Universidade do Estado do Pará Centro de Ciências Sociais e Educação Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestrado Fábio Rogério Rodrigues Gomes Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da Microrregião Marabá/Pará Belém 2007 2121 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Fábio Rogério Rodrigues Gomes Metropolitana De Belém Baixo Amazonas Marajó Nordete Paraense Sudoeste Paraense Belém 2007 Sudeste Paraense Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2222 Fábio Rogério Rodrigues Gomes Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Educação, Linha de Pesquisa Saberes Culturais e Educação na Amazônia e Área de Concentração em Identidade e Diversidade Lingüística e Educação na Amazônia, do Centro de Ciências Sociais e Educação, da Universidade do Estado do Pará, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação, orientada pela Profª. Dr. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da Silva. Belém 2007 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2323 Dados Internacionais de catalogação na publicação Biblioteca do Centro de Ciências Sociais e Educação da UEPA G633c Gomes, Fábio Rogério Rodrigues Cartografia lingüística e educação na Amazônia: um estudo semânticolexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará / Fábio Rogério Rodrigues Gomes; Orientador, Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da Silva - 2007. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade do Estado do Pará, Belém, 2007. 1. Lingüística 2. Sociolingüística 3. Semântica I.Título. CDD: 21 ed. 410 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2424 Fábio Rogério Rodrigues Gomes Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da Microrregião Marabá/Pará Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Educação, Linha de Pesquisa Saberes Culturais e Educação na Amazônia e Área de Concentração em Identidade e Diversidade Lingüística e Educação na Amazônia, do Centro de Ciências Sociais e Educação, da Universidade do Estado do Pará, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação, orientada pela Profª. Dr. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da Silva. Data de aprovação: 08/08/2007 Banca Examinadora: ___________________________________________ (Orientadora) Profª. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da Silva Dr. em Semiótica e Lingüística Geral Universidade do Estado do Pará ___________________________________________ (Membro externo) Profa. Laura Maria Silva Araújo Alves Dr. em Educação Universidade Federal do Pará ___________________________________________ (Membro interno) Profª. Denise de Souza Simões Rodrigues Dr. em Sociologia Universidade do Estado do Pará Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2525 “Dotô, to c’uma dô diacisada, que começa no mucumbú, vai na passarinha, bate na titela e dá um nó no fato.” “Doutor, estou com uma dor muito forte, que começa no cóccix, passa pelo baço, pela caixa toráxica e provoca movimentos peristálticos no instestino”. Resumindo: gases intestinais! (Atzingen, 2004) Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2626 A Deus, pelo dom da vida... da sabedoria ...e do amor, e por tatuar, em mim, a palavra – marca divina – transmitida aos homens, que se fez carne e habitou entre nós. À minha mãe, Ana Acácio Gomes, pela cumplicidade e inesgotável força, para levar adiante um ideal. Ao meu pai, Júlio Rodrigues de Sá, pelos ensinamentos que construíram a essência da minha personalidade. Aos meus manos, Julio Sérgio e Zaqueu. Ao primeiro, pelo privilégio de poder compartilhar uma nova e, talvez, a mais bonita fase de sua vida e, ao segundo, pelo companheirismo, com quem divido, dia a dia, desde a sua infância, alegrias e tristezas. À Lice e Marcos, pela companhia,tantas vezes dividida, e sempre que renovada continua a contagiar de alegria meu coração. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2727 Aos amigos, em especial, à Marlene Chavito e Fernando Melo, por terem sempre aberto, para mim, as portas de seus generosos corações, e a Silvaneto, Janete, Madalena, Rafael, Teresa, Aparecida (Pú), Jânio, Day, Vera Froz e Rosinete. À Administração Superior da Universidade do Estado do Pará – UEPA, representada pelo Magnífico Reitor, Prof. Ms. Fernando Antonio Colares Palácios, pelo empenho na realização de uma inquestionável ação acadêmica que significa este primeiro Mestrado em Educação. À Profa. Ms. Ana Claudia Serruya Hage, Diretora do Centro de Ciências Sociais e Educação – CCSE, da UEPA, por haver rememorado, em mim, nestes momentos finais de conclusão do Mestrado, o início dele, o exato primeiro dia – A aula inaugural – quando, sabiamente, professou: “... guerreiros são pessoas, por isso são fortes e são fracos...”. À Profa. Dr. Ivanilde Apoluceno de Oliveira, Coordenadora do Programa de Pós–Graduação em Educação – Mestrado – do CCSE-UEPA, de quem tive o privilégio de ser aluno e o prazer de me encantar com seus ensinamentos éticos, políticos e epistemológicos. À Profa. Dr. Cely do Socorro Costa Nunes, Vice-Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestrado – do CCSE-UEPA, pela delicada bravura com que superou as aparentes limitações. À Profa. Dr. Denise de Souza Simões Rodrigues, pela inesquecível alegria de haver sido seu aluno, mesmo entre o caloroso frio da Qualificação e o desafio libertador das suas mágicas palavras, na Banca Examinadora, ou, simplesmente, por haver contemplado uma excentricidade que somente a ela é peculiar. À Profa. Dr. Laura Maria Silva Araújo Alves, docente do Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal do Pará, por aceitar o convite para compor a Banca Examinadora deste trabalho, o que requereu disponibilizar e dividir seu tempo, já comprometido com inúmeros compromissos acadêmicos, o meu muito obrigado. Ao Prof. Dr. Orlando Nobre Bezerra de Souza, Souza, pelas instigantes questões, no Exame de Qualificação, como membro da Banca Examinadora, as quais não só recorri para reconfigurar este texto, mas as inscrevi como sub-texto, o não dito, o interdito, em minha mente. Muito obrigado sempre. Aos professores do Mestrado em Educação do CCSECCSE-UEPA, Albene, Josebel, Jesus, Graça, Pedro, Elizabeth, Emmanuel, Nilda, Socorro França, Josefa e Betänia – entre estes, uns se inscrevem na minha gratidão pelo contato direto, ocasionado pelo privilégio que tive de ser aluno; outros, por terem escritos (e ainda escreverem) textos que alargaram meu modo de ver e analisar as questões que envolvem educação. Aos sujeitos, homens homens e mulheres, desta pesquisa, cuja língua e solo os constituem e os enraízam neste espaço amazônico, a Microrregião Marabá. Ao Hidelfonso de Abreu Araújo, Prefeito do município de Abel Figueiredo, pela capacidade visionária e pelo incentivo ao empreendimento intelectual. À Profa. Kátia Virginia Américo Garcia, Secretária de Educação do município de Marabá, minha gratidão, por me apoiar em mais esta formação. 2828 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará LISTA DE MAPAS E TABELAS Mapa 1 Divisão Regional do Estado do Pará 57 Mapa 2 Mesorregiões Paraenses X Ocupação populacional 63 Mapa 3 Mesorregiões Paraenses 65 Mapa 4 Microrregião Marabá no Estado do Pará 77 Mapa 5 Município de Marabá 81 Mapa 6 Município de Palestina do Pará 94 Tabela 1 Campos Semânticos: questão respondida X não respondida 135 Tabela 2 Campo Semântico I: acidentes geográficos 137 Tabela 3 Todas as ocorrências, por Campo Semântico, com freqüência 149 igual ou superior a 75% no corpus Tabela 4 Ocorrências, por Campo Semântico, com freqüência igual ou 156 superior a 75% no corpus e coincidentes as propostas pelo QSL Tabela 5 Ocorrências não-coincidentes com o QSL, por Campo 159 Semântico, com freqüência igual ou superior a 75% no corpus Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2929 LISTA DE GRÁFICOS, FIGURAS E QUADROS Quadro 1 Sistema, normas e falas 4 Gráfico 1 Quadro 2 Língua escrita literária: o “ideal” Área, população e densidade demográfica do estado do Pará 2 5 Gráfico 2 Quadro 3 Língua-sociedade Estado do Pará: mesorregiões, microrregiões e municípios 3 6 Gráfico 3 Quadro 4 Erro & Prestígio social Dados populacionais e densidade demográfica de Marabá 3 8 Gráfico 4 Quadro 5 Nível de água/enchente Dados populacionais e densidade demográfica de Palestina do Pará 8 9 Gráfico 5 Quadro 6 Perfil desejável dos sujeitos Perfil da população-amostra 11 11 Gráfico 6 Quadro 7 Lexias coincidentes X não – coincidentes Campos Semânticos do Questionário Semântico-Lexical – QSL (ALiB, 2001) 16 11 Gráfico 7 Quadro 8 O desempenho dos alunos em língua portuguesa Educação: o Brasil no cenário internacional 18 18 Figura 1 Quadro 9 Níveis de estrutura da língua portuguesa O desempenho dos alunos no SAEB/MEC 2 18 Figura 2 Quadro 10 Variável: faixa etária Aula de língua portuguesa 4 18 Figura 3 Variável: sexo 4 Figura 4 Variável: espaço geográfico 4 Figura 5 Estigma X Prestígio 4 Figura 6 Baldeação de Castanha-do-pará na Itaboca durante o verão de 1926 6 Figura 7 Trabalhadores da Serra Pelada 6 Figura 8 Tribo Indígena Suruí-Sororó 6 Figura 9 Peões libertados pela PM: do desemprego no Maranhão ao trabalho forçado no Sul do Pará 7 Figura 10 A rota do tiro ao alvo 7 Figura 11 Os números da CPT 7 Figura 12 Vista aérea de Marabá – confluência dos rios Itacaiúnas e Tocantins 8 Figura 13 Batelões usados como abrigo – Marabá Pioneira 8 Figura 14 Burgo agrícola 8 Figura 15 Enchente de 1926 8 Figura 16 Enchente de 1980 – Praça Duque de Caxias 8 Figura 17 Travessa Parsondas de Carvalho – Marabá Pioneira 8 Figura 18 Avenida Silvino Santis – Nova Marabá 9 Figura 19 Vista aérea de Palestina do Pará 9 Figura 20 Início da ocupação de Palestina do Pará 9 Figura 21 Cachoeira de Santa Isabel do Araguaia 9 Figura 22 Terras alagadas em Palestina do Pará 9 Figura 23 Índios da Tribo Suruí-sororó 10 Figura 24 Coco babaçu 10 Figura 25 Praia Beira Rio-Palestina do Pará 11 Figura 26 Grupo de dança folclórica boi-bumbá 11 Figura 27 Vila Jarbas Passarinho – cheia de 2005 11 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 3030 LISTA DE CARTAS LEXICAIS 1 139 2 140 3 141 4 Carta Lexical Campo Semântico I: acidentes geográficos 142 5 143 6 144 7 145 1 Campo Semântico I – Acidentes Geográficos 169 2 Campo Semântico II – Fenômenos Atmosféricos 170 3 Campo Semântico III – Astros e Tempo 171 4 Campo Semântico IV – Flora 172 5 Campo Semântico V – Atividades Agropastoris 173 6 Campo Semântico VI – Fauna 174 7 Campo Semântico VII – Corpo Humano 175 8 Campo Semântico VIII – Convívio e Comportamento 176 Social 9 Campo Semântico IX – Ciclos da Vida 177 10 Campo Semântico X – Religiões e Crenças 178 11 Campo Semântico XI – Festa e Divertimentos 179 12 Campo Semântico XII – Habitação 180 13 Campo Semântico XIII – Alimentação e Cozinha 181 14 Campo Semântico XIV – Vestiário 182 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 3131 SUMÁRIO RESUMO 10 ABSTRACT 11 APROXIMAÇÕES INICIAIS 12 CAPÍTULO I – SOCIEDADES, HISTÓRIAS E LÍNGUAS 20 1.1 PORTUGUÊS BRASILEIRO: RAÍZES E TRAJETÓRIAS 21 1.2 DIALETOLOGIA E SOCIOLINGÜÍSTICA: AS LÍNGUAS E QUEM FALA 36 1.3 LÉXICOS, SIGNIFICADOS E NORMAS 46 CAPÍTULO II – GEOLINGÜÍSTICA: O MÉTODO CARTOGRÁFICO 53 2.1 TIPO DE ESTUDO 54 2.2 MESO-MICRORREGIÕES PARAENSES: REDE DE PONTOS LINGÜÍSTICOS 56 2.2.1 PONTO LINGÜÍSTICO 1: MARABÁ 79 2.2.2 PONTO LINGÜÍSTICO 2: PALESTINA DO PARÁ 92 2.3 SUJEITOS 113 2.4 MATERIAL TÉCNICO, APLICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE PRODUÇÃO E TRANSCRIÇÃO GRAFEMÁTICA DOS DADOS E CONSTITUIÇÃO DO CORPUS 116 2.5 ELABORAÇÃO DE TABELAS E CARTAS LEXICAIS E ANÁLISE DO CORPUS 123 CAPÍTULO III – VARIAÇÃO E EDUCAÇÃO LINGÜÍSTICA 124 3.1 FACES SECRETAS DAS PALAVRAS 125 3.2 SIMBOLISMO CULTURAL DAS LEXIAS 146 3.3 VERNÁCULO E ENSINO 183 APROXIMAÇÕES FINAIS 195 REFERÊNCIAS 200 APÊNDICE 209 ANEXOS 240 A – Ficha da localidade B – Ficha do sujeito C – Questionário Semântico-Lexical (QSL: ALiB, 2001) Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 3232 RESUMO O trabalho, em questão, apresenta uma análise semântico-lexical dos dados resultantes da aplicação, in locu, dos instrumentos definidos para esta pesquisa. Esta investigação se justifica por cartografar um léxico nunca antes descrito, o da Microrregião pesquisada. Dessa perspectiva, partimos da hipótese que o acervo semântico-lexical falado por moradores da Microrregião Marabá/PA, é diferente comparado ao proposto pelo Questionário Semântico-Lexical, do Comitê encarregado de elaborar o Atlas Lingüístico do Brasil (QSL: ALiB, 2001). O objetivo geral é analisar as ocorrências semântico-lexicais, de natureza diatópica e diastrática, encontradas na fala de moradores desta Microrregião, situada no Sudeste Paraense, em comparação às referidas anteriormente. Após leituras prévias, reconhecemos um dos pontos lingüísticos a ser pesquisado, neste caso, o município de Marabá, onde realizamos um piloto, para avaliar a produtividade ou não dos instrumentos selecionados. Posteriormente, prosseguimos com a pesquisa para: identificar as lexias encontradas na fala de moradores, coletadas por meio do QSL, composto de 196, distribuídas em 14 campos semânticos, com base nas variáveis sociais: sexo, faixa etária e classe social, em 8 (oito) sujeitos com menor e maior nível de escolaridade; registrar, em tabelas, as lexias cuja freqüência foi igual ou superior a 75% e não coincidentes com a proposta pelo QSL, por campo semântico; documentar cartograficamente esse corpus e analisá-lo, de acordo com um recorte geográfico, e uma abordagem quali-quantitativa. O estudo, em questão, pauta-se na Geolingüística, método cartográfico utilizado em estudos de caráter Dialetológico. Insere-se, portanto, no domínio de três áreas da ciência da linguagem – a Lingüística – o que requer a leitura prévia de construtos teóricos da Dialetologia, da Sociolingüística e da Semântica-Lexical, e na correlação dessas, nesta pesquisa em especial, com práticas educacionais que se processam na região amazônica/dialeto paraense. Os dados demonstram um índice de lexias não coincidentes com as propostas pelo QSL, num total de 30 ocorrências, o que equivale, aproximadamente, a 40% do total, composto de 73 ocorrências, que resultaram da aplicação de 196 questões, a 8 sujeitos. O baixo percentual do número de lexias, de maior freqüência e não coincidentes pode conduzir, inicialmente, a inferirmos que não há, de fato, uma considerável diversidade semântico-lexical entre os falantes localizados geograficamente nos extremos do Brasil, ao considerarmos que o local da pesquisa está no Norte do País e o QSL foi elaborado no Estado do Paraná, Sul do Brasil. Este percentual, no entanto, indica o contrário, o que nos permite reavaliar a afirmação inicial, acerca da ausência de diversidade semântico-lexical entre os falares desta e daquela região. Significa dizer que esta baixa freqüência revela, talvez, a diversidade entre os falares dos próprios sujeitos moradores de uma mesma região, ou melhor, neste caso, de um mesmo município, onde predomina um fluxo migratório, no caso, Microrregião Marabá. Palavras-chave: diversidade cultural – saberes lingüísticos – variação semânticolexical – normas – educação. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 3333 ABSTRACT The present work presents a analyse data as a result of the application, in loco, of instruments. This investigation justifies itself for map-marking a lexion never before described in the microregion researched. In this perspective, there is a hypothesis that the multitude semantic lexicon spoken by people from the microregion Marabá in the state of Pará, formed by people from different regions of the country, which is different compared to the one proposed by the Questionary Semantic-Lexion, from the communities in charge of elaborating the linguistic Atlas of Brazil (QSL: ALiB, 2001). The overall objective is to analyse the ocurrencies semantic-lexicon of special and social variation nature, found on the speaking of people from this microregion, situated in the southeast of Pará, in comparison to the ones previously mentioned. After previous reading, me recognize one of the linguistic issues to be researched, in this a case, the district of Marabá where a archetype was mad to evaluate the productivity or not of the selected instruments. Posteriority, we continue the research to: identify the lexion found in the speaking of inhabitant, collected through QSL, composed by 196, distributed in fourteen semantic fields, based on the sex social variables, age cange and social status, in eight people with lower and higher school levels; register, in charts , the lexicon which the frequency was the same or superior to 75% and not the same with the QSL proposal, by semantic field; map-making documenting this corpus and analyse it according to geographical scissoring in a quality and quantity approach. This study has guide line in Geolinguistic, map-making method, used in Dialectologia feature studies. Womever, inserts itself in there language areas – linguistics – which requires previous readings theory, of social linguistic and semantic lexicon, and in the correlation of these, in this research in special, with educational practice that happen in the Amazon region/Pará’s dialect. The preliminary data show a low rate of lexicon not the same as the one proposed by the QSL, a total of 30 ocurrencies, which it is equivalent, approximatty to 40% of the total, composed by 73 ocurrencies which were the result of 196 questions in 8 people the percentage of the lexicon numbers, of higher frequency an hot the same can lead, initially, to deduct that there is not, in fact , a consirable diversity semantic lexicon among the speakers located geographically – in Brazil’s extremes, considering that Microregion Marabá is situated in the youth and that QSL was elaborated in Paraná’s state, south of Brazil. This percentage hoverer, indicates the opposite, which allows us to rev-evaluate initial statement, about the absence of the diversity semantic lexicon between the speakers of different regions. Perhaps, this low frequency reveals the diversity among the speakers of the own inhabitants of one’s region, or better, in this case, of the same district, where the migrate flow prevails, in this case, Microregion Marabá. Key-words: cultural plurality – linguistic diversity – norm semanti-lexicon – variation – education. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 35 Há dois anos, ao ingressar neste Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestrado, na Linha de Pesquisa Saberes Culturais e Educação na Amazônia, na área diversidade lingüística, do CCSE/UEPA, me propus a investigar aspectos relativos à descrição da realidade lingüística da Microrregião Marabá/PA, e assim o fiz, e estes estão registrados, academicamente, nesta Dissertação. Paralelamente a esta, se configurou em mim, e creio que nos demais, um subtexto, difícil de se deixar escrever, de querer se expor, posto que, demais subjetivo, talvez nem transpareça, mas que insiste em sussurrar em minha alma: “Não somos um/Que outrora éramos um, ou pensamos sermos eu, você, o outro,/três elementos distintos”. (Reynaldo Jardim. “Não Somos Um”). Particularmente, o que despertou meu interesse foi a possibilidade de estudar as ocorrências semântico-lexicais, do português brasileiro, encontradas na fala de moradores desta microrregião, sobretudo, pelo fato da migração, constante, evidenciar a variação dialetal, e, por conseguinte, o plurilingüismo, este nunca antes descrito, e assim contribuir para a superação do mito da “unidade” lingüística – ‘norma padrão’ – cristalizado no imaginário coletivo, e perpetuado pelo sistema escolar, cuja conseqüência mais desastrosa é a segregação, de toda ordem, a que são submetidos os sujeitos que não dominam tal ‘norma’. Para alcançar o amadurecimento acadêmico necessário a todo pesquisador, tanto em relação aos estudos realizados durante o cumprimento dos créditos das disciplinas, bem como aqueles relativos à pesquisa de campo, e à elaboração desta Dissertação, que ora submeto à defesa, não obstante ambos constituírem exigência institucional quanto aos requisitos necessários à conclusão do Mestrado –, tive o privilégio de contar com preciosas orientações da Profª. Dr. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da Silva e dos demais doutores, docentes deste Programa, ancorados na admirável responsabilidade intelectual e na rigorosidade das discussões, às quais se soma a convivência com os demais mestrandos desta que é a primeira turma, do primeiro Mestrado, do CCSE/UEPA. Além desses registros iniciais, que, naturalmente, revitalizaram minha memória, em especial a acadêmica e a docente, esta resultante da convivência diária com meus alunos, no exercício do magistério, nos níveis Fundamental e Médio e da não tão longa experiência adquirida como coordenador de ensino, e, por duas vezes, em municípios distintos, secretário municipal de educação, aguçaram, em mim, a percepção e o interesse em estudar o fenômeno da variação lingüística. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 36 Inquietação, esta, que resultou no Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Letras, intitulado “Variação Lingüística: um fenômeno que deve ser reconhecido pela escola”, que objetivou analisar as ocorrências fonético-fonológicas presentes nas produções escritas de alunos do Ensino Fundamental, de escolas da rede pública do município de Abel Figueiredo. De caráter similar ao que ora desenvolvo, este trabalho já evidenciava a necessidade de ampliar a compreensão de outros fatos lingüísticos. Posteriormente, na Pós-Graduação Lato Sensu, paralelamente à docência no Ensino Médio, a possibilidade de ampliar essa compreensão foi possível por meio da pesquisaação, que resultou na Monografia intitulada “Diálogo por Escrito: uma estratégia de avaliação textual”. Neste trabalho, prioritariamente, “dialogava” com os alunos, por escrito, sobre aspectos “comprometedores” do desvelamento do discurso, materializados nos textos escritos por estes produzidos, momento em que, para o restabelecimento da coesão e da coerência textuais, necessárias à progressão temática, sugeria a refação dessas produções, objeto dos “diálogos”. Cursar este Mestrado me possibilitou reunir duas áreas que me interessam estudar: língua e educação. E, assim, desfibrar, pelos sentidos das vozes, as instâncias históricoculturais, pelo registro, identificação, cartografação, análise e interpretação das ocorrências semântico-lexicais, presentes nesta Microrregião onde resido e atuo como docente. Talvez seja essa trajetória profissional que me impulsiona na busca de saberes lingüísticos que potencializem práticas desafiadoras com as quais alunos e professores (con)vivem, no diaa-dia, na sala de aula e fora dela nas mais diversas situações de interlocuções, em diferentes contextos sociais. Paris (apud CUNHA, 1984) sintetizou, muito bem, a relação das línguas com os contextos que as constituem, ao afirmar: “se não podemos impedir a flora de nossos campos de perecer em face da cultura que a substitui devemos, antes que ela desapareça totalmente, recolher com cuidados seus espécimes, descrevê-los e classificá-los piedosamente num grande herbário nacional”. Razões, portanto, de ordem lingüística, stricto sensu, social, histórica e de políticas de ensino de língua “materna” e as relacionadas ao entendimento de diferentes usos do português, nas diversas práticas educativas que se processam na região amazônica, de forma resumida, justificam o investimento nesta pesquisa. Assim, partimos da hipótese que o acervo semântico-lexical, usado por moradores nativos da Microrregião Marabá/PA, é diferente se comparado ao proposto pelo Questionário Semântico Lexical - QSL (ALiB, 2001). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 37 Para comprovação desta hipótese, se estabeleceu, como objetivo geral, analisar as ocorrências semântico-lexicais, de natureza diatópica e diatrástica, encontradas na fala de moradores desta Microrregião, situada na Mesorregião Sudeste Paraense, em comparação às referidas anteriormente. Para consecução deste objetivo, se procedeu a um estudo do cunho descritivo e abordagem quantiqualitativa, com aporte teórico-metodológico nos estudos advindos da Dialetologia, e da geolingüística, como método cartográfico largamente utilizado na produção de dados semântico-lexicais, na formulação e, principalmente, nas diversas possibilidades de respostas, as quais correspondem às ocorrências atribuídas aos falantes/ouvintes de uma dada comunidade lingüística. Da Sociolingüística, cujo enfoque agrega variáveis sociais, que dizem respeito a um falante-ouvinte real e não ideal, como explicitava Chomsky In: LYONS (1968). As ocorrências relacionadas a cada pergunta, item ou questão, se encontram visualizadas nas listas e cartas lexicais. Quanto à abordagem Semântica, a que referencia esta pesquisa tem por objeto o estudo do significado (sentido, significação) das lexias, ou seja, das formas lingüísticas presentes em um dado espaço geográfico. No entanto, o campo associativo e significativo dessas lexias é bem íntimo e próximo como se fosse um enorme campo semântico. Por essa e outras razões, o estudo do significado ficará sempre no liame essencial entre o eu e o mundo, pois abre espaço para o ser humano elaborar suas representações simbólicas da vida e do mundo. A primeira questão que se impõe no campo dos estudos semânticos diz respeito à necessidade de definir a que área do conhecimento o estudo do significado das palavras interessa vincular. Ao considerar os objetivos da formação acadêmica vivenciada neste mestrado em educação, como espaço investigativo, nos interessa, sobretudo, vincular o estudo da variação semântica a práticas educativas, em especial, a escolar. Portanto, se o significado é antes de tudo cultural, cultura e educação, entre outros, são temas que, mais de perto, também, aqui se evidenciam. Ainda como parte de delinear um aporte teórico-metodológico, desta vez sobre a região pesquisada, e a rede de pontos lingüísticos, nos valemos de fontes documentais locais, artigos em jornais, revistas, fotografias e outras, produzidas na própria Microrregião, ou seja, de por meio de entrevistas, preferencialmente, com moradores nativos nesta localidade, os mais antigos possivel. Esta Microrregião Marabá é o local desta pesquisa, e, nela, os municípios de Marabá e Palestina do Pará funcionaram como pontos lingüísticos. Nestes, um total de 8 (oito) Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 38 sujeitos (4 em cada ponto) foi selecionado como população-amostra, a partir das variáveis: grau de escolarização, faixa etária, sexo e classe social. Os instrumentos usados para a produção dos dados relativos à região e aos sujeitos foram os Anexos A e B e para a composição do corpus o Anexo C. Este, último, um Questionário de Base Semântico-Lexical – QSL (ALiB, 2001), composto de 196 (Cento e noventa e seis) questões, distribuídas em 14 (quatorze) campos semânticos, aplicado, por meio da técnica da entrevista gravada, à população-amostra. As ocorrências, dadas como respostas, após as transcrições grafemáticas, foram tabuladas, por campo semântico, questões e freqüência. Entre estas, as ocorrências semântico-lexicais, com freqüência igual ou superior a 75% e não coincidentes com aquelas propostas pelo QSL, registradas em cartas lexicais, por campo semântico, constituíram o corpus sob análise, que privilegiou o tipo descritivo e a abordagem quantiqualitativa, à luz dos princípios teóricos delineados no Capítulo I. A interpretação quantitativa, com base na freqüência das ocorrências encontradas, permitiu constituir a diferenciação e, ao mesmo tempo, definir a unidade do acervo lingüístico, de cunho semântico-lexical, na área geográfica em estudo. A interpretação qualitativa, à luz do aporte teórico já mencionado e da correlação deste com as práticas educativas, especificamente aquelas processadas na escola, possibilita conduzir ao estudo das estruturas do imaginário da comunidade da região pesquisada e à forma como esta articula, lingüisticamente, sua realidade, em consonância com sua cultura e sistema de vida. Conjugadas essas interpretações, a quantitativa e a qualitativa, uma investigação, desta natureza, constitui um recorte dos veios do português brasileiro, entre tantos outros. No entanto, segundo Bagno (2001), quando o objeto, sob estudo, diz respeito a aspectos semântico-lexicais o enfoque se torna bem mais abrangente, e assim nos permite desvelar áreas em que podemos nos diferenciar e nos identificar; as interfaces dos resultados com outros ramos do conhecimento; que somos diversificados no uso da língua, porque as palavras que a compõem invadem nossas vidas, formando redes, verdadeiros mosaicos de formas e significados e, estes, por sua vez, possibilitam redimensionar o universo; e que a totalidade é constituída de partes que se diferenciam e assemelham, ou seja, a singularidade lingüística é um dos elementos das nossas identidades e, portanto, de um multiculturalismo proporcional à dimensão continental deste país. Ignorar as diferenças lingüísticas, presentes em qualquer nível da estrutura da língua, seria o mesmo que ousar negar as diferenças culturais. Por outro lado, assumi-las, como legítimas, constituem uma ‘fotografia’ – variável, mesmo conscientes que estas vale 39 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará por um certo período de tempo – que pode servir, por um certo período de tempo, de material lingüístico, aos interessados nos estudos em linguagem e educação, cujo volume de dados produzidos, seja fonético–fonológico, morfossintático, semântico e pragmático, permite, nesse caso: aos lexicógrafos, aprimorarem os dicionários; aos gramáticos, atualizarem as informações com base na realidade documentada pela pesquisa empírica; aos autores de livros didáticos, adequarem a produção à realidade cultural de cada região, e aos professores, aprofundarem o conhecimento da realidade lingüística, refletindo sobre uma das variedades que constituem a língua ‘portuguesa’ falada na Microrregião Marabá, Sudeste Paraense e a relação dessas com aulas de língua ‘portuguesa’. Nessa perspectiva, esta Dissertação deseja ser uma contribuição, somada aos esforços de outros pesquisadores que nos motivaram, sugerindo um sonho imprescindível, para o momento atual de ampliação de nossos conhecimentos lingüísticos sobre o português brasileiro: a “descoberta” de nossas identidades, pela descrição da multiplicidade lingüística cultural brasileira. Confirmando, assim, o que afirmou Bachelard, em O direito de sonhar, “na ordem da filosofia [e, nós acrescentamos, da lingüística, também], não se persuade senão sugerindo sonhos fundamentais, senão restituindo aos pensamentos suas avenidas de sonhos”. Não sem dificuldade, optamos por estruturar esta Dissertação em itens que dessem contam de comportar, na medida do possivel, o processo investigatório da pesquisa que nos propusemos a realizar. Assim, o trabalho, em questão, além desta Introdução, intitulada APROXIMAÇÕES INICIAIS, que contém um breve panorama de cada um dos itens subseqüentes, comporta três (3) títulos, sob a forma de Capítulos, que, por sua vez, recobrem um conjunto de premissas, selecionadas entre outras, posto que, não únicas, como pertinentes à temática central que é o fenômeno da variação lingüística e da relação desta com a educação. Somam-se, a estes – à guisa de conclusão – Aproximações Conclusivas; Referências; Apêndice e Anexos. No Capítulo I, intitulado SOCIEDADES, HISTÓRIAS E LÍNGUAS, delineamos alguns aportes teóricos advindos da Dialetologia, Sociolingüística e Semântica-Lexical, áreas da ciência da linguagem – a lingüística – indispensáveis à compreensão, interpretação e análise dos dados produzidos, na medida em que é preciso referenciar a pesquisa em estudos já produzidos sobre o tema. A opção pela descrição do português falado no Brasil Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 40 reside no fato da ausência desta impedir o (re)conhecimento da realidade lingüística brasileira, o que traz sérias conseqüências ao ensino de língua ‘materna’. E, por não ser a única, esta opção não ignora, tampouco, outros aportes, e, sim, desejamos que fosse produtiva, capaz de fornecer explicações mais amplas e adequadas às ocorrências semântico-lexicais, objeto deste estudo, como bases científicas consistentes, derivadas de investigações que priorizam descrições criteriosas sobre a língua e a heterogeneidade desta e a análise de suas múltiplas variedades regionais, sociais, etárias etc., mas que não nos cegue para as demais. No Capítulo II, intitulado GEOLINGÜÍSTICA: O MÉTODO CARTOGRÁFICO, contextualizamos o local pesquisado, a Microrregião Marabá, e nesta os municípios de Marabá e Palestina do Pará, que funcionaram como pontos lingüísticos e nestes os sujeitos que constituíram a população-amostra, segundo os pressupostos da Geolingüística, método da Dialetologia, e modelo historicamente utilizado neste tipo de pesquisa. Assim, esses pressupostos incluem o tipo de estudo e a abordagem, necessários à compreensão, interpretação e análise do objeto de estudo; ambos agrupados às variáveis diatópica (geográfica) e diastrática (social): a primeira diz respeito à região pesquisada e, nela, os pontos lingüísticos e, a segunda, às características dos sujeitos, resultantes da conjugação de variáveis do tipo: faixa etária, gênero, grau de escolarização e classe social; bem como, informa sobre o material técnico; os instrumentos e a técnica de produção dos dados; a constituição do corpus e a perspectiva de análise, à luz dos referenciais constantes no Capítulo I deste trabalho. Sem, no entanto, deixar de atentar para a utilização, alcance, limite e possibilidade inerentes a todo método. No Capítulo III, intitulado VARIAÇÃO E EDUCAÇÃO LINGÜÍSTICA, identificamos, descrevemos, registramos, tabulamos e cartografamos, inicialmente, todas as ocorrências semântico-lexicais, resultantes da aplicação do instrumento de produção dos dados, encontradas na Microrregião Marabá, com o objetivo de testar a hipótese da qual partimos. Entre estas ocorrências, tabulamos aquelas cuja freqüência no corpus foi igual ou superior a 75%; destas, após comparação, selecionamos as não-coincidentes com as propostas pelo QSL (ALiB, 2001), as registramos em Cartas Lexicais, por Campo Semântico, ou seja, na dimensão diatópica; associada às variáveis gênero, grupos etários, grau de escolarização e classe social, ou seja, na dimensão diastrática e as analisamos no âmbito da heterogeneidade dialetal e nesta variação semântico-lexical e educação lingüística. Os resultados da análise dos dados revelam que, de um universo composto de 196 (Cento e noventa e seis) questões, aplicadas a oito (8) sujeitos, 73 (Setenta e três) Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 41 ocorrências (dadas como respostas), encontradas na Microrregião, obtiveram freqüência igual ou superior a 75% (corpus sob análise); 30 (Trinta) destas, não coincidiram com aquelas propostas pelo QSL, dentro deste universo estabelecido. E, deste mesmo universo, 43 (Quarenta e três) coincidiram. A interpretação desses dados permitiu constatar que a variação semântico-lexical não se revelou tanto pela baixa quantidade de lexias nãocoincidentes com as do QSL e sim pela alta quantidade de lexias cuja freqüência não alcançou 75% de freqüência no corpus. Neste Capítulo, registramos uma breve reflexão sobre alguns dos muitos mitos sobre o que é uma língua, o que é saber ‘português’ e, principalmente, o da língua única, em meio a diferentes culturas. Se a língua é um dos fatores de identificação cultural, como a escola pode ignorar a variação lingüística, evidenciada nela própria, por meio das falas dos alunos, dos professores, dos pais, etc...? E cujos sujeitos, desta pesquisa, só nos ajudaram a confirmar a hipótese da qual partimos – a de que há, sim, não uma, mas inúmeras variáveis semântico-lexicais, diferentes, se comparadas às propostas pelo QSL, na região estudada, e são tantas que co-ocorrem entre os próprios sujeitos das referidas localidades. Por fim, a estrutura deste trabalho comporta, REFERÊNCIAS, ANEXOS e APÊNDICE. ainda, APROXIMAÇÕES CONCLUSIVAS; Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 42 43 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 1.1 PORTUGUÊS BRASILEIRO: RAÍZES E TRAJETÓRIAS Quando o português ‘chegou’, debaixo de uma chuva fina, vestiu o índio. Se fosse uma manhã de sol, o índio teria vestido o português. (Oswald de Andrade. Erro de Português, Português 1922) Qualquer reflexão que se deseje empreender, no limiar do século XXI e do III milênio, sobre a língua falada no Brasil, não pode prescindir de dois aspectos, sabiamente, destacados por Bagno (2001), posto que, como rastros, insistem em permanecer em forma de ‘feridas’ incicatrizáveis, para testemunhar que: há muito nessa língua que é característica nossa, parte integrante da nossa identidade nacional, construída, a duras penas, com o extermínio de centenas de nações indígenas – só porque não era uma manhã de sol – como, metaforicamente, expressa o grande poeta na epígrafe deste Capítulo; com o monstruoso massacre físico e espiritual de milhões de negros africanos trazidos para cá como escravos, e com todas as lutas que o povo brasileiro enfrentou e continua a enfrentar para se constituir como nação; o nosso passado colonial não pode ser apagado, porque é história, e a história não é passado, é presente, premente e insistente. Somos um país nascido de um doloroso processo colonizador, com tudo o que isso representa. Ignorá-los, no mínimo, implica em esquecimentos sérios e perigosos, por tudo que significaram e significam na constituição do conjunto dos elementos que, atualmente, nos singuralizaram, e, ao mesmo tempo, nos diferenciam uns dos outros. É preciso não esquecê-los, porque a língua e a história de sua estrutura funcional não se podem separar da história dos falantes que a modificam, que a recriam, ao largo do tempo. Este fato explica ser a língua como é, não como alguns acham que deveria ser. Saber como uma língua é, se faz necessário descrevê-la. Este Capítulo I, intitulado Sociedades, Histórias e Línguas, é uma tentativa de (re)contextualização e (re)construção de alguns saberes sobre a língua, de aportes teóricos, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 44 para conhecer e analisar os usos semântico-lexicais, objeto desta pesquisa. Para tanto, estudos advindos da dialetologia e da geolingüística (como método da dialetologia), sociolingüística, semântica lexical, norma, cultura, educação, entre outros, são, aqui, mobilizados e evidenciados. Nas investigações referentes à língua, sem dúvida, entre as principais inovações introduzidas pela Lingüística, nas últimas três décadas, merecem destaque a inclusão da fala, como objeto de estudo, bem como a dos sujeitos. A primeira, pelo fato da ciência da linguagem, desde seus primórdios, haver eleito o sistema, a que denominou língua (langue), como seu objeto de estudo, por considerá-la homogênea. Ao fazer isso, deixou de fora a fala (parole) – realização individual da langue – por conseguinte, de caráter heterogêneo, portanto, segundo Saussure (2000)1, dependente de fatores referentes aos sujeitos, como, por exemplo, o estado psicológico destes. Dado este caráter, difícil de sistematizar seus estudos. Por isso, o fato de atribuir à língua falada a importância que sempre lhe fora negada, durante o longo império da gramática tradicional, e com ela os sujeitos que a usam, redesenhou, definitivamente, os limites e objetivos desta ciência, mesmo conscientes que este tipo de investigação é uma parte, um dos possíveis recortes, de um sistema lingüístico composto de outros níveis, também passíveis de análise. A importância da língua falada para o estudo científico da linguagem reside no fato de ser nesta modalidade lingüística que ocorrem as variações e as mudanças que incessantemente transformam a língua. Isso porque a principal característica das línguas é a heterogeneidade (BAGNO, 2002). Heterogeneidade, esta, exposta no quadro histórico-social, político-econômico e cultural do Brasil e, neste estudo específico, no da microrregião Marabá, somada à imprescindível descrição sistemática e geral da realidade lingüística brasileira, necessária, sobretudo, à difusão de um ensino adequado ao caráter pluricultural do país, estão a exigir, sem mais demora, um esforço coletivo na tentativa de concretizar estudos mais amplos que levem a um conhecimento global acerca dos fatos lingüísticos, ou seja, a diversidade das variações normativas. Estas, sim, passíveis de descrição, explicação, análise e aplicação (MARTIN, 2003). 1 A Lingüística ‘ganhou’ o status de ciência, entre 1913, morte de Ferdinand Saussure, ‘o mestre de Genebra’, e o lançamento da obra Curso de Lingüística Geral (1916), organizada por alunos deste genebriano, a partir das anotações dos Cursos de Lingüística ministrados por ele. Este livro tem o mérito de reunir as bases conceituais da Lingüística Moderna. Nele, Saussure define a lingua como um sistema de signos duplamente articulados e a fala como a realização individual deste sistema. E deixou claro que não estudaria a fala por esta ser heterogênea. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 45 Como maneira de ver a vida humana, inscreve-se, este estudo, no conjunto de pressupostos que vêem o sujeito como um ator/autor ligado a uma realidade que o constrói como membro de uma comunidade e ao mesmo tempo é construída pelo próprio. Os estudos sobre cultura desenvolvem este pensamento de forma bastante apropriada ao dizer que o homem é um animal suspenso em teias de significado que ele mesmo teceu, assim entendemos a cultura como sendo uma dessas teias, e, sua análise, portanto, como sendo não uma ciência experimental em busca de leis, mas uma ciência interpretativa em busca de significados. Podemos ampliar essa idéia ao constatarmos que os fenômenos sociais que integram essas teias, tais como cultura, língua(gem) e interação encontram-se imbricados e, atualmente, são vistos, por alguns estudiosos, como objetos de investigação de uma mesma pesquisa, favorecendo ao desenvolvimento de estudos multidisciplinares e interpretativas. É nesse sentido que Marcuschi (1999) apresenta o lugar da Análise de Interação Verbal (AIV). Segundo este autor, a AIV situa-se na interface de disciplinas como Sociologia, Antropologia, Etnografia, Lingüística, Psicologia Social, e aqui incluímos também a Lingüística Aplicada, e cuja maior dificuldade é a construção do acervo teórico, e não da natureza dos dados, visto que a AIV tem uma carga informacional de dados imensa e complexa, dados estes que se apresentam “multifacetados e cheios de nuances, de tal modo que, com poucos minutos de gravação, se tem material para muita análise” (p.3). A dificuldade de estudos e pesquisas em uma perspectiva de interface, referida por este autor, não é assim tão grande se reconhecermos que a natureza da questão está na escolha de um determinado posicionamento acadêmico mais subjetivo e sem modelos pré-concebidos de fatos para analisar certas questões concernentes à interlocução e à linguagem. Entre as décadas 20 e 30, do século XX, surge uma nova postura intelectual sobre significado e interação, entre outras correntes teóricas contemporâneas sobre a linguagem. A noção de símbolo, advinda deste novo paradigma, está ligada a sinais, línguas, gestos, ou qualquer outra marca que contenha a noção de significado, sendo o significado, portanto, construído socialmente. Esta visão efetuou uma ruptura com o que era postulado, na época, sobre comportamento humano, que ora era visto como resultado de processos Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 46 psicológicos internos e ora como produto de forças estruturais na sociedade. O homem é então definido como um sujeito criativo, construtor, que, continuamente, interage com o mundo, ajusta seus significados e influencia e é influenciado pelas estruturas sociais. Ao trazermos para este estudo uma paisagem em que o sujeito é o protagonista, é o construtor, assumimos, por conseguinte, que pesquisar é sempre um ato político, neste caso, uma reação há um processo de dominação lingüística, que ocorreu juntamente com a ocupação territorial e teve lances de grande genialidade, como o do padre José de Anchieta, o “apóstolo do Brasil”, que encontrou uma maneira bastante ‘sugestiva’ de levar os índios à adoção do Português. Nas peças religiosas que encenava, em suja missão, Anchieta fazia com que o português fosse a língua de expressão dos anjos e o tupinambá (ou tupi antigo) a dos demônios. Nessa perspectiva de investigação, significa reconhecer a verdadeira questão que se esconde sob o que seria, aparentemente, apenas uma questão lingüística. O anseio pela identidade lingüística brota, como seria de esperar, em meio a todas as outras manifestações românticas de independência cultural. José de Alencar cumpre, então, importante função, procurando resgatar a função do índio na construção do Português no Brasil, e povoa suas páginas com termos extraídos das línguas indígenas conhecidas e descritas. Sua visão era idealizada – como de resto, tudo o mais no Romantismo – mas estabelecia, de modo inequívoco, a necessidade de proclamarmos a independência do Português do Brasil. A luta pela nossa “liberdade lingüística”, porém, só seria iniciada cem anos mais tarde, em 1922, quando escritores modernistas, capitaneados por Mário de Andrade2, pregaram o abandono da sintaxe lusitana e a adoção do que, no dizer de Manuel Bandeira, era a “Língua errada do povo/Língua certa do povo. Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil”. Português, este, que Mário de Andrade evidencia assim: “[...] Que importa que uns falem mole descansado/Que os cariocas arranhem os erres na garganta/Que os capixabas e paroaras escancarem as vogais? [...] /juntos formamos este assombro de misérias e grandezas/Brasil, nome de vegetal!”. De 1922 aos dias atuais, temos caminhado a passos lentos, é bem verdade, no entanto, há que se registrar – e o fazemos ainda neste item – os poucos, mas preciosos estudos e pesquisas resultantes da dedicação dos nossos primeiros dialetólogos, empenhados em descrever esta língua falada no Brasil. 2 Movimento conhecido como a “Semana de Arte Moderna”. