BEXIGÃO CIDADÃO
Antecedentes
1980
Lina Bo Bardi e Marcelo Suzuki projetam o atual
teatro Oficina e sua expansão.
Novembro - O Grupo Silvio Santos inicia demolições
no quarteirão do Oficina e tenta comprar o teatro.
Dezembro – o grande movimento de artistas e
público pela continuidade do Oficina faz com que o
grupo SS desista da compra.
1982
O Teatro Oficina é tombado pelo CONDEPHAAT e
desapropriado para garantir o trabalho da
companhia.
1983
Iniciam-se as obras de demolição e construção do
novo teatro.
1991
Paulo Mendes da Rocha apresenta nova proposta
para a expansão do Oficina baseada na idéia original de Lina.
1994
O novo teatro Oficina é inaugurado, porém sem a
expansão originalmente desenhada por Lina Bardi.
2000
Abril – É aprovada a construcão do Shopping Center de Entretenimento do grupo Silvio Santos, o Bela
Vista Festival Center, nos terrenos envoltórios do
Oficina.
Maio – Daniel Roberto Fink, promotor de justiça do
meio ambiente do ministério público do Estado de
São Paulo, instaura inquérito civil para apurar a
Lenise Pinheiro
São Paulo, 27 de março de 2002, dia internacional do Teatro e do Circo
Este jornal reúne uma breve dramaturgia do conflito urbano que aqui se trava.
legalidade da construção do shopping naquele local
Novembro – As negociações com o Grupo SS
mediadas pelo ministério público atingem o ponto
tabú, o Teatro de Estádio a ser construído no lugar
do atual estacionamento do Baú da Felicidade.
Dezembro, 30 – A gestão Celso Pitta dá a aprovação
final à construção do shopping.
2001
Março - O grupo SS em nova reunião dá fim às
negociações indispondo-se a alterar qualquer
característica do projeto do shopping que não o
aumento de 3 metros em seu recuo lateral.
Julio Neves propõe pessoalmente a José celso
Martinez Corrêa a compra e demolição das casas
da Rua Japurá para implantar o Teatro de Estádio.
O Oficina não aceita.
Abril - É instaurada ação civil pública a pedido do
instituto Lina Bo e P. M. Bardi, contra a construção
do empreendimento do grupo SS.
Maio, 18 – O Oficina recebe nova proposta para a
construção da expansão. Diante da perpetuação do
esmagamento que o projeto propunha a companhia
decide não aceitar.
Dezembro
Medida Cautelar impede o início das obras do
shopping até que se tenha o resultado da ação
civil pública de abril.
2002 na última página
16 de maio de 2001 - Marta Suplicy
Já tomei minha decisão. Sou favorável ao shopping do Sílvio Santos porque vai revitalizar toda
aquela área. Sem gastar nenhum tostão da
prefeitura.
Oficina
Marta, a Lina Bo Bardi, pensando justamente na
revitalização da cidade projetou um novo espaço
público, ligado ao teatro, aberto à penetração das
chuvas, que vai ser completamente destruído com
a construção do shopping...
Marta Suplicy
Você não vai querer discutir revitalização agora
vai?
Olha, eu já tomei minha decisão, conheço o Oficina
mais do que você. Se quiserem mudar a fachada...
coisas assim, aceitamos sugestões. Agora, o
Shopping vai sair.
Tommy Pietra
trechos de cenas baseadas em encontros com autoridades públicas
7 de junho de 2001 - Clara Ant, administradora da Reginal
Sé
Eu olho aquele bexiga eu não vejo! ou faz uma
brincadeira como fez o ACM em Salvador, finge que está
preservando, pega um trechinho, faz um cartão postal
piriri pororó … deste ponto de vista, O BEXIGA NÃO TEM
NENHUMA POSSIBILIDADE DE DAR UM
TRATAMENTO QUE RECUPERE ou que dê um fôlego
dentro do plano de reconstrução…não sei. Não daria,
quero dizer, não vai conseguir!
Oficina
Nós vamos lutar até o fim. Sabemos que a cidade
está cada vez mais cheia de shoppings, porque as
ruas estão cada vez mais feias e perigosas, e quanto
piores as ruas, mais shoppings são construídos para
fugir do verdadeiro problema. Precisamos de praças
verdes, de céu , de estrelas, de árvores, o shopping
só vem aumentar o deserto. O nosso projeto quer um
espaço público agradável a todos. Não é possível que
um projeto popular que privilegia o público numa
relação revolucionária dentro do teatro,nascido
naquele lugar, originário daquele bairro, que faz
questão de trabalhar com pessoas que estão na
vizinhança,inclusive nas ruas, que pensa num trabalho
novo, que carrega consigo a concepção de espaço
vivo, lugar de encontro do Homem com a terra, seja
destruído por um shopping e desprezado pelas
autoridades.
Clara
É um sonhador… eu concordo com tudo o que você
disse, eu também já fui uma sonhadora, mas eu não
posso fazer nada. O que eu vi , eu como arquiteta, eu
digo: é medonho! É medonho! Mas é propriedade
privada, eles fazem lá o que eles quiserem.
BIXIGÃO Estádio de Theat(r)o Musical, SP 448 Anos
CENTRO DE FAZERES DA NOVA CIDADE DA IDADE DA ANTROPOFAGIA
Ágora, Bucolium, Zona, Libido Social. Um Centro cultural construindo-se na sociedade de informação
como reflexão, estudo, crítica, participação, atuação popular, sobretudo invenção, festa, prazer: Teatro,
SEMPRE EM TORNO DE UMA OBRA DE ARTE QUE POSSA SER ALIMENTO E ORIENTE DE TODOS
OS ACONTECIMENTOS.
l- O dia em que fomos reapresentados ao Centro Cultural de Entretenimento Bela Vista. Diante do
Procurador do Meio Ambiente, Dr. Roberto Carramenha, os representantes do Grupo Silvio Santos nos
mostram o projeto do Centro de Cultura e Entretenimento Bela Vista. Nós conhecíamos por um belo
desenho que nos foi enviado a proposta. Compreendemos felizes o esforço que foi feito: os muros do
beco sem saída caíram, foi nos concedido um espaço ao ar mais ou menos livre do tamanho do Oficina,
diante de um muro paredão mais largo e uma saída por uma rampa subindo e outra descendo como saída
para a Rua Japurá. O Centro não é um centro, tem fachada e tem fundo como a estátua de um santo
católico. A Rua Japurá que poderia ser uma das frentes, vira fundo. Nós teríamos uma saída ainda que
envergonhada para ela, pelos fundos. Nossas exigências, portanto, parecem estar satisfeitas.
2- Para haver negociação é preciso não estar subordinado a pressão de uma fatalidade. São dois
mundos tentando ser criadores, não limitadores. Trata-se de um Projeto Cultural Comum. Eu declarei ao
procurador, que era difícil uma negociação diante da pressão da considerada fatalidadade de um
empreendimento que nós conhecíamos, diante da ignorância dos que nos pressionavam a respeito do
que nós desejamos não somente para o Teatro Oficina, mas para o quarteirão onde se passa a ação
desta peça, para o Bexiga, para o futuro das cidades, para o globo. A contracenação, a negociação que
visa um entendimento depende de um reconhecimento mínimo dos conteúdos em discussão. Paulo Mendes
da Rocha, completador do trabalho iniciado por Lina Bardi e Edson Elito, autor de um projeto para a área
que envolve um milagre de um sim para o Minhocão, com sua resignação em ágora em Praça de Cultura,
recusa por exemplo, a participar deste embate na justiça enquanto for uma questão de centímetros para
cá ou para lá.
3 - Convocação de Paulo Mendes da Rocha para falar livremente. Penso mesmo que neste momento
uma convocação de Paulo para falar abertamente sobre o Projeto ágora seria muito reveladora. Paulo
estudou muito o Bexiga. De sua cabeça nasceu até a idéia de um lago na Zona que o Bexiga escorre na
9 de julho. É um arquiteto artista, um gênio, tem que ser ouvido.
