228/536 Terapia oncológica - Resumo (conceitos básicos, histórico, fotossensibilizantes e mecanismo de ação) Terapia fotodinâmica no tratamento do câncer de pele: conceitos, utilizações e limitações Photodynamic therapy in the skin cancer treatment: concepts, utilizations and limitations Eduardo Rodrigues da Silva1, Elisabete Pereira dos Santos2 & Eduardo Ricci-Júnior2 RESUMO – Terapia Fotodinâmica (TFD) é uma modalidade promissora para o tratamento de lesões cutâneas pré-cancerosas e cancerosas. TFD é baseada na combinação de um fotossensibilizante que se acumula seletivamente no tecido alvo e luz visível, resultando em fotodano e subsequente morte celular. Intensas pesquisas nas áreas básica e clinica ao redor do mundo levaram à aprovação da TFD para o tratamento de câncer de pele do tipo não-melanoma como, por exemplo, o carcinoma de células basais (CCB), o carcinoma de células escamosas (CCE) e a Síndrome de Bowen (SB). Lesões pré-cancerosas como a queratose aquitínica (QA) têm sido tratadas com sucesso por essa terapia. O artigo resume os conceitos básicos da TFD, incluindo histórico, conhecimento dos fotossensibilizantes, fontes de luz para iluminação, mecanismos envolvidos na destruição das células cancerosas, bem como, as indicações e limitações do tratamento fotodinâmico dos cânceres de pele. PALAVRAS-CHAVE – Câncer de pele, fotossensibilizantes, Terapia Fotodinâmica. SUMMARY – Photodynamic Therapy (PDT) is a promising modality to pre-cancerous and cancerous cutaneous lesions treatment. PDT is based on the combination by photo sensitizer which is selectively accumulated in the target tissue and illumination of the lesion with visible light, resulting in photo damage and subsequent cell death. Intensive basic and clinical research culminated in the worldwide PDT approval to non-melanoma skin cancer treatment such as basal cell carcinoma, scamous cell carcinoma and Bowen’s syndrome. Pre-cancerous lesions like actinic keratoses have been successfully treated through the PDT. The article summarizes the basic PDT concepts including historical, photo sensitizers, light sources, mechanisms involved in PDT-mediated cancerous cell destruction, as well as the indications and limitations in photodynamic skin cancers’ treatment. KEYWORDS – Skin cancer, photo sensitizers, photodynamic therapy. INTRODUÇÃO O câncer de pele pode ser definido como multiplicaçõesdesorganizadas de células que apresentam um crescimento autônomo e perda da diferenciação celular. Este tipo de célula evolui independentemente dos mecanismos que normalmente controlam a proliferação e a diferenciação celular, transformando o organismo em uma espécie de hospedeiro de células neoplásicas. Os agentes causadores das neoplasias podem ser físicos (radiação solar), químicos (tabaco) ou biológicos (vírus do papiloma), sendo responsáveis por modificações genéticas das células que se multiplicam sem controle (14,43). O número mundial de mortes por câncer em 2007 foi de 7,9 milhões de pessoas(43). No Brasil, em 2008, o Instituto Nacional do Câncer - Inca registrou a incidência de aproximadamente 470.000 casos, sendo o tipo mais incidente, o câncer de pele do tipo não-melanoma, com 115.000 casos. Em seguida, o câncer de próstata, com 49.530 casos; mama, com 49.500; pulmão, com 27.270; cólon e 1 reto, com 26.990; estômago, com 21.800 e o câncer de colo de útero, com 18.670(19). A incidência de câncer de pele tem aumentado rapidamente durante as últimas décadas devido à exposição excessiva à luz solar, especialmente à UVB, reconhecidamente carcinogênica para o homem(17,23) e à diminuição da camada de ozônio e já reconhecida protetora contra as radiações UVB. Os cânceres de pele mais disseminados são os cânceres do tipo não melanoma, denominados de carcinoma de células basais (CCB), carcinoma de células escamosas (CCE), Síndrome de Bowen (SB) e Sarcoma de