Apontamentos de problemas ergonômicos
usabilidade em sapatilhas de ponta
e
de
Notes on usability and ergonomic problems in pointe shoes
SANTOS, Caroline Zanardo Gomes; Mestre; Faculdade de Presidente Prudente
[email protected]
OTANI, Lindomar Aparecido; estudante de Graduação; Faculdade de Presidente Prudente
[email protected]
Resumo
O balé é uma forma de atividade física que executa movimentos específicos e que exige dos
bailarinos grande esforço físico e rigor estético. Este artigo realiza uma pesquisa de dados
bibliográficos e descreve o posicionamento científico a respeito da dança associada ao uso da
sapatilha de ponta, seus agravos e problemas de ordem ergonômica e de usabilidade. Os
resultados apresentam uma retórica reflexiva sobre o atual modelo de sapatilha.
Palavras Chave: sapatilha de ponta; ergonomia; funcionalidade.
Abstract
The ballet is a physical activity that performs specific movements of the dancers and
requiring great physical effort and aesthetic rigor. This article presents a survey of
bibliographic data and describes the scientific position concerning the dance associated with
the use of pointe shoe, their grievances and problems of an ergonomic and usability. The
results show a reflexive rhetoric about the current model of shoe.
Keywords: pointe shoe; ergonomics; functionality.
Apontamentos de problemas ergonômicos e de usabilidade em sapatilhas de ponta
Introdução
O balé clássico é uma modalidade de dança tradicional, performática e antiga. Ela se
originou na Europa no séc. XVI e se estendeu aos demais países oferecendo espetáculos que
proporcionam ao espectador verdadeira representação de graça e delicadeza.
Esta modalidade de dança deu origem a várias outras, mas as suas particularidades
fazem do balé clássico uma prestigiada forma de educação física, onde as estudantes
começam com quatro anos de idade e se prolongam por vários anos a fio.
O balé clássico se firma em regras e métodos pré-estabelecidos em conceitos antigos
onde os bailarinos realizam movimentos árduos que, muitas vezes, extrapolam os limites
físicos do corpo para alcançar o equilíbrio e a harmonia da coreografia em grupo.
Parte do figurino que compõe a arte e a técnica do balé são as sapatilhas de ponta,
importante ferramenta de trabalho para esta atividade, pois é a sapatilha que irá sustentar todo
o peso do corpo na ponta dos pés.
Sabendo que esta é uma atividade que se exige constante esforço físico e a execução
de posições corporais minuciosas, pressupõe-se que haja uma inclinação para o
desenvolvimento de problemas osteomusculares. Pressupõe-se, ainda, que a sapatilha de
ponta seja um fator decisivo no estudo de prevenção destes problemas ou até mesmo um
elemento que corrobora para o seu surgimento.
Através da análise dos dados bibliográficos e do cruzamento das informações
construiu-se um panorama geral e científico do assunto abordado abrindo caminhos para os
estudos no design e na ergonomia da sapatilha de ponta.
Esta pesquisa teve como objetivo verificar na literatura dados bibliográficos que
apontem, especificamente, a incidência de problemas oesteomusculares relacionados à prática
de balé por pessoas do sexo feminino associados ao uso da sapatilha de ponta, e que resultem
numa nova concepção do assunto abordado.
Metodologia
Um trabalho de elaboração teórica é resultante do processo de identificação, localização e
análise de publicações referentes a um tema ou a um problema de pesquisa. O seu objetivo é
sistematizar os textos, verificar as convergências e as discrepâncias entre os fatos.
Para esta metodologia, baseou-se em Gil (2010), utilizando-se uma abordagem
dialética, com procedimentos técnicos descritivos e de coleta de dados que abordam pesquisa
bibliográfica e documental. Os materiais são os artigos publicados em revistas indexadas em
bases de dados nacionais e internacionais, bem como outros trabalhos acadêmicos das áreas
da saúde, ergonomia e design.
Os dados serão apresentados em forma de capítulos detalhando a investigação acerca:
da descrição do balé, das características técnicas e de uso da sapatilha de ponta, dos
problemas ocasionados pela prática do balé e pelo uso da sapatilha de ponta. A interpretação
dos dados será demonstrada através dos resultados obtidos entre as convergências dos fatos,
apontando problemas e soluções para tal assunto.