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 47 Pesquisar, em um país, como o nosso, em que ínfimo é o investimento das agencias financiadoras neste fazer, principalmente quando este diz respeito às áreas ditas ‘humanas’, exige, sobretudo, muito esforço e empenho quase exclusivamente pessoal dos pesquisadores destas áreas. Mesmo assim, este fazer ainda move muitos de nós a não desistir de refletir sobre novos fatos, ou a ensejar novas reflexões, outros ângulos, sobre os mesmos fatos. Para este estudo, por exemplo, reunimos, neste capítulo, algumas reflexões, de variado teor, sobre assuntos fronteiriços, que, nas suas respectivas áreas de interesse, ponderam temas e os põem em contato, direta ou indiretamente, com um vasto campo de conhecimento, objetivando (re)constituir um referencial teórico-metodológico, ao mesmo tempo, relevante e pertinente, na medida em que permitisse operar com a análise do objeto de estudo desta Dissertação – aspectos semântico-lexicais da fala dos moradores na/da Microrregião Marabá – para fazer jus à vinculação desta à Linha de pesquisa Saberes Culturais e Educação na Amazônia, de um Mestrado em Educação. Recorremos, inicialmente, ao pai da Lingüística Moderna, o mestre de Genebra, Saussure (2000), que assim definiu língua: Um tesouro depositado pela prática da fala em todos os indivíduos pertencentes à mesma comunidade, um sistema gramatical que existe virtualmente em cada cérebro ou, mais exatamente, nos cérebros de um conjunto de indivíduos, pois a língua não está completa em nenhum, e só na massa ela existe de modo completo (p.21). Este sistema de signos, objeto de estudo da lingüística, funciona na interlocução de uma coletividade, constituído de uma estrutura fônica, gramatical e lexical. Fala-se em “língua portuguesa”, francesa, inglesa, etc, porque cada uma delas apresenta uma estrutura definida e distinta das demais. A língua, entendida como sistema, estrutura, é uma abstração, posto que, como substância, concretizada nos atos de fala, há uma gama de variações, conseqüência direta da diversidade dos seus usuários. Bakhtin (1988) considera a “língua como uma atividade social, em que o importante não é o enunciado, o produto, mas sim a enunciação, o processo verbal. [...] A língua é (tal como para Saussure) um fato social, cuja existência se funda nas necessidades da comunicação. [...] (p.151-152). A língua de um povo talvez seja, dentre os vários aspectos culturais que o caracterizam, aquele que mais imediatamente lhe confere identidade. Defender a existência Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 48 de um português brasileiro significa defender um traço cultural que marca nossa independência da metrópole colonizadora. Nossa maturidade lingüística traduz-se, assim, em elemento constitutivo de um caráter nacional, que nos fortalece como povo único, independente e livre. Nessa perspectiva, a base conceitual desta pesquisa são os estudos referentes à Dialetologia, e a Geolingüística, esta como método daquela (1991): de Ferreira; Cardoso (1994), e, à Sociolingüística, de Labov (1983) e Tarallo (1986:1988), da Semântica-lexical, de Pottier (1978) e a Norma de Coseriu (1982) entre outros, que, há muito, já mostraram que nenhuma língua é homogênea, mas um conjunto de variedades usadas, diferentemente, de acordo com a época, o lugar, as características sociais do falante (faixa etária, grau de escolaridade, sexo, classe social, profissão) e a situação de comunicação. E, sobre cultura e educação, nos valemos de Brandão (2002), Candau (2005), Freire (2004) e Hall (2002), entre outros. E, para situar a região pesquisada e a rede de pontos lingüísticos nos valemos de Atzingen (2004), Firmino (1996), Marabá (2003), Moraes (1998), Monteiro (2002), entre outros. Segundo Bagno (2001), não é mais possível ignorar as diferenças entre o português falado em Portugal e o falado no Brasil. Este último, na verdade, deveria receber o nome de “português brasileiro”, o que já daria conta de mostrar essas diferenças entre Brasil e Portugal, sem entrar no mérito do português falado nos demais países lusófonos. No entanto, isso não basta, bem como não é a questão central, é necessário reconhecer lingüística e politicamente, de fato, essas diferenças. Reconhecer, lingüisticamente, a existência dessas diferenças inicia por pesquisar, por construir conhecimento sobre elas, pela descrição e interpretação referentes aos níveis fonético-fonológico, morfológico, sintático e semântico-lexical, que compõem a estrutura das línguas (Figura 1), a que denominamos Universais Lingüísticos – traços comuns, recorrentes, compartilhados por todas as línguas descritas que conhecemos – e contrastar o resultado destas com postulados, amplamente divulgados e perpetuados no imaginário coletivo, que incluem um conjunto de prescrições responsáveis por ‘atestar’, por atribuir, a um dado sistema lingüístico o status de língua, o mesmo que dizer ‘correta’. Figura 1 – Níveis de estrutura da língua portuguesa Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 49 Reconhecer, politicamente, implica dar continuidade a luta pela nossa independência lingüística, para que o peso da colonização sobre nossa sociedade não seja tão grande quanto ainda é hoje (BAGNO, 2001). É não querer ocupar um lugar que não é nosso: o lugar do colonizador, para quem os outros são os outros, e só. E para quem, sob o título de ‘exótica’, ‘primitiva’, ‘bárbara’, ‘selvagem’ etc, tais diferenças são consideradas deficiências, e, como tais, são largamente divulgadas, só tem servido para imprimir, nos brasileiros, uma baixa auto-estima lingüística, entre outras, uma das causas da expulsão dos alunos do sistema escolar. Sistema este responsável por legitimar e, portanto, perpetuar, aqueles postulados artificiais, advindos de um processo de colonização, cujo poema-epígrafe, deste capítulo, o exemplifica, e mais, que não correspondem a nenhuma variedade lingüística real usada pelos falantes brasileiros. Portanto, o desafio que o professor-pesquisador brasileiro, da área da linguagem, tem, a sua frente, no limiar do século XXI e do III milênio, é estudar o brasileiro, para que as escolas deixem de ensinar o português, o que significa deixar de perpetuar um conjunto de mitos, sem fundamento, entre estes, o de considerar diferenças lingüísticas “erros” e estes serem advindos da “incompetência” da maioria dos brasileiros em falar a “língua de Camões”. Aquela “boa”, “certa” e “bonita” língua falada pelos habitantes de um “paraíso lingüístico” chamado Portugal, do outro lado do Atlântico. A conseqüência mais desastrosa de um ensino pautado nesses pressupostos é o preconceito lingüístico, que, ao lado de outros, segrega milhões de brasileiros há séculos. A questão, como vemos, envolve a história da abordagem dos fatos da língua – abordagem, esta, historicamente (re)vestida pela ideologia de quem detém o poder – que incorreu em dois “equívocos”. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 50 O primeiro foi se dedicar exclusivamente à língua escrita, e, ao fazer isso, deixou de fora toda a língua falada; o segundo, a forma de conceber a mudança das línguas – que é simplesmente mudança e não “corrupção”, “ruína”, ou “decadência”, como acreditavam os gramáticos alexandrinos3 – e muitos ainda acreditam. Para Lyons (1968), esses dois equívocos se uniram para formar o “erro clássico” no estudo dos aspectos da língua, e ainda se perpetuam nos dias atuais. A língua não pode ser vista tão, simplistamente, como uma questão, apenas, de “certo” e “errado”, ou como um conjunto de palavras que pertencem à determinada classe e se juntam para formar frases, em volta de um sujeito e de um predicado. Um sistema lingüístico é mais que tudo isso. É parte de nós mesmos, de nossa identidade cultural, histórica, social. É na e pela língua que socializamos, interagimos, desenvolvemos nosso sentimento de pertencimento a um grupo, a uma comunidade. É ela que nos faz sentir pertencendo a um espaço, que confirma nossa declaração: eu sou daqui. Falar, escutar, ler e escrever reafirmam, cada vez mais, nossa condição de sujeito histórico, situado em um dado tempo e espaço. Além disso, a língua envolve valores, mobiliza crenças e institui e reforça poderes. A escola, ao oferecer aos alunos, como único modelo de língua “certa”, a ser imitado, os textos dos “clássicos” da literatura, perpetua esses poderes. Em vez disso, ela deve ser um espaço que proporcione a eles o contato com todos os gêneros textuais que circulam socialmente, nos quais se concretizem os usos reais da língua. Bagno (2001), ao analisar tais equívocos, os atribui, ainda, ao fato daqueles gramáticos acreditarem que a língua poderia ser dividida, conforme Gráfico 14, como, aliás, era dividida a sociedade da época. Gráfico 1 – Língua escrita literária: o “ideal” Língua escrita literária Língua escrita Língua falada 3 Segundo Bagno (2007), esses gramáticos foram os primeiros intelectuais que se dedicaram ao estabelecimento e fixação de regras gramaticais. Eram filólogos e viveram na cidade de Alexandria, no Egito, no século III a.C. 4 Cf. Bagno (2001). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 51 A divisão a que Bagno (2001) se refere correspondia ao objeto de interesse dos estudiosos daquela época – a língua escrita com finalidades literárias, que representava e ainda representa um ínfimo percentual em relação ao universo da língua escrita, que, por sua vez, também constituía e constitui apenas um espectro, dentro do universo total da língua. Consagrada, essa língua escrita literária começou a ser usada como um código de leis, para julgar todo e qualquer uso oral ou escrito de uma língua. Devia servir de base para a constituição de um “ideal” de língua escrita e falada. Domínio de uma minoria que pertencia à aristocracia – a classe que detinha o poder econômico e político e ditava as normas que consideravam “boas” e “certas”, em todos os aspectos da vida social – esse modelo de língua foi transformado em instrumento de poder e dominação de uma pequena parcela da sociedade sobre todos os demais membros desta. Este pequeno universo, do total da língua, saiu “colonizando” todo o resto, criando um império de idéias, noções e preconceitos sobre o que é e o que não é “língua”, que, infelizmente, perdura quase inalterado até os dias atuais, no senso comum, mais ou menos como representado no Gráfico 25. Gráfico 2 – Língua-sociedade 5 Cf. Bagno (2001). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 52 Gramática tradicional Língua escrita Língua falada A concepção de língua, expressa no Gráfico 2, pautou-se na tentativa de descrever o que atualmente denominamos língua ‘portuguesa’. Usando as definições e os conceitos aplicados, na Antiguidade clássica, ao grego e ao latim, os gramáticos tentaram “vestir”, esta e outras línguas, com as mesmas “roupas” do latim e do grego, em vez de tentarem analisálas, e, com base nestas, descrever o que as caracterizava, suas peculiaridades. Com base nesses pressupostos, ou seja, acreditam esses gramáticos que, do mesmo modo como o português havia saído do latim, o português brasileiro saiu do português europeu. No entanto, as pesquisas revelam que tanto o português europeu quanto o brasileiro, em suas formas atuais, representam duas derivas diferentes. O português falado em Portugal, atualmente, parte do português falado em Portugal até 1.500. O português falado no Brasil, atualmente, parte do português falado em Portugal até 1.500, mais o galego (do encontro destes na Península Ibérica), mais as línguas indígenas, as africanas e as dos imigrantes. Em ambos os casos, nenhum deles permaneceu “inalterado” esse tempo todo. Mas visões ‘equivocadas’ dos fatos históricos, e perpetuadas em torno dos fatos lingüísticos, nos fazem crer, ainda atualmente, que em Portugal o português permaneceu “puro” e, nós, os colonizados, é que “corrompemos” e “arruinamos” uma língua que não é “nossa”, mas apenas “emprestada”. Essa atitude, “compreensível” para a época, ainda prevalece, pois a escala da gravidade desses “erros” é inversamente proporcional à escala do prestígio social, ou seja, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 53 quanto mais pobre mais “erros” os ricos irão encontrar na língua do sujeito, conforme Gráfico 36. Assim, nasce a noção de “erro” de português. Gráfico 3 – Erro & Prestígio social erro PRESTÍGIO ERRO prestígio As noções cristalizadas de “certo” e “errado” não podem ser aceitas, simplesmente, por duas razões. A primeira, diz respeito à língua como sistema, cujos estudos de base científica atestam que nenhum falante “erra” sua própria língua, a não ser um afásico. A segunda, por razões históricas, baseadas em convenções sociais, ou seja, que determinam o que representa ou não o falar mais aceito socialmente. Portanto, não existem usos lingüisticamente ‘melhores’ ou mais ‘certos’ que outros; existem, sim, aqueles, que adquiriram status, prestígio, mais que outros, por razões sociais, determinadas econômica e politicamente pela comunidade que os “adota”. Dessa forma, não é por acaso que o falar considerado ‘errado’ seja exatamente o do colonizado, o do dominado e ou o da classe que não tem prestígio social, nem poder econômico e político. O que causa espanto não é o fato da língua sempre ser companheira do poder, em uma sociedade dividida em classes, e, sim, ainda, haver gramático, tentando analisar a língua (no singular mesmo, pois este ‘estudioso’ ignora as demais, em torno de 200 línguas) usada, no Brasil, com aquele mesmo aparato teórico-descritivo, que se baseia nos postulados aristocráticos da gramática “tradicional”, mesmo com todos os estudos e pesquisas empreendidos nos últimos anos pela lingüística moderna. É preciso, portanto, ir além, avançar nas pesquisas, produzir conhecimento novo, mais sintonizado com o pensamento científico contemporâneo, e cuja descrição, sistemática e geral da realidade lingüística brasileira (imprescindível, sobretudo, à difusão de um ensino 6 Cf. Bagno (2001). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 54 adequado ao caráter multicultural do país) está a exigir, sem mais demora, um esforço coletivo na tentativa de concretizar estudos mais amplos que levem a um conhecimento global acerca dos fatos lingüísticos, ou seja, a diversidade das variações normativas. Estas, sim, para Martin (2003), passíveis de descrição, explicação, análise e aplicação, em situações reais de comunicação. Essas reflexões, baseadas nas investigações lingüísticas mais recentes, conduzem, cada vez mais, pesquisadores à indagação sobre o que observar e descrever em meio a essa diversidade, com quais procedimentos e finalidades. À observação e a descrição, pode-se afirmar, refere-se a fatos lingüísticos, ou seja, às ocorrências/produções lingüísticas, assim, significa descrever o que a realidade lhes impõe. Mas o que é um fato lingüístico? É a norma mais “correta”, “rebuscada”? Não! Esta é a perspectiva dos gramáticos, como mencionado, anteriormente, posto que, historicamente, a gramática é, antes de qualquer coisa, uma disciplina normativa. À lingüística, ciência da linguagem humana, faz ver, em vez disso, que fato lingüístico é a pluralidade das normas, resultante dos usos diversos que os falantes fazem de um dado sistema lingüístico, nas mais diferentes práticas interlocutivas das quais participam cotidianamente. É essa descrição que oferece a possibilidade de se chegar a delinear, com certa precisão e objetividade, aspectos da heterogeneidade do falar brasileiro, seja no nível fonético-fonológico, morfossintático, semântico-lexical e textual discursivo, cuja ausência induz muitas pessoas (inclusive alguns “estudiosos” da língua “portuguesa”) a acreditarem numa homogeneidade lingüística inexistente na Amazônia, ou em qualquer outro lugar do mundo (FERREIRA et al 1994). Por conseguinte, todas as línguas mudam no tempo e no espaço e variam. Ou seja, a heterogeneidade lingüística está vinculada à social, sendo mais visível num país, cuja extensão territorial é proporcional às desigualdades sociais, como é o caso do Brasil. Tempo, espaço e variação remetem a diferentes sistemas culturais, desde os mais remotos aos atuais, e ao processo de denominar pessoas, objetos, acontecimentos, etc, usado pelo homem. Verifica-se, então, que o sentido desses denominativos é o ponto de partida para as investigações, que, se antes, se definiam apenas como lingüística, atualmente se inscrevem, também, no campo da geografia, da antropologia, da sociologia, da psicologia e da educação, especialmente nas sociedades de cultura letrada, para compreender a própria mentalidade do denominador, não só como elemento isolado, mas como projeção de seu grupo social. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 55 Do ponto de vista histórico, o conhecimento da realidade lingüística do país, das variadas áreas geográficas a serem identificadas e das diferenças que opõem determinadas regiões a outras, pode revelar aportes que ampliem, entre outros estudos, a natureza do peso da colonização do Brasil, construída, a duras penas, com o extermínio de centenas de nações indígenas e o massacre de milhões de negros africanos, a constituição do português falado no Brasil7. Nesse sentido, o estudo em questão visa contribuir com a descrição e interpretação das ocorrências de caráter semântico-lexicais, do dialeto8 falado na Microrregião Marabá/Pará. E, assim, reunir dados, que, somados aos já existentes – resultantes de pesquisas, similares, realizadas e outras em realização – revelem, de maneira mais ampla e geral, as características da língua falada no Brasil. Posto que, a ausência de descrição é uma das razões da crença no mito da homogeneidade lingüística. Por isso, a necessidade de elaboração do Atlas Lingüístico do Brasil, que Nascentes (1961) já antevia, como, também, sabia que só seria possível se iniciada com monografias, dissertações, teses e outros estudos, de caráter regional, até se chegar aquele, de caráter nacional. Para a constituição dos Atlas, sem desconhecer a importância de outras áreas dos estudos lingüísticos e minimizar a função de cada uma delas, na atualidade, urge que se enfrente a descrição do funcionamento da língua falada no Brasil, no plano geográfico, cujo procedimento mais adequado, para se pesquisar nesta amplitude continental, parece ser o que propõe a Dialetologia – estudo relativo às questões diatópicas9 - cujo método – o Geolingüístico – cartografa. Método, este, usado, pela primeira vez, por Jules Gilliéron, na pesquisa que resultou no Atlas Lingüístico da França (BRANDÃO, 1991), primeiro trabalho, nesta área, reconhecidamente elaborado com bases científicas. Dialetologia associada à Sociolingüística – estudo da variação e da mudança na língua em uso – em especial a fala, em meio a fatores diatrásticos10, nesse universo de pesquisa, conformam os aportes teórico-metodológicos necessários à elaboração dos Atlas 7 Segundo Bagno (2001), dar voz à língua falada, neste país chamado Brasil, 92 vezes maior que Portugal, habitado por uma população quase 17 vezes mais numerosa, é atribuir a importância que lhe foi expropriada desde o processo colonizatório e vigora até os dias atuais, nesse império em que a Gramática Tradicional reina sozinha. 8 Termo usado há séculos, desde a Grécia antiga, para designar o modo característico de uso da língua, por uma dada comunidade, num determinado tempo e espaço geográfico. 9 São aquelas verificadas na comparação entre os modos de falar de lugares diferentes, como as grandes regiões, os estados, as zonas rural e urbana, as áreas socialmente demarcadas nas grandes cidades etc. 10 São aqueles verificados na comparação entre os modos de falar de diferentes classes sociais, de grupos etários, de grau de escolarização, de gênero, entre outros. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 56 lingüísticos, que sempre se constituíram em meta ou aspiração principal dos dialetólogos. Assim, já se manifestava Alvar (1958:85 In FERREIRA; CARDOSO, 1994): O grande interesse do Atlas está na grande massa de materiais que oferece agrupados; mas, ainda, penso, que, sobretudo nas múltiplas surpresas que oferece. A busca, sobre o terreno, dá generosamente frutos para todos os lados. A descoberta de novos motivos de investigação e o levantamento incessante de problemas são dados que depõem em seu favor. As descobertas feitas por um Atlas são como brechas na muralha: através das fendas será possível penetrar no ignorado. E será necessário voltar sobre a brecha para ampliá-la e encontrar o fruto perseguido. Ao reconhecer a urgência e a necessidade de vir o Brasil a ter seu Atlas lingüístico, Silva Neto (1957), ao definir as atividades da Dialetologia no Brasil, inclui, entre estas, a elaboração de Atlas regionais, que considera, com outros estudos, pré-requisito, condição essencial para a elaboração do Atlas Nacional. Não parece haver necessidade de argumentar em favor da realização de Atlas Regionais, pois as razões são claras e óbvias para aqueles que a lançaram: a vasta extensão do país e a dificuldade de locomoção, mais fácil de ser resolvida, no interior de cada micro e mesorregião. A ele (isto é, ao Atlas Nacional), havemos de chegar, mas há que se partir do começo, se o quisermos realizar com segurança. Assim, os passos fundamentais para o início desta grande obra nacional, devem envolver ações preliminares, como sondagens experimentais, aplicação de questionários, bem como estudos de natureza sócio-econômico-histórica sobre a região pesquisada, para, finalmente, se chegar aos Atlas Regionais, que conduzirão ao Atlas Nacional. Uma leitura panorâmica dos estudos dialetológicos, no Brasil, não prescinde das proposições e o empenho de Amaral; Nascentes; Silva Neto e Rossi; por considerar, os trabalhos, destes, referências para estudos de falares locais e/ou regionais. A Amaral (1920) deve-se um dos primeiros estudos com esse caráter, no Brasil, cuja obra O Dialeto Caipira é referência obrigatória, pois inaugura o estudo de língua no Brasil, ao registrar vocábulos em uso entre ‘roceiros’ ou ‘caipiras’, cuja linguagem, em vários aspectos, difere bastante da ‘gente’ da cidade, segundo o próprio autor. Nascentes (1939), ao elaborar um Esboço Histórico da Filologia Portuguesa no Brasil, apresenta, na íntegra, um projeto, segundo o qual, os livros didáticos relativos ao ensino da língua pátria só seriam adotados nas escolas primárias e secundárias do Distrito Federal quando denominassem de brasileira a língua falada e escrita no Brasil. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 57 Em 1961, o pai da Dialetologia no Brasil, como é conhecido Nascentes, lança a segunda parte do Projeto Bases para a Elaboração do Atlas Lingüístico do Brasil, como o complemento de um Questionário Geral (publicado pela Casa Rui Barbosa), dividido em duas partes: a primeira, composta de questões e a segunda destinada a especificar o Questionário Geral, ou seja, expressões ou nomes não muito comuns, com possíveis significados. Estes, em grande parte, relativos a determinados fenômenos da suposta pronúncia do português brasileiro, que, por si só, justificariam a importância da elaboração de um Atlas lingüístico, quer regional, quer nacional. Silva Neto, na obra Manual de Filologia Portuguesa: história, problemas e métodos (1957), discute a noção de dialeto e adentra pela Geografia Lingüística, ao comentar alguns Atlas Lingüísticos já publicados, e, ainda, confirma, como conseqüência desses estudos, a produção do ‘verdadeiro’ dicionário da Língua Portuguesa. Em A Língua Portuguesa no Brasil: problemas (1960), exemplifica, com pronúncias denominadas regionais, falares urbanos e rurais para caracterizar a diferença, sem, no entanto, perder de vista a unidade, que considera essencial no domínio lingüístico português. Em Introdução ao Estudo da Língua Portuguesa no Brasil (1963), distingue dois ramos nos estudos brasileiros – a história externa, de cunho etnográfico-social e a interna, propriamente a dialetologia, de cunho filológico-lingüístico. O resumo relativo ao ramo externo, o referido autor se apóia na história, formação e crescimento da sociedade brasileira, para situar a língua no que ele considera ‘verdadeiro’ lugar: expressão de uma dada sociedade, portanto, inseparável da história da civilização. Rossi (1965), com a publicação do Atlas Prévio dos Falares Baiano – APFB, se torna o primeiro autor de Atlas Lingüístico no Brasil. Nesta obra, as cartas fonéticas apresentam a Bahia, as áreas lingüísticas do Brasil e os limites do falar baiano. Dois anos depois desta publicação, o mesmo autor escreve um artigo sobre a origem, os antecedentes e o Questionário do APFB, em especial o questionário-piloto, que serviu de base para elaboração deste Atlas, bem como comenta os critérios de seleção das localidades e o processo de elaboração e tipo de cartas. 1.2 DIALETOLOGIA E SOCIOLINGUISTICA: AS LÍNGUAS E QUEM FALA O arcabouço teórico-metodológico, até, aqui, referido, é o aporte desta investigação que pretende submergir num dado cenário, para, dele, emergirem dados da língua, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 58 passíveis de observação e descrição, especificamente, neste estudo, ocorrências semântico-lexicais encontradas na fala dos moradores da Microrregião Marabá/PA. O cenário, a que nos referimos, denominado rede de pontos lingüísticos, requer a conjugação de fatores sócio-históricos e demográficos, do passado e do presente, para, reunidos, possibilitar a explicação sobre o funcionamento de uma língua, que, por força de Lei, denominamos ‘portuguesa’, e, assim, espelhar os usos que dela fazem os falantes deste/neste cenário. Algumas categorias, como língua, história, sociedade, identidade, dialeto, cultura, educação, entre outras, emergem, conjuntamente, se amalgamam, nos desafiando. Nessa trilha semântico-lexical, todos somos Teseu e precisamos de uma Ariadne11, a bela princesa da mitologia grega. Nesse labirinto, que Hall (2006) destaca como efeito do processo de globalização, o enfraquecimento do estado-nação e, conseqüentemente, a desestruturação das identidades nacionais, como ponto de análise: [...] um tipo diferente de mudança estrutural está transformando as sociedades modernas no final do século XX. Isso está fragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, que, no passado, nos tinham fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais [...] (p. 9). O mesmo autor aponta para outras transformações, como o aumento da resistência à globalização das identidades nacionais, locais e particulares, que permanecem ainda fortes, sendo colocadas acima das identidades “globais”, e, mais ainda, que as identidades nacionais estão em declínio, mas novas identidades estão tomando seu lugar no front de tensão entre o “global” e o “local”. No entanto, como afirmara Marroquim (1945), numa espécie de desabafo: “[...] Nós, no Brasil, presos à gramática ”portuguesa”, somos vítimas de uma desintegração dolorosa de nós mesmos [...]. Regras de gramática rígidas e áridas baseadas em fatos lingüísticos isolados do “homem” são camisas de força asfixiantes [...]” (p.124-5). Diversidade que não anula a unidade, apenas lhe dá a verdadeira dimensão, ou seja, aquela é inerente a todo e qualquer sistema lingüístico. Afirmar isso, no entanto, não basta, é necessário constatar. Falantes de uma mesma língua, mas de regiões distintas, têm características lingüísticas diversificadas e se pertencerem a uma mesma região também não falam da mesma maneira, considerando os estratos sociais. Chega-se assim à noção 11 A bela princesa da mitologia grega – que ajuda o herói, Teseu, a se guiar pelo labirinto e matar o Minotauro, com um novelo que ela desenrolava, para adentrarem e o enrolava para saírem da emaranhada construção. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 59 de dialeto ou variação, recorte que delineia semelhanças e contrastes lingüísticos socioculturais. Portanto, língua nada mais é que um conjunto de dialetos, estes, por sua vez, constituem as múltiplas possibilidades de realização concreta daquela, pelos falantes de qualquer sistema lingüístico. Ao contrário do que circula, historicamente, dialeto não é uma língua menor, inferior, falada por pessoas analfabetas e/ou moradores das zonas rurais. Para outros, nem língua é. Na verdade, o critério definidor da diferença, que se cristalizou, entre língua e dialeto foi o status social e não lingüístico. Dito de outra forma, o dialeto considerado de maior prestígio social ganha o status de língua em oposição aos de menor, então, denominados dialetos. Tal diferença entre língua e dialeto, confirma Coseriu (1982), é de status social historicamente construído. Um dialeto, sem deixar de ser intrinsecamente uma língua, se considera subordinado a outra língua, de ordem superior. Para ele, o termo dialeto, enquanto oposto à língua, designa uma língua menor incluída em uma língua maior, que é, justamente, uma língua histórica (ou idioma). Uma língua histórica não é um modo de falar único, mas uma família histórica de modos de falar afins e interdependentes. Os dialetos são membros desta família ou constituem uma dessas famílias. Portanto, se pode denominar dialeto, tanto a variedade falada em uma região do país, quanto às usadas por cada um dos segmentos que constituem a população que ali vive, desde que se determinem as normas que as caracterizam. O mesmo acontece na relação que estabelecemos entre falantes que moram na capital e os que moram no interior, ou seja, quem mora naquela fala uma língua, e quem mora, neste, fala um dialeto. Da mesma forma que se crer que falantes escolarizados falam uma língua, já os não escolarizados falam um dialeto. Ou seja, em qualquer dos exemplos, o critério usado sempre é o status social, o grau de prestígio social das pessoas que usam este ou aquele dialeto. O status social é sempre o do dominador, por essa razão fomos levados a crer, nesses 5 (cinco) séculos, que o português falado em Portugal é Língua, os demais, falados nos 8 (oito) países colonizados por este, são dialetos. E mais, outro equívoco é crer que o dialeto que ganhou o status de língua não possui variação, é homogêneo. Os estudos empreendidos pela ciência da linguagem, cada vez mais, reafirmam que língua é um conjunto de dialetos e a variação é inerente a todo e qualquer dialeto, portanto, mesmo aquele de “maior” prestígio apresenta variações. 60 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Da mesma forma, os estudos dedicados à análise do discurso revelam que conceitos não nascem do nada e sim de um determinado conjunto de fatores, circunscritos a uma dada época e espaço. Nesse prisma, de Saussure (2000) a Bakhtin (1988), o conceito de língua implica o de sujeito, deixado de fora, pelo primeiro, no entanto, essencial ao segundo, dentro dos estudos lingüísticos. A atitude do primeiro foi o ‘preço’ pago pela lingüística para se “encaixar” nos paradigmas, de base estruturalistas, vigentes à época, para um determinado saber ser considerado ‘científico’. O sujeito, que não cabia nos moldes científicos estruturalistas, emerge nos estudos empreendidos por Bakhtin, quase à mesma época, mas em espaços políticos diferenciados. É nessa concepção de Bakhitin que compreendemos deva estar circunscrito o conceito de língua, o que implica (co)relacioná-lo ao de sociedade, ou seja, reconhecer, segundo Oliveira (1975)12, que, se os homens fazem a língua e não a língua os homens, é necessário, portanto, contextualizá-los em um dado tempo e espaço. Nesta pesquisa, o território é o amazônico, cujo mosaico lingüístico resulta do confronto das mais de 1.000 (mil) línguas indígenas, faladas pelos colonizados, com a língua dita portuguesa, a do colonizador, interpostas pelas africanas, às custas da escravidão, e pela dos imigrantes13. A Dialetologia, ao estudar os dialetos, adentra na complexidade dos diversos contextos sócio-históricos de interação lingüística. Neste caso, em solo brasileiro, pesquisará o que resultou desse processo colonizador, o português brasileiro, heterogeneidade de suas variantes regionais e sociais, também as normas socialmente consentidas, além daquela idealizada por filólogos e gramáticos, coercitivamente veiculadas pelas instituições, sobretudo, escolares. Por que se afirma que falamos a língua portuguesa? Ao se fazer tal afirmação, na verdade, está se tratando de uma língua que se tornou majoritária e oficial neste país multilingüe e 14 escamoteado multidialetal pela dominação. É esse multilingüismo/dialetalismo, de todas as formas possíveis, que queremos tornar evidente, ou seja, a realidade lingüística multifacetada. Retratar a heterogeneidade sincrônica do português brasileiro é, vendo-se o presente, reconstituir o passado e presumir o futuro. É constatar que nada na língua é por acaso. 12 Fernão de Oliveira foi um dos primeiros lingüistas a explicitar uma reflexão sobre língua e sociedade. Pesquisas recentes, de geneticistas brasileiros, provaram que a esmagadora maioria das linhagens paternas da população branca do país veio da Europa, no entanto, 60% das linhagens maternas são ameríndias ou o africanas. Cf. Revista Ciência Hoje, vol. 27, n 159, de abril de 2000, p. 16, “Retrato molecular do brasileiro”. 14 A última Constituição Brasileira (1988) demonstra um razoável avanço político e lingüístico ao registrar que doravante o Português passaria a ser rotulado de língua oficial (língua da administração pública, do governo e que deve ser aprendida nas escolas) e não de língua nacional, materna dos habitantes, que falam muitas línguas locais diferentes. 13 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 61 Um passado em que índios brasileiros e suas línguas foram obrigados a iniciar um percurso etnocida e glotocida conhecido, primeiro pelos colonizadores portugueses e prosseguido pelas chamadas ‘frentes pioneiras’, que atualmente alcançam os limites últimos da Amazônia brasileira. Nesses quinhentos anos de destruição ininterrupta, sobrevivem cerca de 180 línguas indígenas e cerca de 220.000 índios – seriam o dobro as línguas do século XVI ou, muito mais, cerca de 1.500, o que impede de dizer (mas é o que se teima em afirmar!) que o Brasil é um país monolingüe. O processo colonizador e evangelizador dos séculos XVI e XVII utilizou, como instrumento fundamental para a dominação, línguas indígenas brasileiras. Embora homogeneizadora da atividade catequética – construiu um “tupi jesuítico” -, a língua geral da costa, de base tupi, chegou a ser um risco para a hegemonia do português no Brasil, juntamente com outras línguas gerais indígenas que foram veículos de intercomunicação entre brancos, índios e negros, não só no litoral brasileiro, mas nas entradas paulistas; pelo nordeste teria sido uma língua geral cariri e, na Amazônia, a língua geral, de base tupinambá, é o antepassado do nheengatu, que persiste, atualmente, em área de complexo multilingüismo no rio Negro. O que denominamos língua brasileira é o fruto vivo da morte de outras línguas. Exemplo dessa situação é a da área multilingüe do Tocantins, Sudeste do Pará, onde convivem índios do tronco lingüístico jê (gaviões e xikrin) e seis grupos do tronco lingüístico tupi, sobreviventes do contato com a sociedade dominante. São constatações como essas que, de um lado, não nos permitem ignorar a perda progressiva das línguas indígenas e o avanço inexorável da língua portuguesa, a depender do tempo e do tipo de contato. E, por outro, nos permitem constatar que muito provavelmente cada grupo indígena em contato tem a sua própria história e vários fatores interagem para a perda ou a manutenção de suas línguas, o que acontece, atualmente, analogamente, deve ter ocorrido no passado. Informações históricas desse tipo são fundamentais para a reconstituição do passado lingüístico do Brasil – e fontes como essas precisam ser sistematicamente exploradas. Por exemplo, o censo de Anchieta para o Brasil, de 1583, indica a existência de 24.750 brancos, 14.100 negros, 18.500 índios (aldeados). Dentre as línguas faladas por essa quantidade de negros, o percentual de falantes bantu foi sempre superior, e quase sempre, maciçamente, em todo período do tráfico. Isso nos possibilita entender de forma bastante clara porque são precisamente os itens lexicais Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 62 de origem bantu os que se registram com mais anterioridade, com maior grau de integração morfológica e em maior número de campos semânticos no português do Brasil. A posição relativamente proeminente do grupo não bantu, nos últimos séculos, também implica o grande número de itens lexicais emprestados por essas línguas, embora não integrados e particularmente restritos aos campos semânticos ligados à atividade ritual. Portanto, não se pode negar que a história das línguas passa necessariamente pela história demográfica de seus falantes. Como bem afirma Silva (2004, p. 23): [...] Passados quase 5 séculos, está ainda por ser reconstruído, o detalhamento possível, o processo de encontro politicamente assimétrico 15 entre a língua ‘portuguesa ’, língua de dominação, com muitas línguas autóctones (nativas) e as diversas línguas aqui chegadas, primeiro as africanas, depois as línguas de migrantes, que tornaram esta área americana, multilingüe de origem, ainda mais complexa lingüisticamente.[...]. Como essas situações de contato se estabeleceram em sucessivas e diversificadas circunstâncias, ao longo dos 500 anos de história do ‘português’ no Brasil, ainda há muito a ser desvelado, mas é importante afirmar explicitamente: que o português não foi e não é a única língua falada no Brasil. O construto teórico relativo aos estudos dialetológicos no Brasil e à forma como tem se delineado o marco metodológico destes, dentro dos estudos lingüísticos, imprimem marcas para caminhos e perspectivas nesta área da linguagem, associado aos princípios da sociolingüística, em busca da diversidade “ignorada”. Da perspectiva sociolingüística, Labov (1983) e Tarallo (1986), nos estudos empreendidos sobre variação lingüística, há muito mostraram que uma língua não é única e homogênea, mas um conjunto de variedades, usadas, diferentemente, de acordo com a época, o lugar, as características sociais do falante e a situação de comunicação. Os estudos dedicados à Semântica Lexical de Pottier (1978), objeto da lexicologia, nos remete à significação das palavras, a partir da distribuição do léxico por campo semântico, isto é, associações para certo número de semantemas, como os termos para partes do corpo humano, para os fenômenos atmosféricos etc. e, por famílias lexicais, isto é, conjunto de palavras que têm em comum seu semantema, cuja função lexical se multiplica pelos processos de derivação e composição. Temos, portanto, de um lado, um conjunto de variáveis lingüísticas, todas as que a análise permite descobrir, e de outro um conjunto de variáveis sociais, todas as que uma teoria sociológica permite isolar. No meio social, essas variantes coexistem em seu campo 15 Português aqui entendido como língua oficial, imposta pelo dominador. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 63 natural de batalha. É o uso mais ou menos provável de uma ou de outra que iremos analisar. A variável lingüística, no nível semântico-lexical, objeto desta pesquisa, são formas diferentes que permitem dizer a mesma coisa, ou seja, quando dois ou mais significantes têm o mesmo significado (conceito), e quando as diferenças que eles representam têm função outra, estilística ou social. Dizer, por exemplo, conjutivite/sapatãu e dordói, evidentemente, manifestam variáveis semânticas, resta saber a que função correspondem essas diferentes formas. Isso nos remete à noção de signo lingüístico – na perspectiva saussureana – ou seja, uma relação entre um significante e um significado e não entre uma palavra e uma coisa. Podese considerar que essas diferentes palavras se dividem, em seu uso, em uma escala de faixas etárias, em ambos os pontos lingüísticos, conforme Figura 216. Figura 2 – Variável: faixa etária Pode-se, também, imaginar, que elas se dividam, segundo o grau de escolaridade, posto que, entre os sujeitos desta pesquisa, os jovens já concluíram o Ensino Médio e os adultos possuem baixa escolaridade, em ambos os pontos lingüísticos. Já a Figura 317 exemplifica uma variação determinada pelo sexo, e encontrada no ponto lingüístico Marabá. Figura 3 – Variável: sexo 16 Cf. Apêndice 1, desta Dissertação, que contém todos os dados resultantes da pesquisa de campo que compõe este trabalho. 17 Idem. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 64 Ainda se pode imaginar que elas se dividam segundo o espaço geográfico, conforme Figura 418, em que 100% dos sujeitos da Microrregião Marabá deram como resposta gogó, diferente do tema proposto pelo ALiB que é pomo de adão. Figura 4 – Variável: espaço geográfico Teríamos, assim, um uso forçado, e o fato de utilizar um ou outro termo indicaria que o falante se encontra nessa ou naquela categoria social (jovem, mulher, classe enriquecida etc.). No entanto, o ato de nomear aponta para uma discussão decisiva nos estudos da linguagem e que reformularemos nos seguintes termos: devemos tomar a segmentação do mundo em classes como qualquer coisa de ordem do “já dado” ou “do construído?” Em outras palavras, seria a estruturação do mundo em categorias algo previamente constituído nas próprias coisas, dependeria ela das diferentes maneiras de olhar para o mundo? 18 Idem. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 65 Se aderirmos à primeira hipótese, levantaremos uma teoria escorada no referente externo à linguagem, ou seja, nas “próprias coisas”, supondo, portanto, que o homem tem acesso direto a elas, independentemente de quaisquer filtros interpostos pela sua inserção sócio-histórica ou cultural. De acordo com essa visão, línguas naturais seriam como que nomenclaturas apensas às coisas de um mundo preliminarmente discretizado, recortado. A segunda dessas hipóteses nos leva, ao contrário, a uma teoria da linguagem que privilegia os diferentes modos de ver, de olhar, as coisas, concedendo prioridade ao ponto de vista, não ao objeto. Isso implica, por exemplo, reconhecer que dois falantes, pertencentes a comunidades distintas, ou a uma mesma comunidade, não vêem nunca exatamente o mesmo mundo e nem do mesmo jeito. Sendo a Semântica o estudo sistemático do significado constitui uma interrogação permanente dos estudos sobre a linguagem desde seus primórdios. Ou seja, em vez das relações linguagem-coisas, prefere examinar o que se passa entre o fazer persuasivo de um locutor e o fazer interpretativo de um interlocutor; já não se trata da relação linguagem-coisa ou linguagem-mundo, e sim das relações entre o que se diz, o como se diz, e o porquê se diz ou, em termos mais modernos, entre significantes e significados. Tanto significante como significado fazem parte da linguagem humana: são as duas faces do signo lingüístico. Uma das características deste signo, freqüentemente evocadas pela lingüística, é o fato das diversas línguas naturais estabelecerem, cada qual, para uso próprio, diferentes estruturações do “mundo” por elas concebido. Por isso, nessa perspectiva, tanto o pólo da “palavra” quanto o do “conceito” são variáveis segundo a inserção sócio-histórica das lexias que estejam em pauta. Três dimensões estão nesse cenário: uma dimensão diatópica (correlata aos lugares), uma dimensão diastrática (correlata aos grupos sociais)) e uma dimensão histórica (correlata à sincronia/diacronia). Uma descrição que conjuga estas três dimensões consiste precisamente em pesquisar o tipo de correlação entre variantes lingüísticas e sociais, efetuando sistematicamente triagens cruzadas e interpretando os cruzamentos significativos. Por exemplo, é possível que, em um dado meio social, um falante utilize latrina, enquanto os que o cercam utilizam reservado ou toalete, com o único propósito de chocar, de infringir a norma daquele espaço, de se rebelar etc. Por um lado, a utilização dessa ou daquela forma é inconsciente, involuntária, mas ela nos indica algo sobre a posição social Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 66 do falante, e, por outro, ela é consciente, voluntária e nos diz algo sobre o comportamento do falante, que utiliza a língua para agir. Portanto, há três fatores que condicionam a diversidade lingüística: a) a identidade social do falante; b) a identidade social do destinatário e c) o contexto, situando-a, assim, no marco de uma análise lingüística que toma emprestadas noções-chave da teoria da comunicação. Do exposto, neste capítulo, não se pode ignorar que concepções e conceitos sobre língua, norma “culta”, fala, e “erro” de português e tantos outros construtos, não são questões exclusivamente lingüísticas. São produtos socioculturais, vinculados à esfera política, transformados em instrumento de poder, de coerção e de submissão, marcados, historicamente, pela exclusão e repressão de uma maioria por uma minoria detentora do poder econômico. Infelizmente, temos que dizer: Uma língua vale quanto vale seus falantes! Mesmo assim, é preciso nos “agarrar”, nos inspirar, na sabedoria de Freire (2006), expressa na beleza dessas palavras: [...] Sem um mínino de esperança, não podemos sequer começar o embate, mas, sem o embate, a esperança, como necessidade ontológica, se desarvora, se desendereça e se torna desesperança que, às vezes, se alonga em trágico desespero. Daí a precisão de uma certa educação da esperança. É que ela tem uma tal importância em nossa existência, individual e social, que não devemos experimentá-la de forma errada, deixando que ela resvale para a desesperança e o desespero [...] (p. 11). Imbuídos dessa esperança utópica, que não significa impossibilidade, ‘mergulhamos’ no estudo deste universo de palavras, que forma, configura, caracteriza, identifica e singulariza uma dada comunidade, cujo léxico recobre um conjunto de significados normatizados, construídos e ou consentidos culturalmente. 1.3 LÉXICOS, SIGNIFICADOS E NORMAS Este cenário a que denominamos de comunidade lingüística, segundo Labov (1983), é um grupo de pessoas que compartilham um conjunto de normas comuns com respeito à linguagem, e não como um grupo de pessoas que falam do mesmo modo. Nessa perspectiva, norma é definida como sistema de realizações sociais e culturais avaliadas positivamente por uma comunidade. É dessa concepção que nos valemos para ratificar que todos os dialetos (sem exceção) têm uma norma. Cujo léxico veicula o significado de acordo Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 67 com um conjunto de regras que garantem a unidade do dialeto, limitando a variação e a evolução lingüística na comunidade. É em busca dessas normas comuns que se debruça este estudo para a constituição da norma pedagógica do português, que, segundo Castilho (1998), deve ser uma das metas das pesquisas que se preocupam com a inter-relação entre diversidade lingüística e ensino, em outras palavras, com as possíveis aplicações dos saberes das ciências nelas envolvidas, cujo interesse não deve estar centrado somente no poder explicativo de cada uma. No entanto, quando uma língua se institucionaliza, por meio da criação de instrumentos normativos como a gramática normativa e a ortografia, tende a escolher um dos seus dialetos como norma padrão. É importante sublinhar que a ‘escolha’, para não afirmar imposição, de uma dada norma como padrão se pauta por aspectos econômicos e políticos, geralmente, relacionados com a localização das capitais políticas, culturais ou econômica dos países. A língua portuguesa usou, como norma padrão, a partir do século XX, os dialetos falados entre Coimbra e Lisboa, com especial relevo para esse último. No Brasil, por exemplo, a norma padrão evoluiu do dialeto de Lisboa para o Rio de Janeiro e, deste, para São Paulo, capitais políticas, econômicas e culturais. A seleção dos critérios econômicos e políticos que interferem na língua estão muito distantes dos critérios científicos. Há países, em que autênticas línguas são consideradas apenas dialetos da língua oficial, quando, na realidade, não o são de todo. Não é preciso ir muito longe; até o século XX, a língua galega foi considera um dialeto da língua castelhana. Na realidade, a lingüística provou, ao longo do século XX, que o galego é uma variante dialetal do português. De um ponto de vista legal, o galego é considerada uma língua autônoma. De um ponto de vista científico, ela é estudada nas universidades como dialeto do português. Nessa perspectiva, uma é a língua que a escola pretende transmitir a seus alunos, que se funda em uma tradição histórica idealizada e que continua nas gramáticas pedagógicas; a outra19, é o português das falas correntes, do vernáculo, na definição laboviana, que cada vez mais chega à escola, não só na fala do aluno pelo maior acesso, embora insuficiente, como sabemos, dos segmentos empobrecidos, às instituições escolares, mas também na dos professores que, atualmente, na sua maioria, por razões históricas conhecidas, são provenientes desses mesmos segmentos da sociedade. 19 O poema Aula de Português, de Carlos Drummod de Andrade, revela bem esta situação ao afirmar: “(...) O português são dois. O outro... mistério”. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 68 Esta tradição gramatical normativo-prescritiva institucionalizada via sistema escolar nasceu da percepção da unidade do grego, apesar de sua diversidade, e se desenvolveu em um esforço pedagógico para fixar a língua em um certo “estado de pureza”, para permitir o estudo dos escritores clássicos gregos e, estes, por sua vez, servissem de modelo a ser seguido. Define-se, desse modo, uma vertente na tradição das línguas que se tornou hegemônica por mais de 20 séculos: a da tradição gramatical, como suporte da crítica textual, que se concentra no estudo da língua escrita, conforme uma variante privilegiada socialmente, e que, nas sociedades letradas, como a brasileira, coincide com a dos escritores legitimados segundo os cânones literários, também construídos historicamente, ignorando-se, portanto, as variantes faladas, que constituem a realidade, menos ou mais hegemônica, de qualquer língua histórica, que, no entanto, precisa ser descrita. Alguns desses equívocos, transpostos para outros setores da sociedade, fora do mundo acadêmico e, portanto, sem fundamento científico, têm gerado distorções ainda mais graves, transformando-se em rematadas inverdades, repetidas diariamente nos grandes meios de comunicação, com danosas repercussões no ambiente escolar. Alguns desses equívocos, sem fundamento, por exemplo, é considerar que: um dialeto é uma língua menor. Um dialeto não é língua, é uma variante de uma língua. Por outro lado, qualquer língua, por menos prestígio que tenha, não deixa de ser língua e não passa a ser dialeto só por isso. Línguas como o Tétum (de Timor) ou o Potiguara (do Brasil) não é dialeto do português, mas línguas tão dignas como qualquer outra e que, sendo minoritárias, merecem ser protegidas e estudadas. o português de Coimbra é a língua portuguesa e em Marabá, no Pará, fala-se um dialeto ou corruptela. O dialeto falado em Coimbra é tão correto como o dialeto paraense e vice-versa, são apenas maneiras diferentes de realizar a mesma língua. Não há nenhum critério científico que valide a superioridade de uma variante em relação à outra. o crioulo cabo-verdiano é um dialeto do português. O crioulo cabo-verdiano é uma língua e não um dialeto. Tem base lexical na língua portuguesa, mas é diferente e tem seus próprios dialetos. O mesmo se aplica a qualquer crioulo. um dialeto é um linguajar sem regras. Não existe nenhum dialeto sem a sua norma. Qualquer dialeto tem as suas regras gramaticais, fonológicas, morfológicas, sintáticas, semânticas e lexicais. Qualquer Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 69 falante de um dialeto conhece todas as suas regras intuitivamente. A questão é que, ao longo desses séculos, a escola nada mais foi que um instrumento de reprodução da sociedade na qual está inserida, e, portanto, detentora do privilégio de legitimar um padrão normativizador, segundo a variante socialmente prestigiada, o que significa uma poderosa peça dessa engrenagem ideológica, conforme Quadro 1. Quadro 1 – Sistema, normas e falas 1. SISTEMA (línguas) 2. NORMAS(culturais/sociais) 3. FALAS2.(dialetos) Voltamos ao início deste capítulo, para reafirmar a necessidade de descrição das línguas, como uma das funções prioritárias dos pesquisadores desta geração, ou seja, para desvendar nossa realidade lingüística, e, assim, dispormos de dados que nos permitam reajustar as normas pedagógicas no que for necessário. Esse desvendar, como já afirmamos anteriormente, vem sendo feito, vigorosamente, nas três últimas décadas, primeiro pelos dialetólogos, depois pelos sociolingüistas, mesmo que ainda sejam poucos os estudos nesta área. Quanto ao reajuste da norma pedagógica, este deve ser efetivado nas práticas de sala de aula, no cotidiano de muitos, não de todos os professores, sobretudo, daqueles com uma boa formação lingüística, mas os instrumentos pedagógicos “reajustados” ainda estão por vir. Assim, aos poucos, iremos nos desvencilhando do legado que a Gramática Tradicional nos imputou, como modelo de língua “exemplar", produto intelectual de uma sociedade aristocrática, machista, escravagista, oligárquica e hierarquizada, um uso, com base na escrita literária, característico de um grupo restrito de falantes: 20 do sexo masculino; cidadãos (eleitores e elegíveis) livres (não-escravos); 20 Cf. BARROS, João. Gramática da Língua Portuguesa (1940), que registra a expressão "barões doutos", para relacionar, claramente, a língua "certa" como a da aristocracia social e intelectual. E mais, uma vez que "barões" é forma antiga de "varões" – homens – excluía, portanto, do "bem falar", todas as mulheres. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 70 membros da elite cultural (letrados) e da aristocracia política; detentores da riqueza econômica. Ao "eleger" o uso de um grupo restrito, muito mais que uma análise de língua ou mesmo que a prescrição de formas "corretas" de uso da língua, sempre será uma tentativa de selecionar para excluir, não de selecionar umas formas lingüísticas para excluir outras, mas sim de selecionar determinados cidadãos e excluir a maioria, esta, lançada no submundo do falar "errado", do "não saber pensar direito" e, conseqüentemente, do nãopoder falar, o que muitas vezes é o mesmo que não-poder-ser, conforme bem expressa a Figura 521, ou seja, quanto mais prestígio mais poder e, entre ambos, a “boa” e “velha” língua de Camões. + ESTIGMA -renda -escolaridade +renda +escolaridade + PRESTIGIO Figura 5 – Estigma X Prestígio O combate a esses postulados, sintetizados na Figura 5, requer assumirmos a correlação entre o uso lingüístico e estratificação social. Isto é, as gramáticas das comunidades de fala – dando voz à língua falada – regidas por fatores internos (lingüísticos) e por fatores externos (sociais), status socioeconômico, grau de escolarização, faixa etária e sexo. Isso significa reconhecê-las como legítimas. Os postulados sociolingüísticos, portanto, nos ajudam a compreender a relação entre língua e sociedade, a partir do princípio da diversidade lingüística, pois se inscreve na corrente das orientações teóricas contextuais sobre o fenômeno da variação, que consideram as comunidades lingüísticas não somente sob o ângulo das regras de linguagem, mas também sob o ângulo das relações de poder que se manifestam na e pela linguagem. Os estudos empreendidos nessa área, até então, atestam que nenhuma língua é usada de modo homogêneo por todos os seus falantes. Cada pessoa traz em si uma série de características que traduzem, no seu modo de se expressar: a região onde nasceu (variação diatópica) e o meio social (variação diatrástica). 21 Cf. Bagno (2001). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 71 Enfim, o uso de uma língua varia de época para época, de região para região, de classe social para classe social, e assim por diante. Nem individualmente, podemos afirmar que o uso seja uniforme. Dependendo da situação, uma mesma pessoa pode usar diferentes variedades de uma só forma da língua. Ao trabalhar com o conceito de variação lingüística, assumimos que esta se dá em função do sujeitos do discurso e da variedade cultural na qual estes estão inseridos. No entanto, na prática, esquecemos que uma língua, além de uma gramática, tem também um léxico, quer dizer, um conjunto relativamente extenso de palavras, à disposição dos falantes, as quais constituem as unidades de base com que construímos o sentido de nossos enunciados. Dessa forma, ganha sentido afirmar que o léxico é mais que uma lista de palavras à disposição dos falantes. É mais que um repertório de unidades. É um depositário dos recortes com que cada comunidade vê o mundo, as coisas que a cercam, o sentido de tudo. Por isso é que o léxico expressa, magistralmente, a função da língua como elemento que confere às pessoas identidade: como indivíduo e como membro pertencente a um grupo. Fernandes radicalizou esse poder de significação do léxico, ao afirmar: ”O que os olhos não vêem, a língua inventa” (Millör, 1994, p. 285). No âmbito da interação verbal, o léxico recobre diferentes funções. Como unidade de sentido, as palavras constituem as peças com que se vai tecendo a rede de significados. São elas que vão materializando, mediando as intenções do nosso dizer, associadas, inseridas em outras variáveis. Embora outras variáveis possam e/ou devam ser consideradas para uma compreensão mais ampla da variação lingüística, de toda ordem, as aqui selecionadas (área geográfica, renda, faixa etária, sexo e grau de escolarização), assim o foram, por se mostrarem, em estudos similares, as mais relevantes para a compreensão do fenômeno em estudo. Isso porque entre os universais lingüísticos – elementos que caracterizam as línguas do mundo inteiro – as semelhanças que as identificam, como línguas, é que todas elas possuem diferenças quanto ao uso em relação à região, ao grupo social, à faixa etária, ao nível de escolaridade e ao sexo. Entre estas, todavia, chama a atenção o nível de escolaridade do falante, que, no Brasil, está intimamente relacionado a status social. Por isso, neste tipo de pesquisa, é imperiosa a opção, dentre os outros fatores selecionados, por sujeitos analfabetos e/ou de baixa escolarização (no máximo até a quarta série do Ensino Fundamental) X concluintes do 72 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Ensino Médio. Tal opção fortalece o vínculo deste trabalho com a linha de pesquisa Saberes Culturais e Educação na Amazônia: diversidade lingüística, de um Mestrado em Educação, e se justifica, na medida em que pode contribuir com a construção de saberes lingüísticos tão necessários a um ensino de línguas, melhor entendido pelos planejadores e professores, se considerado de uma perspectiva da heterogeneidade dialetal. Necessário, portanto, um giro lingüístico, isso implica descrições que revelem, entre outros, aspectos semântico-lexicais da fala (objeto deste estudo) de sujeitos da região pesquisada, até então nunca antes descritos, que servem bem de exemplo do que se denomina norma oral – a da grande maioria da população brasileira – e constitui excelente amostragem (dados) frente aos ‘padrões’ impostos que chegam atualmente às escolas, via livro didático ou não, e que têm suscitado tanta polêmica, por vezes, por falta de compreensão da dinâmica e sistematicidade inerente a todo sistema lingüístico, e outras por concepções equivocadas sobre o que significa de fato saber uma língua. Mas ambas responsáveis pela segregação de uma maioria de alunos, cujo desempenho escolar é marcado pelo recorrente ‘fracasso’, quando o que é apenas diferença a escola se encarrega de transformar e de perpetuar em deficiência. Para finalizar este capítulo, reafirmamos a relevância e influência tanto da Dialetologia quanto da Sociolingüística nas pesquisas sobre língua falada e, em especial, sobre o fenômeno da variação lingüística, em diferentes comunidades de fala. Evidenciadas, atualmente, nos estudos lingüísticos, empreendidos, principalmente, nas últimas décadas, cuja elaboração de Atlas regionais, estudos geolingüíticos e monografias dialetais no Brasil, exemplificam bem. Estas publicações se constituem em pesquisas de cunho descritivo do fazer e do saber lingüístico em numerosas localidades brasileiras. No Capítulo II, que segue, apresentamos uma das possibilidades de abordagem, de descrição do componente semântico-lexical. Para tanto, situamos o método Geolingüístico, de tradição histórica e intelectual, nos estudos dialetológicos –– com base na variável diatópica – geográfica e cultural – caracterizadora da rede de pontos lingüísticos selecionada, nesta investigação, a Microrregião Marabá e na variável diatrástica – social – singuladora do perfil da população-amostra desta pesquisa, como status econômico, grau de escolarização, sexo e faixa etária. A Geolingüística visa a explicitar a dimensão do conhecimento lingüístico, dentro de um determinado contexto, por isso se revela significativa, na medida em que contribui para o registro da memória de comunidades lingüísticas brasileiras. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 73 Nela, evidenciamos o Questionário Semântico-Lexical – QSL (ALiB, 2001), instrumento largamente utilizado na produção de dados, como os relativos a esta investigação, entre estes, identificação, registro tabulação e cartografação das ocorrências de natureza semântica. Ocorrências, estas, relacionadas a cada pergunta, item ou questão, que se encontram visualizadas nas tabelas e cartas, analisadas no Capítulo III deste trabalho. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 74 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 75 .1 TIPO DE ESTUDO [...] é inegável que a gramática [normativa] sempre esteve sintonizada com a língua da classe mais ‘culta’ e mais abastada (não existe, historicamente, uma ‘gramática’). da língua dos pobres. (Rodolfo Ilari e Renato Basso, 2006) Afirmamos no Capítulo I, desta Dissertação, que ele se destinava à (re)constituição de alguns construtos teóricos, necessários, como aportes, à análise do objeto de estudo desta pesquisa. Basicamente, esta investigação se insere mais especificamente na Dialetologia, que, por sua vez, se firma como ciência que estuda os dialetos, devido à produtividade da Geolingüística, método cartográfico, amplo e reconhecidamente utilizado como instrumento de produção de dados de campo, desde a publicação do Atlas Lingüístico da França, elaborado por Jules Gilliéron, primeiro trabalho reconhecidamente científico na área dos estudos dialetais. Portanto, compor, nesta Dissertação, este Capítulo II, intitulado Geolingüística: o método cartográfico, representa a decisão de revelar um percurso metodológico, que, sabemos, ultrapassa o que é peculiar, ou próprio, à cartografia. Não ignoramos, assim, que qualquer divisão entre aporte teórico e metodológico é meramente textual, posto que, impossível operá-los separadamente, neste estudo, por exemplo, a Geolingüística, como método da Dialetologia, são inseparáveis. Inicialmente, o tipo de estudo – o geolingüístico e a abordagem – a qualiquantitativa. É o Capítulo relativo aos aspectos histórico-econômico-sociais relativos ao local desta pesquisa, a Microrregião Marabá e aos municípios que funcionaram como pontos lingüísticos: Marabá e Palestina do Pará. Neste, também, constam a caracterização dos sujeitos e do local das entrevistas; os materiais técnicos e instrumentos de produção dos dados. Bem como informações sobre a organização das Tabelas e das Cartas Lexicais, e, por fim, os procedimentos relativos à constituição e análise do corpus. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 76 Corpus, este, constituído de dados extraídos da fala dos sujeitos nativos da região , que é a verdadeira língua natural22. Ela é que é a língua viva, em constante ebulição, em constante transformação. A escrita é apenas uma tentativa ‘precária’ – porque não dá conta de expressar todas as realizações possíveis da língua – de representá-la, e por não compreender isso, muitas pessoas, entre elas alguns estudiosos da linguagem, ‘acreditam’ que falar é a mesma coisa que escrever, portanto devemos falar conforme a escrita, e mais a escrita segundo a norma padrão vigente para este. Isto porque, a língua escrita será sempre secundária, tem somente 10.000 anos, enquanto a espécie humana fala, pelo menos, há um milhão de anos. Além disso, a maioria das comunidades lingüísticas do mundo não possui um sistema escrito da língua que fala, e mais, muitas pessoas não têm conhecimento, domínio da escrita e, nem por isso, em ambos os casos, deixam de ter língua, de fazer uso de um dado sistema lingüístico. Escrita e fala nunca foram e nunca serão a mesma coisa, pois são sistemas diferentes, o primeiro é de base fonológica e o segundo ortográfica. E a ortografia de uma dada língua, como sabemos, resulta de um ‘acordo’, de base não científica, pautado no modelo dos escritos pelos ‘clássicos’ da literatura. Assim nasceu e se perpetuou a noção de “erro” de português. Considerar uma forma lingüística mais “certa” que a outra é a mesma coisa que achar que os homens são mais inteligentes que as mulheres, que os homossexuais são doentes e que os brancos merecem mandar nos negros. Essas noções equivocadas “nascem”, exatamente, do fato de se tomar como padrão de ‘língua’ “certa” a escrita, e a escrita literária. Paralelamente, ao operar com tais conceitos, a tradição gramatical, isolou a língua de tudo que estava em cima, embaixo, em volta, dentro e fora dela. Nunca se perguntou, por exemplo, “Quem pronunciou essa palavra, expressão, frase?” (BAGN0, 2007). Só esse Quem, para ser respondido, exige uma série de informações: nacionalidade do falante, origem geográfica, sexo, faixa etária, etnia, nível de escolarização e de renda econômica etc. Poderíamos perguntar, ainda, “A que coisas do mundo real e/ou imaginário se refere?”, “Quais as intenções do falante ao usar precisamente aquelas palavras, naquele arranjo e não em outro?”, Que efeitos ele quis produzir em seus interlocutores?”, entre outras tantas. O Quem (e algumas das questões que o envolvem) e “A que coisas do mundo 22 Língua natural seria aquela ‘apreendida’ ‘espontaneamente’ no seio de uma comunidade de fala. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 77 real e/ou imaginário se refere?” São questões, diríamos, mais específicas, sobre as quais este Capítulo II se debruça. Nele, expomos as trilhas que constituíram a elaboração desta Dissertação, que tomou por base a Geolingüística, como método cartográfico utilizado em estudos de caráter dialetológico, cujo reconhecimento científico, decisivamente, se deve a Jules Gilliéron, autor do Atlas Lingüístico da França (BRANDÃO, 1991). Em linhas gerais, o método geolingüístico reúne – somadas às leituras prévias que todo trabalho acadêmico requer – as seguintes etapas: estabelecimento de ponto(s) lingüístico(s); definição dos critérios e seleção dos sujeitos; elaboração e ou aplicação dos instrumentos de produção dos dados; transcrição e sistematização dos dados para constituição do corpus; elaboração de tabelas e registro em cartas especiais das formas lingüísticas, neste estudo, as de caráter semântico-lexical; análise quantiqualitativa das ocorrências, em comparação as propostas pelo QSL. Neste trabalho, para a produção dos dados, operamos com três (3) instrumentos: Ficha da Localidade (Anexo A), Ficha do Sujeito (Anexo B) e Questionário SemânticoLexical – QSL (Anexo C), validados pela aplicação destes, mediados pela técnica da entrevista gravada, realizada como piloto, em um dos pontos lingüísticos – Marabá, a título experimental. 2.2 MESO-MICRORREGIÕES PARAENSES: REDE DE PONTOS LINGÜÍSTICOS Para o estabelecimento e configuração da rede de pontos lingüísticos, desta pesquisa, se levou em conta o fato do espaço territorial brasileiro ser dividido em duas macro-unidades, e, estas, em micro unidades: a regional, constituída de municípios e estados, e a político-administrativa, composta de micro, meso e região, segundo fontes documentais, como os Censos, realizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, relativos aos períodos de 1991 e 2000, e narrativas orais de alguns moradores mais antigos da região pesquisada. O Mapa 1 registra aspectos da divisão regional do estado do Pará. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Mapa 1 – Divisão Regional do Estado do Pará 23 Fonte: [email protected]. 23 78 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 79 80 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará A origem do nome Pará vem do termo pa'ra – que significa rio-mar na língua indígena tupi-guarani. É como os índios denominavam o braço direito do rio Amazonas, engrossado com as águas do rio Tocantins. Esta característica o torna tão vasto que não se consegue enxergar a outra margem, o que o leva a parecer mais um mar do que um rio. Quando os portugueses ‘chegaram’ à terra deram o nome de Feliz Lusitânia, depois substituído pelo de Grão-Pará (grande rio), para, finalmente, se http://www.paraturismo.com.br/parateen/para_inicial.asp - tornar Pará. # Este, localizado no centro-leste da região Norte, é cortado pela linha do Equador em seu extremo oeste e, no sentido oeste-leste, pelo rio Amazonas, em cuja foz, no Oceano Atlântico, encontra-se o arquipélago do Marajó, e, neste, está, de mesmo nome, a maior ilha flúviomarítima do mundo. O estado possui extensas áreas de florestas, que podem ser de várzea (próximas aos rios e outros cursos de água) e de terra firme. Apresenta também regiões serranas, entre as quais se destacam: a cordilheira do Tumucumaque, no extremo norte do estado; a serra do Cachimbo, a sudoeste; e a serra dos Carajás, onde se localizam as maiores reservas de ferro do mundo, além de outros minérios, como ouro, cobre e níquel. Cerca de 50% do potencial turístico de toda a Amazônia brasileira está no Pará. Praias de rios com ondas, igarapés, sítios arqueológicos, mangues, ilhas selvagens, trilhas ecológicas, entre tantos outros atrativos naturais. O estado do Pará ocupa 16,66% do território brasileiro e 26% da Amazônia. A capital, Belém, é um dos 143 municípios paraenses. Segundo maior estado brasileiro em extensão territorial, cerca de 1.247.689,515 km², é maior que alguns países do mundo, se fosse independente economicamente seria o 18º no ranking mundial. Tem uma população estimada em 6.970.586, que resulta em uma densidade demográfica equivalente a 5,58 habitantes por km², conforme Quadro 2. Quadro 2 – Área, população e densidade demográfica do estado do Pará Capital Área (km²) Número de municípios População residente (Censo 2000) Belém 1.247.689,515 143 6.192,307 81 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará População residente (Censo 2005) 6.970.586 Densidade demográfica (Censo 2000) 5,58 Fonte: IBGE, Censo Demográfico de 2000, resultados do Universo. Em território paraense, desta população estimada, cerca de sessenta mil são índios, de várias tribos, como: Gaviões, Munduruku, Parakanã, Kaiapó, Tembé e Wai-Wai e SuruíSororó, entre outras, localizadas em grandes reservas, e mais de dez mil quilombolas ocupam cerca de 150 comunidades. Os aspectos culturais demarcam, sobretudo, a presença indígena, nas línguas, lendas, danças, gastronomias e artesanatos. Além dos índios, os portugueses e os negros - estes em menor proporção - também marcam essa formação. Nas regiões antropizadas, isto é, ocupadas pelo homem, estão o maior rebanho de búfalos do Brasil e o segundo maior rebanho de gado zebu. Além de produtor de carne e laticínios, o Pará se destaca no setor agrícola, principalmente na fruticultura (com destaque para o abacaxi, banana e coco, e as frutas regionais, como o açaí e o cupuaçu), e na produção de grãos (soja, arroz, milho e feijão). O estado abastece, também, com pescado, outras regiões do país. O maior volume de produção é oriundo da atividade extrativa. O Pará exporta ferro, níquel, cobre, caulim, ouro e pedras preciosas, no setor mineral, além de madeira e castanha-do-pará. Na época da colônia, a província do Grão-Pará era separada do Brasil, e abrangia toda a Amazônia portuguesa, incluindo o Maranhão. A ‘invasão’ efetiva desta província iniciou na primeira metade do século XVII, para a extração das "drogas do sertão" (corantes, couros, sementes oleaginosas e outros produtos), e durou mais de um século. Foi somente um ano e um mês depois da ‘Independência’ do Brasil que a, então, província foi incorporada ao território brasileiro, pelo ato de adesão, assinado em 15 de agosto de 1823, sob a mira dos canhões da frota imperial de D. Pedro I. Pouco depois, durante o período da Regência – o Grão-Pará era reduzido –, com a criação da província do Rio Negro, engloba o Oeste amazônico. A situação de isolamento, a que ficou relegada a província, a pobreza e a arbitrariedade dos governantes imperiais, provocaram uma longa e sangrenta revolta: a Cabanagem, que durou trinta anos e sacrificou um terço da população masculina do Estado. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 82 Em meados do século XIX, a demanda de látex extraído da seringueira fez com que Belém, o principal entreposto comercial da Amazônia, começasse a viver o período conhecido como o Ciclo da Borracha, cujo auge acontece nas duas primeiras décadas do século XX. Nesse período, ocorre a fundação da República brasileira e o antigo Grão-Pará toma a forma e os contornos que tem atualmente, com a criação do atual Estado do Amapá e a definição das divisas com o Maranhão e o Amazonas. Na República, o fluxo migratório que demanda o Estado diversificou-se, para incluir, além de europeus, libaneses e outros povos de língua árabe, judeus de várias nacionalidades e japoneses. O Pará tem a segunda maior concentração de orientais do Brasil. A partir da metade do século XX, o Pará “integrou-se” completamente ao Brasil com a construção das estradas que ligam Belém às demais regiões do país. E, nas últimas três décadas do século, iniciou um novo ciclo econômico, e saiu definitivamente do extrativismo e da monocultura. Atualmente, em termos regional e político, o estado é dividido em 6 (seis) mesorregiões: Baixo Amazonas, Marajó, Belém, Nordeste, Sudoeste e Sudeste Paraense; 22 (vinte e duas) microrregiões e 143 (cento e quarenta e três) municípios. A formação das mesorregiões leva em conta, principalmente, as semelhanças econômicas, sociais e políticas, e a das microrregiões considera a estrutura produtiva de cada comunidade econômica. O Quadro 3 apresenta cada uma das mesorregiões paraenses, com as microrregiões respectivas e os municípios que as compõem. 83 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pa á Quadro 3 – Estado do Pará: mesorregiões, microrregiões e municípios 24 Fonte: Extraído da revista “NOSSO PARÁ” – COLEÇÃO ESPECIAL. Belém: VER Editora, [ s.d.]. Paginação irregular. 24 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pa á 84 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 85 Os municípios paraenses, considerando-se a área, são de grande, médio e pequeno porte. Alguns deles chegam a ser, em extensão territorial, maior que alguns estados brasileiros, como é o caso de Altamira, com 161.445.9 km2, é maior que o Amapá, Alagoas e Sergipe, um pouco menor que Rondônia e correspondente a 50% da área do Rio Grande do Sul. Os municípios de maior área localizam-se nas mesorregiões sudoeste, cuja extensão territorial é de 33,30%; baixo amazonas, com área de 27,27% e sudeste, com área de 23,31%, nesta última está localizada a microrregião Marabá, o espaço geográfico desta pesquisa. O Mapa 2 apresenta as 6 mesorregiões e o percentual referente à extensão territorial ocupada por elas no estado do Pará. Quanto à população dos municípios paraenses, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística – IBGE (contagem da população – 2000), o Município de Belém ocupa o 1º. lugar, com 1.280,614habitantes; Santarém, com 262.538; Marabá, com 168.020 e Castanhal, com 134.496. Ao comparar estes dados com as últimas estimativas do IBGE (ano 2005), que são: Belém, com 1.405,871; Santarém, com 274.012; Marabá, com 195.807 e Castanhal, com 154.811, verifica-se que estes dois últimos municípios apresentaram um número de habitantes superior ao estimado. Os dados do IBGE (2005) revelam também, que, dos mais populosos municípios paraenses, 2 se localizam na microrregião Belém (Belém e Ananindeua) e 1 na microrregião Castanhal (Castanhal). Neles está a maior concentração demográfica do Pará, localizada no entorno da capital paraense. Já Santarém e Marabá, cidades e, respectivamente, microrregiões, são verdadeiras capitais regionais, a primeira, do baixo amazonas e, a segunda, do sudeste paraense. 86 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Mapa 2 – Mesorregiões paraenses X Ocupação populacional 25 25 Fonte: Extraído da revista “NOSSO PARÁ” – COLEÇÃO ESPECIAL. Belém: VER Editora, [ s.d.]. Paginação irregular. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 87 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 88 O Mapa 3 destaca a mesorregião sudeste paraense, da qual fazem parte as microrregiões: Tucuruí, Paragominas, São Félix do Xingu, Parauapebas, Redenção, Conceição do Araguaia e Marabá. Esta, última, é a rede de pontos lingüísticos desta pesquisa. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Mapa 3 – Mesorregiões Paraenses 26 89 26 Os mapas de número 3, 4, 5, 6 e 7 e todos aqueles referentes às cartas lexicais foram elaborados, especificamente para este trabalho, em março de 2006, por Genival Crescêncio, pesquisador do Grupo Espeleológico, da Casa da Cultura de Marabá. 90 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Metropolitana De Belém Baixo Amazonas Marajó Nordete Paraense Sudeste Paraense Sudoeste Paraense 0 515km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 91 A ocupação da mesorregião sudeste do Pará iniciou, timidamente, no século XVIII, por meio da garimpagem e da pecuária extensiva. No entanto, somente na segunda década do século XX é que se observa, nela, um contingente populacional mais estável, atraído pelo proclamado ‘Eldorado’ do milagre econômico, por meio da coleta da castanha-do-pará (Figura 6), o que fez de Marabá a mais importante cidade daquela época, na região, posição que, aliás, ainda ocupa. Figura 6 – Baldeação de Castanha-do-pará na Itaboca durante o verão – 1926 Fonte: Fundação Casa da Cultura de Marabá. Arquivo Fotográfico Miguel Pereira. Quanto à garimpagem, segundo Salgado (1997) registram-se fatos vividos por homens levados pelos ventos do sonho e da liberdade: assim se chegaram à Serra Pelada. Ninguém foi levado à força, mas, uma vez lá, todos se tornaram escravos da possibilidade da fortuna e da necessidade de suportar, sobreviver. Uma vez lá dentro, impossível sair: ali estava a chance da fortuna. A única. Cada vez que, em um barranco, se encontrava ouro, os transportadores de lama, de terra, tinham o direito de escolher um dos sacos que transportavam. Ali dentro podia estar a fortuna, a liberdade. A vida destes homens era uma seqüência alucinada de descidas ao fundo do barranco e subidas delirantes até as alturas da mina, carregando nas costas um Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 92 saco de terra e o sonho de ouro. Não havia álcool, não havia mulheres. Havia uma indizível necessidade de tudo. De afeto, de calor humano. Havia um perigo constante e uma vida sem consolo. Escravos da solidão, revolviam a terra. Quem chegava à ponta do barranco, pela primeira vez, tinha uma visão dilacerada e definitiva do bicho-homem: havia ali 50 mil criaturas esculpidas em lama e sonho. Só se ouvia o rumor humano, murmúrios e gritos silenciados, e o ruído de pás e enxadas impulsionadas por mãos humanas. Nenhum som de máquina, nenhum som que não viesse do homem (Figura 7). Figura 7 – Trabalhadores da Serra Pelada Fonte: Casa da Cultura. Foto de Sebastião Tapajós/Retratos do Brasil. Paralelamente a esta paisagem, não podemos esquecer da numerosa população indígena, quase totalmente dizimada, escravizada e aculturada, desde a chegada, às costas brasileiras, no século XVI, dos europeus, principalmente o português, que encontraram mais de um milhão de indígenas povoando as terras a serem colonizadas e, com eles, cerca de 300 línguas indígenas diferentes. Atualmente, no estado do Pará, conforme vimos, anteriormente, sobrevivem sessenta mil índios e cerca de vinte e uma línguas indígenas são Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 93 faladas. Várias são as áreas de reservas a eles destinados. Destaca-se, entre as tribos, a Suruí-Sororó (Figura 8). Figura 8 – Tribo Indígena Suruí-Sororó Fonte: Casa da Cultura de Brejo do Araguaia. A chegada, porém, de consideráveis ‘investimentos’, que começaram a penetrar neste território, identificados com parte do leste e especialmente com o sudeste do Estado, por meio da Rodovia BR – 010, conhecida como Belém – Brasília, transformou esta mesorregião em uma das áreas de maior dinamismo da Amazônia, não só do ponto de vista da variedade de atividades, como também das tensões e problemas originados com a chegada dos grandes capitais. Entre estes problemas, há que se evidenciar o cruel desmatamento, ordenado pela cobiça, pela ganância dos poderosos, cujas conseqüências desastrosas a história se encarrega de deixar registros, pelas incuráveis feridas, principalmente, humanas. A partir do final da década de 50, ao ser reconhecida como fronteira de recursos, a mesorregião experimenta uma intensa revitalização, apoiada pela implantação de infraestrutura (energia, ferrovia e rodovias) e por diversos programas governamentais, entre os 94 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará quais se destacam as políticas de incentivos fiscais, coordenada pela antiga Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), atualmente Agência de Desenvolvimento da Amazônia (ADA), entre outros financiamentos. A implantação do Programa Grande Carajás representa o ponto ‘alto’ desses “regimes especiais” de incentivos tributários e financeiros, extrapolando sua atuação e influência física para fora dos limites da Mesorregião e, economicamente, complementando elos com regiões de alémmar. O atual Projeto Ferro – Carajás, da Companhia Vale do Rio Doce, delineado ainda na década de 70 e baseado na existência de determinados terrenos, do período PréCambriano, reconhecidos como portadores de notável potencial mineral, representado por jazidas de ferro, ouro, manganês, níquel, cobre, bauxita e cassiterita, entre outros minerais, se constitui no principal empreendimento deste Programa, que ainda compreende outros projetos de agricultura, pecuária, pesca, agroindústria, reflorestamento, beneficiamento de madeiras, indústria siderúrgica, aproveitamento de fonte energética etc. Fácil de imaginar o impacto de todos estes acontecimentos se desenrolando em área denominada, pela floresta úmida amazônica, de terra firme e que se sustentava, até então, pelo extrativismo vegetal, pela pecuária extensiva às margens do rio Araguaia, por uma modesta agricultura de alimentos e por diversos garimpos de ouro, espalhados em sua imensa superfície: graves tensões entre os habitantes pioneiros e os que chegavam em ciclos sucessivos, conforme o avanço da fronteira. Cada um com problemas característicos, entre eles, as modificações na relação de produção, as questões fundiárias e ambientais, o estabelecimento de novas tecnologias, a disponibilidade de numerosa mão-de-obra, após a implantação dos grandes projetos e o êxodo rural, estimulados por novas atividades assalariadas. A violência, sobretudo, advinda da guerra, pela posse da terra, como um barril de pólvora se implantou no campo, num verdadeiro acinte à autoridade dos governos (municipais, estadual e federal), que quase nada têm feito para acelerar o processo de reforma agrária, numa região conhecida pelos grandes latifúndios que dispõe e marcada pelos conflitos agrários. Agrada muito, a certa ala de intérpretes raivosos dos acontecimentos que sucedem nas frentes pioneiras da Amazônia, atribuir a tensão existente a um trabalho subversivo de agitação política. O proselitismo existe – e teremos que conviver com ele, se realmente cremos em uma proposta de democratização pra valer – mesmo que não o aceitemos e o combatamos. Mas essa esmagadora tensão, de origem larvar, de raízes profundas, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 95 transcende a qualquer manifestação política: é um dado da realidade. Portanto, ignorá-la ou colocá-la em plano secundário, só omitindo essas mortes violentas e estúpidas, que, cada vez, freqüentam o noticiário dos jornais, como nódoa de barbarismo em nossos “projetos de civilização”, não resolverá o problema da reforma agrária que assola e castiga o povo desta região. O fato mais desastroso em toda essa celeuma é se chegar à triste constatação que o governo já possui milhões de hectares de terras desapropriadas e o processo de assentamento de famílias, no campo, continua lento, quase imperceptível, poderíamos assim dizer. O sul do Pará, por exemplo, é uma das maiores regiões de incidência de conflitos fundiários e onde, inclusive, tem implantado uma Superintendência Especial do INCRA. Mas até quando teremos que assistir, perplexos, a essa verdadeira guerra entre sem-terra e latifundiários, como, por exemplo, o triste episódio no conturbado município de Eldorado dos Carajás, que foi palco, em 17 de abril de 1996, de uma das maiores carnificinas que se teve conhecimento na região, em decorrência da famigerada briga pela posse da terra. O solo, outrora rico e disputado pela fertilidade de ouro e minérios, que atraiu, para esta região da Amazônia, milhares de brasileiros de todo o país em busca do “Eldorado”, antagonicamente e cruelmente, é fertilizado pelo sangue de trabalhadores mortos, num confronto com a Polícia Militar, pela posse da terra. Encerra-se, assim, um protesto constituído, de aproximadamente, 1.500 sem-terra, que resultou no maior massacre das lutas sociais do país, cujo registro da operação de trânsito rodoviário atesta: uma carnificina com duas dezenas de trabalhadores mortos e mais de quarenta feridos. Recolhidos num posto do Instituto Médico-Legal de Marabá, os corpos de Eldorado dos Carajás trazem as marcas de um massacre. Manchas roxas informam que tomaram chutes e pontapés, enormes buracos de balas e manchas de pólvora comprovam que foram dados tiros à queima-roupa, membros mutilados e cabeças arrebentadas, denunciam uma selvageria além de qualquer razão ou limite. Homens e mulheres, atacados na floresta, “deixaram” sangue e pedaços de cérebros pelo chão e pela relva, são esses brasileiros, chamados sem-terra, cidadãos que andam descalços, têm as roupas sujas de barro e só costumam ser notícia sob forma de cadáver. Acompanhada a estas guerras, pela posse da terra, a fome faz papel de estrela – é o que nos revela um documentário de uma hora e meia, intitulado La Terre et la Peine (Terra de Esperança), exibido em março de 1998, com sala cheia, a antiga Biblioteca Nacional da França e, também, no XX Festival Internacional de Filmes Etnográficos e Sociológicos, no Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 96 cinema Real, em Paris27. Terra de Esperança é um documentário que protagonizou os semterra e posseiros dos municípios de Parauapebas, Curionópolis e São Félix do Xingu. É produto de mais de 04 anos de trabalho entre pesquisas e viagens pela terra no sul do Pará, na Amazônia brasileira. O método utilizado foi deixar que os sem-terra falassem, fazendo com que os elementos básicos de suas vidas e da fronteira agrícola fossem mostrados pelos seus depoimentos. Neste documentário, a fome, no acampamento dos sem-terra, faz papel de estrela. As cenas comentadas aparecem ilustrando o massacre. Baiana, uma senhora sem-terra e sem marido, aparece matando uma galinha para preparar o ‘de comer’ de seus filhos. Fala da sua angústia com a incerteza da alimentação diária. E demonstra revolta ao lembrar que, diferentemente, de outros, no dia de eleição municipal, a comida aparece sendo fartamente ofertada para eleitores ou não. Aproveitar o momento é a palavra de ordem. Depois, saiam de baixo se um carro se aproximar, ninguém espere carona, mas atropelo. Os fazendeiros, por sua vez, chegam ao absurdo de dizer para o governo que cuidem da “ordem”, que o “progresso” eles sabem fazer. Ainda afirmam que não houve massacre em Eldorado dos Carajás, mas um conflito entre policiais e sem-terra numa operação de desobstrução de uma estrada. Para eles – quem não tem condições de defender o que é seu não merece o que tem – afirma um deles. No filme, os depoimentos e discussões fogem à banalização, como se trata a questão da Amazônia, em que apenas o desmatamento é colocado em evidência. Uma versão em português, do documentário, deverá ser providenciada e quem sabe difundida nos canais brasileiros. Quem sabe assim a gente repense essa história de terra no Brasil. Uma Terra que, em vez de túmulo, seja de Esperança. As manifestações de milhares de sem-terra e agricultores familiares são um grito de dor e de resistência, querendo mostrar aos donos de poder que não conseguirão tirá-los da terra e da história, como sempre fizeram. Eles, os sem-terra, pedem à sociedade que os compreenda, que, quando se arranca o poder de um pai de família de alimentar seu próprio filho, lutar até o fim e de todos os modos, é a única reação natural e digna que se pode fazer. Querem, somente, que um Estado Democrático de direito cumpra a Constituição e preserve o princípio da função sócio-ambiental da terra, desapropriando as áreas improdutivas. Não aceitam a escravidão e o desrespeito do agro-negócio. Querem a 27 Notícia extraída do Jornal Correio do Tocantins. Marabá – PA, 31 de março a 2 de abril de 1988. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 97 dignidade, a garantia de alimentos e os empregos que surgem somente pela reforma agrária. Exigem a imediata suspensão dos despejos e retirada do aparato policial. E afirmam estar abertos ao diálogo, desde que sejam respeitados como cidadãos. Existem também várias fazendas com trabalho escravo comprovado (Figura 9) – a chamada “senzala amazônica”, em que os brasileiros podem ser divididos em três categorias distintas. Uma, a mais bem remunerada, inclui os assalariados que tentam incorporar à prática os direitos sociais previstos pela Constituição. Outra é a que luta pelos direitos trabalhistas mais elementares, como ganhar um salário mínimo no final do mês e ter registro na carteira de trabalho. E, a última, ignorada pelas estatísticas oficiais, é formada por aqueles peões negros e brancos, que torcem para que a Lei Áurea entre vigor um século depois que a princesa Isabel “declarou” extinção ao trabalho escravo. Em geral, eles dormem ao relento, fazem apenas uma refeição por dia, trabalham sob mira de espingarda e não recebem um salário no final do mês. Figura 9 – Peões libertados pela PM: do desemprego no Maranhão ao trabalho forçado no Sul do Pará Fonte: Casa da Cultura de Marabá. Soma-se, ainda, às mazelas, a situação de descalabro das estradas, a falta de soluções para o problema fundiário e a ausência de eletrificação em diversos municípios, mesmo com a Hidrelétrica de Tucuruí, fatores que aumentam as desigualdades e geram os Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 98 conflitos sociais. O que falta é vontade política: enquanto se gastam bilhões para salvar bancos de falências, deixam-se abandonadas as estradas de uma região rica como a nossa, inibindo a produção, matando seres humanos em suas pontes mal feitas e buracos espalhados por toda parte. O sul e sudeste do Pará são a maior província mineral do planeta e juntos têm o 4º rebanho de gado do país e não têm suas potencialidades estimuladas, porque os recursos, concentrados nas mãos de poucos, são usados de acordo com a conveniência destes. Nessa selva, sem lei, que engloba o sul do Pará, as pessoas continuam, violentamente, se matando. A Comissão Pastoral da Terra (CPT), ao divulgar relatórios sobre assassinatos, atribui aos pistoleiros a maioria dos crimes cometidos contra lavradores e trabalhadores rurais, enfatizando que contratar um pistoleiro no Brasil é tarefa tão fácil quanto engraxar os sapatos ou trocar a camisa. Pistoleiros são os jagunços, àqueles que têm como “profissão” eliminar quem represente um entrave aos interesses de terceiros – os mandantes – dispostos a pagar o que for necessário para ter livre o seu caminho. A morte de um posseiro, por exemplo, custa R$ 200,00 na tabela da pistolagem. Mas o preço pode triplicar, caso a vítima seja sindicalista rural (Figura 10). Figura 10 – A rota do tiro ao alvo Fonte: Casa da Cultura de Marabá. Ainda segundo este relatório, dependendo da importância da pessoa a ser assinada e do grau de dificuldade para a execução do serviço, o preço aumenta, porém, em algumas Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 99 áreas de conflitos no sul e sudeste do Pará, o negócio pode ser fechado por menos de mil reais. A forma mais utilizada de escravidão é a decorrente da dívida. Nela, o salário pago aos trabalhadores nunca é suficiente para saldar seus débitos junto ao empregador, referente a transporte, comida, roupa e ferramenta. A maior parte das vítimas vem dos estados nordestinos, sobretudo da Bahia, Piauí e Maranhão. No entanto, é predominantemente, deste último, pelos altos índices de desemprego, e por estar, geograficamente, mais próximo da região sudeste paraense, a origem de escravos que vivem no sul do Pará. Alem do massacre de Eldorado de Carajás, o documento da CPT aponta que 23 (vinte e três) trabalhadores foram mortos nos 630 (seiscentos e trinta) conflitos agrários registrados no País, de janeiro a setembro do ano passado, e que há uma lista com nome de 73 (setenta e três) líderes rurais marcados pra morrer. O estado que apresenta os maiores índices de violência no campo é o Pará (Figura 11). Figura 11 – Os números da CPT Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 100 Fonte: Comissão de Pastoral da Terra – CPT/2006. Os dados divulgados no último relatório da CPT, sobre a escravidão e a violência no campo, revelam que, de janeiro a setembro de 2006, o Ministério do Trabalho localizou e libertou 1.812 (mil e oitocentos e doze) trabalhadores rurais, que viviam em sistema de escravidão. Para se ter idéia, em todo o ano de 2005, esse número chegou a 465 casos. Ainda não se sabe, porém, se este crescimento assustador se deve ao recrudescimento dessa exploração por parte dos fazendeiros ou a uma fiscalização mais rigorosa por parte do governo. Na tentativa minimizar essa violência desenfreada, o Prêmio Nobel da Paz, de 2005, Adolfo Perez Esquivel, chegou a desembarcar em Marabá, onde foi participar de uma manifestação em favor da paz. E, entre as autoridades, que o acompanhavam estavam o Presidente e o Vice da Ordem do Advogados do Brasil, no Estado Pará, e representantes da Comissão de Direitos Humanos. Denominado de Ato de Paz, este evento contou com, aproximadamente, 5000 pessoas, além da participação de atores globais, como Paulo Betti, Ângelo Antonio e Letícia Sabatela. É impossível não notar, em meio a todos esses problemas, ou à custa deles, que a região apresenta uma “crescente diversificação de atividades”, cuja posição geográfica privilegiada facilita o acesso a todo o país, baseada numa rede de rodovias que constituem estratégicos eixos de circulação de que dispõe a mesorregião para a sua vida de relações. A variedade de vias de transporte, inclusive a fluvial, e sua posição geográfica, que, atualmente, a situa como ponto de passagem para os diversos fluxos que chegam ou demandam a todas as áreas da mesorregião, inclusive as importantes regiões minerais e o traçado da Rodovia Amazônica (BR – 230), que atravessa seu território, pondo-a em contato com o vasto interior amazônico, fazem de Marabá a principal cidade da mesorregião e da microrregião Marabá, localizada no sudeste paraense, bem como a de maior fluxo migratório. Diariamente, chegam pessoas das mais diversas partes do Brasil em busca de dias ‘melhores’. As raízes da maioria dos habitantes do sul do Pará, nome pelo qual é mais conhecida essa região, estão além das fronteiras do estado. A cultura, com todos os elementos que ela comporta, entre eles a língua, vem nas “bagagens” e é desdobrada junto com os “cabedais” dos migrantes. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 101 Da mesma forma, com esse cenário, é impossível ignorar que a história paraense moderna se confunda com a história do descaso e da violência. Nessa paisagem está a microrregião Marabá (Mapa 4), que reúne 05 (cinco) municípios: Brejo Grande do Araguaia, Palestina do Pará, São Domingos do Araguaia, São João do Araguaia e Marabá, e, nela, localizada a rede de pontos lingüísticos selecionada. Ancorados nos princípios teórico-metodológicos que ancoram este trabalho, o estudo na microrregião, em questão, pretende submergir num cenário para dele emergirem dados passíveis de observação e descrição da linguagem, especificamente, de aspectos semântico-lexicais, na perspectiva da educação na Amazônia. O cenário, a que nos referimos, foi o local selecionado para esta pesquisa de caráter lingüístico. No entanto, um estudo deste caráter requer a conjugação de fatores sóciohistóricos e demográficos, do passado e do presente, que, reunidos, poderão explicitar a (re)constituição de uma língua, que, por força de Lei, denominamos ‘portuguesa’, e, assim, espelhar os usos que dela fazem seus falantes. Por essa razão, inicial e preliminarmente, algumas categorias, como sociedades, histórias, línguas, dialetos, culturas, demografias e educação, entre outras, emergem, conjuntamente, para estabelecer um amálgama, uma trilha, que nos permita compreender a história lingüística deste espaço chamado amazônico. Os dados seguintes referem-se à Microrregião Marabá e, nela, Marabá e Palestina do Pará, dois dos cinco (5) municípios que compõem esta microrregião, e que, neste estudo, funcionaram como pontos lingüísticos representativos da mesma. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 102 Mapa 4 – Microrregião Marabá no Estado do Pará A microrregião Marabá possui considerável plantel bovino, o que torna a pecuária para corte sua principal atividade. A agricultura consiste numa força complementar, voltada para a produção de alimentos. A implantação de um distrito industrial na cidade de Marabá acena com a industrialização da região, aproveitando-se principalmente da existência da estrada de Ferro Carajás e de inúmeras rodovias que partem em várias direções. Diferentemente de outros trabalhos, tradicionalmente realizados, de natureza dialetal, neste, não consideramos, prioritários, critérios como antiguidade e isolamento, para selecionar os pontos lingüísticos representativos da microrregião, e, sim, o aspecto econômico, conjugado com a distribuição espacial e aspectos relativos aos estudos lingüísticos já desenvolvidos ou não na área geográfica em questão. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 103 Assim, entre aqueles 5 (cinco) municípios que integram a microrregião Marabá, foram selecionadas 2 (duas) localidades, como pontos lingüísticos: Marabá e Palestina do Pará. A primeira, pelo fato de ser considerado o pólo de maior desenvolvimento econômico, inclusive da mesorregião sudeste paraense, e está localizada, geograficamente, no extremo oeste desta micro. A segunda, por estar localizada no extremo leste da micro, constituindo um limite interno, interestadual, com o estado do Tocantins, e ser a menos desenvolvida desta micro. E pelo fato de haver um léxico nunca antes descrito e cartografado em nenhuma destas localidades. Apresentamos, a seguir, tanto pelas fotos da vista aérea dos municípios de Marabá e Palestina do Pará, seguidas dos mapas geográficos, estes dois pontos lingüísticos, locais desta pesquisa. A essas figuras, seguem informações sobre localização geográfica, área, ato de criação, dados populacionais e densidade demográfica, atividades econômicas predominantes, e aspectos sócio-histórico-culturais, entre outros, resultantes da aplicação de um dos instrumentos de produção de dados, já mencionado, a Ficha da Localidade (Anexo A), cujas fontes foram documentos oficiais (Prefeitura, IBGE, Arquivos Públicos, Bibliotecas e Casas de Cultura) e alguns dos moradores mais antigos dos referidos pontos. 2.2.1 PONTO LINGÜÍSTICO 1: MARABÁ Formada, atualmente, por três grandes núcleos populacionais: Marabá Pioneira, Nova Marabá e Cidade Nova, o município de Marabá é considerado a cidade mais importante do sudeste paraense. Sem ser projetada, uma cidade, para bem dizer, nascida da própria terra, criada pela necessidade da região e fundada por um homem comum, o comerciante mateiro Francisco Coelho, era, então, um pequenino lugarejo, um barracão de taipa encravado naquela estreita faixa de terra entre os dois rios, Tocantins e Itacaiúnas (Figura 12). Assim nasceu a cidade de Marabá (Mapa 5), despontando por entre as folhagens verde da Amazônia, onde o som da viola e do pandeiro se confundiam com a estranha voz da natureza ainda virgem. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá Figura 12 – Vista aérea de Marabá – confluência dos rios Itacaiúnas e Tocantins Fonte: Fundação Casa da Cultura de Marabá. Foto de Miguel Pereira. Arquivo Fotográfico Miguel Pereira. 104 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Mapa 5 – Município de Marabá 0 20 40 km 105 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Latitude Sul: - 5.5º (sul) Coordenadas: 5º 22’ 07” Longitude: - 50.5º (oeste) 49º 07’ 04” Limites: Ao Norte Itupiranga, Jacundá e Rondon do Pará Ao Sul São Geraldo, Curionópolis, São Felix do Xingu e Parauapebas A Leste Bom Jesus do Tocantins e São João do Araguaia A Oeste São Felix do Xingu e Senador José Porfírio NOME OFICIAL Marabá ÁREA 15. 092 Km² ATO DE CRIAÇÃO Lei 1.278, de 27/02/1913 GENTÍLICO Marabaense DISTÂNCIA DA CAPITAL 485 Km COMO CHEGAR 106 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 107 Quadro 4 – Dados populacionais e densidade demográfica de Marabá Total de população residente estimada para 2005 Densidade demográfica Urbana 168.020 11,13 28 134.373 Densidade demográfica Rural 8,90 33.647 Densidade demográfica Homens Densidade demográfica Mulheres 2,22 84.709 5,61 83.311 HISTÓRICO DA LOCALIDADE A denominação “Marabá” é atribuída a Francisco Coelho da Silva, em 1905. É um topônimo de origem indígena, que poderá ser tupi ou tapuia, pois ambas as nações estiveram na região. Se de origem tupi, origina-se da decomposição mara=subará (mar, águas) e bá=bau (parente, semelhante), cujo significado seria: “semelhante ao mar”. Tal hipótese se justifica pelo fato de Marabá estar situada na confluência do rio Tocantins com o rio Araguaia. Segundo Sampaio (1970)29, o nome Marabá é originário do vocábulo “mairabá”, que significa “filho de francês com mulher índia” ou “filho de índia com estrangeiro”. 28 Fonte: IBGE, Censo Demográfico de 2000, resultados do Universo. 29 Cf. SAMPAIO, Teodoro. O Tupi na Geografia Nacional. São Paulo: EDUSP. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 108 Figura 13 – Batelões usados como abrigo – Marabá Pioneira Fonte: Casa da Cultura de Marabá. A denominada Marabá pioneira (Figura 13), iniciada com a navegação pelos rios Tocantins, Araguaia e Itacaiúnas, tem mais de três séculos de história. À frente, os aventureiros Daniel de La Touche e Francisco Cadeira Castelo Branco, o povoamento da bacia do Itacaiúnas tem, na formação do município de Marabá, um capítulo especial. A região mesmo explorada pelos portugueses, ainda no século XVI, permaneceu sem ocupação definitiva durante quase 300 anos. A partir de 1892, é que começa a colonização efetiva, com o burgo agrícola localizado a 11 milhas abaixo da foz do Itacaiúnas. Data desse período o primeiro ciclo econômico da colônia, baseado na extração de caucho de borracha. A transferência do burgo para o pontal do Itacaiúnas começou a se concretizar em 1898, quando para lá se mudaram os comerciantes e sócios Francisco Casimiro de Souza e Francisco Coelho da Silva. O termo Marabá, que para os indígenas designava o filho do prisioneiro ou estrangeiro, ou o filho de índia com branco, acabou denominando o burgo (Figura 14), quando houve a mudança oficial e definitiva para o pontal, em novembro de 1904. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 109 Figura 14 – Burgo agrícola Fonte: Casa da Cultura de Marabá. A base econômica iniciou com o ciclo da borracha, e, paulatinamente, despontou o da castanha-do-pará. Marabá cresceu e, ao mesmo tempo, a fama da sua “riqueza”, que corria de ‘boca em boca’, atraiu milhares de aventureiros dos mais longínquos rincões deste país. O então povoado se transformou em tumultuoso aglomerado humano, onde a lei era quase desconhecida e primava o rápido ‘enriquecimento’, para tanto, valiam todos os recursos. Mas já, nessa época, o pequeno vilarejo também hospedava homens, cujas idéias provocaram as primeiras manifestações a favor da sua independência, e da criação do município de Marabá. No início de 1908, vários destes cidadãos se dirigiram ao Governo do Estado para tal solicitação, com o principal argumento da necessidade de autoridades que impusessem a lei e a ordem. No entanto, somente em 27 de fevereiro de 1913, foi votada pelo Legislativo Estadual e sancionada pelo então Governador do Estado, o Dr. Enéas Martins, a lei que criava este município. Embora, somente em 05 de abril, daquele mesmo ano, se instalou o Município de Marabá. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 110 Um fenômeno que não podemos deixar de mencionar são as enchentes. Marabá “sofre”, periodicamente, com enchentes de maior ou menor intensidade. Era crença popular que, de 20 em 20 anos, a cidade seria assolada pelas grandes cheias. Entretanto, na década de 70, estas ocorreram com maior freqüência, contrariando essa assertiva popular. Há registro de grandes cheias em 1906, 1910, 1926, 1957, 1968, 1974, 1978, 1979 e 1980. Esta última, segundo depoimento de moradores mais antigos, foi a maior de toda a sua história. Nesta cheia, nenhum torrão de chão ficou fora da água. Muitas cumieiras das casas desapareceram sob as águas. O nível do Rio Tocantins, medido pelo serviço de Hidrologia do Departamento de Águas e Energia Elétrica, do Ministério de Minas e Energia, atingiu 17,42 metros. Para se ter idéia do contraste, esse nível desce à marca de 1,20 a 1,50 metros, quando registra a menor altura. O Gráfico 4 apresenta uma Tabela dessas enchentes referente ao período de 1977 a 2002. Gráfico 4 – Nível de água/enchente Fonte: Pasta Enchentes da Biblioteca Frederico Morbach. Há quem pergunte o porquê dessas freqüentes enchentes. Algumas pessoas atribuem – nas ao maior índice pluviométrico nas cabeceiras dos rios Tocantins, Araguaia e Itacaiúnas, outras, porém, acham que o fenômeno é conseqüência do desmatamento intensivo que vem ocorrendo na região. Com isso, há maior infiltração de água no solo, acarretando a lixiviação do solo e carreando as substâncias nutrientes para a calha dos rios. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 111 A enchente de 1926 causou sérios danos à cidade, que permaneceu imersa por mais de 30 dias (Figura 15). Figura 15 – Enchente de 1926 Fonte: Fundação Casa da Cultura de Marabá. Arquivo Fotográfico Miguel Pereira. Eis alguns excertos que Yoshioka (1986, pp. 20 e 21)30 extraiu do Relatório do então Juiz de Direito da Comarca de Marabá, Dr. Pio de Andrade Ramos, apresentado ao então Secretário Geral do Estado, Dr. Deodoro de Mendonça: [...] Quando cheguei àquelle município em 22 de maio do corrente anno, fui residir em uma pequena barraca, na Povoação de Lago Vermelho, em cuja localidade se achava provisoriamente a séde da Comarca. A 29 do mesmo mez fiz uma digressão à cidade, e ao povoado do Amapá. Pude então contemplar os estragos causados pelas águas que haviam transformado a formosa urbs do Itacayuna em uma verdadeira tapera. E para mais justificar esta última denominação, um grande aspecto de tristeza pairava sobre todo o ambiente. Destroços de toda espécie, escombros de prédios derruídos, enchendo as ruas, atulhando as praças, interceptando todas vias e passagens; uma interminável e dolorosa esqueletaria de casas que foram de taipa ou tabique agora arrasadas, reduzidas ao madeirame arruinado e penso, inclinadas sobre esteios partidos ou arrancados dos alicerces defeitos; tal era o quadro pungente e desolador que nos deparava aquellas ruínas. 30 YOSHIOKA, Reimer. Avaliação de Implantação de Núcleo Urbano. São Paulo, 1986 (mimeo.). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 112 Da igreja singela e formosa, recentemente construída, sob a invocação de São Félix, via-se sobre os entulhos, apenas o campanário ao lado e, à frente, um lindo torreão, zimborio da saudade e da esperança, erguido ainda, mais inclinado na direção do Itacayuna, como ultima trincheira que houvesse defendido aquelle reducto sagrado. E para completar o scenario, mal se viam alguns vegetais, erguidos, murchos, enlameados. [...] Em junho, começou a reconstrucção, desde que não foi possivel um accórdo sobre a mudança da cidade, para outro ponto inaccessivel às enchentes. [...] E, em meiados de setembro, Marabá, renascida, deparava-se sorridente, numa casaria nova, recém pintada, que lhe dava o encanto e a faceirice da novidade e da moda. Sobre a tapera, ressuscitava, ainda mais graciosa e bonita do que fôra a cidade destruída (Estado do Pará, 1927, pp. 70 e 71). Antes dessa cheia, já em 1906 e, depois, em 1910, inundações tremendas derrubaram tudo. A cheia de 1947 causou prejuízos consideráveis. Os barcos aportavam à porta do Palacete Augusto Dias, atualmente sede da Câmara Municipal de Vereadores, com água atingindo quase um metro sobre o piso do pavimento inferior. Entretanto, a cheia de 1980 (Figura 16) foi a que atingiu maior nível, com água chegando a altura do teto do pavimento inferior deste mesmo prédio da municipalidade. Figura 16 – Enchente de 1980 – Praça Duque de Caxias Fonte: Fundação Casa da Cultura de Marabá. Fotógrafo João Salame, 1980. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 113 Se o drama de 1926 atingiu toda a população, a cheia de 1980 foi muito mais danosa, uma vez que a população era superior e o volume de mercadorias e os investimentos atingidos pelas águas eram consideravelmente superiores. Mesmo com esse prejuízo a velha Marabá renasce e revigora. Marabá reflete as duas estações. Na época do “verão”, que vai de maio a outubro, período de poucas chuvas, diminui a vazão dos rios, e, o “inverno”, que pega os meses de novembro a abril, com muita chuvas, os rios subindo, e a população em expectativa, preparando-se para mudar a qualquer momento. A enchente de 1980, afirmam os moradores, foi a mais “democrática”, pois atingiu a todos, ricos e pobres. Entretanto, se a enchente “socializa” os pertences dos pobres, os ricos possuem alternativas, mandando seus familiares para Belém ou mesmo para suas fazendas com o mesmo conforto existente no centro urbano de Marabá. À época não faltavam afirmações de autoridades governamentais sobre a necessidade de desativar a velha Marabá, interditar as casas e responsabilizar as pessoas “imprudentes” que teimam em retornar às suas casas na área “condenada”. Mas essa preocupação com a desativação é rapidamente esquecida, por existir contradições no seio das próprias autoridades governamentais. E, por outro lado, a desativação da velha Marabá não é tão simples assim, primeiro pelos investimentos representados pelas construções, segundo porque muitas atividades econômicas se realizam às margens do rio (Figura 17). Não se pode esquecer também os fatores culturais dos habitantes, que encontram no rio o lazer, associado à pesca, inclusive para subsistência da população ribeirinha. Figura 17 – Travessa Parsondas de Carvalho – Marabá Pioneira Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 114 Fonte: Casa da Cultura de Marabá. Interessante observar que, apesar dos transtornos, a enchente vira atração turística, e se torna comum água e tecnologia e barcos e celulares se misturarem pelas ruas. Água e barco mantêm a inalterabilidade dos elementos da natureza, essenciais, eternos, vitais, porém, também, mortíferos. A água, mesmo violenta, como costuma ficar, descendo seus rios numa revolta diluviana, causando caos ao cais, e a madeira, arrancada com violência da terra, transformada em tora e acalmada em barco, combinam com o ‘marabazinho’ que envelhece; já a tecnologia desponta contrastante, ao acaso, oriunda da engenhoca cinzenta do homem, a serviço dos anseios e desejos. O cheiro que exalava dos depósitos de castanhas, a brisa do rio impregnada de húmus, folhas e águas é o último reflexo da trajetória orgânica da vida, que volta de onde começou. Para onde vai o vento? Será que entra pelas narinas e penetra o ser em sua profundeza e se transforma em força muscular, alegria, inspiração, medo? O Tocantins mostra sua força hercúlea, apolínea, o Itacaiúnas, como um filho pródigo, distante, incorpora-se ao pai, de modo mais intenso e alastrador, obedecendo-o. O declínio do mundo, as corredeiras, os pirucabas, fazem o rio correr para a foz, arrastando a argamassa, a pedra, a cal e os bustos da praça. Trabalho para o pedreiro e o construtor na labuta dos próximos sóis. Os vendedores de espetinho e cachaça tomam a vez das agências bancárias, a água engole a laje asfáltica, o lixo metamorfoseia-se em grãos, em partículas, em átomos, em água; a energia elétrica dá lugar ao clarão da lua e tudo parece correr para o túnel do passado, início dos tempos, princípio de tudo, amálgama de Gaia, água. Por outro lado, a situação é dramática, especialmente, para as famílias desabrigadas que fazem o que podem para fugir de seus lares: de canoa, carro de mão, charrete e até carregando a mobília nas próprias costas. Os carros disponibilizados pela Prefeitura não dão conta de transportar, satisfatoriamente, milhares de pessoas atingidas pelas cheias. O desespero toma conta, principalmente, daqueles flagelados, desempregados e sem renda para manter a família, que, sem outra possibilidade, ficam alojados precariamente no Clube de Mães, nos pavilhões da feira coberta da velha Marabá, no Parque de Exposição Agropecuário e em outros alojamentos de condições precárias disponibilizados pela Prefeitura. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 115 Outro dilema enfrentado pelos desabrigados é o calor causticante que faz debaixo dos barracões de brasilit e no interior das minúsculas barracas de lona, onde muitos passam à noite, porque durante o dia preferem ficar de fora das sufocantes casinhas de lona. Uma cidade de antagonismos sobre a muralha do ‘marabazinho’ infiltra-se no rio. Telhados são ilhotas de argila, como o sol de antonho representa o ouro congelado depois de milhares de anos, aos poucos uma cidade se incorpora à paisagem líquida e plúmbea (Figura 18). A cidade desce, o sol despenca, a lua lamenta. Figura 18– Avenida Silvino Santis – Nova Marabá Fonte: Casa da Cultura de Marabá. Nessa época é comum, entre os governos, ações integradas para minimizar a calamidade que assola as famílias flageladas. Em operação conjunta com a Prefeitura local, o governo do estado encaminha para Marabá toneladas de medicamentos e suprimentos alimentares. São medicamentos relacionados a tratamento ou prevenção de diarréia, problemas respiratórios, doenças de pele, febre amarela, dengue, entre outros males endêmicos. Aliados a interesses políticos, é comum, nessa época, a visita de Secretários de Estado, Deputados e até de Governador, apenas para ‘avaliar’ a dimensão dos problemas Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 116 causados pelas enchentes e também conhecer os alojamentos onde ficam as famílias desabrigadas. À medida que as águas vão baixando na Marabá Pioneira, recomeça a ansiedade das pessoas para voltarem a habitar as casas que vão ficando livre das águas, no velho núcleo, ainda com ruas tomadas de lama, lodo, lixo e, provavelmente, com focos de doenças de toda sorte. Com a diminuição do nível das águas, um carro fumacê do Distrito de Endemias da Fundação Nacional de Saúde é utilizado para lançar inseticida, por meio da fumaça, para erradicação do mosquito transmissor de malária, dengue e outras doenças comuns nessa ocasião. Também são preparados e distribuídos folders informativos para as famílias atingidas pelas cheias. Para a retirada de espessas camadas de lodo e lama deixados pelas águas da cheia e limpeza das artérias pavimentadas é utilizado um carro pipa com jato d’água. Por todos os lados, é possível ver pessoas lavando e pintando aquelas casas que estão fora d’água, no afã de voltarem o quanto antes a morar no velho lar. Na medida em que os moradores promovem limpeza em suas residências vão tirando o lixo direto da rua. Esses dejetos costumam ser retirados pouco a pouco por caminhões disponibilizados pela Prefeitura. O fornecimento de energia elétrica, que esteve cortado durante os dias mais críticos da enchente, começa a ser normalizado, à medida que as águas vão saindo das ruas. ATIVIDADES ECONÔMICAS PREDOMINANTES Há, em Marabá, um pólo econômico diversificado, inclui pecuária, agricultura, pesca e distrito industrial. Firma-se como um dos mais importantes municípios do Estado. A Estrada Ferro-Carajás e as várias rodovias que ligam o município, às outras regiões do país, beneficiam o distrito industrial e podem ajudar a transformar Marabá num pólo turístico entre o sul do Pará e a região nordeste. Segundo o Censo Agropecuário de 1995, este setor predominava em 66% das propriedades e a pecuária era desenvolvida em 20% delas, nesta se destacam rebanhos bovinos, bubalino, eqüino, suíno e muar, uma espécie de mula. O tipo de agricultura predominante é de subsistência, com a produção de arroz, feijão, mandioca, manga, laranja e banana. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 117 Quanto ao extrativismo, dados do escritório do SEBRAE, em Marabá, indicam um declínio na oferta de madeira em tora, lenha, castanha-do-pará e carvão vegetal, mesmo sendo este último essencial para funcionamento dos fornos das siderúrgicas. No setor pesqueiro, a produção excedente é destinada à exportação. Após o período do defeso (novembro, dezembro e janeiro), os rios da região são fartos em pescada branca, piau, curimatá, tucunaré, mapará, misto e branquinha. Com sólidas redes de lojas e de supermercados, que já se estenderam a outros municípios e regiões, o comércio de Marabá também é o mais importante da mesorregião. Ainda segundo os dados do SEBRAE, em Marabá, há 203 indústrias, que utilizam matériaprima, insumos oriundos do próprio município. A indústria siderúrgica (principalmente ferrogusa) é a mais importante, com uma produção anual de 180 mil toneladas. Em segundo lugar está a indústria madeireira, com 57.796 metros cúbicos de madeira nobre (entre elas mogno, ipê, sucupira e jatobá), e a fabricação de telhas e tijolos, com mais de 19 mil unidades. Além disso, há fábricas de carrocerias e cabines para caminhão, de beneficiamento de borracha natural, de carvão vegetal, de estruturas pré-moldadas de cimento, de calçados, de confecções, de gelo, de sorvetes, de artefatos de couro, de doces em massa e calda, de laticínios, de beneficiamento de produtos vegetais e uma engarrafadora de água mineral. O setor terciário, representado pelo comércio, também é expressivo. O SEBRAE relacionou 2.198 estabelecimentos, entre varejistas, atacadistas e 490 atuando na prestação de serviços empresas prestadores de serviço. São micros, pequenas e grandes empresas, que movimentam a economia municipal, além daquelas que atuam no setor informal. 2.2.2 PONTO LINGÜÍSTICO 2: PALESTINA DO PARÁ Com uma área territorial de 984 Km², localizada na região sudeste paraense, microrregião de Marabá, Palestina do Pará (Figura 19) está a 600 km da capital do Estado, Belém. Pelo IBGE, Palestina tem uma população estimada em 7.544 habitantes, esse número é levado para 10.000 habitantes, de acordo com os dados da Fundação Nacional de Saúde – FNS. O processo de ocupação, “espontânea”, do núcleo urbano, de Palestina do Pará (Mapa 6) iniciou na década de 50. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Figura 19 – Vista aérea de Palestina do Pará 118 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Fonte: Arquivo Público do Gabinete do Prefeito de Palestina do Pará. Acessada em 2007. 119 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Mapa 6 – Município de Palestina do Pará 0 20 40 km 120 Latitude: - 5.8º (sul) Coordenadas: 05º 44’ 30” Longitude: - 48.4º (oeste) 8º 19’ 01” Limites: Ao Norte Brejo Grande do Araguaia Ao Sul São Geraldo do Araguaia A Leste Estado do Tocantins A Oeste Brejo grande do Araguaia NOME OFICIAL Palestina do Pará ÁREA 984 Km² ATO DE CRIAÇÃO Lei 5.689 de 13/12/1991 GENTÍLICO Palestinense DISTÂNCIA DA CAPITAL 600 km COMO CHEGAR Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 1 Quadro 5 – Dados populacionais e densidade demográfica de Palestina do Pará Total de população residente Densidade demográfica 7.544 31 0,007 Urbana 3.840 Rural 3.704 Homens 4.003 Mulheres 3.541 HISTÓRICO DA LOCALIDADE Ao desembarcar às margens do rio Araguaia, mais precisamente em 1958, Olindo Ribeiro de Souza observou que sua orla não era propícia para o plantio por causa das constantes enchentes deste rio. Pernambucano, de Araripina, vindo da cidade de Araguatins, antigo Estado do Goiás, atualmente Tocantins, em busca de terra para plantar e sustentar sua família, por indicação de um amigo que lhe informou sobre o lugar, aquele homem resolveu, então, explorar em direção ao interior. Insatisfeito, por estar numa imensidão de terras e não poder fazer uso dela, o colonizador resolveu investigar, junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Marabá, a titulação daquelas terras, e com base na pesquisa, realizada no referido cartório, fora informado que aquela região não tinha dono. Foi então que, em 21 de abril de 1958, 31 Fonte: IBGE, Censo Demográfico de 2000, resultados do Universo. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2 juntamente com sua família, Olindo chegou à região para se fixar definitivamente. Posteriormente, por seu intermédio, chegaram Nilo Lopes, Adão e Mico Preto, todos vindos de Araguatins. Estes primeiros habitantes viviam da caça, pesca, de roçadas de mandioca, arroz, milho e da colheita de babaçu. Durante algum tempo, este núcleo (Figura 20) ficou conhecido como “Centro do Olindo”, conforme especificado nos documentos de nomeação das primeiras professoras que vieram a lecionar na região, após funcionar a primeira escola. Figura 20 – Início da ocupação de Palestina do Pará Fonte: Casa da Cultura de Brejo Grande do Araguaia. Com a chegada de protestantes, Olindo passou a freqüentar a igreja destes e, certo dia, lendo a Bíblia, gostou da palavra Palestina. Laconicamente foi até a sede do município de São João do Araguaia solicitar, ao então Prefeito, que mudasse o nome da localidade, de Centro do Olindo para “Nova Palestina”. Em 1963, no documento de nomeação da 3ª professora da escola local, já vinha especificada a denominação Nova Palestina, que permaneceu até 1991, quando foi desmembrada do município de Brejo Grande do Araguaia e emancipada cidade, pela Lei nº. 5.689, de 13 de dezembro de 1991, com o nome de nome de Palestina do Pará. O município possui elevadas altitudes, como a cachoeira de Santa Isabel do Araguaia (Figura 16) e a Serra das Andorinhas, localizada no extremo sul do município, além de colinas entre chapadas e terras alagadas (Figura 21). Quanto ao solo, predominam os tipos arenosos e argilosos. O clima insere-se na categoria de equatorial superúmido, tipo Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 3 Am, na classificação de kóppen, no limite de transição para o Aw. A temperatura média anual varia de 26 a 35ºC. O período mais chuvoso ocorre, notadamente, de novembro a abril. Figura 21 – Cachoeira de Santa Isabel do Araguaia Fonte: Arquivo Público do Gabinete do Prefeito de Palestina do Pará. Acessada em 2007. Na vegetação predomina a floresta densa, com cerrados e floresta aberta mista (cocal). Grande parte da cobertura vegetal nativa foi derrubada para dar lugar a pastagens e ao cultivo de arroz, feijão, milho, mandioca e banana, que, na maioria das vezes, é para a subsistência das próprias famílias dos colonos, ensejando, neste caso, o aparecimento de áreas de capoeira. O relevo (Figura 22) é relativamente movimentado, apresentando áreas colinosas, cristas, chapadas em área sedimentares e apreciáveis várzeas, e a hidrografia é constituída por um dos trechos sinuosos do rio Araguaia, que serve de limite natural com o estado do Tocantins. 4 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Figura 22 – Terras alagadas em Palestina do Pará Fonte: Arquivo Público do Gabinete do Prefeito de Palestina do Pará. Acessada em 2007. A Lei de criação não estabelece distritos, menciona apenas Palestina do Pará como sede municipal, entretanto, com base nos limites territoriais, definidos pela mesma, passou a fazer parte do município as seguintes localidades (vilas): Santa Izabel do Araguaia, Porto Jarbas Passarinho, Posto Fiscal Jarbas Passarinho, Nova Vida, popularmente conhecida como Vila Viração e São Pedro. Mesmo situado numa das regiões mais prósperas do Estado, em termos de potencialidades naturais e econômicas, a qualidade de vida da população, deste município, é precária. A área rural apresenta-se descaracterizada, observando-se uma grande concentração de fazendas, que, paulatinamente, vão substituindo a vegetação nativa por grandes áreas de pastos. Proliferam-se as queimadas, que, além de causarem alterações na temperatura, contribuem, juntamente com a poeira levantada do leito das rodovias, para a poluição do meio ambiente. Devido aos reflexos da vegetação, o clima da região passa por consideráveis alterações nos últimos anos. O núcleo urbano de Palestina apresenta uma topografia plana em toda extensão e tem como principais condicionantes à sua expansão o rio Araguaia, localizado no quadrante sudoeste. Quanto ao uso do solo, predomina o residencial, sendo as condições de moradia da maioria das casas extremamente precárias, prevalecendo às construções de um Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 5 pavimento, entre construções de alvenaria, de madeira e taipa. Algumas ainda são cobertas de palha de babaçu, mas, a maioria, é de telha de barro ou fibrocimento. A partir de 1964, com a descoberta de um garimpo de diamantes, na localidade do Itamerim (hoje pertencente ao município de Brejo Grande do Araguaia), houve um fluxo migratório considerável de pessoas para as localidades mais próximas, entre elas, Palestina, situada a 20 km do Itamerim. Foi nessa época que a população de Palestina passou a manter relações com outras localidades e a economia, que era de subsistência, passou por uma ligeira ascensão, em função do garimpo, para onde era comercializada toda produção de cereais, até que se extinguiu, vindo a cair a produção local. A descoberta da jazida de diamante na pequena Vila de Itamerim despertou o interesse de muitas pessoas, que, em meio às dificuldades financeiras ou a ganância pela riqueza facilitada, enfrentaram obstáculos, como a falta de estradas e transportes, para chegarem ao local do garimpo. As pessoas locomoviam-se no estreito caminho no meio da mata, na maioria das vezes a pé ou montadas em lombos de animais. Um dos mais antigos32 garimpeiros de Palestina do Pará33, senhor Galdenço Pereira da Silva: [...] nós ia para o garimpo por um ramal (caminho), trabalhei lá durante seis meses e não arrumei nada. [...] O garimpo era na beira da grota, cada pessoa que chegava escolhia um lugar e fazia a sua cata (buraco ou barranco de onde se tira o minério). Lá só deu muito serviço e pouco diamante (In Ferreira, 2002). Segundo o senhor Galdenço, ex-garimpeiro do Itamerim, pessoas de diversas regiões do estado vieram à procura de diamantes, mas o garimpo só funcionou com entusiasmo por dois anos. Outro fato ocorrido na região, à mesma época, e que merece atenção, foi a Guerrilha do Araguaia, movimento armado, liderado por militantes de esquerda, que se fixaram, na região do Baixo Araguaia e do Médio Tocantins, a fim de (re)conhecer a selva amazônica e todos os benefícios e obstáculos proporcionados pela floresta e, sucessivamente, combater a ditadura estabelecida no País, desde 1964, período em que o Brasil ainda era governado pelo regime militar. Os “terroristas”, como eram conhecidos os militantes, ajudavam os moradores da região com distribuição de remédios, medicamentos, feituras de partos e ainda realizavam pequenas cirurgias e alfabetizavam. 32 Relatos resultantes de entrevistas gravadas pelo pesquisador, devidamente autorizadas, inclusive, para publicação, com alguns moradores mais antigos. 33 Há poucos registros, na própria localidade, que documentem aspectos sobre a região. Por isso, neste trabalho, nos valemos das entrevistas, mencionadas anteriormente e de outros escritos, entre estes, o Trabalho de Conclusão de Curso (2002) intitulado “O Fluxo Migratório na Transamazônica”, de autoria de Edmilson Paes Ferreira, aluno do Curso de História, da Universidade Federal do Pará. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 6 As forças de repressão do governo, ou seja, o exército, a fim de inibir os esquerdistas, realizaram três grandes campanhas para eliminar o foco guerrilheiro do Araguaia, e abriu 85 km de estrada, conhecida como Operacional 3, que permitia o acesso às matas, cortando o território dos atuais municípios Brejo Grande do Araguaia e Palestina do Pará. O conflito iniciou em abril de 1972 e terminou em janeiro de 1975. A escolha de começar o movimento guerrilheiro partindo da selva amazônica foi uma estratégia da esquerda, pois a área de conflito era desprovida dos poderes públicos e o exército brasileiro não tinha experiência em combate na floresta. Considerando que os guerrilheiros tinham o apoio dos moradores da região, pelos serviços que prestavam às comunidades, o exército tentou deturpá-los, divulgando que os paulistas (como os guerrilheiros ficaram conhecidos) eram assaltantes, estupradores e as mulheres, prostitutas, em São Paulo. Outra tática do exército foi transformar os pequenos agricultores em guias e castigar cruelmente aqueles que eram suspeitos de colaborarem com os guerrilheiros. As pessoas que se negassem a colaborar com ele eram aprisionadas e torturadas, uma forma usada para amedrontar a população e encurralar os guerrilheiros. Segundo o Sr. Francisco Marciel, um outro morador mais antigo, o modo como o exército conduziu a Guerrilha deixou seqüelas visíveis, até hoje, em alguns munícipes, principalmente naqueles que serviram forçosamente de guias. Segundo ele: [...] o pior de tudo, foi os combates dos soldados contra os guerrilheiros. Eles (os guerrilheiros) era gente boa, compravam mercadorias da gente aqui, eles eram pessoas refugiadas do PC do B. Já os soldados tiravam o povo da roça, empatando o povo de trabalhar para se transformar em guias do exército dentro da mata [...]. [...] os soldados do exército bateram, espancaram e amedrontaram todos aqueles que eram suspeitos de saber onde os guerrilheiros estavam. Em suma, em três grandes combates o exército, envolvendo aproximadamente 10.000 homens, assassinaram brutalmente aqueles que ficaram na história como os Guerrilheiros do Araguaia (Entrevista gravada em dezembro de 2006). Ele conta, ainda, que, no ano de 1970, o Governo Federal, cujo presidente era o General Emílio Garrastazu Médici, utilizando o rádio, meio de comunicação mais acessível à época, anunciou que iria construir a estrada da Transamazônica. Essa construção também é uma lembrança revitalizada na memória do seu Marciel: [...] foi uma surpresa para nós, peguei pelo rádio que o governo ria construir uma estrada por nome de Transamazônica, saindo de João Pessoa até a divisa do Brasil com a Bolívia. Só que ela iria ser efetuada do Estreito para cá, para lá ela já era ligada e depois virava Transamazônica (Entrevista gravada em dezembro de 2006). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 7 Outro morador, entre os mais antigos, o senhor João Bezerra Diniz, também narra esse episódio marcante para suas vidas: [...] eu vi no rádio o presidente Médici dizendo que ia fazer uma estrada chamada Transamazônica, que iria cortar de João Pessoa até chegar em Humaitá, no Amazonas. [...] aí eu fui lá em Araguatins e disse para o Baiano Vermelho: Baiano, vai acabar esse negócio de motor, aqui, nesses dias, não vai custar muito não, vai passar uma estrada aqui por perto. Ele ficou duvidando, ai eu disse para ele: – aí vem umas máquinas pesadas que nunca achou um pau para dá mais que dois empurrão. Tu pode ligar o rádio que vai passar de novo (In FERREIRA, 2002). Com a construção da rodovia, no início na década de 1970, e dos lotes de terra doados pelo governo, por meio do Instituto Brasileiro de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, vieram inúmeras famílias, ocasionando um outro fluxo migratório para a região. Este fluxo resulta da propaganda enganosa do governo, de “dar”, às margens da rodovia, um lote de terra de 100 hectares, casa e salários referentes aos seis primeiros meses, para quem ali viesse a se estabelecer, além de assistência técnica e crédito com juros baixos. Ainda de acordo com o Plano de Integração Nacional – PIN, lançado em junho de 1970, seria destinado um percentual de 30% de fundos de incentivos fiscais para financiar a construção de 5.000 km da estrada Transamazônica – (BR 230), ligando o nordeste à Amazônia. Segundo o comunicado oficial do governo, essa rodovia atravessaria a Belém Brasília, na altura de Marabá, às margens do Tocantins, para, em seguida, cruzar a bacia do Xingu e Tapajós e alcançar Humaitá, onde se encontraria com a estrada Porto Velho – Manaus. Com seu 1750 km, a estrada poderia se chamar Transamazônica. Este foi o discurso oficial, na prática ocorreu o inverso, os nordestinos serviram de cobaias para dar sustentáculos a um plano ambicioso do governo federal – que lançou o projeto oficial de colonização, que era unir “homens sem terra no Nordeste à terra sem homens na Amazônia”. Mas somente os militares e grandes fazendeiros foram privilegiados, enquanto os migrantes foram simplesmente jogados às margens da Transamazônica “recebendo” apenas a terra. Até os produtos cultivados pelos colonos eram escoados em lombos de animais, carroças e, às vezes, nas próprias costas dos colonos, pois a maior parte dos produtos era colhida em épocas de fortes chuvas, o que piorava ainda mais o tráfego nas vicinais. 8 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará O fato é que o governo criara a impressão que, com tais projetos, era possível produzir um excedente de alimentos básicos, como feijão e arroz, a fim de compensar a perda da produção, decorrente da concentração, cada vez maior, no sul do Brasil, da produção de soja para exportação. Mas como seria possível produzir uma grande quantidade de alimentos se os colonos receberam do governo somente as terras. Em vista disso, praticavam ‘mal’ a agricultura de subsistência. Antes da colonização, a região era desprovida de centros urbanos que pudessem atender às necessidades sociais, econômicas e culturais da nova população do meio rural. Por isso, além das agrovilas, eram previstos as ‘agrópolis’, que eram pequenos centros urbanos, e as ‘rurópolis’, que deveriam oferecer maior amplitude de serviços. A agrovila era a concretização da agrópolis, como se fosse um bairro rural, construída num espaço de 10 km, às margens da rodovia, no meio da selva amazônica, com capacidade para atender até 70 famílias, com escolas primárias, igrejas, escritório do Banco do Brasil, posto de comunicações e de saúde. Seriam nas agrovilas que os colonos encontrariam seu ponto de apoio e moradia, mas faltou infra-estrutura que possibilitasse melhores condições de vida para os moradores. Durante o dia, os colonos iriam trabalhar em seus lotes de terra, cuidando de seus afazeres agrícolas e, à tarde, voltariam para casa, na maioria das vezes, situadas nas agrovilas, carregando ferramentas de trabalho e uma vasilha para pôr água. A construção dessas rodovias substituiu os meios de transportes aquáticos (pequenas embarcações) existentes, tradicionalmente, na Amazônia, pelo terrestre, proporcionando, assim, mais agilidade e rapidez no escoamento de mercadorias e no deslocamento de pessoas. A região ganhou outras formas de desenvolvimento, importando mercadorias para o consumo local e exportando minérios ou produtos de origem florestal. Entretanto, esse “desenvolvimento” não chegou para os pequenos colonos. Aqueles que moravam nas vicinais ou agrovilas continuaram isolados. As rodovias serviram mais para retirar matéria-prima, como o minério e madeiras da Amazônia, que era vendida para outros países por preços irrisórios, provocando ainda mais o empobrecimento da região. A construção de rodovias, nessa região amazônica, embora importante, desapropriou muitos grupos indígenas (Figura 23), que há séculos habitavam esta área, e, por não ser bem “planejada”, pouco contribuiu para melhorar a situação de vida dos antigos e novos habitantes, iludidos pelas grandiosas promessas governamentais. Figura 23 – Índios da Tribo Suruí-Sororó Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 9 Fonte: Casa da Cultura de Brejo Grande do Araguaia. Alguns anos após o término da rodovia, o governo cortou os investimentos que eram necessários para a conservação da mesma. A famosa Transamazônica ficou quase intrafegável no inverno e, nos meses de sol, os buracos e a poeira dificultavam sobremaneira o tráfego. Com isso, os colonos ficavam cada vez mais isolados, sem ter como comprar ou vender sua produção. Sobre isso relata o senhor João Bezerra Diniz, outro dos moradores antigos da região: [...] o primeiro fracasso da estrada foi em 1974, que embrejou tudo, naqueles lugares de corte estourou tudo, aí eles drenaram, aí melhorou, aí de 80 para cá foi abandonada de vez e nós não tinha condição de sair para vender o legume e comprar as coisas para casa (In FERREIRA, 2002). Diante dos fatos, a situação para os militares não era das mais confortáveis, pois eles precisavam, a qualquer custo, integrar a Amazônia para não entregá-la a grupos estrangeiros que ameaçavam invadi-la, além da seca que assolava o nordeste e da baixa produção de produtos agrícolas básicos, para atender às regiões sul e sudeste do Brasil, que concentravam todas as terras produtivas no cultivo de soja para exportação. Diante do novo caos que se estabelecia, o governo, mais uma vez, tentava, a qualquer custo, atrair pessoas, sobretudo do nordeste, para colonizar a Amazônia, com promessas tentadoras, que, segundo discurso do governo, sofria uma calamidade natural – Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 10 a seca, e do estado de Goiás (atualmente Tocantins), por se tratar de uma região de fronteira. Sobre essa colonização, o Presidente do INCRA, à época, senhor José de Moura Calvacanti, discursou, e, contundentemente, posicionou-se: [...] Virão cerca de cem mil famílias, mas, não virão como arigós, de lamentável minoria para a Amazônia. [...] Agora, os nordestinos serão localizados em colônias na margem da Transamazônica e contarão com total assistência governamental, inclusive casas, terra de boa qualidade e ainda assistência social [...] (In FERREIRA, 2002). Segundo o senhor Alcides Pereira da Silva, um dos migrantes, e morador de Palestina do Pará, o INCRA disponibilizava até carros para buscar migrantes em qualquer parte do Brasil e, sobre isso, afirmou: [...] bastava só a pessoa ir lá na sede do INCRA e dizer que queria morar na Transamazônica, que o INCRA mandava um caminhão buscar a família e as coisas dele de qualquer lugar (In Ferreira, 2002). Com isso, as pessoas que estavam sofrendo, por falta de alimentos em seus locais de origem, vieram arriscar sua sobrevivência na Amazônia, entretanto, mais uma vez, foram enganados pelos discursos escabrosos do governo, como nos relata a senhora Raimunda Siqueira Gomes Leal: [...] nessa região, aqui nossa, o governo não deu casa, não tinha escola, não tinha nada, nós vivemos aqui isolados, quem sobreviveu é porque teve sorte e foi só trabalhando (In FERREIRA, 2002). Para a senhora Zenaide Lopes Guimarães, migrante, e, atualmente, professora na Vila do Porto Jarbas Passarinho (distrito de Palestina do Pará), a doença - especialmente a malária - foi um dos grandes obstáculos que os migrantes encontraram: [...] a maior dificuldade que encontrei aqui foi a doença, vi muita gente morrer de malária, no hospital de Marabá, de Araguatins e aqui mesmo, gente morria de malária direto, a vida aqui era muito difícil. Muitos colonos não resistiram, vendo seus familiares morrer de doença, venderam os lotes e foram embora. Os que permaneceu no local tiveram que conviver com a falta de um posto de saúde e também a falta de transporte para que pudessem se locomover rapidamente (Entrevista gravada em dezembro de 2006). Simultaneamente à colonização, por pequenos agricultores, houve também a colonização por fazendeiros, estes receberam do Governo Federal as chamadas glebas, correspondentes a 604 alqueires de terra (em disparidade aos 100 hectares “doados” aos pequenos agricultores), essas ficavam a uma distância de 10 km da rodovia, ou seja, depois da área demarcada para a colonização, conforme relatos do senhor Arlindo da Cruz Brito, emigrante do Estado da Bahia: [...] vendi tudo que tinha lá (na Bahia) e vim para cá em 1978, aqui não tinha mais terra vazia, aí eu comprei uma gleba, a 10 km da Vila Santana Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 11 (atual distrito do município de Brejo Grande do Araguaia), depois comprei os lotes da frente até chegar na estrada, aí busquei todos os meu familiares e fomos trabalhar dentro dela (In FERREIRA, 2002). Os pequenos agricultores que foram assentados pelo INCRA, a partir de 1971, quando começou oficialmente a demarcação de terra na região, receberam um lote de terra medindo 100 hectares. Mas diante das dificuldades enfrentadas pela falta de apoio do governo, da inexistência de estradas para escoamento da produção e das péssimas condições de vida, muitos colonos começaram a vender seus lotes, o que proporcionou um aumento de latifúndios na Transamazônica. O INCRA “doava” aos migrantes apenas 100 hectares de terra, mas houve pessoas que utilizaram estratégias ilegais, conforme nos relata o senhor Francisco Marciel Lima, migrante e atual morador de Palestina do Pará: [...] A colonização da nossa região virou fazenda. O Antonio do Carlos fez uma treita na frente da Transamazônica, ele pegou uma certa quantidade de pessoas dele, para tomar a frente da estrada, para que ele pudesse pegar por trás, aí ele fundou uma fazenda muito grande. [...] E, outros iam comprando os lotes dos outros colonos, o que resultou é que a área de colonização se transformou quase toda em fazendas (Entrevista gravada em dezembro de 2006). Dos colonos que “receberam” os 100 hectares de terra do governo, poucos mantêm esta propriedade. A região está quase toda nas mãos de latifundiários, que transformaram a área em pastagem para a criação de gado. Os colonos que venderam seus lotes para os latifundiários, mais tarde, começaram a trabalhar para os próprios fazendeiros, a fim de garantir a sua sobrevivência, e outros foram embora para outras áreas de colonização ou para seus locais de origem. Os latifundiários vêem na terra seu próprio bem e nela cultivam lavouras, criam gados e se apropriam da mão-de-obra barata, ou seja, dos migrantes, para a feitura de serviços, como: roços, fazer cercas, cuidar de gado, zelar de lavoura etc. A abundância de mão-de-obra era tudo que os fazendeiros precisavam para dar procedimentos aos seus serviços, com custos cada vez mais baixos, pois, à medida que aumentava a procura por estes serviços, diminuíam os preços pagos por essas atividades. Fatores que revitalizam o contraste na Amazônia, ou seja, enquanto alguns - os pequenos agricultores, lutam pela sobrevivência, outros – os latifundiários, conseqüentemente, ficam ainda mais ricos. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 12 A maioria dos migrantes não sabia e não sabe ler nem escrever, vivia e vive basicamente do trabalho no campo, de fazenda em fazenda, para garantir o pão de cada dia. Os chamados “peões” são “atraídos” por uma espécie de “gato” (encarregado de executar um determinado serviço na fazenda), quando as atividades chegavam ao fim, eram dispensados. A saída era procurar outro emprego, em outra fazenda, isso se tornou um “círculo vicioso”. O gigantesco projeto do Governo Federal, de povoar, inicialmente, com 100 (cem) mil famílias, o grande vazio demográfico no meio da selva Amazônica, às margens da Transamazônica, chegou ao fim com apenas 10 (dez) mil famílias, ou seja, 10% do total propagado pelo governo. O fracasso do processo de colonização se deu porque o governo não honrou com os compromissos assumidos com os colonos. Sob essa ótica, afirma Hebett (1989, p. 88): Os frutos da colonização oficial não corresponderam, nem de longe, às expectativas despertadas por uma propaganda irresponsável motivada por objetivos políticos ou puramente comerciais. Seria injusto atribuir ao INCRA todas as frustrações. Muitos dos fracassos registrados se devem muito mais à política agrícola global do Estado. O INCRA foi incumbido de dar seguimento ao Programa para que o mesmo pudesse alcançar seus objetivos – ocupar a região demograficamente vazia, proporcionar a segurança interna, minimizar as tensões sociais, principalmente a nordestina, sem mexer com a elite agrária existente na região. Sob esse enfoque, Ianni (1978) assinala que, na prática, ao mesmo tempo em que crescia extensivamente o capitalismo na região, havia uma espécie de reforma agrária, em que os trabalhadores rurais, desempregados ou super explorados, camponeses e operários buscavam terras virgens ou devolutas para ali construir seu lugar. ATIVIDADES ECONÔMICAS PREDOMINANTES Como podemos observar, a ocupação de Palestina está, historicamente, desde o início, ligada à atividade agrícola, uma vez que seus primeiros moradores partiram de suas regiões de origem, a maioria do nordeste do País, em busca de terras férteis para o plantio, fixando, na região, a cultura de arroz, de milho, de feijão e de mandioca. Mesmo com a importância, já demonstrada, na cultura de grãos, em particular a de arroz, o município não dispõe de uma estrutura de armazenamento adequada, forçando os Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 13 produtores a venderem sua produção, inclusive na “folha”, às beneficiadoras locais. Estas passam a estocar a produção até a entressafra, quando, então, o arroz é vendido a preço mais elevado. A ausência de incentivos governamentais para o desenvolvimento de atividades agrícolas e a carência de infra-estrutura a estas atividades são responsáveis pelos baixos índices de produtividade e, conseqüentemente, pelos reduzidos ganhos reais do produtor. Quanto ao extrativismo, ainda predomina a extração de babaçu (Figura 24), representando importante complemento na renda familiar dos pequenos produtores, apesar dos processos de derrubadas dos babaçuais ter se intensificado nos últimos anos, em decorrência do desenvolvimento da pecuária. Figura 24 – Coco babaçu Fonte: Casa da Cultura de Brejo Grande do Araguaia. Esta atividade, além de ser considerada sinal de pobreza, é realizada exclusivamente por mulheres, as chamadas “quebradeiras de coco”, que são discriminadas e, às vezes, ameaçadas na luta pela preservação dos babaçus, já que desenvolvem seus trabalhos em fazendas de propriedade de terceiros. Esse conflito decorre do fato da quebra do coco se dá no próprio local de extração, ocasionando, conforme alegação dos fazendeiros, o ferimento das patas do gado pela casca do coco quebrado. Apesar de ser considerado de pequeno valor, o babaçu gera inúmeros subprodutos que ajudam na complementação da renda familiar. A casca serve para produzir o carvão, o bagaço é utilizado como ração para pequenos animais e a amêndoa dá origem ao azeite e até mesmo à produção de sabonete artesanal. 