Kaposi (SK)(44). O CCB, CCE, SB e SK são classificados como cânceres do tipo não melanoma por serem menos agressivos ao organismo(3). Os melanomas podem exigir tratamentos mais complexos devido à agressividade e potencial poder metastático. Atualmente, um dos tratamentos mais utilizados no controle e cura do câncer de pele do tipo não melanoma é a Terapia Fotodinâmica (TFD). A terapia envolve reações de fotossensibilização cutânea, com eliminação das células cancerosas, seguida de cicatrização tecidual, com excelente resultado estético para o paciente35. Data do aceite: 08/7/2009 Mestrando e 2Docente do Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas da FF-UFRJ, Laboratório de Desenvolvimento Galênico (LADEG), Departamento de Medicamentos, Faculdade de Farmácia, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Av. Brigadeiro Trompowski s/nº, Cidade Universitária, Rio de Janeiro, RJ, Brasil - 21941-970 Rev. Bras. Farm., 90(3): 211-217, 2009 211 Histórico e evolução da Terapia Fotodinâmica A TFD é uma modalidade terapêutica atual para tratamento de várias doenças, entre elas o câncer. A terapia envolve a combinação de luz visível, fármacos fotossensibilizantes e oxigênio molecular tecidual. Isoladamente, o fármaco e a luz não causam danos nos tecidos. Entretanto, estes dois componentes, em presença de oxigênio tecidual, produzem formas reativas do oxigênio que são tóxicas para as células(3,20). Historicamente, o uso da luz e de fotossensibilizantes em seres humanos data do Egito antigo onde, há 4.000 anos, tratava-se vitiligo combinando-se a ingestão de plantas e a exposição à luz solar. O sucesso do tratamento era resultado de uma reação fotoquímica, mediada por psoralenos presentes nas plantas(34). Estudos sistemáticos das reações de fotossensibilização foram iniciados apenas no final do século XIX por Oscar Raab (1900) que investigou o efeito dos corantes eosina e acridina, ambos fotossensibilizantes, sobre uma cultura de paramécios (protozoários), percebendo que, em presença de luz, os microrganismos eram inativados(31,34). Em 1903, Tappeiner empregou uma solução de eosina e luz para tratar câncer de pele e observou uma redução no tamanho do tumor(31). MeyerBetz (1912) estudou o efeito fotossensibilizante sistêmico de porfirinas em humanos, injetando no próprio corpo hematoporfirina. A subsequente exposição de algumas partes do seu braço à luz visível produziu forte reação de eritema solar, indicando que a hematoporfirina possui efeito fotossensibilizante. Anos mais tarde, em 1950, Schwartz descobriu que o efeito colateral observado por Meyer-Betz não era devido à hematoporfirina, eliminada rapidamente do organismo e sim, devido a uma mistura de derivados diméricos e oligoméricos facilmente formados durante a purificação do composto(13). Em 1925, Policard avaliou a fototoxicidade de porfirinas em tecido canceroso após injeção e acúmulo do fotossensibilizante no tecido. Em 1960, Lipson empregou, pela primeira vez, uma combinação de derivados de hematoporfirina e luz para tratar câncer de mama(12,41). Em 1976, iniciaram-se os primeiros estudos clínicos em pacientes com câncer de bexiga tratados com hematoporfirina injetável e levando a TFD, como uma ferramenta promissora para o tratamento moderno do câncer(12,41). A TFD tem se mostrado eficaz no tratamento dos cânceres de bexiga, pulmão, cabeça, pescoço e esôfago. Além disso, é considerada o tratamento ideal para muitos casos de câncer de pele do tipo não-melanoma(11,36). Outras indicações para a TFD são, por exemplo, a degeneração macular (síndrome oftálmica), psoríase, artrite reumatóide (doença autoimune), parasitoses cutâneas (Leishmaniose), acne severa e a periodontite(11,16,30). No Brasil, a experiência clínica da TFD iniciou-se em São Paulo e envolveu a colaboração do Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo, do Hospital Amaral