crianças, os adultos inventaram
uma distinção arbitrária entre violência punitiva, a qual se considera aceitável, e “abuso” que já não
é visto como tal. Na realidade, não é possível estabelecer a diferença entre abuso infantil e castigo
corporal.
17
Esta é uma questão eurocêntrica que diz respeito aos brancos. O castigo corporal faz parte da minha
cultura e da tradição de se criarem as crianças. As tentativas de o tornarem ilegal são discriminatórias.
A ideia de que bater nas crianças é uma questão de orgulho cultural é inaceitável. De qualquer
modo, bater nas crianças parece ser uma tradição de brancos, exportada para muitas partes do
mundo por intermédio da escravatura, do colonialismo e de certos ensinamentos missionários.
Aparentemente, as únicas culturas onde as crianças raramente ou nunca sofrem castigos corporais
são as pequenas sociedades de caçadores-colectores, provavelmente as mais “naturais” de todas as
culturas humanas, embora actualmente em vias de extinção sob impacto da urbanização.
Mas os direitos humanos são universais, e as crianças de todo o mundo têm o direito de viver as
suas vidas livres de todas as formas de violência.Todas as culturas têm a obrigação de renegar o
castigo corporal, do mesmo modo que foram capazes de renegar outros atentados contra os direitos
humanos e que haviam feito parte das suas tradições. A Convenção sobre os Direitos da Criança da
ONU defende todos os direitos das crianças à protecção contra todas as formas de violência física e
mental, sem discriminação assente na raça, cultura, tradição ou religião. Há iniciativas conjuntas que
visam acabar com o castigo corporal das crianças em todos os continentes. Em muitos estados de
todas as regiões do mundo, os espancamentos nas escolas e os espancamentos judiciais foram
banidos.
As culturas africanas parecem estar repletas de ditados que sugerem que o castigo corporal contra as
crianças não é a melhor prática de as criar.
“Imbwa ya mukali taichenjela.”
Provérbio bemba que significa que o tratamento duro das crianças a nada conduz.
“Não constróis uma família com um pau.”
Ditado tradicional Zulu
A minha religião exige o castigo corporal das crianças.
A liberdade religiosa não pode ser contrária aos direitos humanos.Tal como o Comité dos Direitos
da Criança esclarece: 53
“Algumas justificações para o castigo corporal assentes na fé sugerem que certas interpretações de
textos religiosos não só justificam a sua aplicação como atribuem o dever de castigar. A liberdade
de crença religiosa é defendida no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (Art. 18),
mas a prática de uma religião ou crença deve ser consistente com o respeito pela dignidade
humana e integridade física das pessoas. A liberdade de cada indivíduo praticar a sua religião ou
crença poderá ser limitada legitimamente de forma a proteger os direitos fundamentais e a
liberdade dos outros.”
As pessoas que possuem perspectivas religiosas extremas e que defendem o espancamento das
crianças com a ajuda de implementos e o emprego de outras formas de castigo corporal severo
necessitam de ser condenadas pela maioria da opinião religiosa e pela sociedade em geral. Figuras
religiosas de destaque têm aderido à campanha em prol da abolição de todo o tipo de castigo
corporal, incluindo no contexto familiar. Na Assembleia Mundial das Religiões pela Paz de 2006,
em Quioto, no Japão, mais de 800 líderes religiosos endossaram “um compromisso religioso para o
combate à violência contra as mulheres”, o qual insta os governos a adoptarem leis no
cumprimento da Convenção sobre os Direitos da Criança e a proibirem a violência na sua
totalidade, incluindo todas as formas de castigo corporal.
18
Se o castigo corporal contra as crianças for banido ou criminalizado, isso dará origem a uma intervenção
judicial ultrajante ou à intervenção disciplinar. As crianças serão encorajadas a reportar os seus pais à
polícia.