14 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Neste sentido, existe um projeto, em andamento, que pretende fortalecer o desenvolvimento dessa atividade, denominado “Mulheres, Participação e Preservação do Meio Ambiente”, uma iniciativa do Sindicato dos trabalhadores Rurais, encaminhado à Embaixada do Canadá, para captar recursos necessários à sua implementação. O projeto prevê que os produtos possíveis de serem derivados são: chocolate, azeite, cocada, bolo, sabão, sabonete e ração. Registra-se, também, no município, a atividade pesqueira, desenvolvida, principalmente, na sede e nas Vilas Santa Izabel do Araguaia e Jarbas Passarinho, devido suas localizações ribeirinhas. Mesmo caracterizando uma alternativa viável ao desenvolvimento econômico, o município não vem sendo explorado com este fim. A fim de fortalecer a atividade pesqueira foi fundada a colônia de pescadores, cuja sede funciona na cidade de Araguatins, município vizinho, no estado do Tocantins, no entanto, inexiste estrutura de apoio e de escoamento da produção para outros mercados. A atividade industrial está concentrada basicamente nos setores oleiro-cerâmico e de produção de alimentos. O primeiro restringe-se à produção de tijolos e telhas, por meio de quatro olarias, sendo três de pequeno porte, localizadas junto à área ribeirinha e uma de grande porte, pertencente à Associação de Moradores de Palestina do Pará, localizada na estrada de acesso à Rodovia Transamazônica, considerada pelos oleiros a mais importante, com uma capacidade de produção de dez mil tijolos/dia. Com o objetivo de gerar empregos e propiciar a melhoria das moradias dos habitantes do município, a partir da utilização de argila, recurso natural disponível na região, aos poucos a palha de babaçu e a taipa são substituídas pela alvenaria. Registra-se, ainda, uma produção artesanal de banco de madeiras, com assento em couro de gado, somente para o mercado local e os trabalhos em palha, de uma moradora da sede do município, dona Eva, que confecciona bolsas, cestos, peneiras, e outros produtos, já divulgados pela Casa da Cultura de Marabá. A atividade comercial é incipiente. Existem, em média, 80 estabelecimentos varejistas de apoio local, cujas fontes abastecedoras são de outros centros urbanos e até de outros Estados, como o Maranhão e Tocantins, por exemplo. O setor de prestação de serviços conta com apenas alguns hotéis, tipo dormitório, posto de combustível, feira livre para o pequeno produtor, açougues e os serviços de água, correios e delegacia, estes últimos, instalados em prédios da Prefeitura. Não existe matadouro, mercado municipal, agência bancária, dentre outros serviços essenciais à comunidade. A população fica à mercê dos serviços oferecidos na cidade de Araguatins, no estado do Tocantins, ou em Marabá. Não existe sistema de esgoto e drenagem pluvial, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 15 embora não haja erosão e nem empoçamento de água no leito das vias urbanas, devido ao solo ser arenoso. Por estar inserido em uma região onde os problemas sociais se acumulam em conseqüência ou priorização de interesses que beneficiam uma parte da população – aquela que detém os grandes empreendimentos econômicos, voltados para pecuária, agricultura e extrativismo – os movimentos sociais, na medida do possível, tentam influenciar nas decisões políticas da comunidade, por intermédio de ações populares e inúmeras reivindicações encaminhadas ao poder público local, que, na maioria das vezes, não são atendidas, tampouco respeitadas pelos governantes. Os reflexos dessa segregação há muito repercute negativamente e se faz sentir no meio ambiente, na saúde, na educação, enfim, na qualidade de vida da população. Nesse sentido, a Guerrilha do Araguaia, a título de exemplo, se manifestou positivamente, uma vez que a população, mesmo reprimida, adquiriu forças para se organizar, não só no sentido de reivindicar o atendimento de suas necessidades básicas, mas também de fazer justiça, às vezes, ‘com as próprias mãos’. Além de Associações de Moradores e Sindicato de Produtores Rurais, o município conta, atualmente, com mais duas entidades sociais - a Associação das Mulheres de Palestina e o Clube de Jovens. Ambas não dispõem de sedes próprias. As reuniões da Associação das Mulheres são realizadas nas residências das associadas e do Clube de Jovens na Escola Municipal 21 de Abril. A primeira tem, como objetivo, a proteção e a assistência às mães carentes e, a segunda, tem como principal finalidade a educação de jovens para serem integrados ao mercado de trabalho. A população carece de incentivos à cultura e ao lazer, pois as opções são raras, mesmo existindo recursos naturais possíveis de serem explorados para este tipo de atividade, como também para o turismo. Um desses é o rio Araguaia, cujas praias Beira Rio (Figura 25) e Pedral da Viração, que distam, aproximadamente, de 2 a 3 km, respectivamente, do núcleo urbano, da sede do município. De uma terceira praia do rio Araguaia, que banha a localidade de Santa Izabel, avista-se, no verão, a Cachoeira de Santa Izabel, espetáculo de rara beleza. Principalmente na época do veraneio, no mês de julho, estas praias são visitadas por turistas de localidades mais próximas, não banhadas pelo rio Araguaia. Figura 25 – Praia Beira Rio-Palestina do Pará Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 16 Fonte: Arquivo Público do Gabinete do Prefeito de Palestina do Pará. Acessada em 2007. Se existem no município alternativas, propiciadas pelos recursos naturais, o mesmo nem sempre acontece com outros espaços de laser. A única praça existente, além de pequena, carece de cuidados e infra-estrutura que garantam conforto e diversão à comunidade, outra opção é uma orla inacabada, num espaço privilegiado, que, também, por falta de infra-estrutura adequada e energia elétrica, vive abandonada. O futebol é o esporte mais freqüente em todo município, praticado também pelas mulheres. Para o incentivo às práticas desportivas, a Secretaria de Educação, Cultura e Desporto dispõe de uma quadra polivalente na Escola Municipal Adélia Vaz e de um ginásio coberto, que fica no centro da cidade. Estes espaços são utilizados pelos alunos e pela comunidade em geral para torneios de vôlei, basquete e futebol de salão. Existem ainda dois campos de futebol, com condições inadequadas de uso, onde são realizados torneios, disputados, inclusive, com agremiações de outras localidades. Além de bares, como o I. P. Souza Lanches, que funciona diariamente, os clubes sociais e os salões de dança, todos particulares, funcionam, na maioria das vezes, nos finais de semanas, para festas dançantes. Quanto às manifestações populares, a maioria das atividades, atualmente, não conta com o incentivo do poder público local e se refere basicamente a danças folclóricas – quadrilhas e boi-bumbá (Figura 26), como a dança da Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 17 Sussa, dos grupos folclóricos das Vilas São Pedro e Nova Vida (viração). Estas danças de origem africana foram introduzidas no município pelos nordestinos. Figura 26 – Grupo de dança folclórica boi-bumbá Fonte: Casa da Cultura de Brejo Grande do Araguaia. Ainda por iniciativa da população, foram formados dois grupos de teatro, o Independente, com aproximadamente 20 pessoas e o Clube de Jovens, que fazem apresentações ao ar livre, por falta de espaço adequado. Em todo o município só existe uma biblioteca, localizada na sede, restrita apenas a uma sala, cujas instalações, equipamentos e pouco acervo bibliográfico, são inadequados para atividades de leitura e consulta. A principal festividade religiosa é a do padroeiro do município Sagrado Coração de Jesus, que acontece no mês de junho, organizada por uma comissão constituída de pessoas da comunidade da igreja católica. Durante nove noites, funciona um arraial, com pequenas barracas armadas em frente à igreja, sendo que, na última noite, além do arraial, é celebrada uma missa, em que acontecem cerimônias de batizado e crisma. Palestina do Pará também sofre com a cheia do Araguaia e vive momentos angustiantes provocados pela enchente. Segundo autoridades do município, mais de 500 famílias tiveram suas casas invadidas pelas águas na última enchente, como também suas Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 18 roças, sítios e fazendas, o que tem comprometido grande parte da produção agrícola. A Vila Jarbas Passarinho (Figura 27), no Porto da Balsa, ficou totalmente submersa pelas águas do rio Araguaia, o que obrigou as famílias a buscarem abrigos em barracões cedidos pelo DNER, no município de Araguatins, estado do Tocantins, como também às margens da Rodovia Transamazônica, do lado do Pará. Figura 27 – Vila Jarbas Passarinho – cheia de 2005 Fonte: Arquivo Público do Gabinete do Prefeito de Palestina do Pará. Acessada em 2007. Desse modo, se pode concluir que este município se apresenta totalmente carente, tanto em termos infra-estruturais como econômicos. Neste último, se concentra a maior responsabilidade com o futuro do município e, para onde, prioritariamente, devem ser direcionados esforços, no sentido de solucionar os problemas que inibem o desenvolvimento das atividades agrícolas, pecuárias, extrativistas e comerciais, que, sem dúvida, trarão retornos financeiros capazes de reverter o quadro de pobreza que assola o município. O perfil econômico, por exemplo, precisa ser reformulado, principalmente no que se refere à atividade agrícola, para que esta atividade possa se desenvolver em nível mais elevado, em todo território municipal, uma vez que, nos moldes em que é desenvolvida, na maioria das localidades (agricultura de subsistência), apresenta baixos rendimentos, sem contar com os entraves da comercialização que agravam mais ainda essa situação. O reconhecimento da rede de pontos lingüísticos, previamente selecionados, proporcionou produzir os dados sobre as localidades (informações históricas, atividades culturais, condições sócio-econômicas, fotografias de locais e eventos representativos, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 19 assim como sobre os indivíduos que se envolveram com a pesquisa, sobretudo os sujeitos). Bem como proporcionou, também, informar às lideranças locais sobre a importância e finalidade deste tipo de pesquisa, isso permitiu que algumas dessas pessoas, em alguns casos, auxiliassem na seleção dos sujeitos. Este reconhecimento permitiu também iniciar a mediação dos diálogos entre pesquisador e sujeitos (o que inclui desde a concessão à realização das entrevistas), cujo perfil está delineado no item seguinte. 2.3 SUJEITOS Seguindo os princípios do método Geolingüístico e os aportes da Dialetologia, devem ser respeitados, na composição da população-amostra, alguns critérios que configurem o perfil desejável do sujeito para o tipo de pesquisa que se propõe realizar. Assim, os sujeitos, desta investigação, deveriam atender aos seguintes requisitos: serem nativos do ponto lingüístico pesquisado; não terem vivido mais de 1/3 de suas vidas fora do lugar onde nasceram; quanto ao nível socioeconômico, todos deveriam possuir renda igual ou inferior a dois (2) salários mínimos vigentes à época da pesquisa; quanto à faixa etária, deveriam estar situados em uma das duas: adulta (a partir de 50 anos) e jovem (entre 18 e 30 anos), pela impossibilidade de se documentar três diferentes faixas etárias, pois demandaria mais tempo e acarretaria mais custos. E, também, porque pessoas de faixas etárias mais distanciadas, permitem confrontar mais adequadamente os usos que fazem da língua, o que propicia a análise da variação e da mudança lingüísticas, mais evidenciadas quanto mais distantes forem as faixas etárias; quanto à escolaridade, deveriam estar em um dos dois níveis: analfabetos ou com baixa escolarização (até a quarta série do Ensino Fundamental) ou com o Ensino Médio completo; quanto ao sexo, homens e mulheres. O Gráfico 5 reúne o perfil desejável para a composição da população-amostra, deste tipo de pesquisa. 20 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Gráfico 5 – Perfil desejável dos sujeitos SUJEITO SEXO RENDA ESCOLARIDADE FAIXA ETÁRIA Ensino Médio M 02 B 04 18 a 30 anos (jovem) F 02 B Ensino Médio M 02 B Até a 4ª série do Ensino 04 Fundamental (zona rural) 50 a 65 anos (adulta) F 02 B Até a 4ª série do Ensino Fundamental (zona rural) Os critérios de seleção dos sujeitos, deste tipo de pesquisa, têm, nessas variáveis, a referência necessária, tanto a questões lingüísticas, quanto a aspectos sociais, que as envolvem. O Quadro 6 reúne, de fato, as características dos sujeitos que, estabelecidas, constituíram a população-amostra da Microrregião Marabá, para esta pesquisa. Com exceção do fato de todos serem moradores da zona urbana. 21 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Quadro 6 – Perfil da população-amostra SUJEITOS S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM Sujeito 1 Sujeito 2 Sujeito 3 Sujeito 4 Masculino Feminino Masculino Feminino Adulto Adulto Jovem Jovem Baixa escolaridade Baixa escolaridade Ensino Médio Ensino Médio Os dados relativos aos sujeitos que constituíram a população-amostra foram produzidos por meio de 01 (um) dos instrumentos de produção de dados, a Ficha do Sujeito (Anexo B), cujo objetivo foi registrar algumas características, destes, conforme seguem. Dos oito (8) sujeitos, quatro (4) são nativos de Marabá, entre eles estão o S1MBE e S2FBE – isto é, da faixa etária adulta, com baixa escolaridade, masculino e feminino, respectivamente. O primeiro, com 61 anos de idade, católico, casado, pescador, profissão que, segundo ele, o orgulha por haver aprendido, desde criança, com seu pai. O segundo, com 60 anos de idade, católica, viúva, filha de doméstica e pai, cuja profissão era quebrar pedras, residentes em um dos bairros situados na periferia, área ribeirinha do núcleo Marabá Pioneira. Ambos são alunos de um Programa de Alfabetização para Adultos – Brasil Alfabetizado, do Governo Federal. O S3MEM e o S4FEM são masculino e feminino, respectivamente, com Ensino Médio completo, da faixa etária jovem, também residentes do núcleo Marabá Pioneira. Ele, evangélico, solteiro, filho de professora, só aos 30 anos, conseguiu se profissionalizar como torneiro mecânico. Ela, católica, casada, e, embora haja concluído o Ensino Médio, com 30 anos de idade, ainda não havia conseguido emprego formal, trabalha, em casa, como doméstica. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 22 Os outros 4 (quatro) são de Palestina do Pará. Entre eles estão o S1MBE e S2FBE, ou seja, aqueles da faixa etária adulta e de baixa escolaridade. O primeiro (S1MBE), do sexo masculino, vive no centro urbano da cidade, é filho de pai e mãe lavradores. Com 63 anos de idade, católico, casado, e, da mesma forma que os demais, também, lhes foi tirada a oportunidade de ter acesso à educação formal, e, por conseguinte, não sabe ler nem escrever. É lavrador e vive basicamente do trabalho no campo, de fazenda em fazenda, para garantir o sustento da família. O segundo (S2FBE), filha de pai lavrador e mãe quebradeira de coco, do sexo feminino, reside na zona rural de Palestina, na comunidade Viração, há uns 03 km da sede do município. Aos 57 anos de idade, católica, casada, trabalha ativamente ao lado do esposo, como lavradora, de fazenda em fazenda, para ajudar no sustento da família. Entre os sujeitos da faixa etária jovem e com Ensino Médio completo estão o S3MEM e o S4FEM. O sujeito do sexo masculino, filho de lavrador e professora, tem 21 anos de idade, é evangélico, desempregado e reside no centro urbano da cidade. O outro, do sexo feminino, filha de lavrador e doméstica, é católica, desempregada e reside em um dos bairros periféricos deste município. 2.4 MATERIAL TÉCNICO, APLICAÇÃO DO QSL, TRANSCRIÇÃO GRAFEMÁTICA DOS DADOS E CONSTITUIÇÃO DO CORPUS A realização deste tipo de pesquisa requer gravadores, fitas, pilhas e acessórios (etiquetas de identificação, máquina fotográfica, gravuras, bloco para anotação, lapiseira, etc.). Nesta pesquisa, nas entrevistas, foram usados: 01 microcassette recorder, de marca Panasonic, modelo RN – 405; 09 fitas, de marca Sony, microcassett, mc 60; pilhas Panasonic, power alkaline AA; além de papel, lápis, caneta, etc. Convém destacar, estes são apenas alguns dos pequenos custos, iniciais, de uma pesquisa de campo, com essa dimensão geográfica. Custos, estes, que exigem do pesquisador consideráveis recursos financeiros, entre outros, para custear transporte, hospedagem, alimentação, entre outras despesas, como a aquisição dos materiais técnicos listados, anteriormente, que devem ser de qualidade. Ainda há casos em que o pesquisador, ao contactar os sujeitos, constata, principalmente, a ausência de alimentação mínima, o que o faz contribuir, de alguma forma, no momento da entrevista. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 23 Todo esse aparato técnico visa, o mais possível, documentar as formas lingüísticas encontradas na localidade pesquisada, de forma segura e com qualidade. No entanto, a maioria deste material é necessária à aplicação do QSL (Anexo C), na perspectiva Geolingüística, cuja produção dos dados, relativos às ocorrências semântico-lexicais, na Microrregião Marabá, resulta desta aplicação aos sujeitos que constituem a populaçãoamostra. O QSL é um dos 3 (três) instrumentos de produção de dados em Geolingüística. Este consiste em um conjunto de questões, de cunho descritivo, cujo objetivo é investigar a designação, atribuída pelo sujeito da pesquisa a determinados objetos do mundo referencial ou imaginário, por meio da técnica da entrevista gravada. Pretende-se documentar a diversidade sinonímica, ou seja, as ocorrências lexicais usadas, oralmente, e relacionadas a um dado conceito. Configura-se como um instrumento de cunho onomasiológico34, pois se parte do ‘significado’ (‘conceito’ ou ‘noção’) para estudar suas manifestações no plano dos signos ou lexemas, unidades lexicais que nomeiam objetos, atividades, fenômenos naturais, entre outros. Segmentado em domínios, denominados Campos Semânticos (CS), procura abarcar o universo de possibilidades de identificação de elementos do mundo biossocial. Contempla questões gerais e universais, cujos resultados podem subsidiar estudos comparativos com os correspondestes dos demais Atlas estaduais, regionais, entre outros. Composto de 196 (Cento e noventa e seis) perguntas, que consistem na descrição de um dado objeto do mundo referencial ou imaginário, nomeado conforme dicionarizado, visa ampliar o universo de possibilidades dos lexemas usados em um determinado ponto lingüístico. Essa nomeação – respostas/ocorrências – proposta no QSL, serve tão somente para guiar o pesquisador. A 1ª. versão do QSL, datada de 1998, foi elaborada por um grupo de pesquisadores (lingüistas) da região Sul e Sudeste – membros do Comitê responsável por coordenar as pesquisas para a construção do Atlas Lingüístico do Brasil (ALiB). O QSL, inicialmente, seria aplicado nos pontos lingüísticos sugeridos por Nascentes (1939), no entanto, aos poucos, e, mais freqüentemente, na última década, tem sido largamente usado por pesquisadores de diferentes regiões do Brasil. E tais usos, entre outras finalidades, contribuem para o debate sobre a validade, deste, nos diversos eventos, sobre a temática, 34 Do grego onómasis, 'designação nominal', é o estudo das expressões de que dispõe uma língua para traduzir determinada noção, e parte do significado para estudar o significante. Significado e Significante são as duas faces da unidade psíquica que é o signo lingüístico, como definido, pelo pai da Lingüística Moderna, Saussure (1916). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 24 promovidos pelo referido Comitê, que reconhece e acolhe, como pertinentes, as reflexões que se impõem, e os obriga a reelaborá-lo. Ou seja, são esses mesmos usos que permitem, também, a formulação dos enunciados (das perguntas) que o compõem. A 2ª. versão do QSL, datada de 2001, visava atender à solicitação de diversos pesquisadores interessados em conhecer este instrumento e propiciar as aplicações, de caráter experimental, previstas e realizadas em diferentes pontos do país. A partir do que se revelou um instrumento produtivo para coletar dados da língua falada, mas isso não significa que ele esteja isento de críticas, entre as quais a de ser composto somente de questões fechadas. Dois aspectos ser observados quando se trata da produtividade deste instrumento, na perspectiva do método Geolingüístico. O primeiro diz respeito à relação entre os campos semânticos que compõem o QSL, à região pesquisada e aos sujeitos. O segundo, à forma como os sujeitos reagem aos tipos de enunciados que constituem o QSL. A título de exemplo, podemos citar o Campo Semântico (CS) V (Atividades Agropastoris), que pode não ser produtivo se aplicado a uma região em que tal atividade não exista ou nunca existiu, ou, mesmo existindo, o(s) sujeito(s) selecionado(s) nunca teve/tiveram ou não tem/têm nenhuma relação com elas. Quanto à formulação dos enunciados (questões), não significa que as respostas dos sujeitos devam coincidir com as propostas pelo QSL (ALiB, 2001). O que se busca é a lexia/ocorrência usada e a constatação da presença ou não de ocorrências previamente previstas no QSL. São esses fatores que podem atestar a produtividade de uso do instrumento em questão. Por exemplo, se for constatado um número considerável de questões não respondidas, por alguma razão, entre elas, por exemplo, o fato do sujeito afirmar não conhecer determinado objeto ou fenômeno, ou, ainda, afirmar conhecer, mas alegar não saber o nome, há que se revê-lo, reelaborá-lo, adequá-lo. O que, no entanto, não impede a aplicação deste instrumento, desde que o pesquisador saiba analisar a produtividade ou não, em um dado no contexto, dele, a partir do objetivo da pesquisa que se propõe realizar. Do mesmo modo, não o impede, também, de excluir ou incluir outros campos ou questões consideradas mais pertinentes à área geográfica em estudo e aos sujeitos da pesquisa, aqueles que nela vivem. Dependendo da natureza e do objetivo do estudo, por exemplo, se visa registrar o maior número possível das palavras que constituem o léxico recorrente entre pescadores, podem ser elaborados questionários específicos, da mesma forma com outras profissões, eventos, entre outros. Portanto, a utilização, na íntegra, tal como proposto, do QSL (ALiB, 25 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 2001), não é uma “camisa de força”, que engessa o pesquisador. Ele deve ser usado, na íntegra ou não, de acordo com os objetivos da pesquisa. Neste trabalho, foi usada na íntegra a 2ª versão do QSL (2001), composto de 196 (Cento e noventa e seis) questões, distribuídas em 14 (quatorze) Campos Semânticos, conforme Quadro 7. Quadro 7 – Campos Semânticos do Questionário Semântico-Lexical – QSL (ALiB, 2001) Nº do CS Nome do CS Nº Abs. CS I Acidentes Geográficos 07 II Fenômenos Atmosféricos 14 III Astros e Tempo 16 IV Flora 06 V Atividades Agropastoris 23 VI Fauna 26 VII Corpo Humano 32 VIII Convívio e Comportamento Social 06 IX Ciclos da Vida 19 X Religiões e Crenças 09 XI Festas e Divertimentos 10 XII Habitação 07 XIII Alimentação e Cozinha 08 XIV Vestiário 06 14 Total de questões 196 Fonte: ALiB (2001). A formulação inicial das 196 questões que compõem o QSL objetiva assegurar, em razoável grau de uniformidade, a intercomparabilidade dos dados produzidos, em um dado local, acrescentando-se, em alguns casos, gravuras que visam auxiliar o desenvolvimento do diálogo, no entanto, compete ao entrevistador, fazer as adequações necessárias, no momento da entrevista. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 26 Em meio a essas teias, neste trabalho, como já mencionado, inicialmente foi realizado um piloto, em caráter experimental, a fim de analisar, avaliar, a produtividade dos dados, que resulta da relação entre a aplicação do QSL, o ponto lingüístico e a populaçãoamostra, ambos selecionados previamente. Para tanto, foi selecionado o município de Marabá, um dos pontos lingüísticos, e nele aplicados estes instrumentos. O critério de seleção desta localidade residiu no fato de Marabá ser considerada a cidade pólo mais importante, pelas potencialidades sócio-econômicas, da Mesorregião Sudeste Paraense. A experiência propiciada pelo piloto é significativa, primeiro pelo reconhecimento do ponto lingüístico selecionado previamente; pela seleção da população amostra, e, na medida em que, ao produzir dados de qualquer natureza, exige, principalmente, de jovens pesquisadores, um mínimo de exercício, de preferência realizado in locu, por e com um pesquisador mais experiente, nesta área, que, como em qualquer outra, sempre será um labirinto para quem nela nunca adentrou. A abordagem do sujeito, por exemplo, exigiu calma e paciência, requereu conversa introdutória, e, só depois, bem depois, ao se perceber um momento mais “descontraído” e o ambiente (com um mínimo de ruído externo, por conta da qualidade da gravação), propícios, se convidava às pessoas a responder ao Questionário. E foi em meio a tantas dúvidas, incertezas, anseios, medos, mas, ao mesmo tempo, a curiosidade, a novidade e tantas outras expectativas, nos impulsionavam, nos motivavam, a iniciar o trabalho de campo, em caráter experimental, a partir das contribuições da Profª. Orientadora. Para a produção dos dados do piloto, foram necessários quatro (4) dias para entrevistar dois (2) sujeitos. Inicialmente, dois (2), destes dias, foram, incansavelmente, dedicados a encontrar os sujeitos com o perfil delineado, que permitisse diminuir, o mais possível, intercomparações equivocadas dos dados produzidos. Assim, se fez necessário ajustarmos a seleção dos sujeitos a um conjunto de dados que precisava estar sob controle: naturalidade, com precisão do local de nascimento, grau de escolaridade, profissão, domicílios e período de permanência em cada um deles, viagens efetuadas e duração de cada uma delas, naturalidade e profissão dos pais e renda familiar. Os ajustes, aparentemente, nos fazem pensar que são dificuldades insuperáveis. E algumas delas parecem ser mesmo. Por exemplo, encontrar o sujeito que atendesse ao perfil requerido pelo tipo de pesquisa que nos propomos a realizar não foi fácil. Houve, nesses dias de muitas caminhadas, momentos de desânimo, pois quando acreditávamos haver encontrado o sujeito, segundo o perfil traçado, faltava, a este, às vezes, apenas um item do conjunto do perfil que precisava estar sob controle. A título de exemplo, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 27 encontramos um jovem, na faixa etária estabelecida, com Ensino Médio completo, nascido em Marabá, sem nunca haver morado em outra localidade, no entanto, a profissão – guarda rodoviário – o expunha ao contato com variados dialetos, de outras localidades, o que poderia influenciar na fala dele. Somente no terceiro (3º.) dia de trabalho de campo, conseguimos encontrar os sujeitos com o perfil delineado. Assim, começamos a agendar as entrevistas, conforme convinham a eles. No dia e hora marcados, sempre iniciávamos com uma breve conversa, nos apresentando, com o objetivo de diminuir o grau de formalidade, típico deste tipo de trabalho. Essas conversas, preliminares, envolviam jogos, diversões, plantas, animais, vestuário, tempo, alimentação e cozinha, corpo humano, entre outros, sem ainda o caráter de entrevista. Informávamos da necessidade de gravar, e solicitávamos, deles, autorização, sempre concedida, sem problema. Cada sessão de entrevista durou, em média, quatro (4) horas. Houve necessidade, por exemplo, de entrevistarmos um sujeito em dois dias, e, em vários momentos diferentes, pois o mesmo, operado do coração, cansava, então era preciso parar e retornar em outros momentos. Os outros dois (2) sujeitos, devidamente contactados, foram entrevistados, no mês seguinte. O mérito, desta etapa da pesquisa, sem dúvida é testar muito mais a nós mesmos, nossa resistência física, nosso desânimo, por vezes assustador, que testar os instrumentos de método Geolingüístico, para proceder a uma análise relativa à produtividade deles, ou seja, a necessidade ou não de ajustes das questões do QSL, como reformulações e/ou supressão de algumas delas, considerando, sobretudo, aspectos históricos, sócioeconômicos e culturais e assim elaborar a versão final a ser aplicada a todos os sujeitos, bem como limites e possibilidades reais da pesquisa. Os dados produzidos, nesta primeira etapa, foram inicialmente transcritos e registrados, e, após avaliá-los, como processo metodológico adequado, tanto no que dizia respeito ao perfil desejável dos sujeitos, quanto à produtividade do QSL, optamos por considerar esses dados já produzidos não mais como piloto e sim com dados pertinentes à analise, ou seja, constituidores do corpus. Assim, demos continuidade à pesquisa no município de Palestina do Pará – o outro ponto lingüístico, com 4 sujeitos, com o mesmo perfil dos sujeitos de Marabá. Perfazendo, então, dois pontos lingüísticos e um total de 8 (oito) sujeitos, 4 em cada localidade. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 28 Em geral, os sujeitos que constituíram a população-amostra desta pesquisa demonstraram boa vontade para responderem as questões propostas (196) do QSL. Ao mesmo tempo, observamos, nos escolarizados, uma aparente intranqüilidade, talvez, pela (in)certeza quanto ao conceito de “certo” ou “errado” sobre as respostas dadas, e por saberem que uma das características do perfil do sujeito era haver concluído o Ensino Médio, e, assim, deduziam que, de certa forma, estavam sendo avaliados por este nível de escolaridade. Da mesma forma que a sociedade, de uma maneira geral, costuma avaliar as pessoas pela maneira como se expressam oralmente. Fator este ainda mais evidente na entrevista com um dos sujeitos, do sexo feminino e Ensino Médio completo, que recorria, com o olhar, quase sempre, ao seu cônjuge, para confirmar ou não as respostas dadas, e que, a pedido dela, permaneceu no local da entrevista para acompanhá-la. Paradoxalmente, os sujeitos da faixa etária adulta, de 50 a 65 anos, analfabetos ou com até a 4ª série do Ensino Fundamental, demonstraram menos “timidez” para responder ao Questionário, talvez pelo mesmo fator, mas diametralmente inverso, ou seja, sabiam que o nível de escolarização, no caso deles pouca escolaridade, era um dos elementos que constituía o perfil desejável para que fossem entrevistados. As respostas, naturalmente, eram justificadas com histórias de vida, especialmente as relacionadas ao labor, que, às vezes, emocionava, neste caso, um dos sujeitos do sexo feminino. Em todas as entrevistas foram gravadas tanto as falas dos sujeitos como as do pesquisador, no entanto, só foram transcritas as respostas referentes às questões propostas pelo QSL, de forma grafemática, conforme os sinais definidos por Marcuschi (1986), para este tipo de trabalho. Este tipo de transcrição, convencionado para aspectos semânticolexicais, é uma tentativa de representar, o mais possível, a fala, que é diferente da ortografia, forma padrão da escrita da língua, como, por exemplo, menino(forma ortográfica) e mininu(forma grafemática). Os dados selecionados para formação do corpus foram constituídos pelas lexias (formas lingüísticas) que caracterizam, somente, variação semântica, ou seja, mudança de significado do signo lingüístico. Aquelas que caracterizam somente variação de natureza fonética, por não alterarem o significado, como, por exemplo, troca de fonemas, como /g/ pelo /k/, em gangorra/cangorra; de gênero, como /u/ por /a/, em gêmiu/gêmia; de número, como /ø/ por /s/, em coscaø/coscas, entre outras, foram agrupadas e passaram a equivaler a uma única ocorrência; como, também, para efeito de análise, foi considerada apenas a primeira lexia dada como resposta, pelo sujeito, à mesma questão, as demais foram excluídas, mesmo que registradas. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 29 2.5 ELABORAÇÃO DE TABELAS, CARTAS LEXICAIS E ANÁLISE DO CORPUS A organização das ocorrências de natureza semântico-lexical, gravadas e transcritas, em Tabelas, resultantes da aplicação do QSL, encontradas na fala dos moradores da Microrregião Marabá, ao mesmo tempo em que favoreceu proceder a uma análise de base quantitativa, por permitir identificar as lexias de freqüência igual ou superior a 75% e nãocoincidentes com as propostas pelo QSL (ALiB, 2001) – objeto de estudo desta pesquisa – permitiu selecionar, dentre estas, aquelas passíveis de serem cartografadas e os elementos para a análise qualitativa. A cartografação é o registro, em Cartas Lingüísticas, no estudo em questão, do tipo lexical, ou seja, de diferentes expressões, lexias, palavras, encontradas, na fala dos sujeitos, empregadas para nomear um mesmo conceito. A cartografia é, portanto, uma maneira de representar a distribuição diatópica, assinalando a presença/ausência de ocorrências semântico-lexicais e de associar essas variáveis às diatrásticas, do tipo: gênero, sexo, faixa etária e grau de escolaridade e o nível sócio-econômico dos sujeitos. Inicialmente, foi elaborado um quadro para cada ponto lingüístico da Microrregião Marabá, por questão e campo semântico e nele registradas graficamente todas as ocorrências semântico-lexicais, por sujeito; bem como foi usado o símbolo NR (não respondeu) para indicar ausência de respostas), a fim de, além de constituir um acervo lexical, contrastar sexo, grau de escolaridade, faixa etária e pontos lingüísticos, e também permitir uma visualização de todas as ocorrências encontradas, por questão e campo semântico, o que possibilitou compará-las às lexias propostas pelo QSL, para identificar as não-coincidentes, entre ambos, tomando-as por base para a análise. Os resultados obtidos possibilitam nos aproximar, quem sabe, o mais possível, do estabelecimento de formas semânticas, recorrentes na região pesquisada, ou seja, definidoras da(s) norma(s), segundo Coseriu (1982), e, portanto, caracterizadora(s) da comunidade lingüística em questão. Material, este, objeto de análise do Capítulo III, bem como a relação desta com práticas educativas que se processam nesse espaço amazônico, mais especificamente o escolar. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 30 31 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 3.1 FACES SECRETAS DAS PALAVRAS Penetra surdamente no reino das palavras. Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra... Trouxeste a chave?[...] (Carlos Drummond de Andrade. Procura da Poesia Poesia.) O poeta da linguagem, o poeta da palavra, como Drummond era homenageado, como poucos soube ser um ‘adversário’ à altura do poder da palavra. Não se furtava de ‘lutar’ com elas, mesmo sabendo ser a luta mais vã. A exemplo de Drummond, no poema epígrafe, este Capítulo III é um convite a “penetrar no reino das palavras”, das ocorrências semântico-lexicais, encontradas na Microrregião Marabá. Cujas trilhas, a exemplo do labirinto da bela princesa Ariadne, foram adentradas, como descritas no Capítulo II. Imersas nas enchentes que a banham, literalmente, imprimindo em cada uma as faces de seus usuários, como bem afirma Cunha (2004): Com a palavra criaram-se e destruíram-se mundos, selaram-se destinos, elaboraram-se ideologias, proferiram-se maldições e blasfêmias, expressaram-se ódios, mas também com ela – e só com ela –, em tantos e tão desvairados povos, falou-se de amor, consolaram-se aflições e levaram-se preces ao seu Deus. Ela tem sido, através do tempo, a mensageira do bem e do mal, da alegria e da dor. Para penetrar ‘surdamente no reino’ dessas ocorrências semântico-lexicais, nesta Microrregião, foi preciso boiar sempre, como há mais ou menos 1 (um) ano, ao sobreviver a uma das muitas “enchentes” neste Mestrado – o Exame de Qualificação – diante daquela douta Banca Examinadora, quando minha mente havia sido tomada por um dilúvio. 32 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará De um lado, era preciso responder a razão que me levava a me desafiar nesta aventura, neste empreendimento, enfim, nesta pesquisa. Por outro lado, já adentrando aquela estreita faixa de terra, entre os rios Tocantins e Itacaiúnas, não havia mais como voltar, o jeito era “pisar na várzea”, “na lama” e “no sangue” dos náufragos, era preciso “mergulhar” e “boiar”. E assim o foi... durante mais 1 (um) ano. Quanto à primeira questão, reitero o afirmado no início deste trabalho, que dois temas são de meu interesse estudar: língua e educação, pois têm pautado minha trajetória acadêmica, mais especificamente a educação formal. Todos os dias, a sala de aula, os alunos, me desafiam, e com eles a complexidade do cotidiano escolar, em que ressoam outros cotidianos – o da família, o da igreja, o do grupo, o da cidade, relacionados a diferentes culturas, múltiplas linguagens, imagens e discursos plurais, redesenha-se, assim, um cenário em que língua e cultura, saberes indissociáveis que são, já implicam multiplicidades e desafios permanentes. Enquanto isso, a escola tende a hierarquizá-los e a fragmentá-los, artificialmente, marcada que é pela ordem dos livros didáticos sob a hegemonia da escrita. Nessa maré multicultural, as palavras rompem o silêncio e invadem os limites do espaço e do tempo. Um dos nossos desafios, como educadores, é trabalhar, segundo Almeida: [...] nesse universo de pessoas com suas confusas histórias de oralidade, de alfabetização, de escrita e também suas novas histórias de habitantes da atual sociedade de imagem e som (2001, p. 21). Então, o que me instigou, a me desafiar, deriva da docência – ser professor. Quanto à segunda questão, o adentrar, este é necessário para professor ser. E ser, nesse universo conceitual, pressupõe uma atitude de mediador do conhecimento, produzido socialmente e significado culturalmente, pela mobilização dos “fios” que o tecem e dos “fios” que nós, alunos e professores, trazemos de nossas próprias histórias. Tecem-se, assim, novos conhecimentos, ou novos olhares sobre os mesmos. Mas isso requer se apropriar de um conjunto de saberes lingüísticos necessários a um ensino de língua ‘materna’, mais honesto, em meio à diversidade lingüístico-cultural, sabendo-se que o acervo lingüístico de uma dada comunidade 33 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará espelha a própria história da mobilidade sócio-espacial do homem. Isso implica compreender as redes de saberes e poderes e os discursos sobre estes. Portanto, ensinar – ser professor – exige construir, produzir conhecimento. A constituição deste capítulo visa, portanto, situar a variação lingüística nos fatos da linguagem, resguardados os limites que nossa compreensão alcança, com tudo o que estes fatos comportam, desde aqueles relativos à sociedade, história, língua, identidade, educação, entre outros, delineados no Capítulo I. À luz dos aportes teórico-metodológicos da dialetologia, da geolingüística, da sociolingüística, e da norma lingüística, esta reflexão se insere na correlação, mais especificamente, da variação semântico-lexical com outras abordagens, em especial, educação e cultura. Para dar conta deste estudo, delineia-se, aqui, um breve panorama do fenômeno da variação lingüística; seguido da descrição, tabulação e cartografação; e interpretação e análise quantiqualitativa das ocorrências semântico-lexicais encontradas na fala dos moradores da Microrregião Marabá. Entre estas, priorizamos aquelas cuja freqüência foi igual ou superior a 75% e nãocoincidentes com as propostas pelo QSL (ALiB, 2001), a fim de estabelecer uma comparação que permitisse configurar as lexias encontradas na região pesquisada, contextualizada no Capítulo II. E, a partir desses dados, identificar ou não o estabelecimento de uma norma semântica, caracterizadora e definidora do falar local, bem como chamar a atenção para a necessidade da escola incorporar o estudo das variações lingüísticas como parte de um saber necessário à formação de um sujeito reflexivo, capaz de aprender a respeitar as diferenças e assim ajudar a construir uma sociedade mais solidária, justa e democrática e, por fim, a escola deve entender que saber uma língua (saber a gramática de uma língua) não tem nada a ver com a ortografia desta. São dois saberes diferentes. Um é natural, o outro é artificial. Por isso, são necessárias pesquisas que descrevam então como são as línguas, como funcionam e os usos que delas fazem seus falantes. A pesquisa em foco é um empreendimento científico que se insere nessa descrição, como premissa básica para a compreensão do comportamento das 34 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará palavras e isso está relacionado com mentalidades, concepções e crenças dominantes no período e com as estruturas, formas sociais, em vigor na época. Que saberes lingüísticos circulam este universo escolar e nele a questão do ensino na Microrregião Marabá, localizada em um espaço que denominamos amazônida, cujo foco é o eterno embate entre ‘um ideal lingüístico’ e ‘vários usos reais lingüísticos ’ Ou seja – a língua – ‘carteira de identidade lingüística de pertença a uma comunidade; onde a escola é o cenário, e, nela, técnicos, professores, alunos e pais são apenas coadjuvantes e, aos legisladores, sempre protagonistas, cabe ‘decidir’ que variação será eleita padrão, norma de maior prestígio social, de status de língua ‘boa’, ‘bonita’ e ‘certa’. Por isso, não é de se estranhar os inúmeros jornais e revistas que dedicam tantas colunas aos palpiteiros, travestidos de ‘conselheiros gramaticais de plantão’, sobre a ‘boa’ e ‘certa’ língua, no entanto, recheados de equívocos sem base científica. O que encontraríamos nesses escritos não seria muito diferente do espanto dos portugueses frente à língua dos gentios, quando “chegaram” ao Brasil, que, para eles, carecia de três letras: o F, L e R, sem elas, segundo os colonizadores, não teriam Fé, Lei e Rei, e, desta maneira, viveriam sem justiça e desordenadamente. Nenhuma língua, enquanto tiver falantes, pode resistir às mudanças que ocorrem em suas estruturas com o tempo. O que cria a ilusão de que as línguas não mudam no tempo e no espaço é o fato de, na imensidão territorial do Brasil, de norte a sul, ‘compartilharmos’, apenas nos livros didáticos e dicionários, uma morfologia semelhante e um vocabulário (léxico) comum, embora saibamos que essas mesmas palavras dicionarizadas nem sempre tenham o mesmo significado em cada uma de nossas regiões, estados, cidades etc. Isso porque para (re)conhecer de fato um enunciado é preciso ir além da morfologia e do léxico, é preciso, a exemplo de Drummond, (...)Penetrar surdamente no reino das palavras(...)Elas têm mil faces secretas sob a face neutra (...). É preciso se ‘embrenhar’ no campo da semântica, bem como das intenções que comandam esse ou aquele uso. É admitir, como se admite, a diferença entre as culturas. Se reconhecemos que toda cultura está estreitamente relacionada com a ecologia (solo, clima, topografia, hidrografia etc.) e também com os fatores 35 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará etnográficos (a composição étnica da população), por que somente com a língua seria diferente Ou seja, se há diferentes culturas, por que a língua seria a mesma Assim a variação, independente do ensino de língua, aflora reiteradamente. Essas reflexões, por sua vez, nos permitem pontuar alguns elementos, evidenciados por esta análise e necessários, mas ausentes dos debates sobre políticas públicas, em especial aqueles relativos às práticas educativas. Quase sempre planejadores, gestores educacionais, docentes, entre outros, e nas propostas pedagógicas presentes na região amazônica, nas mais diferentes administrativas, inclusive na Microrregião Marabá. Rever conceitos e concepções, principalmente aqueles que dizem à língua, deve ser entendido como uma forma de interação e interlocução diversificada, possuidora de uma pluralidade de normas de uso, porém dotada de uma norma sistêmica. Com esta apresentação, nos propomos a oferecer uma explicação teóricometodológica que não ignora a relação entre variáveis lingüísticas e variáveis sociais, e atestar um paradoxo, ou seja, embora se diga que aqui “todo mundo fala português”, existem “portugueses” que valem mais que outros. Em outras palavras, onde existe variação existe avaliação e esta é social. Isso significa que não podemos esquecer que, na origem das discussões sobre o nome e a denominação, se encontra toda uma reflexão sobre a linguagem e o sentido, o significado, em razão do plano conceitual (o outro lado do signo lingüístico). Por exemplo, ainda se questiona se conceitos seriam ou não independentes de contexto ou situação e se seriam realmente universais. Diferentemente, os significados sempre são qualificados como dependentes e compreendidos como não universais. Ainda que alguns autores postulem uma semântica de valores universais de significação, atualmente, conceitos passaram a ser percebidos em frames, que interferem sobre os significados, oferecendo-lhes domínios ou escopos de referência. Isso ocorre porque a percepção cognitiva nos oferece a possibilidade de observar outras condições, por exemplo, que interferem sobre diferentes definições para um mesmo termo e também diferentes e multiplicadas apresentações de um termo. À luz desse princípio, se trata de uma concepção de semântica fundada Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 36 sobre uma percepção de padrões cognitivos culturalmente modelados, de tal forma que as lexias, os enunciados e toda a linguagem, podem ser vistos em meio à vigência de determinados “padrões de conhecimento” que seriam conformados pelas diferentes “culturas”. Essas distinções dariam margem a determinados padrões de representação e de expressão de um conhecimento sobre um determinado objeto (a nomeação). Essa perspectiva da significação, ou seja, a dimensão cultural das lexias e enunciados, é, ainda, um estudo em desenvolvimento, entretanto, qualquer investigação que envolva aspectos conceituais será melhor compreendida à luz dessa dimensão. Então, quando ‘apreendemos’ uma língua, é necessário ‘aprendermos’ também a utilizá-la a partir de um contexto de uso. Compreender a gramática35 de uma língua é operar com o funcionamento das regras de formação e de combinação dos elementos dessa língua, bem como novos signos introduzidos pelos sujeitos, nas comunidades em que estão inseridos, são repostas a mudanças culturais e tecnológicas. E, em toda comunidade de fala, são freqüentes as formas lingüísticas em variação, que são, portanto, diversas maneiras de se dizer a mesma coisa em um mesmo contexto, e com o mesmo valor de verdade36. Ao trabalhar com o conceito de variação lingüística, pretendemos demonstrar que a língua portuguesa, como todas as línguas do mundo, não se apresenta de maneira uniforme em todo o território brasileiro, conforme bem assinalou Cunha: Nenhuma língua permanece a mesma em todo o seu domínio e, ainda num só local, apresenta um sem-número de diferenciações. (...) Mas essas variedades de ordem geográfica, de ordem social e até individual, pois cada um procura utilizar o sistema idiomático da forma que melhor lhe exprime o gosto e o pensamento, não prejudicam a unidade superior da língua, nem a consciência que têm os que a falam diversamente de se servirem de um mesmo instrumento de comunicação, de manifestação e de emoção (1984, p. 23). 