Carvalho, em Jaú e da Escola de Medicina da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto(3). O grupo estabeleceu contatos com grupos de pesquisa nos Estados Unidos e na Rússia para dar início às atividades de Terapia Fotodinâmica no Brasil. Os fotossensibilizantes usados são o Photogem® (derivado da hematoporfirina produzida na Rússia) para os casos de injeção sistêmica e o ácido aminolevulínico (ALA) para as aplicações tópicas. Diversos tipos de câncer foram tratados, entre eles, o câncer bucal, 212 o carcinoma de nasofaringe e de pele(3). Atualmente existem várias clínicas médicas e hospitais nos grandes centros urbanos com infraestrutura, equipamentos e profissionais qualificados para realizar a TFD para o tratamento e cura do câncer de pele. A pesquisa na área de TFD é multidisciplinar envolvendo profissionais de várias áreas. A Tabela I resume os profissionais envolvidos na equipe de TFD. TABELA I Multidisciplinaridade da equipe que compõe a TFD e suas funções (3) Profissional Função Médico Diagnóstico das lesões e indicação do tratamento Enfermeiro Administração dos fotossensibilizantes, acompanhamento, cuidados e atenção Farmacêutico Preparo das formulações tópicas ou sistêmicas, transporte e conservação Físico Desenvolvimento das fontes de luz: lasers e LEDs Biólogo e Bioquímico Entendimento da ação da luz nos sistemas biológicos Químicos Síntese de novos fotossensibilizantes Mecanismo de ação A TFD envolve dois componentes individualmente nãotóxicos que são utilizados juntos para induzir lesões no tecido canceroso de uma maneira oxigênio-dependente, ou seja, a combinação da luz visível com um fotossensibilizante, na presença de oxigênio molecular tecidual, produzindo agentes citotóxicos letais que podem eliminar as células cancerosas(30,37). O tratamento consiste em administrar o fotossensibilizante e, após um intervalo de tempo para acúmulo no tecido tumoral, irradia-se com luz visível a lesão cancerosa(4). O fotossensibilizante pode ser administrado por via intravenosa ou cutânea (tópica)(12) e a luz visível é aplicada em um comprimento de onda específico, que coincide com o comprimento de onda de absorção máxima do fotossensibilizante(16) (Fig. 1). As reações fotobiológicas restringemse ao local de acúmulo do fotossensibilizante que são expostas à luz visível(11,12). A seletividade da TFD é produzida pelo direcionamento preferencial do fotossensibilizante para o tecido alvo e pela habilidade de se ativar o fotossensibilizante por iluminação sítio específica. Dessa forma, a TFD permite a destruição seletiva dos tumores enquanto mantém intacto o tecido adjacente normal(37). O processo fotodinâmico inicia-se quando o fotossensibilizante, no estado fundamental, absorve um fóton de luz e sofre decaimentos sequenciais que resultam em reações de transferência de energia intramolecular, originando FIG. 1 - Principais etapas da Terapia Fotodinâmica(11). Rev. Bras. Farm., 90(3), 2009 o estado tripleto excitado, capaz de reagir com o oxigênio molecular tecidual (tripleto), ocorrendo transferência de energia intermolecular. O oxigênio molecular absorve energia e origina o oxigênio singlete (1O2) que é citotóxico(11,38). As reações de fotooxidação via oxigênio singlete são as responsáveis pela eliminação das células cancerosas. O sucesso da TFD tópica depende basicamente de três fatores principais: dose de luz, via de administração e do acúmulo do fotossensibilizante no tecido alvo. O comprimento de onda da luz, tempo de iluminação e a área a ser iluminada são fatores importantes para determinação da dose de luz. A administração tópica é a mais frequentemente recomendada para tratamento de lesão cutânea pré-cancerosa e cancerosa. O ácido aminolevulínico (ALA) ou metilaminolevulinato (MAL) deve ser administrado no local da lesão, utilizando um veículo farmacêutico adequado (creme) e posterior oclusão do