6. SÉRIES DE FUNÇÕES
6.1: Séries de potências e a sua convergência
Definição 1.1: Uma série de potências de x − a é uma série da
forma
+∞
a0 + a1 ( x − a ) + a2 ( x − a ) + " + an ( x − a ) + " = ∑ an ( x − a ) .
2
n
n
(1)
n =0
Uma série de potências de x − a é sempre convergente para
x = a . De facto, quando x = a , obtemos a série numérica
a0 + 0 + 0 + " , cuja soma é a0 ∈ IR .
Mas será que existem outros valores de x para os quais a série (1)
é convergente? O teorema seguinte fornece uma resposta a essa
pergunta.
Teorema 1.2: Teorema de Abel- séries de potências de x − a
+∞
Dada a série de potências
∑ an (x − a )n ,
apenas uma das
n=0
seguintes situações se verifica:
(i)
a série converge apenas para x = a ;
(ii)
a série converge (absolutamente) para todos os valores
reais de x;
1
(iii)
existe um número real R > 0 (chamado raio de
convergência) tal que a série converge absolutamente
para todos os valores de x para os quais x − a < R , e
diverge para todos os valores de x para os quais
x − a > R.
Nota: No teorema anterior, quando se verifica (i) tem-se R = 0 e
quando se verifica (ii) tem-se R = +∞ .
Definição 1.3: Chama-se intervalo de convergência da série de
potências ao conjunto de todos os valores de x para os quais a
série converge.
Nota: Para estudar a convergência de uma série de potências,
podemos aplicar o critério de Cauchy ou de D’Alembert a série
dos módulos.
Exemplo 1.4: Determine o intervalo de convergência da série de
(
− 1)n x 2 n
potências ∑
.
(
)
2
n
!
n=0
+∞
Vamos agora ver duas regras para o cálculo do raio de
convergência de uma série de potência de termos não nulos.
2
Teorema 1.5: O raio de convergência de uma série de potências
+∞
da forma
∑ an (x − a )n
é dado por
n=0
R = lim
n→+∞
an
, desde que o limite existe ou seja igual à + ∞ ;
an+1
ou R = lim
n→+∞ n
1
, desde que o limite existe ou seja igual à + ∞ .
an
Além disso,
(i)
se R = 0 então a série converge para x = a ;
(ii)
se R = + ∞ então a série converge ∀x ∈ IR ;
(iii)
se R ∈ ]0,+∞[ então a série converge pelo menos para
todos os x ∈ ]a − R, a + R[ .
Exemplo 1.6: Determine o raio e o intervalo de convergência da
+∞
série
n!
∑ 2n + 1(x − 1)n .
n =0
Exemplo 1.7: Determine o raio e o intervalo de convergência da
+∞
série
1
∑ nn xn .
n=0
+∞
Exercício 1.8: Analise a convergência da série
∑
n=0
( x − a )n , sendo
bn
b > 0.
3
6.2: Séries de Taylor e de Maclaurin
Nesta secção, vamos considerar o problema seguinte: dada uma
função com derivadas de todas as ordens, como representá-la por
uma série de potências?
Definição 2.1: Seja f uma função que admite derivadas de todas
as ordens no ponto a. Chama-se série de Taylor de f em a a série
f (n ) (a )
∑ n! (x − a )n .
n =0
+∞
No caso em que a = 0 , a série é designada por série de
Maclaurin de f.
Exemplo 2.2: Determine a série de Maclaurin para f ( x ) = senx .
Exemplo 2.3: Determine a série de Maclaurin da função
f (x ) =
1
e analise a sua convergência.
1− x
Exemplo 2.4: Determine a série de Maclaurin da função
f ( x ) = e x e analise a sua convergência.
Teorema 2.5: Seja f uma função que admite derivadas de todas as
ordens num intervalo I centrado em a, então
f (n ) (a )
f (x ) = ∑
( x − a )n ,
n!
n=0
+∞
4
f ( n +1) (c )
n +1
(
para todo x ∈ I tal que lim
x − a ) = 0, sendo c um
n→+∞ (n + 1)!
número compreendido entre a e x.
f (n+1) (c )
( x − a )n+1 é chamado resto
Nota: (1) Para x ≠ a , Rn ( x )=
(n + 1)!
de Lagrange da função f.
(2) Se existir duas constantes C e M tais que
f (n +1) ( x ) ≤ CM n , ∀x ∈ I , então lim Rn ( x )= 0, ∀x ∈ I .
n→+∞
6.3: Séries de Fourier
6.3.1. Definições
Em muitos fenómenos da vida real aparecem funções periódicas
(ondas de som, batimento cardíaco…)
Definição 3.1: Diz-se que a função f é periódica de período T>0
se
f (x + T ) = f (x ) ,
∀x, x + T ∈ D f .
O menor número T que satisfaz a relação anterior é chamado
período fundamental.
