INCERTEZAS ASSOCIADAS À COMERCIALIZAÇÃO DO PALMITO PUPUNHA POR PEQUENOS PRODUTORES NO MUNICÍPIO DE JUQUIÁ, SP Luís Carlos Ferreira de Almeida1, Pablo Furlan Vargas2, Gláucia Maria Pereira Pavarini3, Débora Kobayashi Vazami4 1 Campus Experimental de Registro/ Unesp, [email protected] Campus Experimental de Registro/ Unesp, [email protected] 3 Campus Experimental de Registro/ Unesp, [email protected] 4 Campus Experimental de Registro/ Unesp, [email protected] 2 INTRODUÇÃO Durante muito tempo o palmito, considerado por Anefalos et al. (2007) como uma hortaliça não convencional, foi obtido a partir de várias espécies de palmeiras, cabendo destaque aos palmitos obtidos do açaizeiro (Euterpe oleracea) e do palmiteiro Juçara (Euterpe edulus), o primeiro comum da Mata Atlântica, já o segundo da região amazônica. Uma característica importante do processo de obtenção do palmito a partir dessas duas espécies é que toda produção é obtida a partir de sua extração na natureza e, considerando o fato que cada palmeira fornece uma única haste, esse processo – extrativista e predatório – vem contribuindo para a extinção dessas espécies na natureza. Particularmente para o palmito extraído do Açaí, no Estado de São Paulo, temos a figura dos “palmiteiros” que invadem constantemente as últimas áreas de reservas de mata atlântica para a busca desse produto. Como alternativa a essa atividade predatória, desde a década de 70, segundo Bovi (2003), o cultivo da pupunha (Bactris gasipaes Kunth.) vem ganhando espaço junto aos produtores e consumidores por apresentar vantagens econômicas e ambientais. Do ponto de vista econômico tem-se o fato do crescimento acelerado, precocidade da produção, com o primeiro corte ocorrendo entre 14 e 24 meses, o que contribui para a lucratividade do setor (CHAIMSONH, 2000); por sua vez, do ponto de vista ambiental tem-se um produto ambientalmente sustentável uma vez não sendo necessário o abate da planta como um todo, visto que a pupunheira apresenta a grande vantagem do perfilhamento, permitindo cada planta produzir 2.000 hastes ou 800 kg/ha no 2º ano (primeiro corte) e 4.500 hastes ou 2.250kg/ha líquidos de palmito/ha a partir do 3º ano. (CORDEIRO & SILVA, 2009) Botanicamente a pupunha é uma palmeira originária da Região Amazônica (CORDEIRO & SILVA, 2009), estando plenamente adaptada à região do Vale do Ribeira, São Paulo, apresentando-se como alternativa econômica para um grande número de produtores rurais. Neste sentido, Anefalos et al. (2007), verificaram que essa cultura, no período 2002/2006 apresentou efeito-escala e efeito-substituição favorável, passando de 860,62 ha plantados em 2002 para 3.206,40 ha em 2007, com um aumento de área da ordem de 2.345,79 ha, demonstrando assim o grande interesse pela mesma na região. Especificamente para o município de Juquiá (SP), localizado no Vale do Ribeira, segundo os dados da Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2010), verificou-se que, para a safra 2007/2008, existiam 82 produtores de pupunha totalizando 638,2 ha plantados, sendo a segunda maior cultura em área. Outra característica importante, é que em relação ao consumo desse produto, uma parcela muito reduzida é consumida in natura, sendo que majoritariamente a produção é encaminhada para empresas que comercializam esse produto de forma beneficiada. Uma vez que grande parte da produção tem como origem a pequena produção familiar, esse trabalho tem como objetivo geral avaliar e discutir incertezas e dificuldades relacionadas à comercialização desse produto junto às empresas processadoras, tendo como objetivo específico de gerar subsídios para fornecer informações para aprofundamento posterior da pesquisa. MATERIAL E MÉTODOS O trabalho foi desenvolvido tendo como território o município de Juquiá (SP). A escolha desse município se justifica na medida da importância econômica dessa cultura para essa cidade sendo que, de acordo com dados da Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo, esse município concentra 60 % da área total cultivada de pupunha na região do Vale do Ribeira (SÃO PAULO, 2008), possuindo ainda, de acordo com os dados da Prefeitura Municipal, as principais empresas processadoras, sendo que a