Nos países em que o castigo corporal foi banido, já se moveram acções disciplinares contra
professores e trabalhadores de cuidados infantis que persistem em bater nas crianças. Relativamente
ao lar familiar, essas leis centram-se em definir padrões e em modificar atitudes, e não em processar
os pais ou dividir as famílias. A questão da protecção infantil torna-se mais linear e directa quando
se abandonam os complicados conceitos jurídicos como 'castigo razoável' ou 'correcção legítima'. A
investigação tem demonstrado que os pais procuram ajuda mais cedo quando reconhecem que
magoar os seus filhos é social e juridicamente inaceitável. Os serviços de acção social reconhecem
que, de um modo geral, os interesses das crianças são mais bem satisfeitos no contexto familiar, e
oferecem ajuda e apoio aos pais em vez de optarem por intervenções punitivas.
Banir o castigo corporal levará apenas a que as crianças sejam tratadas de maneiras mais horríveis abuso emocional, ou humilhação, ou serem trancadas.
As crianças devem ser protegidas contra todas as formas de castigo humilhante e desumano e não
apenas contra o castigo corporal. Muitas vezes, os pais, outros prestadores de cuidados e os
professores necessitam de orientação sobre alternativas. O ponto de partida não reside na
substituição de um castigo por outro, mas em encarar a disciplina como um processo positivo e não
punitivo, e que faz parte da relação comunicativa entre o adulto e a criança. A 'Boa' disciplina que, no final, deve ser a auto-disciplina - depende do modelo que os adultos oferecem e da
explicação sobre a natureza do comportamento positivo. Depende igualmente das altas expectativas
que se tem relativamente à vontade das crianças - e expectativas realistas face à sua capacidade de
desenvolvimento - de se portarem de um modo positivo, dos elogios que se oferecem como
recompensa pelos seus esforços, da companhia e do respeito. Para além disso, as escolas devem
desenvolver os seus próprios códigos de comportamento e sistemas disciplinares, em cooperação
com os alunos. A imposição de regras arbitrárias concebidas por adultos e as sanções automáticas
não incentivarão a auto-disciplina.
Este é um estado democrático onde, porém, não há apoio democrático que promova a erradicação
do castigo corporal. Se fosse realizada uma sondagem sobre esta matéria, a grande maioria das
pessoas optaria por reter o castigo corporal.
As democracias representativas não são governadas por referendos populares. Quando os políticos
eleitos concebem novas leis ou uma nova constituição, podem ser forçados a tomar uma série de
medidas impopulares, assentes nos princípios dos direitos humanos e em argumentos esclarecidos.
Antes da sua aplicação, e tal como sucedeu por ocasião da abolição da pena de morte, as propostas
que visam acabar com o castigo corporal contra as crianças nunca gozam do apoio popular. Mas se
as reformas forem acompanhadas de uma educação pública adequada, as atitudes e a prática mudam
rapidamente. Este argumento também se baseia nas perspectivas dos adultos. Se as crianças tivessem
direito a votar sobre esta questão, haveria forte apoio à proibição do castigo corporal.
19
8. SUBSTITUTOS PARA O CASTIGO CORPORAL E
OUTRAS FORMAS DE CASTIGO HUMILHANTE E
DEGRADANTE
As crianças necessitam de disciplina, e necessitam, mais particularmente, de aprender a autodisciplina. Mas, para além de contrariarem os direitos das crianças à dignidade humana e à
integridade física, o castigo corporal e outras formas de castigo humilhante e degradante são
métodos de disciplina ineficazes (tal como foi discutido no capítulo 3). A palmada, o espancamento,
a tareia e a humilhação são substitutos fracos para uma disciplina positiva, a qual, longe de estragar
as crianças, assegura que elas aprendem a pensar nos outros e a ponderar as consequências dos seus
actos. Nos países onde o castigo corporal foi eliminado por via das reformas na legislação e de uma
educação pública adequada, não há evidência que demonstre que os distúrbios nas escolas e nos
lares de crianças insubmissas tenham aumentado. 54
É também claro que a maior parte das crianças moçambicanas que são alvo de castigos corporais
preferem ser disciplinadas de maneira não violenta. Elas desejam que os pais e os professores lhes
falem e expliquem o que as crianças fizeram de errado, em vez de usarem o castigo corporal ou
outras formas de castigo humilhante e degradante contra elas. 55
Para além da reforma na lei, o desafio em Moçambique reside em fazer aumentar o grau de
consciencialização dos adultos em relação ao direito básico das crianças de serem protegidas contra
o castigo corporal e outras formas de castigo humilhante e degradante, e à ineficácia dessas formas
de punição. Os adultos devem ser detentores de outros modelos para criarem as crianças, os quais
assentem em métodos disciplinares positivos e livres de violência. É igualmente importante garantir
que o castigo corporal não é substituído pelo castigo humilhante e degradante contra a criança.