4- Está-se discutindo o Centro Cultural de uma Metrópole no século 21. A negociação só é possível
se criadora e pública. Se os negociadores enfrentarem as diferentes visões de mundo, do público, de
política cultural contidas nos projetos e partirem para a criação. Há uma imposição. Ou você aceita a
discussão monetarista como um axioma ou não tem conversa. Numa área tão fundamental para São
Paulo, o centro cultural da metrópole, é preciso uma discussão de valores não somente financeiros, mais
valores humanos, sociais, políticos, estéticos e de saúde libidinosa. O urbanismo e a arquitetura não são
neutros, encenam uma ideologia, um conceito de vida.
5- Itens. Eduardo Velucci nos enviou gentilmente para o Teatro o projeto do Centro. O advogado Dr.
Marcelo Terra, pediu que colocássemos por escrito o que queremos diante da proposta que nos fazem.
Em itens. O mais rápido possível. Dia 15 de janeiro de 2002. É um começo de negociações entre o ócio
e o neg-ócio. Há tudo por se criar a partir do momento que nasça o desejo do entendimento.
6 - Dia de Oswald. Hoje, 11 de janeiro. 112 anos de Oswald de Andrade, poeta do modernismo, da
antropofagia, precursor do tropicalismo. Nasceu na Barão de Itapetininga, vinha brincar numa chácara da
rua Santo Antônio e morreu num apartamento da rua Ricardo Batista, no Bexiga, e desejou, viu o Teatro
de Estádio:”Estádios de nossa época, onde se há de se tornar uma realidade o teatro de amanhã, como
foi o teatro na Grécia, o teatro para a vontade do povo e para a emoção do povo...” Oswald de Andrade
“Ponta de Lança”. E tinha que ser na ágora onde o poeta fóra da Torre de Marfim, abre seu abcesso
fechado em Praça Pública na ágora, no Social! Libertado como escreveu na “Morta” peça que inspirou a
invasão do sol no Oficina, no país sem luz própria, o Teatro. O movimento arquitetônico urbanístico do
Oficina em ágora, espaço público, é totalmente poesia concreta realizando-se das antenas e raízes deste
grande e ainda por se redescobir filósofo, poeta do Bexiga.
7- Primeira Coragem: proposta. Estamos no Brasil, num século que abre com a guerra e terrorismo.
Guerra ao Terrorismo e Casa dos Artistas. Neste embate específico entre as partes, vivemos exemplarmente
no embate: Grupo Silvio Santos & Oficina, essas contradições do mundo, mas em segredo. Passo a falar
diretamente em carta aberta como os que nos pediram propostas em itens: Se nos abrirmos publicamente,
vamos brincar de brigar primeiro mas, depois, em vez de nos massacrarmos, podemos encontrar o inverso
de nos consumirmos, nos comermos, produzindo, trabalhando juntos, começando por transformar nossa
disputa em espetáculo gravado sem fronteiras, exatamente como na “Casa dos Artistas” transmitido ao
mesmo tempo que juntos encenamos no Quarteirão tal com ele está. “Os Sertões” de Euclides da Cunha,
agora em 2002, centenário do livro em co-produção.
8- Centro Cultural temático no Centenário de “Os Sertões”.
Da nossa parte, mesmo se vocês não toparem estamos fazendo juntos esta encenação. Aqui, agora,
nesta carta pois o impasse entre “Sertões” e “República” é o mesmo desta contenda que já nos reúne há
mais de um ano. O que há cem anos se revelava no livro que reinventou o Brasil é o que se vive no
mundo, a mesma Terra, o mesmo Homem, a mesma Luta:civilização & barbárie, terror da ordem & desordem
do terror universo liberal republicano & o que está fora dele. Mas, tem um porém. Nós não vamos reviver
o livro para fazer a missa do massacre, nem vocês. Cabe a nós agora reinventar outro Brasil, onde os
termos das contradições não se excluam criando o nunca visto: a captação das energias guerreiras
antípodas para a cachoeira transmitida digitalmente. O Sertão do seu centésimo ano vira cachoeira entre
o Grupo Silvio Santos, o SBT, o Teatro Oficina Uzyna Uzona, Artistas de todas as áreas, técnicos, pessoas
aprendendo, ensinando o Público ativo não somente espectador. (mas quem quiser pode ficar só vendo).
Não sei se devia deixar esta decorosa proposta para o fim porque a estas alturas vocês vão estar dizendo
que isto não tem nada a ver com o assunto. Mas vamos provar que tem.
9- O Projeto do Shopping Cultural.
No fim do ano passado nos reunimos, estudamos o projeto Julio Neves do Centro. Para o que pretende
não há melhor. É ótimo. Uma Torre que começou enfeitada como um castelo dos Jetsons, agora é gêmea
da torre da caixa d’água do Sesc Pompéia, de Lina Bardi. Sorveu o glacê do bolo de noiva da Disneyworld:
um Caralho explícito maior, mais alto, do que o Copan, o poderio do Rei da Vela nos domínios do Bela
Vista, a cruz da primeira missa para um restaurante onde se come vendo e sendo visto por toda São
Paulo! O reino do novo Rei do Brasil. Sem ironia mas com fé, viva Silvio Santos! Viva seu atual reinado!
Da tua torre, nem com luneta se verá um mendigo. Eles comprarão casas e somente os painéis de hotéis
multi-estrelados duma mais que Broadway Brasileira. A estrela da novela mexicana no seu coquetel de
estréia de lá verá a Bexiga, perdão, a Bela Vista e seu empresário lhe dirá: “Você tem a Bela Vista a seus
pés”. Os executivos terão inúmeras salas para suas convenções e fofocas. Depois terão o Credicard
Show, a Fnac, os teatros Alpha, as Academias de Malhação, Centros da Convenção , a praça da
alimentação, uma micro Orlando para seus garotos e lojas satélites, 10 cinemas de 80 lugares, passando
o mesmo filme: Bilheterias, bilheterias, e bilheterias... E para sair do sério dentro do “espírito boêmio” do
bairro virado metrópole, uma Pista de Dança com um subsolo riquíssimo em estacionamento, de onde
todos se retirarão seguros aos pares ou em bandos como coros orientais de executivos, com garotos(as)
de programa para seus lugares, famílias pra os lares, hotéis, ou motéis com a certeza metafísica que
consumiram. Mas que ficou faltando alguma coisa, sempre falta. O quê? No meio daquele templo a
minhoca do Oficina dá para um Playground, que chamam Teatro Grego e sai em fila por trás, pois como
um palco italiano, o Shoppping Centro tem repito fachada e muro dos fundos. Não é um centro, um Cieps
do capitalismo popular, onde nada se cria, tudo se consome. Um Templo de Consumo. Aleluia! O projeto
tem tudo que conhecemos na culinária do mundo do entretenimento americano junto. Ideal para montar
“Ascensão e Queda de Mahagony” de Bertolt Brecht.
10- Bexiga Centro ou Bela Vista Center da Paulicéia 448.
É o início com esta torre e este centro modelo de cultura e entretenimento, de uma implantação onde o
Bexiga vai desaparecer num qualquer lugar, uma Barra da Tijuca sem Lúcio Costa, sem o mar, uma Miami
a seco. Talvez caiba um Piscinão. O projeto de Lina Bardi do Oficina é o de um embrião de uma cidade,
o modelo do Shopping de outra, ou melhor do mesmo DNA da mesma que vem sendo construída há 448
anos. Mesma idade do nascimento da antropofagia com a devoração do Bispo Sardinha. Estamos, portanto,
neste aniversario de São Paulo vivendo este tupy or not tupy. Digo Sim a este projeto se examinar pela sua
natureza financeira como um novo Centro de Diversões e Entretenimentos da cidade mais claramente: Centro
da Cidade, uma mais que Broadway. Digo Sim, se fosse tudo por dinheiro. O Bexiga entrou para a Operação
urbana, logo vira Bela Vista, vira Centro da Cidade. A Torre do novo Marco Zero de São Paulo no emergir do
Vaticano da SBT, de Silvio Santos vivovirando o Rei do Brasil, o Rei da Vela!Maravilhoso! Mas um espetáculo
já conhecido. Se fosse tudo por dinheiro! Mas não é.