maior destas empresas chega a processar quatro toneladas por dia. Tendo como base a metodologia de elaboração de Diagnósticos de Sistemas Agrários, no qual o recorte se dará com a cultura da pupunha. Os dados referentes ao processo de comercialização foram obtidos mediante entrevistas históricas nos quais os informantes foram escolhidos em virtude de seus conhecimentos e de suas experiências profissionais (GARCIA FILHO, 1999) com a cultura, sendo dessa forma a amostragem foi constituída de forma intencional, conforme descrito por Dufumier, (1996), nesse caso, a suposição básica para construção de amostragens intencionais é de “com bom julgamento e uma estratégia adequada, podem ser escolhidos os casos a serem incluídos e, assim, chegar a amostras que sejam satisfatórias para as necessidades da pesquisa. Uma estratégia utilizada na amostragem intencional é a de se escolherem casos julgados como típicos da população em que o pesquisador está interessado” (MATTAR, 2000, p. 138). Para a consecução dos objetivos propostos foram entrevistados dois representantes da indústria, dois da municipalidade, um representante do setor financeiro e cinco produtores rurais que, de acordo com os critérios previamente definidos no processo da amostragem intencional, possuíssem conhecimento e fossem representativos da cultura da pupunha. Diante deste perfil, os respondentes foram entrevistados a respeito do processo produtivo e da comercialização tendo como roteiro as seguintes perguntas: 1) Como é processo de funcionamento da cadeia produtiva – produção e comercialização – da pupunha? 2) Quais os principais problemas da cultura da pupunha desenvolvida por pequenos produtores familiares em Juquiá, SP; 3) Como se dá o manejo/condução da cultura (é feito de forma adequada)? Considerou-se como pequeno produtor àquele que possuísse entre 15.000 e 20.000 pés de pupunha. RESULTADOS E DISCUSSÃO Diferentemente de outros setores integrados à agroindústria processadora não existem contratos formais entre produtores e compradores industriais. Essa situação leva a uma fragilidade das relações comerciais do pequeno produtor que tem poucas opções de comercialização de um produto que necessariamente é beneficiado. Por outro lado, a questão do fornecimento à agroindústria também é fragilizada, levando inclusive algumas delas a possuírem áreas cultivadas próprias, possivelmente como garantia de fornecimento. Todos os agentes inquiridos concordaram que o principal problema da pupunha está relacionado à assistência técnica especializada, faltando a estes produtores técnicas sobre a maneira adequada de como conduzir a cultura, notadamente quanto às questões de espaçamento, adubação, época de corte, espaçamento temporal entre os cortes, controle químico e, principalmente informações a respeito do ponto ideal de corte. Entretanto informaram que mesmo produtores com alto nível de investimento tem dificuldades de obterem informações sistematizadas de como conduzir essa cultura nas condições do Vale do Ribera, dada ser uma cultura nova na região. Quanto ao momento adequado de se fazer o corte da haste, as informações são contraditórias, havendo diferentes critérios para tal, como por exemplo, diâmetro do caule, altura da folha vela, número de nós e altura geral da planta. Essa situação também é observada quanto à necessidade ou não de proceder ao manejo dos perfilhos, tempo do primeiro corte, qual o momento (condições climáticas) para corte, necessidade ou não de renovação do pupunhal e também quanto ao uso de defensivos agrícolas registrados para controle fitossanitário. Além de todos os fatores que envolvem o desenvolvimento da planta aquele que se apresentou mais crítico com relação aos resultados da comercialização foi o estabelecimento de um critério quanto ao momento do corte da haste para entrega à indústria. A classificação usual para determinar o rendimento da haste diferencia o produto em Filé, parte mais nobre da haste; Coração, fatiado em forma de rodela; e Picado, produto marginal. Assim, a haste, de acordo com o manejo, poderá fornecer diferentes proporções destes produtos, apresentando rendimentos diferentes de Filé, Coração e Picado, de acordo com os diferentes