UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
LAYS CRISTINA PEREIRA DE LIMA
ROSILEI CARDOSO DE LIMA
COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO: UMA HISTÓRIA
DE AMOR E LUTA PELA PRESERVAÇÃO DE SUAS
TRADIÇÕES
CURITIBA
2015
LAYS CRISTINA PEREIRA DE LIMA
ROSILEI CARDOSO DE LIMA
COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO: UMA HISTÓRIA
DE AMOR E LUTA PELA PRESERVAÇÃO DE SUAS
TRADIÇÕES
Trabalho apresentado ao curso de PósGraduação da Universidade Tuiuti do
Paraná, como requisito para a obtenção
do título de Especialista em Educação do
Campo.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Cristina
Borges da Silva.
CURITIBA
2015
RESUMO
O presente artigo faz uma análise reflexiva das transformações socioespaciais
ocorridas nas comunidades faxinalenses do Município de Tijucas do Sul- (PR),
dentre algumas das comunidades que se caracterizam com o sistema faxinal, a
ênfase da respectiva pesquisa é na comunidade do Postinho que localiza-se a
25 quilômetros da sede do Município, que atualmente encontra-se com grandes
dificuldades de permanência no lugar, devido à falta de políticas publicas que
viabilizem a sustentabilidade dos sujeitos do campo. Os faxinais caracterizamse pelas florestas naturais de araucárias, o criadouro livre e comunitário de
animais, a preservação da mão de obra familiar no cultivo agrícola além da
preservação das tradições culturais. Os procedimentos metodológicos da
pesquisa foram a aplicação de entrevistas com a comunidade. Os referenciais
teóricos trazem as reflexões de Tavares (2008), Simões (2008), Cunha (2006),
Caldart (2004 e 2011), Arroyo (2011) e Molina (2011). Os resultados
evidenciam que devido a falta de emprego para os jovens e adultos, e pela a
falta de políticas publicas para uma educação dos sujeitos do campo, muitos
moradores estão migrando para municípios vizinhos em busca de melhores
condições de vida. Além disso, destaca-se a desagregação constante e a
extinção de uma cultura rica e de conhecimentos empíricos desses sujeitos,
como resultado da desvalorização do sujeito do campo.
Palavras-chave: Comunidade tradicional. Faxinal. Desagregação. Políticas
públicas. Permanência.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 01 – MAPA DO BRASIL DIVIDIDO POR REGIÃO COM
ÊNFASE PARA O ESTADO DO PARANÁ................................................
16
FIGURA 2 – MAPA DE LOCALIZAÇÃO DE ALGUMAS REGIÕES QUE
POSSUEM O SISTEMA FAXINAL NO ESTADO DO PARANÁ................
17
FIGURA 03 – MAPA DE LOCALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE TIJUCAS
DO SUL EM RELAÇÃO AO ESTADO DO PARANÁ................................. 18
FIGURA 04 – MAPA DO MUNICÍPIO DE TIJUCAS DO SUL,
LOCALIZANDO A COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO.........
21
FIGURA 05 – VISUALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA SEDE DE TIJUCAS
DO SUL A COMUNIDADE DE POSTINHO............................................... 22
FIGURA 6 - CRIADOURO LIVRE DE ANIMAIS DE GRANDE PORTE
NA COMUNIDADE DE POSTINHO..........................................................
24
FIGURA 7 - CRIADOURO LIVRE DE ANIMAIS DE PEQUENO PORTE
NA COMUNIDADE DE POSTINHO..........................................................
24
FIGURA 8 - ESTRADA DE TERRA NA LOCALIDADE FAXINALENSE
DE POSTINHO..........................................................................................
25
FIGURA 9 - MATA BURRO NA LOCALIDADE FAXINALENSE DE
POSTINHO................................................................................................
25
FIGURA 10 – HORTA DA COMUNIDADE FAXINALENSE DO
POSTINHO................................................................................................
FIGURA
11
–
ALGUNS
ALIMENTOS
PRODUZIDOS
26
PELOS
MORADORES DA COMUNIDADE FAXINALENSE DO POSTINHO........ 26
FIGURA 12 – MORADORA DA COMUNIDADE FAXINALENSE DO
POSTINHO EM SUAS ATIVIDADES TRADICIONAIS..............................
27
FIGURA 13 – MORADORA DA COMUNIDADE FAXINALENSE DO
POSTINHO EM SUAS ATIVIDADES TRADICIONAIS..............................
FIGURA
14
–
MORADORA
DA
COMUNIDADE
E
27
ALGUNS
ALIMENTOS PRODUZIDOS NA COMUNIDADE: MEL, QUEIJO,
BOLACHA CASEIRA E DOCE DE ABÓBORA.........................................
28
FIGURA 15 – FAMÍLIA INDO PARA A ROÇA FAZER A COLHEITA DE
MILHO NA COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO....................
28
FIGURA 16 – GRADE E ZORRA INSTRUMENTOS UTILIZADOS NO
PLANTIO DOS ALIMENTOS..................................................................... 29
FIGURA 17 – GRADE E ZORRA INSTRUMENTOS UTILIZADOS NO
PLANTIO DOS ALIMENTOS.....................................................................
FIGURA
18
-
OTILIA
OLIVEIRA
BISCAIA
MORADORA
29
DA
COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO FAZENDO FARINHA
30
DE MILHO...................................................................................
FIGURA 19 – MONJOLO INSTRUMENTO UTILIZADO NO PREPARO
DA FARINHA DE MILHO........................................................................... 30
FIGURA 20 – SURURUCA, PENEIRA UTILIZADA NA PRODUÇÃO DA
FARINHA DE MILHO................................................................................. 31
FIGURA 21 – CAIXA DE CONCRETO UTILIZADA PARA DEIXAR O
MILHO EM GRÃO SUBMERSO NA ÁGUA PARA AMOLECER............... 31
FOTO 22 - DONA MARIA DAS GRAÇA MANTINS MORADORA DA
COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO QUE AUXILIA E
REALIZA OS BENZIMENTOS E TRATAMENTOS COM ERVAS
MEDICINAIS..............................................................................................
FIGURA 23 – IGREJA CATÓLICA DA COMUNIDADE FAXINALENSE
32
DE POSTINHO..........................................................................................
33
FIGURA 24 – IGREJAS EVANGÉLICAS DA COMUNIDADE DE
FAXINALENSE DE POSTINHO................................................................
34
FIGURA 25 - CAVALGADA TÍPICA DAS FESTAS RELIGIOSAS
TRADICIONAIS DA COMUNIDADE.......................................................... 34
FIGURA 26 - FESTA JUNINA TRADICIONAIS DA COMUNIDADE
FAXINALENSE DE POSTINHO................................................................
35
FIGURA 27 - MORADOR DA COMUNIDADE FAXINALENSE DE
POSTINHO VACINANDO OS ANIMAIS.................................................... 35
FIGURA 28 - LUIZ IDINAR PEREIRA DE LIMA E LIVINO FURTADO
MORADORES DA COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO
ASSANDO COSTELA DE FOGO DE CHÃO, COMIDA TÍPICA DAS
FESTAS DA IGREJA CATÓLICA DA COMUNIDADE..............................
36
FIGURA 29 – ALCINDO PEREIRA DE LIMA E SEU FILHO ANTÔNIO
ADEMIR PEREIRA DE LIMA MORADORES DA COMUNIDADE
FAXINALENSE DE POSTINHO................................................................
37
FIGURA 30 – PRESERVAÇÃO DO ECOSSISTEMA E DAS MATAS DE
ARAUCÁRIA NA COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO........... 38
FIGURA 31 – KAROLINE KATZMANN JOVEM MORADORA DA
COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO....................................... 43
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 01 - REALIDADE DA VIDA ACADÊMICA DOS JOVENS
MORADORES
DA
COMUNIDADE
FAXINALENSE
DE
POSTINHO........................................................................................
41
GRÁFICO 2 - PRETENSÃO DOS JOVENS DE CONTINUAR VIVENDO
NA
COMUNIDADE
FAXINALENSE
DE
POSTINHO..........................................................................................
42
GRÁFICO 3 – FORMA COM QUE OS PROFESSORES DO CAMPO
DO
MUNÍCIO
DE
TIJUCAS
DO
SUL
REALIZARAM
SUA
GRADUAÇÃO............................................................................................ 44
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................