35 Gramática, aqui, entendida como um conjunto de regras (estratégias) que o falante emprega com a finalidade de produzir comunicação coerente, em uma dada comunidade lingüística, independente de ser escolarizado ou não. Diferente de norma, que focaliza a língua como um modelo ou padrão ideal de comportamento compulsório em qualquer situação de fala ou escrita, cujo critério definidor é social e não lingüístico. 36 ‘Valor de verdade’ significa que a variante selecionada não altera o significado e/ou gera ambigüidade, naquele dado contexto. Não significa, nesta acepção, certa ou errada, falsa ou verdadeira. 37 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará E mais, à luz do(s) paradigma(s) do multiculturalismo e do contexto educacional brasileiro, essa diversidade lingüística é um dos aspectos que nos singulariza, como pessoas, na medida em que compõe nossa identidade, ou seja, a maneira como nos relacionamos no e com o mundo neste espaço amazônico. A variação de um dado sistema lingüístico se dá em função do sujeitos do discurso e de diversos fatores, como região, faixa etária, classe social e grau de escolarização, são responsáveis pela variação da língua. Não há hierarquia entre esses variados usos, assim como não há uso lingüisticamente melhor que outro. Em uma mesma comunidade lingüística, portanto, coexistem usos diferentes, não existindo um padrão de linguagem que possa ser considerado superior. O que determina a escolha de tal ou tal variedade é a situação concreta de comunicação. A possibilidade de variação da língua expressa a variedade cultural existente em qualquer grupo. Basta observar, por exemplo, no Brasil, que, dependendo do tipo de colonização, a que uma determinada região foi exposta, os reflexos desta estarão presentes de maneira indiscutível. A variação lingüística manifesta-se, portanto, em todos os níveis de funcionamento da língua. Esse fenômeno da variação se torna mais complexo, porque os níveis não se apresentam de maneira estanque, eles se superpõem, sendo mais perceptível na pronúncia e no vocabulário (léxico). Vejamos. No nível fonético-fonológico, por exemplo, o /l/ final de sílaba é pronunciado como consoante pelos gaúchos, enquanto em quase todo o restante do Brasil é vocalizado, ou seja, pronunciado como um /u/; o /r/ retroflexo; o /ʃ/ africado de paraenses e cariocas. No nível morfossintático, muitas vezes, por analogia, por exemplo, algumas pessoas conjugam verbos irregulares como se fossem regulares: "cabeu", em vez de "caibo", "ansio", em vez de "anseio"; certos segmentos sociais não realizam a concordância entre sujeito e verbo, e isto ocorre com mais freqüência se o sujeito está posposto ao verbo. Há ainda variedade em termos de regência: "eu lhe vi", em vez de "eu o vi". No nível semântico-lexical, algumas palavras são empregadas em um sentido específico de acordo com a localidade. Exemplos: em Portugal diz-se "miúdo", ao passo que, no Brasil, se usa " moleque", "garoto", "menino", "guri"; as gírias são, 38 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará tipicamente, um processo de variação vocabular. Na Microrregião Marabá, por exemplo, as lexias “serraçãu”, “nevi”, “neblina”, equivalem a “nevoeiro“, tema proposto pelo (QSL, ALiB, 2001). Assim, existem dois tipos de variedades lingüísticas: os dialetos (variedades que ocorrem em função das pessoas que utilizam a língua, ou seja, os emissores); os registros (variedades que ocorrem em função do uso que se faz da língua, as quais dependem do receptor, da mensagem e da situação). registro A variação dialetal pode ser dividida em: regional, social, etária divide-se em: e grau de formalismo, modalidade de uso sintonia. e profissional. A variação de Cada pessoa traz em si uma série de características que traduzem, no seu modo de se expressar: a região onde nasceu, o meio social em que foi criada e/ou em que vive, a profissão que exerce, a sua faixa etária, o seu nível de escolaridade. Os exemplos, a seguir, ilustram esses diferentes tipos de variação: a região onde nasceu (variação regional): aipim, mandioca, macaxeira (para designar a mesma raiz); tu e você (alternância do pronome de tratamento e da forma verbal que o acompanha); vogais pretônicas abertas em algumas regiões do Nordeste; o /ʃ/ africado do carioca e o /s/ sibilado mineiro; o meio social em que foi criada e/ou em que vive; o nível de escolaridade (no caso brasileiro, essas variações estão normalmente inter-relacionadas (variação social): substituição do /l/ por /r/ (crube, pranta, prástico); eliminação do /d/ no gerúndio (correndo/correno) e troca do /a/ pelo /o/ (saltar do ônibus/soltar do ônibus); a profissão que exerce (variação infarto/fazer um infarto) e profissional): jargão linguagem médica (ter um policial (elemento/pessoa; viatura/camburão); a faixa etária (variação etária): irado, sinistro (termos usados pelos jovens para elogiar, com conotação positiva, e, pelos mais velhos, com conotação negativa). Os estudos e pesquisas empreendidos concluem que há dialetos de dimensão territorial, social/profissional, de faixa etária, de sexo, histórica e outras, Nem todos os autores apresentam a mesma divisão para estas variedades, sobretudo porque elas se superpõem, e seus limites não são bem definidos. 39 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará O segundo tipo de variedade que as línguas podem apresentar diz respeito ao uso que se faz delas, em função da situação em que o usuário e o interlocutor estão envolvidos. Para se fazer entender, qualquer pessoa precisa estar em sintonia com o seu interlocutor e isto é facilmente observável na maneira como nos dirigimos, por exemplo, a uma criança, a um colega de trabalho, a uma autoridade. Escolhemos palavras, modos de dizer, para cada uma dessas situações. Tentar adaptar a própria linguagem à do interlocutor já é realizar um ato de interlocução. Pode-se dizer que o nível de linguagem deve se adaptar à situação. Quanto às variações de registro, estas podem ser de três tipos: grau de formalismo, modalidade e sintonia. Cada tipo não aparece isolado, eles se correlacionam. Assim, temos, do francês, a lexia colibri – resposta proposta pelo ALiB – substantivo masculino e beija-flor [beijar + flor] – lexia encontrada na Microrregião Marabá, cuja freqüência alcançou 100%, ou seja, foi a resposta de todos os sujeitos e não coincidente com aquela. Também um substantivo masculino, designação comum às aves apodiformes, troquilídeas, de vôo muito veloz, e que se alimentam de néctar das flores e de insetos minúsculos, chupa-flor, chupa-mel, colibri, cuitelo (muito usado em Portugal), guainumbi, guanambi, guanumbi, guinumbi, pica-flor. Floreio e/ou golpe do jogo da capoeira, no qual o jogador, com o apoio de uma das mãos no chão, projeta o tronco sobre a cabeça e, simultaneamente, impulsiona uma das pernas à frente, na direção do adversário. Nessa mesma via, temos onda de mar – resposta proposta pelo ALiB, e banzeiro – lexia encontrada na Microrregião Marabá, cuja freqüência também alcançou 100%, é um adjetivo, diz-se do mar que se agita vagarosamente e em pequenas ondas. Entre outras definições, nos interessa aquela que equivale à triste, melancólico: ex. “cantando com desentôo na voz apagada e rouca as modinhas banzeiras da senzala”, na obra de Francisco Ribeiro Sampaio, denominada Renembrancas. Mais especificamente, na Amazônia, sucessão de ondas provocadas pela passagem da pororoca ou de uma embarcação a vapor, no rio. Nostalgia mortal que atacava os negros trazidos escravizados da África. Triste, abatido; pensativo. Surpreendido, pasmado, sem jeito, sem graça, encafifado. Exemplos como estes nos remetem a, pelo menos, duas abordagens dos fatos lingüísticos (estes, objeto da ciência da linguagem – a lingüística), não, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 40 necessariamente, excludentes: a diacrônica e a sincrônica. A primeira estuda as variações/mudanças pelas quais os elementos de um dado sistema lingüístico passam ao longo do tempo (análise histórico–comparativa). A segunda descreve e analisa a posição e as funções dos elementos que compõem um dado sistema lingüístico, em um determinado tempo e espaço (análise contrastiva). A diacronia prioriza registrar a história interna da língua, como sistema, estrutura e a sincronia prioriza descrever e analisar os usos que os falantes fazem da língua em um dado espaço e momento da história e correlacioná-los a fatores externos à língua como sistema. Por estarem situados tanto geográfica como historicamente, posto que são usos de sujeitos reais, homens e mulheres e não de um suposto falante-ouvinte “ideal”, preconizado por Chomsky (1965), os dados constituidores deste trabalho não prescindem dessas duas abordagens. No entanto, é sempre bom lembrar o mestre de Genebra, Saussure (2000), para quem os estudos sincrônicos devem prevalecer sobre os diacrônicos. Portanto, sincrônica/diacronicamente, ao registrá-los e descrevê-los, se analisa e se historicia, não necessariamente nesta ordem, ao mesmo tempo. Assim, esse ‘falante-ouvinte ideal’, no entanto, não parece ser tão “falante-ouvinte”, nem tampouco “ideal”, posto que teria que pertencer a uma comunidade lingüística homogênea, e, todo falante, escolarizado ou não, percebe que a língua falada na comunidade lingüística na qual está inserido, nas diversas situações de interlocução que participa, é, a um só tempo, heterogênea e diversificada (TARALLO, 1994). Nessa perspectiva, as considerações, a seguir, versam sobre limites, possibilidades e domínios do QSL, como instrumento de produção de dados, expressos nas Tabelas. Algumas reflexões antecedem à análise das Tabelas, ensejadas por aspectos característicos da própria estrutura do QSL, cuja organização, o entrevistador deve ter o melhor domínio possível, ou seja, exercitar a habilidade de alterá-lo, adaptá-lo e reformulá-lo, conforme os objetivos da pesquisa; os sujeitos e a região pesquisada. Em outras palavras, o QSL deve ser sempre considerado como um guia, um roteiro. Uma reflexão diz respeito aos anunciados – todos na forma interrogativa – dessa forma, aparentemente, obedece a um único padrão sintático, o que induz à crença que este funciona em 41 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará todas as regiões do país. No entanto, qualquer falante/ouvinte brasileiro, sem muito esforço, distingue, como diferentes, enunciados do tipo: 1) Como se chama, aqui, para um rio pequeno? 2) Como chamam, aqui, um rio pequeno? 3) Como chamam, aqui, para um rio pequeno? 4) Como se diz quando a fêmea de um animal perde a cria? 5) Como chamam isso? (Mostrar um objeto) Os enunciados de 1 a 5 exemplificam diferentes arranjos sintáticos que os falantes utilizam para perguntar o nome de um objeto, fato etc. As evidentes diferenças co-existem em uma mesma região ou comunidade lingüística, bem como em diferentes regiões e comunidades lingüísticas. Paralelamente a estrutura dos enunciados, outra questão imperiosa diz respeito à abordagem dos sujeitos, pelo pesquisador, durante a entrevista. Isso significa que abordagem destes está diretamente relacionada à seleção do enunciado, cuja organização sintática pode ou não ser partilhada por ambos; aspecto este facilitador ou não da instauração do processo interlocutivo entre os sujeitos. Isso nos ajuda a compreender e, quem sabe, explicar a ausência de respostas/ocorrências constatadas na Microrregião Marabá (Tabela 1) para algumas questões propostas pelo QSL. Como tudo muda, estudos e pesquisas empreendidos nas três últimas décadas, veementemente, insistem na relação entre língua e sociedade e na possibilidade, virtual e real, de sistematizar, ao descrever a variação existente e própria das línguas faladas. A heterogeneidade não necessariamente exclui a noção de sistema, ao contrário, sistematicidade e heterogeneidade equacionamse entre si. Os dados produzidos foram agrupados em Tabelas, Gráficos e Cartas Lexicais. Pode parecer que, ao transformá-los em percentuais, pretendamos que, por si só, expliquem o fenômeno da variação. No entanto, se faz necessário que os mesmos sejam analisados e devidamente relativizados, pois indicam uma, dentre outras, tendência geral que mascara, por assim dizer, uma série de condicionamentos, que se entrecruzam e geram diferentes combinações de significantes/significados, quanto ao sentido/conceito que encharcam as lexias. Como bem assinala Perini (2004), cada língua é um retrato do mundo, tomado de 42 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará um ponto de vista diferente, e que revela algo não tanto sobre o próprio mundo, mas sobre a mente do ser humano. Nessa perspectiva, para proceder a uma análise inicial, agrupamos os dados em Tabelas, numeradas de 1 (um) a (dois), cujos objetivos seguem. Tabela 1 – demonstrar a quantidade de questão respondida versus não respondida, por Campo Semântico. Tabela 2 – demonstrar, a título de exemplo, o registro de todas as ocorrências por questão e Campo Semântico, neste caso, Acidentes Geográficos, encontradas na fala dos sujeitos, por ponto lingüístico. Os dados expostos nas Tabelas de 1 e 2, em questão, resultam da aplicação do QSL (composto de 196 questões, distribuídos em 14 Campos Semânticos), a 8 (oito) sujeitos, que constituíram a população-amostra da região pesquisada, 4 (quatro) destes são de Marabá e 4 (quatro) de Palestina do Pará, municípios que funcionaram como pontos lingüísticos, representativos da Microrregião Marabá. Os dados da Tabela 1 estão organizados da seguinte maneira: na coluna 1, os números romanos identificam os Campos Semânticos; na 2, o nome dos campos semânticos: na 3, a quantidade de questões contidas em cada campo; na 4, a quantidade de questões respondidas e na 5, a quantidade de questões não respondidas por ordem crescente de ausência em cada campo. Tabela 1 – Campos Semânticos: questão respondida X não respondida Campo Semântico N° NOME Quantidade Questão CS Respondida Não Respondida IV Flora 06 05 01 VIII Convívio e Comportamento Social 06 05 01 XIV Vestiário 06 05 01 I Acidentes Geográficos 07 05 02 II Fenômenos Atmosféricos 13 11 02 IX Ciclos da Vida 19 17 02 XIII Alimentação e Cozinha 08 06 02 VII Corpo Humano 32 29 03 X Religiões e Crenças 09 06 03 XII Habitação 06 03 03 III Astros e Tempo 16 12 04 VI Fauna 26 21 05 XI Festas e Divertimentos 19 14 05 43 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará V Atividades Agropastoris 14 Total 23 14 09 196 153 43 Fonte: pesquisa de campo 2006/2007. A Tabela 1 demonstra a quantidade de questão respondida versus não respondida, por Campo Semântico. Os dados, nela expostos, permitem avaliar o índice de produtividade do uso do QSL, como instrumento de produção de dados, nesta pesquisa, na Microrregião Marabá e com os sujeitos selecionados. A leitura da Tabela 1 revela que: das 196 questões, apenas 43 (25%) não foram respondidas, por, pelo menos, um sujeito, e 153, equivalente a 75%, o foram. esta quantidade de questões respondidas atestou a produtividade deste instrumento, neste tipo de pesquisa. em todos os 14 CS, houve, pelo menos, uma questão não respondida, ausências assim distribuídas: a) nos CS, IV, VIII e XIV, uma em cada um; b) nos CS I, II, IX e XIII, duas em cada um; c) nos CS VII, X e XII, três em cada um; d) no CS III, quatro; e) nos CS VI e XI, cinco em cada um; e f) no CS V, nove. Constatamos, assim, que no CS V – Atividades Agropastoris – está concentrado o maior número de questões sem respostas. Há inúmeras razões que justificam a ausência de resposta, em cada um dos CS, mencionadas anteriormente. No entanto, evidenciamos, aqui, o CS V, considerando que este concentra a maior quantidade de questões não respondidas. Como base na análise da entrevista gravada, são os sujeitos jovens e escolarizados os responsáveis pela maioria dessas ausências, aliado ao fato de ambos, terem residido, até a data da entrevista, na zona urbana, ou seja, se pressupõe pouco ou nenhum contato destes sujeitos com atividades agropastoris, tampouco convivência com questões e objetos relacionadas ao meio rural. 44 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Essas constatações são indicadores da necessidade outras pesquisas para que tais dados, de fato, se confirmem ou não, e, nelas, sujeitos da faixa etária adulta, preferencialmente, devam ser selecionados entre os residentes na zona rural e os mais jovens na zona urbana, das localidades que funcionarem como pontos lingüísticos. A elaboração de Tabelas, como a 2, que segue, tem a função de exemplificar, como podem ser tabuladas as ocorrências encontradas, em um dado Campo Semântico, e como estas podem ser registradas em Cartas Lexicais. Para tanto, selecionamos, como exemplo, aquelas do Campo Semântico I – Acidentes Geográficos, que, após transcritas, grafematicamente, foram organizadas, tabuladas e cartografadas, somente, a título de exemplo, posto que não é o objeto de estudo desta pesquisa. Apresentamos, a seguir, a Tabela 2, seguida das Cartas Lexicais, numeradas de 1 a 7. Tabela 2 – Campo Semântico I: acidentes geográficos 45 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Quantidade Questão Lexia QSL (ALiB, 2001) (QSL) de Ocorrências Lexias (questão) 06 01 04 onda de mar córrego redemoinho (de água) 02 03 05 07 foz onda de rio terra umedecida pela chuva % onda 06 75 banzeru du má 01 12,5 NFR 01 12,5 grota 03 37,5 corgu 02 25 lagu 02 25 riu pequenu 01 12,5 rededuinhu/redemuinhu/ridimunh u/ 05 62,5 04 02 25 01 12,5 ponti 05 62,5 pinguela 02 25 bausa di bananera 01 12,5 incontru das água 02 25 incontru dus riu 02 25 cabiçera 02 25 boca du ri 01 12,5 NFR 01 12,5 banzeru 06 75 banzeru du riu 01 12,5 maré 01 12,5 molhada 04 50 terra úmida 01 12,5 rispingada 01 12,5 úmida 01 12,5 umidade 01 12,5 ridemoinhu/ridimunhi d’água funiu reboju pinguela Nº Abs. 03 Fonte: pesquisa de campo 2006/2007. 02 Ponto Lingüístico Ocorrências de Maior Freqüência 03 04 03 05 M P. P. X X X X X X X X X X X X X X 100%Semântico TOTAL 24 dados da Tabela - 2, relativa ao Campo Conforme demonstram os I 46 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará freqüência que variam de 12,5% a 62,5%, entre estas estão banzeru du má (12,5%), relativa à questão 6; grota (37,5%), corgu (25%), lagu (25%) e riu pequenu (12,5), relativas à questão 01; rededuinhu/redemuinhu/ridimunhu/ridemoinhu/ridimunhi d’água (62,5%), funiu (25%) e reboju ( 12,5%) relativas à questão 04; ponti (62,5%), pinguela (25%) e bausa di bananera (12,5%), relativas à questão 02; incontru das’água (25%), incontru dus riu (25%), cabiçera (25%), boca du ri (12,5%), relativas à questão 03; banzeru du riu (12,5%) e maré, (12,5%), relativas à questão 5; molhada (50%), terra úmida (12,5%), rispingada (12,5%), úmida (12,5%) e umidade (12,5%), relativas à questão 07. Esses dados revelam que das 7 (sete) questões, 2 (duas) lexias, do CS I, coincidiram com as propostas pelo QSL, são elas: rededuinhu/redemuinhu/ridimunhu/ridemoinhu/ridimunhi d’água e pinguela. Ainda, assim, a primeira obteve 62,5% de freqüência, pois ao lado co-ocorreram outras variantes: funiu, com 25% e reboju, com 12,5% de freqüência. Quanto à segunda, esta equivale a 25% de freqüência, co-ocorreram com ela, ponti (62,5%) e bausa di bananera (12,5%). Os dados também expressam que, quando há várias lexias como resposta a uma mesma questão, ou seja, quando as lexias co-ocorrem o percentual de freqüência de cada uma delas diminui. E quanto menos ocorrências registradas, como resposta a uma mesma questão, o percentual de freqüência aumenta. Constatamos, no CS I, que mesmo as lexias de maior freqüência onda (75%) coocorre com banzeru du má (12,5%) e banzeru (75%) co-ocorre com banzeru du riu (12,5%) e maré (12,5%). Isso significa que, para 7 (sete) questões, houve 24 (vinte e quatro) ocorrências, ou seja, mais ou menos 03 (três) ocorrências por questão. O mesmo objeto ou fenômeno recebeu + ou – três denominações diferentes, ou, dito de outra forma, do universo de 07(sete) questões dirigidas a 08 (oito) sujeitos, 06 (seis) deles, em 02 questões, somente, denominaram um mesmo objeto ou fenômeno com um mesmo nome. A partir desta Tabela foram selecionadas as Cartas Lexicais, numeradas de 01 a 07, pela ordem decrescente de freqüência das lexias no corpus, não seguem, portanto, o número de ordem do QSL. Nelas estão registradas todas as ocorrências, relativas ao CS I, por questão, considerando 8 (oito) sujeitos e 2 (dois) pontos lingüísticos. As cartas apresentam, no centro da página, a numeração e o nome dela, em seguida, abaixo do nome da carta, a(s) lexias propostas pelo QSL (ALiB, 2001) e, dentro da Carta Lexical, está(ao) registrada(s) a(s) todas as ocorrências encontradas nos pontos lingüísticos, referentes às questões do CS I, pela freqüência. No lado esquerdo, no canto inferior, 47 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará estão os códigos dos sujeitos, que indicam o gênero, a faixa etária e o grau de escolaridade, estes mesmos sujeitos estão ao lado das ocorrências nas Cartas. Fábio Rogério Rodrigues Gomes 48 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Quantidade Campo Semântico I–Acidentes Geográficos de questão (CS) Nº da Questão Lexia do QSL (ALiB, 2001) Nº de Ocorrência = ou superior a 75% de freqüência no corpus, não coincidentes com as do QSL (ALiB) Sujeitos PL Ocorrências Lexias Nº Abs. % 05 onda de rio 02 banzeru/banzeru du riu 07 75,0 X xx -x xx xx 06 onda de mar 02 onda 06 75,0 X -- xx xx xx 13 - 13 2 3 4 4 07 - - - 2 Tabela 5 – Ocorrências não-coincidentes, com o QSL, por Campo Semântico, com freqüência igual ou superior a 75% no corpus. 41 IV–Flora banana dupla 01 banana gêmia(s)/gemi/gêmia(s) 06 75,0 X x- x- xx xx - 1 06 - 06 1 1 2 2 06 - - 49 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará V–Atividades 49 mandioca/aipim 01 macaxera 08 100 X xx xx xx xx 08 - 08 2 2 2 2 23 Agropastoris VI–Fauna - - - 1 67 colibri 01 bejaflô 08 100 X xx xx xx xx 76 crina da cauda 01 rabu du cavalu/rabu 08 100 X xx xx xx xx 89 bicho de fruta 02 bichu da goiaba 08 100 X xx xx xx xx 88 libélula 02 cambitu 07 87,5 X -x xx xx xx 91 pernilongo 02 murissoca 07 87,5 X xx xx -x xx 69 galinha d’angola 02 angulista 06 75,0 X xx xx x- x- 78 anca 03 trasera/trasera du cavalu 06 75,0 X xx x- -x xx 50 - 50 13 13 11 13 26 - - - 7 50 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará VII–Corpo Humano 32 94 pomo de adão 01 gogó 08 100 X xx xx xx xx 102 dentes caninos 02 preza 07 87,5 X xx xx xx -x 108 cego de um olho 02 caôi/caoiu/caolhu 07 87,5 X xx xx xx x- 109 vesgo 02 zanoi/zanoiu 07 87,5 X xx xx -x xx 96 seios 02 peitu 05 75,5 X xx xx x- -- 104 dentes molares 03 quexau 06 75,0 X xx xx -x -x 105 desdentado 03 banguelu/banguelas 06 75,0 X x- x- xx xx 106 fanhoso 02 foêi 06 75,0 X -x -x xx xx 115 meleca 02 cataraca/catarata 06 75% X xx xx -x -x 121 axila 03 suvacu 06 75,0 X x- xx xx -x 64 - 64 17 18 16 13 - VIII–Convívio e 06 Comportamento Social - - 127 mau pagador 01 veacu/velhacu 08 100 X xx xx xx xx 128 assassino pago 01 pistoleru 08 100 X xx xx xx xx 16 - 16 4 4 4 4 - IX–Ciclos da Vida 19 e 10 - 2 140 filho mais novo 01 caçula 08 100 X xx xx xx xx 137 ama-de-leite 01 mãi di leiti 07 87,5 X xx xx x- xx 15 - 15 4 4 3 4 08 100 X xx xx xx xx XI–Festas Divertimentos - 10 159 bolinha de gude 01 2 peteca 51 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Divertimentos 160 estilingue 02 baladera 07 87,5 X x- xx xx xx 164 cabra-cega 01 cobracega 07 87,5 X -x xx xx xx 22 - 22 4 6 6 6 08 100 X xx xx xx xx 1 08 - 08 2 2 2 2 prizilha/grampu 06 75,0 X x- xx xx x- - XIII–Alimentação 187 - cigarro de palha - 01 3 porronca 08 e Cozinha - 196 XIV–Vestiário 06 Fonte: pesquisa de campo/2006/2007. - grampo (sem pressão) - 02 - - - 1 06 - 06 1 2 2 1 - - - 30 - - - - - - - Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 52 Os dados expostos na Tabela 5 revelam que 10 (dez) lexias alcançaram 100% de freqüência em todo o corpus, ou seja, elas foram as respostas dadas por todos que constituíram a população-amostra, um total de 8 (oito) sujeitos, e nenhuma destas coincidiu com a proposta pelo ALiB (2001). As 10 (dez) perguntas que originaram essas lexias estão distribuídas em 7 (sete), dos 14 (quatorze) campos semânticos que compõem o QSL (2001). Os dados revelam, também, que 09 (nove) lexias alcançaram 87,5% de freqüência em todo o corpus, ou seja, elas foram as respostas dadas por 7 (sete) que constituíram a população-amostra, de um total de 8 (oito) sujeitos, e nenhuma destas coincidiu com a proposta pelo ALiB (2001). Os dados revelam, ainda, que 06 (seis) lexias alcançaram 75,5% de freqüência em todo o corpus, ou seja, elas foram as respostas 6 (seis) que constituíram a população-amostra, de um total de 8 (oito) sujeitos, e nenhuma destas coincidiu com a proposta pelo ALiB (2001). Os mesmos dados, além de indicarem as lexias, cuja freqüência foi igual ou superior a 75%, fazem referência às não coincidentes com o QSL e também indicam as variáveis sexo, faixa etária e grau de escolaridade dos sujeitos entrevistados. A análise, a seguir, refere-se aos dados informados na tabela 4 e segue a ordem crescente de freqüência por Campo Semântico. O Gráfico 6 sintetiza os dados da Tabela 5 e apresenta o resultado da comparação das lexias entre Microrregião Marabá e ALiB, objetivo geral deste trabalho. Gráfico 6 – Lexias coincidentes X não-coincidentes 53 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará A importância e ou a necessidade de se estabelecer um percentual de freqüência de usos lingüísticos não reside tanto no quantitativo, em si, e sim naquilo que este aspecto pode nos revelar, ou seja, por um lado, a interpretação das estruturas lingüísticas como manifestação das capacidades cognitivas e da organização conceitual do conhecimento, e por outro, como atividade experienciada. Assim, os dados indicam que: 73 ocorrências alcançarem um percentual igual ou superior a 75% de freqüência, isso equivale a, mais ou menos, ¼ de um total de 196 questões; 123 ocorrências não alcançaram freqüência igual ou superior a 75% de freqüência, isso equivale a, mais ou menos, ¾ de um total de 196 questões; das 73 ocorrências que alcançaram a freqüência estabelecida, 43 coincidiram com as propostas pelo ALiB, o equivalente a, mais ou menos, 52% de freqüência neste corpus; dessas 73, 30 ocorrências não coincidiram com as propostas pelo ALiB, o equivalente a 42% de freqüência neste corpus. Este quantitativo baixo de ocorrências não coincidentes, aparentemente, parece ser um percentual pouco representativo, como diferenciador e ou singularizador de um falar característico da Microrregião Marabá, no entanto, pode nos indicar uma significativa diversidade de formas lingüísticas, neste estudo, diferentes variantes semântico-lexicais de um mesmo conceito. Vejamos: Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 54 o fato de 73 ocorrências, de um total de 196, alcançarem o percentual de freqüência igual ou superior a 75%, por si só, revela que há várias outras lexias coocorrendo, por isso poucas alcançaram este percentual; neste universo de 73 lexias, o fato de 30 delas não coincidiram, ou seja, quase 50%, constitui um percentual significativo como indicador da variedade de ocorrências; para atingir o percentual estabelecido foi preciso que, no mínimo, seis (6) sujeitos dessem, como resposta, a mesma lexia, ou seja, mais da metade dos oito (8) sujeitos da população-amostra; e para que uma dada lexia, ou um conjunto delas, seja reconhecida como componente do acervo lexical de uma dada localidade, se faz necessário qua a maioria dos sujeitos dela(s) faça uso, e 75%, estatisticamente, tem sido uma freqüência considerável, por se mostrar pertinente, em trabalhos desta natureza, ou seja, um dos parâmetros, mas não o único e nem analisado isoladamente, adequados para avaliar o uso efetivo de dada ocorrência. O uso generalizado de expressões de expressões como variação, freqüência, fenômeno lingüístico, heterogeneidade dialetal, preconceito lingüístico, e outras tantas da mesma natureza, reafirma ser fundamental que se realizem mais e mais pesquisas quantiqualitativas com dados produzidos em circunstâncias reais, seja do “português” considerado padrão ou não-padrão, a fim de que se possa identificar quais são a variação e a verdadeira extensão e intensidade desta, que, conforme atesta a literatura, sabemos ser de pequena magnitude, inversamente proporcional a dimensão territorial do Brasil. O objetivo central deste trabalho foi registrar, comparar e analisar as ocorrências semântico-lexicais encontradas na Microrregião Marabá, que são, na maioria das vezes, consideradas “erros” exclusivos de falantes não escolarizados. Enfatizamos que é quase impossível empreender tal pesquisa ignorando a existência inquestionável de condições sócio-históricas propícias à variação, neste estudo, a semântica-lexical, em terra brasileira, marcadas por um multilingüismo generalizado entre falantes adultos que, no início do ‘contato, não partilhavam língua comum, em um contexto de colonização e de conseqüentes relações lingüísticas e sociais assimétricas. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 55 Descrever aspectos lingüísticos, neste espaço, de contato permanente com diferentes culturas, advindas do fluxo migratório, que, na região pesquisada, é constante, entre outros fatores, permite construir esse herbário do qual nos fala o autor, não só para guardá-la e, sim, para compreender as outras redes de saberes que se entrelaçam na e pela língua, que fazem esta variar, mudar, do mesmo jeito que ela, a lingua, muda esses mesmos saberes, pelos seus dizeres, conscientes que as mudanças diatópicas, diastráticas e diafásicas, porém, não ocorrem de forma homogênea, em um dado espaço e nem ao mesmo tempo. Isso significa que a variação está relacionada à comunidade lingüística, que sempre a apresentará, e mais, em todos os níveis que compõem a estrutura da língua usada por ela. Sendo os signos lingüísticos produzidos no seio de uma comunidade de fala, são formas convencionais, portanto, resultam de processos ativos entre sujeitos, e envolvem diversos fatores, tais como: grupos etários, gênero, grau de escolarização, classe social, e outros, conforme segue uma das possibilidades de análise desses dados. O Campo Semântico I – Acidentes Geográficos registra as lexias onda (75%) e banzeru/banzeru du má (87,5%), como as de maior freqüência neste Campo. A primeira lexia foi respondida exclusivamente pelos sujeitos do sexo feminino das faixas etárias jovem e adulta, escolarizadas e não escolarizadas (S2FBE, S4FEM) e pelos sujeitos do sexo masculino da faixa etária jovem. A segunda foi respondida exclusivamente pelos sujeitos do sexo feminino das faixas etárias jovem e adulta, escolarizada e não escolarizada (S2FBE, S4FEM) e pelos sujeitos do sexo masculino da faixa etária jovem. Nos Campo Semântico II – Fenômenos Atmosféricos, III – Astros e Tempos não foi registrada nenhuma lexia com freqüência igual ou superior a 75%, que não coincidisse com aquelas propostas pelo QSL, Comitê do ALiB(2001). O Campo Semântico IV – Flora registra a lexia banana gêmia/gemi/gêmia(s) (75%), ocorrência mais recorrente entre os sujeitos da faixa etária jovem e escolarizada, isto é, S3MEM e S4FEM. 56 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará O Campo Semântico V – Atividades Agropastoris registra a lexia macaxera (100%), ocorrência informada por todos os sujeitos, isto é S1MBE, S2FBE, S3MEM e S4FEM. O Campo Semântico VI – Fauna registra as lexias: trazera/trazera du cavalu (75%), cuja recorrência foi maior entre os sujeitos do sexo masculino da faixa etária adulta e feminino da faixa etária jovem (S1MBE e S4FEM); angulista (75%), mais recorrente entre os sujeitos masculino e feminino da faixa etária adulta (S1MBE e S2FBE); cambitu (87,5), com recorrência entre os sujeitos do sexo feminino da faixa etária jovem e adulta e masculino da faixa etária jovem (S2FBE, S3MEM e S4FEM); murissoca (87,5), recorrente entre os sujeitos da faixa etária adulta do sexo feminino e masculino e jovem do sexo feminino (S1MBE, S2FBE e S3MEM) e bichu da goiaba, bejaflô e rabu du cavalu, cuja freqüência de 100% revela que elas, as lexias, foram respondidas, com o mesmo sentido, mesmo entre sujeitos e municípios distintos. O Campo Semântico VII – Corpo Humano registra as lexias: seios, quexau e cataraca/catarata (75%), com ocorrência de maior freqüência entre os sujeitos do sexo masculino e feminino da faixa etária adulta (S1MBE e S2FBE); banguelu e foêi (75%), mais recorrente entre os sujeitos do sexo masculino e feminino da faixa etária jovem (S3MEM e S4FEM); suvacu (75%), com maior recorrência entre os sujeitos do sexo feminino da faixa etária adulta e masculino da faixa etária jovem (S2FBE e S3MEM); preza e caoi/caoiu/caolhu (87,5%), mais recorrente entre os sujeitos do sexo masculino da faixa etária jovem e adulta e feminino da faixa etária adulta (S1MBE, S2FBE e S3MEM); zanôi/zanoiu (87,5%), com maior recorrência entre os sujeitos do sexo feminino da faixa etária jovem e adulta e masculino da faixa etária adulta (S1MBE, S2FBE e S4FEM) e gogó cuja freqüência (100%), a única lexia, deste campo, respondida com sentido semelhante entre todos os sujeitos. O Campo diferentemente do Semântico anterior VIII e dos – Convívio demais, e todas Comportamento as lexias, nesse Social, caso, veacu/velhacu e pistoleru, obtiveram 100% de freqüência. O Campo Semântico IX – Ciclos da Vida registra as lexias mãi di leiti (87,5%), com recorrência maior entre os sujeitos do sexo feminino da faixa etária jovem e Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 57 adulta e masculino da faixa etária adulta e adotivu (100%), ocorrências informada por todos os sujeitos. NO Campo Semântico X – Religiões e Crenças não foi registrada nenhuma lexia com freqüência igual ou superior a 75%, que não coincidisse com aquelas propostas pelo QSL, Comitê do ALiB(2001). O Campo Semântico XI – Festas e Divertimentos registra as lexias baladera e cobra cega (87,5%), com recorrência maior entre os sujeitos do sexo feminino da faixa etária jovem e adulta e masculino da faixa etária jovem (S2FBE, S3MEM e S4FEM) e peteca (100%) ocorrência informada por todos os sujeitos, NO Campo Semântico XII – Habitação não foi registrada nenhuma lexia com freqüência igual ou superior a 75%, que não coincidisse com aquelas propostas pelo QSL, Comitê do ALiB (2001). O Campo Semântico XIII – Alimentação e Cozinha obteve somente lexia porronca, cuja freqüência é de 100%, portanto, respondida por todos os sujeitos. O Campo semântico XIV – Vestiário registra a lexia prizilha/grampu (75%) com recorrência maior entre os sujeitos adultos do sexo feminino e jovens do sexo masculino, isto é, (S2FBE e S3MEM). O mestre de genebra, o suíço F. Saussure, ao estabelecer a dicotomia langue(língua) & parole(fala), e, ao se propor a estudar a primeira e não a segunda, posto que, por ser, esta, uma realização individual do falante, de um dado sistema lingüístico, a heterogeneidade lhe era peculiar. Saussure, assim já previu que, por ser individual, outros fatores implicariam nas realizações, entre estes, por exemplo, o fato de ser homem, mulher, etc., confirmada pelos dados analisados. O baixo percentual de 30 ocorrências não coincidentes com as do ALiB, já referido neste trabalho, voltamos a reafirmar, pode nos conduzir, inicialmente, a inferir que não há, de fato, uma considerável diversidade semântico-lexical (plurilingüismo), na forma de nomear um mesmo signo lingüístico, por falantes localizados geograficamente nos extremos do Brasil, ao considerarmos que Marabá está no Norte do País e o QSL foi elaborado no Estado do Paraná, Sul do Brasil. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 58 Há que se considerar o fato de um dos critérios estabelecidos para a composição do corpus, sobre análise diz respeito à freqüência das lexias, que deveriam ser igual ou superior a 75%. Este percentual indica, portanto, o contrário, ou seja, entre os próprios sujeitos, há um considerável índice de ocorrências com baixa freqüência, ou seja, inferior a 75%, o que permite reavaliar a afirmação inicial, acerca da ausência de diversidade semântico-lexical entre os falares desta e daquela região. Significa dizer que esta baixa freqüência revela, talvez, a diversidade entre os falares dos próprios sujeitos moradores de uma mesma região, ou melhor, uma microrregião, onde predomina um fluxo migratório, no caso, a Microrregião Marabá. Historicamente, as cidades de Marabá e Palestina do Pará iniciam a natureza do processo de povoamento da Microrregião da pesquisa em questão, advinda, muitas vezes, de famílias inteiras, principalmente dos Estados do Maranhão, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia, Minas Gerais, e outros, atraídos pelas “promessas” governamentais de possibilidades da posse da terra para investimentos econômicos, que lhes permitissem subsistir, originando a um caldeamento étnico diversificado. A imensidão territorial, a “olhos vistos”, ainda “inexplorada”, frente àqueles Estados, oferecia novas e “promissoras” possibilidades de investimentos em latifúndios e matas, cujos benefícios se originaram da pecuária extensiva, agroindústria e o beneficiamento de madeira, por meio de indústrias madeireiras. Tarallo (1994) afirma que, para compreender a história de qualquer língua, devemos levar em consideração dois fatores que concorrem para explicar as mudanças ocorridas num sistema lingüístico: os fatores externos e os fatores internos. Os primeiros compreendem aspectos político, social e cultural da comunidade em questão, aos segundos correspondem todos os processos ocorridos internamente no sistema lingüístico, entre os quais se destacam as variações fonéticas, morfológicas, sintáticas e semânticas, esta última, objeto deste estudo. O estado político e social da comunidade é um elemento de atuação na relativa fixidez ou na mobilidade, neste caso, do material semântico das línguas. Os estudos lingüísticos revelam que, nas épocas de calma e estabilidade, as línguas se mantêm como que estacionárias, ao passo que, nos momentos de instabilidade e agitação, Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 59 de abalos profundos e principalmente de reversão social, acelera-se o ritmo e aumenta o vulto das variações e transformações dialetais. A Microrregião Marabá apresenta uma singularidade, caracterizada pela não estabilidade populacional, que segue o próprio fluxo migratório. Nesse caso, haveria uma equação entre este estado e a co-ocorrência de inúmeras variáveis semânticas registradas. Isso significa que certos fatores, ‘estranhos’ ao mecanismo interno das línguas, agem extrinsecamente sobre a realidade lingüística, condicionando os usos de umas ou outras lexias. É o caso da formação populacional de Marabá e Palestina do Pará, composta de sujeitos de várias cidades do Brasil. Tal fator, ligado à instabilidade política e social, age como elemento externo e propiciador de variações lingüísticas, em geral, e semântico-lexical em particular. O estado de desagregação das forças de coesão social, a mobilidade geográfica, permite que a língua, desembaraçada das peias que lhe entravavam os seus movimentos, recupere a sua original liberdade e desenvolva à larga seus movimentos embrionários ou suas tendências. De modo que a mobilidade geográfica é ambiente propício à diversidade lingüística. Há muito mais probabilidade de persistirem as variações, em uma comunidade, quando deixa de ser homogêneo o meio lingüístico. É o caso destas cidades, onde uma leva de imigrantes, de diversas regiões, se fixou. Com o passar de algum tempo, apreendem as variações uns dos outros. Porém, já a realizam com as variações. Os filhos desses imigrantes, caso estejam estes aglomerados num mesmo ponto, provavelmente ainda conservarão algumas das variações dos avós e pais, e assim por diante. Os dados analisados na Tabela 5 permitiram a elaboração das Cartas Lexicais, numeradas de 1 (um) a 14 (catorze), que seguem, e registram as ocorrências, cuja freqüência, no corpus, foi igual ou superior a 75% e não coincidentes com as lexias propostas pelo QSL (ALiB, 2001). Segundo a ordem do QSL: apresentamos, no centro, o Nº da Carta e o campo semântico, em seguida, no centro a(s) lexias propostas pelo QSL (ALiB, 2001) Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 60 e, dentro da Carta Lexical, está(ao) registrada(s) todas as lexias cujo índice foi igual ou superior a 75% de freqüência e não coincidentes com as propostas pelo QSL. No lado esquerdo, no canto inferior estão os códigos dos sujeitos, que indicam o gênero, a faixa etária e o grau de escolaridade. Os ícones, ao lado do código dos sujeitos, os identificam e acompanham as suas respostas, ou seja, as lexias dentro da carta. 61 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará Carta Lexical 1 – Campo Semântico I – Acidentes Geográficos onda de mar – onda de rio onda banzeru onda banzeru 0 100km 62 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 2 – Campo Semântico II – Fenômenos Atmosféricos tromba d’água Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 0 63 100km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 64 S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 65 Carta Lexical 3 – Campo Semântico III – Astros e Tempos 0 100km 66 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 4 – Campo Semântico IV – Flora banana dupla banana gêmia (s) / gêmi gêmias 0 100km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 67 S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ Carta Lexical 5 – Campo Semântico V – Atividades Agropastoris mandioca/aipim PALESTINA DO PARÁ Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 68 macaxera macaxera 0 100km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 69 S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 6 – Campo Semântico VI – Fauna anca – libélula – bicho de fruta – pernilongo – colibri – galinha de angola – crina da cauda 70 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará trazera cambitu bichu da goiaba murissoca bejaflô angulista rabu du cavalu trazera cambitu murissoca trazera bichu da goiaba bejaflô 0 100km ra bu d u c avalu Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 71 S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 7 – Campo Semântico VII – Corpo Humano seios – vesgo – axilas – dentes molares – dentes caninos - pomo de adão – meleca -desdentado – fanhoso - cego de um olho Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará peitu zanoi suvacu quexau gogó banguelu 72 catarata foêi zanôiu suvacu preza quexau preza caôi foeî 0 100km caôi cataraca gogó 73 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 8 – Campo Semântico VIII – Convívio e Comportamento Social mau pagador - assassino pago vecu / velhacu pistoleiro pistoleiro vecu / velhacu 0 100km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 74 S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ Carta Lexical 9 – Campo Semântico IX – Ciclos da Vida ama de leite – filho mais novo PALESTINA DO PARÁ 75 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará mãi di leiti caçula mãi di leiti caçula 0 100km 76 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 10 – Campo Semântico X – Religiões e Crenças feitiço Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 0 77 100km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 78 S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 11 – Campo Semântico XI – Festas e Divertimentos bolinha de gude – estilingue – cabra cega peteca cobra cega baladera peteca baladera cobra cega 0 100km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 79 MARABÁ Carta Lexical 12 – Campo Semântico XII – Habitação pessoa sem sorte no jogo PALESTINA DO PARÁ Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 0 80 100km 81 Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 13 – Campo Semântico XIII –Alimentação e Cozinha cigarro de palha Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 82 porronca porronca 0 100km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 83 S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ Carta Lexical 14 – Campo Semântico XIV – Vestiário grampo (sem pressão) prizilha / prizia prizilha 0 100km Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala na/da microrregião Marabá/Pará 84 S1MBE S2FBE S3MEM MARABÁ PALESTINA DO PARÁ 3.3 VERNÁCULO E ENSINO O léxico de uma língua, usado por uma dada comunidade lingüística, é um baú de memórias da convivência entre diferentes povos, de diferentes países e entre pessoas de um mesmo país, de um mesmo estado, de uma mesma comunidade de fala. Inúmeros são os vocábulos veacu, bejaflô, gogó, peteca, porronca, entre outros que alcançaram 100%, ou seja, foram respostas de todos os sujeitos e não coincidentes com as do ALiB. Essas ocorrências são algumas detectáveis por falantes da Microrregião Marabá, mas o serão por todos os falantes brasileiros? Então, perante as diferenças registradas, estaremos nós diante de uma única e invariável língua? Assim, a manutenção dessas variedades, que vivem em diferentes culturas, no enquadramento do que se denomina língua portuguesa, é, em primeira análise, uma ‘opção’ política, jamais lingüística. Se a língua é um fator de identificação cultural, como conjugar esta definição com o fato de se afirmar ser, a mesma, a língua falada, como língua materna, por pessoas com diferentes referências culturais? Há muito, nos mais diferentes espaços e práticas educativas, e mais especificamente nas escolas, se perpetuam concepções equivocadas que se criaram em torno do que é linguagem, língua, gramática e “erro” de português. Os equívocos são vários, vão desde a crença ingênua que, para se garantir “eficiência” nas atividades de fala, de leitura e escrita, basta estudar gramática (nomenclatura gramatical), até a pergunta: se não é para ensinar gramática, então, é para ensinar o quê Ora, no mundo contemporâneo, e, em conseqüência na escola, cada vez mais culturas se interpenetram, constituindo o mosaico fragmentário em que vivemos, urge conhecê-lo, quem sabe, encontrar as respostas a estas questões, se elas estiverem assim tão prontas como muitos pensam, equivocadamente. Geraldi, ao repensar este mosaico, e a relação deste com o ensino que se processa na escola, em meio a essa diversidade lingüístico-cultural, afirma: Das pesquisas lingüísticas contemporâneas podem ser retiradas três grandes contribuições para o ensino da língua materna: a forma de 196 conceber a linguagem e, em conseqüência, a forma como define seu objeto específico, a língua; o enfoque diferenciado da questão das variedades lingüísticas e a questão do discurso, materializado em diferentes configurações textuais (1996, p. 65). Essas contribuições, obviamente, não são estanques, ao contrário, interligam-se. Assim, as diferentes formas lingüísticas emergem das situações de interlocuções entre os sujeitos nelas envolvidos. A essas diferentes formas lingüísticas denominamos variedades lingüísticas. A que usamos resulta daquela falada no grupo social do qual fazemos parte, que, por sua vez, remetem a sistemas de referências. Usar uma dada variedade lingüística é dominar um sistema de referências. Desse espaço singular, a Microrregião Marabá, a necessidade de escrever, registrar e analisar a diversidade lingüística (fonético-fonológica, morfossintática, semântica e textual), se deve à ausência de trabalhos dessa natureza, na região pesquisada, o que impede a compreensão, de forma adequada, de várias questões lingüísticas, entre estas, as ocorrências semântico-lexicais presentes na fala dos moradores da Microrregião Marabá. Alia-se a uma imensa expectativa, a de que tal saber possa ser utilizado, em especial, pelos professores, na mediação das interlocuções nos espaços educativos, especialmente na escola, única instituição autorizada a ‘dizer’ e a ‘ensinar’ qual ‘língua’ se deve falar e escrever, cujo fazer, há séculos tem ‘legitimado’ o ‘monolinguismo’, e impedido o acesso e permanência, com qualidade, de alunos advindos dos rincões de miséria que assola este estado, língua, esta, dita ‘padrão’, e que estes não dominam. A exemplo das enchentes que assolam esta Microrregião, também podemos construir uma noção de língua que derrube a fortaleza da gramática tradicional, em que a língua idealizada ficou presa, nos últimos dois milênios, fato este resultante de equívocos que perduram em torno das palavras língua e gramática. Sobre este aspecto Antunes In BAGNO (2001, p.11) afirma: Falar ou escrever não é apenas uma questão de gramática, de morfologia ou de sintaxe, não é apenas uma questão de executar, certo ou errado, determinados padrões lingüísticos. Não é tampouco formar frases, nem sequer juntá-las, por mais bem formadas que elas estejam. 