O balé clássico e a sua relevância técnica e estética
A dança é uma manifestação social, mas também é um fenômeno estético-cultural e
simbólico. É uma forma de comunicação não-verbal, onde o corpo é o instrumento básico
para análise, ele é a matriz geradora da dança, das performances, dos gestos plenos de
significação consciente e dos movimentos espontâneos (SIQUEIRA, 2006).
O balé clássico é uma forma de dança conhecida por prezar pela tradição e pelo rigor
estético. Historicamente, ele nasceu com a Renascença, no século XVI, na Corte de Médicis,
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em Paris, refletindo gestos, movimentos e padrões típicos da época. Mas foi ao final do século
XVII que Pierre Beauchamps definiu as posições básicas do balé clássico, que descrevem
todos os passos (BAMBIRRA, 1993).
A partir de então, a técnica clássica evoluiu pela busca de leveza e agilidade, na qual o
bailarino procura o total domínio do corpo, de seus músculos e de seus movimentos, de modo
a poder utilizá-lo de forma expressiva, sem estar preso às limitações naturais.
Segundo Malanga (1985), a técnica clássica possui certos princípios de postura (ereta
e alongada) e colocação do corpo, que devem ser mantidos em todos os movimentos:
trabalha-se essencialmente a amplitude dos movimentos articulares, a precisão de seus giros
sobre ou fora do eixo corporal.
A prática da dança traz diversos benefícios para a saúde e bem estar: ela desenvolve
sensibilidade, musicalidade, percepção, coordenação, equilíbrio, tônus, lateralidade, noção
espacial, noção temporal, ritmo, relaxamento e respiração (BANBIRRA, 1993).
O balé conjuga, portanto, o domínio do corpo associado ao equilíbrio, a agilidade e
aos movimentos harmônicos. Tais características técnicas e estéticas é o que fazem do balé
algo tão valorizado e permanente na história.
No balé são utilizados dois tipos de sapatilha: a “de meia ponta” e a “de ponta”
(Figura 1). A sapatilha de ponta proporciona ao corpo da bailarina um distanciamento do solo
para causar a impressão de um corpo levitando. Tal característica, assim como da bailarina
içada deslizando o espaço, remetem à metáfora da supremacia da alma sobre o corpo, a um
ideal da bailarina como um ser etéreo, mais próximo do céu/da alma do que da terra/da
materialidade do corpo (SANTANA, 2005).
Figura 1: Sapatilha de ponta (direita) e meia-ponta (esquerda)
Fonte: Picon e Franchi, 2007.
A estética da dança permeia a poética de interpretar cenicamente uma partitura
musical, regida por expressões corporais sincronizadas em passos pré-estabelecidos com
proporções métricas e harmônicas. Os elementos cênicos e de figurino ainda remetem aos
valores românticos do séc. XVII, priorizando a coreografia à fotografia. Sua tradição e
relevância é de inegável valor histórico e artístico.
Segundo Meereis et al. (2010) as cinco principais posições dos pés utilizadas no balé
clássico são as ilustradas na Figura 2:
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Figura 2: Posições básicas do balé clássico
Outros movimentos básicos são os chamados plié e demi-plié, que consiste em um
movimento onde o bailarino vagarosamente flexiona seus joelhos na mesma linha dos pés que
estarão em total rotação externa (en dehours), juntamente com o quadril (Figura 3):
Figura 3: Movimentos básicos do balé clássico
Com a sapatilha de ponta realiza-se a “primeira posição em ponta” do balé clássico
que consiste, principalmente, na flexão plantar e manutenção do corpo ereto apoiado sobre o
antepé: região de apoio e sustentação para a bailarina (Figura 4).
Figura 4: Passos básicos do balé clássico
Todos estes passos, movimentos e posições citados acima pertencem a um vocabulário
específico do balé clássico que estão presentes de forma inalterável há décadas dentro da sua
prática esportiva.
Para Assumpção (2003) o ele compõe, na atualidade, um antagonismo, entre o novo e
o antigo, preso a raízes estéticas na pedagogia do corpo, onde já não se comporta o sacrifício
físico para atingir o belo. Salienta que é necessário uma proposta de superação destes valores,
onde o trabalho é pautado na reprodução e repetição a fim de chegar a um movimento
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tecnicamente perfeito. Segundo a autora, desvencilhar-se das antigas concepções reafirmadas
pelo balé clássico sobre o ensino da dança é bastante árduo, porém muito necessário para que
tenhamos uma nova proposta, pautada na liberdade e no respeito pela individualidade do ser
humano.