9
2 DELINEAMENTO TEÓRICO E METODOLÓGICO...............................
11
2.1 A LUTA DOS POVOS DO CAMPO POR UMA EDUCAÇÃO DE
QUALIDADE E DIGNA AO SUJEITO DO CAMPO...................................
11
2.2 O ESTADO DO PARANÁ E O MODO DE VIDA PECULIAR DOS
FAXINAIS..................................................................................................
14
2.2.1 A possibilidade de reconhecimento do Faxinal de Postinho
em Tijucas do Sul....................................................................................
18
2.2.2 O Postinho e sua característica como faxinal.............................
20
2.3 A EDUCAÇÃO DOS JOVENS DA COMUNIDADE TRADICIONAL
FAXINALENSE DE POSTINHO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS QUE
VIABILIZAM
O
DIREITO
A
“IGUALDADE”............................................................................................ 40
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................
46
REFERÊNCIAS.........................................................................................
48
9
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem o intuito de apresentar e discutir as questões
relacionadas aos faxinais, aos modos de ser e de viver destes povos.
Respeitando esta diversidade buscamos neste trabalho a valorização e o
reconhecimento dos diferentes aspectos presentes neste contexto. Nesse
sentido apresenta-se a afirmação de Simões (2009, p.14) sobre as
características das comunidades tradicionais, pois como aponta o autor as
comunidades tradicionais de faxinais no Paraná permanecem sendo realidades
visíveis nos dias de hoje, apresentando as particularidades desta população,
como o uso coletivo da terra para a criação de animais, habitação, o uso da
terra para o plantio, as festas tradicionais, a crença em benzimentos e
curandeiros além da preservação das matas de araucária.
O questionamento sobre o modo de vida das comunidades
faxinalenses iniciou por sermos professoras e moradoras da comunidade do
Postinho, que apresenta algumas das características do sistema faxinal e ao
percebermos em nossa prática docente pouco, ou melhor, nenhum
conhecimento sobre a realidade da comunidade faxinal, sentimo-nos instigadas
a investigar e retratar a realidade vivenciada pelos moradores desta
comunidade.
A partir do momento de nossa inserção no curso de Pós-Graduação
em Educação do Campo, no final do ano de 2013, pela Universidade TUITI do
Paraná, tornou-se possível a realização desta pesquisa na comunidade do
Postinho situada no perímetro rural aproximadamente 25 quilômetros distante
da sede do município de Tijucas do Sul, na Região Metropolitana de Curitiba
estado do Paraná. Mediante leituras realizadas constatamos as peculiaridades
do modo de vida das pessoas da comunidade caracterizada como faxinal.
Alguns dos autores que inspiraram nossa pesquisa foram: Simões
(2009) que desenvolveu seu trabalho na comunidade Taquari dos Ribeiros
propondo compreender os impactos da territorialidade e as Políticas Públicas
Educacionais nas comunidades tradicionais faxinalenses, Tavares (2008)
descreve os faxinais do estado do Paraná e as características deste modo de
10
vida em seus diversos aspectos e Caldart (2011) que traz reflexões sobre a luta
dos povos tradicionais na perspectiva da Educação Básica do Campo.
Um dos objetivos inerentes a esta pesquisa fez-se em torno da
desagregação constante das famílias da comunidade de Postinho perante a
falta de políticas públicas que garantam uma vida digna aos moradores do
faxinal. Um dos fatores decorrente da desagregação deste povo, diz respeito à
condição do acesso e à escolarização, pois na comunidade existe uma escola
municipal que atende as crianças que estão nos anos iniciais de Pré-escola I e
II ao 5º ano do ensino fundamental, e para aqueles que desejam dar
continuidade a vida escolar é preciso se deslocar para a sede do Município de
Tijucas do Sul.
Neste sentido, alguns questionamentos se fizeram presentes, a saber:
1) se os jovens tem interesse em dar continuidade á vida escolar? Como irão
fazer para conseguir dar essa continuidade? 2) se pretendem continuar
morando nesta comunidade? 3) quais são as dificuldades que encontram nesta
comunidade?
Para dar conta de apresentar as reflexões propostas nos
questionamentos desta pesquisa o trabalho encontra-se estruturado em cinco
tópicos; no primeiro momento apresentamos uma reflexão sobre a luta dos
povos do campo por uma educação de qualidade e digna ao sujeito do campo
e as necessidades destes conhecimentos na formação docente. Em seguida
traremos a gênese dos faxinais acompanhado do conceito e das características
deste modo de vida, juntamente com um breve histórico dos faxinais no Estado
do Paraná. Num terceiro momento retratamos o histórico e a possibilidade de
reconhecimento do sistema faxinal no Município de Tijucas do Sul. Em um
quarto momento, apresentamos um panorama das características dos faxinais
que compreende a organização da comunidade do Postinho. Em seguida
traremos a discussão da educação dos jovens da comunidade tradicional
faxinalense do Postinho e as Políticas Públicas que viabilizam o direito a
“igualdade” da população que reside no campo. Por fim apresentamos algumas
reflexões sobre as dificuldades encontradas pelos jovens da comunidade em
dar continuidade à vida escolar e da permanência dos moradores nesta
comunidade.
11
2 DELINEAMENTO TEÓRICO E METODOLÓGICO
2.1 A LUTA DOS POVOS DO CAMPO POR UMA EDUCAÇÃO DE
QUALIDADE E DIGNA AO SUJEITO DO CAMPO.
A partir da década de 60 a Educação dos Povos do Campo é uma luta
que vem tendo grande intensidade, instigada pela proposta da pedagogia
libertadora de Paulo Freire e expandida pelos movimentos sociais e sindicais
contra uma lógica excludente historicamente no Brasil, uma característica é a
educação como direito de poucos. Neste contexto surge o movimento nacional
“Por uma Educação do Campo” que aliada aos órgãos governamentais, aos
estudiosos das universidades e de um coletivo de sujeitos que indagavam as
fragilidades sociais e educacionais, firmaram o compromisso de cobrar direitos
no campo.
A Educação do Campo denuncia todas as formas de exploração e das
contradições presentes na sociedade lutando contra um sistema que oprime e
desrespeita o sujeito do campo. Torna-se emergente repensar e levar em
consideração a valorização da identidade, modos de vida, cultura e a relação
do trabalho muitas vezes distantes da realidade vivida.
Vivemos cotidianamente resistindo a uma sociedade capitalista e que
não é nada fácil mudar um paradigma firmado num ideário urbano. O
pensamento tradicional indica que só é possível realizar praticas pedagógicas
distantes da realidade. Freire faz a reflexão sobre o ensino tradicional como um
ensino bancário, neste sentido o conhecimento é depositado ao educando e
sacado ao fim do período. Nesta perspectiva não há valorização do
aprendizado e por consequência ficam de lado as indagações sobre as
injustiças sociais que os alunos vivenciam.
É preciso repensar numa concepção de Educação do Campo lutando por
um projeto que ao invés do individualismo seja construído um coletivo
instigando e indagando as contradições presentes no cotidiano; e que ao invés
de um ensino fragmentado haja um ensino interdisciplinar, significativo e
coerente que envolva as questões da realidade, ou seja, fundamentada numa
prática problematizadora que segundo Paulo Freire (1987) É preciso se libertar
12
das opressões que vivenciamos a todo o momento e para isso é preciso lutar
coletivamente.
Caldart traz reflexões a respeito da Educação do Campo como princípios
extremamente importantes para formação humana:
1)Intencionalidade política; 2) Uma visão de totalidade na sociedade;
3) Relação de política agrária e uma política de educação frente a
diversas aspectos (agricultura, saúde e educação); 4) A luta de uma
agricultura capitalista exterminando o agronegócio lutando por um
projeto educativo que favorece a agricultura familiar, agroecologia e a
reforma agrária; 5) É preciso superar a visão de que o urbano se
prevalece como desenvolvido e moderno desvalorizando a população
do campo; 6) Luta pela garantia de políticas públicas que favoreçam o
direito de educação em que esta seja no o sujeito tem direito de ser
educado no lugar onde vive e do vinculada as suas necessidades
tanto humana como sociais campo; 7) É preciso pensar em um
projeto construído pelos sujeitos do campo e não para eles
respeitando assim as organizações, as famílias, a comunidade, para
que estes se assumam como sujeitos lutadores e construtores de
seus direitos sociais (CALDART, 2004, p. 15-18).
