XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ CAMINHAR PARTILHADO: A CONTRIBUIÇÅO DAS INCERTEZAS NA INICIAÇÅO DOCENTE EM ARTES VISUAIS. Diana Patrícia Medina Pereira Instituto Federal do Ceará [email protected] http://lattes.cnpq.br/9410331193558808 Gilberto Andrade Machado Instituto Federal do Ceará [email protected] http://lattes.cnpq.br/3764709459727514 RESUMO Trata-se de uma pesquisa no ensino de arte que discute a narrativa e a reflexão da prática docente em Artes Visuais no Ensino Fundamental. Caracteriza-se como um estudo de caso realizado numa escola particular em Fortaleza-CE, durante o ano escolar de 2011. A pesquisa evidencia como o artista/professor/pesquisador se insere no âmbito da docência, descrevendo inseguranças e incertezas na elaboração de uma metodologia para artes visuais. Para tanto, invoca-se a postura da prática reflexiva de Schon (2000) e promove a reinvenção de si enfatizada por Delory-Momberger (2006). O estudo desconstrói o discurso do vencedor e estimula a narrativa como estratégia investigativa sobre a formação do professor. Conclui-se que o ponto de vista docente sobre suas práticas e sentimentos alicerça a formação necessária ao ser professor. Palavras-chave: prática reflexiva, pesquisa narrativa, artes visuais. SOMMAIRE Il s'agit d'une recherche en enseignement de l'art qui traite de la narration et la réflexion de la pratique d'enseignement en arts visuels dans l'enseignement primaire. Il est caractérisé comme une étude de cas réalisée dans une école privée à Fortaleza-CE, au cours de l'année scolaire de 2011. L'étude révèle comment l'artiste/enseignant/chercheur relève de la profession enseignante, décrivant l'insécurité et des incertitudes dans l'élaboration d'une méthodologie pour les arts visuels. A cet effet, c’est invoquer la posture de la pratique réflexive chez Schon (2000) et favoriser la réinvention de lui-même souligné par DeloryMomberger (2006). L'étude déconstruit le discours du gagnant et encourage le récit comme une stratégie de recherche sur la formation des enseignants. En conclusion Il est observé que la vue sur leurs pratiques d'enseignement et ses sentiments sont à la base de la formation d'être un enseignant. Mots-clés: pratique réflexive, recherche narrative, arts visuels. Introdução __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ “Só sei que nada sei” com esta conhecida citação de Sócrates, inicio este artigo para evidenciar um conhecimento que desejo mas não domino. Ser artista/educadora/pesquisadora, demanda antes de tudo uma abertura constante de nossa percepção. Não lido com um conhecimento fechado, comprovado, delimitado, meu material de trabalho é fluido, sensível e mutável. O que estudo são as artes visuais, que por si só comporta várias definições. O meu local de trabalho é o ambiente da sala de aula que é composto por seres humanos em constante desenvolvimento. O que pesquiso é a relação entre estes dois universos. Antes de tudo, sei que estou em constante aprendizado e devo permanecer aberta para aprender, crescer e observar. É dentro desta proposta de formação constante que compartilho com o leitor minha experiência. Não por serem ótimas experiências, mas por serem dignas de reflexão e crítica como toda ação. Esta é uma pesquisa em ensino de artes visuais. (...) é aquela cuja ênfase está no processo de ensino de arte, seus fundamentos e as reflexões sobre eles, sua prática e sua reflexão sobre ela. É o ensino de arte enquanto processualidade do ser, vinculado ao fazer e ao aprender e ensinar concomitantes, indissociáveis, interagentes e interativos.(PIMENTEL,2006.p.311) A autora se baseia nas proposições de Rey (2002) sobre a pesquisa em arte e pesquisa sobre arte. “Sendo a pesquisa em ensino de artes baseada no processo de ensino e a pesquisa sobre o ensino de artes baseada na história, na crítica e na teoria relativas a ela.” Pimentel(2006) Diante da análise da experiência de um ano letivo com minha prática didática, enfatizo esta ação como pesquisa em ensino de artes pois trato de temas relevantes que permearam esta prática. Partindo de algumas ações que foram registradas em diários de campo desde o planejamento escolar até as reações dos alunos, passei também a coletar a produção de desenhos dos alunos com a finalidade de analisá-los e apresentá-los no final do ano aos mesmos. Fez-se necessário uma revisão