A sapatilha
usabilidade
de
ponta:
características
estruturais
e
de
A sapatilha de ponta é um calçado utilizado no balé como meio de sustentação das
bailarinas para auxiliar os movimentos sobre as pontas dos pés. Logo, este artefato deve
suportar o peso, a força exigida para movimentos e ainda se adequar à anatomia da usuária
(PÉRIGO; BUGLIANE, 2009).
A sapatilha de ponta é composta de partes específicas com nomenclatura própria.
Estas características são preponderantes para a compra e uso, a fim de se adequar o modelo ao
formato de pé e biotipo de cada bailarina (Figura 5).
Figura 5: Partes que compõem a sapatilha de balé.
Fonte: adaptado de Gaynor Minden, 2010.
É importante ressaltar a finalidade dos principais componentes de uma sapatilha,
conforme descrevem: Perigo e Bugliani (2009), Cunningham et al. (1998), Picon e Franchi
(2007):
- a caixa: que é a estrutura confeccionada por cola (à base de água ou resina), papel, juta e
tecido de algodão e que abriga os dedos dos pés;
- a plataforma: onde todo o peso do corpo da bailarina se apóia;
- a sola: de couro ou raspas de couro que auxilia as palmilhas a sustentarem o arco de pé;
- as palmilhas: que são confeccionadas, geralmente, por papel cartão rígido, originado da
colagem de suas camadas com resinas;
- o tecido: cetim brilhante que reveste os calçados, sendo geralmente um tipo de polímero
com finalidade estética.
- gáspea: região que define a altura onde ficam encaixados os dedos;
- abertura: parte da caixa onde se define a largura de cima.
Os calçados são fixados às pernas das bailarinas por meio de fitas de cetim e elásticos
sintéticos.
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A sapatilha de ponta trouxe um grande desenvolvimento técnico, exigindo prática,
aperfeiçoamento, e anos de estudo sobre o assunto. (ASSIS et al., 2009).
No período do desenvolvimento da técnica de ponta não existiam calçados
apropriados. Os pés das bailarinas eram acolchoados e forrados com algodão e lã, e as
sapatilhas eram cerzidas nas pontas e incluídas fitas para amarração dos tornozelos. Hoje, os
modernos calçados de ponta possuem suas extremidades endurecidas com cola para maior
firmeza (BARCELLOS; IMBIRRA, 2002).
Segundo Guimarães e Simas (2001), hoje, a estudante iniciante de balé recebe aulas
em sapatilhas macias de couro ou lona. As aulas concentram-se nas posições básicas dos pés e
dos braços no controle do tronco e na rotação externa apropriada. É enfatizado o
desenvolvimento da força, da coordenação e da graça. Com o passar do tempo, a sapatilha de
ponta é introduzida na rotina da estudante.
Guimarães e Simas (2001) complementam que é necessário estar atento para o tipo de
material e características da sapatilha que o aluno dispõe, pois uma sapatilha que deixe o pé
irregular ou esteja quebrada demais pode levar a uma fratura ou lesão. O papel do professor
em orientar a escolha do calçado e sua composição material é de máxima importância.
Também concerne ao professor estimular o uso de materiais auxiliares, como: protetores de
dedos, ajustadores entre outros.
Com a sapatilha de ponta, o esforço corporal é muito mais rígido. Além de a bailarina
ter domínio das movimentações do balé ela deve ter força muscular suficientemente
desenvolvida, uma postura ereta e consistente, e principalmente, um pé meticulosamente
treinado (SIQUEIRA, 2006; ASSIS, 2009).
Perigo e Buliane (2009) fazem severas críticas quanto ao caráter de usabilidade e
sustentabilidade das sapatilhas de balé clássico: eles afirmam que além dos materiais
constitutivos das sapatilhas acarretarem problemas que convergem para a instabilidade de uso,
comprometendo o conforto e a segurança das bailarinas, a falência precoce dos materiais e das
funções do calçado obriga as mesmas a utilizarem muitos pares destes, dando origem a uma
quantidade de resíduos hipoteticamente acima do necessário. No mesmo estudo Perigo e
Buliane (2009) apresentam dados fornecidos pelo English National Ballet onde as bailarinas
profissionais inglesas chegam a inutilizar 120 pares do calçado por ano devido ao desgaste e
deformação precoce das sapatilhas.