O decreto presidencial nº 7.352 de 4 de novembro de 2010
traz os
princípios da educação do campo em seu art. 2o :
I - respeito à diversidade do campo em seus aspectos sociais,
culturais, ambientais, políticos, econômicos, de gênero, geracional e
de raça e etnia; II - incentivo à formulação de projetos políticopedagógicos específicos para as escolas do campo, estimulando o
desenvolvimento das unidades escolares como espaços públicos de
investigação e articulação de experiências e estudos direcionados
para o desenvolvimento social, economicamente justo e
ambientalmente sustentável, em articulação com o mundo do
trabalho;III - desenvolvimento de políticas de formação de
profissionais da educação para o atendimento da especificidade das
escolas do campo, considerando-se as condições concretas da
produção e reprodução social da vida no campo;IV - valorização da
identidade da escola do campo por meio de projetos pedagógicos
com conteúdos curriculares e metodologias adequadas às reais
necessidades dos alunos do campo, bem como flexibilidade na
organização escolar, incluindo adequação do calendário escolar às
fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;V - controle social da
qualidade da educação escolar, mediante a efetiva participação da
comunidade e dos movimentos sociais do campo (BRASIL, 2010).
A educação é uma ligação entre descobrir o mundo e investir numa
sociedade mais justa e igualitária para todos, por tanto a escola tem um papel
fundamental no desenvolvimento da educação qualitativa, pois ela é a ponte de
ligação entre conhecimento e cultura, valores e identidade, porém desde que
tenha um olhar aberto ao que há de mais humano, simples e avançado no
13
Campo Brasileiro, no entanto as escolas públicas ofertadas à população do
campo em sua grande maioria encontram-se em condições precárias na
estrutura física, sendo mais preocupante na estrutura pedagógica e de
profissionais com visão ruralista/urbanista.
No texto preparatório da primeira conferência nacional “Por Uma
Educação Básica do Campo” os autores trazem os principais problemas
enfrentados nas escolas do meio rural:
Falta de infraestrutura e formação docente de qualidade; Ausência de
apoio e ações de uma reconfiguração pedagógica; Currículo e
calendário escolar distantes da realidade campesina; Falta de
formação específica para a realidade do campo; Desarticulada as
necessidades com relação ao trabalho dos diferentes grupos
identitários: assalariados, camponeses movimentos e organizações
sociais; Alheia a um projeto de desenvolvimento onde o campo e
desvalorizado e o urbano enaltecido; Falta de organizações
alternativas articulando o deslocamento dos jovens para estudar na
cidade, desta forma trabalhando em prol da sua própria ruína;
(FERNANDES; CERIOLI; CALDART, 2011, p. 38-39).
Segundo o texto A Escola do Campo em Movimento no qual a autora
Caldart (2011 p. 92-93) traz uma reflexão a respeito da educação nas escolas
do campo partindo do Movimento Social Sem Terra MST, como exemplo de
luta por uma educação como direito. Demonstrando, que ainda muitos são
excluídos deste direito, pela condição de vida em que viviam, alegando
também que as escolas tradicionais não tem lugar para os sujeitos sem-terra,
assim como não tem lugar para o sujeito do campo, pois no que se refere a
estrutura formal das escolas tradicionais estas não respeitam e não conhecem
a realidade e os saberes, desses sujeitos. Desta forma foi percebendo-se está
realidade em nosso entorno que destacamos a importância de lutar e buscar
uma educação, que valorize os povos e comunidades tradicionais bem como
está descrito no decreto 7352 de 4 de novembro de 2010 em seu artigo 6º:
Art. 6o Os recursos didáticos, pedagógicos, tecnológicos, culturais e
literários destinados à educação do campo deverão atender às
especificidades e apresentar conteúdos relacionados aos
conhecimentos das populações do campo, considerando os saberes
próprios das comunidades, em diálogo com os saberes acadêmicos e
a construção de propostas de educação no campo contextualizadas
(BRASIL, 2010).
14
Podemos assim afirmar que a Educação do Campo precisa de um olhar
atento e carinhoso a sua população, pois não basta ter escolas situadas no
campo e didáticas impostas por uma sociedade que visa o pleno
desenvolvimento do capital e enfatizar a valorização da área urbana, como se
tudo o que há de melhor esta centrado nas grandes cidades. Para tanto se
torna indispensável considerar os conhecimentos empíricos destes sujeitos e a
sua realidade, respeitando e valorizando a identidade deste povo.
Segundo Kolling, Cerioli e Caldart (2002, p. 88) sem reconhecer o campo
e seus sujeitos não há como discorrer a propósito de uma educação digna aos
povos tradicionais, é preciso compreender que são seres humanos que
possuem direitos, constituíram e constituem a história, cultura e identidade que
devem ser respeitados e legitimados perante seus direitos sociais e humanos.
2.2 O ESTADO DO PARANÁ E O MODO DE VIDA PECULIAR DOS FAXINAIS
A gênese dos faxinais surge a partir da hipótese levantada pelo autor
Tavares (2008, p.383) que aponta esse processo como uma herança cultural e
social da aliança entre índios e negros indígenas escravocratas fugitivos de um
sistema feudal, e que ao se encontrarem nas matas de araucária no Estado do
Paraná surge á junção das culturas de cada grupo social como: o uso comum
de terras para o plantio originário dos índios, a criação livre de animais pelos
escravos africanos e a extração da erva mate por ambos os sujeitos sociais,
constituindo assim as principais características do modelo de vida faxinal no
início do século XVII, onde também imigrantes europeus, participantes da
Guerra do Contestado, jesuítas espanhóis e principalmente camponeses do
leste europeu, (Ucrânia e Polônia) contribuíram significativamente para a
consolidação deste modelo de vida.
Por meio da discussão que discorre o autor aponta que a formação do
sistema faxinal está correlacionada á organização social, econômica e cultural
que perpassa á décadas, e que é característico de comunidades do estado do
Paraná.
15
O Paraná é um dos 26 estados do Brasil e está situado na Região Sul do
País. Faz divisa com os Estados de São Paulo, Santa Catarina e Mato Grosso
do Sul, fronteira com a Argentina e o Paraguai e limite com o Oceano Atlântico.
Ocupa uma área de 199.880 km². Sua capital é Curitiba, e outras importantes
cidades são Londrina, Maringá, Foz do Iguaçu, Ponta Grossa, Cascavel,
Guarapuava e Paranaguá.
O clima paranaense apresenta diferenças marcantes, dependendo da
região de tropical úmido ao norte a temperado úmido ao sul. A população é
formada por descendentes de várias etnias: poloneses, italianos, alemães,
ucranianos, holandeses, espanhóis, japoneses e portugueses, e por imigrantes
procedentes, em sua maioria, dos estados do Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, São Paulo e Minas Gerais.
As economias dos municípios da Região Metropolitana de Curitiba estão
entre as maiores do Estado. Em razão do dinamismo da indústria e dos
serviços, Curitiba, São José dos Pinhais e Araucária são os municípios mais
representativos no PIB do Paraná. No interior do Estado, Londrina e Maringá
têm forte presença da agroindústria e dos serviços e, em Foz do Iguaçu,
sobressaem às atividades ligadas ao turismo e à produção de energia elétrica.
Já no litoral, Paranaguá se destaca pelas atividades ligadas ao Porto.
Segundo o Ipardes, o Paraná é o maior produtor nacional de grãos,
apresentando uma pauta agrícola diversificada. A utilização de avançadas
técnicas agronômicas coloca o Estado em destaque em termos de
produtividade. A cana-de-açúcar, o milho, a soja, a mandioca e o trigo
sobressaem na estrutura produtiva da agricultura local, observando-se, em
paralelo, forte avanço de outras atividades, como a produção de frutas. Na
estrutura industrial do Estado, predominam os segmentos de veículos
automotores,
alimentos
e
refino
de
petróleo,
responsáveis
aproximadamente 58% do valor da transformação da indústria estadual.
por
16
FIGURA 01 – MAPA DO BRASIL DIVIDIDO POR REGIÃO COM ÊNFASE
PARA O ESTADO DO PARANÁ
Fonte: portuguesdobrasil.com.br
Tavares traz em sua tese a pesquisa de Chang realizada no ano de
1988 como uma das pesquisas pioneiras da descoberta sobre o sistema faxinal
do Paraná, pois aos olhos do autor:
Chang realizou uma das pesquisas pioneiras sobre os faxinais do
Paraná, portanto, fundamental para que o meio acadêmico tomasse
conhecimento dessa forma de organização social camponesa. Sendo
a pesquisa de Chang a mais abrangente sobre o tema é, portanto, a
mais divulgada e conhecida e possivelmente a mais polêmica.