Perante isto, e em conformidade com as recomendações do Comité dos Direitos da Criança da
ONU, o governo moçambicano deve iniciar e apoiar as campanhas educativas e de sensibilização
pública que visem promover métodos positivos e não violentos de se criarem as crianças. Esse
esforço poderia ser realizado em estreita colaboração com as ONG e as OBC que trabalham em
prol dos direitos das crianças, e ainda com líderes políticos e tradicionais, organizações com base na
fé e organizações internacionais de doadores. As próprias crianças podem desempenhar um
importante papel nestas iniciativas.Todavia, antes de se lançar em campanhas de consciencialização e
educação, o governo necessita de assegurar recursos humanos e financeiros que permitam pôr em
prática um programa que se pretende sustentável a longo prazo.Também a comunicação social
poderia passar a ser um parceiro chave nessas campanhas, de modo a intensificar a
consciencialização no que toca os direitos das crianças e as formas alternativas de disciplina sem
violência.
É essencial lembrar que a disciplina é um processo contínuo. Não existem 'curas rápidas' para que as
crianças se desenvolvam e transformem em seres humanos que sejam donos de auto-disciplina e
capazes de respeitar outros seres humanos. Considerando que as crianças são indivíduos com
características e necessidades individuais, é importante encontrar alternativas que sejam adequadas a
cada criança. A seguir, algumas dicas de carácter geral e várias sugestões sobre opções de
substituição do castigo corporal e outras formas de castigo humilhante e degradante. 56
20
Elogie as crianças quando elas obedecem e executam bem as tarefas. Essa medida encoraja as
crianças a modelar o seu comportamento no reforço positivo, e incentiva-as a aprender a autodisciplina. Os elogios não custam nada, e mesmo as recompensas não têm necessariamente de
custar uma fortuna: estas podem variar desde os simples mimos, como contar uma história ao
deitar, até permitir que a criança visite um amigo ou familiar favorito.
Aja como recomenda que os outros ajam. Se não é permitido ao seu filho usar uma linguagem
imprópria, então também não o faça.
Seja realista em relação àquilo que espera das crianças em diferentes idades. De nada serve
castigar um bebé por chorar porque ele/ela tem fome, ou punir uma criança de dois anos que
corre para o meio da estrada onde circulam os carros. Deve antes garantir a segurança da
criança eliminando a possibilidade do perigo físico: certifique-se de que o bebé não pode
chegar ao fogo ou à garrafa de parafina, dê a mão à criança quando estiverem a atravessar a rua.
Encoraje as crianças a resolverem os seus próprios problemas, pois muitas vezes elas são capazes
de oferecer soluções que podem resultar num acordo aceitável. Por exemplo, uma técnica útil
para as crianças mais velhas é utilizar práticas de 'reposição da justiça' que são tão conhecidas
no seio da cultura africana. A 'reposição da justiça' visa envolver ambos 'vítima' e 'ofensor'
num encontro para que se trace um plano sobre a forma de reparar o mal causado ou as
relações feridas. Paralelamente, todas as partes desenvolvem planos para impedir condutas
indevidas no futuro. Estas técnicas têm sido usadas com êxito pelos órgãos directivos das escolas
que procuram castigos alternativos no sistema escolar Sul-Africano.
Não use ameaças, nem grite com as crianças. É preferível que as crianças façam o que lhes
pede porque compreendem as razões, e não por terem receio ou por terem sido ameaçadas.
Procure usar palavras 'boas' quando se dirigir ao seu filho/a. Está provado que insultar,
enxovalhar e humilhar conduzem a um baixo nível de auto-estima, e podem mesmo servir de
profecia para a criança. (ex.: és preguiçoso/ burro/ estúpido/ gordo/ mau)
Tente negociar um acordo, mesmo que isso o obrigue a reconsiderar o seu ponto de vista.
Pense: Isto é importante? Afecta a segurança da criança? Alguém sairá magoado se eu negociar?
