334 Maria Helena Ochi FLEXOR propriedades, fatalmente, cairiam em suas mãos e chamava a atenção do Rei para alguma providência42. Cabrinha ou cabra era a designação dos descendentes de negro e índio43. Servia para identificar homens e mulheres. E já se falava em mestiços que, em 1794, designavam a mesma mistura de índio e negro (INVENTÁRIOS, 04/1596/2065/09). Cabra, portanto, era designação específica, pois cafusos, caribocos ou ariboco ou caboclos designavam os descendentes da mistura de branco e índio, portanto, sem relação com os africanos. Não foi constatada dominância de nenhuma das nações nos diversos ofícios. O comum era a presença de várias nações, de acordo com a chegada de novos contingentes. Em qualquer ocupação, o domínio e habilidade dos escravos se dava em vários níveis. A classificação mais genérica, dividia-os em ladinos, ou os que já dominavam a língua e costumes locais, e os boçais, que não tinham essa capacidade. Além disso, podiam ter apenas princípios de conhecimento, ser aprendiz, ter luz de ofício ou ser oficial completo ou, ainda, oficial perito, oficial pouco perito, mas jamais mestre. Os ofícios mecânicos representavam 25% do total de ocupações declaradas mais as não declaradas. Foram contados, entre os ofícios mecânicos, os carregadores de cadeira de arruar que concentrava o maior número de escravos (22%), por contar entre eles aprendizes, que se aperfeiçoavam no ofício, como os artesãos. Eram seguidos pelos oficiais de polieiros (15%), ganhadores de rua (8%), carapinas (8%), sapateiros (6%), barbeiros e sangradores (5%), carpinteiros (4%), e mais calafates, tanoeiros, cabeleireiros, cavoqueiros, padeiros, caldeireiros e alfaiates (todos com 3%) e, ainda, ferreiros, cerieiros, oleiros (todos estes com 1%)44. Foram apenas esses os ofícios mecânicos apontados entre os escravos, nos Inventários e Testamentos consultados, não ocorrendo o que Lima (1999) classifica como ofícios mais valorizados ou ofícios menos valorizados. Existiam sim, os escravos boçais, meio boçais, meio desasizados, meio oficial até 4 negras sem profissão, sarnentas e talabardeiras (INVENTÁRIOS, 04/1710/2180/06). O autor incluiu, como ocupação dos artífices, atividades que eram sub-ocupações de um outro ofício por ele indicado, como cortumador, que é atividade de corrieiro; ferrador e malhador de ferro atividades de ferreiro, etc. Apontou outras que não eram ofícios mecânicos, como entalhador45 ou pintor e colocou, como ofícios considerados pouco qualificados, as principais ocupações dos escravos na Bahia: alfaiate, barbeiro, 42 VILHENA, 1969: 135-137. 43 Esse uso de identificar os escravos, e mesmo os brancos, pela raça, pode causar enganos históricos como o acontecido com o escultor Francisco das Chagas, autor do Cristo Morto, da Ordem 3.ª do Carmo, de Salvador, cujo qualificativo de mestiçagem transformou-se em apelido. Inclusive, mesmo portando esse apelido, alguns historiadores e guias turísticos insistem em afirmar que Francisco das Chagas era um negro. 44 Subtraíram-se os falecidos (11%) e com profissões ilegíveis (3%). 45 Eventualmente os entalhadores registravam seus documentos na Câmara, especialmente porque alguns deles conjugavam essa atividade com a de marceneiro, cuja atividade devia, obrigatoriamente, ter licença, registrar carta de exame, pagar fiança, esmola ao santo protetor, etc. (FLEXOR, 1974: 43).