197 Falar ou escrever é ativar sentidos e representações já sedimentados que sejam relevantes num determinado modelo de realidade e para um fim específico; é, antes de tudo, agir, atuar socialmente; é, nas mais diferentes oportunidades, realizar atos convencionalmente definidos, tipificados pelos grupos sociais, atos normalizados, estabilizados em gêneros, com feição própria e definida. É uma forma a mais de, tipicamente, externar intenções, de praticar ações, de intervir socialmente, de “fazer”, afinal. Para que o acesso à palavra possa resultar numa forma de acesso das pessoas ao mundo e recobre, assim, um sentido humanizador, o que, nesse vasto mundo, não é rima, mas pode ser uma solução. Alcançar estes objetivos, propostos pela autora, nos desafia, como educadores, à organização de um trabalho pedagógico de qualidade, que proporcione oportunidade de aprendizagem a todos os alunos, como cidadãos, com direitos e deveres de participação social. A consciência crítica sobre a diferença começa pela distinção das variedades do idioma. A percepção do diferente é o primeiro passo para uma sociedade que se pretenda igualitária, em que, em maior ou menor grau, raças, cores, credos, espelham uma característica inerente aos seres humanos: a diversidade. Romper a “barreira” lingüística é superar o isolamento entre pessoas de diferentes culturas, inclusive dentro de uma mesma comunidade lingüística, como o é a Microrregião Marabá. E isso porque cada língua é um retrato do mundo, tomado de um ponto de vista diferente, e que revela algo não tanto sobre o próprio mundo, mas sobre a mente do ser humano. Por isso, a diversidade lingüística, seja entre falantes de um mesmo idioma ou de idiomas diferentes, é parte inerente a este amálgama cristalizado de multiculturalismo. Afinal, é impossível sentir-se parte de uma realidade sem interagir com ela. Imagine-se em um lugar onde não é possível entender o que as pessoas falam, tampouco o que significam os milhares de avisos, placas, propagandas espalhadas pelas ruas. Vivemos em sociedades icônicas, em cada segmento dos espaços deixamos nossa marca. Símbolos que não só refletem o que somos, como também nos situam, dão indicações, informam, permitem nosso passo ou o interditam. Sem a possibilidade de comunicação com o mundo que nos rodeia, nos perdemos nele e, 198 com isso, perdemos parte da condição de sujeitos. É o que Bagno (2001) denominou de diglossia.37 Em meados do século XX, muitos países empreenderam campanhas maciças de alfabetização, porque alguns sociólogos argumentavam que esta era a habilidade pessoal básica para as pessoas acessarem ao mundo da experiência indireta. Por outro lado, alguns antropólogos discutiam a relação entre pensamento lógico e pré-lógico e pensamento alfabetizado e pré-alfabetizado, pois acreditavam que era a alfabetização o que tornava o pensamento abstrato possível. Alguns historiadores também avaliaram a alfabetização, em distintos períodos, cujo foco eram as conseqüências econômicas, sociais e políticas decorrentes. Cerca de 20 anos depois, houve reação àqueles que, ao escreverem sobre alfabetização – como tecnologia neutra e uniforme –, ou seja, abordada fora de seu contexto social, exageraram na distância entre culturas orais e alfabetizadas, forma de subestimar as realizações e ignorar os recursos de sociedades sem alfabetização, a dos iletrados. Em analogia aos usos da língua, pelo dos falantes, no Brasil, há que se reportar, pelo menos, a dois domínios: nível de escolaridade e status social, cuja cultura imperiosa do domínio de uma única norma, para a fala e a escrita da língua, é condição para “ascender” socialmente. Atualmente, a escola ‘alfabetiza’, mas, ignora a diversidade lingüística que se revela, não padrão, com mais evidência na fala, é uma forma de subestimar, mais que dialetos, seus sujeitos, e ignorar o bilingüismo, o plurilingüismo e o multilinguismo, é torná-los ‘sem-lingües’. Sob o título “Baixa escolaridade é predominante”38, a reportagem chama a atenção para uma, entre tantas, das graves questões brasileiras: os adolescentes infratores. O tema não é novidade, todos os dias está estampado nas ruas. Mas nunca será demais voltar a ele, não para preencher colunas de jornais ou engrossar as estatísticas das mazelas do Brasil, e sim para nos forçar a não esquecer jamais. 37 Cf. Bagno (2001), para quem o termo, do grego, significa “duas línguas”. Termo usado em lingüística para designar uma situação em que duas línguas são usadas ao mesmo tempo por uma mesma comunidade de falantes, sendo que uma delas em geral tem um status sociocultural mais prestigioso que a outra. 38 Reportagem publicada no Jornal O Liberal, de 04/03/2007. Caderno Atualidades, p. 9. 199 Paralelamente à estreita relação entre baixa escolaridade e adolescentes infratores, há outros dados assustadores. 60% desses jovens vivem apenas com a mãe ou em famílias recombinadas (a mãe e seu companheiro). Mas é rara a perda total do vínculo familiar, em torno de 5% destes. A freqüência escolar da família desses jovens também é baixa. Apenas 50% possuem o Ensino Fundamental completo, 20% são analfabetos e 10% concluíram o Ensino Médio. No Pará, entre 2003 e 2006, 13.280 (Treze mil, duzentos e oitenta) jovens cumpriram medidas sócio-educativas e entre estes 160 (Cento e sessenta) eram do sexo feminino. O perfil das famílias desses menores não é nada alentador. 60% delas não possuem emprego formal, 15% dependem de pensões do INSS e o restante não tem atividade geradora de renda. Marabá ocupa o quinto lugar neste cenário (1,67%). Fator comum a todos: baixa escolaridade, que os impede, entre outros, de ter acesso ao mercado de trabalho. Esse cenário de violência que envolve crianças e adolescentes não é resultante da baixa escolaridade e sim de outros fatores dos quais esta é uma das conseqüências. O Quadro 8 retrata, em parte, o cenário educacional brasileiro, em comparação ao internacional. Quadro 8 – Educação: o Brasil no cenário internacional O Brasil O resto do mundo Indicadores Índices Situação real Situação atual Analfabetismo 74% das pessoas entre 15 e 64 anos são semi-analfabetas. situação parecida com a dos Estados Unidos no século XIX. Repetência 32% dos estudantes são reprovados na 1ª. série do Ensino Fundamental. apenas 07 países no mundo se saem pior que do que o Brasil neste medidor, entre eles Laos e Gabão. Escolas 37º. foi o lugar em que as escolas brasileiras ficaram em leitura, 40º. em ciências e 41º. em matemática. de uma lista que comparou 41 países. Jornada de Estudos (em anos) 6 é tempo em que os brasileiros passaram em sala de aula. nos países desenvolvidos, a média é de 12 anos. Ensino Superior 20% dos jovens brasileiros chegam à universidade. em países vizinhos ao Brasil, como Venezuela e Peru, esse número é de 40% (dobro). 200 Artigos Científicos 23º. foi o lugar que o Brasil ficou em número de publicações. em uma lista de 25 países. Fonte: Revista Veja, de 07/03/2007. O Quadro 8 revela diversos fatores cujo conjunto traça o perfil e as causas dessa ‘baixa escolaridade’, ou seja, ela não ‘anda’ só. No entanto, numa sociedade, como a nossa, quem não domina a norma escrita, dita ‘padrão’, da língua ‘portuguesa’, falada e escrita no Brasil, acaba discriminado e prejudicado, tanto no seu desenvolvimento escolar quanto fora da escola. Nesse sentido, registrar, descrever e analisar sincronicamente aspectos semântico-lexicais é expor uma diversidade lingüística, de natureza diatópica que, no ambiente escolar e nos livros didáticos, se finge não existir, e mais, responsável, entre outros fatores, pela repetência, evasão, reprovação, etc..., como revelam os dados expostos no Quadro 9, divulgados na primeira semana de fevereiro de 2007, relativos ao Sistema Nacional de Avaliação Básica (Saeb). É o exame do Ministério da Educação que testa os conhecimentos de Português e Matemática dos alunos de 4ª. e 8ª. séries do Ensino Fundamental e 3º. ano do Ensino Médio. Na comparação com 1995, os estudantes brasileiros, em todas as séries, têm desempenho pior que há dez anos. Quadro 9 – Desempenho dos alunos no SAEB/MEC 7 a 14 15 a 17 de anos O desempenho dos alunos no Saeb caiu. O governo diz que e porque o numero matriculas aumentou anos Níveis de Ano ensino O Desempenho em 03 língua 95 97 99 01 05 portuguesa Desempenho em 05 95 O 97 99 01 03 matemática 3ºEM 290 284 267 262 267 258 282 289 280 277 279 271 8ªEF 256 250 233 235 232 232 253 250 246 243 245 230 4ªEF 188 187 171 165 169 172 191 191 181 176 177 182 1995 – 2005 1995 - 005 O número de matrículas % 90 97 67 82 201 Fonte: Dados SAEB/MEC-2007. Considerando esses percentuais, bem melhor visualizados no Gráfico 7, é importante reexaminar a relação entre pesquisa, neste caso, a lingüística, e ensino, que deve ser uma das prioridades das universidades deste país. A efetivação de investigações aprofundadas sobre a realidade lingüística do Brasil, seja da forma falada, escrita, jornalística, acadêmica ou literária, e outras, dela decorrentes, é tarefa fundamental. É esse o desafio! Gráfico 7 – Desempenho dos alunos em língua portuguesa Fonte: Dados SAEB/MEC. Freire39 dizia que consciência crítica é “um pensar que percebe a realidade como processo, que a capta em constante devenir e não como algo estático”. A consciência crítica também é lingüística. Para além do domínio da ‘norma padronizada’, a escola deve ser espaço de discussões sobre preconceitos, arbitrariedade, relação língua e sociedade, tão recorrentes para uma consciência crítica que podem ser suscitadas a partir das diferenças. 39 Cf. Revista Língua. Ano II – Número 16, fev. /2007 p. 45. 202 Na abordagem que se pretende crítica, a escola, as aulas de línguas, devem ser espaços em que se reflita, sobre estas, como função social e assim potencializar os educandos para que se percebam e se sintam sujeitos de sua história, exercendo plenamente sua cidadania. O desenvolvimento de uma educação lingüística pode auxiliar os na construção de uma consciência crítica. Por isso, outras questões se impõem, para, quem sabe, assim, um dia chegarmos ao Atlas Lingüístico do Brasil – ALiB, sonho acalentado, há décadas, pelos dialetólogos, e que, se já elaborado, muito teria contribuído para a superação do mito da unidade que segrega milhões de brasileiros ao anonimato. Esses aspectos, no entanto, só serão relevantes, se, ao mesmo tempo, consideramos questões do tipo: o que e como ensinar. O Quadro 10 (Neves, 1990: 14)40 resulta de uma pesquisa efetuada pela referida autora entre os professores de São Paulo. Ela revela o que de fato os professores avaliam como importante a ser ensinado em sala de aula. Quadro 10 – Aula de língua portuguesa 40 1 Classe de palavras 39,71 % 2 Sintaxe 35,85 % 3 Morfologia 10, 93 % 4 Semântica 3,37 % 5 Acentuação 2,41 % 6 Silabação 2,25 % 7 Texto 1,44 % 8 Redação 1,44 % 9 Fonética e fonologia 0,96 % 10 Ortografia 0,80 % 11 Estilística 0,32 % 12 Níveis de linguagem 0,32 % 13 Versificação 0,16 % Cf. NEVES, Maria Helena de Moura. Gramática na Escola. São Paulo: Contexto, 1990. 203 Ao analisar o Quadro 10, pela ordem de freqüência, os exercícios de reconhecimento das classes e das funções sintáticas ocupam a maior parte das aulas de língua portuguesa. Estes exigem por sua vez, o domínio metalingüístico, ou seja, obriga o aluno, a saber, o nome da língua, em vez e proporcionar a ele práticas de usos desta língua. Bagno In (IRANDÉ, 2007) resume claramente o quadro atual do ensino que se processa atualmente, no espaço-tempo sala de aula – rarefeito e, portanto, precioso em um país de tradição educacional paupérrima como o nosso – com essas aulas de nomenclatura gramatical, rigidamente fixadas há séculos. Portanto, mais especificamente, no que se refere ao ensino de línguas, pesquisas revelam, cada vez mais, a necessidade urgente de discussões e reflexões acerca do objeto e do objetivo deste ensino – que, até então, ignora a diversidade lingüística – da função da escola, do professor e do aluno, frente a esta, ou seja, de uma educação lingüística que se concentre no que é relevante para a função humana e intelectual de todos nós. Sem esconder a realidade sociocultural intrisincamente excludente que é a nossa. Sem fazer a propaganda enganosa que basta “saber gramática” para ser capaz de ler e escrever produtivamente e nem que “saber português” é gramática de “ascensão social”. Para tanto, é preciso ter-se a visão da multidimensionalidade da língua no país, não apenas para efeito de precisar e demarcar espaços geolingüíticos, e, sim, para contribuir, de forma direta, para um adequado equacionamento entre a realidade de cada área e o ensino de língua que nela se processa. Pessoas, como nós, que vivem em uma sociedade, com uma tradição escrita imposta, baseada em uma história literária, e m sistema educacional organizado em função dela, de perpetuá-la, se “acostumaram” a ter uma idéia de língua como sinônimo de gramática e esta um conjunto de ‘regras’ para o “bem” falar e o “bem” escrever. Antunes (2007) afirma que esse ideário é tão forte e influente, ainda, que se transformou em ‘crença’, o que dificulta propor ao grande público o debate sobre ‘gramática, imagine sobre questões lingüísticas. Estas, então, as pessoas, em geral, acham que “não lhes dizem respeito”, “não têm nada a ver” com suas atividades profissionais, com suas relações familiares, com suas interações nos diferentes 204 espaços em que atuam. Questões lingüísticas, dizem, “são questões para professores de línguas ou para gramáticos, não nos pertencem”. No entanto, “esquecemos” que as práticas educativas são instituídas socialmente, são produções culturais. A língua é uma atividade social, um trabalho coletivo, um processo, um fazer-se permanente e coletivo, empreendido por todos os seus falantes, cada vez que eles interagem nas mais diversas situações interlocutivas, em diferentes espaços discursivos. A questão que se impõe é como desconstruir todo um folclore, toda uma superstição que gira em torno dos fatos lingüísticos na nossa cultura, e, assim, não continuar a perpetuar injusta e injustificavelmente um conjunto de mitos sem fundamento. Essa questão nos obriga a um questionamento sobre legitimidade lingüística, sobre política lingüística. E requer uma abordagem dos processos históricos, sociais e políticos que levaram à constituição do cânone lingüístico atual. Na esfera estritamente lingüística, implica mostrar, cientificamente, o que é e qual norma lingüística, considerando a polissemia do termo? Como admitir vários nomes para um mesmo objeto e um mesmo objeto apresentar diferentes significados e o sistema escolar admitir apenas um correto? Norma lingüística corresponde ao uso estatisticamente dominante ou ao uso valorizado por um determinado grupo – o grupo socialmente dominante –, que produz assim o “bom uso”, que irá eclipsar as normas de outros grupos? Norma e ensino. O que ensinar? Assim, Se, como resultado da intervenção dos lingüistas, o tema da variação acabou incorporado pelo discurso pedagógico, podemos dizer que não conseguimos ainda construir uma pedagogia adequada a essa área. Talvez porque não tenhamos, ainda, como sociedade, discutido suficientemente, no espaço público, nossa heterogênea realidade lingüística, nem a violência simbólica que a atravessa (FARACO. In Bagno, 2007, p. 17). Nenhuma das variáveis selecionadas para este trabalho pode, por si só, explicar as variações e mudanças que ocorrem nos sistemas de uma dada comunidade lingüística. Esquivas e desafiadoras elas são, contraditórias e fortuitas, mas regulares e inconscientes. Apenas é lícito dizer que algumas dessas causas explicarão alguns câmbios lingüísticos. A verdade é que elas – e outras desconhecidas – agem de certo, mas, sem continuidade, cruzam-se aqui, retraem-se 205 ali, chocam-se acolá. Umas se mostram mais poderosas, como o menor esforço ou as influências de substrato; outras mais fracas, como a persistência da linguagem infantil; outras talvez inoperantes, como o clima ou a raça, que, portanto, não serão causas. É provável até que um dos grandes fatores seja o acaso metafísico, embora contra essa hipótese valha o argumento da regularidade e coerência do processo. De qualquer modo, mesmo de forma não consciente, as variações/mudanças lingüísticas são fenômenos humanos e, como tais, extremamente complexos, fenômenos em que rezam fatores fisiológicos, psicológicos, sociológicos, mesológicos. Nunca talvez se lhe poderá apontar a causa predominante, nem lhe é adequado esse tratamento racionalista que lhe querem emprestar certos autores. No entanto, há que se dizer alguma coisa sobre os efeitos dessas variações. A primeira e mais importante conseqüência das variações é a ruptura do liame gramatical com a escola. Quer dizer: por força das mutações de sons divergentes por causa da diversidade de situação fonética, deixa-se de perceber a relação que unia o significante ao significado. Uma conseqüência é a perda da consciência da composição e da derivação, os dois processos básicos de formação de palavras no sistema denominado língua “portuguesa". Assim é que, por apofonia41, per mais dare deu perdere em latim, português perder. Mas quem de nós, atualmente, sente em perder qualquer relação etimológica com dar? Conhecer e nome são palavras corradicais, já que se encontram na raiz latina gno, mas quem o diria? Insosso deriva de sal e ninguém espontaneamente o pode perceber. É que em latim salsus, “salgado”, recebendo o prefixo in, produziu, por apofonia, insulsus, de cujo acusativo procede o português insosso. Treva e tenebroso são palavras corradicais, do mesmo modo que saudade e solteiro, do mesmo modo que dez e onze (um-decim: “um mais dez”), do mesmo modo que faculdade, fazer, artífice, fácil, fatura, malfeitor, benefício, dificuldade, feitiço, tanto é verdade que todas estas palavras estão à base de fac. Outro efeito é o aparecimento de formas convergentes. Por tal se entende o vocábulo único resultante da transformação de dois ou mais étimos. Assim, de rideo e de rivu, latinos, temos o português rio, que, por isso mesmo, representa duas palavras completamente estranhas uma à outra: primeira pessoa do indicativo 41 Variação em vogal de raiz ou de afixo que pode resultar em mudança de significação ou de função gramatical. 206 presente de rir e “corrente d’água”. São é o ponto de convergência de quatro cadeias evolutivas, na origem das quais estão respectivamente sunt, sum, sanu e sanctu. Sunt e sum deram som na língua arcaica, e o o nasal acabou ditongando-se, surgindo então a forma única são: “eu são”, “eles são”; sanu, “sadio”, por perda normal do -n- intervocálico, continua em são; sanctu deu santo, que em virtude de posição ante-tônica (fonética sintática), perdeu a sílaba final, transformando-se em san, ditongado depois em são: “São Joaquim”, “São Bento”. Manga identifica em português dois étimos distantes: manica, do latim, “parte do vestuário”, e manga, do malaiala, nome de certo fruto. As formas convergentes são sempre um resultado fortuito, mas merecem registro e estudo, porque sob um mesmo vocábulo escondem palavras fundamentalmente diversas, que não podem ser confundidas nem examinadas sob um mesmo prisma. Nos dicionários, por exemplo, devem constituir cada uma um verbete autônomo. A língua não é usada de modo homogêneo por todos os seus falantes. O uso de uma língua varia de época para época, de região para região, de classe social para classe social, e assim por diante. Nem individualmente, podemos afirmar que o uso seja uniforme. Dependendo da situação, uma mesma pessoa pode usar diferentes variedades de uma só forma da língua. Câmara Jr. (1970) observa que a variação semântica não deve ser analisada isoladamente, como acontece de maneira geral na gramática tradicional. Para ele, o sentido não é um conceito independente, mas está ligado à forma, pois a lexia é uma unidade de forma e de sentido. Ao longo desses séculos, a escola não é mais do que um instrumento de reprodução da sociedade na qual está inserida e o privilégio de um padrão normativizador, segundo a variante socialmente dominante, é uma poderosa peça dessa engrenagem ideológica. Uma das tarefas dos pesquisadores desta geração é desvendar nossa realidade lingüística e reajustar a norma pedagógica no que for necessário. Esse desvendar vem sendo feito vigorosamente nessas três últimas décadas, primeiro pelos dialetólogos, depois pelos sociolingüistas; o reajuste da norma pedagógica se faz na prática da sala de aula, no cotidiano de muitos, não de todos os professores, 207 sobretudo daqueles com uma boa formação lingüística, mas os instrumentos pedagógicos “reajustados” estão por vir. O modelo de língua ideal que os gramáticos tradicionalistas tentam impor fez nascer a distância entre a língua real, usada por falantes reais, e aquela, idealizada. A conseqüência mais desastrosa desse ‘hiato’ foi a criação de uma série de mitos que, além de violentar, baixam profundamente a auto-estima lingüística de milhões de brasileiros, que acham que “não sabem falar português”, e, ainda, prejudicam seriamente o ensino de língua. Seria muita ingenuidade considerar que o português brasileiro e o português europeu trilharam caminhos idênticos, ao longo desses 500 anos, pois ambos apresentam diferenças inquestionáveis, as aqui apresentadas são apenas algumas delas. 208 Para alguém, como eu, que aprendeu, nestes dois anos de mestrando, do CCSE/UEPA, que, ainda, há muito a aprender, me parece que a primeira lição a ser aprendida, por aqueles que, como eu, se aventuram pelos labirintos dos saberes lingüísticos, é aquela anunciada por Bagno (2001), nas primeiras páginas do Capítulo I, desta Dissertacao: não se permitir viver o sério perigo do esquecimento do nosso passado, cujas faces secretas estão sob a face neutra das palavras. Ao olhar para este reino encantado das palavras – as ocorrências semântico-lexicais aqui registradas, era como se elas me perguntassem: Trouxeste a chave? A ‘chave’ era um dos objetivos - estabelecer uma análise comparativa, de cunho semântico-lexical, entre as ocorrências semântico-lexicais, registradas na Microrregião Marabá, com as propostas pelo QSL (ALiB, 2001). Para tanto, partimos da hipótese que o acervo semântico-lexical, usado por moradores nativos da Microrregião Marabá/PA, era diferente se comparado ao proposto pelo Questionário Semântico Lexical - QSL (ALiB, 2001). Para comprovação desta hipótese, se estabeleceu, como objetivo geral, analisar as ocorrências semântico-lexicais, de natureza diatópica e diatrástica, encontradas na fala de moradores desta Microrregião, situada na Mesorregião Sudeste Paraense, em comparação às referidas anteriormente. Os dados estudados permitiram identificar diferenças entre os dois pontos lingüísticos (Marabá e Palestina do Pará), representativos da Microrregião, bem como entre esta e as propostas pelo QSL. Trata-se do significante das expressões, o que ocasiona diferença de léxico ou entre os falares das referidas localidades ou em relação às propostas pelo QSL. Reconhecer que a variação lingüística não resulta apenas das capacidades cognitivas do homem e sim da interação dos fatores estritamente lingüísticos e dos fatores sociológicos, abriria campo para os estudos desses fatores e para o desenvolvimento de perspectivas teóricas nesta área, mas o espaço de discussão sobre as relações entre língua e cultura ainda caminha a passos lentos. Neste espaço, reunimos uma breve síntese sobre os resultados desta pesquisa, cuja descrição, organização, cartografação e análise de um léxico nunca antes descrito, é um passo decisivo para o conhecimento, registro e análise das variantes lingüísticas, de cunho semântico, e sociais do português brasileiro, sobretudo, de uma região marcada pelo fluxo migratório, como é o caso da Microrregião Marabá, local desta pesquisa. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 201 Nessa perspectiva, talvez, possamos, preencher as inúmeras lacunas relativas aos estudos sobre o português falado na Microrregião Marabá e dar continuidade aos estudos dessa natureza, no Estado do Pará, a fim de contribuir, ora para desconstruir idéias cristalizadas e equívocos sobre o falar paraense, ora para confirmar suposições feitas sobre este falar, uma vez que, a produção de dados, resultados da pesquisa in locu, permite fazer afirmações com bases científicas sobre o que é uma língua e os usos que os falantes dela fazem, neste caso, o dialeto denominado paraense. Essas ‘vozes’, a exemplo do convite que nos faz Drummond, nos versos: “Penetra surdamente, no reino das palavras...” Chega mais perto e contempla as palavras...”, também nos convidam a tentar ‘descobrir’ as ‘faces secretas’, sob a face neutra representada pelas ocorrências semântico-lexicais identificadas e cartografadas nesta Microrregião. As ‘faces secretas’ são as memórias desta comunidade lingüística e nos revelam as designações que os falantes/ouvintes atribuem ao mundo/espaço dito real. E, ao mesmo tempo, são ‘chaves’ que possibilitam compreender como esse mundo/espaço é elaborado e reelaborado pelos falantes/ouvintes, como membros desta comunidade lingüística e segmentos sociais, em suas relações intersubjetivas. A ‘face neutra’, ou seja, as ocorrências semântico-lexicais funcionam como ‘nome fantasia’, para rotular, etiquetar, um conjunto de saberes e poderes, que resultam de um intenso fluxo migratório, que ecoam nas práticas de interlocução, em especial as experienciadas na instituição escolar, que, infelizmente, permeada por concepções equivocadas sobre o que é uma língua e os usos que dela fazem os sujeitos, ignora o fenômeno da variação lingüística, em todos os níveis da estrutura da língua, porque não o (re)conhece, e, ao agir dessa forma, revela que confunde: fala (sistema fonológico) com escrita (sistema ortográfico); “erro” de português com desvio ortográfico, quando se trata de escrita; diferença (variação) com deficiência; língua com gramática normativa; avaliação com julgamento. Confusões, essas, que Bagno (2002) tenta esclarecer, ao afirmar: [...] Enquanto a língua é um rio caudaloso, longo e largo, que nunca se detém seu curso, a gramática normativa é apenas um igapó, uma grande poça de água parada, um charco, um brejo, um terreno alagadiço, à margem da língua (p. 9-10). Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 202 A escola pode e deve ser o espaço da (com)vivência que nos (re)construa como sujeitos reflexivos, capazes de operar com saberes, outros, que ressignifiquem concepções e essas possam nortear o fazer educativo, cotidianamente, e possibilitem a alunos e professores mediarem saberes que iluminem um ensino de língua eficiente, que forme, de fato, leitores e escreventes. E, assim, aos poucos, preenchermos a lacuna desse tipo de estudo lingüístico, cuja literatura da área atesta, já há algum tempo, a inexistência de dados que revelem, de maneira mais ampla e geral, características do português falado no Brasil, pela ausência de descrição, como esta, que me desafiei a realizar e cuja conseqüência é um ensino de uma suposta língua que ninguém domina, ‘morta’ que está nas gramáticas. Isso porque acreditamos que o acervo lingüístico de uma comunidade espelha a própria história da mobilidade sócio-espacial do homem. A existência de variedades lingüísticas é um fato inegável. Este trabalho, por exemplo, reflete, além da diversidade diatópica, formas variantes entre os próprios sujeitos nativos dos pontos lingüísticos (a social), ao mesmo tempo, índices sobre a origem da formação desta Microrregião, cuja marca singular é a migração constante. Como é a diferença, entre os modos de falar, que identifica, nada mais justo que descrevê-la, para, assim, inscrevê-la no conjunto dos saberes necessários à compreensão deste espaço amazônico. Assim, na tentativa de vislumbrar tecer fios, entrelaçados de significados, como o fazem as aranhas, com outros estudos que investiguem a fala, e conseqüentemente um ensino de língua ‘materna’ que não a ignore, priorizamos correlacionar esse conjunto de dados às práticas educativas e, em especial, aquelas que se processam na sala de aulas, inclusive as de uma língua, que, por força de Lei, somos obrigados a denominar portuguesa. Ensejando, por fim, a questão central deste estudo que é a variação lingüística, que a muito merece entrar pela “porta da frente”, ou seja, estar, ao lado de tantas outras, no centro dos inúmeros debates sobre multiculturalismo, pluralidade, identidade, educação, entre outros tantos temas, considerados relevantes, menos este ilustre desconhecido, por isso, infelizmente, quase sempre ausente, o que ajuda a perpetuar o mito da língua única, em um país multicultural. As nossas ‘avenidas dos sonhos’, metaforicamente, foram as trilhas cartográficas percorridas, para a composição deste trabalho, que: evidenciaram que a heterogeneidade lingüística, atualmente envolta em estigma e preconceito social, é inerente à qualquer sistema lingüístico, a língua; Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 203 reafirmaram que esta heterogeneidade deve e precisa ser entendida à luz do contexto lingüístico-social que cerca cada uma das comunidades de fala. Isso tudo para nos ajudar a combater, no que diz respeito à educação, julgamentos equivocados e discriminatórios sobre heterogeneidade lingüística, e a complexa rede de conseqüências sociais, culturais e políticas que ela suscita e é suscitada, nas práticas educativas, que se processam em vários espaços, entre estes, a escola, que se encarregam de perpetuá-los. A escola, que deveria ser um espaço acolhedor, de exercício de práticas de inclusão, de respeito às diferenças, de socialização, de interlocução entre os sujeitos nela presentes, se destina, se reduz, se resume, a reproduzir mecanismos de exclusão. E o ensino de língua ‘portuguesa’ que se pratica, atualmente, em nossas escolas, é uma poderosa arma, responsável, usada oficialmente, para estigmatizar os que não dominam a “boa” língua, e assim dissemina e perpetua o preconceito lingüístico, mais um entre os muitos já existentes. Isso porque, muitas vezes, e com tanta intensidade, na “casa da palavra, onde o silêncio mora” (Caetano Veloso, “Terceira Margem do Rio”, Circuladô), cada palavra dita implica o silêncio de inúmeras outras a dizer. E sobre esse poder das palavras, Cecília Meireles nos alertou, na obra de sua autoria, O Romanceiro da Inconfidência, ao sintetizá-lo: [...] Ai palavra! Ai Palavra! Que estranha potência a vossa! [...]. Cartografia Lingüística e Educação na Amazônia: um estudo semântico-lexical da fala dos moradores na/da microrregião Marabá/Pará 204 RELATIVAS À REGIÃO ATZINGEN, Noé. Vocabulário Regional de Marabá. Fundação Casa da Cultura de Marabá/Projeto Usimar: Cultural, 2004. FIRMINO, Ana Izabel Pantoja. (coord) Sul e Sudeste do Pará Hoje – Associação dos Municípios do Araguaia e Tocantins. Belém: UNICEF, 1996. MARABÁ. Boletim Técnico. N. 2. Fundação Casa da Cultura, 2003. MONTEIRO, João Brasil. Marabá: caminho das águas. Marabá: (s/ed.), 2002. MORAES, Almir Queiroz de. Pelas Trilhas de Marabá. Marabá: Chromo Arte, 1998. REVISTA NOSSO PARÁ – COLEÇÃO ESPECIAL. Belém: VER Editora, (s/d). Paginação irregular. FERREIRA, Edmilson Paes. O Fluxo Migratório na Transamazônica. Belém: Universidade Federal do Pará, 2002. Trabalho de Conclusão de Curso (mimeo.). GERAIS AGUILERA, Vanderci de Andrade. (org.) A Geolingüística no Brasil: trilhas seguidas, caminhos a percorrer. Londrina: Eduel, 2005. 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In: Ler e Produzir: discurso, texto e formação do sujeito leitor/produtor. Maceió: Edufal, 2002. 217 218 APÊNDICE 1 – Quadro de todas as ocorrências semântico-lexicais de Marabá e Palestina do Pará: campo semântico, tema (QSL, 2001 – ALiB), questão, sujeito, ocorrência e ponto lingüístico CAMPO SEMÂNTICO – I – ACIDENTES GEOGRÁFICOS Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 1. Como se chama aqui um rio pequeno, de uns dois metros de largura? Marabá CÓRREGO S1MBE Palestina grota corgu Marabá S2FBE Palestina lagu grota Marabá Palestina grota S3MEM riu piquenu Marabá Palestina corgu S4FEM corgu Questão 2. ... tronco, pedaço de pau ou tábua que serve para passar por cima de um ... PINGUELA S1MBE bausa di bananera ponti S2FBE pinguela pinguela S3MEM ponti/canoa ponti S4FEM ponti ponti Questão 3. ... o lugar onde o rio termina ou encontra com outro rio? FOZ S1MBE boca du ri S2FBE S3MEM S4FEM incontru das água incontru dus riu NFR incontru das água cabicera incontru dus riu Questão 4. Muitas vezes, num rio, a água começa a girar, formando um buraco na água que puxa para baixo. Como se chama isto? cabicera S1MBE REDEMOINHO (DE ÁGUA) Funiu S2FBE ridimunhu funiu S3MEM reboju S4FEM banzeru rededuinhu banzeru S3MEM Banzeru banzeru ridimunhi da água Questão 5. ... o movimento da água do rio? (imitar o balanço das águas) ONDA DE RIO S1MBE banzeru du riu/marezia/onda das água banzeru S2FBE maré banzeru S4FEM Banzeru banzeru 219 Questão 6. ... o movimento da água do mar? (imitar o balanço das águas) ONDA DE MAR S1MBE S2FBE banzeru du má NR onda Questão 7. Depois da chuva a terra fica _________?onda TERRA UMIDECIDA PELA CHUVA S1MBE onda S2FBE terra úmida umidadi Molhada S3MEM onda onda S3MEM molhada S4FEM Onda onda S4FEM Rispingada molhada úmida molhada CAMPO SEMÂNTICO – II – FENÔMENOS ATMOSFÉRICOS Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB REDEMOINHO (DO VENTO) Questão 8. ... o vento que vai virando em roda e levanta poeira, folhas e outras coisas leves? Marabá ridimunhi S1MBE Palestina ridimunhu Marabá S2FBE Palestina ridimuinhi ridimunhu Marabá S3MEM Palestina redumuinhu redemoinhu Marabá S4FEM Palestina redemuinhu ridimunhu S3MEM relampejandu S4FEM relâmpagu Questão 9. ... uma luz que risca o céu em dias de chuva? RELÂMPAGO RAIO S1MBE relâmpagu relampu S2FBE relâmpagu relampi relâmpagu Questão 10. ... uma luz forte e rápida que sai das nuvens, podendo queimar uma árvore, em dias de mau tempo? relâmpagu 220 S1MBE curiscu curiscu S2FBE Raiu curiscu S3MEM Raiu raio S4FEM raiu raiu trovãu S4FEM truvãu truvãu Questão 11. ... o barulho forte que se escuta logo depois de um __________ (cf. item 10)? TROVÃO S1MBE NFR truvãu S2FBE truvãu truvãu S3MEM Truvãu Questão 12. ... uma chuva com vento forte que vem de repente, geralmente no verão? S1MBE TEMPORAL temporau chuva di primavera S2FBE tempestadi di vetania chuva S3MEM chuvarada S4FEM temporau temporau temporau Questão 13. Existem outros nomes para __________ (cf. item 12) NOMES ESPECÍFICOS PARA TEMPORAL S1MBE NFR chuva di primavera S2FBE NFR chuva di pedra S3MEM chuva forti / chuva grossa temporau S4FEM chuva rápida / pé d’água tempestadi S3MEM chuva passagera di manga S4FEM chuva passagera di manga Questão 14. ... uma chuva de pouca duração, muito forte e pesada? TROMBA D’ÁGUA / PÉ D’ÁGUA S1MBE temporau chuva di manga S2FBE chuva passagera chuva di manga chuva chuva 221 Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 15. É uma chuva bem fininha? Marabá GAROA S1MBE Palestina chuva di amolhá abestadu / garoinha lubrina Marabá S2FBE Palestina Chuviscanu lubrina Marabá S3MEM Palestina chuva fina/chuvendu fininhu neblina Marabá S4FEM Palestina chuvisu / chuva di molhá besta lebrina Questão 16. Durante uma chuva pode cair pedacinhos de gelo. Como chamam para isso ? S1MBE CHUVA DE PEDRA chuva di pedra S2FBE chuva di pedra chuva di pedra S3MEM chuva di granizu di granizu chuva di pedra S4FEM chuva chuva di granizu chuva di pedra Questão 17. Quase sempre, depois de uma chuva, aparece no céu uma faixa com listras coloridas e curvas (mímica). Que nomes dão a essa faixa? ARCO - ÍRIS S1MBE arcu-iri arcuí S2FBE Arcuíris arcuí S3MEM arcuíris arcuíris S4FEM Arcuíris arcuíris Questão 18. De manhã cedo, a grama geralmente está molhada. Como chama aquilo que molha a grama? ORVALHO S1MBE Uruvai uruvai S2FBE Orvalhu serenu S3MEM molhadas orvalhu S4FEM Serenu serenu Questão 19. Muitas vezes, principalmente de manhã cedo, quase não se pode enxergar por causa de uma coisa parecida com fumaça, que cobre tudo. Como chamam isso? NEVOEIRO ESTIAR / COMPOR O TEMPO S1MBE serraçãu serraçãu S2FBE Nevi nevi S3MEM Neblina neblina S4FEM Neblina Questão 20. Como dizem aqui quando termina a chuva e o sol começa a aprecer S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM nevi 222 u sou clariô/u sou abriu clariô u céu passô a chuva u tempu alimpô cabô a chuva u céu ta clariandu u sou abriu clariô u tempu CAMPO SEMÂNTICO – III – ASTROS E TEMPOS Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB NASCER DO SOL Questão 21. O que é que acontece de manhã cedo? Marabá S1MBE clariá du sou/raiá du sou saindu Palestina u sol tá Marabá S2FBE Palestina u sol vêi nacendu as barra veiî clarianu Marabá S3MEM Palestina u u sol tá nascendu clariô u dia Marabá S4FEM Palestina u dia istá clariandu nacer du sou 223 Questão 22. E o que acontece no final da tarde? S1MBE PÔR DO SOL u sou tá si pondu u sou tá si ponu S2FBE u sou si põi S3MEM anoitecendu u sou tá si pondu S4FEM escurecenu istá iscurendu /chegandu a noiti pô du sou Questão 23. ... a claridade do céu antes de __________ (cf. item 21)? ALVORADA CREPÚSCULO S1MBE S2FBE S3MEM rompê da aurora u céu vem clarinu auvorada anoitecenu raiu du sou NFR Questão 24. ... a claridade que fica no céu depois do __________ (cf. item 22)? S4FEM auvorecê NFR S1MBE clariá da noite/a noiti vem chegandu claridadi da lua S4FEM NFR NFR S2FBE NFR sou raiu du S3MEM Nuvem dourada NFR Questão 25. De manhã cedo, uma estrela brilha mais e é a última a desaparecer. Como chamam esta estrela? ESTRELA MATUTINA S1MBE istrela da manhã dauva istrela S2FBE istrela dauva istrela dauva S3MEM NFR S4FEM istrela cadenti istrela da istrela dauva manhâ Questão 26. De tardezinha, uma estrela aparece antes das outras, perto do horizonte, e brilha mais. Como chamam esta estrela? ESTRELA VESPERTINA S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM istrela da boca da noiti istrela istrela cadenti NFR NFR papassea istrela papassea NFR NFR Questão 27. De noite, muitas vezes pode – se observar uma estrela que se desloca no céu e faz um risco de luz. Como chamam isso? (Identificar os verbos usados para identificar os movimentos da estrela cadente) ESTRELA S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM 224 CADENTE istrela di cauda/istrela di rabu guii Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB istrela velaçãu S1MBE Palestina Marabá S2FBE Palestina camim di sãu tiagu camin di sãu tiagu camim de sãu tiagu camin di sãu tiagu Questão 29. ... parte do dia quando começa a clarear? S1MBE AMANHECER deus ti guii istrela cadenti istrela cadenti istrela cadenti istrela cadenti Questão 28. Numa noite bem estrelada, aparece uma banda ou faixa que fica no céu de fora a fora, onde têm muitas estrelas muito perto uma das outras. Como chamam esta banda ou faixa? Marabá VIA LÁCTEA istrela deus ti S2FBE nacendu u dia u dia vêim raianu u dia nacenu u dia claru Marabá S3MEM Palestina cruzeru du su NFR Marabá S4FEM Palestina céu istreladu NFR S3MEM S4FEM auvovercendu / amanhecendu / cagá dus pintu clarianu amanhecê du dia amanhecendu Questão 30. E quando o sol se põee __________ (cf. item 21)? ENTARDECER S1MBE boca da noiti anoitecenu S2FBE a noiti vêim iscurecendu anoitecenu S3MEM u dia ta si findandu iscurecenu S4FEM Intardecê S2FBE boca da noiti S3MEM S4FEM boquinha da noiti boquinha da noiti fim di tardi Questão 31. ... o começo da noite? S1MBE ANOITECER boca da noiti boquinha da noiti MESES DO ANO Questão 32. Quais são os meses do ano? noiti Anoitecendu anoitecendu 225 S1MBE janeru/fevereru/marçu/abriu/mai/junhu/julh u/ agostu/setembru/otubru/novembru /dezembru janeru/fevereru/marçu/abriu/mai/junhu/julh u/ agostu/setembru/otubru/novembru /dezembru S2FBE janeru/fevereru/marçu / abriu/mai/junhu/julh u/ agostu/setembru/otub ru/novembru/dezembr u S3MEM janeru/fevereru/marçu/abriu/m aiu/ junhu/julhu/agostu/setembru/ outubru/novembru/dezembru janeru/fevereru/marçu/abriu/m aiu/ junhu/julhu/agostu/setembru/ outubru/novembru/dezembru S4FEM janeru/fevereru/marcu/abriu/ maiu/junhu/julhu/agostu/setem bru/otubru/novembru/dezembru janeru/fevereru/marcu/abriu/ maiu/junhu/julhu/agostu/setem bru/otubru/novembru/dezembru janeru/fevereru/marçu / abriu/mai/junhu/julh u/ agostu/setembru/otub ru/novembru/dezembr u Questão 33. Alguns desses meses têm outro nome, por exemplo, junho, julho, etc.? MESES COM NOMES ESPECIAIS S1MBE janeru/abriu/mai/julhu/setembru/dezembru S2FBE fevereru/maiu/junhu/ setembru/dezembru Junhu/julhu/novembr u/dezembru S3MEM abriu/fevereru/julhu/dezembru janeru/fevereru/maiu/julhu/deze mbru S2FBE Ontêim S3MEM Ontêim S4FEM janeru/abriu/junhu/otubru/ dezembru jeneru/fevereru/junhu/julhu/de zembru janeru/junhu/julhu/novembru/dezembru Questão 34. o dia passou? [o senhor já almoçou (ou jantou) hoje? Quando foi que almoçou (ou jantou) pela última vez?] ONTEM S1MBE onti onti onti onteiî S4FEM ontêim onteiî 226 Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 35 ... o dia que foi antes desse dia? [E um dia para trás?] Marabá ANTEONTEM S1MBE antonti Palestina antionti Marabá S2FBE Marabá Palestina Palestina Ontem di onti antonti antiontêim S3MEM antis di onteiî Marabá S4FEM Palestina Antiontêim antis di onteiî Questão 36. ... o dia que foi antes de __________ (cf. item 35)? [E mais um dia para trás] S1MBE TRASANTONTEM quarta - fera passada treisontonti S2FBE S3MEM S4FEM treisnontonti treisdiontonti antisdionti NFR tresontonti antonti 227 CAMPO SEMÂNTICO – IV – FLORA Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB TANGERINA / MEXERICA Questão 37. ... as frutas menores que a laranja, que se descascam com a mão, e, normalmente, deixam um cheiro na mão? Como elas são? (pedir para descrever) Marabá S1MBE tangirina/mixirica Palestina tangirina Marabá S2FBE tangirina tangirina Marabá tangirina S3MEM tanja Marabá S4FEM mixirica/tangirina tangirina S4FEM Amenduiî minduim Questão 38. ... o grão coberto por uma casquinha dura, que se come assado, cozido, torrado ou moído? AMENDOIM S1MBE menduiî bundubim S2FBE Menduiî S3MEM bundubim Amenduiî amendoim Questão 39. ... umas florezinhas brancas com miolo amarelinho, ou florezinhas secas que se compram na farmácia e servem para fazer um chá amarelino, cheiroso, bom para dor de barriga de nenê/bebê e até também para acalmar? (Mostrar) CAMOMILA S1MBE aufavaca/perpétua/hosrtelã/camumila NFR S2FBE camumila S3MEM aufazema ervacidera / camumila NFR S4FEM camumila camomila Questão 40. ... cada parte que se corta do cacho da bananeira para põr para madurar? PENCA S1MBE penca di banana penca S2FBE penca di banana penca S3MEM penca di banana penca S4FEM penca di banana penca Questão 41. ... duas bananas que nascem grudads? BANANA DUPLA PARTE FINAL DA INFLORES_ CÊNCIA DA BANANEIRA S1MBE Gemi ingemada Questão 42. ... a ponta roxa no cacho da banana S2FBE Gêmia ingemadu S3MEM banana gêmias gêmias S4FEM banana gêmia gêmias 228 S1MBE pauma da banana / coraçãu da banana manga S2FBE Imbigu banana S3MEM mangará da pinta da banana coraçãu S4FEM olhu da bananera coraçãu 229 CAMPO SEMÂNTICO – V – ATIVIDADES AGROPASTORIS Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 43. O que é que se corta da planta, quando se colhe o milho? Marabá ESPIGA ispiga S1MBE Palestina ispiga Marabá S2FBE Palestina ispiga ispiga Marabá Palestina Ispiga S3MEM Marabá ispiga Palestina ispiga S4FEM ispiga Questão 44. Quando se tira da __________ (cf. item 43) todos grãos do milho, o que sobra? SABUGO S1MBE Sabugu S2FBE sabugu sabugu sabugu S3MEM sabugu sabugu S4FEM sabugu du milhu sabugu Questão 45. Depois que se corta o pé de arroz ou de fumo, ainda que fica uma pequena parte no chão. Como se chama essa parte? SOCA / TOUCEIRA S1MBE soca troncu S2FBE troncu du arroiz tronquera S3MEM raiz / troncu NFR S4FEM tocu du arroiz NFR Questão 46. ... flor grande, amarela, redonda, com uma rodela de sementes no seio? GIRASSOL S1MBE girassou girassou S2FBE girassou mirassou S3MEM Girassou girassou S4FEM girassou girassou Questão 47. Onde é que ficam os grãos de feijão, no pé antes de ser colhido? VAGEM DE FEIJÃO MOINHA S1MBE bagi bagi S2FBE bagi casca du fejãu S3MEM casca du fejãu casca di fejãu S4FEM fava bagi du fejãu Questão 48. Depois de colher e secar o feijão, alguns costumam bater com uma vara para soltar os grãos da __________ (cf. item 47) e a palha vai virando um pó. Como se chama esse pó da palha do feijão batido? 230 S1MBE xerenhi muim S2FBE paia batida bagaçu S3MEM Puaca S4FEM NFR Puaca NFR Questão 49. ... aquela raiz branca por dentro, coberto por uma casca marrom, que se cozinha para comer? MANDIOCA / AIPIM Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB S1MBE macaxera S2FBE macaxera macaxera S3MEM Macaxera macaxera S4FEM macaxera macaxera Questão 50. Tem um tipo de __________ (cf. item 49) que não serve para comer e se rala para fazer farinha (polvilho, goma). Como se chama essa raiz? Marabá MANDIOCA macaxera S1MBE mandioca Palestina mandioca Marabá S2FBE Palestina mandioca mandioca Marabá Palestina mandioca S3MEM mandioca Marabá S4FEM Palestina mandioca mandioca Questão 51. ... um veículo de uma só roda, empurrado por uma pessoa, para pequenas cargas em trechos curtos? CARRINHO DE MÃO S1MBE carriî di mãu carru di mãu S2FBE carru di mau carriî di mãu S3MEM carinhu di mãu S4FEM cariî di mãu carru di mãu carriî di mãu Questão 52. ... as duas partes em que a pessoa segura para empurrar o __________ (cf. item 51)? HASTES DO CARRINHO DE MÃO S1MBE cabu du carriî di mau CANGALHA S1MBE Culera CANGALHA S2FBE S3MEM S4FEM perna du carru di mãu braçu du carrinhu de mãu braçu du carru di mau pegadô du carriî di mãu braçu du no carrinhu di de mãu braçu du carru di mãu Questão 53. ... a armação de madeira, em forma de forquilho (mímica), que se coloca pescoço animais (porco, terneiro/bezerro, carneiro, vaca) para não vararem a cerca? cabu du carru furquia S2FBE cambitu furquia S3MEM NFR NFR Questão 54. ... armação de madeira que se coloca no lombo do cavalo ou do burro para levar cestos ou cargas? S4FEM Cangalha furquia 231 S1MBE Cangaia S2FBE cangaia cangalha cangaia S3MEM NFR S4FEM cangaia cangalha cangaia Questão 55. ... esses cestos de vime, de taquara, de cipós trançados, para levar batatas(mandioca, macaxeira, aipim etc...), no lombo do cavalo ou do burro? JACÁ S1MBE caçuá / paneru S2FBE jacá jacá jacá S3MEM paneru S4FEM cangaia cochu jacá caçuá S3MEM NFR NFR S4FEM NFR cestu jugo Marabá Palestina NFR S3MEM ovelha recêi-nascida filhoti di ovelha S4FEM NFR Questão 56. E, se forem de couro, com tampa? BOLSA Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB S1MBE Caçuá S2FBE jacá Questão 57. ... a peça de madeira que vai no pescoço do boi, para puxar o carro ou arado? Marabá CANGA caçuá canga S1MBE Palestina canga Marabá S2FBE Palestina Canga Marabá Palestina canga NFR S3MEM S4FEM canga Questão 58. ... a cria da ovelha logo que nasce? BORREGO (DO S1MBE NASCER ATÉ...) filha di carneru cabritim S2FBE ovelha cabritim filhoti di ovelha Questão 59. ... a cria da ovelha, quando vai crescendo? CORDEIRO FÊMEA QUE ESTÁ PARA DAR S1MBE carneru refeitu marã S2FBE carnerinhu S3MEM marã ovelha nova NFR S4FEM ovelhinhas Questão 60. ... a fêmea de um animal que está´prestes a/nos dias de dar cria dar cria? S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM carnerim 232 CRIA tá dandu cria mojada ela vai dá cria mojada tá para parí prenha pertu di parí mojada Questão 61. Como se diz quando a fêmea de um animal perde a cria? S1MBE PERDA DA CRIA S2FBE perdeu perdeu a cria perdeu a cria perdeu a cria S3MEM perdeu a barrigada / barrigada perdida S4FEM perdeu a cria NFR perca da cria Questão 62. ...