(TAVARES 2008, p.447).
Os faxinais no Paraná, segundo Rocha e Martins (2007, p.209) se
caracteriza assim:
Faxinais são comunidades rurais que se estabeleceram no centro-sul
do Paraná e que se constituíram historicamente como mecanismo de
autodefesa do campesinato local buscando assegurar sua
17
reprodução social em conjunturas de crise econômica como a do
tropeirismo e durante o ciclo da erva-mate, ou seja, entre meados do
século XIX e a década de 30 do século XX. Tais comunidades
possuem formas peculiares de apropriação do território tradicional,
baseadas no uso comunal das áreas de criadouros de animais,
recursos florestais e hídricos e no uso privado das áreas de lavoura,
onde é praticada a policultura alimentar de subsistência com venda
de pequeno excedente. Baseados em normas de conduta e de uso
ambiental próprias, sobretudo na combinação de uso comum e
privado dos recursos naturais, os faxinais são considerados uma
forma de organização camponesa diferenciada no sul do país.
(ROCHA, MARTINS, 2007, p.209)
No estado do Paraná segundo Silva (2005) a distribuição de faxinais é
assim:
14 faxinais na região de Guarapuava (...) nos municípios de
Prudentópolis, Turvo e Pinhão (...) 15 faxinais na região de Irati (...)
nos municípios de Rebouças, Mallet, Rio Azul e Inácio Martina (...) 02
faxinais na região de Pitanga (...) no município de Boa Ventura de
São Roque (...) 03 faxinais na região de Ponta Grossa, Imbituva e
Imbaú (...) 03 faxinais na região de União da Vitória (...) situados nos
municípios de São Mateus e Antônio Olinto (...) e 07 faxinais na
região de Curitiba (...) situados nos municípios de Mandirituba e
Quitandinha (SILVA, 2005, p. 42).
FIGURA 2 – MAPA DE LOCALIZAÇÃO DE ALGUMAS REGIÕES QUE
POSSUEM O SISTEMA FAXINAL NO ESTADO DO PARANÁ
Fonte: https://www.google.com.br
18
2.2.1 A possibilidade de reconhecimento do Faxinal de Postinho em
Tijucas do Sul
O município de Tijucas de Sul tem a sua economia voltada
principalmente para agricultura e reflorestamento, possui poucas indústrias, um
comércio pequeno, mas estável, cerca de 30 haras (devido ao clima propício
para a criação de cavalos) e um potencial para o ecoturismo e o turismo rural.
Vide figura 2.
FIGURA 03 – MAPA DE LOCALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE TIJUCAS DO
SUL EM RELAÇÃO AO ESTADO DO PARANÁ
Município de Tijucas do Sul
Fonte: IPARDES, 2015.
O munícipio de Tijucas do Sul é eminentemente rural e é uma das
cidades mais antigas do estado do Paraná, porém teve sua emancipação
somente no ano de 1951. Tijucas do Sul foi palco de um marco histórico e
19
significativo no cenário sociopolítico paranaense, por meio da Revolução
Federalista, na qual seu povo lutou bravamente por seus ideais e na defesa de
seu território.
Segundo o censo do IBGE de 2010 o município de Tijucas do Sul tem
aproximadamente 14.537 habitantes distribuídos entre 44 comunidades e
dentre elas, a comunidade de Postinho que apresenta algumas das
características do sistema faxinal, como o criadouro livre e comunitário de
animais, a mão de obra familiar na subsistência das famílias, o respeito pelas
tradições religiosas e a preservação das matas de araucária.
O pesquisador Tavares traz em sua tese de doutorado a seguinte
definição do sistema faxinal:
Formação social tipicamente camponesa, silvo-agro-pastoril, com
tradição secular de terras de uso comum, independente da
propriedade ser privada ou não, que constrói, mantém e reconstrói
seu território em uma combinação de três elementos inseparáveis (...)
1. Terras de uso comum no criadouro comunitário ou comumterras de criar e viver (...) 2. Cercas das terras de uso comum no
criadouro comunitário ou comum- delimitam o criadouro das terras
agrícolas (...) terras agrícolas- majoritariamente de propriedade
privada e posses individuais (2008, p.573 – 574, grifos do autor).
Nesse momento podemos articular que as particularidades presentes na
descrição da tradição faxinalense é algo tipicamente encontrado na região do
Centro-Sul do Paraná, tal qual apresenta o uso coletivo das terras de criar, a
mão de obra familiar nas questões agrícolas, à crença na religiosidade e
principalmente a preservação das matas de araucária.
Segundo uma pesquisa realizada no ano de 2005 por Souza, com
relação ao mapeamento social dos faxinais no Estado do Paraná juntamente
com a rede Puxirão a qual trata do reconhecimento de comunidades
tradicionais, discorrem sobre a hipótese de haver 9 comunidades tradicionais
de faxinal no município de Tijucas do Sul, contudo em nosso trabalho
apresentamos as peculiaridades da comunidade de Postinho que traz a
identidade de um povo com gênese tipicamente camponesa .
Na dissertação realizada por Cruz tendo como tema a reestruturação do
Projeto Político-pedagógico das escolas municipais localizadas no campo no
município de Tijucas do Sul, no desenvolvimento de sua pesquisa do Mestrado
20
em Educação pela Universidade Tuiuti do Paraná no ano de 2014, ressalta a
pertinente questão exposta em torno da comunidade de Postinho. Segundo a
autora a comunidade de Postinho tem a seguinte particularidade:
Uma comunidade que apresenta características de um faxinal. Os
moradores preservam costumes típicos culturais na comunidade,
embora haja a degradação da mata nativa por meio da plantação de
pinus e eucalipto, através das grandes empresas reflorestadoras. Há,
ainda, na comunidade criadouro livre (CRUZ, 2014, p.133).
Diante da descrição de Cruz apresentamos que com o passar do tempo
comunidade do Postinho vem sofrendo algumas interferências no âmbito
ecológico, pois segundo CORONA e SILVA que no ano de 2010 realizaram
uma pesquisa pela Universidade Federal do Paraná UFPR apresentando como
o tema de trabalho, “O global e o local: as empresas reflorestadoras e a
comunidade cabocla de Postinho na Região Metropolitana de Curitiba”, tendo
como
objetivo principal do referido trabalho a
analise no processo de
mudança vivenciado pelos agricultores familiares desta comunidade bem como
o confronto com as pressões e limitações que interferem na permanência em
quanto formato social e cultural desta população. Os desafios mencionados por
elas, é de que os moradores desta comunidade defrontam-se com as
empresas reflorestadoras
que
estão
estabelecidas na
comunidade à
aproximadamente 20 anos, a qual priorizam a plantação de pinus e eucalipto,
sofrendo fortes alterações ambientais e assim extinguindo as características da
vegetação natural desse local e o trabalho das famílias que residem nesta
área.
Essa dinâmica coloca em risco as condições no âmbito ecológico e
social dos moradores, pois a localidade do Postinho sofre com as alterações
ambientais por meio da retirada da mata nativa e o plantio de eucalipto e pinus,
embora alguns dos moradores sustentem suas famílias com o árduo trabalho
braçal exercido para essas empresas, não percebem que as mesmas estão
explorando e ajudando na desapropriação de uma cultura e da desagregação
de suas famílias por exigir a mão de obra barata e um rendimento de serviço.
2.2.2 O Postinho e sua característica como faxinal
21
A
comunidade
faxinalense
de
Postinho
está
localizada
a
aproximadamente 25 quilômetros da sede do Município de Tijucas do Sul
estado do Paraná, faz divisa com Rodeio de Santa Cruz, Serra do Quiriri que
pertence ao estado de Santa Catarina, Piraí, Taquaroca e Inga pertencentes ao
estado do Paraná, vide figura 04.
FIGURA 04 – MAPA DO MUNICÍPIO DE TIJUCAS DO SUL, LOCALIZANDO A
COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO
Fonte: Câmara Municipal de Tijucas do Sul.
22
FIGURA 05 – VISUALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DA SEDE DE TIJUCAS DO SUL
A COMUNIDADE DE POSTINHO
Fonte: Google Earth
Segundo entrevistas com os moradores da comunidade de PostinhoPR, este nome surgiu em meados do ano de 1930 por meio da instalação de
um posto fiscal que cubava caminhões carregados de madeira, instalado na
divisa entre os estados do Paraná e de Santa Catarina, na qual a população
referia-se a Postinho com a intenção de identificar onde se localizava o posto
fiscal que controlava a entrada e saída de caminhões madeireiros.
