Título:
Aristóteles e a educação: como motivar o aluno a aprender por si
mesmo?
Autores:
Susana Aparecida da Silva (PUC-SP)
Marcos Eduardo Melo dos Santos (UNICAMP)
Apresentação oral.
Área temática: 1. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem
Resumo: Este trabalho propõe uma reflexão filosófica em torno da relação de
três conceitos aristotélicos significativos para a área da educação: emoção,
amor e imitação. Uma reflexão contextualizada desses conceitos pode
contribuir para a tarefa do professor em motivar o aluno no processo de
aprendizado. O pathos (emoção ou paixão), é relevante para a reflexão da
prática pedagógica pois, o conhecimento é absorvido através dos sentidos
(Metafísica I,1), e estes são simultaneamente gerados e motivados pelas
emoções que influenciam tanto o processo do conhecimento quanto o
movimento de benevolência (Política, 1340a15). É justamente nessa união
entre o conhecimento e o amor que o aprendizado pode ser pensado de um
modo profícuo na filosofia aristotélica (Ética a Nicômaco. 153-4). A mímese, um
conceito básico para a teoria aristotélica da educação, decorre do amor, pois
na Paidéia, quem ama imita, quem imita, aprende. Mover a vontade (o amor ou
a benevolência) do aluno para o conteúdo proposto é fundamental para o
aprendizado. Somente assim, a pedagogia ativa, tão em voga nas reflexões
filosóficas da prática pedagógica, tem eficácia. O presente projeto de pesquisa
visa propor uma reflexão filosófica do processo de aprendizado com a
finalidade de extrair da obra de Aristóteles alguns princípios úteis para a
reflexão em torno do estímulo no aluno da vontade de aprender, pois O mestre
deve estar ciente de que amor e conhecimento nascem na mesma fonte e
caminham para o mesmo mar.
Palavras-chave: Filosofia da Educação; Aristóteles; emoção; amor; imitação.
Problema
A motivação da vontade do aluno no sentido do aprendizado tem sido o
principal objetivo e o principal problema tanto nas abordagens ativas quando
passivas de aprendizado. Interessar o aluno a querer aprender o que deve ser
aprendido é o problema a ser discutido na presente comunicação. Para
objetivar esse escopo fundamental da arte de educar, alguns escritos
atribuídos ao filósofo grego Aristóteles parecem conter respostas que apesar
da antiguidade de sua origem, afrontam problemas atuais, que nem sempre
estão alicerçados nas questões técnicas inerentes ao tempo, mas na própria
natureza do homem enquanto animal político e racional.
Objetivos
A presente comunicação visa ressaltar algumas ideias de Aristóteles que
podem contribuir para a ação pedagógica no sentido de refletir sobre a tarefa
de educar. Este trabalho propõe uma reflexão filosófica em torno da relação de
três conceitos aristotélicos significativos para a área da educação: emoção,
amor e imitação. Uma reflexão contextualizada desses conceitos pode
contribuir para a tarefa do professor em motivar o aluno no processo de
aprendizado. O pathos (emoção ou paixão), é relevante para a reflexão da
prática pedagógica pois, o conhecimento é absorvido através dos sentidos
(Metafísica I,1), e estes são simultaneamente gerados e motivados pelas
emoções que influenciam tanto o processo do conhecimento quanto o
movimento de benevolência (Política, 1340a15). É justamente nessa união
entre o conhecimento e o amor que o aprendizado pode ser pensado de um
modo profícuo na filosofia aristotélica (Ética a Nicômaco. 153-4). A mímese, um
conceito básico para a teoria aristotélica da educação, decorre do amor, pois
na Paidéia, quem ama imita, quem imita, aprende. Mover a vontade (o amor ou
a benevolência) do aluno para o conteúdo proposto é fundamental para o
aprendizado. Somente assim, a pedagogia ativa, tão em voga nas reflexões
filosóficas da prática pedagógica, tem eficácia. O presente projeto de pesquisa
visa propor uma reflexão filosófica do processo de aprendizado com a
finalidade de extrair da obra de Aristóteles alguns princípios úteis para a
reflexão em torno do estímulo no aluno da vontade de aprender, pois O mestre
deve estar ciente de que amor e conhecimento nascem na mesma fonte e
caminham para o mesmo mar.