Picon et al. (2002) também censuram as sapatilhas de balé, alegando que os materiais
para a composição do calçado: cola, cetim, papéis especiais e palmilhas flexíveis, são
materiais incapazes de oferecer proteção aos pés contra a atuação de forças externas.
Atributos como amortecimento, estabilização e direção ainda não foram levados em
consideração na construção de sapatilhas de ponta, e, embora estudos já tenham apontado que
modificar o calçado esportivo não significa diminuir sobrecargas e impactos, existe uma
grande lacuna no estudo do calçado para dança. Os métodos biomecânicos de medição podem
render grandes esclarecimentos para um melhor conhecimento do uso do aparelho locomotor
e de sobrecargas envolvidas nos movimentos da dança clássica e do treino em pontas (PICON
et al., 2002).
Considerando, portanto, que a sapatilha de ponta tem a função de proteger os pés dos
impactos e auxiliar nos movimentos do balé, o seu projeto deve levar em consideração
aspectos mecânicos e estruturais.
Apenas um único trabalho de pesquisa foi realizado neste âmbito que se tenha
conhecimento: os testes realizados por Cunningham et al. (1998) que avaliou a rigidez
estática, força estática e propriedades de fadiga (ciclos de falha) das sapatilhas de ponta. O
estudo se baseou em testes mecânicos e ensaios em laboratório avaliando as cinco marcas
preferidas pelos praticantes de balé: Capezio, Freed, Gaynor Minden, Leo, e Grishko. Os
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resultados mostraram importantes aspectos que elucidarão os estudos subseqüentes para o
projeto deste calçado:
- necessita-se aumentar a flexibilidade da sapatilha como um todo, principalmente para os
movimentos de flexão plantar, distribuindo melhor a pressão desta região;
- a sapatilha de ponta deve ser capaz de fornecer o apoio e a proteção quando a praticante
estiver em pointe, na posição demi-pointe ou realizar um giro;
- O desenho do sapato deve reforçar a forma cônica da perna para facilitar um pouso
tranqüilo;
- em relação à resistência de compressão nenhum desenho suportou a força de compressão
simulando o peso do corpo humano na posição em pointe;
- a haste rígida com uma palmilha flexível colabora com o aumento da flexibilidade;
- a rigidez da região da caixa ajuda a absorver as forças de que o pé está sujeito;
- O material ideal para a construção do calçado é tido como o que preserva as propriedades
contra os choques e que permite sentir (em termos de percepção) o contato do pé com o chão;
- o calçado tido como ideal é aquele que passa a sensação de conforto e que permite manobras
artísticas, não significa necessariamente o sapato mais forte e durável;
Compreendeu-se, portanto, que muitos aspectos projetuais apontados pelo autor
precisam ser melhorados. Tanto na questão estrutural como no conforto.
Perigo e Buliane (2009) colocam o seguinte questionamento em pauta: porque em um
tênis de corrida existe muito mais tecnologia que em uma sapatilha de ponta, onde o
desempenho dos bailarinos fica reduzido a uma pequena plataforma, recheada de tecido
rústico, cola de farinha de trigo e papel? Onde o processo de fabricação não depende apenas
da máquina, mas da manipulação e avaliação constante de um artífice, que executa cada etapa
da confecção dos calçados? As bailarinas, por sua vez, são as menos beneficiadas, pois:
sofrem com a obsolescência do produto, submetem-se a riscos e são obrigadas a adquirir e
descartar um número exorbitante de material de consumo periodicamente.
Picon et al. (2002) também relata que a dança clássica, no decorrer de sua evolução,
vem exigindo de seus praticantes desempenhos cada vez mais complexos em calçados que
podem ser considerados rígidos, a fim de manter sua tradição e o grau de dificuldade técnica
desta arte.
Percebe-se, até aqui, que este produto carece de modificações estruturais, ergonômicas
e de uso. Contribuições no campo da Ergonomia, como o estudo de Keller e Santos (2006) e
de CEZAR et al. (2003), já apontaram que: para se obter um calçado confortável e então
ergonômico, deve-se analisar as condições: de calce, temperatura, distribuição de pressão e
absorção de choque, deve-se manter a integridade dos pés, proteger os pés, oferecer
segurança, estar adequado à atividade a que se destina,. Um calçado confortável deve
preservar a saúde do usuário, não machucar os pés, protegê-lo e ser adequado à atividade que
o calçado se destina. Tratando-se da sapatilha de ponta, este é um verdadeiro desafio.