Simões (2009 p. 12) descreve as comunidades faxinalenses do estado
do Paraná como uma realidade concreta e contemporânea, fato esse
observado na comunidade de Postinho, pois a mesma possui o uso coletivo da
terra para a criação de animais, o plantio para subsistência familiar, a
preservação das matas de araucária, a realização de festas tradicionais com
comidas típicas, a prática de benzimentos e a crença das ervas medicinais na
cura de doenças.
Douglas Grzebieluka realizou uma pesquisa entorno das comunidades
faxinais na tese de Mestrado em Gestão do Território pela Universidade
Estadual de Ponta Grossa com o tema do referido trabalho: Comunidades de
faxinal e suas dinâmicas sócio-espaciais: da formação à desagregação de uma
tradição no município de Tibagi (PR) no ano de 2010, o qual o autor descreve
23
que o modo de vida faxinalense torna-se reconhecido como modo de vida
tradicional a partir do ano de 2005, inserindo-se na luta pelos direitos de suas
vivencias. A partir deste momento esse povo leva a nomenclatura de
comunidade faxinalense.
Grzebieluka (2010, p.47) destaca em seu trabalho o autor Löwen Sahr
que traz algumas reflexões entorno das características das comunidades
faxinalenses:
Associam a pecuária, a agricultura, e o extrativismo, num sistema
singular; Partilham o chão, ou seja, as terras do criadouro são de uso
comum; Criam de forma coletiva animais de pequeno e grande porte
soltos e misturados; Praticam uma agricultura de subsistência com
instrumentos tradicionais (enxada, tração animal); Partilham as
sementes, criações, produtos através de trocas; Praticam uma cultura
de extrativismo (erva-mate, madeira, pinhão); Desenvolvem uma
atividade agroflorestal e prezam pela conservação da biodiversidade;
Possuem uma forte convivência e integração com o meio ambiente;
Possuem uma historia e uma cultura própria; Preservam e respeitam
as suas tradições, os seus costumes e a sua cultura (festas, rezas);
Praticam uma religiosidade popular; Apresentam uma vida
comunitária, solidaria e de união; Integram em sua convivência
famílias com terra e famílias que não tem terra; Possuem normas e
fazem acordos baseados na cultura e tradição; Trabalham de forma
solidária em Multirões/Puxirões; Partilham os bens, os serviços e os
conhecimentos; Lutam pela sobrevivência; Possuem alegria de viver,
amor a natureza, liberdade, esperança, confiança e união.
(GRZEBIELUKA, 2010, p.47. Apud SAHR, 2005, p.57).
Uma das características marcante do sistema faxinal é o criadouro livre
e comunitário dos animais, em que os moradores deixam os animais de
pequeno e grande porte soltos em terras de criar, buscando na natureza seu
alimento, este tipo de particularidade ocorre pela confiança existente entre os
moradores destas comunidades, pois, Grzebieluka, diz que:
A utilização de espaços coletivos para a criação de animais em
ambiente da Floresta com Araucária é a característica que diferencia
os Faxinais das outras comunidades tradicionais. Este principio é
resultante da relação de confiança entre os faxinalenses
(GRZEBIELUKA, 2010, p. 47-48)
24
FIGURA 6 - CRIADOURO LIVRE DE ANIMAIS DE GRANDE PORTE NA
COMUNIDADE DE POSTINHO
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 7 - CRIADOURO LIVRE DE ANIMAIS DE PEQUENO PORTE NA
COMUNIDADE DE POSTINHO
Fonte: As autoras, 2014.
As comunidades faxinalenses destacam-se pelos cenários encontrados
no meio rural os quais possuem aspectos peculiares da tradição camponesa ,
contendo estradas de terra, mata-burro, porteiras, casas de madeira, igrejas,
bares, escola, comércio de pequeno porte, tanques de peixe, monjolo e hortas
aos arredores das casas, deste modo Grzebieluka destaca que:
25
Nas comunidades rurais integradas ao Sistema Faxinal, encontramos
uma paisagem rural típica com a presença de estradas de terra,
porteiras, mata-burros, casas de madeira, casa de comercio, bares,
igrejas, escolas, e barracões comunitários. Encontram-se também
tanques de peixe, moinho, monjolos, fornos de pedra (...)
(GRZEBIELUKA, 2010, p. 53-54).
FIGURA 8 - ESTRADA DE TERRA NA LOCALIDADE FAXINALENSE DE
POSTINHO
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 9 - MATA BURRO NA LOCALIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO
Fonte: As autoras, 2014.
26
As comidas típicas deste povo é um diferencial presente na comunidade,
pois na maioria são feitas do cultivo e de recursos próprios contidos na
comunidade como o leite tirado da vaca e transformado em queijo, o mel
extraído das abelhas, os ovos, os legumes e verduras das hortas.
FIGURA 10 – HORTA DA COMUNIDADE FAXINALENSE DO POSTINHO
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 11 – ALGUNS ALIMENTOS PRODUZIDOS PELOS MORADORES
DA COMUNIDADE FAXINALENSE DO POSTINHO
Fonte: As autoras, 2014.
27
FIGURA 12 – MORADORA DA COMUNIDADE FAXINALENSE DO POSTINHO
EM SUAS ATIVIDADES TRADICIONAIS.
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 13 – MORADORA DA COMUNIDADE FAXINALENSE DO POSTINHO
EM SUAS ATIVIDADES TRADICIONAIS.
Fonte: As autoras, 2014.
28
FIGURA 14 – MORADORA DA COMUNIDADE E ALGUNS ALIMENTOS
PRODUZIDOS NA COMUNIDADE: MEL, QUEIJO, BOLACHA CASEIRA E
DOCE DE ABÓBORA
Fonte: As autoras, 2014.
Na comunidade do Postinho as pessoas cultivam os alimentos,
preparam as terras, plantam e colhem os produtos utilizando a mão de obra
familiar e a utilização da tração animal como a carroça, arado, cultivador,
grade, zorra, entre outras.
FIGURA 15 – FAMÍLIA INDO PARA A ROÇA FAZER A COLHEITA DE MILHO
NA COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO
Fonte: As autoras, 2014.
29
FIGURA 16 – GRADE E ZORRA INSTRUMENTOS UTILIZADOS NO PLANTIO
DOS ALIMENTOS.
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 17 – GRADE E ZORRA INSTRUMENTOS UTILIZADOS NO PLANTIO
DOS ALIMENTOS
Fonte: As autoras, 2014.
O monjolo é um instrumento típico de muita utilidade para o uso dos
moradores da comunidade faxinalense de Postinho o qual serve para a
produção de farinha de milho. A senhora Otilia Oliveira Biscaia moradora da
30
comunidade tem 91 anos e ainda costuma fazer a farinha de milho para o
consumo da família, segundo o relato da senhora Otilia Biscaia:
Pa pode faze a farinha é perciso debuia o mio e aventa ele na
sururuca que é um tipo de penera dai dexa de moio no demoiador 24
hora, dai põe pa pindoca no munjolo por 1 hora depois penera a
farinha e leva pa torra no forno dai ta pronta pa gente come. (sic)
FIGURA 18 - OTILIA OLIVEIRA BISCAIA MORADORA DA COMUNIDADE
FAXINALENSE DE POSTINHO FAZENDO FARINHA DE MILHO
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 19 – MONJOLO INSTRUMENTO UTILIZADO NO PREPARO DA
FARINHA DE MILHO.
Fonte: As autoras, 2014.
31
FIGURA 20 – SURURUCA, PENEIRA UTILIZADA NA PRODUÇÃO DA
FARINHA DE MILHO.
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 21 – CAIXA DE CONCRETO UTILIZADA PARA DEIXAR O MILHO
EM GRÃO SUBMERSO NA ÁGUA PARA AMOLECER
Fonte: As autoras, 2014.