completa de minhas anotações e práticas para a observação destas aulas. __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ Este trabalho também é uma atividade auto-biográfica em que o relator participa parte de sua vida. Partes importantes para a compreensão de outros dados, como sua formação por exemplo. (...) a atividade biográfica não é uma atividade episódica e circunstancial limitada apenas ao relato de vida, mas uma das formas privilegiadas de atividade mental e reflexiva segundo a qual o ser humano representa-se e compreende a si mesmo no seio de seu ambiente social e histórico. (DELORY-MOMBERGER, 2006, p.369) Relatar minhas experiências na sala de aula constitui uma maneira de trabalhar dentro do inexperiente, do iniciante, dos erros ocorridos e dos acertos também. Disponibilizar este processo estabelece uma linha de comunicação com aqueles que ainda não iniciaram sua prática docente e estão à beira de fazê-lo. Algo que nunca é fácil e alimenta muitas ansiedades. A necessidade de compartilhar este assunto é relevante pois, temos muitos temas de sucesso expostos em artigos, monografias, etc. Porém, poucos trabalhos levam em conta a importância da reflexão e da posterior adaptação da didática de cada um, ou mesmo a inexperiência e a dúvida. Segundo Paulo Freire (1996, p.121) “a humildade exprime, pelo contrário, uma das raras certezas de que estou certo: a de que ninguém é superior a ninguém”. Trabalhar no erro, na tentativa do acerto me parece tão válido quanto a exposição do sucesso ou até mais, pois errar é humano e o acerto vem depois de várias tentativas. Outro eixo importante neste trabalho é saber dividir com o outro a experiência de forma humilde e humana ou seja partilhar minha caminhada. Minha esperança é que os procedimentos histórias de vida se multipliquem afim de que todos aqueles e aquelas que os utilizam e os vivem possam encontrar, por meio dessa forma particular um novo laço social, um caminho de humanidade partilhada. Minha convicção é que os procedimentos, conduzidos com essa intencionalidade, alimentarão pouco a pouco uma outra maneira de nos religarmos a nós mesmos e aos outros em uma partilha respeitosa de nossas singularidades, em um diálogo intenso porque tocam as questões essenciais da existência, na interpelação recíproca de nossos a priori, de nossos pressupostos, de nossos preconceitos.(JOSSO, 2006, p.383) Dentro desta perspectiva de dividir nossas experiências na construção de um mundo mais humano compartilho com Josso sua esperança. O ato de compartilhar também nossos erros nos fortalece, pois, sabemos que estamos no caminho de um crescimento feito de acertos e erros. __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ Nossa experiência de vida é construída a cada dia. Infelizmente estamos acostumados numa sociedade mitificada onde vemos apenas sorrisos e sucessos e nossas inquietações, indecisões, dúvidas, são ‘jogadas para debaixo do tapete’ como forma de melhorar nossa auto-imagem. É de experiência de vida que estou tratando aqui, então, é bom o leitor estar atento a todos os elementos que constituem esta formação. O convívio social, a formação escolar, influências, experiências de trabalho, etc. Todo o nosso universo deve se abrir à análise para um entendimento melhor de nossas ações. Esta pesquisa esta formatada como um estudo de caso, pois estou coletando dados de fatos vividos e acompanhados por mim que também sou pesquisadora. Segundo Yin(2005) o estudo de caso descritivo permite ao investigador a descrição de fenômenos contemporâneos dentro de seu contexto real. Elaborando diários, coletando imagens e perfazendo meu caminho, posso estruturar minha pesquisa como sendo um estudo de caso de uma narrativa auto-biográfica no ensino de Artes Visuais. A caminhada começa. Já no finalzinho de 2010, fui convidada pela diretora de uma escola particular para lecionar desenho e pintura, no Ensino Fundamental I. Foi uma oportunidade que chegava em boa hora, pois estava cheia de vontade de vivenciar o que era dar aula. Aceitei de prontidão e comecei a me integrar com o local. O desafio estava lançado; dar aula uma vez por semana, aulas de trinta minutos de duração. Meus alunos seriam os estudantes da segunda à quinta série. Ficaria com uma turma do segundo ano com 18 alunos, uma turma do terceiro ano com 25 alunos, uma turma do quarto ano com 16 alunos e duas