Problemas ergonômicos associados à prática do balé e ao uso
de sapatilha de ponta
Como será demonstrado abaixo, muitos estudos, na área da ergonomia e da saúde,
apontam a prática do balé clássico como portadora de diversos problemas ocupacionais.
Acredita-se que estes dados sejam manifestados em uma porcentagem significativa das
praticantes profissionais.
A ergonomia é um campo de estudo amplamente utilizado em diversas áreas, com
caráter multidisciplinar (IIDA, 2005) e que tem por objetivo melhorar as condições do homem
de acordo com as atividades realizadas no dia-a-dia, trazendo conforto, satisfação e bem-estar,
e ainda, garantindo a sua segurança (MORAES; MONT’ALVÃO, 2010).
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Para discorrer sobre a ergonomia é necessário primeiramente explicar a anatomia dos
pés. Segundo Keller e Santos (2006) o pé tem como importante função a sustentação do corpo
e é essencial para a atividade de locomoção. Ele possui músculos divididos em quatro regiões,
sendo estas: a dorsal, plantar, plantar interna e plantar externa, tendo entre elas um total de 20
músculos e possuindo ainda os tendões que são uma continuação dos músculos, e os
ligamentos que tem como função o sistema ósseo do pé.
Segundo Prati e Prati (2006), a atividade física, como qualquer movimento corporal
produzido pelo sistema músculo-esquelético, proporciona maior gasto de energia, acarretando
em benefícios à saúde do praticante, quando realizadas corretamente.
Dentro desta prática esportiva destaca-se o movimento, uma das características mais
presentes na atividade do balé. As estruturas do organismo podem ser diretamente afetadas
pela forma de execução, quantidade e especificidade do movimento. Por isto, Guimarães e
Simas (2001) relatam que, quando a atividade física é levada a certos limites, solicitando ao
máximo dos músculos e tendões, ossos e articulações, pode atuar como agente patológico
sobre o aparelho locomotor.
A atividade do balé apresenta elevadas amplitudes articulares e repetitividade de
movimentos que levam a desequilíbrios de grupos musculares, alterando a biomecânica do
corpo e comprometendo a função (COSTA; PINHEIRO, 2007).
A bibliografia também apresenta dados alarmantes sobre a quantidade e variedade de
lesões osteomusculares associadas à prática do balé com o uso da sapatilha de ponta,
conforme mostrado a seguir.
Segundo Guimarães e Simas (2001), as lesões mais frequentes derivadas da prática do
balé são as de pé e tornozelo, seguido das de joelho e quadril. Os membros superiores são
menos acometidos. Essas lesões acontecem devido ao excesso de exercícios, repetições e
graças ao uso incorreto e precoce da sapatilha de ponta.
Prati e Prati (2006) relatam diversos estudos que apontam que dentre os problemas de
postura e dores prevalentes em bailarinas clássicas, estão: as hiperlordoses lombares (80% de
casos), tronco inclinado (72% de casos) e cifose cervical (62% de casos).
Monteiro e Grego (2003) afirmam que as lesões decorrentes da dança vêm sendo
investigadas na Europa e América do Norte, com enfoque predominante para o balé clássico.
Por este motivo, profissionais da dança atualmente vêm condenando, por exemplo, o uso da
sapatilha de ponta, sendo, as posições básicas, realizadas em meia ponta para prevenir lesões.
O trabalho na ponta faz com que os dois primeiros metatarsos suportem a maior parte
do peso corporal. Conseqüentemente, quando as bailarinas aprendem a dançar na ponta dos
pés, esses ossos começam a sofrer processo de remodelagem, tornando-se muito mais espessa
que em pessoas que não dançam. (BARCELLOS, IMBIRIBA, 2002).
A tendência da bailarina é ficar na posição en dehors (princípio mais importante do
balé) e transferir o peso do corpo para o arco interno do pé, podendo desenvolver alterações
nos membros inferiores, como o pé valgo e calcâneo valgo. Assim também o trabalho
incorreto do demi-plié pode levar a problemas na coluna, joelhos, pés e tornozelos. As
articulações são afetadas pela força colocada nos pés, tornozelos e joelhos. Este cenário
biomecânico prepara a bailarina para a formação do joanete e resulta em problemas de
disfunção patelofemoral, tendinite patelar e condromalacia da patela. Podem surgir joelhos
elásticos ou para trás, em conseqüência de ligamentos distendidos. Outras deformações ainda
podem advir do uso precoce de pontas, com os pés em garra, ou seja, com os dedos
encolhidos, como sugere o nome (GUIMARÃES; SIMAS, 2001).