manejos adotados, que irão refletir diretamente na remuneração do produtor. A relação produção e rendimento, diferentemente das culturas tradicionalmente cultivadas na região, não dá para ser obtida diretamente a partir do número de hastes entregues à indústria. De forma prática foi obtida a informação que a relação de preço entre Filé, Coração e Picado é de 1,0:0,5:0,2; assim pequenas variações de qualquer um desses componentes terá impacto significativo na receita final, o que pode gerar uma situação de incerteza quanto à remuneração a ser recebida pelo produtor. Assim, os principais problemas relacionados à comercialização são de duas ordens, o primeiro diz respeito à forma como o produtor conduz sua cultura que, da forma como ocorre atualmente, tem implicações na produtividade total do empreendimento; já o segundo diz respeito à relação produtor-agroindústria. O produtor no momento de fornecer as hastes para a indústria não sabe com certeza qual vai ser a remuneração final uma vez que a indústria vai remunerá-lo não pelo número de hastes entregues, e sim pelo rendimento que essa vai gerar. Já do ponto de vista da indústria esse procedimento se justifica, pois ela não sabe a priori qual o rendimento que vai ser obtido pelas hastes entregues. Essa situação explica eventuais conflitos existentes e tem como provável causa o baixo nível de informação do produtor rural em relação ao rendimento do produto, visto ser a pupunha uma cultura relativamente nova na região, e estes estarem acostumados a formar o preço de venda simplesmente pela multiplicação quantidade de produto vezes seu preço unitário. Ademais, tem-se o fato da cultura da pupunheira ser relativamente nova na região do Vale do Ribeira, onde se inscreve o município de Juquiá, não existindo informações sistematizadas sobre qual a melhor forma de manejo para essa região. O grande entrave para uma melhor remuneração do produtor familiar, que contribuiria para reduzir sua incerteza da renda obtida pela produção entregue, está diretamente relacionada à falta de informações da melhor maneira de como manejar a cultura, que tem como resultado o produtor não obter o potencial financeiro das culturas já implantadas, fato esse notado em grande parte do sistema. Uma vez que a cultura da pupunha vem continuamente aumentando a área cultivada, sendo inclusive apresentada como alternativa de renda para os produtores, existindo inclusive linhas de crédito para sua implantação, são necessários estudos específicos dessa cultura para a realidade ambiental, climática e social do Vale do Ribeira, o que proporcionará um nível maior de informações não só para a indústria como, principalmente, para o pequeno produtor familiar, que conjuntamente com outras atividades agropecuárias, terá como resultado uma melhoria de sua renda, contribuindo para o seu desenvolvimento social e fixação na terra. AGRADECIMENTOS Agradeço à Fundação para o Desenvolvimento da Unesp pelo apoio financeiro para a realização do trabalho. REFERÊNCIAS ANEFALOS, L.C. et al. Expansão do cultivo da pupunheira no Vale do Ribeira, estado de São Paulo, 2002-2006. Informações Econômicas, São Paulo, v.37, n.10, p. 37-43, out. 2007. BOVI, M.L.A.O. agronegócio palmito de pupunha. Horticultura Brasileira, v. 21, n. 1, p. 2, 2003. CHAIMSOHN, F.P. Cultivo de pupunha e produção de palmito. Viçosa: Aprenda Fácil, 2000. CORDEIRO, S.A.; SILVA, M.L. Rentabilidade e risco de investimento na produção de palmito de pupunha (Bactris gasipaes Kunth.). Cerne, Lavras, v. 16, n. 1, p. 53-59, jan./mar. 2010. DUFUMIER, M. Les projets de développement agricole - manuel d'expertise, Paris: CTAKarthala, 1996. GARCIA FILHO, D.P. Guia metodológico: diagnóstico de sistemas agrários. Brasília: Incra, 1999. (Projeto de Cooperação Técnica INCRA/FAO). MATTAR, F.N. Pesquisa de Marketing. São Paulo: Atlas, 2000. SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Agricultura e Abastecimento. Coordenadoria de Assistência Técnica Integral. Instituto de Economia Agrícola. Levantamento censitário de unidades de produção agrícola do Estado de São Paulo – LUPA 2007/2008. São Paulo: SAA/CATI/IEA, 2008. Disponível em: <http://.cati.sp.gov.br/br/projetolupa>. Acesso em 3 maio 2011.