´´égua quando está velha? ÉGUA VELHA S1MBE égua véia égua véa S2FBE Caduca S3MEM égua vea égua velha égua veia S4FEM égua velha égua veia Questão 63. ...homem que é contratado para trabalhar na roça do outro? TRABALHADOR S1MBE DE ENXADA EM ROÇA juquireru ALHEIA Tema proposto pelo (QSL, 2001) – AliB PICADA piãu S2FBE S3MEM S4FEM trabalhadô/ piãu diara diarista/trabalhadô rurau/bóia fria piãu Piau diara Questão 64. O que é que abre com o machado, com o facão, a foice para passar por um mato fechado? Marabá pinicada S1MBE Palestina Marabá S2FBE picada Palestina camiî picada Marabá Palestina trilha S3MEM vareda Marabá Palestina Roça S4FEM vareda Questão 65. ... o caminho, no pasto, onde não cresce mais grama, de tanto o animal TRILHO S1MBE camiî vareda S2FBE capuera vareda S3MEM caminhu camiî S4FEM picada barrida picada barrida 233 CAMPO SEMÂNTICO – VI – FAUNA Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB URUBU Questão 66. ... ave preta que come animal morto, podre? Marabá urubu S1MBE Palestina urubu Marabá S2FBE Palestina Urubu Marabá Palestina urubu Urubu S3MEM urubu Marabá Palestina urubu S4FEM urubu Questão 67. ... o passarinho bem pequeno, que bate muito rápido as asas, tem bico comprido e voa de flor em flor? COLIBRI S1MBE beja - flô beja - flô S2FBE beja - flô beja - flô S3MEM beja – flô beja - flô S4FEM beja - flô beja - flô Questão 68 ... a ave que faz o ninho com terra, nos postes, nas árvores e até nos cantos da casa? JOÃO DE BARRO S1MBE juãu di barru juãu di barru S2FBE NFR NFR S3MEM juãu di barru juãu di barru S4FEM juãu di barro juãu di barro Questão 69. ... a ave de criação parecida com a galinha, de penas pretas com pintinhas brancas? GALINHA D’ANGOLA S1MBE angulista / capoti angulista S2FBE Angulista angulista S3MEM guiné guiné S4FEM Guiné guiné 234 Questão 70. ... a ave do mato, de bico curvo e penas coloridas; quando presa, pode aprender a falar PAPAGAIO S1MBE Papagai papagai S2FBE Papagaiu papagaiu S3MEM Papagai papagai S4FEM Papagaiu S2FBE Sura sura S3MEM suru suru S4FEM suru suru S2FBE cotó cotó S3MEM sem rabu sem rabu S4FEM Rabicó rabicó papagaiu Questão 71. ... uma galinha sem rabo? SURA S1MBE sura sura Questão 72. ... um cachorro de rabo cortado? COTÓ Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB GAMBÁ S1MBE bicó bicó Questão 73. ... o bicho que carrega os filhotes numa bolsa que tem na barriga e solta um cheiro muito ruim? Marabá gambá S1MBE Palestina gambá Marabá S2FBE Marabá gambá gambá gambá S3MEM gambá Marabá gambá S4FEM gambá Questão 74. ... as patas dianteiras do cavalo? PATAS DIANTEIRAS DO CAVALO S1MBE mãu du cavalu mãu du cavalu S2FBE pé du cavalu pé du cavalu Questão 75. ... o cabelo em cima do pescoço do cavalo? CRINA DO PESCOÇO S3MEM patas dianteiras S4FEM patas dianteiras mãus du cavalu mãus du cavalu 235 S1MBE quilina quilina S2FBE quilina quilina S3MEM cabelu du cavalu cabelu du cavalu S4FEM quilina S3MEM S4FEM quilina Questão 76. ... o cabelo comprido na traseira do cavalo? S1MBE CRINA DA CAUDA rabu rabu S2FBE rabu du cavalu rabu du cavalu rabu rabu rabu du cavalu rabu du cavalu Questão 77. ... a parte do cavalo onde vai a sela? S1MBE LOMBO costa du cavalu costa du cavalu S2FBE costa du cavalu S3MEM S4FEM rabu du cavalu lombu lombu pelu du cavalu S3MEM Trasera trasera S4FEM trasera trasera S3MEM chifu chifri chifri S4FEM chifri chifri NFR Marabá Palestina tronchu pelu du cavalu Questão 78. ... a parte larga atrás do __________ (cf. item 77)? ANCA S1MBE trasera trasera S2FBE garupa garupa Questão 79. O que o boi tem na cabeça? CHIFRE Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB UM SÓ CHIFRE S1MBE chifi S2FBE chifi chifu Questão 80. O animal que tem um só __________ (cf. item 79) porque o outro não nasceu? Marabá NR S1MBE Palestina NFR Marabá S2FBE Palestina tronchu tronchu Marabá Palestina NFR S3MEM Questão 81. ... a cabra que não tem __________ (cf. item 79) CABRA SEM S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM S4FEM tronchu 236 CHIFRE Moxa moxa moxa moxa NFR NFR moxa moxa S2FBE moxu moxu S3MEM NFR NFR S4FEM Moxu moxu S2FBE ubru ubru S3MEM peitu peitu S4FEM ubru ubru rabu S3MEM orelha / rabu S4FEM rabu rabu rabu S4FEM mancu caxingandu S4FEM mosca di privada varejera varijera Questão 82. ... o boi sem __________ (cf. item 79) BOI SEM CHIFRE S1MBE moxu moxu Questão 83. ... a parte da vaca onde fica o leite? ÚBERE S1MBE ubri ubri Questão 84. ... a parte com que o boi espanta as moscas? RABO S1MBE rabu rabu S2FBE Rabu Questão 85. ... o animal que tem a perna mais curta e que puxa uma perna? MANCO S1MBE alejadu mancu S2FBE coxo / mancu S3MEM coxó mancu mancu Questão 86. ... um tipo de mosca grande, esverdeada, que faz um barulhão quando voa? MOSCA VAREJEIRA Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB SANGUESSUGA S1MBE varijera mosca azul S2FBE varijera mutuca S3MEM varejera Questão 87. ... um bichinho que se gruda nas pernas das pessoas quando elas entram num banhado ou córrego?? Marabá Chamixuga S1MBE Palestina chamixuga Marabá S2FBE Palestina chamixuga chamixuga Marabá S3MEM Palestina Sanguissuga sanguissuga Marabá S4FEM Palestina Chamixuga chamixuga 237 Questão 88. ... o inseto de corpo comprido e fino, com quatro asas bem transparentes, que voa e bate a parte traseira na água? LIBELULA S1MBE corta água cambitu S2FBE cambitu cambitu S3MEM cambitu cambitu S4FEM cambitu cambitu Questão 89. ... aquele bichinho branco, enrugadinho, que dá em goiaba, em coco? BICHO DE FRUTA S1MBE bichiî da goiaba bichu da goiaba S2FBE bichu da gaiaba S3MEM bichu da goiaba bichu da goiaba da gaiaba Questão 90. ... aquele bicho que dá em esterco, embichu pau podre? S1MBE CORÓ Congu bichu da goiaba S2FBE broca micobri S4FEM bichu da goiaba S3MEM broca Congu S4FEM cupim cupiî cupim Questão 91. ... aquele inseto pequeno, de perninhas compridas, que canta no ouvido das pessoas, de noite? (imitar o zumbido) PERNILONGO S1MBE murissoca murissoca S2FBE murissoca murissoca S3MEM carapanã murissoca S4FEM murissoca murissoca 238 239 240 CAMPO SEMÂNTICO – VII – COPRPO HUMANO Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB PÁLPEBRAS Questão 92. ... esta parte que cobre o olho? (apontar) Marabá capela du oi S1MBE Palestina pestana Marabá S2FBE Pestana capela du oi Marabá Páupebra S3MEM S2FBE pé – du – ovido fonti S3MEM Lombu fonti S4FEM Fonti fonti gogó S3MEM Gogó gogó S4FEM Gogó gogó pestana Marabá Páupebra S4FEM pestana Questão 93. ... isto? (apontar) NUCA S1MBE Cangoti fonti Questão 94. ... esta parte alta do pescoço do homem? (apontar) POMO DE ADÃO S1MBE Gogó gogó S2FBE Gogó Questão 95. ... o osso que vai do pescoço até o ombro? (apontar) CLAVÍCULA S1MBE Cantarera calvica S2FBE Cravícula cantarera S3MEM Cavícula cravícula S4FEM Sabonetera cavícula Questão 96. ... a parte do corpo da mulher com que ela amamenta os filhos? SEIOS ÚTERO S1MBE Peitu peitu S2FBE Peitu peitu S3MEM Peitu Questão 97. ... parte do corpo da mãe onde fica o nenê/bebê antes de nascer? seius S4FEM Seius seius 241 S1MBE Utru ventru S2FBE Barriga S3MEM buxu barriga S4FEM úteru Ventri S3MEM S4FEM ventri Questão 98. ... isto? (apontar) S1MBE CALCANHAR Carcanhá Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 99. ... isto? (apontar) Marabá TORNEZÊLO Canela carcanhá S1MBE Palestina regetu S2FBE Regetu caucanhá Caucanhá Marabá S2FBE Palestina batata da perna Marabá Palestina Panturrilha caucanhá caucanhá tornozelu Marabá Palestina canela S3MEM caucanhá S4FEM tornozelu ôssu gostosu Questão 100. ... o osso redondo que fica na frente do joelho? S1MBE RÓTULA Juei S2FBE bola du juelhu S3MEM bulacha cabeça du juei juelhu S4FEM bulacha du juei rótula NFR Questão 101. Que sente uma criança quando se passa o dedo na sola do pé? CÓCEGAS S1MBE Cosca S2FBE cosca cosca S3MEM Cosca cósega S4FEM Coscas cosca S2FBE presa Presa presa S3MEM Presa presa S4FEM caninu presa cosca Questão 102. ... esses dois dentes pontudos? DENTES CANINOS S1MBE presa Questão 103. ... os últimos dentes, que nasce quando a pessoa já é adulta? DENTES DO 242 SISO S1MBE quexau denti queru S2FBE Dentiqueru denti queru S3MEM denti di insisu S4FEM denti queru NFR denti queru Questão 104. ... esses dentes grandes no fundo da boca, vizinhos dos __________ (cf. item 103)? DENTES MOLARES S1MBE Quexau quexau S2FBE quexau quexau S3MEM panela quexau S4FEM molares quexau Questão105. ... a pessoa que não tem dentes? DESDENTADO Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB FANHOSO S1MBE banguelu boca muxa S2FBE Banguelu S3MEM disdentadu banguelu banguela S4FEM Banguelas banguelu Questão 106. ... a pessoa que parece falar pelo nariz? (imitar) Marabá fainhosu S1MBE Palestina foeî Marabá S2FBE Palestina Fanhosu Marabá Palestina foeî Fuêi S3MEM Marabá foeî Palestina foêi S4FEM foeî Questão 107. ... alguma coisa que cai no olho e fica incomodando? CISCO S1MBE ciscu algueru S2FBE broca / musquitu ciscu S3MEM ciscu ciscu S4FEM Ciscu ciscu S4FEM caolhu cegu du olhu Questão 108. ... a pessoa que tem só um olho? CEGO DE UM OLHO VESGO S1MBE Caôi S2FBE S3MEM caôi/cegueta/galu cegu caolhu caolhu caôio Questão 109. ... a pessoa que tem os olhos olhando em direção diferentes? (completar com um gesto dos dedos) S1MBE caôio S2FBE S3MEM S4FEM 243 zanôi zanôiu Zanôi zanôiu vesga / ligação invertida zanôiu zanôi / zaroi / vesgu zanôiu Questão 110. ... a pessoa que não enxerga longe, e tem que usar óculos? MÍOPE S1MBE míupi curtu da vista S2FBE míupi vista curta S3MEM Míupi S4FEM ruim das vista Míupi ruim das vista Questão 111. ... a bolinha que nasce na __________ (cf. item 92), fica vermelha e incha? TERSOL S1MBE trêis sou CONJUTIVITE S1MBE dordói Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB S2FBE S3MEM Tersou / caui trêis tersou sou o olho fique vermelho e amanheça grudado? Questão 112. ... a inflamação no olho que faz com que dordói S2FBE dordói S3MEM dordói conjutivi tersou sapatãu S4FEM tersou trêis sou S4FEM conjutiviti sapatãu Questão 113. ... aquela pele branca no olho que dá em gente velha? Marabá CATARATA trêis sou cataraca S1MBE Palestina catarata Marabá S2FBE Palestina carni cricida Marabá S3MEM Marabá Palestina Palestina avelidi carni cricida / piterúgenu catarata catarata S4FEM catarata Questão 114. ... este barulhinho que se faz? (soluçar) SOLUÇO S1MBE soluçu soluçu S2FBE soluçu S3MEM soluçu Soluçu S4FEM Soluçu soluçu S4FEM cataraca bustela cataraca soluçu Questão 115. ... a sujeirinha dura que se tira do nariz com o dedo? MELECA S1MBE Cataraca cataraca S2FBE cataraca cataraca S3MEM meleca 244 Questão 116. ... a pessoa que tem um calombo grande nas costas e fica assim? (mímica) CORCUNDA S1MBE cocundu / sanfona lumbin S2FBE cacunda S3MEM lombin corcundu cocunda S4FEM Cacunda cacundu Questão 117. ... a pessoa que come com a mão esquerda, faz tudo com essa mão? (completa com o gesto) CANHOTO S1MBE canhotu canhotu S2FBE canhotu canhotu S3MEM canhota canhotu S4FEM canhotu canhotu S2FBE quetequi coxó S3MEM alejadu alejadu da perna S4FEM perneta NFR Questão 118. ... a pessoa que não tem uma perna? PERNETA S1MBE Saci coxó Questão 119. ... a pessoa que puxa de uma perna? S1MBE S2FBE MANCO cochu/aqui ta rasu, aqui tá fundu Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 120. ... a pessoa das pernas curvas para os lados? PESSOA DE PERNAS ARQUEADAS Marabá S1MBE perna di cangaia mancu aqui tá fundu, aqui tá rasu/mancu/perneta mancu Palestina cambota Marabá S2FBE Palestina perna di cangaia cambota S3MEM aqui tá fundu, aqui tá rasu / mancu S4FEM mancu mancu Marabá S3MEM Palestina perna di alicati cambota caxinganu Marabá S4FEM Palestina cambota / perna di alicati cambota Questão 121. ... esta parte aqui? AXILA S1MBE Suvacu suvaquera S2FBE Suvacu suvacu S3MEM Suvacu suvacu S4FEM aquissilas suvacu 245 Questão 122. ... o mau cheiro embaixo dos braço? CHEIRO NAS AXILAS S1MBE Suvaquera inhaca di gambá S2FBE deriba boi inhaca S3MEM Suvaquera catinga nu suvacu S4FEM Inhaca inhaca Questão 123. Se uma pessoa come muito e sente que vai por/botar para fora o que comeu, se diz que vai o quê? VOMITAR S1MBE Vumitá lançá S2FBE Vomitá provocá S3MEM Vomitá S4FEM vomitá vomitá / baudiá CAMPO SEMÂNTICO – VIII – CONVÍVIO E COMPORTAMENTO SOCIAL Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB PESSOA TAGARELA Questão 124. ... a pessoa que fala demais? Marabá faladô S1MBE Palestina Marabá S2FBE Palestina linguarudu Marabá Palestina faladera S3MEM Marabá Palestina tagarela Questão 125. ... a pessoa que tem dificuldade de aprender as coisa? PESSOA PUCO S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM S4FEM baudiá 246 INTELIGENTE burru buru burru buru Questão 126. ... a pessoa que não gosta de gastar seu dinheiro, e às vezes, até passa dificuldades para não gastar? PESSOA SOVINA S1MBE pãu duru S2FBE nonô correa S3MEM mãu di vaca S4FEM mãu di vaca S3MEM velhaca S4FEM veacu S3MEM pistoleru S4FEM pistoleru Questão 127. ... a pessoa que deixa suas contas penduradas? MAU PAGADOR S1MBE veacu S2FBE veacu Questão 128. ... a pessoa que é paga para matar alguém? ASSASSINO PAGO S1MBE pistoleru S2FBE pistoleru Questão 129. ... a pessoa que mora e trabalha para si nas terras de outra pessoa? POSSEIRO S1MBE grileru S2FBE roceru S3MEM grileru S4FEM sêi terra 247 CAMPO SEMÂNTICO – IX – CICLOS DA VIDA Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 130. As mulheres perdem sangue todos os meses. Como se chama isso? Marabá MESNTRUAÇÃO S1MBE mulhé tá di bodi / mestruação Palestina menstruada Marabá S2FBE Misntruação mestruação Marabá S3MEM mestruação / ficá di bodi mestruada Marabá S4FEM Menstruação minstruação Questão 131. Numa certa idade acaba a/o __________ (cf. item 130). Quando isso acontece, se diz que a mulher __________ . S1MBE ENTRAR NA MENOPAUSA Menopausa cabô a regra S2FBE amarandu u facãu S3MEM marrô u facãu Menopausa S4FEM menopausa Menopausa menopausa 248 Questão 132. ... a mulher que ajuda a criança nascer? PARTEIRA S1MBE Partera S2FBE partera Partera partera S3MEM Partera partera S4FEM Partera partera Questão 133. Chama-se a __________ (cf. item 132) quando a mulher está para __________? S1MBE DAR À LUZ ganhá mininu ganhá neneiî S2FBE dá luiz a criança S3MEM prá ganhá criança tá prá pari S4FEM parí tá pra parí Questão 134. ... duas crianças que nasceram no mesmo parto? GÊMEOS S1MBE Gêmiu gemis S2FBE Gêmius gemis S3MEM Gêemius gêmius S4FEM Gêmius gêmius abortu S4FEM Abortu abortu abortá S4FEM perdê u mininu abortá Questão 135. ... Quando a mulher grávida perde o filho, se diz que ela teve __________ . ABORTO S1MBE Abortu perdeu u mininu S2FBE Aborto abortu S3MEM Abortu Questão 136. Quando a mulher fica grávida, mas não quer ter a criança, ela toma remédio para quê? ABORTAR S1MBE Abortá Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB S2FBE Perdê matá a criança S3MEM Abortá Questão 137. Quando a mãe não tem leite e outra mulher amamenta a criança , como chamam essa mulher? Marabá AMA-DE-LEITE matá u mininu mãi di leiti S1MBE Palestina mãi di leiti Marabá S2FBE Palestina mãi di leiti mãi di leiti Marabá Palestina mãi di leiti S3MEM Marabá S4FEM Palestina NFR mãi di leiti mãi di leiti 249 Questão 138. O próprio filho da __________ (cf. item 137) e a criança que ela amamenta são o que um do outro? S1MBE IRMÃO DE LEITE irmãu di leiti primus irmãu S2FBE irmãu di leiti S3MEM irmãu di leiti irmãu di leiti S4FEM NFR irmãu di leiti irmãu di leiti Questão 139. ... a criança que não é filho verdadeiro do casal, mas que é criado por ele como se fosse? S1MBE FILHO ADOTIVO Adotivu filhu adotivu S2FBE di criaçãu / adotadu / adotivu S3MEM S4FEM Adotivu adotivu Adotivu adotivu Questão 140. ... o filho que nasceu por último? FILHO MAIS NOVO S1MBE Caçula S2FBE caçula Caçula caçula S3MEM Caçula caçula S4FEM Caçula caçula garotu S3MEM Pirralhu pixoti S4FEM Garotu mininu S3MEM moçota Pirralha moçinha S4FEM Garotinha minina Questão 141. ... a criança de 05 a 10 anos, do sexo masculino? MENINO S1MBE Rapaiziî mulequi S2FBE Nenêi Questão142. E se for do sexo feminino, como se chama? MENINA S1MBE Mocinha garotinha S2FBE Neném Questão 143. ... a pessoa que acompanha uma moça quando ela sai com o namorado? ACOMPANHANTE DOS NAMORADOS S1MBE Ispiãu S2FBE vigia Fiscau vigia S3MEM pasteu / sigura vela sigura vela S4FEM cendi vela / vendi pasteu 250 sigura vela Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB MARIDO ENGANADO Questão 144. ... o marido que a mulher passa para trás com oro homem? Marabá S1MBE Cornãu Palestina boi Marabá S2FBE Palestina aruá / rei du busu cornu Marabá Palestina Chifrudu S3MEM cornu Marabá Palestina Cornu S4FEM chifrudu Questão 145. ... a mulher que se vende para qualquer homem? S1MBE PROSTITUTA garota di programa rapariga S2FBE quenga / chifrera / galinha / rapariga /safada S3MEM puta Rapariga S4FEM vadia prostituta / garota di programa prostituta Questão 146. Numa conversa, para falar de uma pessoa que já morreu, geralmente as pessoas não a trata pelo nome que tinha em vida. Como é que se refere a ela? DEFUNTO S1MBE Finadu finadu S2FBE Falecida finadu S3MEM Finadu S4FEM finadu Difuntu finadu Questão 147. Quando um homem fica viúvo e casa de novo, o que a segunda mulher é dos filhos que ele já tinha? S1MBE MADRASTA Madrasta S2FBE madrasta Madrasta madrasta S3MEM Madrasta madrasta S4FEM Madrasta madrasta Questão 148. ... a pessoa que tem o mesmo nome da gente? XARÁ S1MBE Xará xarapin S2FBE Xará xarapin S3MEM Xará xará S4FEM Xará xará 251 252 CAMPO SEMÂNTICO – X – RELIGIÕES E CRENÇAS Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 149. Deus está no céu e no inferno está ___________ . Marabá DIABO diabu S1MBE Palestina diabu Marabá S2FBE Palestina Demoî cãu Marabá Palestina Diabu S3MEM S4FEM diabu Diabu Diabu Questão 150. O que algumas pessoas dizem já ter visto, à noite, em cemitérios ou em casas, que se diz que é do outro mundo? FANTASMA FEITIÇO S1MBE Fantasma S2FBE auma Visagu S3MEM auma Visagi visagem Questão 151. O que certas pessoas fazem, botam, por exemplo, nas encruzilhadas, para prejudicar alguém? S4FEM Assombração auma 253 S1MBE Dispachu feitiçu S2FBE Macumba feitiçu S3MEM Macumba S4FEM NFR Macumba macumba Questão 152. ... o objeto que algumas pessoas usam para dar sorte ou afastar males? AMULETO S1MBE Simpatia S2FBE NFR Amuletu NFR S3MEM Simpatia amuletu S4FEM Talismã rezadera S4FEM Rezadera muletu Questão 153. ... uma mulher que cura, tira o mau olhado através de rezas e simpatias? BENZEDEIRA S1MBE rezadera / curandera terecozera S2FBE Benzedera S3MEM ciantista Curandera benzedera Questão 154. E se for homem? BENZEDOR S1MBE Curanderu S2FBE terecozeru Benzedô ciantista S3MEM Curanderu rezadô S4FEM benzedô / rezado benzedô Questão 155. ... a pessoa que trata de doenças através de ervas e plantas? CURANDEIRO Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB MEDALHA PRESÉPIO S1MBE Pageleru ciantista S2FBE Curanderu raizeru S3MEM Curanderu curadera S4FEM Curandera curandero Questão 156. ... a chapinha de metal com um desenho de santo que as pessoas usam, geralmente no pescoço, presa numa corrente? Marabá Medalhina S1MBE Palestina medalha Marabá S2FBE Palestina Medalha cauçufissu Marabá Palestina Pingenti S3MEM pingenti Marabá S4FEM Palestina medalha / pingenti Questão 157. No natal, monta-se um grupo de figuras representando a Virgem Maria, São José, o Menino Jesus etc. Como chamam isso? S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM pingenti 254 Presépiu presépiu Presépiu andô NFR NFR Presépiu presépiu 255 256 CAMPO SEMÂNTICO – XI – FESTAS E DIVERTIMENTOS Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Sigla s S= suj eit o Questão 158. ... a brincadeira em que se gira o corpo sobre a cabeça e acaba sentado? (mímica) 1 = númeroMarabá identificador do sujeito BOLINHA DE GUDE S1MBE sautu mortau Palestina Marabá S2FBE Palestina tiuba Carambela Marabá S3MEM Palestina tiuba Cambalhota virá carambola Marabá S4FEM Palestina Cambaiota carambola Questão 159. ... as coisinhas redondas de vidro com que os meninos gostam de brincar? S1MBE Peteca peteca S2FBE Peteca S3MEM peteca Peteca peteca S4FEM Peteca peteca Questão 160. ... o brinquedo feito de uma forquilha e duas tiras de borracha (mímica), que os meninos usam para matar passarinho? ESTILINGUE S1MBE Baladera badogui S2FBE Baladera baladera S3MEM Baladera baladera S4FEM Baladera baladera S4FEM pipa/papagaiu papagaiu Questão 161. ... o brinquedo feito de varetas cobertas de papel que se empina no vento por meio de uma linha? PAPAGAIO DE PAPEL S1MBE papagai/curica/guinadera papagaiu S2FBE Pipa papagaiu S3MEM Papagaiu papagaiu 257 Questão 162. ... o brinquedo de papel sem varetas que se empina no vento por meio de uma linha? PIPA S1MBE Bermudãu papagaiu S2FBE Papagai S3MEM pipa Pipa papagaiu S4FEM Pipa / papagaiu Questão 163. ... a brincadeira que uma criança fecha os olhos, enquanto as outras se escondem em algum lugar, e depois vai procurá-las? ESCONDEESCONDE S1MBE cobra cega indurina S2FBE Podri indurina S3MEM iscondi iscondi duiscondi S4FEM iscondi iscondi cobra cega S4FEM cobra cega sisconda Questão 164. ... a brincadeira em que uma criança, com olhos vendados, tenta pegar as outras? CABRA-CEGA ema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB PEGA-PEGA S1MBE NFR S2FBE cobra cega cobra cega cobra cega S3MEM cobra cega cobra cega Questão 165. ... uma brincadeira em que uma criança corre atrás das outras para tocar numa delas antes que alcance um ponto combinado? Marabá S1MBE Palestina Palestina Trisca Palestina NFR Marabá S2FBE Palestina Coladu NFR S2FBE posti/paredi Marabá Palestina cola pega pega S3MEM garrafãu Marabá Palestina Trisca mancha S4FEM NFR S4FEM birita Questão 166. ... esse ponto conbinado? FERROLHO S1MBE Mancha mancha S3MEM Banderinha mancha Questão 167. ... uma brincadeira em que as crianças ficam em círculo, enquanto outra vai passando com um objeto que deixa cair atrás de uma delas e esta pega o objeto e sai correndo? CHICOTEQUEIMADO/SILÊ NCIO ATRÁS/GATO E RATO S1MBE NFR NFR S2FBE cumpadi malaquia cobra laquixia S3MEM NFR NFR S4FEM NFR NFR 258 Questão 168. ... uma tábua apoiada no meio, em cujas pontas sentam duas crianças e quando uma sobe, a outra desce? (mímica) GANGORRA S1MBE Cangorra gangorra S2FBE Gangorra S3MEM gangorra Gangorra gangorra S4FEM Gangorra gangorra Questão 169. ... uma tábua, perdurada por meio de cordas, onde uma criança senta e se move para frente e para trás? S1MBE BALANÇO S2FBE Trapéis balançu balançu balançadô S3MEM balançu / cadera de embalu balançu S4FEM balançadô Balançu Questão 170. ... a brincadeira em que as crianças riscam uma figura no chão, formada por quadrados numerados, jogam uma pedrinha (mímica) e vão pulando com uma perna só? (solicitar a descrição) AMARELINHA S1MBE macacu NFR S2FBE Macacu cancãu S3MEM Macacu cancãu S4FEM Amarelinha cancãu Questão 171. ... a pessoa que rouba no jogo? PESSOA QUE AGE COM DESONESTIDA DE NO JOGO Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB PESSOA QUE TEM SORTE NO JOGO PESSOA SEM SORTE NO S1MBE S2FBE Pilantra mãu ligera Ladraãu S3MEM treiteru S4FEM Desonesta ladrãu Trapassera ladrãu Questão 172. ... a pessoa que tem sorte no jogo? Marabá S1MBE fulana qui dá sorti nu jogu Palestina sortista Marabá S2FBE Palestina Sortudu Marabá Palestina sortista Sortudu S3MEM Marabá Palestina sortuda Sortudu Questão 173. ... a pessoa que não tem sorte no jogo? S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM S4FEM sortudu 259 JOGO pessoa qui dá azá sem sorti Azaradu sem sorti Azarada azarentu Azaradu azaradu S3MEM Craqui S4FEM fera Artilheu artileru S2FBE perna di pau S3MEM S4FEM ruim jogadô ruim/ perna de pau perna de pau perna di pau perna di pau S2FBE bom di perna dançadera S3MEM Dançarinu S4FEM pé di vaussa boa di salãu Questão 174. ... a pessoa que joga bem? [Pelé foi o quê?] BOM JOGADOR S1MBE Craqui S2FBE artista rei/bom di bola rê Questão 175. ... a pessoa que joga mau? S1MBE MAU JOGADOR perna dura ruim jogadô Questão 176. ... a pessoa que dança muito bem? PESSOA QUE DANÇA MUITO BEM S1MBE Dançarinu dançarina dança muitu bem 260 261 CAMPO SEMÂNTICO – XII – HABITAÇÃO Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 177. ... aquela pecinha de madeira, que gira ao redor de um prego, para fechar a porta, janela ...? Marabá TRAMELA Tramela S1MBE Palestina tramela Marabá S2FBE Marabá Palestina Palestina Tramela tramela Tramela S3MEM Marabá tramela Palestina Tranca S4FEM tramela Questão 178. Quando uma janela tem duas partes, como se chama a parte de fora que é formada de tirinhas horizontais que permitem a ventilação e a claridade? (mostrar gravura) VENEZIANA / TAMPO S1MBE Iscama NFR S2FBE cansela janeziana S3MEM Gradeadu NFR S4FEM NFR NFR S4FEM mancha di fumaça NFR Questão 179. ... aquilo, preto que se forma no chaminé, na parede ou no teto da cozinha, acima do fogão a lenha? FULIGEM S1MBE NFR pucumã S2FBE fumacê pucumã S3MEM NFR cinza boi di fogu S3MEM Isqueru isqueru Questão 180. Para acender o cigarro, eu uso fósforo ou ________ . ISQUEIRO S1MBE Isqueru isqueru S2FBE Isqueru S4FEM Isqueru Questão 181. ... aquele objeto que se usa para clarear no escuro e se leva na mão assim? (apontar) LANTERNA S1MBE S2FBE S3MEM S4FEM isqueru 262 Lanterna lanterna Lanterna lantarina lamparina/lanterna lanterna Lanterna lanterna Questão 182. ... a cinza quente que fica dentro do fogão a lenha? BORRALHO S1MBE Burralhu S2FBE cinza Burrai CAMPO SEMÂNTICO – XIII – ALIMENTAÇÃO E COZINHA cinza S3MEM Cinza cinza S4FEM Cinza NFR 263 Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB CARNE MOÍDA Questão 183. ... a carne depois de passada na máquina? Marabá carni muída S1MBE Palestina muída Marabá S2FBE boi raladu muída Marabá S3MEM carni muída muída Marabá muída S4FEM muída Questão184. ... Quando uma pessoa acha que comeu demais, ela diz: comi tanto que estou __________ . EMPANTURRADO(A)/CHEIO( S1MBE A) Anciosu S2FBE buxu inxadu Chea oufandu S3MEM Impapuçada cheiu S4FEM chea / satisfeita barriga chea Questão 185. ... uma pessoa que normalmente come demais? GLUTÃO S1MBE Gulosu isgulamidu S2FBE Gulosu S3MEM cumilãu/ gulosu mortu di fomi S3MEM bebu Bêbadu beberãu S4FEM Bêebada cachaceru S3MEM Porronca porronca S4FEM Porronca porronca S3MEM bagana Bagana pitocu golosu S4FEM Gulosa mortu di fomi Questão 186. Que nomes dão a uma pessoa que bebeu demais? BÊBADO (DESIGNAÇÕES) S1MBE chea du’aucu pingunçu S2FBE Beberãu Questão 187. Que nomes dão ao cigarro feito pela própria pessoa , enrolado à mão? CIGARRO DE PALHA S1MBE Porronca porronca S2FBE Porronca porronca Questão 188. ... o resto do cigarro que se joga fora? TOCO DE CIGARRO S1MBE Bagana tocu S2FBE Bagana Questão 189. Que nomes dão aqui para bebida alcoólica feita de cana-de-açúcar? S4FEM Bagana pitocu 264 S1MBE S3MEM caninha da roça Pinga S4FEM AGUARDENTE dosi/birita/cachaça Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB Questão 190. ... um lugar pequeno, com um balcão, onde homens costumam ir beber __________ (cf. item 189) e onde também se pode comprar alguma outra coisa? Marabá BODEGA S1MBE Butecu cachaça sertaneja S2FBE Gingibira Palestina mercearia Marabá S2FBE Palestina Quitanda butequi NFR Marabá Palestina Merciaria S3MEM Marabá sutiã S3MEM cachaça/pinga Marabá S4FEM Palestina butecu bar mercearia NFR botequi CAMPO SEMÂNTICO – XIV – VESTIÁRIO Tema proposto pelo (QSL, 2001) – ALiB SUTIÃ Questão 191. Que peça do vestiário serve para segurar os seios? Marabá porta sei S1MBE Palestina sutiãu Marabá S2FBE corpeti corpeti sutiã Marabá Sutiã S4FEM sutiã Questão 192. Que roupa o homem usa debaixo da calça? CUECA S1MBE cueca cilora S2FBE cueca cueca S3MEM cueca cueca S4FEM Cueca cueca Questão 193. Que roupa a mulher usa debaixo da saia? CALCINHA ROUGE S1MBE caucinha S2FBE S3MEM caucinha/ caçola caucinha Questão 194. ... aquilo que as mulheres passam no biquim rosto, nas bochechas, para ficarem rosadas? biquim caucinha S4FEM Caucinha caucinha 265 S1MBE Rugi rugi S2FBE Rugi S3MEM rugi Taucu NFR S4FEM Blanchi pó compaquitu Questão 195. ... um objeto fino de metal, para prender o cabelo? (mostrar) GRAMPO (COM PRESSÃO) S1MBE Grampu prizilha S2FBE Pregado grampu S3MEM Piranha prizilha S4FEM grampu di cabelu S3MEM grampu/prizia S4FEM piranha Prisilha prendedor Questão 196. ... um objeto de metal, para prender o cabelo? (mostrar) GRAMPO (SEM PRESSÃO) S1MBE Prisia grampu S2FBE Prisilha prizilha grampu 266 267 1. NOME OFICIAL 268 2. NOME REGIONAL 3. a) NOME(S) DADO (S) AOS HABITANTES Pelos próprios habitantes b) Pelos habitantes de outras localidades 4. NÚMEROS DE HABITANTES a) b) Oficial: aproximadamente Cálculo do sujeito aproximadamente 5. ATIVIDADES ECONÔMICAS PREDOMINANTES 6. INDÚSTRIAS CASEIRAS 7. SUBLOCALIDADES 8. COMUNICAÇÕES: (viárias, fluviais, marítimas, ferroviárias, etc.) Acesso por carro, ônibus e barcos 9. DADOS SOBRE A INFRAESTRUTURA DA LOCALIDADE (alojamentos, escolas hospitais, etc.) 10. DADOS SOBRE EMIGRAÇÃO 269 11. DADOS SOBRE IMIGRAÇÃO 12. CARACTERÍSTICAS DEMOGRÁFICAS DA LOCALIDADE 13. HISTÓRICO SUCINTO DA LOCALIDADE (COMO SURGIU, DATA DA FUNDAÇÃO, PRIMEIROS HABITANTES) 14. OBSERVAÇÕES GERAIS 270 A – Ficha da localidade 1.NOME COMPLETO: 2.ENDEREÇO: 3.NOME PELO QUAL É CONHECIDO: 4. SEXO: masculino ( ) feminino ( B – Ficha do sujeito ALCUNHA: ) DATA 12. NATURALIDADE DA APLICAÇÃO: DO MARIDO OU DA MULHER: 5. IDADE: anos julga (diz) ter: /Profissão: Parece (calculo) ter: LOCAL 13. COMDA QUE ENTREVISTA: IDADE CHEGOU A ESTE LUGAR? (caso pai, mãe ou esposa não seja daqui): 6. ESTADO CIVIL: solteiro ( ) casado ( ) viúvo ( ) outro ( ) QUANTIDADE 14. PROFISSÃO DO DE FITAS: SUJEITO: 7. LOCAL DE NASCIMENTO: 15. ONDE EXERCE: 8. JÁ VIAJOU: sim ( ) não ( Nº DAS FITAS ) Para onde?: Por quanto tempo? 16. SALÁRIO: menos de um salário mínimo ( ) mais de um salário mínimo ( 9. DOMICÍLIOS E TEMPO DE PERMANÊNCIA FORA DA LOCALIDADE: 17.ESCOLARIDADE: 10.NATURALIDADE DO PAI: 18.CARACTERÍSTICAS PSICOLÓGICAS APARENTES: tímido ( 11. NATURALIDADE DA MÃE: 19.RELIGIÃO 20.GRAU DE ESPONTANEIDADE DA FALA: OBSERVAÇÕES: ENTREVISTADOR: ) /Profissão: ) viúvo ( ) /Profissão: sarcástico ( ) 271 C – Questionário Semântico-Lexical (QSL: ALiB, 2001) 272 CAMPO SEMÂNTICO – I – ACIDENTES GEOGRÁFICOS Questão 1. Como se chama aqui um rio pequeno, de uns dois metros de largura? CÓRREGO Questão 2.... tronco, pedaço PINGUELA o de pau ou tábua que serve para passar por cima de um ... PINGUELA Questão 3.... o lugar onde o rio termina ou encontra com outro rio? FOZ Questão 4. Muitas vezes, num rio, a água começa a girar, formando um buraco na água que puxa para baixo. Como se chama isto? REDEMOINHO (DE ÁGUA) Questão 5.... o movimento da água do rio? (imitar o balanço das águas) ONDA DE RIO Questão 6.... o movimento da água do mar? (imitar o balanço das águas) ONDA DE MAR Questão 7. Depois da chuva a terra fica _________? 273 TERRA UMEDECIDA PELA CHUVA CAMPO SEMÂNTICO – II – FENÔMENOS ATMOSFÉRICOS Questão 8.... o vento que vai virando em roda e levanta poeira, folhas e outras coisas leves? REDEMOINHO (DO VENTO) Questão 9.... uma luz que risca o céu em dias de chuva? RELÂMPAGO Questão 10. ... uma luz forte e rápida que sai das nuvens, podendo queimar uma árvore, em dias de mau tempo? RAIO Questão 11. ... o barulho forte que se escuta logo depois de um __________ (cf. item 10)? TROVÃO Questão 12. ... uma chuva com vento forte que vem de repente, geralmente no verão? TEMPORAL Questão 13. Existem outros nomes para __________ (cf. item 12) NOMES ESPECÍFICOS PARA TEMPORAL Questão 14. ... uma chuva de pouca duração, muito forte e pesada? TROMBA D’ÁGUA / PÉ D’ÁGUA Questão 15. É uma chuva bem fininha? GAROA Questão 16. Durante uma chuva podem cair pedacinhos de gelo. Como chamam para isso? CHUVA DE PEDRA Questão 17. Quase sempre, depois de uma chuva, aparece no céu uma faixa com listras coloridas e curvas (mímica). Que nomes dão a essa faixa? 274 ARCO – ÍRIS Questão 18. De manhã cedo, a grama geralmente está molhada. Como chama aquilo que molha a grama? ORVALHO Questão 19. Muitas vezes, principalmente de manhã cedo, quase não se pode enxergar por causa de uma coisa parecida com fumaça, que cobre tudo. Como chamam isso? NEVOEIRO Questão 20. Como dizem aqui quando termina a chuva e o sol começa a aparecer ESTIAR / COMPOR O TEMPO CAMPO SEMÂNTICO – III – ASTROS E TEMPO Questão 21. O que é que acontece de manhã cedo? NASCER DO SOL Questão 22. E o que acontece no final da tarde? PÔR DO SOL Questão 23. ... a claridade do céu antes de __________ (cf. item 21)? ALVORADA Questão 24... a claridade que fica no céu depois do __________ (cf. item 22)? CREPÚSCULO Questão 25. De manhã cedo, uma estrela brilha mais e é a última a desaparecer. Como chamam esta estrela? ESTRELA MATUTINA Questão 26. De tardezinha, uma estrela aparece antes das outras, perto do horizonte, e brilha mais. Como chamam esta estrela? ESTRELA VESPERTINA Questão 27. De noite, muitas vezes pode – se observar uma estrela que se desloca no céu e faz um risco de luz. Como chamam isso? ESTRELA CADENTE 275 Questão 28. Numa noite bem estrelada, aparece uma banda ou faixa que fica no céu de fora a fora, onde têm muitas estrelas muito perto uma das outras. Como chamam esta banda ou faixa? VIA LÁCTEA Questão 29. ... parte do dia quando começa a clarear? AMANHECER Questão 30. E quando o sol se põe __________ (cf. item 21)? ENTARDECER Questão 31. ... o começo da noite? ANOITECER Questão 32. Quais são os meses do ano? MESES DO ANO Questão 33. Alguns desses meses têm outro nome, por exemplo, junho, julho, etc.? MESES COM NOMES ESPECIAIS Questão 34. O dia passou? [o senhor já almoçou (ou jantou) hoje? Quando foi que almoçou (ou jantou) pela última vez?]. ONTEM Questão 35 ... o dia que foi antes desse dia? [E um dia para trás?] ANTEONTEM Questão 36. ... o dia que foi antes de __________ (cf. item 35)? [E mais um dia para trás] TRASANTEONTEM CAMPO SEMÂNTICO – IV – FLORA Questão 37. ... as frutas menores que a laranja, que se descascam com a mão, e, normalmente, deixam um cheiro na mão? Como elas são? (pedir para descrever) TANGERINA / MEXERICA Questão 38. ... o grão coberto por uma casquinha dura, que se come assado, cozido, torrado ou moído? 276 AMENDOIM Questão 39. ... umas florzinhas brancas com miolo amarelinho, ou florzinhas secas que se compram na farmácia e servem para fazer um chá amarelinho, cheiroso, bom para dor de barriga de nenê/bebê e até também para acalmar? (Mostrar) CAMOMILA Questão 40. ... cada parte que se corta do cacho da bananeira para pôr para madurar? PENCA Questão 41. ... duas bananas que nascem grudadas? BANANA DUPLA Questão 42. ... a ponta roxa no cacho da banana PARTE FINAL DA INFLORESCIÊNCIA DA BANANEIRA CAMPO SEMÂNTICO – V – ATIVIDADES AGROPASTORIS Questão 43. O que é que se corta da planta, quando se colhe o milho? ESPIGA Questão 44. Quando se tira da __________ (cf. item 43) todos os grãos do milho, o que sobra? SABUGO Questão 45. Depois que se corta o pé de arroz ou de fumo, ainda que fica uma pequena parte no chão. Como se chama essa parte? SOCA / TOUCEIRA Questão 46. ... flor grande, amarela, redonda, com uma rodela de sementes no seio? GIRASSOL Questão 47. Onde é que ficam os grãos de feijão, no pé antes de ser colhido? VAGEM DE FEIJÃO Questão 48. Depois de colher e secar o feijão, alguns costumam bater com uma vara para soltar os grãos da __________ (cf. item 47) e a palha vai virando um pó. Como se chama esse pó da palha do feijão batido? MOINHA 277 Questão 49. ... aquela raiz branca por dentro, coberto por uma casca marrom, que se cozinha para comer? MANDIOCA / AIPIM Questão 50. Tem um tipo de __________ (cf. item 49) que não serve para comer e se rala para fazer farinha (polvilho, goma). Como se chama essa raiz? MANDIOCA Questão 51. ... um veículo de uma só roda, empurrado por uma pessoa, para pequenas cargas em trechos curtos? CARRINHO DE MÃO Questão 52. ... as duas partes em que a pessoa segura para empurrar o __________ (cf. item 51)? HASTES DO CARRINHO DE MÃO Questão 53. ... a armação de madeira, em forma de forquilha (mímica), que se coloca no pescoço de animais (porco, terneiro/bezerro, carneiro, vaca) para não vararem a cerca? CANGALHA Questão 54. ... armação de madeira que se coloca no lombo do cavalo ou do burro para levar cestos ou cargas? CANGALHA Questão 55. ... esses cestos de vime, de taquara, de cipós trançados, para levar batatas (mandioca, macaxeira, aipim etc.), no lombo do cavalo ou do burro? JACÁ Questão 56. E, se forem de couro, com tampa? BOLSA Questão 57. ... a peça de madeira que vai ao pescoço do boi, para puxar o carro ou arado? CANGA Questão 58. ... a cria da ovelha logo que nasce? BORREGO (DO NASCER ATÉ...) Questão 59. ... a cria da ovelha, quando vai crescendo? CORDEIRO Questão 60. ... a fêmea de um animal que está prestes a/nos dias de dar cria? FÊMEA QUE ESTÁ PARA DAR CRIA Questão 61. Como se diz quando a fêmea de um animal perde a cria? 278 PERDA DA CRIA Questão 62. ...égua quando está velha? ÉGUA VELHA Questão 63. ...homem que é contratado para trabalhar na roça do outro? TRABALHADOR DE ENXADA EM ROÇA ALHEIA Questão 64. O que é que abre com o machado, com o facão, a foice para passar por um mato fechado? PICADA Questão 65. ... o caminho, no pasto, onde não cresce mais grama, de tanto o animal TRILHO CAMPO SEMÂNTICO – VI – FAUNA Questão 66. ... ave preta que come animal morto, podre? URUBU Questão 67. ... o passarinho bem pequeno, que bate muito rápido as asas, tem bico comprido e voa de flor em flor? COLIBRI Questão 68 ... a ave que faz o ninho com terra, nos postes, nas árvores e até nos cantos da casa? JOÃO DE BARRO Questão 69. ... a ave de criação parecida com a galinha, de penas pretas com pintinhas brancas? GALINHA D’ANGOLA Questão 70. ... a ave do mato, de bico curvo e penas coloridas; quando presa, pode aprender a falar PAPAGAIO Questão 71. ... uma galinha sem rabo? SURA Questão 72. ... um cachorro de rabo cortado? 279 COTÓ Questão 73. ... o bicho que carrega os filhotes numa bolsa que tem na barriga e solta um cheiro muito ruim? GAMBÁ Questão 74. ... as patas dianteiras do cavalo? PATAS DIANTEIRAS DO CAVALO Questão 75. ... o cabelo em cima do pescoço do cavalo? CRINA DO PESCOÇO Questão 76. ... o cabelo comprido na traseira do cavalo? CRINA DA CAUDA Questão 77. ... a parte do cavalo onde vai a sela? LOMBO Questão 78. ... a parte larga atrás do __________ (cf. item 77)? ANCA Questão 79. O que o boi tem na cabeça? CHIFRE Questão 80. O animal que tem um só __________ (cf. item 79) porque o outro não nasceu? UM SÓ CHIFRE Questão 81. ... a cabra que não tem __________ (cf. item 79) CABRA SEM CHIFRE Questão 82. ... o boi sem __________ (cf. item 79) BOI SEM CHIFRE Questão 83. ... a parte da vaca onde fica o leite? ÚBERE Questão 84. ... a parte com que o boi espanta as moscas? RABO 280 Questão 85. ... o animal que tem a perna mais curta e que puxa uma perna? MANCO Questão 86. ... um tipo de mosca grande, esverdeada, que faz um barulhão quando voa? MOSCA VAREJEIRA Questão 87. ... um bichinho que se gruda nas pernas das pessoas quando elas entram num banhado ou córrego?? SANGUESSUGA Questão 88. ... o inseto de corpo comprido e fino, com quatro asas bem transparentes, que voa e bate a parte traseira na água? LIBÉLULA Questão 89. ... aquele bichinho branco, enrugadinho, que dá em goiaba, em coco? BICHO DE FRUTA Questão 90. ... aquele bicho que dá em esterco, em pau podre? CORÓ Questão 91. ... aquele inseto pequeno, de perninhas compridas, que canta no ouvido das pessoas, de noite? (imitar o zumbido) PERNILONGO CAMPO SEMÂNTICO – VII – CORPO HUMANO Questão 92. ... esta parte que cobre o olho? (apontar) PÁLPEBRAS Questão 93. ... isto? (apontar) NUCA Questão 94. ... esta parte alta do pescoço do homem? (apontar) POMO DE ADÃO 281 Questão 95. ... o osso que vai do pescoço até o ombro? (apontar) CLAVÍCULA Questão 96. ... a parte do corpo da mulher com que ela amamenta os filhos? SEIOS Questão 97. ... parte do corpo da mãe onde fica o nenê/bebê antes de nascer? ÚTERO Questão 98. ... isto? (apontar) CALCANHAR Questão 99. ... isto? (apontar) TORNOZELO Questão 100. ... o osso redondo que fica na frente do joelho? RÓTULA Questão 101. Que sente uma criança quando se passa o dedo na sola do pé? CÓCEGAS Questão 102. ... esses dois dentes pontudos? DENTES CANINOS Questão 103. ... os últimos dentes, que nasce quando a pessoa já é adulta? DENTES DO SISO Questão 104. ... esses dentes grandes no fundo da boca, vizinhos dos __________ (cf. item 103)? DENTES MOLARES Questão 105. ... a pessoa que não tem dentes? DESDENTADO Questão 106. ... a pessoa que parece falar pelo nariz? (imitar) FANHOSO Questão 107. ... alguma coisa que cai no olho e fica incomodando? 282 CISCO Questão 108. ... a pessoa que tem só um olho? CEGO DE UM OLHO Questão 109. ... a pessoa que tem os olhos olhando em direção diferente? (completar com um gesto dos dedos) VESGO Questão 110. ... a pessoa que não enxerga longe, e tem que usar óculos? MÍOPE Questão 111. ... a bolinha que nasce na __________ (cf. item 92), fica vermelha e incha? TERSOL Questão 112. ... a inflamação no olho que faz com que o olho fique vermelho e amanheça grudado? CONJUNTIVITE Questão 113. ... aquela pele branca no olho que dá em gente velha? CATARATA Questão 114. ... este barulhinho que se faz? (soluçar) SOLUÇO Questão 115. ... a sujeirinha dura que se tira do nariz com o dedo? MELECA Questão 116. ... a pessoa que tem um calombo grande nas costas e fica assim? (mímica) CORCUNDA Questão 117. ... a pessoa que come com a mão esquerda, faz tudo com essa mão? (completa com o gesto) CANHOTO Questão 118. ... a pessoa que não tem uma perna? PERNETA Questão 119. ... a pessoa que puxa de uma perna? MANCO 283 Questão 120. ... a pessoa das pernas curvas para os lados? PESSOA DE PERNAS ARQUEADAS Questão 121. ... esta parte aqui? AXILA Questão 122. ... o mau cheiro embaixo dos braços? CHEIRO NAS AXILAS Questão 123. Se uma pessoa come muito e sente que vai por/botar para fora o que comeu, se diz que vai o quê? VOMITAR CAMPO SEMÂNTICO – VIII – CONVÍVIO E COMPORTAMENTO SOCIAL Questão 124. ... a pessoa que fala demais? PESSOA TAGARELA Questão 125. ... a pessoa que tem dificuldade de aprender as coisas? PESSOA POUCO INTELIGENTE Questão 126. ... a pessoa que não gosta de gastar seu dinheiro, e às vezes, até passa dificuldades para não gastar? PESSOA SOVINA Questão 127. ... a pessoa que deixa suas contas penduradas? MAU PAGADOR Questão 128. ... a pessoa que é paga para matar alguém? ASSASSINO PAGO Questão 129. ... a pessoa que mora e trabalha para si nas terras de outra pessoa? POSSEIRO CAMPO SEMÂNTICO – IX – CICLOS DA VIDA 284 Questão 130. As mulheres perdem sangue todos os meses. Como se chama isso? MENSTRUAÇÃO Questão 131. Numa certa idade acaba a/o __________ (cf. item 130). Quando isso acontece, se diz que a mulher __________ . ENTRAR NA MENOPAUSA Questão 132. ... a mulher que ajuda a criança nascer? PARTEIRA Questão 133. Chama-se a __________ (cf. item 132) quando a mulher está para __________? DAR À LUZ Questão 134. ... duas crianças que nasceram no mesmo parto? GÊMEOS Questão 135. ... quando a mulher grávida perde o filho, se diz que ela teve __________ . ABORTO Questão 136. Quando a mulher fica grávida, mas não quer ter a criança, ela toma remédio para quê? ABORTAR Questão 137. Quando a mãe não tem leite e outra mulher amamenta a criança , como chamam essa mulher? AMA-DE-LEITE Questão 138. O próprio filho da __________ (cf. item 137) e a criança que ela amamenta são o que um do outro? IRMÃO DE LEITE Questão 139. ... a criança que não é filho verdadeiro do casal, mas que é criado por ele como se fosse? FILHO ADOTIVO Questão 140. ... o filho que nasceu por último? FILHO MAIS NOVO Questão 141. ... a criança de 05 a 10 anos, do sexo masculino? MENINO 285 Questão 142. E se for do sexo feminino, como se chama? MENINA Questão 143. ... a pessoa que acompanha uma moça quando ela sai com o namorado? ACOMPANHANTE DOS NAMORADOS Questão 144. ... o marido que a mulher passa para trás com oro homem? MARIDO ENGANADO Questão 145. ... a mulher que se vende para qualquer homem? PROSTITUTA Questão 146. Numa conversa, para falar de uma pessoa que já morreu, geralmente as pessoas não a trata pelo nome que tinha em vida. Como é que se refere a ela? DEFUNTO Questão 147. Quando um homem fica viúvo e casa de novo, o que a segunda mulher é dos filhos que ele já tinha? MADRASTA Questão 148. ... a pessoa que tem o mesmo nome da gente? XARÁ CAMPO SEMÂNTICO – X – RELIGIÕES E CRENÇAS Questão 149. Deus está no céu e no inferno está ___________ . DIABO Questão 150. O que algumas pessoas dizem já ter visto, à noite, em cemitérios ou em casas, que se diz que é do outro mundo? FANTASMA Questão 151. O que certas pessoas fazem, botam, por exemplo, nas encruzilhadas, para prejudicar alguém? FEITIÇO Questão 152. ... o objeto que algumas pessoas usam para dar sorte ou afastar males? AMULETO 286 Questão 153. ... uma mulher que cura, tira o mau olhado através de rezas e simpatias? BENZEDEIRA Questão 154. E se for homem? BENZEDOR Questão 155. ... a pessoa que trata de doenças através de ervas e plantas? CURANDEIRO Questão 156. ... a chapinha de metal com um desenho de santo que as pessoas usam, geralmente no pescoço, presa numa corrente? MEDALHA Questão 157. No natal, monta-se um grupo de figuras representando a Virgem Maria, São José, o Menino Jesus etc. Como chamam isso? PRESÉPIO CAMPO SEMÂNTICO – XI – FESTAS E DIVERTIMENTOS Questão 158. ... a brincadeira em que se gira o corpo sobre a cabeça e acaba sentado? (mímica) BOLINHA DE GUDE Questão 160. ... o brinquedo feito de uma forquilha e duas tiras de borracha (mímica), que os meninos usam para matar passarinho? ESTILINGUE Questão 161. ... o brinquedo feito de varetas cobertas de papel que se empina no vento por meio de uma linha? PAPAGAIO DE PAPEL Questão 162. ... o brinquedo de papel sem varetas que se empina no vento por meio de uma linha? PIPA Questão 163. ... a brincadeira que uma criança fecha os olhos, enquanto as outras se escondem em algum lugar, e depois vai procurá-las? ESCONDE-ESCONDE Questão 164. ... a brincadeira em que uma criança, com olhos vendados, tenta pegar as outras? 287 CABRA-CEGA Questão 165. ... uma brincadeira em que uma criança corre atrás das outras para tocar numa delas antes que alcance um ponto combinado? PEGA-PEGA Questão 166. ... esse ponto combinado? FERROLHO Questão 167. ... uma brincadeira em que as crianças ficam em círculo, enquanto outra vai passando com um objeto que deixa cair atrás de uma delas e esta pega o objeto e sai correndo? CHICOTE-QUEIMADO/SILÊNCIO ATRÁS/GATO E RATO Questão 168. ... uma tábua apoiada no meio, em cujas pontas sentam duas crianças e quando uma sobe, a outra desce? (mímica) GANGORRA Questão 169. ... uma tábua, perdurada por meio de cordas, onde uma criança senta e se move para frente e para trás? BALANÇO Questão 170. ... a brincadeira em que as crianças riscam uma figura no chão, formada por quadrados numerados, jogam uma pedrinha (mímica) e vão pulando com uma perna só? (solicitar a descrição) AMARELINHA Questão 171. ... a pessoa que rouba no jogo? PESSOA QUE AGE COM DESONESTIDADE NO JOGO Questão 172. ... a pessoa que tem sorte no jogo? PESSOA QUE TEM SORTE NO JOGO Questão 173. ... a pessoa que não tem sorte no jogo? PESSOA SEM SORTE NO JOGO Questão 174. ... a pessoa que joga bem? [Pelé foi o quê?] BOM JOGADOR Questão 175. ... a pessoa que joga mau? MAU JOGADOR Questão 176. ... a pessoa que dança muito bem? PESSOA QUE DANÇA MUITO BEM 288 CAMPO SEMÂNTICO – XII – HABITAÇÃO Questão 177. ... aquela pecinha de madeira, que gira ao redor de um prego, para fechar a porta, janela ...? TRAMELA Questão 178. Quando uma janela tem duas partes, como se chama a parte de fora que é formada de tirinhas horizontais que permitem a ventilação e a claridade? (mostrar gravura) VENEZIANA/TAMPO Questão 179. ... aquilo, preto que se forma na chaminé, na parede ou no teto da cozinha, acima do fogão a lenha? FULIGEM Questão 180. Para acender o cigarro, eu uso fósforo ou ________ . ISQUEIRO Questão 181. ... aquele objeto que se usa para clarear no escuro e se leva na mão assim? (apontar) LANTERNA Questão 182. ... a cinza quente que fica dentro do fogão a lenha? BORRALHO CAMPO SEMÂNTICO – XIII – ALIMENTAÇÃO E COZINHA Questão 183. ... a carne depois de passada na máquina? CARNE MOÍDA Questão 184. ... Quando uma pessoa acha que comeu demais, ela diz: comi tanto que estou __________ . EMPANTURRADO (A) /CHEIO (A) Questão 185. ... uma pessoa que normalmente come demais? GLUTÃO 289 Questão 186. Que nomes dão a uma pessoa que bebeu demais? BÊBADO (DESIGNAÇÕES) Questão 187. Que nomes dão ao cigarro feito pela própria pessoa, enrolado à mão? CIGARRO DE PALHA Questão 188. ... o resto do cigarro que se joga fora? TOCO DE CIGARRO Questão 189. Que nomes dão aqui para bebida alcoólica feita de cana-de-açúcar? AGUARDENTE Questão 190. ... um lugar pequeno, com um balcão, onde homens costumam ir beber __________ (cf. item 189) e onde também se pode comprar alguma outra coisa? BODEGA CAMPO SEMÂNTICO – XIV – VESTIÁRIO Questão 191. Que peça do vestiário serve para segurar os seios? SUTIÃ Questão 192. Que roupa o homem usa debaixo da calça? CUECA Questão 193. Que roupa a mulher usa debaixo da saia? CALCINHA Questão 194. ... aquilo que as mulheres passam no rosto, nas bochechas, para ficarem rosadas? ROUGE Questão 195. ... um objeto fino de metal, para prender o cabelo? (mostrar) GRAMPO (COM PRESSÃO) Questão 196. ... um objeto de metal, para prender o cabelo? (mostrar) GRAMPO (SEM PRESSÃO) 290 Universidade do Estado do Pará Centro de Ciências Sociais e Educação Programa de Pós-Graduação em Educação Travessa Djalma Dutra, s/n – Telégrafo 66113-200 Belém-PA www.uepa.br