Resíduos Sólidos Texto introdutório e questões inspiradoras Data: 08/08/2013 Local: Centro de Estudos Helênicos, Areté. Roda de Conversa: Resíduos Sólidos Data: 08.08.2013 Espaço Areté 14h-18h I. Programação 1. Expositores Ricardo Abramovay – sociólogo e professor da FEA/USP Rizpah Besen – Doutora pela Faculdade de Saúde Pública/USP Ronei Alves – Presidente da Central das Cooperativas do Distrito Federal (Centcoop) 2. Moderador Gisela Moreau – membro do Conselho Diretor do IDS 3. Debatedores Fabrício Soler – advogado do escritório Felsberg II. Texto Introdutório: A Roda de Conversa sobre Resíduos Sólidos, promovida pelo Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), tem como objetivo buscar subsídios que contribuam para a construção de diretrizes e propostas para o tema no contexto do Eixo “Economia para uma sociedade sustentável” da Plataforma Brasil Democrático e Sustentável. A geração de resíduos sólidos está intimamente ligada ao processo de produção e consumo das sociedades. Quando falamos em termos percentuais, globalmente a produção de lixo ainda está concentrada nos países ricos. Exemplo disso são os 34 países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que tem aproximadamente a mesma população da África, mas geram a metade do lixo do mundo (BANCO MUNDIAL, 2012). Mesmo assim, a discussão sobre os resíduos sólidos chega em bom momento no Brasil e nos demais países em desenvolvimento, pois, diferentemente do que ocorre no mundo rico, que já estabilizou sua produção de resíduos, estamos aumentando nossa quantidade de lixo, tanto em termos absolutos, quanto per capita. Aqui, a geração per capita de resíduos sólidos tem crescido a taxas mais altas do que o crescimento da população ou do PIB, especialmente a partir da década de 2000. Foi nessa época que teve início um processo maciço de inclusão social, especialmente das classes C, D e E. O aumento do poder aquisitivo da população, através do crescimento das oportunidades de emprego, Bolsa Família, facilidade na obtenção de crédito, estímulo ao consumo e uso indiscriminado de produtos descartáveis, por exemplo, são fatores que certamente influenciam na quantidade de resíduos sólidos gerados no país (CAMPOS, 2013). Em 2012, o Brasil gerou quase 63 milhões de toneladas de resíduos sólidos domiciliares, com média per capita de 1,1 quilo/hab/dia (ABRELPE, 2013), média já próxima a dos países desenvolvidos. Além disso, o enorme potencial de reaproveitamento do que é jogado fora vem sendo constantemente desperdiçado pelos governos, mas também pela sociedade, que ainda não aproveitou plenamente as oportunidades de negócio do setor. Ainda que a coleta domiciliar dos resíduos sólidos tenha crescido muito e atenda a 80% do conjunto da população brasileira, apenas 18% dos municípios possuem algum sistema de coleta seletiva. Um dado ainda pior trata do volume de lixo reciclado no Brasil onde, oficialmente, somente 3% do lixo produzido é reciclado (CEMPRE, 2012), representando um desperdício anual de cerca de R$ 8 bilhões, a valores de 2007 (IPEA, 2012). Finalmente, após mais de 20 anos de discussões no Congresso Nacional, o tema dos resíduos sólidos ganhou notoriedade a partir da promulgação da Lei 12.305 / 2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) (BRASIL, 2010). Esta Lei estabelece caminhos importantes para a gestão do lixo, como a obrigatoriedade de formulação de Planos de Gestão de Resíduos Sólidos Municipais e Estaduais, a eliminação dos lixões, a implementação da logística reversa e a inclusão social dos catadores de materiais recicláveis como parte importante da cadeia de reciclagem no Brasil. No entanto, ainda há muito a ser feito. Até agora, somente cerca de 10% dos municípios brasileiros encaminharam seus planos de gestão de resíduos ao Governo Federal (ABRAMOVAY et al, 2013), mesmo que a PNRS tenha estabelecido 2012 como a data final para esta ação. Quase 40% do lixo produzido no país ainda são despejados nos