É suficientemente importante para ainda ter alguma relevância daqui a dez anos?
Empregue métodos de orientação e de aconselhamento, especialmente com as crianças mais
velhas. Se necessário, consulte um familiar com quem a criança tenha uma relação especial, ou
uma pessoa mais idosa na família ou na comunidade que a criança respeite. Peça a essa pessoa
para discutir com a criança os efeitos negativos do seu comportamento e para aconselhar a
criança em relação às expectativas que ela tem.
As crianças aprendem na prática, por conseguinte dê uma tarefa não abusiva à criança, de
preferência algo que esteja relacionado com a sua má conduta. Uma criança que seja obrigada a
consertar, a limpar ou a arrumar algo que partiu ou que sujou sentirá menos inclinação para
repetir o mesmo erro no futuro.
21
9. A RELIGIÃO E O CASTIGO CORPORAL
Em todos os países do mundo, há quem afirme que a sua fé aprova, ou que exige mesmo, o castigo
corporal contra as crianças. Para reforçar os seus argumentos, esses grupos utilizam muitas vezes
textos religiosos antigos. Assente na fé, esta justificação para a violência contra as crianças tem
obrigado diversas autoridades conceituadas das maiores religiões do mundo a pronunciarem-se a
favor de uma maior consciencialização no seio das comunidades religiosas em torno do impacto
devastador que a violência tem na vida das crianças, devendo as comunidades assumir papéis de
liderança ao lidarem com o problema do castigo corporal. 57
Uma série de teólogos e de líderes religiosos já
afirmaram claramente que nada há ligado à sua
fé que justifique a legalidade continuada e a
aprovação social do castigo corporal. Aqueles
que assim se pronunciaram fizeram realçar os
valores centrais partilhados pela maior parte das
religiões - valores como compaixão, igualdade,
equidade e justiça - e o respeito sagrado que
cada religião consagra à inerente dignidade
humana de cada criança, e que não são
compatíveis com o acto de magoar as crianças
ou de lhes causar a dor. Manifestaram-se
também sobre o significado da palavra
“disciplina”, a qual, para alguns grupos
religiosos, passou a ser sinónimo de “castigo
corporal”. 58
“Está a ser feito progresso a caminho da
abolição do castigo corporal, porém milhões
de crianças de todo o mundo ainda sofrem
na sequência de actos humilhantes de
violência, e essas violações dos seus direitos
como seres humanos podem ter efeitos
graves e vitalícios.”
“A violência semeia violência e nós
acabaremos por colher tempestades. As
crianças podem ser disciplinadas sem a
violência que incute o medo e a
infelicidade…”
Desmond M.Tutu, Arcebispo Jubilado
O Conselho Sul-Africano das Igrejas (SACC), numa comunicação intitulada Religiões, a Promoção
da Disciplina Positiva e a Abolição do Castigo Corporal (2007), afirmava: “A raiz da palavra
'disciplina' no Novo Testamento vem da palavra grega
'disciple' que significa orientar, instruir e ensinar.
“Não há Lei na Religião Judaica que
Disciplina no Novo Testamento nunca é usada com a
decrete o castigo corporal contra as
conotação de um acto de vingança ou de castigo. Pelo
crianças. É lógico que os Judeus
contrário, as suas intenções têm por foco ensinar e agir
modernos repudiam todo o tipo de
apropriadamente enquanto seres humanos, com
tratamento degradante das crianças.”