local. Após síntese da protoporfirina IX (PpIX) (fotossensibilizante) in situ e acúmulo cutâneo, efetua-se a iluminação com fonte de luz visível. Os fotossensibilizantes, como o Photofrin® solução injetável, também podem ser administrados pela via intravenosa. Após acúmulo no tecido alvo, efetua-se a TFD seguindo protocolo pré-estabelecido. Resposta biológica A TFD induz a produção de agentes citotóxicos, como o oxigênio singleto, que rapidamente destroem as células neoplásicas; essa resposta é afetada in vivo pela complexidade dos sistemas biológicos. Diversos alvos celulares podem ser afetados durante a TFD, incluindo a mitocôndria, lisossomos, membranas plasmáticas, retículo endoplasmático, aparelho de Golgi e o núcleo e a morte celular pode ocorrer por necrose ou apoptose (morte celular programada)(8,37). A eficácia da TFD no tratamento do câncer - ou seja, a extensão do fotodano e da citotoxicidade - é multifatorial e depende do tipo de fotossensibilizante, da concentração do ativo e da sua localização intra ou extracelular, da dose de luz, do tempo entre a administração do ativo, da exposição à luz e da disponibilidade de oxigênio tecidual(12,41). Esses fatores podem modular três processos independentes que contribuem para a eficiência da destruição do tumor pela TFD: morte celular tumoral por apoptose (morte celular programada) ou por necrose, isquemia pela destruição da vasculatura no tumor e a ativação da resposta imune contra as células tumorais remanescentes(8,10,41) (Fig. 2). FIG. 2 - Mecanismo de ação da TFD na eliminação das células cancerosas(10). Fotossensibilizantes e iluminação Fotossensibilizantes são compostos que absorvem ener- Rev. Bras. Farm., 90(3), 2009 gia da luz em comprimentos de onda específicos e utilizam essa energia para induzir reações de fotooxidação na presença de oxigênio molecular em outras moléculas que não absorvem energia(10,38). A principal característica dos fotossensibilizantes é a habilidade de se acumular no tecido tumoral e gerar agentes citotóxicos para induzir o efeito fotobiológico desejado(37). Um fotossensibilizante ideal apresenta diversas propriedades que podem ser divididas em: • físico-químicas: alta pureza química, alto coeficiente de absorção de luz; baixa tendência à agregação no meio aquoso; • fotofísicas: alto rendimento de produção de oxigênio singlete capaz de eliminar as células cancerosas; • farmacológicas: direcionamento seletivo e eficiente para o tecido canceroso; eliminação rápida do organismo e baixa toxicidade sistêmica; • fototerapêuticas: destruição preferencial de células cancerosas; ausência de efeitos adversos, mínima toxicidade no escuro e citotoxicidade apenas na presença de luz; ausência de potencial mutagênico ou carcinogênico(37,41,44). Os fotossensibilizantes podem ser classificados em famílias, de acordo com sua estrutura química, conforme apresentado na Tabela II. TABELA II Classificação dos fotossensibilizantes (1) Famílias de Fotossensibilizantes Derivados da Porfirina Hematoporfirina, Benzoporfirina e Ácido 5-aminolevulínico e Metil-aminolevulinato Derivados da Clorofila Clorinas e Bacterioclorinas Corantes Ftalocianinas e Naftalocianinas Apesar dos fotossensibilizantes naturais serem abundantes na natureza e os sintéticos de fácil produção, existem poucos disponíveis no mercado para uso terapêutico devido à falta de estudos clínicos. Os principais fotossensibilizantes disponíveis comercialmente, as indicações clínicas e o país onde o ativo foi aprovado para o uso na TFD estão apresentados na Tabela III. As porfirinas constituem a 1a geração de fotossensibilizantes. Os medicamentos disponíveis no mercado à base de porfirinas são o Photofrin®, Photosan® e Photogem®1. Photofrin® (Fig. 3) (Axcan Pharma, Inc.) foi o primeiro fotossensibilizante aprovado para uso na TFD do câncer e é utilizado em diversos países nos tumores de