turmas do quinto ano com 31 alunos no total. O início das aulas estava marcado para o final de janeiro de 2011. Minha escolha em trabalhar apenas com os alunos do quinto ano nesta pesquisa se deu logo no início. Pude observar rapidamente que aconteciam muitas coisas nas aulas e seria difícil observar com critérios mais cuidadosos todos os alunos, então me dediquei na análise apenas destas turmas, o quinto ano A e o quinto ano B. __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ O quinto ano A era composto por dezesseis alunos, sendo oito meninas e oito meninos. A maioria dos alunos estavam na faixa etária entre os dez e onze anos. Esta turma contava com uma aluna especial, com a idade um pouco mais avançada e dificuldades de cognição. O quinto ano B era composto de quinze alunos, sendo cinco meninas e dez meninos. A maioria dos alunos estavam na faixa etária entre os dez e onze anos. Esta turma contava com três alunos especiais que apresentavam dificuldades de cognição. É importante relatar aqui como eu era antes de começar a lecionar. Quais eram minhas experiências e como eu havia me preparado para este momento. Quando comecei a dar aulas em janeiro de 2011, ainda não havia realizado as disciplinas de estágio supervisionado necessários para a finalização do curso de Licenciatura em Artes Visuais pois, ainda estava em formação. Lembro que no início deste ano, tive dificuldades em encontrar uma escola onde pudesse fazer o estágio. Este seria o primeiro, numa série de três semestres antes da conclusão do curso de licenciatura. Também não havia cursado a disciplina de Metodologia do Ensino de Arte Visuais, o que me enfraquecia ainda mais. No primeiro dia de aula já havia preparado sozinha um planejamento completo para todas as séries de todas as aulas do ano, dia após dia. Minha ansiedade era tamanha que me levava a aceitar somente que tudo daria certo e ponto final. Mesmo com planejamento debaixo do braço e o apoio da escola, eu me sentia terrivelmente só. A posição de professora nos coloca numa exposição tamanha, o que me causava grande insegurança. Estar com os alunos requer um domínio que é muito difícil ter no primeiro dia de aula. O meu primeiro dia como professora foi algo inesquecível. As crianças pulavam de um lado para o outro e eu não sabia como acalmá-los. Não conseguia ser ouvida e as aulas daquele dia se passaram como uma tempestade atrás da outra. Toda esta insegurança me causou uma certa revolta. Pensar que todas aquelas aulas de pedagogia se desmanchavam assim nos minutos em que aqueles meninos __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ pintavam e bordavam comigo, me causou desespero. Tive a nítida consciência que nada podia nos preparar para aquele momento. Foi imersa neste sentimento de frustração que decidi escrever meu dia-a-dia como arte-educadora e transformar esta revolta em objeto de estudo. O que me motivou a iniciar uma pesquisa foi a junção de alguns dados que definiam minha situação no momento de iniciar minhas aulas como arte-educadora. Ser aluna concludente do primeiro curso de licenciatura em Artes Visuais do estado do Ceará, nunca ter ministrado aula nenhuma, e ser artista antes de ser educadora. As perguntas de início desta pesquisa eram: como eu me comportaria estando nesta situação; quais soluções eu encontraria para me sair o melhor possível naquelas aulas e como me manteria no centro daquele acontecimento(no caso as aulas de Artes)? Escrevendo sobre o vivido As ações se desenvolveram nesta instituição que está localizada num bairro de classe média de Fortaleza e trabalha com 30 professores, 36 funcionários, e 180 alunos divididos em 14 séries. A escola trabalha desde a pré-escola, o ensino fundamental I até o ensino fundamental II e têm uma sala específica para o ensino de artes plásticas. A orientação dada pela coordenadora era desenvolver trabalhos voltados à pintura e ao desenho sem sofrer pressões com datas comemorativas, etc. Sendo assim, pude desenvolver um conteúdo voltado para as Artes Visuais. É válido salientar aqui as diretivas curriculares desta escola, que por ser uma instituição referência na prática transdisciplinar e com aplicações no cotidiano de atividades que buscam uma aproximação da consciência ecológica para os alunos, prioriza algumas atividades bem diferenciadas das demais escolas. Como por exemplo: realização de abaixo-assinados