11- O Rei Merece Mais. Este novo Rei sinceramente, merece mais. Já pode aposentar a fatalidade do Rei
Midas. Concordo que o Bexiga seja o Centro porque é o umbigo cultural da Cidade, pode como todo centro
quer e ser o centro do mundo, de um mundo, de muitos mundos. Já conhecemos estes centros em muitas
capitais de capitais de mundos, o centro do Vaticano do Consumo culinário da Imagem do Espetáculo Happy
Hour do Mundo, com muitas sagradas bilheterias. Este é o mundo que conhecemos, e que está como está
aterrorizado, com seu próprio espetáculo bíblico de horror de sua própria produção de drogas, de terror, de
calotes, exílios, refugiados de ditaduras econômicas, et les miserables. Tudo porque rejeita, reprime, exclui o
que não entra na sua ordem. Os gregos foram sábios, instituíram em Atenas o Terreiro das Fúrias onde todo
o rejeitado do social era praticado, transmutado. Daí veio a Tragédia Grega, a maior criação de arte pública
da história da humanidade.
12- Centro de Cultura de Importação ou Exportação? Produção ou Consumo? That is the question. O
centro de uma Cidade hoje, pós 11 de setembro, não tem obrigação de ser de diversão mercenarizada.
Saímos culturalmente da imposição trágica do mercantilismo. Pode ser o de produção de arte e de vida, um
centro de exportação e não de importação. Centro Produtor de uma cultura de Exportação, para lá da Benetton,
ou da Factory de Andy Wahrol. A overdose financeira do capitalismo provocou no entretenimento a tagarelice,
o papo furado, a especulação. Mas a verdadeira diversão é criar, produzir, jogar e inventar o jogo. Atuar no
social por amor a si mesmo, para produzir outra sociedade, sociabilidade. Além do saldo, as multidões estão
famintas daquilo que não se compra e que podem fabricar juntas com a participação de sua energia criadora.
A popularidade dos jogos da SBT são vanguarda, sintoma de uma multidão que quer jogar o jogo dos valores
da vida. É canalizada para o dinheiro, mais quer mais está querendo mais. Mais dinheiro e mais não dinheiro.
13- Bexiga mire-se na Lapa, no Recife velho. No Candial. No Rio de Janeiro, a Lapa voltou a ser a Lapa.
É o ponto maior do mapa do ex-Distrito Federal. Salve a Lapa! Sexta-feira ela é Federal e Negra, é capital.
Todo Diáspora Africano carioca com seu luxo de Madame Satã, ocupa o novo centro Vivo do Rio. A cultura
dominante africana na ginga do mundo futuro que o presente engravida, esparrama-se pelas escadarias de
Santa Tereza, azuleijadas por um artista do bairro num chão brilhante de subida de estrelas, esquentado por
milhares de bundas assentadas em todos
os seus degraus, assistindo as ruas e casas
abertas cheias da Lapa funkando. A
“Fundição Progresso”, o “Tá na Rua”, o
“Circo Voador”, o Teatro, foi a vanguarda
recriadora onde as putas, poetas,
malandros, já haviam reinado, onde a Corte
portuguesa capitalizando Portugal no Brasil
havia feito os Arcos. A Lapa está virando
um Maracanã de cultura popular viva. Um
Milagre. No Recife, a Velha Sinagoga
origem de Nova York está lá musicada pelo
Mangue Beat, pelos Galpões do porto
ocupados por grupos de teatro, maracatú,
reinado de Chico Science. Sem esquecer
a maravilhosa ágora do candial em Salvador dirigida pelo gênio de Carlinhos Brown
e projeto axé etc..
14- Bexiga, bairro inventado como
centro internacional cultural por
artistas.
Digo Sim ao Sim. De um Bexiga assim
revitalizado, revivescido, das suas origens
tupys e negras: o quilombo de Libertas, a
escrava alforriada que ganhou a “Chácara
do Bexiga” do seu Senhor que ia até a
Avenida Paulista. De lá veio a Glória da
“Vai-Vai”, até hoje sem quadra de ensaios
que faz da rua, sua casa de artista. Vieram
os emigrantes do império Romano. Fizeram
a arcos casarões, palácios de fachada que
você não dá nada por dentro, como a casa
do fotógrafo inglês, Granger, que por dentro
é um Palazzo.Os negros foram para as
cabeças de porco e para os cortiços, e veio o Samba de São Paulo. A ópera italiana no Zeus, Adoniran
rebolou. Abriram-se as cantinas e o TBC. O primeiro com uma companhia permanente de teatro e de cinema,
a Vera Cruz. De lá, saíram vários territórios livres de produções verdadeiras, cidades principados de teatro.
Viva Franco Zampari! Sérgio Cardoso e Nídia Licia, Maria Della Costa, Cacilda Becker, Arena, Oficina, cada
lugar um universo de auto produção de exportação. Um país, um lugar único como cada cantina tendo seu
sabor específico. Os artistas de teatro, do samba, da poesia moravam no Bexiga. Pensões de estudantes, eu
mesmo morei na Condessa São Joaquim para fazer a Faculdade de Direito.
15- Origem e Destino: Bairro não de boêmios, mas de artistas criadores de sua própria maneira de
viver, produzir. Omulú, deus bixiguento da cura. Artistas, senhores de sua própria horta, de seu próprio
pomar nessa diversidade provocando toda a cidade como um todo que trazia o nome dos buracos na cara da
peste, da resistência à peste, da reivenção permanente da doença em saúde de Omulú, o deus bexiguento
do Bexiga.
16- Teatro Oficina, o que restou de uma prática passada agora futura. O Teatro Oficina é um teatro
inaugurado no dia 16 de agosto, dia de Omulú de l961, virou três vezes para virar terreiro eletrônico. Hoje
centro cultural orgânico em fase de plugação virtual e transbordamento de toda cultura retida, primeiro pela
ditadura militar depois, pela financeira. Agora, plantando um vasto pomar sem dono. No universo pós dia 11
de setembro, este núcleo é o Guesa, isto é, o último índio de um tipo de teatro-terra, cultivado por companhias,
coletivas que se suscendem. Poderia ser uma espécie em extinção, mas justamente na sua solidão veio de
encontro à tendência natural de todo teatro novo de São Paulo configurada no movimento “Arte contra a
Barbárie”, das novas companhias paulistas de repertório ocupando o espaço para cultivo de uma maneira de
ser. Teatro de Companhias, livres, independentes que querem produzir-se. Assim como esta arte é mambembe,
ela parte sempre de um lugar onde ela concebe de um barraco de fabricação onde ela tem seu suporte, seu
estúdio de artista como o cineasta a câmera, o violonista o violão. O teatro é uma arte de ocupação de
espaço para criação dos rituais públicos de inter-relação humana, visando o movimento, a transformação, e
esta arte como todas transcende atualmente a bilheteria, e assim como a novela da televisão, ela deve ser
criada original e visar todo o público, independentemente de seu poder aquisitivo. E tende cada vez mais em
jogar com a sociedade de espetáculos como sua fonte desmistificadora, criadora e revitalizadora para a
sociedade mais do que do espetáculo. É um teatro em que público não somente assiste, mas atua. Ensina e
aprende. Coube este destino ao Teatro Oficina. De ter acumulado uma experiência e um acervo de mudas
capazes de expandirem-se socialmente. Grávido de uma história de mais de quarenta anos, está prenhe de
um projeto para seu entorno Tombado, que aliás deu origem ao seu terceiro nascimento como o Teatro
Oficina de Lina Bardi e Edson Elito. Lina concebeu num canudo de terras um teatro de passagem, um link,
uma liga, uma tomada entre a Rua Jaceguay e o Anhangabaú através de um Estádio de Teatro Eletrônico ao
Ar Livre, com teto retrátil acomodado a topografia do terreno do atual estacionamento do Baú da Felicidade.
