A. Bellini - M. Capatti - A. Padovani - A. Scomparin Fundamentos e Linhas Educativas da Ursulina Ursulinas Filhas de Maria Imaculada Verona 2008 ÍNDICE Apresentação Introdução Anotações históricas I PARTE FUNDAMENTOS CAP. I Imagem e experiência de Deus em Santa Ângela Merici e transmitidas pelo Bem-Aventurado Zefirino Agostini às suas Ursulinas (Ir. M. Magda Capatti) Introdução 1. Modelo Trinitário 1.1. “No nome da Santa Indivisível Trindade”, em Santa Ângela 1.2. “O mistério dos mistérios”, no Fundador Conclusão 2. O “Deus Só” 2.1. “Deus só e n'Ele todo nosso bem”, em S. Ângela 2.2. “Meu Senhor, única vida e esperança minha”, nas meditações do Fundador Conclusão 3. “Jesus Cristo, o Esposo” 3.1. “O Esposo”, o “Amador”, em Santa Ângela 3.2. “Amados por Deus com amor de Esposo”, nas palavras do Fundador Conclusão 4. Cristo, o Salvador 4.1. “Derrama o seu sangue por nosso amor, em S. Ângela 4.2. “Jesus é o nosso amadíssimo Redentor, no Fundador Conclusão 5 5. A Eucaristia, sacramento do Amor 5.1. “Na Missa encontram-se os méritos da Paixão de Nosso Senhor”, em Santa Ângela 5.2. “Neste Sacramento encontra-se Deus”, como diz o Fundador Conclusão 6. “Na Igreja de Jesus Cristo” 6.1. A Santa Mãe Igreja, em Santa Ângela 6.2. “A Igreja, Esposo diletíssima de Jesus Cristo”, no Fundador Conclusão CAP. II A Antropologia nos Escritos de Santa Ângela Merici e do Bv. Zefirino Agostini (Ir. M. Agnese Bellini) Intodução 1. Criatura de Deus 2. Chamado à perfeição 3. Chamado à liberdade 4. Chamado à relação em Cristo 5. Chamado à imitação de Cristo 5.1. Glória 5.2. Verdade 5.3. Obediência 5.4. Dom gratuito 6. Chamado a uma Vida Espiritual 6.1. Silêncio a palavra: a oração como relação com Deus 6.2. Vigilância sobre as paixões 6.3. Vida eucarística CAP. III A Ursulina segundo o coração de Ângela Merici e de Pe. Zefirino Agostini (Ir. M. Angiolina Padovani) 6 Introdução 1. Quem é a Ursulina 1.1. Filha e Irmã 1.1.1. “Unidas juntas” 1.2 . Esposa 1.2.1. Virgens 1.3. Mãe 1.3.1. Zelosas Conclusão CAP. IV A Ursulina vive e educa empenhando-se a “revestir-se de Cristo” (Ir. M. Agnese Scomparin) Introdução 1. Revestida de Cristo 1.1. Responde oferecendo-se 1.2. Expressa em si mesma a imagem de Cristo 1.3. Deixando-se educar pela Cruz 1.4. Cuida do seu próprio crescimento 2. Unida com o laço da Caridade 2.1. Acolhe o dom da comunidade 2.2. Estima a cada uma e aceita a gradualidade 3. Com Amor de Mãe 3.1. Aberta a todas e a cada uma por uma necessidade de coração 3.2. Com afeição e afabilidade 3.3. No conhecimento amoroso pessoal 3.4. Reconhece e aprecia a dignidade de cada pessoa 3.5. Sábia e vigilante 4. Incansável no zelo 4.1. Com coração aberto, empenha-se assiduamente 4.2. Com a fortaleza do Espírito 4.3. Sempre e em cada situação 7 5. Na obediência amorosa 5.1. À procura do verdadeiro bem 5.2. Na Igreja 6. Humilde e Confiante 6.1. Conhece a si mesma e encontra o seu lugar 6.2. Instrumento inadequado e confiante 6.3. Cria relações positivas 7. Simples, busca “Deus só” 7.1. Com o coração e as mãos numa só direção 7.2. Serena diante dos limites 8. Alegre no Senhor, habitada pela paz 8.1. Habitada de íntima paz anseia à plenitude 8.2. Serena também nas provas II PARTE LINHAS PARA A CONSTRUÇÃO DE UM PERCURSO EDUCATIVO Introdução 1. Valores e critérios de cada percurso formativo 1.1. “Unidas juntas” 1.2. Partícipes da missão da Igreja 1.3. No campo que nos é próprio 1.4. Com sabedoria de mãe 1.5. Numa contínua formação 2. Percurso formativo paradigmático 2.1. Do Modelo Trinitário, aprendemos o dinamismo da nossa ação educativa 2.2. Construamos um percurso formativo 2.2.1. Da estupenda Dignidade à ser Luz 2.2.2. Para a educadora ursulina: de esposa à mãe 2.2.3. Para as nossas comunidade: do lar da mútua Caridade ao Zelo Incansável 8 2.2.4. Para os jovens: Da dignidade de Filho de Deus ao empenho do Testemunho 2.2.5. Para os leigos colaboradores: da estupenda dignidade de ser partícipes ... ao ser Sal e Luz 2.2.6. Para os pais: da estupenda Dignidade de chamados a gerar à única Paternidade em Deus APÊNDICE CONCLUSIVO NOS ESCRITOS, IMAGENS QUE SÃO FAMILIARES Introdução A videira e os ramos O Bom Pastor A árvore e seus frutos A ursulina Mãe BIBLIOGRAFIA Fontes Estudos 9 