Metodologia
O método de pesquisa será bibliográfico, por meio de levantamento e
comparação de fontes. O texto grego utilizado quando isto se tornar necessário
será o da edição bilíngüe (grego e inglês) publicada pela Harvard Univesity
Press e disponível na Biblioteca da Faculdade de Educação da Universidade
de São Paulo. Serão também consultadas algumas traduções para o português
listadas infra. Para a análise da conceituação de imitação, amizade e pathos,
aplicada à área da educação, consultar-se-ão autores que são a bibliografia
especializada no estudo da obra de Aristóteles sob ponto de vista pedagógico,
tais como Boto, Camps, Cassin, Chauí, Cunha, Frankena, Hourdakis,
Marcondes, Pagotto-Euzebio, Reale, Ruiz, Schmied-Kowarzik e Wilson, cujas
publicações estão listadas na bibliografia.
Fundamentação e justificativa teórica
Aristóteles, devido sua ampla e profunda obra, tem sido um dos autores
fundamentais para a filosofia da educação. Embora o Estagirita não tenha
escrito nenhuma obra especificamente sobre a prática pedagógica (Ruiz,
1969:11), verifica-se que algumas de suas obras gozam de inegável relevância
para a reflexão dos educadores. Suas teorias pedagógicas encontram-se
esparsas nos seus escritos exotéricos (sobre retórica e dialética) e nos escritos
esotéricos (sobre as temáticas mais diversas). Os primeiros tratam da arte de
persuadir e da argumentação assim como da sua teoria do conhecimento. Os
segundos são compostos de comentários sobre aspectos da atividade
pedagógica assim como escritos sobre diversos temas nos quais, Aristóteles
aplica o papel ao tratar de física, matemática, ética e política (Cunha, 2007:71).
Diversos autores tem comentado a obra de Aristóteles sob o ponto de
vista da reflexão pedagógica. Marrou (1981:374) afirmava que a obra de
Aristóteles segue sem originalidade a esteira dos escritos de Isócrates e
Platão. Entretanto, vários autores têm contestado essa afirmação, pois
“Aristóteles poderia ser caracterizado como o politólogo e o médico da
educação, que sente a necessidade de formular uma teoria de caráter
reformador e fisiopedagógico, de maneira metódica e em profundidade,
permanecendo mais realista do que seu mestre Platão” (Hourdakis, 2001:11).
Para Marcondes (2002:69-70), a obra de Aristóteles se caracterizou por “um
esforço de elaboração de uma concepção filosófica própria que não se
confunde com a de seus antecessores”. Ademais, deve-se evitar o preconceito
de que as teorias aristotélicas pedagógicas visassem apenas à pedagogia
passiva. Aristóteles estava bem ciente de que a Paidéia consiste em uma
prática (práxis), que deve produzir (poíesis), e sobre a qual se pode teorizar
(epistéme) (Cunha, 2007).
Para Aristóteles, a educação deve produzir uma imitação, pois o aluno
deve captar as coisas que devem ser aprendidas com o mestre, não somente
teóricas, mas também as habilidades. É nesse sentido que o conceito
aristotélico da imitação aplicado à Paidéia, não somente ressalta a importância
do papel exemplar do professor aos olhos do aluno, mas também a prática de
exercícios de preferência lúdicos (Política, 1336a23-30), que tendo em vista
paradigmas corretos e as narrativas motivacionais (Política, 1336a30-32),
estimulem o aluno no aprendizado. De fato, segundo Aristóteles: “todos os
homens têm mais amor ao que eles próprios produziram, como os pais e os
poetas” (Ética a Nicômaco, IV.1). Assim também o aluno. Mas não é somente a
pura mimese que faz com que a reflexão sobre a motivação do aluno em
aprender pode ser iluminada pela filosofia aristotélica. Nota-se em várias
passagens a relação dos conceitos de conhecimento e amor: “Podemos admitir
a distinção entre prazeres corporais e prazeres da alma tais como o amor à
honra e o amor ao estudo; pois quem ama uma dessas coisas deleita-se
naquilo que ama, não sendo o corpo de nenhum modo afetado, e sim a mente”
(Ética a Nicômaco, III. 10). É justamente tornado o aluno amante do objeto a
ser apreendido que se faz com que este se torne agente do seu próprio
aprendizado. Mas para tornar alguém amante, alguns conceitos expostos por
Aristóteles merecem especial destaque a fim de que se possa mover a vontade
(a benevolência) do aluno ao objeto do conhecimento.
A obra de Aristóteles apresenta diversos conceitos úteis para a reflexão
da prática pedagógica. Na Ética a Nicômaco (1094a26-b9), Aristóteles discutiu
os princípios e a finalidade da educação do cidadão centrada na prática de
hábitos bons (virtudes) em vista da felicidade individual (Ética, 1179b31-34).