suprema dignidade.” A comunicação avançou: “Ao
Morton Narrowe, Rabino-Chefe
contrário da crença, não há momento nenhum no
Novo Testamento em que o castigo físico seja um meio
disciplinar justificável. Qualquer tentativa para justificar o castigo corporal contra as crianças por via
de textos bíblicos 'comprovados' e/ou de interpretações psicossociais e religiosas das escrituras é
uma tentativa anti cristã, não ortodoxa e, à luz do contexto dos direitos humanos, tangente ao
perigoso abuso dos direitos das crianças”. 59
Na sequência de um estudo que pretendia determinar se o castigo corporal era permitido no Islão,
Hademine Ould Saleck, Presidente da Rede de Imãs da República Islâmica da Mauritânia,
declarou: “A evidência de que o castigo corporal é proibido pelo Islão é clara e vinculativa para
todos nós. Deixemos de discutir. Não temos escolha, e devemos aplicar a Xariá, que protege
totalmente as crianças.” 60
22
Um exemplo de como os estudiosos religiosos têm ajudado na mudança de atitudes no seio das
suas comunidades figura no estudo “As crianças no Islão, seus cuidados, protecção e
desenvolvimento”. O estudo compreende trabalhos de investigação e extractos de versos corânicos,
hadites e sunas que oferecem orientação sobre os direitos das crianças, e que afirma: “A Xariá
proíbe qualquer ataque contra o corpo humano, incluindo bater ou outras formas de danos
corporais ou agressão sexual”. 61
O envolvimento religioso neste movimento para
“A evidência de que o castigo corporal é
a erradicação do castigo corporal contra as
proibido pelo Islão é clara e vinculativa para
crianças tem vindo a alastrar-se,
todos nós. Deixemos de discutir. Não temos
consideravelmente, na última década, e sobretudo
escolha, e devemos aplicar a Xariá, que
desde o lançamento do Estudo do Secretário
protege totalmente as crianças.”
Geral da ONU sobre a Violência contra as
Crianças. Esse movimento teve origem com a
Hademine Ould Saleck, Presidente da Rede
tomada de consciência relativa à perspectiva da
de Imãs e Líderes Religiosos para os
maior parte dos textos religiosos que consideram
Direitos da Criança, Mauritânia
o castigo corporal como uma forma inaceitável
de disciplina - na verdade, ele é contrário aos
valores essenciais que são partilhados pela maioria das fés.
23
10. CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES
De acordo com os tratados internacionais e regionais sobre os direitos humanos, tais como a CDC
e a ACRWC, existe actualmente um movimento internacional que visa abolir todas as formas de
castigo corporal e outras formas de castigo humilhante e degradante contra as crianças, quer o
castigo ocorra em instituições de cuidados infantis, nos sistemas de justiça juvenil, nas escolas ou no
contexto familiar.
Para além de atentar contra os direitos humanos básicos das crianças, existe uma vasta evidência,
facultada por especialistas da área da medicina, educação e psicologia, que aponta para os efeitos
nocivos do castigo corporal e de outras formas de castigo humilhante e degradante contra as
crianças.
Em Moçambique, a violência interpessoal é corrente e está disseminada e os conflitos são muitas
vezes resolvidos por meios violentos. A aplicação do castigo corporal contra as crianças contribui
para que, de tenra idade, se ganhe a percepção de que a violência é uma resposta adequada aos
conflitos e à conduta indevida. Ensina-nos que é aceitável que as pessoas com poder e autoridade
possam ser violentas em relação aos mais fracos e resolvam os conflitos empregando a violência.
O castigo corporal e outras formas de castigo humilhante e degradante na família e na escola são
motivo de forte preocupação para as crianças moçambicanas. Os rapazes e as raparigas em
Moçambique gostariam de poder viver uma vida livre do castigo corporal e de outras formas de
punição humilhante e degradante. Gostariam que os seus pais e professores falassem com eles, ao
invés de lhes baterem, e que utilizassem métodos disciplinares sem violência.
Ao ter ratificado a CDC e outras convenções internacionais de direitos humanos, Moçambique
obriga-se não apenas a proibir, por via da lei, todas as formas de castigo corporal no seio da família,
na escola, em instituições de cuidados infantis e no sistema de justiça juvenil, mas também se
compromete a desenvolver campanhas de sensibilização e de educação, com o objectivo de
promover a disciplina positiva e não violenta das crianças. A aplicação do castigo corporal contra as
crianças está ainda bastante disseminada por diferentes grupos, como pais, professores e funcionários
responsáveis pela aplicação da lei. Muito professores queixam-se do facto de o governo ter
emanado directrizes a proibir o castigo corporal sem que tivesse fornecido as devidas linhas de
orientação, ou facultado formação sobre métodos disciplinares alternativos.
Aparentemente, as principais razões pelas quais esta prática persiste estão associadas à legalidade do
seu uso contra crianças em certas esferas da vida; à falta de compreensão, por parte dos adultos, dos
quadros de referência dos direitos humanos que protegem as crianças e dos efeitos nocivos que o
castigo corporal provoca nas crianças; à ausência de competências para gerir a disciplina
empregando medidas positivas e não violentas; e às crenças culturais.