contestados lixões e nos aterros controlados, e apenas 27% dos municípios encaminham seu lixo para os aterros sanitários (BRASIL, 2012). Estima-se que existam atualmente entre 400 mil e 600 mil catadores de materiais recicláveis no Brasil (BRASIL, 2011), sendo autônomos ou organizados em associações ou cooperativas. A sua importância é enorme, pois são eles que realizam a coleta seletiva dos resíduos em 72% dos municípios em que ela é praticada, normalmente sem qualquer apoio do poder público (CEMPRE, 2008). Na década passada, os catadores conseguiram várias conquistas. Criaram o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR, 2012), em 2001. Tiveram sua profissão reconhecida pelo Código Brasileiro de Ocupações, do Ministério do Trabalho, em 2002, e no ano seguinte o governo federal criou o Comitê Interministerial de Inclusão Social dos Catadores (CAMPOS, 2013). Mesmo assim, como a grande maioria dos catadores não tem vínculo empregatício, suas organizações também não são remuneradas pelos serviços prestados (coleta e triagem) e o valor que recebem pelos materiais recuperados é muito baixo, com a renda baseada apenas na comercialização do reciclável para a indústria. O IPEA (2012) estima uma remuneração média de apenas R$ 412,64 por catador, ou seja, bastante inferior ao salário mínimo, de R$ 678,00. O quadro atual indica que a coleta seletiva no Brasil está baseada na exploração do trabalho e na injustiça social. Segundo o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (BRASIL, 2011), a composição do lixo no Brasil tem predominância do chamado lixo úmido (51%), que contém matéria orgânica, sendo o restante composto de materiais recicláveis (32%) e outros (17%). O resíduo orgânico, por não ser coletado separadamente, acaba sendo encaminhado para disposição final inadequada, gerando despesas e problemas como contaminação do ar e da água, que poderiam ser evitados. Além do custo, esse resíduo orgânico quando decomposto gera metano, gás vinte e uma vezes mais agressivo ao efeito estufa que o carbono. Por isso, o setor de resíduos sólidos globalmente já corresponde a cerca de 13% das emissões totais de GEE (IPCC, 2007). No Brasil, já se observa um aumento considerável de emissões relacionadas com o setor de resíduos. A variação percentual das emissões no período de 2005 a 2010, comparada com o período 1995 a 2005, foi de mais de 16%, com os resíduos representando atualmente cerca de 4% das emissões nacionais de GEE, contra 2% anteriormente (BRASIL, 2013). Quanto ao tema da logística reversa, o país avançou em alguns setores como pneus, baterias, lâmpadas fluorescentes, embalagens de agrotóxicos e óleos lubrificantes, onde os fabricantes tem a obrigatoriedade dada pela PNRS de cuidar da disposição final de suas mercadorias. No caso das embalagens em geral, que também possuem tal obrigatoriedade, mas que são produzidas por diversos fabricantes, utilizando-se de distintos materiais e está presentes em praticamente todas as residências do Brasil, o que acaba acontecendo é que não é o fabricante quem paga pelo serviço de coleta e organização da logística reversa e sim o contribuinte, ou seja, o orçamento das prefeituras (ABRAMOVAY ET AL, 2013). Esse precedente das embalagens em geral abre uma discussão importante sobre a gestão dos resíduos sólidos no Brasil em que, ao mesmo tempo, incentiva-se a logística reversa através do princípio do poluidor-pagador, onde os fabricantes têm a obrigação legal de gerenciar seu resíduo, e a responsabilidade compartilhada por todos. Para mudar o panorama da gestão de resíduos sólidos no Brasil, Abramovay et al (2013) colocam a necessidade de aumentar o diálogo com as empresas e, consequentemente, o protagonismo destas na gestão dos resíduos. Indicam que são as empresas que devem assumir os custos de sistemas capazes de recuperar os materiais remanescentes do consumo daquilo que oferecem e na proporção desta oferta, fazendo com que a gestão de resíduos