Analogamente, na Política, afirma que a inserção do educando na polis
(cidade), dá-se pela instrução, a Paidéia (Aristóteles. Política, 1332a33-35). A
educação, não somente torna a vida do cidadão feliz na esfera individual, em
razão da transmissão e da formação de hábitos bons (virtudes), mas também
da própria sociedade (Boto, 2002:302), que se torna feliz em razão da prática
de comportamentos adequados à vida na cidade (Hourdakis, 2001:9). E não
somente o bem comum, mas também a própria unidade do corpo social
(Aristóteles. Política, 1263b36-37). A educação deve ser exercida pelo estado,
não pela família (1179b20-21), pois “o homem é fruto da cidade, da sua
paideia, e por decorrência toda criação humana terá a cidade como origem e –
é importante não esquecer – como propósito ou, pelo menos, referência”
(Pagotto-Euzebio,
2010:201).
Na
Política,
também
constata-se
uma
fisiopedagogia, entendida como o processo educacional adaptado às diversas
fases do desenvolvimento etário do corpo humano. Por outro lado, a teoria do
conhecimento de Aristóteles, sobretudo alguns conceitos explicados no Sobre
a alma e no Órganon, também tem sido um assunto abordado, especialmente
no tocante ao acesso ao conhecimento através dos sentidos externos (visão,
audição, tato, paladar e olfato), o papel da memória e a transmissão dos
conhecimentos técnicos através de exercícios práticos (práxis).
Nota-se nesse sistema, coerente para alguns e incoerente para outros
autores, que há muitos conceitos úteis para a reflexão filosófica da prática
pedagógica. Carlota Boto seleciona alguns conceitos “como categorias
operatórias” que se mostram “interessantes e factíveis para se pensar o ato de
educar”, entre os quais apresenta a amizade (amor) e a imitação (Boto,
2002:291). É justamente esses conceitos, alinhados às reflexões de Aristóteles
a respeito do pathos, que também tem sido aplicado à prática da educação,
uma vez que uma das maiores preocupações do educador deve ser justamente
fazer com que o aluno se motive a aprender, que ame o conhecimento.
Considerações conclusivas
O amor em Aristotéles não se restringe à necessária relação harmoniosa entre
os docentes (Nóvoa, 1991:25) e entre aluno e professor, e não somente à
docência da virtude da amizade tão útil para a sociedade (Boto, 2002:302) mas
compreende também a relação da vontade (amor ou benevolência) para com o
que vede ser apreendido (Ética a Nicômaco. 153-4). Essa motivação é exercida
justamente na vontade do aluno. Mover o aluno a amar o conteúdo que se
pretende transmitir seria uma das chaves da motivação para o conhecimento.
Para mover o amor do aluno, deve-se deitar especial atenção sobre o pathos
(emoção). Segundo Carvalho,
Aristóteles demonstra, em diversas passagens, estar
especialmente interessado na educação do lado cognitivo das
emoções. Em seu ponto de vista, emoções não são forças cegas
e selvagens. São reações inteligentes, identificam uma
personalidade, estando relacionadas a crenças e, portanto,
sensíveis a uma modificação cognitiva através da educação. É
necessário ao homem virtuoso cultivar suas emoções e,
frequentemente, elas são modificadas no curso da vida.
Portanto, emoções e desejos são também sensíveis ao
raciocínio e ao ensinamento. Os jovens, por exemplo, se
caracterizam pela sua reação emocional e não pelo raciocínio.
Mas como as emoções são cognitivas eles estão aptos, desde
cedo, à educação moral. Um jovem pode aprender princípios
que guiarão suas reações mesmo que estes não sejam ainda
completamente compreendidos. Entre as várias influências sobre
o caráter moral, a educação musical é escolhida para ter um
tratamento especial exatamente por causa de seu papel único no
desenvolvimento de bons hábitos e na formação do caráter
através de estímulos emocionais adequados (Carvalho,
2010:49).