A legislação, por si só, não bastará para pôr fim ao castigo corporal. A reforma legislativa terá de se
aliar às campanhas públicas de sensibilização e educação para que as atitudes mudem e se
promovam formas positivas e não violentas de disciplina.
No sentido de assegurar o direito das crianças a uma vida livre do castigo corporal e de outras
formas de castigo humilhante e degradante, recomenda-se que sejam dados os seguintes passos
essenciais:
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Reforma legislativa
No âmbito do processo da reforma legislativa em decurso, e no cumprimento das suas obrigações
internacionais no que toca os direitos das crianças, o governo moçambicano deve assegurar que o
castigo corporal e outras formas de castigo humilhante e degradante contra a criança são expressa e
explicitamente proibidas por lei, incluindo a sua ocorrência na família, na escola e em locais de
cuidados infantis. Devem ser repelidas as disposições constantes na legislação que ainda permitam o
uso do castigo corporal, assim como as defesas especiais na leis que escusem quaisquer formas de
castigo corporal contra as crianças, ao mesmo tempo que se devem confrontar as práticas existentes
que tornam possível a sua aplicação. Ao tomar estas medidas, todas as formas de castigo corporal
seriam proibidas por lei, em conformidade com as obrigações internacionais de Moçambique,
estabelecendo-se também uma base clara para a consciencialização e a formação.
Sensibilização e educação pública
O governo moçambicano deve iniciar e apoiar campanhas públicas de sensibilização e educação
com vista a promover métodos positivos e isentos de violência com as quais se deve criar as
crianças. Estas iniciativas podem ser realizadas em estreita colaboração com as ONG e as OBC que
actuam na área dos direitos das crianças, assim como com líderes políticos e tradicionais,
organizações com base na fé, instituições educativas e organizações internacionais de doadores. As
próprias crianças podem desempenhar um importante papel nestes esforços conjuntos. Contudo,
antes de se lançar em campanhas educativas e de sensibilização, o governo necessita de assegurar
recursos humanos e financeiros que permitam pôr em prática um programa que se pretende
sustentável a longo prazo. Ainda no seguimento destas medidas, uma legislação abrangente, relativa
às crianças, deve definir com exactidão a necessidade de os departamentos governamentais
relevantes agirem em conformidade, a fim de garantirem que a educação pública e a sensibilização
para os métodos não violentos de criar as crianças são implementados.
De modo a assegurar que as crianças estarão protegidas contra o castigo corporal nas escolas, o
governo moçambicano necessita igualmente de passar legislação que proíba esse castigo nas escolas
e, simultaneamente, atribuir recursos humanos e financeiros adequados, destinados ao
desenvolvimento de manuais sobre como aplicar métodos disciplinares não violentos na sala de
aula. O governo deve ainda certificar-se de que os professores recebem formação na área dos
direitos das crianças e orientações sobre opções de castigo não violento. Acresce indicar que devem
ser implementados programas de formação concebidos para os oficiais responsáveis pela aplicação
da lei e outros funcionários de cuidados infantis.
Deve ser investigado o modo como as instituições de formação de professores poderiam
providenciar formação aprofundada em torno de conceitos como os direitos das crianças; oferecer
informação sobre a proibição do castigo corporal contra as crianças na escolas moçambicanas; e
garantir extensa formação sobre como gerir a disciplina na sala de aula de um modo positivo e não
violento.
O governo moçambicano, as organizações que defendem os direitos das crianças e a comunicação
social devem reforçar os seus esforços para que haja uma melhor compreensão e respeito em relação
aos direitos das crianças. É menos provável que os adultos recorram ao castigo corporal e a outras
formas de castigo humilhante e degradante quando integram uma sociedade onde a compreensão
relativamente aos direitos das crianças e o respeito por esses mesmos direitos estiverem, de um
modo geral, bem desenvolvidos.