converta-se num dos vetores pelos quais o próprio setor privado obriga-se a reformular seus padrões de oferta de bens e serviços. Concluem, assim, que “a proximidade e o diálogo com o setor privado e o estabelecimento conjunto de objetivos na gestão de seus resíduos é o melhor caminho para que o tema seja abordado com base em inovação, economia de recursos, racionalidade econômica e eficiência na formação de novos mercados para a reciclagem”. Considerando esses dados e informações apresentamos as seguintes questões norteadoras para os expositores e debatedores convidados para a Roda de Conversa do IDS sobre Resíduos Sólidos: III. Questões Inspiradoras O aumento da renda estimula o aumento do consumo e, consequentemente, da geração de resíduos, além da pressão sobre os recursos naturais. O modelo de desenvolvimento estimulado atualmente pelo governo federal (estimulo ao crédito e ao consumo) pode ser considerado sustentável no sentido amplo desse conceito? Como melhorar qualidade de vida com garantia de consumo de bens essenciais para as famílias que saem da condição de miséria e pobreza, ampliar o contingente humano que deixa a condição de miséria e ao mesmo tempo reduzir a geração per capita de resíduos sólidos? A PNRS, apesar de diversos avanços, estabelece uma contradição entre a responsabilidade compartilhada pelos resíduos e o princípio do poluidor pagador, que prega a responsabilização pelo gerador. Como fugir desta contradição? Nesse sentido, a quem cabem os custos e a inovação tecnológica necessários para a gestão adequada dos resíduos sólidos? O quadro normativo vigente permite uma harmonização de responsabilidades e competências entre as diferentes instâncias e setores de forma a viabilizar a adequada gestão dos resíduos sólidos? Como aumentar a quantidade de negócios produzidos pelo descarte do lixo? Cabe aos governos um papel central nesse sentido? Que tipo de incentivos o governo pode dar a esses “negócios sustentáveis”? Há um levantamento dos incentivos (creditícios e tributários) que o governo federal tem dado a inovação tecnológica associada à gestão de resíduos sólidos? Os catadores de materiais recicláveis são protagonistas do sistema de reciclagem, porém socialmente e economicamente marginalizados. Como realizar a inclusão socioprodutiva dos catadores de maneira digna e inclusiva? Quais os principais gargalos para a eliminação dos lixões no prazo definido pela PNRS? Os consórcios intermunicipais são uma solução? Há exemplos bem sucedidos? Como tornar eficiente a coleta dos resíduos dos domicílios, que realizam um descarte difuso, desigual e descentralizado? É adequado ou desejável que seja implantado no Brasil um tributo sobre a produção residencial considerada excessiva de lixo? Tal ação, adotada mediante critérios embasados e na medida adequada promoveria mais seletividade ou um padrão menos descartável de produção e consumo? Como enfrentar a questão dos resíduos orgânicos gerados em ambiente urbano? É viável a adoção em escala de sistemas de tratamento ao menos parcial dos resíduos orgânicos residenciais (ou condominiais) como os minhocários e outros sistemas de compostagem ainda artesanais? Há tecnológicas sociais relevantes que podem ajudar? Você poderia citar e caracterizar dois ou três exemplos (nacional ou internacional) de programas ou iniciativas públicas ou privadas de gestão de resíduos sólidos que funcionem como modelos a serem difundidos, adaptados e seguidos? IV. Referências Bibliográficas ABRAMOVAY, R.; SPERANZA, J. S.; PETITGAND, C. Gestão de resíduos sólidos para uma sociedade mais próspera. Relatório parcial de pesquisa (NO PRELO). Instituto Ethos. São Paulo. 2013. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE LIMPEZA PÚBLICA – ABRELPE. Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2012. 2013. Disponível em: http://www.abrelpe.org.br/panorama_apresentacao.cfm. Acesso dia 01 de julho de 2013. 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