Exemplo 3.2: As funções
f ( x ) = senx e g ( x ) = cos x são
periódicas de período T = 2π
5
⎛ nπx ⎞
Exercício 3.3: Mostre que a função f ( x ) = sen⎜
⎟ , n ∈ IN ,
⎝ L ⎠
L > 0 é periódica de período T =
2L
.
n
2L ⎞
⎛ nπ
⎛
Resolução: f ⎜ x +
⎟ = sen⎜
n ⎠
⎝
⎝ L
2L ⎞ ⎞
⎛
⎜x+
⎟⎟
n ⎠⎠
⎝
⎛ nπx nπ 2 L ⎞
= sen⎜
+
⎟
Ln ⎠
⎝ L
⎛ nπx
⎞
⎛ nπx ⎞
= sen⎜
+ 2π ⎟ = sen⎜
⎟ = f (x ) .
⎝ L
⎠
⎝ L ⎠
O objectivo desta secção é de representar uma função periódica à
custa de funções periódicas simples, nomeadamente, seno e
cosseno, sob a forma de uma série trigonométrica.
Suponhamos que uma dada função f : IR → IR , periódica de
período 2 L , pode ser representada por uma série trigonométrica
da forma
+∞
1
⎡
⎛ nπx ⎞
⎛ nπx ⎞⎤
a0 + ∑ ⎢an cos⎜
⎟ + bn sen⎜
⎟⎥ ,
L
L
2
⎝
⎠
⎝
⎠⎦
⎣
n =1
(1)
ou seja,
+∞
1
⎡
⎛ nπx ⎞
⎛ nπx ⎞⎤
f ( x ) = a0 + ∑ ⎢an cos⎜
⎟ + bn sen⎜
⎟⎥ .
2
⎝ L ⎠
⎝ L ⎠⎦
n =1 ⎣
(2)
6
Então, os coeficientes an e bn estão ligados à função f através
das seguintes relações:
1 L
⎛ nπx ⎞
an = ∫ f ( x ) cos⎜
⎟ dx, n ≥ 0
L −L
L
⎝
⎠
;
1 L
⎛ nπx ⎞
bn = ∫ f ( x )sen⎜
⎟ dx, n ≥ 1
L −L
⎝ L ⎠
(3)
(4)
Definição 3.4: Seja f : IR → IR , uma função periódica de período
2 L , integrável e absolutamente integrável em cada intervalo
⎞
⎛L
limitado ⎜⎜ ∫ f ( x ) dx < ∞ ⎟⎟ . A série (1) é chamada série de
⎠
⎝ −L
Fourier de f e os números an , para n ≥ 0 e bn , para n ≥ 1,
definidos pelas relações (3) e (4) são chamados coeficientes de
Fourier de f.
Exemplo 3.5: Determine a série de Fourier da função
⎧ 1 se 0 ≤ x < π
e periódica de período T = 2π .
f (x ) = ⎨
π
0
se
−
≤
x
<
0
⎩
1 +∞
2
Solução: + ∑
sen((2k − 1)x ) .
2 k =1 (2k − 1)π
Exercício 3.6: Determine a série de Fourier da função
⎧− 1 se − 1 ≤ x < 0
f (x ) = ⎨
, periódica de período T = 2 .
1
se
0
≤
x
≤
1
⎩
7
Exercício 3.7: Determine a série de Fourier da função
⎧ 2 x se 0 ≤ x ≤ π
f (x ) = ⎨
, de período T = 2π .
x
se
−
<
x
<
0
π
⎩
6.3.2. Funções pares e ímpares - desenvolvimento em
séries de Fourier de senos e cossenos
Proposição 3.8: Se f for uma função par, periódica de período
2 L , integrável e absolutamente integrável, então a sua série de
Fourier é dada por
+∞
1
⎛ nπx ⎞
a0 + ∑ an cos⎜
⎟,
2
L
⎝
⎠
n =1
com
(5)
2L
⎛ nπx ⎞
an = ∫ f ( x ) cos⎜
⎟ dx, n ≥ 0.
L0
L
⎝
⎠
A série (5) é chamada a série de Fourier de cossenos.
Proposição 3.9: Se f for uma função ímpar, periódica de período
2 L , integrável e absolutamente integrável, então a sua série de
Fourier é dada por
+∞
⎛ nπx ⎞
⎟,
L ⎠
∑ bn sen⎜⎝
n =1
com
(6)
2L
⎛ nπx ⎞
bn = ∫ f ( x )sen⎜
⎟ dx, n ≥ 1.
L0
L
⎝
⎠
A série (6) é chamada a série de Fourier de senos.
8
f : IR → IR periódica de período 2 L
Exemplo 3.10: Seja
definida por f ( x ) = x , para − L ≤ x < L . Determine a série de
Fourier de f.
Resolução: Como f é ímpar, teremos uma série de senos cujos
2L
⎛ nπx ⎞
coeficientes são dados por bn = ∫ xsen⎜
⎟ dx, n ≥ 1.