Paulo Mendes da Rocha completou ligando o Minhocão e terrenos remanescentes a este canudos, imaginado
da Rua Adoniran Barbosa até a Rua Japurá numa planta baixa como duas taças ligadas por suas hastes. Uma
rua e duas praças dando para outras ruas, um delta irrigador da cidade, com criação e consumo na fonte. A
primeira visão de Paulo, foi uma prateleira espelhada do Bar com pingas de todo mundo. O projeto nascido de
uma história de resistência sem resistência a transformação é cosmopolita, não há nada no mundo parecido, é
de exportação.
17- Teat(r)o Futebol Esta expansão é uma necessidade vital das sementes culturais de mais de quatro décadas,
que agora contém muitos erros preciosos, muitos acertos, muitas apostas para o futuro de uma produção de
invenção de vida convivida de artista a ser partilhada e principalmente potencializada pela inclusão no seu
processo de todo o mundo. Chegou a hora do Brasil viver seu teatro popular como um futebol. Chegou o
momento em que é possível o Teatro ter seu Estádio e tudo que envolve esta arte com todo poder e pujança que
já existiu na Grécia. O VAI-VAI , o TBC, o Samba de Adoniran, a Poesia de Oswald, o Teatro de Cacilda, e os
delírios Tecnológicos do terreiro eletrônico vão dar agora num Estádio Tecnizado de Teatro, num pomar no
sentido da ecologia urbana de lugar onde em se plantando dá frutos entornado, abraçado de tudo que possa dar
vida a este salto de popularização de Teatro. Quando o público vai ver “Bacantes” não sai mais do teatro, quer
mais. Quer fazer teatro, dançar, namorar, quer mais que consumir, quer produzir, gerar, fecundar.
18- Exercício de Imaginação. Antônio Conselheiro encontra-se com Marechal Bittencourt no meio da Guerra
de Canudos e muda o destino do massacre. Tudo que for necessário para fazer uma peça de Estádio e para
acolher sua recepção poderá ser feito, e a melhor maneira de nós fazermos a entender, é propondo ao menos
como exercício de imaginação, a produção conjunta de uma peça de Estádio: “Os Sertões”, por exemplo. É um
livro onde há o arraial de Canudos cercado pelo Exército que quer civilizar os bárbaros a pranchadas. Vamos
supor que Antônio Conselheiro, João Abade, O Beatinho, Pajeú, as Beatas de Canudos conduzidos pelo jornalista,
poeta e cientista Euclides da Cunha no meio da Guerra se encontrassem com o Marechal Bittencourt. O presidente
Prudente de Morais, os Nizan Guanaes da época se propusessem ao invés de se matarem, unir as forças da
produção de mutirão de Canudos com as do Exército e potencializarem os dois Brasis, num terceiro Brasil
desconhecido.
O Grande livro de Euclides e a Epopéia que os brasileiros viveram tanto no Exército como em Canudos, valem
neste ano eleitoral este escândalo de contracenação de contrários. Uma novela que vem a tona hoje na segunda
semana do ano 2002, para começarmos a gravar hoje no tribunal do meio ambiente. Se não gravarmos, estará
gravado na nossa memória e logo passado para anotações, daí para cena. Mais uma vez vão dizer, não estamos
de acordo, isto não tem nada a ver com o que estamos discutindo. Ora, estamos tratando do centro cultural de
São Paulo, o Teatro Oficina de quatro décadas de experiência de continuidade da contribuição do modernismo,
do tropicalismo, do teatro universal, e o grupo com o protagonista de que leva o nome, tornado o mais onipresente
deste ano em tudo no Brasil, Silvio Santos holístico. Acha que
um teatro pode burocraticamente ignorar toda a riqueza desta
novela e ficar numa discussão abstrata, fora do tempo e do
espaço? Fixar-se em duas concepções segundo a limitação dos
nossos conceitos, presos a velhos esquemas e preconceitos?
De repente, juntos não podemos fazer alguma coisa a altura do
momento excitante em que vivemos? Vamos cair no lugar
comum?
19- Abrir o jogo, debate público em ação construtiva de um
trabalho.
O que há para esconder? Eu sei que o segredo é a alma do
negócio, mas o que há para esconder que não deva ser
mostrado. As guerras atuais escarafuncharam tudo, está tudo a
vista. A sociedade de espetáculos atingiu um tal ponto em que
é inevitável as câmeras voltarem-se para os que fazem o
espetáculo do mundo, e para os segredos dos seus negócios
este slogan foi superado pela revolução digital. O maior negócio,
o da China, seja agora talvez revelar seu segredo. O Teatro,
artes, a literatura, são portas abertas na revelação dos segredos.
Eu quero passar todos os segredos que produzem meus maiores
negócios, como é o de estar em cena para mim. Acho que temos
de ensinar um pouco das nossas malandragens profundas para
todo mundo. Seria maravilhoso que Júlio Neves viesse se juntar
ao seu colega de classe Paulo Mendes, a Edson Elito, ao
paisagista Fernando Chacel, a Lina, para criarmos juntos alguma
coisa que nunca se viu. De Silvio Santos, o homem que ganhou
de Bin Laden em Mídia no Brasil, é o mínimo que eu espero. A
audácia de não fazer um Centro lucrativo e previsível, mas de
surpreender com uma aliança tão absurda e investir numa jogada
de reinventar o Brasil e reinventar o mundo, de criarmos juntos
com muitos artistas e crianças brasileiras de todas as classes e
idades, um espaço cultural o mais móvel e rápido possível em
torno de temas. Neste ano viveríamos “Os Sertões”. O que é
preciso para os “Sertões”? A Formação de uma pequena
humanidade de atores, músicos, técnicos capazes de encenarem de um lado uma comunidade de jagunços,
nordestinos, a população mais viva do Bexiga atual com fé na sua capacidade de reviver sua própria cultura
comunitária, de mutirão, seu forró de Gonzagão pós Chico Science, seu Forró do Avanço como já tivemos aqui
no Oficina nos anos 80, nordestinos que foram a rocha viva da vitória do Oficina Tombado, sobre o Oficina
quase comprado pelo Baú. A formação de tudo que é preciso para um exército com todo o poder da República,
uma rua do Ouvidor, um baixo atento, informado, fofoqueiro, a opinião pública da classe média mudando os
destinos das fatalidades. Comendo da farinha de guerra, da mandioca aos tofús, nas cantinas cabarets. Todas
as condições do musical americano para este exército. Todas as tecnologias, a cyber informação e o universo
digital nos seus níveis mais sofisticados de revelar as entranhas do corpo humano, da terra, da sociedade
construindo-se. Toda esta humanidade estudando-se junto, revezando os papéis. Liberando com a força do
teatro todo seu desejo de transmutação inter-relacionada e pública. Parece “Imagine” do João Lennon, ou as
utopias da bondade d’Ela, sua Santidade, o Papa, mas não é. No espetáculo do espetáculo, na cultura e no
entretenimento, na ciência, no estudo, no amor, tudo é possível. Mas vocês vão dizer, é um negócio: o show
business argumentarão. Mas o show business padronizado é um negócio que está ficando chato, sem criatividade,
sem tesão. Onde o jogo está com as cartas marcadas demais e o resultado, a produção de tédio. Os Centros de
Entretenimento e cultura não vão mais produzir tédio e terrorismo. Vamos fazer business do século 21. Estou
oferecendo esta consultoria grátis para um grande empreendimento patrocinado pelo Grupo Silvio Santos.
Incluindo o Minhoção e as Torres do Arquivo Eletrônico do Teatro e A Casa de Produção com o Bar de todas as
pingas que Paulo Mendes da Rocha viu.
20- Primeiro passo, tomar conta do espaço sertão. Vamos ser mais concretos, partir do que está. Dos
espaços tais como estão, dos lugares já comprados como a Sinagoga, o prédio da esquina Abolição Japurá, e
todo nosso conflito se derrama na armação, encenação da história de um conflito e do massacre de Canudos
que é chave para que o Brasil de um salto. Montamos juntos todos os cursos necessários do que o livro pede.