pelos alunos e pais solicitando mudanças no trânsito local, realização de eventos que buscam a troca de objetos numa postura contra o consumismo, realização de campanhas de reciclagem ou de economia dos produtos naturais, etc. __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ Apenas ilustro aqui atividades pedagógicas desta instituição, mas não é meu objetivo discutir ou ampliar os conceitos de transdisciplinaridade, consciência ecológica, ou militância nas escolas neste trabalho, esclareço os diferenciais desta, na intenção de especificar melhor ao leitor, o local onde realizei minha prática didática. Minha primeira experiência foi uma escultura em papel jornal que aconteceu logo no início do ano letivo, foi nosso primeiro trabalho e nos ocupou, eu e os alunos, por dois meses ou sendo mais precisa oito aulas. O conteúdo desta experiência foi uma escultura de uma gatinho feita em papel jornal, fita adesiva, coberta com papel absorvente de cozinha e colorido com tinta guache. Diante do interesse de todos os alunos pela escultura do gatinho no primeiro dia de aula, modifiquei todo o meu planejamento e passei a dar o mesmo objeto para todas as séries. Este trabalho não foi planejado, aconteceu numa decisão de última hora ou melhor no primeiro contato com os alunos. Depois de iniciada, comecei a calcular quanto tempo tomaria. Passamos dois meses para a realização deste primeiro trabalho. Tomamos mais tempo que o planejado e só pude finalizá-lo depois de adiantar eu mesma o trabalho de alguns alunos. Ou seja, moldei e esculpi, no papel jornal vários gatinhos. Eu prometi que cada um deles poderia ter um gatinho e agora como eu poderia desistir desta ideia? E mais, o gatinho é um elemento marcante para se trabalhar a obra de Aldemir Martins; um contexto perfeito para se trabalhar as cores primárias, meus objetivos no primeiro bimestre. Além da importância de se trabalhar papel reciclado para demonstrar como criar a partir do que já temos. (Diário de campo11 de fevereiro de 2011) No recorte do meu diário de campo acima citado, demonstro minha ansiedade em inserir vários conteúdos num mesmo objeto e minha preocupação em manter um nível de diálogo confiável com os alunos. De qualquer maneira eu havia assumido um compromisso com os alunos de fazer os gatinhos e isso foi feito. Nossas aulas se seguiram na construção do gatinho. Muitos alunos o faziam sozinhos mas outros precisavam de ajuda e às vezes de muita ajuda. Pois não sabiam dimensionar o tamanho do objeto. __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ Queria integrar na mesma atividade muitas coisas e esqueci da simplicidade. Reciclagem, Aldemir Martins, Proposta Triangular, etc.Tudo ao mesmo tempo. Não parei para ouvir os alunos. Desempenhando meu papel semanalmente em nossos encontros, minha ansiedade começou a dar lugar a uma atitude de atenção contínua. Observava os interesses, as conversas paralelas e conseguia aos poucos me aproximar dos alunos. No final das oito aulas os gatinhos foram expostos na galeria de artes da escola. Dentro do calendário anual desta escola existe um espaço para a galeria de artes. É um evento que ocupa o pátio da entrada da escola e acontece no final de cada bimestre. O objetivo desta galeria é expor os trabalhos realizados nas aulas complementares de Artes e artesanato familiarizando a comunidade escolar: funcionários, professores, alunos e seus familiares com a produção visual dos discentes. Reitero que as experiências expostas na pesquisa tratam do vivido em sala de aula com as turmas do quinto ano, sendo que a primeira experiência aqui comentada tratou de todas a séries do fundamental I inclusive os alunos do quinto ano. Escrever sobre estas experiências no formato de diários de campo e depois lê-los e repensá-los inúmeras vezes, agiu na minha prática didática de forma positiva. Pois; Ela (a história de vida) se reconstrói a cada uma de suas enunciações e reconstrói, juntamente com ela, o sentido da história que anuncia. Essa história por definição não é jamais “finita”, submetida ao perpétuo não acabamento ou, o que dá no mesmo, circunscrita a um acabamento que está sempre adiante dela. Delory- Momberger (Op. cit. p.362) Sendo que a cada vez que relato minhas experiências transformo esta história mais uma vez, seja acentuando certos episódios ou detalhes, seja omitindo algumas partes. Fica ao