CONCEITO A raiva (conhecida impropriamente como hidrofobia) é uma doença infecciosa de origem viral, que causa uma doença grave, geralmente fatal do sistema nervoso central. Afeta os mamíferos, sendo considerada uma zoonose. Por que esta doença é tão importante ? Importante zoonose com mortalidade mundial estimada em 40.000-100.000 humanos/ano Elevados custos no controle da doença em animais silvestres e em campanhas de vacinação Em todo o Brasil, com elevadas perdas econômicas na pecuária (Estima-se : 17 milhões de dólares/ano no Brasil) ETIOLOGIA Ordem Mononegavirales Família Rhabdoviridae Gênero Lyssavirus 100 50 0 1° 3° Trim Trim Leste Oeste Norte ETIOLOGIA Rhabdo (grego) = bastão Vírus RNA envelopado em formato de bastão Seu genoma codifica 5 proteínas – duas funcionam como antígenos principais ETIOLOGIA Glicoproteína (Ag de superfície ) - induz a formação de anticorpos neutralizantes Porção interna cilíndrica central de ribonucleoproteína ETIOLOGIA Inativado por: - pH baixo - solventes lipídicos - aquecimento a 56oC/30 min. - agentes químicos como a Formalina (1%), cresol (3%), beta-propiolactona (0,1%). -Persiste no tecido cerebral infectado por até 10 dias à temperatura ambiente e por várias semanas a 4o C ETIOLOGIA/HOSPEDEIROS Infecta todos aos animais de “sangue quente”, inclusive o homem Numerosas variantes do vírus da raiva já foram identificadas No Brasil há duas variantes: - Ciclo silvestre (isolada de morcegos e bovinos) - Ciclo urbano (isolada de cães) EPIDEMIOLOGIA Mamíferos de qualquer idade Graus variáveis de susceptibilidade: Mamíferos silvestres: ppte morcegos Em aves, a doença é muito rara EPIDEMIOLOGIA Distribuição cosmopolita Enfermidade endêmica em muitas partes do mundo: países da África, Ásia, Américas do Norte e do Sul e no oeste Europeu Em todo o Brasil Não ocorre: Austrália, Ilhas Britânicas, Chipre, Japão, Nova Zelândia, Escandinávia TRANSMISSÃO Inoculação do vírus (saliva) através da mordedura (raivoso → sadio) Contaminação de feridas recentes com saliva ou material infectado Contaminação de mucosas (olhos, narinas, boca) Via aerosol Período de incubação= 2-3 semanas até 6 meses Principais hospedeiros na transmissão são os carnívoros e morcegos, não sendo importantes os herbívoros e roedores TRANSMISSÃO Vírus pode ser eliminado pela saliva dos animais infectados 2-13 dias antes da sintomatologia clínica Nem todos os animais raivosos eliminam os vírus pela saliva/ nem todas as mordidas são infectantes! A transmissão do vírus entre os morcegos não-hematófagos está restrita a eles mesmos, exceto se houver manipulação inadequada destes Cavernas infestadas e pouco ventiladas – aerosois A transmissão alimentar para humanos ou animais não foi confirmada até o presente momento, apesar da detecção do vírus no leite de vacas com raiva CICLOS • Urbano – cães e gatos → humanos • Rural – herbívoros- fontes para os morcegos hematófagos • Silvestre – raposas, guaxinins, gambás e primatas (macacos e saguis)- morcegos hematófagos • Aéreo- morcegos hematófagos, frutívoros e insetívoros Morcego hematófago -Principal propagador do vírus para os animais de produção agressão diária - É o segundo maior transmissor de raiva humana no Brasil Morcegos hematófagos - No Brasil há 3 espécies deles: •Desmodus rotundus - somente este é importante •Diaemus Youngi •Diphylla ecaudata RAIVA RURAL A Raiva rural que acomete bovinos é cíclica, com periodicidade de 3-5 anos. Motivos: Morcegos infectados e doentes também morrem -Repovoar e Reinfectar a colônia - Cada fêmea= 1 cria / ano repovoamento lento - Brasil: principalmente bovinos de 2-3 anos (vacinados menos vezes?) RAIVA RURAL - Sazonal - Motivo: ciclo biológico do morcego - Machos disputam as fêmeas na primavera/ agressões / macho dominante fica e os outros têm que procurar novas colônias... transmissão - Período de incubação no morcego + animal agredido = pico de incidência da doença no outono -Os morcegos eliminam os vírus na saliva 10 dias ou mais antes da morte PATOGENIA Infecção → 1ª replicação nas células musculares na área da mordedura → invade neurônios motores ou sensoriais → fluxo axonal retrógrado (“centrípeta”) Neurônios motores → medula espinhal / tronco