Ora, para amar algo, é preciso conhecer, mas é preciso ter contado de
uma forma atraente, pois nada há no intelecto que não tenha entrado através
dos sentidos (Sobre a alma). De fato, não é somente o conhecimento que
penetra na alma através dos sentidos. Os sentidos também estimulam o amor,
pois conforme afirma Aristóteles, “a visão corporal é o princípio do amor
sensitivo” (Ética. 9.5.3), de forma que pela contemplação da beleza ou
bondade se move simultaneamente o amor e o conhecimento, não somente a
fim de que o aluno aprecie o belo e a arte (Política. 1337b25-26;1338a41-b2),
mas, sobretudo a educação em suas diversas disciplinas. Não somente as
artes visuais são úteis para a educação, mas Aristóteles (Política, 1337b29-35)
também apontava a música como um dos conteúdos e das estratégias
pedagógicas principais (paideumata). Daí a relação intrínseca e inseparável
entre o amor, a emoção e o conhecimento e seu papel imprescindível no
aprendizado. Quem ama, aprende melhor o que ama. Daí, resulta a relação do
pathos e da sensibilidade, que devem fazer com que o aluno se interesse pelo
conteúdo proposto. Trata-se de um conceito fundamental ao tratar do processo
da formação do homem, de tal modo que Wald não hesitou em escrever:
As paixões humanas foram um tema importante da filosofia
antiga e medieval. Emoções como o amor e o medo não afetam
somente as nossas ações, mas também os nossos juízos. E
mais: sua força de captação da realidade vai ale da capacidade
da razão humana (Wald, 2010:9).
Com as emoções atendidas, o aluno pode amar o que se transmite, e assim,
poderá ter um aproveitamento maior ao adquirir um conhecimento.1 O grande
desafio do educador seria então tornar o conhecimento objeto de amor do
aluno. Mas, segundo Aristóteles, há condições a serem preenchidas a fim de
que algo seja amado.
Ora, nem tudo parece ser amado, mas apenas o estimável, e
este é bom, agradável ou útil. Mas o útil, em suma, é aquilo que
produz algo de bom ou agradável, de modo que são o bom e o
útil que são estimáveis como fins. Os homens amam, então, o
que é bom em si ou o que é bom para eles? Os dois entram por
vezes em conflito. E o mesmo pode-se dizer no tocante ao
agradável. Ora, pensa-se que cada um ama o que é bom para
ele, e o que é bom é estimável em si mesmo, enquanto o que é
bom para cada um é estimável para ele; mas cada homem ama
não o que é bom para ele, e sim o que parece bom. Isso,
contudo, não vem ao caso; limitar-nos-emos a dizer que ele é ‘o
que parece estimável’ (Ética a Nicômaco, VIII.2)
O educador não deve fazer com que o conteúdo seja amável, mas que pareça
estimável. Pois as questões de amor e amizade no processo educativo têm
11
“Todos os homens tem naturalmente o desejo de saber. O prazer que nos causam as
percepções dos nossos sentidos é uma prova desta verdade. Agradam-nos por si mesmas,
independentemente de sua utilidade, sobretudo as da vista. Com efeito, não somente quando
temos intenção de obrar, senão até quando nenhum objeto prático nos propomos, preferimos,
por assim dizer, o conhecimento visível a todos os que não dão os demais sentidos. A razão é
que a vista, melhor que os outros sentidos, não dá a conhecer os objetos e nos descobre entre
eles grande número de diferenças” (Metafísica, I,1).
uma inferência direta sobre a formação do aluno em diversos aspectos, como
bem sintetiza Cunha,
a amizade assume também valor pedagógico, na medida em
que aquelas virtudes podem ser prendidas numa relação, seja
entre iguais, seja entre diferentes, tornando-se confiança, o
pressuposto da verdadeira Educação e da verdadeira filosofia.
[...] Suas [dos alunos] disposições intelectivas e de caráter
imitam a ação do filósofo, até certo ponto, no processo
constitutivo de si mesmos, não apenas quando nutrem por ele
um sentimento de amizade, como também quando buscam, nos
instrumentos da poiésis, da retórica, da analítica e da dialética
disponibilizados pelo mestre, os meios para alcançar a
verdadeira felicidade (Cunha, 2007:71-72).