garganta, boca, nariz e pele(1). O Photofrin® tem como princípio ativo uma mistura complexa de oligômeros de hematoporfirina. O Photofrin® apresenta elevado tempo de meia-vida plasmática (250h). O fotossensibilizante apresenta acúmulo na pele ocasionando fotossensibilização cutânea, vantajosa no tratamento do câncer de pele, exigindo, entretanto, que o paciente permaneça protegido da luz durante 6 semanas(23). O acúmulo do Photofrin® no tecido canceroso ocorre, em aproximadamente 48h após a injeção do fotossensibilizante. No tecido tumoral, devido à sua alta permeabilidade, o acúmulo do fotossensibilizante é mais rápido que no saudável, provocando, eventualmente, a necessidade de hospitalização do paciente dois dias antes da iluminação. Ape213 TABELA III Nomes comerciais dos medicamentos utilizados na TFD, indicação clínica e países onde os medicamentos foram aprovados(1,7,39) Medicamento Indicação clínica Países Levulan , Kerastick , Metvix ® Queratose actínica União Européia Photofrin®, Photogem®, Photosan® Esôfago de Barrett Unão Européia, EUA Photofrin® Displasia cervical Japão Levulan®, Metvix® Carcinoma de células basais Carcinoma de células escamosas União Européia Photofrin® Câncer cervical Japão Photofrin® Câncer endobronquial Canadá, Dinamarca, Finlândia, França, Irlanda, Japão, Reino Unido, EUA Photofrin® Câncer esofágico Canadá, França, Alemanha, Japão, Reino Unido, EUA Photofrin® Câncer gástrico Japão Foscan ® Câncer de cabeça, pescoço e pele não-melanoma União Européia Photofrin® Câncer de Bexiga Canadá Photosens® Cânceres de pele não-melanoma e mama Rússia e Índia ® ® FIG. 4 -Ácido aminolevulínico (ALA) pró-fármaco sendo bioconvertido à Protoporfirina IX (fotossensibilizante endógeno) com atividade fotossensibilizante(39). FIG. 3 - Fórmula estrutural do dímero do Photofrin® (39). sar do incômodo da proteção contra a luz, essa desvantagem é pequena quando comparada aos efeitos colaterais dos métodos clássicos de tratamento de câncer, como a quimioterapia e radioterapia. O Photofrin® é comercializado na forma extemporânea, sendo reconstituído com solução aquosa de 5% de dextrose ou com 0,9 % de cloreto de sódio (31,8mL para 75mg de porfirina de sódio). A solução resultante, de pH entre 7 e 8, deve ser usada imediatamente(39). No entanto, o Photofrin® apresenta algumas limitações, como baixa absorção no comprimento de onda de 600-800nm e, portanto, com necessidade de doses altas de luz, baixa seletividade pelas células neoplásicas e sensibilização sistêmica do paciente por 4 a 12 semanas. Levulan® e Kerastick® contêm o ácido aminolevulínico (ALA) que atualmente é o ativo mais utilizado no tratamento do câncer de pele não-melanoma, utilizado na TFD tópica. O ALA é um pró-fármaco que é convertido enzimatica214 FIG. 5 - Ciclo de bioconversão enzimática do ALA (pró-fármaco) para PpIX (fotossensibilizante)(22). Excesso de ALA é bioconvertido para PpIX. Formulações contendo ALA podem ser acrescidas de EDTA que inibe a enzima ferroquelatase proporcionando acúmulo de PpIX. mente em Protoporfirina IX (PpIX) in situ (Fig. 4) pelo ciclo bioquímico do HEME (Fig. 5). A conversão ALA para PpIX ocorre de 3 a 6h após a administração tópica da formulação, correspondendo ao período de latência para se efetuar a TFD(5,42). O ALA é uma molécula hidrofílica e de baixo peso molecular capaz de penetrar na pele, ou seja, a formulação difunde para o estrato córneo, podendo alcançar a epiderme e derme. As formulações tópicas de ALA contêm 20% do ativo, além de dimetilsulfóxido (DMSO) e anestésico local. O DMSO, desde que abaixo de 20%, pode ser utilizado como promotor de penetração cutânea para o ALA. Um anestésico local é utilizado para reduzir a sensação de ardência provocada durante a TFD. O ALA pode ser também administrado pelas vias oral e intravenosa, ocorrendo fotossensibilização sistêmica, situação em que o paciente deve ficar