encefálico Neurônios sensoriais → gânglios → SNC No SNC – disseminação trans-neuronal através das sinapses (rápida) Disseminação passiva (“centrífuga”) para os nervos periféricos e invasão dos tecidos com inervação abundante: glândulas salivares (replicação no epitélio dos ácinos) Eliminado junto com a saliva através dos ductos IMPULSO * FLUXO ANTERÓGRADO: DENDRITOS CORPO CELULAR AXÔNIO * FLUXO RETRÓGRADO: AXÔNIO CORPO CELULAR PATOGENIA Chegada do vírus ao SNC → rápida a meses Depende: Da quantidade de vírus transmitida Do local da inoculação (cabeça ou membros) Da natureza da lesão Do estado imunológico do hospedeiro SINTOMATOLOGIA - Lesões difusas no SNC - medula, tronco encefálico, cerebelo, cérebro,... grande variação de sinais clínicos FORMA FURIOSA X FORMA PARALÍTICA Furiosa (lesões cerebrais) = + frequente caninos Paralítica (lesões na medula e tronco encefálico) = + frequente herbívoros BOVINOS - - - - Debilidade de membros posteriores e depois torácicos Decúbito esternal e depois lateral Paralisia da cauda Diminuição do reflexo anal Flacidez da língua/mandíbula Estrabismo, nistagmo Dificuldade de deglutição Diminuição da sensibilidade facial Trismo mandibular Diminuição dos reflexos palpebral e pupilar Espasmos e ataxia BOVINOS * Ainda (relacionados a lesões cerebrais): - depressão ou agressividade - Cegueira total ou parcial - Movimentos involuntários da cabeça e lábios - Bruxismo - Mugidos frequentes • - - Sinais cerebelares: Opistótono Tremores Salivação Prurido intenso no local da mordedura de morcegos CAVALOS - Sintomatologia semelhante a dos bovinos São frequentes: paresia e paralisia dos membros, depressão, agressividade, galope desenfreado e ataxia OVINOS E CAPRINOS - Sintomatologia semelhante a dos bovinos São frequentes: paresia e paralisia dos membros seguidas de decúbito CARNÍVOROS Três fases: 1) Prodrômica: mudanças na conduta - Cães se escondem em locais escuros; 2) Excitativa: hiperexcitabilidade e agressividade - Cães podem apresentar-se perigosamente agressivos 3) Paralítica (muda): paralisia progressiva Cães não deglutem a saliva/ salivação abundante; latido longo e rouco - Fase terminal: convulsões generalizadas, incoordenação muscular, paralisia de músculos do tronco e das extremidades - Período de incubação= 10 dias a 2 meses ou mais - MORCEGOS HEMATÓFAGOS - Atividade alimentar diurna - Hiperexcitabilidade - Agressividade - Tremores - Falta de coordenação dos movimentos - Contrações musculares e paralisia MUDANÇAS NOS HÁBITOS - Se afastam das colônias... podem perder a capacidade de voar e caem no chão Importante: a paralisia mandibular não é observada, mantendo a capacidade de morder - Morte: 48h após o aparecimento dos sinais clínicos - Período de incubação = 30 dias em média MORCEGOS NÃO-HEMATÓFAGOS - Sinais clínicos pouco conhecidos Principalmente a forma paralítica, sem a fase de excitação Relatos de morcegos insetívoros perseguindo outros – atitude de agressividade ??? PATOLOGIA Macroscopia: - mínimas alterações - Edema e Congestão - Automutilação e Corpos estranhos no estômago são indicativos, principalmente em monogástricos! Herbívoros: distensão da bexiga urinária e ampola retal distendida, com fezes Cavalos: escoriações e feridas cutâneas e hematomas subcutâneos (galope desenfreado e batidas contra cercas e objetos) PATOLOGIA Microscopia: Polioencefalomielite não-purulenta Manguitos perivasculares (linfócitos, plasmócitos e macrófagos) Corpúsculos de Negri (neurônios de Purkinje - cerebelo) Satelitose Neuronofagia Gliose Corpúsculo de inclusão intracitoplasmático eosinofílico em neurônio - HE DIAGNÓSTICO ☼ Imunofluorescência direta (IFD) e inoculação intracerebral em camundongos (IIC) – material congelado - Diagnóstico anatomopatológico não é o ideal ! - O sacrifício de animais abrevia o curso da doença e impede o aparecimento do corpúsculo de Negri! - Cadáver - corpúsculos desaparecem até 6 h após a morte (autólise) - Técnicas de imunoistoquímica podem ser utilizadasdetecção do Ag viral - Técnicas de amplificação viral (PCR) – humanos diagnóstico com amostras de saliva ou biópsias de pele: cultura e isolamento viral após replicação e amplificação DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL - Listeriose Polioencefalomalacia Encefalite por Herpesvírus bovino-5 Intoxicações por plantas hepatotóxicas (encefalopatia hepática) - Botulismo - Tétano TRATAMENTO Não existe CONTROLE E PROFILAXIA -Programas de erradicação e controle da raiva urbana; -Controle da raiva silvestre; -Medidas de transporte internacional de animais; -Procedimentos de vacinação prévia e de pós-exposição em humanos CONTROLE E PROFILAXIA - Programas de erradicação e controle da raiva urbana: 1) Vacinação de cães • Vacinas de vírus inativado e de vírus vivo modificado • Campanhas – cães e gatos a partir de 3 meses / revacinação de acordo com o período de imunidade conferido pela vacina utilizada 2) Eliminação de animais de rua 3) Acompanhamento/observação de animais mordidos e de seus agressores – 3 meses CONTROLE E PROFILAXIA - Programas de vacinação em massa de cães e gatos são altamente eficientes no controle da doença CONTROLE E PROFILAXIA - Controle da raiva silvestre transmitida por morcegos ou carnívoros terrestres: Realizar a Vacinação dos herbívoros • Instrução Normativa no 5, de 1º de março de 2002 do Ministério da Agricultura: determina a obrigatoriedade, nas áreas de ocorrência da doença, da vacinação anual de bovinos e equinos com vacinas inativadas, a partir dos 3 meses de idade. •Animais primovacinados- revacinados 30 dias após • Se houver animais doentes com menos de 3 mesesvacinar a partir dos 2 meses- revacinar aos 60 e 90 dias • Não são permitidas vacinas vivas atenuadas • Áreas endêmicas: vacinar também caprinos e ovinos CONTROLE E PROFILAXIA - Controle da raiva transmitida por morcegos hematófagos: (Supervisão de um médico veterinário) - Reduzir a população dos morcegos: 1) Captura com redes e utilização de venenos anticoagulantes (Warfarina a 1% veiculada com vaselina sólida) – soltos para que regressem a suas colônias – limpos por outros morcegos – morrem com hemorragias - Para uma colônia de 100 morcegos – tratar no máximo 10 2) Anticoagulantes ao redor das lesões recentes nos animais - morcegos retornam na mesma lesão e se intoxicam CONTROLE E PROFILAXIA - Para evitar casos de raiva transmitidos por morcegos não-hematófagos: - Orientar/Advertir a população: (crianças !) 1) Não recolher morcegos caídos ou capturar os que voam durante o dia 2) Impedir o acesso de morcegos às residências (telagem) 3) Não matar os morcegos insetívoros pois tem seu papel benéfico na agricultura CONTROLE E PROFILAXIA Controle da raiva transmitida por carnívoros silvestres: - Vacinação - Tais espécies são protegidas pela legislação ambiental, não sendo permitido o controle populacional Medidas de transporte internacional de animais: -Proibição de introduzir animais de áreas infectadas em países livres da raiva -Quarentena prolongada (6 meses) seguida de vacinação - Exigir certificados oficiais de vacinação de cães e gatos, com quarentena reduzida sob vigilância veterinária CONTROLE E PROFILAXIA Prevenção da raiva humana: - Vacinação limitada aos grupos de alto risco: pessoal de laboratório, de serviços anti-rábicos, médicos veterinários e naturalistas - Nenhuma vacina é completamente inócua! - A profilaxia pré-exposição não elimina a necessidade de cuidados médicos após a exposição à raiva – simplifica a terapia: elimina a administração do soro e diminui o número de doses de vacinas - Vacinar pessoas que vivem em regiões isoladas - Profilaxia pré-exposição: 0 - 7 – 21 - 28 dias CONTROLE E PROFILAXIA Prevenção da raiva humana: - Profilaxia pós-exposição: - Possível exposição à doença: mordidas de animais ou contaminações de mucosas com saliva - Tratamento local da ferida – lavar com água corrente, com sabão ou detergente e desinfetada com álcool, iodo ou compostos de amônia quaternária a 0,1%. Não suturar as feridas imediatamente ! - Vários protocolos de profilaxia... P. ex. soro + 5 doses da vacina em 28 dias. - Cada caso avaliado individualmente CONTROLE E PROFILAXIA Prevenção da raiva humana: Cada caso avaliado individualmente - Considerar: - Espécie do animal agressor - Circunstância da agressão: ataque provocado? - Tipo de exposição: local e extensão do ferimento - Presença de raiva na região - Situação vacinal do animal agressor