ABREVIAÇÕES AO AOV FG/4 FM FO FP FPN/2 FS FSS/1 FTA/7 FTP/6 Leg Leg Prol Leg Ult RdV Reg Reg Prol Rec Rec Prol Rec Ult Dir 1 2 3 1 Às Origens Arquivo das Ursulinas Filhas de Maria Imaculada de Verona 2 Aos jovens, Escritos do Fundador - Série Cadernos Vermelhos Às Mães Cristãs, Escritos do Fundador Fascículo de uso manuscrito O Fundador às suas Ursulinas F.MªI., Escritos do Fundador, Z. Agostini Fascículo impresso de uso manuscrito. Ao povo nas várias circunstâncias, Escritos do Fundador, Z. Agostini fascículo de uso manuscrito. O Pai Nosso, Escritos do Fundador, Z. Agostini Série Cadernos Vermelhos Aos Sacerdotes, Escritos do Fundador, Z. Agostini fascículo de uso manuscrito. O Espírito Santo, Escritos do Fundador, Z. Agostini Série Cadernos Vermelhos Homilias do Tempo Comum, Escritos do Fundador, Z. Agostini Série Cadernos Vermelhos Homilias da Quaresma e do Tempo Pascal, Escritos do Fundador, Z. Agostini - Série Cadernos Vermelhos 3 Legados de Santa Ângela Prólogo dos Legados de Santa Ângela Merici Legado Último Regra de Vida das Irmãs Ursulinas F. Mª I. de Verona Regra de Santa Ângela Merici Prólogo da Regra de Santa Ângela Merici Recordações de Santa Ângela Merici Prólogo das Recordações de Santa Ângela Merici Recordação Última Diretório das Irmãs Ursulinas F. Mª I. de Verona Primeiras Regras ditadas pelo Bv.Agostini para o seu Instituto: 1856; 1860; 1866. A série “Cadernos Vermelhos” é uma transcrição simplificada e na língua corrente dos textos do Fundador, originais e manuscritos, conservados no Arquivo das Ursulinas F. MªI. de Verona (AOV). Os escritos de S. Ângela são citados com uma abreviação, o número dos capítulos e o número dos versículos, versões organizadas pela L. Mariani e E. Tarolli no 1996. 11 APRESENTAÇÃO Em sintonia com as indicações do 17º Capítulo Geral, que aprovou este conteúdo, podemos finalmente entregar o texto: “Fundamentos e linhas educativas da Ursulina” a cada irmã e comunidade, para que possa ser ponto de referência na reflexão e nos percursos educativos. Também isso nos ajuda a “Renascer do Alto ... para fazer vida nova!”. É um trabalho feito “a quatro mãos”, como uma sinfonia, na qual cada instrumento se distingue, reconhece-se e, ao mesmo tempo, harmoniza-se com o todo, é o fruto da reflexão, do estudo, do aproximar-se às fontes carismáticas feito com “intelecto de amor”, deixando falar os textos de Ângela que conhecemos, relidos e propostos às jovens da sua Paróquia por Pe. Zefirino Agostini, zeloso pároco de S. Nazário. Existe o objetivo de oferecer a toda a Congregação um instrumento, um subsídio para alimentar a nossa espiritualidade e a nossa ação educativa também com a contribuição das ciências humanas. O tema dominante que emerge da releitura dos textos é a imagem de Deus e a imagem da pessoa que, à luz da Palavra e da particular experiência espiritual dos nossos Santos Fundadores, dão à nossa vida e missão a fisionomia de filha e irmã, de esposa e mãe capaz, por graça, de amar e de dar a vida. Um método de leitura sugerido é aquele de aproximar-se às diversas partes fazendo atenção também as anotações, as citações, intencionalmente, abundantes, parando onde o coração sugere, onde o Espírito suscita intuições, sentimentos, desejos de bem. Podemos ler o texto também levando continuamente no coração uma pergunta: o que significa, hoje, viver a nossa missão educativa na Igreja? Com qual modalidade formar hoje à fé cristã? 13 A leitura pessoal resultará de grande interesse e utilidade também com a partilha comunitária e com os nossos colaboradores. Para todos nós, o texto é também possibilidade e espaço para a oração pessoal e comunitária. Agradeço de coração todas as pessoas que, em diversos níveis, contribuíram para a realização deste texto. Com afeto e gratidão, Madre M. Pierina Scarmignan Superiora Geral Verona, 15 de agosto de 2008. 