protegido da luz direta durante vários dias. A administração tópica do ALA a 20% é vantajosa para que seja evitada a fotossensibilização sistêmica. Entretanto, por ser uma substância ácida, causa desconforto e ardência(5,42) que podem ser reduzidos pelo desenvolvimento de formulações de uso tópico contendo promotores de penetração cutâneos mais eficientes do que o DMSO. Os promotores, como ácido oléico, aumentam eficientemente a penetração cutânea do ALA e, consequentemente, pode-se reduzir a concentração do pró-fármaco na formulação, mantendo-se o mesmo efeito fotossensibilizante(33). O custo do tratamento utilizando ALA ainda é elevado, porque os medicamentos são importados. A modificação química do ALA fez surgir um derivado metilado denominado metil-aminolevulinato (MAL) (Fig. 6) ou Metvix® na forma de creme contendo 16% de ativo(28). O MAL é um éster do ALA com maior lipofilia e capacidade de penetração cutânea(28). Rev. Bras. Farm., 90(3), 2009 Fig. 6 - Metil-aminolevulinato (MAL)(27). O MAL é também um pró-fármaco e sua conversão a PpIX in situ ocorre pelo ciclo do HEME. A conversão de MAL a PpIX ocorre 3h após a aplicação do creme sobre a lesão(2,32,40). Após o período de produção e acúmulo da PpIX no tecido alvo, efetua-se a TFD, que consiste da remoção do curativo oclusivo, lavagem do local com solução salina para remoção do creme e aplicação de luz visível (570-670 nm) na dose de 75 J/cm2 sobre a superfície da lesão(28). Os sucessos obtidos com os atuais fotossensibilizantes não impediram a pesquisa para o desenvolvimento de novos fotossensibilizantes(37). Os problemas com as hematoporfirinas e seus derivados levaram ao desenvolvimento da segunda família de fotossensibilizantes, as ftalocianinas. Esses compostos apresentam a vantagem de serem puros, eficientes geradores de oxigênio singleto e apresentarem alta absorção entre 650 a 800nm, que é a faixa de comprimento de onda onde ocorre máxima transmitância da luz pelos tecidos e, portanto, a mais utilizada no tratamento de cânceres de pele. Além disso, apresentam alta seletividade para tecidos tumorais e rápida eliminação do organismo, o que minimiza a fotossensibilização sistêmica(11,24,36). Muitas ftalocianinas estão em fase de estudos clínicos e futuramente estarão disponíveis para o tratamento de diversos tipos de cânceres por TFD. Photosens® é um fotossensibilizante de segunda geração aprovado na Rússia para uso na TFD. Trata-se de uma mistura de derivados de alumínio ftalocianina sulfonada (Fig. 7), efetivos no tratamento de diversos tipos de cânceres(1,7). Fig. 8 - Foscan® (nome comercial) ou meta-tetra hidroxifenilclorina(39). As fontes de luz utilizadas na iluminação dos tecidos tumorais após acúmulo do fotossensibilizante são lâmpadas de luz fluorescente, lasers de baixa potência e LEDs (do inglês Light Emitting Diodes), ou Diodo Emissor de Luz. As lâmpadas foram as primeiras fontes de iluminação. Elas produzem luz não-coerente com o componente térmico nocivo que pode ser eliminado por filtros. A vantagem das lâmpadas está relacionada com o baixo custo do sistema de iluminação, entretanto, a luz emitida apresenta vários comprimentos de onda. Os lasers foram escolhidos como fontes de iluminação porque produzem luz coerente e comprimento de onda monocromática que permitem o cálculo da dose de luz(26), importante para a definição os protocolos experimentais da TFD. Além disso, o laser pode apresentar fibras ópticas que facilitam o direcionamento da luz para os locais de iluminação(29). A desvantagem dos lasers é o alto custo do equipamento. Por serem equipamentos mais simples e baratos, os LEDs têm sido utilizados, preferencialmente, como fontes de luz para a TFD. Os comprimentos de luz utilizados na TFD devem estar na faixa de 400 a 800nm, faixa conhecida como Janela Terapêutica, onde há máxima transmitância tecidual da luz. Nessa faixa, os