Os moradores da comunidade faxinalense de Postinho ainda possuem a
tradição de seus antepassados como benzimentos, simpatias e chás na busca
pela cura das doenças. Esses benzimentos são feitos por pessoas mais velhas,
onde seus ensinamentos são passados de geração para geração. Grzebieluka
assinala os seguintes fotos a cerca das crenças dos faxinalenses:
A crença em Benzedeiras, sempre esteve presente entre os
moradores das comunidades rurais. A distância, aliada a falta de
transporte, fazia das benzedeiras pessoas de destaque nas
32
comunidades. Sempre que surgiam problemas de saúde com as
crianças, procurava-se uma benzedeira para que ela fizesse um
benzimento e posteriormente receitasse um chá. Muitos moradores
mantêm em seu quintal remédios caseiros como a hortelã, arruda e
outras (GRZEBIELUKA, 2010, p.113).
FOTO 22 - DONA MARIA DAS GRAÇA MANTINS MORADORA DA
COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO QUE AUXILIA E REALIZA OS
BENZIMENTOS E TRATAMENTOS COM ERVAS MEDICINAIS
Fonte: As autoras, 2014.
Dona Maria da Graça Martins é moradora da comunidade faxinalense de
Postinho e utiliza-se muito dos recursos naturais para curar algumas doenças e
fazer seus benzimentos segundo ela:
Eu uso muito as erva pa faze chá pa cura as pessoa, aprendi uns
bensimento com minha família e hoje ajudo aqueles que presiza, tem
muita gente que desconhece as coisa que eu tenho no quintar, tem
muita erva pa tudo quanto e dor (sic)
As atividades culturais presentes na comunidade faxinalense do
Postinho são fortemente ligadas com a religiosidade dos moradores, uma das
principais tradições na contemporaneidade deste povo é a cavalgada típica das
festas da igreja católicas. A festa junina é também uma questão tradicional e
religiosa que reverencia aos Santos. Encontram-se ainda as missionárias que
são responsáveis por levar nas casas dos moradores a Santa Nossa Senhora
de Fátima que é a Padroeira da comunidade, além disso, realizam o terço com
as famílias mais próximas em forma de agradecimento.
33
No que tange a religião católica, é realizada uma vez por mês a missa
com a presença de um padre, o qual se desloca da sede do município de
Tijucas do Sul até a localidade e aos domingos os ministros das comunidades
presidem as rezas com na comunidade.
Uma questão de suma importância é o respeito à diversidade religiosa,
pois na comunidade do Postinho encontra-se também a religião evangélica que
possui sua doutrina de acordo com o estatuto de cada igreja e suas crenças,
perante esta tradição religiosa é fortemente presente os cultos e as vigílias que
são dias de oração, reflexão e louvor.
FIGURA 23 – IGREJA CATÓLICA DA COMUNIDADE FAXINALENSE DE
POSTINHO.
Fonte: As autoras, 2014.
34
FIGURA 24 – IGREJAS EVANGÉLICAS
FAXINALENSE DE POSTINHO.
DA
COMUNIDADE
DE
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 25 - CAVALGADA TÍPICA
TRADICIONAIS DA COMUNIDADE.
Fonte: As autoras, 2014.
DAS
FESTAS
RELIGIOSAS
35
FIGURA 26 - FESTA JUNINA
FAXINALENSE DE POSTINHO
.
TRADICIONAIS
DA
COMUNIDADE
Fonte: As autoras, 2014.
FIGURA 27 - MORADOR DA COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO
VACINANDO OS ANIMAIS.
Fonte: As autoras, 2014.
36
FIGURA 28 - LUIZ IDINAR PEREIRA DE LIMA E LIVINO FURTADO
MORADORES DA COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO ASSANDO
COSTELA DE FOGO DE CHÃO, COMIDA TÍPICA DAS FESTAS DA IGREJA
CATÓLICA DA COMUNIDADE.
Fonte: As autoras, 2014.
Os moradores desta comunidade descreveram que a vida era simples
onde com pouco se tinha muito, pois para o cultivo e sustento da família havia
a união no trabalho, e após um longo e cansativo dia de trabalho nas roças
prevalecia a roda de conversa na varanda das casas com os vizinhos e ainda
apreciando um chimarrão e uma “pura branquinha” (cachaça). Com relação ao
plantio existia ainda o chamado “Pixirum” que era um grupo de pessoas que
trocavam dias de serviços nas lavouras, e após o dia de trabalho o dono do
terreno que se estava trabalhando oferecia um jantar com muita bebida e até
um sanfoneiro para tocar um “bailinho” em forma de agradecimento.
De acordo com o Senhor Alcindo Pereira de Lima morador do Faxinal
da Comunidade do Postinho:
Nos dia de hoje ainda agente ve as familha junto trabalhando na
lavora e i passia de tarde na casa do vizinho pa prozia um pouco, e o
“pixirum” não existe mais. Os bicho andum sorto por ai e agente so
cerca o pedaço de terra que pranta. Mais a vida desse povo já foi
mior porque hoje não da de vive so da lavora, presizamo busca
arguma coisa que de mais lucro. (sic).
37
FIGURA 29 – ALCINDO PEREIRA DE LIMA E SEU FILHO ANTÔNIO ADEMIR
PEREIRA DE LIMA MORADORES DA COMUNIDADE FAXINALENSE DE
POSTINHO.
Fonte: As autoras, 2014.
O pinheiro é uma árvore nativa peculiar do estado do Paraná que é
considerado símbolo do estado e das comunidades tradicionais de faxinal, a
preservação do ecossistema perante os moradores do faxinal esta inteiramente
ligada com a conservação de paisagens naturais do ambiente, que abrilhantam
o dia-a-dia das pessoas que habitam esse belo lugar.
Os moradores da comunidade faxinalense do Postinho retiram dos
pinheiros o pinhão para o consumo próprio e a vendo como forma do aumento
da renda familiar. Outra árvore nativa que auxilia os moradores no aumento da
renda familiar é a erva mate que é uma espécie encontrada em meio às matas
de araucária pelo fato de ser beneficiada pela projeção das sombras das
araucárias.
38
FIGURA 30 – PRESERVAÇÃO DO ECOSSISTEMA E DAS MATAS DE
ARAUCÁRIA NA COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO
Fonte: As autoras, 2014.
Perante a pesquisa realizada na comunidade de Postinho, além do
favorável fato de sermos moradoras desta localidade é fácil descrevê-la como
sendo um privilégio das pessoas que nela habitam, pois a vida é simples e
tranquila, a felicidade é encontrada nas pequenas coisas da vida, como um
simples cumprimento entre os moradores, o respeito mútuo e a solidariedade é
presente entre as pessoas.
Como mostra o referente trabalho a comunidade faxinalense de Postinho
apresenta inúmeros aspectos do sistema faxinal, embora este modo de vida
defronte-se com uma série de conflitos, iniciando pelo fato da dificuldade
encontrada pelos jovens em dar continuidade aos estudos e a falta de emprego
aos moradores percebe-se a importância da manutenção e preservação desta
tradição, pois citamos abaixo o Decreto Estadual nº 3446/1997 que descreve o
sistema faxinal como um modo de vida camponesa reconhecido pelas políticas
públicas:
Art.1º - Ficam criadas no Estado do Paraná, as Áreas Especiais de
Uso Regulamentado - ARESUR, abrangendo porções territoriais do
Estado caracterizados pela existência do modo de produção
denominado “Sistema Faxinal”, com os objetivos de criar condições
para a melhoria da qualidade de vida das comunidades residentes e a
manutenção do seu patrimônio cultural, conciliando as atividades
agrosilvopastoris com a conservação ambiental, incluindo a proteção
da Araucaria angustifolia (pinheiro-do-paraná).
§ 1º - Entende-se por Sistema Faxinal: o sistema de produção
camponês tradicional, característico da região Centro-Sul do Paraná,
39
que tem como traço marcante o uso coletivo da terra para produção
animal e a conservação ambiental. Fundamenta-se na integração de
três componentes: a) produção animal coletiva, à solta, através dos
criadouros comunitários; b) produção agrícola - policultura alimentar
de subsistência para consumo e comercialização; c) extrativismo
florestal de baixo impacto - manejo de erva-mate, araucaria e outras
espécies nativas.
§ 2º - A ARESUR, na perspectiva do desenvolvimento do Sistema
Faxinal, observará as disposições legais aplicáveis as Áreas de
Proteção Ambiental - APAs, no que couber.
§ 3º - O Secretário do Estado do Meio Ambiente e dos Recursos
Hídricos definirá, através de ato administrativo apropriado, as
ARESUR, caso a caso, por faxinal, contendo no mínimo:
denominação, superfície e limites geográficos, diretrizes para
conservação ambiental e instrumentos de apoio como: diagnóstico,
justificativas, mapa e memorial descritivo.