Todos os conselhos. Juntamos todas as traduções do livro no mundo e criamos a partitura musical, com músicas
a partir das letras de Euclides, de várias culturas: China, EEUU, Islã e do Brasil. O poeta Carlos Renó vai colher
trechos do livro e dar para os compositores do Brasil musicar. “Os Sertões” é um musical do Bexiga no mundo.
Seu destino é formar um Cieps de cultura, ciência, política, história, brasileira, com todos os seus criadores. O
próprio povo periférico que já através da Petrobrás recebe bolsas para participar em mergulhos de artes que
levem a uma participação em um espetáculo desta monta. Investimento social em leituras coletivas do livro,
cursos sobre todos seus multifacetados aspectos: geologia, física, metereologia, ecologia, (Os Sertões é a
primeira grande obra de ecologia, na acepção mais vasta que inclui a economia geral da vida no combate ao
martírio da terra conseqüente do martírio do próprio homem). Matemática, artes marcias, ocidentais, estratégia,
marketing, literatura, língua shakesperiana de Euclides, capoeira, dança, maracatú, taichi chuan, sertanejo,
yoga, história do teatro, teatro, muito teatro e circo, e dança, raves sagradas, artes cênicas.Augusto Boal poderá
organizar uma Universidade do Teatro do oprimido. O grupo dos teatros de deficientes mentais Ueinz,
os presidiários do Carandirú, os meninos do Bexiga e tantos grupos viriam se juntar! A SBT abriria
toda uma área experimental de estudos da TV da era digital, Canudos no mundo cybernético com
pessoas vindas de todo o Brasil. Estas idéias todas estão registradas no coração deste escrito, mas
se quiserem copiar não vão saber fazer. É alguma coisa que tem de ser feito abertamente, dando
prioridade a produção, a criação, ao aprendizado e a humildade do aprendizado de nós todos. Ivaldo
Bertazzo também poderia trazer seu saber trabalhar multidões. E a SBT poderia fazer “A Guerra do
Fim do Mundo” de Vargas Lloza, uma novela global que é uma toca não montar este ano.
21- O que o Bexiga pode poder e precisar? Mas a questão que se coloca, deve ser debatida e
produzida publicamente é a de saber se São Paulo precisa de mais shoppings culturais ou não. Se o
Bexiga com sua configuração geográfica, não totalmente verticalizada, e sua possibilidade de ser um
centro de artistas, lugar onde se vai consumir o que lá se produz, se cria, se exporta: produção e vida
de artista, ou vai ser uma área turística de consumo, de “bohemia” e de exibição das grandes
corporações. No espetáculo da cidade de São Paulo, o Bexiga deve ser um lugar de liberdade onde
estará acontecendo sempre alguma coisa imprevisível. Nesta virada do mundo, como diretor do Oficina,
sinto que desejo dizer sim a tudo que criei aqui até aqui e, que agora está a ponto de realizar-se pleno
no social, na ágora. Mas devo dizer-me a mim, a meu trabalho, não? Diante de um projeto que o
interesse está em gerar 9000 empregos, por uma aplicação de 75 milhões de reais, e que tem sua
qualidade maior exatamente na sua forma arquitetônica-urbanística de Shopping Cultural, de fazer
render este capital e garantir esses empregos? Vivo sem dúvida uma situação trágica. Parece o
quinto ato de uma tragédia. A contracenação que eu esperava entre dois tipos de teatro tem sido difícil
encontro uma posição financista fundamentalista, no poder público, estado, município, no tudo por
dinheiro. Este dado é tomado como tabú, indiscutível, metafísico, hegemônico. 9000 empregos - 9000
trabalhos de criação, 75 milhões - investidos na infra estrutura de tornar público e praticável o Bexiga,
praças verdes, confortos urbanos, produções culturais digitalizadas.Trabalho social, educativo de
artístico para que o Teatro de Estádio se transforme numa riqueza cultural e econômica como o futebol.
Executivos & populares, vanguarda econômica & vanguarda artística & população teatralizando seus
conflitos e contradições, projetados nas criações coletivas do Bexigão. circo romano, muvucas GLS,
e fanáticos heteros, Rock in Rio, sinagoga com rave ecumênica, com raves de todos os credos,
músicas e danças sagradas de todos os deuses. Um trabalho em progresso que vai sendo determinado
arquitetural e urbanisticamente pela sua evolução conjunta. Investimento para grande rendimento a
médio prazo. Invenção de uma nova paixão nacional: a novela sem fronteiras das superproduções
coletivas.O grupo Silvio Santos que criou a vanguarda no capitalismo popular, pode saltar para um
investimento social com sua experiência, terminará por fazer multiplicar ao infinito o capital
investido.Minha proposta é de um investimento desse porte e até mais, para todo o Centro da cidade
cultural, o Bexiga como Bexiga. Com seu casario, com uma ampliação maníaca de todos os seus
pomares possíveis e impossíveis no seu atual deserto, do seu passado, de suas saudosas malocas e
castelos, na folhagem excessiva e sombria que cobre a casa de Dona Iaiá, que os homens com as
ferramentas não vão derrubar , se somem construções urbanas que o Bairro nunca teve para virar o
centro cultural de uma cultura viva de São Paulo futurista, mas com gente, muita gente e muita tecnologia
e muita, muita produção. Que se crie uma infra estrutura pública na restauração de muitos espaços e
no equipamento onde se desenvolva um trabalho de arte, educação de artes populares e eruditas,
estudos que seja todo ocupado com Oficinas, Uzynas Uzonas, Estúdios, Sítios de Arte, como uma
universidade popular onde todo saber da gaia ciências das periferias venham se encontrar nesta
periferia, que ela não saia daqui. Mas que não fique como está agora, periférica, miserabilisada,
mendiga, assaltante, sem teto. Que essa quantidade, empregos e dinheiro, seja investida na
transformação de seus habitantes, os que quiserem aqui estar, ser um lugar não para as famílias
passearem, mas para quem quiser não desistir da Ronda, o samba hino de São Paulo, e precisar sair
na fissura da mais nova aventura e reinventar uma cidade pelo seu centro cultural velho, ressuscitado
criança. Sei do que sonho para aquele quarteirão e sempre pensei que os reis do Brasil iriam se
orgulhar do que nasceu nele. Já teve sinagoga, terreiro, igreja protestante com corais bachicos
maravilhosos, partido comunista, UEE, PT, centro de meditação japonesa, Baú da Felicidade, Teatro
Oficina. Era um quarteirão cabeça. Jaceguay, rua do que come cabeça. Vieram aqueles prédios
enormes, com o nome imenso de SS, como nos blocos das grandes corporações americanas, o
sonho americano. Misturado como toda miscelânea no Bexiga, tudo bem. Mas aos poucos foi
comprando tudo e botando tudo abaixo, criando a tensão Quarteirão do Silvio Santos, agora Bela
Vista Las Vegas.Tudo disse sim, não sei porque no Oficina eu disse sim, ao poder que o lugar tinha
criado e tenho a pretensão de que existe uma força indivina popular não informada, desligada, mas
que atenderia ao chamado de um trabalho cultural forte que como artista com vocês, eu posso
demonstrar através de um trabalho coletivo com os “Sertões”. Não sei abranger todo o Bexiga, muito
menos todo o quarteirão. Vou aprender, vocês e todo mundo podem me ensinar. Sei que se este
assunto fosse deixado de ser tabú e Silvio Santos em pessoa viesse ser pessoa aqui também, se
quiser passo meu papel de Antônio Conselheiro e o dirijo ou vice-versa. Sua fortuna foi construída
como camelô, é o deus dos ambulantes, exploração, devoração, adoração, não sei. Ele tem a sabedoria
com o dinheiro a ponto de ser artista do dinheiro e começou do centavo. Sua filha na tragédia “Fernando
Dutra Pinto”, revelou o desejo do pai. Todos os jornais repetiram o release, desfilou no Sambódromo
do Rio, foi seqüestrado, estourou na Casa dos Artistas e finalizou o ano com o desfile de políticos,
coroando-o rei do espetáculo e Maluf do simpático Bobo do Rei ( adoro, não tenho nada contra). Sou
um dramaturgo atormentado por estar vivendo diante de tal novela, dentro dela, mas fora dela, sujeito
oculto, vivendo a clareza de estar vivendo esta situação mas sem saber fazê-la emergir com toda sua
imensa teatralidade. É impossível discutir sério a questão de um Centro Cultural fechando as asas do
Oficina, sem ser capaz de trazer a tona esta novela. É de interesse do que, de quem? que esta novela
não apareça, que não seja dada clara ao público? Mas não sou somente eu que estou jogando meu
talento de artista de teatro fora, se não consigo criar um poema a altura deste acontecimento. Todos
nós, juristas, partes, responsáveis, estamos num encontro para marcar o século. É grande demais! E
eu, sou pequeno diante de tanta grandeza. Devo ter a possibilidade de elaborar publicamente este
projeto com muita gente. Abrir a zona para todos os puta artistas criarem. Com dor de dente, dopado,
indolor, mas incolor, luto com minha cabeça e corpo, pois tenho certeza que a formulação mais clara
se se busca vem. “Se disserem desista, esta busca é inútil. Eu não desistia”.