É justamente tendo como pressuposto a abrangência da noção de amor
no processo pedagógico que faz com que os conhecimentos teórico e técnico
sejam transmitidos com maior eficácia (Hourdakis, 2001:15). O pathos
(emoção), segundo a Retórica, permite com que o orador mova as emoções do
ouvinte para persuadi-lo aderir a um dos lados de uma causa (Rhetorica, I,
1354a). O uso do pathos, entendido como o uso de apelos emocionais para
alterar o julgamento do ouvinte, age justamente sobre a vontade, sobre o
amor. Mas isso não significa de que a teoria aristotélica contribua apenas para
a educação passiva ao aprimorar o discurso do mestre. O amor gera ação:
“Acresce que o amor é como a atividade, e ser amado assemelha-se à
passividade” (Ética a Nicômaco, IX,7). A teoria aristotélica se concentra na
formação de hábitos, inclusive a virtude do amor, pois “a ação que leva a cabo
inclui uma dose de contemplação e de teoria, mas não é contemplação pura, a
qual seria privativa dos deuses e não de humanos para quem a ação é
inevitável” (Camps, 1996:92). Conforme observa Boto, “por virtude, Aristóteles
compreende uma prática. A virtude não é, portanto, natureza; e não haveria um
aprendizado suficientemente eficaz para garantir a ação virtuosa” (Boto,
2002:293). Na verdade, alguns conceitos, “como a virtude, associada às
noções do fazer e do agir, torna-se um das noções mais fundamentais da
educação no âmbito de uma pedagogia ativa, que ainda hoje constitui o
objetivo principal da reflexão pedagógica moderna” (Hourdakis, 2001:11). Com
finalidade notoriamente prática, a teoria aristotélica contempla justamente a
mímesis (imitação) como um dos princípios fundamentais da educação
(Boto,2005:39). A arte e a educação imitam a natureza (Física, 991a15), pois
“cada arte e cada educação procura completar as carências da natureza”
(Política, 1337a1-2). Esse conceito aplicado em sentido distinto mas
semelhante na Retórica, na Poética e na Tragédia,2 também pode ser aplicado
na Paidéia, pois na educação como no teatro, “o criador convida o espectador
a se envolver com um desempenho, uma mimesis da realidade, e, portanto, por
delegação, com a própria realidade” (Mcleish, 2000:18), uma vez que não
somente o aluno deve ter o exemplo do professor para que aprender com
maior disponibilidade, não somente através do ethos retórico do professor
enquanto orador (Cunha, 2007:75), mas também que os conhecimentos são
adquiridos de forma mais eficaz através do exemplo, seja por meio das
narrativas mitológicas ou históricas, que se tornam exemplos a serem imitados
pelos alunos, seja através de paradigmas que o aluno possa imitar, como um
exercício, a fim de que possa aprender. Também o jogo se insere na teoria da
imitação, uma vez que se imita as regras sérias (Hourdakis, 2001:71). A
imitação faz com que o aluno pratique um hábito, esse hábito se torna uma
faculdade, pois em muitos casos, procura-se na educação a formação de
hábitos bons não somente aqueles ligados ao comportamento moral, mas
também aqueles decorrentes do próprio conteúdo escolar, como o hábito de
bem escrever bem, de bem falar, entre outros.
Segundo Boto,
Haveria, por assim dizer, algum envolvimento subjetivo no
drama. Este se torna sujeito, para o mestre e para o aprendiz.
Daí a magia da ação educativa quando assumimos a confluência
proposta por Aristóteles dessa imitação/representação do bom,
do belo e do bem – tríade necessária para pensar a formação da
virtude ao educar. Trata-se de hábitos; no justo meio, pela
prudência do discernimento; alicerçados pela equidade das
práticas; e de criações de rotinas e de rituais coletivos, públicos
e dirigidos ao bem comum; e , portanto, à felicidade – como se
fosse por amizade... (Boto, 2002:310-311).
2
“Segundo o caráter, as pessoas são tais ou tais, mas é segundo as ações que são felizes ou
o contrário. Portanto, as personagens não agem para imitar os caracteres, mas adquirem os
caracteres graças às ações. Assim, as ações e a fábula constituem a finalidade da tragédia, e,
em tudo, a finalidade é o que mais importa” (Aristóteles, Arte Poética, 25).
Tornar o aluno um amante do conhecimento seria a chave de leitura,
com a qual os escritos de Aristóteles, apresentam princípios e técnicas úteis
para reflexão filosófica da prática educativa, pois iluminaria o percurso para
produzir no aluno uma motivação para o aprendizado fazendo com que este se
torne agente do seu próprio desenvolvimento. Mas cabe ao professor atear a
chama inicial do amor ao conhecimento. Se o aluno se torna interessado no
seu próprio processo formativo, seu aproveitamento será maior. Ler os textos
da Ética de Aristóteles, procurando responder a pergunta de como estimular o
aluno amar o conhecimento, seria pertinente para uma tese doutoral, pois a
novidade de uma reflexão sob esse diapasão na obra de Aristóteles poderia
contribuir para a reflexão filosófica dos educadores em busca do maior
aproveitamento dos alunos através da motivação.