A técnica do balé aplicada de forma incorreta e precoce provoca lesões que, muitas
vezes, acabam com a carreira da bailarina. Isto pode ocorrer quando se trabalha
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excessivamente um só movimento, principalmente na sapatilha de ponta (GUIMARÃES;
SIMAS, 2001).
As características técnicas e estéticas do balé levam a uma prática com movimentos
nada anatômicos, conduzindo a bailarina clássica a um grupo de lesões: associadas a erros de
técnica e de treinamento e ao uso indevido da sapatilha de ponta (GUIMARÃES, 2001).
Picon e Franchi (2007) cita que sapatilhas de ponta são particularmente
desconfortáveis para os artelhos, pois estes devem se ajustar na gáspea e daí alcançar a
completa flexão plantar, que é a posição em pontas. Nesta especial construção, a flexão
plantar é totalmente atingida, dedos, arcos plantares, e bordo anterior dos pés ficam
comprimidos e formam as principais regiões de apoio e sustentação para a bailarina, o que
requer um grande esforço neuro-muscular, fisiológico e ósseo.
Grego et al.(2006) alega que a execução de exercícios sobre a sapatilha de ponta foi
nos seus estudos a segunda dos AMEs. Os estudos que apontam as sapatilhas de ponta como
calçados pouco seguros para a prática da dança (PICON et al., 2002) e o formato anatômico
da sapatilha de ponta que provoca o estrangulamento dos dedos (MONTEIRO; GREGO,
2003). Portanto, a sapatilha de ponta, associada a específicos movimentos pode ser um
importante instrumento no desenvolvimento de lesões, uma vez que esta não é desenhada a
fim de proteger os pés contra estresses físicos (PICON et al., 2002).
Não se deve culpar unicamente a atividade física, mas também os erros de técnica e de
treinamento, que acabam sendo os principais causadores de problemas ergonômicos. Fica
claro também que a bibliografia associa o aparecimento destes problemas de ordem
ergonômica ao uso de sapatilhas de ponta.
Resultados e conclusão
É pertinente afirmar que a literatura proporcionou convergências em relação a algumas
premissas, mesmo quando de áreas diferentes:
- apesar do balé ser uma forma de arte antiga e prestigiada, ainda está presa a
conceitos que nos fazem questionar suas diretrizes austeras e adversa a mudanças. Um olhar
mais detalhado oferece condições de afirmar que já existem questionamentos quanto ao
sacrifício do corpo pela arte e que a expressão corporal deve evoluir para a expressão da
individualidade;
- existe um consenso de que a sapatilha carece de transformações tecnológicas e que,
atualmente, o desenho não oferece segurança, conforto e estabilidade. Os movimentos
minuciosos que encadeiam a participação de ossos, músculos e nervos são diretamente
afetados pela relação entre a prática do balé e o uso da sapatilha de ponta;
- muitas considerações presentes na bibliografia poderiam auxiliar o projeto de novos
produtos demonstrando os pontos falhos e apontando parâmetros ergonômicos para a
elaboração de novos produtos;
- estudos interdisciplinares da área de design e de ergonomia para sapatilhas de ponta
seriam proveitosos e acrescentariam virtuosidade técnica, estética e tecnológica.
Beneficiariam os usuários, deixando se der considerado um objeto de confecção defasado;
- o excesso de exercícios e repetições, o uso precoce e incorreto da sapatilha de ponta
e a prática de posições incorretas são os grandes causadores de lesões osteomusculares. O
bom preparo físico, a informação e um bom calçado somam qualidade de vida e devem estar
presentes em qualquer forma de atividade física.
Este artigo buscou conhecer e analisar as contribuições culturais e científicas
existentes sobre o assunto abordado, onde se sucedeu a reflexão sobre o tema com o intuito de
proporcionar maior qualidade de informações possíveis do fenômeno em questão e auxiliar
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futuras pesquisas sob o ponto de vista do design, na expectativa de que o balé, que é uma
manifestação artística tão sutil, possa deixar de ter um fardo tão pesado.
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