22- “A arquitetura dos homens de conhecimento” “Será preciso entendermos um dia , talvez um
dia próximo o que falta acima de tudo nas nossas cidades, tranqüilos e espaçosos lugares para a
reflexão, lugares com longas e altas galerias para o tempo ruim ou demasiado claro, onde não o
chegue o barulho dos carros e dos pregoeiros e onde um refinado decoro proibisse até a um padre de
rezar em voz alta. Construções e passeios que no conjunto exprimissem o que há de sublime no
meditar, e no por-se de lado. Foi-se o tempo em que a Igreja tinha o monopólio da reflexão, em quer
a vita contemplativa tinha de ser antes vita religiosa. Tudo o que a Igreja construiu deu expressão a
esta idéia. Eu não sei como que tais construções, ainda que fossem despidas de finalidade eclesiástica,
poderiam nos satisfazer. Elas falam uma linguagem demasiado patética e constrita, enquanto casa de
Deus e luxuosos pontos um comércio supra terreno, para que nós, o sem deus pudéssemos pensar
ali, os nossos pensamentos. Queremos nos ver traduzidos, nós mesmo em planta e pedra. Queremos
passear em nós mesmos, ao andar por estas galerias e jardins. Nietzche “A Gaia Ciência”. Pois nisso
tudo, no aperto que querem vocês querem nos meter, na casa de cachorro, estamos vindo para trazer
ar, verde, frutos e flores, pausas para meditação na simplicidade de um caminho novo escolhido para
uma tentativa de fazer alguma coisa gostosa. Salve a promotoria do meio ambiente. Salvas!Salvas
para os contendores que no correr das audiências foram se revelando pessoas encantadoras. Pena
que não foi gravado, mas está na minha memória e quero escrever muito sobre este momento
privilegiado. Só quero que o embate de frutos saia da cerimônia e da seriedade estéril e se transforme
num Bexigão.
ENSAIO DE UM DEBATE PÚBLICO
últimos textos trocados entre Marcelo Terra, advogado do Grupo Silvio Santos e José Celso Martinez Corrêa, diretor do Teatro Oficina
Sílvio Santos Empreendimentos e Participações S/
C Ltda., acompanhada por seu procurador, abaixo
assinado, em atendimento ao exposto no Ofício n.
162/02-4 PIMAC-IC 078.00 do dia 17 de janeiro, vem,
respeitosamente, se manifestar sobre o documento
intitulado como “proposta elaborada pelos membros
do Teatro Oficina Uzyna Uzona” (BEXIGÃO),
aduzindo o quanto segue:
Objetivando pôr um fim ao verdadeiro tumulto
procedimental causado pelo Teatro OficinaUzyna
Uzona, houve por bem V.Exa. determinar que referida
Associção formulasse uma proposta técnica objetiva,
articulada, clara e inequívoca a respeito de sua
proposta de eventual conciliação.
A proposta que escrevi a pedido do Dr. Marcelo Terra,
mais do que uma tentativa de acordo foi uma proposta
de trabalho. Partiu da declaração que fiz na audiência
do dia 17 de janeiro a esta promotoria que somente
seria possível a discussão entre as partes, quando
se levasse em conta o projeto que há 22 anos o
Oficina vem concebendo para seu entorno de imóvel
tombado, afim de que o Grupo Silvio Santos tivesse
a mínima informação sobre o que, com o que, com
quem, está, esteve, discutindo sua tentativa de
acordo. “Tecnicamente” uma proposta de conciliação
nasce acima de tudo do entendimento dos direitos,
projetos, desejos, das partes, e não por critérios
exclusivamente da “objetividade”, da “articulacão”, da
“clareza” da lógica subjetiva e delirante do “tudo por
dinheiro”
Em 13 de janeiro de 2002 o ilustre patrono da
Associação requereu a juntada aos autos de uma
documentação – que é um manifesto, como tantos
outros já produzidos – que o nobre subscritor e
patrono optou por identificar como “proposta
elaborada pelos membros do Teatro Oficina uzyna
Uzona”.
Não sou “patrono” de Associação nenhuma. Sou
diretor do Teatro Oficina e presidente da Associação
Teatro Oficina Uzyna Uzona, que zela pelos objetivos
vivos que inspiraram o Tombamento deste bem
Tombado, sua manutenção e principalmente seu
crescimento. Trabalhamos com o Conselho da
Associação minuciosa e criadoramente sobre a
situação especifica que inspirou o texto, que com
muito orgulho, eu, José Celso Martinez Corrêa,
diretor, ator, produtor e dramaturgo premiado, digitei
com meus próprios dedos. Como o assunto é de
importância vital para o Centro de São Paulo,
esperava nem digo, o mesmo do Diretor do grupo,
mas que Silvio Santos do alto do seu pedestal, tivesse
a delicadeza e a humildade, por respeito a justiça da
cidade, de manifestar-se diante de uma proposta de
trabalho, de um “Manifesto” que tem tudo a ver com
ele, feito por um artista reconhecido de sua mesma
cidade. Os entendimentos de contrários somente são
possíveis na prática do trabalho comum e o contrário
de uma guerra. Sou líder de um grupo cultural, que
se manifesta apaixonada e personificadamente, em
manifestos também, como os nossos ancestrais
modernistas de 22. E muitas vezes. É nosso estilo.
Cartas abertas que não se conformam com os
segredinhos do negócio quando uma causa pública
está em jogo.
Tal documento tem o salutar efeito de demonstrar,
de uma vez por todas e colocando certamente uma
pá-de-cal no presente procedimento, que:
a) A Associação rasga a constituição Federal e toda
a legislação infra-constitucional brasileira, regedora
e disciplinadora do direito de propriedade.
b) A Associação não guarda o menor respeito pela
autoridade constituída pela ilustre Promotoria, pelo
princípio da proteção à propriedade privada, pelo
princípio da boa fé , pelo princípio da serenidade e
da lealdade.
Não considero salutar colocar uma “pá-de-cal” em
procedimentos vivos e nem mesmo isto é possível.
Vivemos uma sociedade que luta por ser
democrática. Nosso conflito é muito real, é global e
está muito vivo.
a) A paranóia do “direito de propriedade” é tanta que
uma proposta de trabalho comum, é vista como um
atentado a esta instituição. Ninguem está querendo
num simples esclarecimento de posicionamentos,
ocupar, invadir, tomar a propriedade de ninguém. Está
se levantando a hipótese de que por desejo próprio,
Silvio Santos ou o Grupo Silvio Santos, a partir de
um momento de parenteses nos preconceitos, muito
necessário no mundo hoje em dia, participem de um
empreendimento de alcance social, público, estético,
de relevância, sinergisando-se o capital cultural dos
40 anos do Oficina e o capitalismo popular midiático
bem sucedido do GSS. E esta possibilidade foi
aventada em nome de uma hipótese intelectual, para
o entendimento do conflito e sua possível superação.
Em sentido totalmente contrário ao entendimento do
Grupo Silvio Santos, em nenhum momento a
Associação rasga a Carta Magna, mas cumpre,
realizando um dos direitos e garantias fundamentais
consubstanciado no artigo 5º, IV que é o da livre
manifestação do pensamento e formas de expressão.