Referências bibliográficas
ANSELMO DE CANTUÁRIA. Proslógio. 2ª ed. Trad. Angelo Ricci. São Paulo:
Abril Cultura, 1979.
ARISTÓTELES. Art of Rhetoric. Vol. XXII. Loeb classical library, 193. Trad. J.
H. Freese. Bilingual version (English/Greek) Bilingual version
(English/Latin). Cambridge/London: Harvard University Press, 2011.
______. Ética a Nicômaco. 4 ed. Trad. Mário Gomes Kurry. Brasília: UNB,
2001.
______. Órganon. Trad. Edson Bini, Bauru: EDIPRO, 2005.
______. Poetics. Vol. XXIII. Loeb Classical Library, 199. Trad. Stephen
Halliwell. Bilingual version (English/Greek).
Cambridge/London: Harvard University Press, 1995.
______. Tratado da política. Trad. M de Campos. Lisboa: Europa-América, s. d.
BOTO, Carlota . A ética de Aristóteles e a educação. Cadernos de História &
Filosofia da Educação, São Paulo: FEUSP, v. VII, n. nº 7, p. 289-312,
2004.
______. A ética de Aristóteles e a educação. Videtur (USP), v. 1, p. 49-62,
2002.
CAMPS, Victoria. Ética, Retórica e Política. Madrid: Alianze Editorial, 1995.
CARVALHO, João. Educação, tragédia e amizade política em Aristóteles. Anais
de Filosofia Clássica. v. 4, n. 7, 2010.
CASSIN, Bárbara. Aristóteles e logos. Trad. Luiz Paulo Rouanet. São Paulo:
Loyola, 1999.
CAVALCANTE, Tatyana Murer. A virtude da amizade na Suma Teológica de
Tomás de Aquino (Séc XIII): uma possibilidade de prática educativa?
Tese doutoral. Universidade Estadual de Maringá. 2012.
CHAUÍ, Marilena. Introdução à História da Filosofia: dos pré-socráticos a
Aristóteles. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
CUNHA, Marcus Vinicius. “O conhecimento e a formação humana no
pensamento de Aristóteles” in: Introdução à Filosofia da Educação:
Temas contemporâneos e História. Pedro Pagni e Divino José da Silva
(Org.). São Paulo: Avercamp, 2007. pp. 60-84.
FRANKENA, William. Tres filosofias de la educación en la Historia: Aristoteles,
Kant e Dewey . Ciudad de México: UTEHA, 1968.
HOURDAKIS, Antoine. Aristóteles e a Educação. Trad. Luiz Paulo Rouanet.
São Paulo: Loyola, 2001.
MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia. 7. Ed. Rio de Janeiro
Jorge Zahar, 2002.
MARROU, Henri-Irénée. Histoire de l’éducation dans l’Antiquité. Vol. 1. In : Le
monde grec. Paris : Editions du Seuil. 1981.
McLEISH, Kenneth. Aristóteles. Trad. Raul Fiker. São Paulo: Unesp, 2000.
NÓVOA, António. Profissão professor. Porto: Porto Editora, 1991.
PAGOTTO-EUZEBIO, Marcos Sidnei. A Filosofia, a Cidade e a Paideia: os
Antigos Contemporâneos. Páginas de Filosofia (São Bernardo do
Campo), v. 2, p. 195-214, 2010.
REALE, Giovanni. História da filosofia antiga. 2 ed. Trad. Henrique de Lima Vaz
e Marcelo Perine. São Paulo: Loyola, 2002. v. II.
RUIZ, Santiago Hernandez. Antología pedagógica de Aristóteles. Coleção
Ensayos Pedagógicos. México: Luis Fernandez, 1969.
SCHMIED-KOWARZIK, Wolfdietrich. Pedagogia dialética: de Aristóteles a
Paulo Freire. Trad. Wolfgang Leo Maar. Coleção esboços pedagógicos.
São Paulo: Brasiliense, 1983.
WALD, Berthold. “Razão e paixão: Tomás de Aquino e Josef Pieper – hoje. In:
Antropologia e educação – ideias, Ideias e História. Jean Lauand (org).
Anais do X Seminário Internacional: Filosofia e Educação. São Paulo:
Feusp/Factash Editora/Unifai, 2010.
WILSON, John. “Mistakes and Methodology” in: Preface to the philosophy of
education. London/Boston/Henley: Routledge & Kagan Paul/Department
od Educational Studies of Oxford Univesity, 1979.
Download

como motivar o aluno a aprender por si mesmo? - sinpro-sp