L0
L
⎝
⎠
Efectuando
2L
bn = 2 2
nπ
a
mudança
nπ
∫ y seny dy,
de
variável
y=
nπx
,
L
n ≥ 1.
0
nπ
Integrando por partes,
∫ y seny dy = [− y cos y ]
nπ
nπ
0
− ∫ − cos y dy .
0
0
nπ
Ou seja,
obtemos
∫ y seny dy = −nπ cos(nπ ) = −nπ (− 1)
n
.
0
Logo, bn =
2L
(− 1)n +1 , n ≥ 1.
nπ
Portanto a série de Fourier da função f é
2 L + ∞ (− 1)n +1
⎛ nπx ⎞
sen
⎜
⎟.
∑
π n =1 n
⎝ L ⎠
Exemplo 3.11: Seja
f : IR → IR periódica de período 2 L
definida por f ( x ) = x 2 , para − L ≤ x < L . Determine a série de
Fourier de f.
9
Resolução: Como f é par, teremos uma série de cossenos cujos
coeficientes são dados por
2L 2
⎛ nπx ⎞
e an = ∫ x cos⎜
⎟ dx, n ≥ 1.
L0
L
⎝
⎠
2L 2
2 L2
a0 = ∫ x dx =
L0
3
Efectuando
a
mudança
de
variável
y=
nπx
,
L
obtemos
2 L2 nπ 2
an = 3 3 ∫ y cos y dy, n ≥ 1.
nπ 0
Integrando por partes,
nπ
∫y
2
[
cos y dy = y seny
2
]
nπ
0
nπ
0
0
− 2 ∫ y seny dy = −2 ∫ y seny dy .
0
nπ
Como,
nπ
∫ y seny dy = nπ (− 1)
n +1
(ver exemplo anterior), temos
0
4 L2
n
an = 2 2 (− 1) , n ≥ 1.
nπ
Portanto a série de Fourier da função f é
L2 4 L2
+
3 π2
+∞
∑
n =1
(− 1)n cos⎛ nπx ⎞ .
n2
⎜
⎟
⎝ L ⎠
6.3.3. Convergência das séries de Fourier e aplicações
Em (2) supusemos que uma dada função era representada por uma
série de Fourier. Mas quando é que uma função é igual à sua série
de Fourier? Para dar resposta a esta questão, precisamos de
algumas definições.
10
Definição 3.12: Uma função f : IR → IR , diz-se seccionalmente
contínua no intervalo [a, b], se for definida em [a, b] excepto
possivelmente num número finito de pontos xi , i = 1," , n com
a ≤ x1 < x2 < ... < xn −1 < xn ≤ b , se f é contínua em cada sub-
intervalo da forma ]a, x1[, ]x1 , x2 [," , ]xn , b[ , e se são finitos os
limites laterais em cada ponto xi , i = 1," , n .
Nota: Toda a função contínua é seccionalmente contínua.
⎧ 1 se 0 ≤ x < π
Exercício 3.13: Mostre que a função f ( x ) = ⎨
⎩0 se − π ≤ x < 0
periódica de período T = 2π é seccionalmente contínua.
Definição 3.14: Uma função f : IR → IR , diz-se seccionalmente
diferenciável, se as funções f e
f ′ forem seccionalmente
contínuas.
Teorema de Fourier Seja f : IR → IR uma função periódica de
período 2 L , seccionalmente diferenciável. Então a série de
Fourier de f, dada em (2), converge, em cada ponto x0 , para
[ ( ) ( )]
1
f x0− + f x0+ , ou seja,
2
[ ( ) ( )]
+∞
1
1
⎡
⎛ nπx ⎞
⎛ nπx ⎞⎤
−
+
f x0 + f x0 = a0 + ∑ ⎢an cos⎜
⎟ + bn sen⎜
⎟⎥
2
L
L
2
⎠⎦
⎝
⎠
⎝
n =1 ⎣
11
Exemplo 3.15: Use o resultado do exemplo 3.5 para obter uma
expressão em série de π .
Uma das aplicações das séries de Fourier é o cálculo da soma de
uma série numérica.
Exemplo 3.16: Use o resultado do exemplo 3.11 para calcular a
+∞
soma da série
1
∑ n2 .
n =1
Resolução: Como consequência do teorema de Fourier, podemos
afirmar que
L2 4 L2
x = + 2
3 π
2
+∞
∑
(− 1)n cos⎛ nπx ⎞ .
n =1
n2
⎜
⎟
⎝ L ⎠
Considerando x = L , obtemos
L2 4 L2
+
L =
3 π2
2
(− 1)n cos(nπ ) ⇔ L2 = L2 + 4 L2 + ∞
+∞
∑
n =1
n2
3
π2
1
∑ n2 ,
n =1
ou seja,
π2
6
+∞
1
.
2
n
n =1
=∑
12
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