Art.2º - Só poderão ser registrados no Cadastro Estadual de
Unidades de Conservação - CEUC, os faxinais que atenderem ao
conceito contido no parágrafo 1º do artigo 1º.
§ 1º - Os faxinais registrados no CEUC, deverão ser anualmente
avaliados e receberão tratamento diferenciado, levando-se em conta,
dentre outras, variáveis como: densidade populacional, qualidade de
vida das populações residentes, organização e participação
comunitária e nível de comprometimento e empenho dos municípios
para o desenvolvimento social e econômico dos mesmos.
§ 2º - Somente poderão ser consideradas para efeito dos benefícios
previstos na Lei Complementar Estadual nº 59/91 e demais normas
pertinentes, as áreas de criadouros comunitários dos faxinais
registrados no CEUC, diferenciados por estágios de desenvolvimento.
§ 3º - Tanto a criação, quanto o benefício financeiro passível de ser
creditado, de acordo com o previsto na Lei Complementar Estadual nº
59/91, poderão ser feitos a partir de manifestação de interesse do
município, devendo para tal além da solicitação, apresentar proposta
negociada com as comunidades, das ações a serem desenvolvidas, a
partir, dentre outras, das variáveis a serem avaliadas anualmente,
conforme previsão contida no § 1º, deste artigo.
Art.3º - As Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento e
da Cultura, desenvolverão programas e projetos específicos visando
atingir os objetivos previstos no artigo 1º do presente Decreto.
Art.4º - O presente Decreto será regulamentado no que for necessário
ao seu perfeito cumprimento.
Art.5º - Este Decreto entra em vigor nesta data, revogando-se as
disposições em contrário (PARANÁ, 1997)
Ao observarmos as preocupações citadas pelos moradores da
comunidade do Postinho e ao analisar o decreto 3446/1997 percebe-se a
importância do reconhecimento e a manutenção deste modo peculiar de vida
encontrado nos faxinais, o qual é de extrema importância para as gerações
40
futuras no que diz respeito à preservação dos fatos históricos, culturais,
ambientais e sociais dos sujeitos do campo.
2.3 A EDUCAÇÃO DOS JOVENS DA COMUNIDADE TRADICIONAL FAXINALENSE
DE POSTINHO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS QUE VIABILIZAM O DIREITO A
“IGUALDADE”.
A pauta da questão educacional é de suma importância e um dos
fatores decorrente da desagregação deste povo, diz respeito à condição do
acesso à escolarização, pois na comunidade existe uma escola municipal que
atende as crianças que estão nos anos iniciais da Pré-escola I e II ao 5º ano do
ensino fundamental, e para aqueles que desejam dar continuidade a vida
escolar é preciso se deslocar para a sede do Município de Tijucas do Sul o qual
se localiza á aproximadamente cerca de 25 quilômetros de distância e aqueles
que pretendem ir em busca de uma especialização necessitam se deslocar
para a cidade de São José dos Pinhais que da aproximadamente 70
quilômetros de distância da comunidade, portanto não conseguem continuar
morando nesta comunidade e precisam ir embora para casa de parentes ou
pagar aluguel em uma cidade mais próxima.
Segundo Cruz retrata a dificuldade encontrada pelos jovens em dar
continuidade a vida escolar após a conclusão do 5º ano do ensino fundamental:
É uma comunidade bastante carente e com condições econômicas
extremamente precárias. É considera uma localidade de difícil
acesso, estrada de chão e quando chove fica difícil a locomoção dos
moradores e alunos. Os moradores questionam sobre a distância
para os alunos estudarem na sede (6º ao 9º ano e ensino médio) e
pela falta de políticas públicas de incentivo a agricultura camponesa
(CRUZ, 2014, p.135).
Ao analisarmos o questionamento de Cruz e realizarmos uma pesquisa
com aproximadamente 20 jovens moradores da comunidade de Postinho o
gráfico abaixo retrata a realidade dos jovens que lutam por uma educação do
campo de qualidade, tal qual percebemos ainda que este direito não foi
conquistado pela falta de políticas públicas que garantam uma educação digna
aos povos do campo.
41
GRÁFICO
1
-
REALIDADE
DA
VIDA
ACADÊMICA
DOS
JOVENS
MORADORES DA COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO.
6%
17%
Alunos que concluiram o ensino
médio
Transferidos
Alunos que não concluiram o
ensino médio
77%
Fonte: Organizado pelas autoras, 2014.
É neste pensamento que Caldart descreve que a Educação precisa ser no
e do campo. No: pois o povo tem o direito de ser educado no lugar onde vive;
Do: o povo tem direito a uma educação pensada desde o lugar em que vive e,
sobretudo com a sua participação vinculada em sua cultura e suas
necessidades (CALDART, 2002, p.18).
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica tratam da
educação do campo como algo inerente à própria sociedade, algo a ser
valorizado e tratado com a deferida importância.
A Educação do Campo, tratada como educação rural na legislação
brasileira, tem um significado que incorpora os espaços da floresta,
da pecuária, das minas e da agricultura, mas os ultrapassa ao acolher
em si os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas. O
campo, nesse sentido, mais do que um perímetro não urbano, é um
campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres
humanos com a própria produção das condições da existência social
e com as realizações da sociedade humana (BRASIL, 2013, p.267).
Ainda sobre a educação do campo e sua importância dentro do sistema
educacional brasileiro, a Resolução CNE/CEB 1 de 3 de abril 2002. (Diário
Oficial da União, Brasília, 9 de abril de 2002. Seção 1, p. 32) traz no artigo 1º:
42
Parágrafo único. A identidade da escola do campo é definida pela sua
vinculação às questões inerentes a sua realidade, ancorando-se na
temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na memória
coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia
disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de
projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à
qualidade social da vida coletiva no país. (BRASIL, 2013, p.282)
Perante os descritos acima percebemos que o governo federal dispõe de
leis e diretrizes para que a educação do campo seja entendida como algo
essencial a sociedade e a preservação de suas tradições e respeitando as
raízes do povo brasileiro, porém na maioria das vezes a realidade vivenciada
pelas comunidades tradicionais é o oposto ao que se esta enfeitada nas leis e
nos discursos políticos, pois como discorre Simões (2009, p.43) muitos dos
direitos desta população são negados, combatidos, marginalizados e o Estado
contribui com a injustiça social perante o homem do campo.
GRÁFICO 2 - PRETENSÃO DOS JOVENS DE CONTINUAR VIVENDO NA COMUNIDADE
FAXINALENSE DE POSTINHO.
20
18
16
14
Alunos que pretendem
permanecer morando na
localidade
12
10
Alunos que não pretendem
permaner na comunidade
8
6
4
2
0
Fonte: Organizador pelas autoras, 2014.
Segundo o resultado apontado no gráfico 2 que foi obtido por meio de
questionários respondidos pelos jovens da comunidade do Postinho foi
43
possível compreender o quanto é preocupante a visão dos entrevistados, pois
o sentimento de pertença desses sujeitos está corroído pelo sentimento de
descaso e abandono perante a sociedade.
Os jovens trazem consigo uma angústia gerada pela falta de recursos
essenciais para a permanência, o qual garanta uma vida digna e de qualidade
aos moradores do campo, dentre alguns dos questionamentos fazem-se
presentes: a falta de emprego, a dificuldade de acesso à educação superior, os
cursos técnicos e a tecnologia.
Segundo a jovem moradora da comunidade faxinalense de Postinho
Karoline Katzmann, que hoje tem 14 anos de idade e cursa o 9º ano do ensino
fundamental na sede do município de Tijucas do Sul, descreve as dificuldades
de permanecer morando na comunidade de Postinho:
Pretendo ir embora quando estiver na hora de cursar uma faculdade,
pois aqui faltam oportunidades de estudo e emprego, as dificuldades
são muitas desde a falta de internet para pesquisas até a falta de
empregos e cursos profissionalizantes (sic).
FIGURA
31
–
KAROLINE
KATZMANN
COMUNIDADE FAXINALENSE DE POSTINHO.
Fonte: As autoras, 2014.