componentes teciduais não absorvem e há penetração da luz no tecido. O fotossensibilizante acumulado na pele é capaz de absorver luz visível e provocar fotodano. Os comprimentos de onda abaixo de 400nm têm baixa transmitância tecidual e são prejudiciais aos tecidos. Aplicações FIG. 7 - Alumínio ftalocianina disulfonada(25). As clorinas pertencem à terceira família de fotossensibilizantes. Foscan® é o nome comercial da meta-tetra hidroxifenilclorina (Fig. 8), um derivado sintético das clorinas também utilizado para o tratamento de câncer cutâneo(2). Após administração intravenosa e acúmulo da metatetrahidroxifenilclorina durante 96h, efetua-se a TFD. Contudo, a fotossensibilidade cutânea, causada pelo Foscan® é apenas ligeiramente menor que a provocada pelo Photofrin®. Devido à sua hidrofobicidade, a meta-tetra hidroxifenilclorina é formulada em polietilenoglicol 400:etanol:água, (3:2:5, v:v:v) para usos clínicos. O Foscan® é comercializado na forma de propilenoglicol:etanol, (6:4, v:v) sendo dissolvido em veículo aquoso antes da administração(39). Rev. Bras. Farm., 90(3), 2009 As aplicações da TFD no tratamento e cura de lesões cutâneas estão limitadas à queratose actínica e cânceres do tipo não-melanoma, como o CCB, CCE e SB. O dermatologista deve diagnosticar através de exames o tipo de lesão pré-cancerosa ou cancerosa e indicar o tratamento mais adequado. A queratose actínica (QA) é decorrente da exposição à luz solar, principalmente, à radiação ultravioleta (UV), podendo originar o câncer de células escamosas da pele com potencial formação de metástases(6,21). As lesões cutâneas são superficiais e aparecem na face, pescoço, braço e mãos. O tratamento consiste na aplicação tópica de ALA (Levulan®) em solução a 20% seguida da TFD utilizando luz vermelha (ë= 415 nm, 100-150 J/cm2), 3 a 6h após(10,21). A QA pode ser tratada também com MAL. O creme contendo 16,6% de MAL é aplicado sobre a lesão e, após um período de 3h para produção e acúmulo da PpIX, efetua-se a remoção do curativo, remoção da formulação pela lavagem do 215 local com soro fisiológico, secagem e iluminação com luz visível (630nm, 37 J/cm2)(32). O Carcinoma de Células Basais (CCB) é o mais comum dos cânceres de pele(40). Ele se origina a partir das células basais da epiderme(9,40). As lesões causadas pelo CCB são clinicamente distinguíveis em lesões pigmentadas, nodulares e superficiais. As lesões superficiais são as que mais respondem ao tratamento por TFD. O tratamento é feito por aplicação de creme contendo ALA a 20% e iluminação utilizando luz vermelha na dose de 100 J/cm2 (2,18). O CCB pode ser tratado utilizando Photofrin® injetável, 1mg/Kg e, após 48h para acúmulo do ativo na lesão cancerosa, efetua-se a iluminação utilizando luz vermelha na dose de 215 J/cm2 com total regressão das lesões(38). Entretanto, a falta de seletividade causa fotossensibilização sistêmica e o paciente deve ficar protegido da luz direta por semanas. Atualmente, o CCB pode também ser tratado com MAL que tem penetração cutânea superior ao ALA. O Carcinoma de Células Escamosas (CCE) é uma forma de câncer do tipo não-melanoma originário de queratinócitos epiteliais e seus apêndices(15). O CCE pode surgir a partir de excesso de exposição à radiação ultravioleta ou de lesões pré-existentes, tais como, a queratose actínica, Síndrome de Bowen, papulosis bowenoíd e a eritroplasia de Queyrat. As lesões primárias e superficiais causadas pelo CCE são totalmente tratáveis por TFD tópica. Entretanto, o CCE é agressivo e pode originar metástases. O tratamento das lesões envolve a administração cutânea de ALA e bioconversão em PpIX no período de 3 a 6h(1,2). Após acúmulo local do fotossensibilizante, efetua-se a TFD. O tratamento de CCB pode ser feito com administração intravenosa de Photofrin® ou Foscan® e, após o período de acúmulo no tecido lesado, efetua-se a iluminação(2). A