meu critério o que compartilho e como o faço. A partir daí a minha história começa a tomar forma, uma forma especial que não é definida e finita, mas sempre em acabamento. De fato a escrita e a leitura destas experiências me fizeram abrir minha própria história para análise. Observando as palavras utilizadas os adjetivos empregados pude ter de forma contínua uma idéia de como andava minha cabeça no início e no final do ano letivo. Pude observar que a experiência na sala de aula, o conhecimento __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ da turma e o tempo me cercaram de refinamento no final desta vivência. E o interessante é que esta história continua mudando. Quando estamos imersos no cotidiano, não distinguimos com clareza nossos atos e apenas fazemos, não temos uma visão global dos mesmos. O distanciamento favorece esta apreciação, tornando-a mais nítida. Podemos definir alguns momentos e perceber fatos observando a transformação destes com o passar do tempo. No caso de escrever ou narrar estas experiências, esta percepção se torna ainda mais clara. Sobre este aspecto e interessante observar que: A narrativa realiza, sobre o material indefinido do vivido, um trabalho de homogeneização, ordenação, de funcionalidade significante; reúne, organiza e trata de modo temático os acontecimentos da existência; dá sentido a um vivido multiforme, heterogêneo, polissêmico. (DeloryMomberger,Op. cit. p. 363) Este sentido organizado pode trazer consigo uma maior apropriação da ação. Um sentimento de documentação do passado e controle no presente, com a experiência já vivida servindo de base para um crescimento maior. Ao observar estes diários convivo por alguns momentos comigo mesmo no passado e no presente. Me observo antes e me defino no agora. Ordeno meu caminhar de forma a perceber a conexão entre meus passos. Passo a ligar ações e suas conseqüências de forma ordenada e clara. Como também salientou Delory- Momberger; “a narrativa é o lugar onde o indivíduo humano toma forma, onde ele elabora e experimenta a história de sua vida.”(2006). A prática reflexiva Na formação permanente do professor, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. “É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática” (FREIRE, 1996). Em outros termos temos aqui, a indicação de uma prática reflexiva constante, assim como deve ser constante a formação de um professor. “A reflexão sobre cada tentativa e seus resultados prepara o campo para a próxima”,Schon (2000, p.33). Trabalho com um conhecimento específico, enquanto arte-educadora, o conhecimento das artes visuais, que recusa em definitivo qualquer delimitação. Um campo que é aberto às experiências e vivências de nossa sociedade. Não podendo fechar-se com __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ definições formatadas. Um campo que se refaz sempre sendo um constante desafio para o pesquisador. Ser artista e educadora ao mesmo tempo pode abrir vantagens e encontrar soluções que não definimos no momento da ação exatamente, mas nos acompanha. Dentro de uma prática como artista, encontramos soluções constantemente para acontecimentos inesperados dentro de cada experiência. A mesma postura é demandada em sala de aula enquanto educadora. Segundo Schon (Op. cit. p.32) existe esta reflexão na ação que só podemos observar com um certo distanciamento. “Podemos refletir sobre a ação, pensando retrospectivamente sobre o que fizemos, de modo a descobrir como nosso ato de conhecer-na-ação pode ter contribuído para um resultado inesperado”. Mesmo certos de nosso planejamento podemos nos surpreender com a demanda de adaptações múltiplas, sejam por questões materiais ou pessoais, devemos ter conosco sempre a disposição de adaptação nos diferentes casos. “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (FREIRE,Opus cit p. 23). O ensino é algo em processo assim como o aprendizado. Como um caminho que se faz ao caminhar, não temos a imagem fechada de um objeto já definido deste processo, pois, ele é continuamente metamorfoseado e tudo começa ao entrar na sala de aula, quando começamos a conhecer nossa turma e ela a nos conhecer. O conteúdo é uma ponte que nos interliga aos alunos, muitos assuntos se fazem durante as aulas e dentro destes assuntos passamos a conhecer uns aos outros. “As qualidades e virtudes são construídas por nós, no esforço que nos impomos