No mesmo sentido encontra-se o artigo 216 que inclui
de forma cristalina como patrimônio cultural brasileiro
os bens materiais e imateriais, portadores de
referência a identidade, à ação, à memoria dos
diferentes grupos formadores da sociedade brasileira,
nos quais se incluem as edificações e demais espaços
destinados as manifestações artístico-culturais, das
quais o Oficina faz parte uma vez que esta no livro do
Tombo. O defensor do Grupo Silvio Santos refere-se a
afronta ao “direito de propriedade” que encontra-se
consubstanciado no artigo 5º, XXII da Constituição.
Todavia se esquece que nenhum direito é absoluto e
deve harmonizar-se com o texto constitucional, que
preserva o patrimônio cultural, sendo compreendido
assim o Teatro Oficina Uzyna Uzona.
Verifica-se que a área de 300 metros em torno do
patrimônio tombado deve ser preservada nas suas
caracteristicas, sem impedimentos à sua visualização,
acessibilidade. Estranhamente o Grupo Silvio Santos
ignora tal realidade e fala em “falta de boa-fé”. A boa fé
sempre esteve ao alcance da grande Corporação e seu
vasto escritório advocaticio, no Livro do Tombo. Se
existiu algo foi a inércia, passividade, negligência de
verificar-se tais fatos ou ... má fé. É a obra de Lina Bardi
que o Instituto que leva seu nome, defende na justiça:
um embrião que transborda o limite físico do atual
Oficina para seu entorno, um DNA de um outro conceito
de cidade desentulhada, arejada, verde e mais que
humana.
b) Nossa luta existe, por respeitar, querer fortalecer,
muito, esta promotoria, as leis do meio ambiente muitas
vezes violadas, desrespeitadas pela absoluta
incompreensão de muitos do que seja um
procedimento legal a partir da valorização do fim social
da propriedade privada, dos que não tem a experiência
deliciosa da boa-fé e da nunca invocada, temida,
criatividade para enfrentar uma situação
eminentemente cultural. A respeito da “lealdade” eu nao
entendi nada. Meu horror à hipocrisia, pede que seja
expilicado qual o sentido da invocação desta palavra.
Lealdade ao que? a quem?
Quanto ao promotor Doutor Roberto Carramenha e aos
procuradores que o precederam nesta questão, muito
além do respeito, foi crescendo em mim, em todos que
querem o Teatro Oficina, a admiração pela coragem,
amor, inteligência e firmeza, com que têm
desempenhado esta função pública. Um procedimento
de absoluta lealdade ao meio ambiente, à vida.
Não obstante, a absoluta falta de clareza de articulação
do arrazoado, obviamente não escrito pelos ilustres
advogados, alguns pontos merecem destaque, tudo a
demonstrar sua absoluta inutilidade.
O Dr. Modesto Cavalhosa, realmente um ilustre
advogado, depois de ouvir, “O Bixigão” que li para ele,
aconselhou-me, dirigiu-me a encaminhar o texto como
estava, sem nenhum juridiquez, acompanhado de um
vídeo, que revelasse meu empenho pessoal, a
eloquência e a especificidade do escrito. Infelizmente
oitenta anos depois da Semana de Arte de 22, o texto
não soube ser lido pelo academicismo parnasiano das
cabeças que declaram pretender construir um Centro
Cultural em São Paulo.
Começa a “proposta” pela sugestão de uma discussão
pública do manifesto (grife-se que a própria Associação
batiza sua proposta como manifesto e não como
tentativa de composição), jogando luzes definitivas
sobre sua verdadeira intenção de produzir fatos
jornalísticos e de prejudicar o empreendimento que é
vizinho ao prédio por ela ocupado precaria e
gratuitamente, à custo do erário público, eis que o
prédio, vale sempre se afirmar, é de domínio da
Fazendo do Estado.
A discussão pública sempre foi o nosso desejo. Somos
um teatro. Um grupo produtor de cultura. Nossa
responsabilidade é para com a sociedade. Esta
situação, este assunto, é de interesse público. Talvez
até transcenda o direito civil e tenha que ser encarada
do ponto de vista criminal. Extermínio de um bairro, de
uma cultura. Este crime não pode ser decidido por uma
corporacão, por maior que seja. Este procedimento unilateral e sem a participação do publico é genocídio. O
projeto do Grupo Silvio Santos vem se relevando um
Show Room do que pretendem fazer no Bairro todo,
dando prosseguimento a lógica das obras do Minhocão,
fazer do Bixiga um lugar nenhum, chamado Bela Vista,
um centro de Hotelaria e de diversão da Cultura Shopping, pior que uma Broadway brasileira: um “O Clone”
de Las Vegas. Este projeto veio cair nos pés do Teatro
Oficina, um centro ativo de produção cultural, que por
estar nesta situação de ameaça, tem tomado
conhecimento, tem experimentado, como agora está,
esta atitude autoritária, tipicamente mafiosa de fazer
na calada, sem a discussão democratica essa invasão.
Por amor a justiça da fé no teatro como arte poderosa
social, não se pode passar batido a este cerco genocida.
A área urbana transformada em zona de especulação
imobiliária vai expulsar toda a população de renda baixa
que ocupa o Bixiga. E atenção. O texto do Dr. Terra
revela a intenção de pressionar a Fazenda Estadual,
para que saiamos do Oficina. Declara que a ocupação
do Oficina por nós, é precária. Absolutamente, ao
contrario. É das casas culturais mais arraigadas no seu
próprio território no Brasil. Fizemos o lugar.
Artistas, público, poder público, (Governo Marin,
Montoro, Quércia, Fleury, Covas, e acredito Governador
Alckimin) todos trabalhamos para que o Oficina não
fosse vendido para Silvio Santos em 1980 e para que
exatamente fosse Tombado para a continuidade de
nossos trabalhos e da expanção do semeado
urbanisticamente pelo gênio inventivo de Lina Bardi.
Somos os criadores, cultivadores e guardiões deste
teatro.
De um ponto de vista democrático, a Fazenda do
Estado não tem
“domínio” sobre o Teatro Oficina. Em 20 anos, Estado
tombou,
desapropriou concluiu as obras do teatro para que
conforme o ato do tombamento, o grupo continuase
seus trabalhos, e não fosse engolido pelo Baú da
Felicidade. Vem o Estado há 20 anos, exercendo sua
intervenção justa diante da ameaça do Poder
Econômico. O Estado patrocinou parte de alguns
espetáculos por premiações, filtradas por editais da
Secretaria de Cultura. Patrocinou Oficinas culturais
gratuitas para a montagem de “Os Sertões”, como é
seu dever constitucional: a promoção da cultura. O
Erário público participou na fase de desapropriação
exatamente garantindo a continuidade, e o
crescimentro do imenso capital cultural acumulado na
Rua Jaceguai, 520 no imóvel Tombado. Querer por em
dúvida a legitimidade da ocupação do Oficina pelo
Oficina é ignorar a história da cultura brasileira e afinal
uma falta de compreenssão de qual seja o conteúdo
desta contenda. Porque não discutir então a concessão
dos canais de TV à Silvio Santos pelo Estado ?
A Fazenda é um organismo à serviço da sociedade,
no caso, a serviço de suas aspirações culturais mais
elevadas. A leitura como puro “domínio” vêm da cobiça
finaceirista que ignora a historia e vê o Estado como
um objeto de manipulação a favor dos interesses
especulativos privados.
No mundo todo existem teatros como o Oficina que
prestaram grandes servicos à sociedade e puderam
se desenvolver tantos nos seus entornos, como na
influência sobre o mundo: a Ópera de Pequim, o Teatro
de Arte de Moscou, o Royal Shakespeare de Londres,
O Berliner Ensenble, a Comedie Française, a Cia. de
Peter Brooks, milhares de instituições, que enriquecem
a inteligência de seus países e do mundo. O que torna
esta contenda interessante é que documentos como
este, expõe a cabeça despreparada do “tudo por
dinheiro”, diante da vida cultural em que quer se meter.