Síndrome de Bowen (SB) é um carcinoma de células escamosas intraepidermal e pode ocorrer em qualquer parte da pele(6). O tratamento é feito por aplicação tópica de creme com ALA a 20% e, após 4h, efetua-se iluminação utilizando luz vermelha na dose de 125 J/cm2 ou com injeção intravenosa de Photofrin®, 1-2 mg/Kg, após 48h, para acúmulo do fotossensibilizante no tecido tumoral e iluminação com luz vermelha na dose de 150 J/cm2 (2). CONCLUSÃO As numerosas experiências clínicas têm mostrado que TFD é efetiva e segura para o tratamento do câncer de pele do tipo não melanoma. Uma das grandes vantagens da TDF é a possibilidade de administração tópica, permitindo destruição do tecido canceroso e poupando o tecido periférico normal. A administração do fotossensibilizante na forma de creme sobre a lesão cutânea e posterior iluminação do local com luz visível, torna a terapia seletiva. A aplicação tópica das formulações evita procedimentos invasivos, como a administração intravenosa dos fotossensibilizantes com risco de fotossensibilização sistêmica. A TFD permite o tratamento simultâneo de várias lesões cancerosas pela aplicação do fotossensibilizante sobre o tecido alvo e posterior iluminação com luz visível. Lesões em locais, como os lábios, nariz, olhos e orelhas são de difícil tratamento por serem áreas sensíveis e esteticamente importantes. As ci216 rurgias, apesar de eficientes, podem causar cicatrizes e mutilações, enquanto que, a TFD permite a eliminação do câncer dessas áreas com excelente recuperação estética. Formulações de uso tópico com o ALA e MAL, prófármacos mais utilizados na TFD do câncer de pele, são muito promissores, entretanto, o tratamento é de alto custo porque os medicamentos são importados. A pesquisa e o desenvolvimento de novos fotossensibilizantes são promissores e muitos centros de pesquisa estão realizando a busca de novos ativos que possam ser utilizados na TFD do câncer de pele. Outra área promissora envolve o desenvolvimento de novos sistemas de liberação para a administração tópica dos fotossensibilizantes. Os farmacêuticos que atuam na área de Tecnologia Farmacêutica contribuem pesquisando novos sistemas de liberação que melhorem a penetração e o acúmulo dos fotossensibilizantes nas lesões cancerosas, melhorando a eficácia da TFD. A pesquisa na área de TFD deve ser feita com trabalhos colaborativos entre médicos, enfermeiros, farmacêuticos, biólogos, químicos e físicos. O desenvolvimento de fontes de luz que se ajustem às diversas superfícies a serem iluminadas pode melhorar a efetividade da terapia. Atualmente, equipamentos mais simples e baratos, como os LEDs estão sendo desenvolvidos, contribuindo para melhorar a efetividade e a disseminação da TFD. Outra área importante é a pesquisa para o entendimento dos mecanismos bioquímicos da ação fotodinâmica nas células. A variedade em um mesmo modelo experimental com diferentes tipos de tumores de pele oferece a possibilidade para explorar os componentes moleculares e celulares responsáveis pele eliminação das células cancerosas. A TFD tem um futuro promissor em dermatologia no tratamento do câncer de pele do tipo não-melanoma, porque oferece seletividade, poucos efeitos adversos, altas taxas de cura e excelentes resultados estéticos das áreas afetadas. AGRADECIMENTOS Ao Programa Farmácia Universitária da Faculdade de Farmácia da UFRJ e à FAPERJ (Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – Aux. Inst.). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ALLISON, R.R.; DOWNIE, G.H.; CUENCA, R.; HU, X., CHILDS, C.J.H. & SIBATA, C.H. Photosensitizers in clinical PDT. Photodiagn Photodyn Ther., 1: 27-42, 2004. 2. ALLISON, R.R.; SIBATA, C.H.; DOWNIE, G.H. & CUENCA, R.E. A clinical review of PDT for cutaneous malignancies., Photodiagnosis Photodyn Ther., 3 (4): 214-26, 2006. 3. 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