para diminuir a distância entre o que dizemos e o que fazemos” (FREIRE, Opus cit, p.65). Estamos em constante construção de nós mesmos, nossas crenças podem se desfazer ou fortificar a cada novo dia. Tenho consciência do aprimoramento diário, na busca de um fazer pertinente com minha teoria. O ato de ensinar nos faz esta observação a cada mensagem passada. Será isso realmente verdade? Acredito no que digo? São questionamentos que nos reafirmam ou nos fazem repensar nossas crenças. Nada melhor do que educar, para se lançar neste aprimoramento diário. __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ “A alegria não chega apenas no encontro do achado mas faz parte do processo de busca”.(FREIRE,Opus cit p.142). Temos muitos caminhos a serem vencidos, etapas a serem cumpridas no nosso próprio processo criativo, que levantam questões tão interessantes ou mais, quanto o resultado final. É a mesma coisa no ensino das Artes Visuais, onde podemos observar este mesmo caminho, sendo o processo mais importante que o resultado final. As trocas, os diálogos durante as aulas nos fazem refletir de forma natural sobre muitos temas incluindo nossa real capacidade de criar é o que pude observar durante minhas conversas com meus alunos. Considerações finais Toda caminhada têm seu primeiro passo. Meu percurso no magistério iniciou-se de forma analisada, esmiuçada, estudada. Obtive com a experiência de me ter como objeto de estudo, um olhar menos crítico. O que parece contraditório, mas não o é. A excelência na sala de aula para um professor é diretamente proporcional ao seu tempo de experiência, o entrosamento com os alunos e o aprofundamento com o conteúdo, todos estes elementos não são conquistados de forma instantânea. Para me sentir confiante hoje, tive que assumir meus erros e meus acertos, ouvir meus alunos, e confiar no tempo. A crítica ainda existe é claro, mas de forma mais amena, aceitando a dúvida de forma positiva. Pois sei que, com minha paixão de artista posso influenciar meus alunos, com minha atenção como educadora posso ensinar e aprender com eles e com minha experiência como pesquisadora, posso transitar entre estes dois universos o da arte e o da sala de aula, com a mente curiosa e aberta, disposta a aprender sempre. Bibliografia DELORY-MOMBERGER, Christine. Formação e socialização: Os ateliês biográficos de projeto. Revista Pesquisa e Educação. São Paulo: USP,2006. DUARTE, João Francisco. Porque arte-educação?. 6 ed.Campinas-SP: Papirus,1991. __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected] XXII CONFAEB Arte/Educação: Corpos em Trânsito 29 de outubro à 02 de novembro de 2012 Instituto de Artes / Universidade Estadual Paulista __________________________________________________________________ FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. – São Paulo: Paz e. Terra, 1996. JOSSO, Marie Christine. As figuras de ligação nos relatos de formação: Ligações formadoras, deformadoras e transformadoras. Revista Pesquisa e Educação,São Paulo: USP, 2006. REY, Sandra. Por uma abordagem metodológica da pesquisa em artes. acessado em 30/04/2012 disponível em: http://www.grupogaia.art.br/Sandra%20Rey%20%20Por%20uma%20abordagem%20metodolgica%20da%20pesquisa%20em%20Artes%20 Visuais.pdf. SCHON, Donald. Educando o profissional reflexivo, um novo design para o ensino e aprendizagem. Ed Artmed.Porto Alegre, 2000. YIN, Robert K. Estudo de caso. Planejamentos e Métodos. 3º Ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. Autores Diana Patrícia Medina Pereira Licencianda em Artes Visuais no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará. Atua como arte-educadora no ensino formal. Artista plástica, ilustradora, performer. Pesquisa intervenção urbana e utiliza-se do grafite e da performance como linguagens para o seu desenvolvimento poético visual. Gilberto Andrade Machado Professor da Licenciatura em Artes Visuais do Instituto Federal do Ceará, campus Fortaleza. Doutor em Educação Brasileira (UFC) coordena o subprojeto Artes Visuais do PIBID/IFCE. Lider do IRIS – Grupo de Estudos da Formação de Professores de Artes Visuais investigando Práticas Educativas e Narrativas de ensinar/aprender Artes Visuais. __________________________________________________________________ Federação de Arte Educadores do Brasil / FAEB Site: http://xxiiconfaeb2012.blogspot.com.br/ - e-mail: [email protected]