25
A comunicação social
A comunicação social poderia desempenhar um importante papel no que toca a consciencialização
sobre os direitos das crianças, incluindo os direitos de as crianças não serem expostas ao castigo
corporal e a outras formas de castigo humilhante e degradante. Poderia ainda transformar-se num
parceiro chave durante as campanhas de consciencialização sobre os métodos disciplinares sem
violência. Poderia também exercer um papel relevante na monitorização do modo como o governo
cumpre as suas obrigações ao abrigo da CDC, ACRWC e da Constituição moçambicana.
A participação das crianças
Às crianças assiste o direito de estarem envolvidas nos processos e nas decisões que as afectam. As
crianças podem facultar informação valiosa e oferecer opiniões, as quais devem ser levadas em conta
quando se desenvolvem a legislação e as intervenções destinadas a abolir o castigo corporal e outras
formas de castigo humilhante e degradante, e quando as mesmas são postas em prática. As crianças
devem desempenhar um papel activo no processo de implementação dessas intervenções.
Investigação
Sondagens nacionais que compreendam tanto as componentes quantitativas como entrevistas
detalhadas a adultos e crianças sobre as atitudes relativas ao castigo corporal e a outras formas de
castigo humilhante e degradante, e ainda sobre a sua utilização, devem ser realizadas regularmente
em Moçambique.Tais sondagens não devem abranger apenas estas formas de castigo aplicadas na
família e nas escolas, mas devem também averiguar a situação vigente nas casas de cuidados infantis,
nas prisões e noutras instituições. Essa medida vai tornar visível a verdadeira dimensão da violência
e auxiliará o governo e a sociedade civil a conceberem intervenções adequadas que promovam
métodos não violentos de se criarem as crianças.
Monitorização
O governo deve certificar-se de que são activadas medidas eficazes que monitorem o cumprimento
das leis que proíbem o castigo corporal nos diferentes contextos.
Recentemente constituída em Moçambique, a Comissão dos Direitos Humanos pode exercer
funções de relevância no processo de consciencialização que inverta a cultura do castigo corporal,
podendo ainda monitorar o cumprimento, por parte do governo, das obrigações internacionais e
das leis nacionais relativas a esta área.
A sociedade civil estaria capacitada para desempenhar um importante papel não só auxiliando o
governo no campo da formação e da sensibilização para as opções de substituição do castigo
corporal e de outras formas de castigo humilhante e degradante, mas também advogando a favor da
reforma legislativa e monitorando o cumprimento, por parte do governo, das obrigações legais
internacionais e nacionais. Para além dos requisitos que exigem aos estados a submissão de
relatórios periódicos ao Comité dos Direitos da Criança da ONU, solicita-se igualmente à
sociedade civil que forneça ao Comité um relatório alternativo, o chamada 'sombra', fazendo incidir
a sua análise na situação das crianças de um determinado país. Este requisito concede uma
excelente oportunidade à sociedade civil para divulgar a situação vigente, relativamente ao castigo
corporal e a outras formas de castigo humilhante e degradante.
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CONTACTOS ÚTEIS
Save the Children em Moçambique
Para a obtenção sem custos de cópias do relatório
principal e do relatório sumário do estudo quantitativo e
qualitativo sobre as experiências de castigo corporal e de
outras formas de castigo humilhante vividas pelas crianças
em Moçambique.
Tel: (258) 21 493 140
Email: [email protected]
Rede Came
Tel: (258) 21 417 910
Email: [email protected]
www.redecame.org.mz
Save the Children Suécia
Tel: +27 (0)12 342 0222
Gabinete Regional para a África Austral
Para a obtenção sem custos de cópias do relatório
principal e do relatório sumário do estudo quantitativo e
qualitativo sobre as experiências de castigo corporal e de
outras formas de castigo humilhante vividas pelas crianças
em Moçambique.
Email: [email protected]
Iniciativa Global pelo Fim da Punição corporal
contra as crianças
Uma iniciativa internacional que visa formar alianças
fortes contra o castigo corporal, dar visibilidade ao castigo
corporal, influenciar os governos no sentido de banirem
o castigo corporal e oferecer apoio técnico aos estados
que procedem a estas reformas. O seu sítio na internet
contém bastante informação e diversas publicações.
www.endcorporalpunishment.org
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NOTAS FINAIS
1 Clacherty, G., Donald, D. & Clacherty, A. (2009),
Experiências de Castigo Vividas pelas Crianças em
Moçambique, Pretória, Save the Children Suécia.