Mas esta cabeça no mundo contemporâneo é
anacrônica. Que a história não se repita, que o paulista,
o sulista, deixe de continuar sendo “o empreiteiro
predileto das grandes hecatombes” como escreveu
Euclides em “Os Sertões”.
Continua a “proposta” em sua tentativa vã de provocar
risos, sugerindo a “substituição total do mencionado
projeto…omissis…que esses recursos sejam aplicados
na área social, particularmente na revitalização do
Bixiga transformando o espaço destinado ao shopping,
em torno do Teatro Oficina tombado, num centro de
formação cultural e artísitica da população de São
Paulo”.
“O que uma pessoa pode fazer senão rir”
(Shakespeare- Hamlet).
Porque não gargalhar de felicidade quando existe uma
proposta de transformação de um empreendimento
privado em público?
Em vez de destruir um Bairro histórico e popular, porque
uma Grande Corporação não pode a partir de um teatro,
reconstruir o umbigo cultural prodigamenete fértil do
Bixiga, no centro de uma das maiores cidades do
mundo. Plantar as sementes de uma outra urbes, uma
nova vida vindo do que Bexiga criou e não o seu
sepultamento numa Bela Vista de hotelaria de business-men, interessados somente na cultura Shopping?
Demonstra a Associação sua total aversão política e
econômica ao projeto, sem , contudo, arguir ou
apresentar qualquer ilegalidade. Quero por que quero!
Esta é a única e infantil assertiva da Associação,
tentando fazer da Digna Promotoria o veículo de sua
insensatez.
A gestão atual do Condephaat, aprovou esse filho do
Minhocão sem levar em conta o entorno do Oficina.
Entorno geográfico e cultural, contido já no projeto Lina
Bardi há 22 anos, 4 anos antes do tombamento do
Teatro. A “insensatez” todos nós felizmente às vezes
somos insanos, mas quem se aventura a passar por
cima com o trator em qualquer lugar que pretenda
especular, sem levar em consideração as minas, a
existência do que há de específico, o que é? A aversão
política e econômica é menos ao projeto arquitetônico
do Shopping (é até boa para o que pretende: capitalizar,
pode ser construido em qualquer lugar) do que à
maneira cega com que se quer implantar a partir desta
torre do tamanho do Banespa um domínio feudal
privado. Na carta magna procura-se harmonizar-se os
direitos e não esmagá-los. Artigo 5º, XXIII
Ao longo de suas longas, enfadonhas, tumultuadas
quatorze páginas, o manifesto da Associação nada de
novo trouxe aos autos , somente se repetindo, se
repetindo, se repetindo, sem nexo, sem lógica, sem
juricidade. Se fosse uma petição inicial, certamente sem
destino seria o julgamento de sua inépcia!
A inépcia no caso é a falta de capacidade intelectual,
cultural escondida no formalismo jurisdicista, totalmente
inadequada a decifrar a Justiça numa causa
eminentemente cultural de lógica eco-lógica que fala a
língua da arte.
Ali, nada há que se aproveite, por mais que se tente,
por maior que seja o esforço do leitor. Tanto assim
que, contrariando ao que foi determinado por esta D.
Promotoria, não há no documento entelado uma linha
sequer que trate de quetões técnicas de arquitetura
que pudesse possibilitar alguma compreensão sobre
a posição da Associação.
A arquitetura é uma arte mais do que uma “técnica”.
Em se tratando de um centro cultural, somente pode
ser discutida a partir de critérios públicos, estéticos,
sociais, como exaustivamente tentei explicar no
documento, pedindo inclusive a palavra solta de um
dos maiores arquitetos brasileiros: Paulo Mendes da
Rocha, autor do projeto “Ágora” para o entorno do
Oficina. Paulo recusa-se a participar de um
entendimento que parta de uma visão unilateral de
milimetragem. No documento de Dr.Terra penso que
não foi entendida a determinação do Promotor que
visava um entendimento baseado na legislação do
Tombamento, e na defesa do meio ambiente. Não ví
no projeto do Shopping nada que possa sequer
mencionar a mínima preocupação com este aspecto
legal.
Como não houve a oferta de qualquer proposta, a ora
Requerente pede vênia para não mais se alongar. Não
há o que ser contraditado, não há o que se contra
argumentar.
Infelizmente o documento que redigi, não encontrou
no primeiro momento, esforço para ser compreendido.
No centenário de “Os Sertões”, o grande livro brasileiro,
poderíamos encontrar uma via para nos entendermos
através de um trabalho prático aqui e agora no
quarteirão tal qual está. Não ponho “pá-de-cal” em
nada. Não sou coveiro. Fiz uma proposta, uma simples
proposta que foi julgada indecorosa e nem sequer
citada no documento. Escandalizou em um primeiro
momento meus queridos algozes impotentes até agora
de dar uma réplica à altura da situação. Não tive o
talento ainda de ser claro, nem encontrei talento, boafé nos meus contendores para o início de uma
compreensão produtiva entre o Oficina e o Grupo Silvio
Santos. Jamais me veio a mente que uma simples
proposta de trabalho conjunto pudesse provocar uma
reação tão grosseira, brutal, autoritária, tanto no
primeiro documento que foi divulgado como nota oficial
do Grupo Silvio Santos assinado pelo sr. Carlos
Brickman, como pelo que atualmente respondo. Um
muro e uma muralha de comunicação, mas o muro
tem um furo. Um buraco.
Mas, para que dúvida não paire, a ora Requerente
consiga sua mais absoluta contrariedade à tentativa –
que restará infrutífera – de transformar a reunião
agendada para o dia 20 de fevereiro próximo em palco
público para mais uma encenação de quem não
respeita a Justiça !
Nesse item há clara demonstração do horror ao “palco
público”, à democracia e ao teatro. O não respeito e
atencão a lei do entorno faz-se com que se perca a
oportunidade para tratar uma questão de direito cultural de uma maneira realmente nobre e civilizada.
Esse encontro das partes, promovido pelos promotores
do meio ambiente, sempre foi enriquecedor, agradável
e clarificador, mesmo quando fiquei chocado com a
dificuldade que tem o Grupo Silvio Santos de entender
o outro, a cidadania além da mercadoria. Não entendo
a concepção irada e farisaica que diz que não respeito
a justiça porque quero exatamente discussão aberta,
pública e com arte. Sou formado em direito na
Faculdade do Largo São Francisco e por paixãoadoração a Justica Justa de Xangô me dediquei ao
Teatro. Como artista que compreende a advocacia sei
que esta polêmica não para aí. Muitas águas vão rolar
sob o signo da justiça. Por isso respondo aos itens ao
nome da iluminação da razão, das muitas razões que
fazem da vida riqueza cultural.
As leis do meio ambiente existem, fiquei sabendo por
Euclides da Cunha, desde 1713 e visavam “a severa
proibição do corte das florestas”, pra impedir a seca.
Hoje as próprias hecatombes que a não observação
a estas leis provocou na economia geral da vida, criou
a consciência no mundo, que elas são hoje o
fundamento das esperanças de sobrevivência da Terra.
Oficina nesta Luta está ensaiando “Os Sertões” que
jogam tanta luz nesta questão. Na sua época ele
concluiu o livro dizendo não haver alertadores, para
os crimes das nacionalidades. Hoje temos. Euclides
tornou-se este alertador. O denunciador no seu livro
de um crime, um holocausto. Cem anos depois, sua
lembrança viva fará com que este crime no coração
urbano do Bixiga querido, não seja consumado. Que
São Paulo tenha sobre o Martírio da Terra esta vitória
do Meio Ambiente.
Termos em que, reiterando seu pedido de
arquivamento do presente inquérito civil.
São Paulo, 05 de fevereiro de 2002.
Marcelo Terra – OAB 53.205
Evoé!
São Paulo, 5 de março de 2002.
José Celso Martinez Corrêa
bexigão cidadão editado por Tommy Pietra,
Cristiane Cortilio e Maurício Shirakawa
Download

bexigão_cidadão (pdf do manifesto que deu origem