JOVEM
MORADORA
DA
44
O sentimento que os jovens moradores da comunidade faxinalense de
Postinho possuem em relação a dar continuidade aos estudos é descrito por
Caldart no texto A Escola do Campo em Movimento como uma visão de um
circulo vicioso imposta pelas elites brasileiras:
Um dos entraves ao avanço da luta popular pela educação básica do
campo é cultural. As populações do campo incorporam em si uma
visão que é um verdadeiro círculo vicioso: sair do campo para
continuar a ter escola, e ter escola para poder sair do campo. Ou
seja, uma situação social de exclusão, que é um dos desdobramentos
perversos da opção de (sub) desenvolvimento do país, feita pelas
elites brasileiras, acaba se tornando uma espécie de bloqueio cultural
que impede o seu enfrentamento efetivo por quem de direito. As
pessoas passam a acreditar que para ficar no campo não precisam
mesmo de “muitas letras” (CALDART, 2011, p.110-111).
A população do campo tem uma grande dificuldade em dar continuidade
aos estudos, pois como mostra a pesquisa realizada com professores da rede
educacional do município de Tijucas do Sul, em sua grande maioria optaram
por fazer faculdade com ensino a distância que por sua vez é uma alternativa
que garante o acesso e a permanência dos mesmos.
Observe o gráfico 3:
GRÁFICO 3 – FORMA COM QUE OS PROFESSORES DO CAMPO DO MUNÍCIO
DE TIJUCAS DO SUL REALIZARAM SUA GRADUAÇÃO.
Tijucas do Sul:
12%
Graduação por ensino
presencial
Graduação por ensino a
distância
88%
Fonte: As autoras, 2014.
45
Segundo os entrevistados esta opção feita pela maioria é devido ao
difícil acesso a faculdades que exigem a presença diária e a utilização da
internet como meio de comunicação entre professores e alunos, pois nas
comunidades do município de Tijucas do Sul a internet é um meio de
comunicação utilizado pela minoria das pessoas.
Caldart traz sua contribuição perante a permanência das pessoas do
campo e o acesso à educação:
O campo é um lugar de vida, onde as pessoas podem morar,
trabalhar, estudar com dignidade de quem tem o seu lugar, a sua
identidade cultural. O campo não é só o lugar da produção
agropecuária e agroindustrial, do latifúndio e da grilagem de terras. O
campo é espaço e território dos camponeses e quilombolas. É no
campo que estão as florestas, onde vivem as diversas ações
indígenas. Por tudo isso, o campo é lugar de vida e sobre tudo de
educação (CALDART, 2011, p. 137).
46
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo desse trabalho foi retratar a realidade vivenciada pelos
moradores da comunidade tradicional do Postinho que por sua vez apresenta
um aporte significativo para a compreensão da realidade e das dificuldades
enfrentadas pelos povos das comunidades faxinalenses. Neste sentido a
intenção foi de trazer reflexões a respeito do modo de vida dos faxinais e as
características presentes na comunidade faxinalense do Postinho, as
dificuldades que este povo enfrenta para continuar morando nesta localidade, a
falta de emprego que garanta o sustento das famílias e a vida digna desses
sujeitos.
O campo é um lugar de partilha em que estão presentes os valores
sociais, econômicos e culturais de um retrato de vida simples mais com muitas
contribuições perante a história deste país. Todavia, os problemas enfrentados
pelos moradores das comunidades faxinalenses impõem aos moradores um
ritmo diferente de vida e uma cultura em declínio, que acaba não resistindo as
fortes pressões de uma sociedade capitalista.
Visto que as políticas públicas voltadas aos moradores do campo e
respectivamente do pequeno produtor rural são falhas, deixam estas
comunidades a mercê da própria sorte, facilitando assim os conflitos
decorrentes da falta de apoio do poder público, o qual gera a desagregação
constante desta população.
Outra questão inerente ao campo é que mais que um perímetro não
urbano o campo é um espaço de vivências educativas e culturais entre os
sujeitos e a terra. É pela educação dos Jovens e a dificuldade enfrentada por
eles que se deve pensar em uma educação que atenda as especificidades
destes sujeitos.
Na comunidade faxinalense de Postinho é comum os jovens terem que
se deslocar da comunidade onde vivem para assim dar continuidade a vida
escolar, percorrendo aproximadamente cerca de 25 Km de distância em
estradas de chão até a sede do município de Tijucas do Sul, ou em muitas
situações acabam deixando suas famílias e indo morar com parentes nos
centros urbanos para ingressar na faculdade em busca de uma vida menos
sofrida e mais remunerada.
47
Esta pesquisa visou compreender a realidade de povos tradicionais
frente a diversas determinações, também, gostaríamos não apenas de concluir
uma tarefa acadêmica, mas sim buscar respostas satisfatórias que amenize a
angústia que os moradores trazem em seu olhar, na busca de uma vida melhor
e permanente nesta localidade.
48
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Decreto nº 7.352, de 4 de novembro de 2010.
Dispõe sobre a política de educação do campo e o Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária - PRONERA. Diário Oficial da União, Poder
Legislativo, Brasília, DF, 4 de novembro de 2010.
BRASIL. Ministério da Educação. Resolução CNE/CEB nº 1, de 3 de abril de
2002. Institui Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do
Campo. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 9 abr. 2002.
BRASIL. Ministério da Educação. Resolução nº 2, de 28 de abril de 2008.
Estabelece
diretrizes
complementares,
normas
e
princípios
para
o
desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação Básica do
Campo. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 29 de abril
2008.
BRASIL. Panorama da educação do campo. Brasília, DF: Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2007.
BRASIL. Referências para uma Política Nacional de Educação do Campo:
Cadernos de subsídio. Brasília, DF, 2004.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da
Educação Básica. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Currículos e
Educação Integral. Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.
CALDART, R. S. Elementos para construção de um projeto político e
pedagógico da educação do campo. In: MOLINA, M. C.; JESUS, S. M. S. A.
(Org.). Por uma educação do campo: Contribuições para a construção de um
projeto de educação do campo. Brasília, D.F, Articulação nacional por uma
educação do campo, 2004.
49
______.Por uma Educação do Campo: traços de identidade em construção.
KOLLING, E. J.; CERIOLI, P. R.; CALDART, R. S. (Orgs.). Por Uma Educação
do Campo: A Educação do Campo: identidade e políticas públicas. Brasília,
2002.
_______. Por uma Educação do Campo: Traços de Uma Identidade em
Construção. In: ARROYO, M. G.; _______; MOLINA, M. C. (Org). Por uma
educação do campo. Petrópolis, RJ. Vozes, 2011. p. 149-158.
CHANG, M. Y. Sistema faxinal: uma forma de organização camponesa em
desagregação no Centro-Sul do Paraná. Londrina, IAPAR, 1988. 124p.
CRUZ, R. A.. Reestruturação do projeto político–pedagógico das escolas
municipais localizadas no campo no município de Tijucas do Sul. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Universidade Tuiuti do Paraná, Curitiba, 2014.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 32 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1987.
GOOGLE EARTH. Visualização geográfica do município do Postinho.
Disponível em < http://www.google.com.br/intl/pt-BR/earth/> acesso 17 maio
2015.
GRZEBIELUKA. D. Comunidades Faxinais e suas dinâmicas sócio-espaciais:
da formação à desagregação de uma tradição no município de Tibagi (PR).
Dissertação de Mestrado (Gestão do Território) – Universidade Estadual de
Ponta Grossa, Ponta Grossa, 2010.
IPARDES. Perfil do Município de Tijucas do Sul. Disponível em: <
http://www.ipardes.gov.br/> acesso em 20 maio 2015.
50
PARANÁ. Decreto Estadual nº 3.446, de 25 de julho de 1997. Cria as àreas
Especiais de Uso Regulamentado - ARESUR no Estado do Paraná e dá outras
providências.
PREFEITURA MUNICIPAL DE TIJUCAS DO SUL. Mapa do município.
Disponível em <http://tijucasdosul.pr.gov.br/> acesso em10 abr. 2015.
ROCHA, E. P.; MARTINS, R. S. Terra e Território Faxinalense no Paraná:
notas sobre a busca de reconhecimento. Campos: Revista de Antropologia
Social. Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Curitiba:
UFPR/PPGAS, 8°ed. 2007 p. 209-212.
SIMÕES, W. Comunidades tradicionais de faxinais e gestão de políticas
públicas educacionais no estado do Paraná: compreendendo territórios e
territorialidades, Ponta Grossa, 2009.
TAVARES, L. A. Campesinato e os faxinais do Paraná: as terras de uso
comum, São Paulo, 2008.
Download

comunidade faxinalense de postinho - TCC On-line