2 Iniciativa Global pelo Fim da Punição Corporal contra as
Crianças (2009), www.endcorporalpunishment.org.
3 Iniciativa Global pelo Fim da Punição Corporal contra as
Crianças (2005), Acabar com a violência legalizada contra as
crianças, Relatório para Consulta Regional das Caraíbas - Estudo
do Secretário-Geral da ONU sobre a Violência contra as Crianças,
Londres, Iniciativa Global pelo Fim da Punição Corporal
contra as Crianças.
4 Comité dos Direitos da Criança, Comentário Geral N.º 8
5 Clacherty, G. et al op cit.
6 Ibidem
7 Ibidem
8 Ibidem
9 Ennew, J. & Plateau, D.P. (2004), How to research the physical
and emotional punishment of children, Bangcoc, Aliança
Internacional Save the Children.
10 Apresentação de Carol Bower, RAPCAN, ao Children's Bill
Working Group, sobre as consequências psicossexuais do
castigo corporal, Junho de 2004.
11 Dawes, A., Kafaar, Z. & de Sas Kropiwnicki, Z.O., Pather, R
& Richter, L. (2004), Partner Violence, Attitudes to Child
Discipline & Use of Corporal Punishment: A South African
National Survey, Cape Town, Desenvolvimento Infantil,
Juvenil e Familiar, Conselho de Investigação de Ciências
Humanas Sul-Africano.
12 Durrant, J.E., Ensom, R. & Coalition on Physical
Punishment of Children and Youth (2004), Declaração
Conjunta sobre o Castigo Físico contra Crianças e Jovens,
Ottawa, Coligação sobre o Castigo Físico contra Crianças e
Jovens.
13 Clacherty, G. et al op cit.
14 Ibidem
15 Porteus, K.,Vally, S. & Ruth,T. (2001), Alternatives to corporal
punishment - Growing discipline and respect in our classrooms,
Joanesburgo, Editora Heinemann (Pty) Ltd.
16 Ibidem
17 Ibidem
18 Clacherty, G. et al op cit.
19 Ibidem
20 Ibidem
30 Ibidem
31 Ibidem
32 Ibidem
33 Ibidem
34 Ibidem
35 Ibidem
36 Ibidem
37 Ibidem
38 Ibidem
39 Ibidem
40 Ibidem
41 Ibidem
42 Ibidem
43 Ibidem
44 Assembleia Geral das Naçóes Unidas (1989). Convenção dos
Direitos da Crinça
45 Comité dos Direitos da Criança, Comentário Geral Nº 8.
46 CRC/C/15/Ad.172, parágrafo.38-39, 3 Abril de 2002.
47 HRI/GEN/1/Rev.4, Pág. 108.
48 Iniciativa Global pelo Fim da Punição Corporal contra as
Crianças (2009), www.endcorporalpunishment.org.
49 Ibidem
50 Ibidem
51 Ibidem
52 Os argumentos esboçados nesta secção foram extraídos, em
grande parte, do livro Hitting People is Wrong - and Children
are People Too, A practical handbook for organizations and
institutions challenging corporal punishment of children, Iniciativa
Global pelo Fim da Punição Corporal contra as Crianças &
Save the Children Suécia, 2003
53 Comentário Geral Nº 8, parágrafo. 29.
54 Iniciativa Global pelo Fim da Punição Corporal contra as
Crianças (2003), Hitting People is Wrong - and Children are
People Too, A practical handbook for organizations and institutions
challenging corporal punishment of children, Iniciativa Global
pelo Fim da Punição Corporal contra as Crianças & Save
the Children Suécia.
55 Clacherty, G. et al op cit.
56 Sloth-Nielsen, J. op cit.
22 Ibidem
57 Iniciativa Global pelo Fim da Punição Corporal contra as
Crianças & Save the Children Suécia, Relatório Global
2009.
23 Ibidem
58 Ibidem
24 Ibidem
59 Ibidem
25 Ibidem
60 Ibidem
26 Ibidem
61 Ibidem
21 Ibidem
27 Ibidem
28 Ibidem
29 Ibidem
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em Moçambique - Save the Children`s Resource Centre