14 INTRODUÇÃO Aumentou na Congregação, nos últimos decênios, a consciência da riqueza carismática que nos foi transmitida, e que requer continuamente ser feita nossa e re-proposta. O trabalho que aqui apresentamos é uma tentativa de resposta à exigência, muito sentida na Congregação, de melhor conhecer e de ter um quadro unitário do nosso patrimônio, para a finalidade de obter linhas educativas “nossas”, seja por conteúdo que por método operativo. A partir da re-leitura dos textos de Ângela e Zefirino, buscaremos fazer emergir os elementos fundamentais e metodológicos de um percurso formativo, específico da ursulina, atual e possível de ser praticado na obra educativa, dirigido em primeiro lugar a nós, mas também para partilhar com quem participa conosco na “sublime” missão de educar. Parece-nos importante desenvolver na PRIMEIRA PARTE do trabalho os fundamentos que sustentam a nossa ação apostólica. Mediante a visão teológica, veremos que o dinamismo “trinitário” é paradigma de todo dinamismo educativo: o Pai, plenitude do ser, nos faz crescer até formar em nós e nos outros a imagem do Cristo com a ação do Espírito, primeiro protagonista na obra educativa, que deve ser acolhido. Na relação, que Deus estabelece, imprime na pessoa a “estupenda dignidade de filhos”, ilumina o seu agir de uma sabedoria toda espiritual, a chama a revestir-se de Cristo e a torna partícipe da sua mesma missão. Cristo, fundamento e Caminho, Origem e Fim, oferece o modelo do homem redimido, chamado a crescer até a sua plena estatura, na consciência de uma relação que põe a pessoa sob o senhorio divino e doa a ela a liberdade de tornar-se o melhor de si mesma, com um percurso que a conduz a ser testemunha. Neste dinamismo de relações, a ursulina descobre ser chamada a viver como Filha, Irmã, Esposa, Mãe e, junto com outras, como ela “Esposas do Altíssimo”, faz de si a primeira mediação na relação de Deus com as pessoas da missão a ela confiada. Entre as atitudes que cada uma de nós é chamada a viver e fazer próprias, algumas são consideradas características, capazes de formar um coração sábio que, esperto no caminho da busca de Deus, intui a ação 15 educativa como capacidade de ver o outro assim como Deus já o vê e como paixão para que no outro se forma o Cristo. Na SEGUNDA PARTE do trabalho, as linhas educativas, propositalmente essenciais para que possam ser adaptadas em contextos diversos, traduzem os conteúdos que emergiram em indicações para percursos de crescimento para uma vida em conformidade a Cristo. A presença da nossa Congregação em Países e culturas diferentes é um dos sinais através dos quais o Senhor nos garante que o nosso carisma ursulino é uma preciosa herança e leva em si a fecundidade que o torna eficaz em tempos e contextos diversos. Animadas, encorajadas desta certeza, colocamo-nos na escuta do mundo contemporâneo e, nele, das perguntas educativas provenientes do mundo juvenil e feminino em particular. As diversas urgências nos interpelam e nos provocam a encontrar respostas sempre mais adequadas, diante às quais estamos convictas que também hoje, como nos tempos de Zefirino e Ângela, a missão de educar é urgente “obra das obras”, o caminho que nos permite de encontrar os jovens e de acolhê-los como um dom confiado aos nossos cuidados. Na obra que é de Deus, com a nossa ajuda, os jovens possam descobrir a si mesmos como dom único, original e crescer responsáveis por uma tarefa confiada a eles como pessoas que crêem no mundo e na Igreja. Este trabalho, pensado principalmente para nós ursulinas, requer ser verificado na concreta obra educativa, que o Senhor realiza mediante a nossa ação e a nossa oração, a favor da juventude, e entre esta, a mais pobre e abandonada, objeto dos amorosos cuidados de cada ursulina e de cada comunidade. As autoras 16 ANOTAÇÕES HISTÓRICAS É importante preceder o texto com estas breves reflexões, para esclarecer a interpretação e o uso que foi feito no tempo dos Escritos4 de Santa Ângela e dos “destinatários” dos mesmos. Algumas considerações Os Escritos de Santa Ângela ditados por ela ao fiel secretário Grabriel Cozzano, são três: Regra, Recordações e Testamento (ou Legados)5, bem caracterizados, pelo estilo, linguagem, conteúdo, fazendonos perceber que são três os grupos de destinatários. Mas se isso não fosse suficiente, Ângela mesma indica, no Prólogo que precede cada escrito, a quem se dirige: na Regra, “Às diletas filhas e irmãs da Companhia de Santa Úrsula”6; nas Recordações, “Irmã Ângela, serva indigna de Jesus Cristo, às suas diletas filhas e irmãs, as coronelas da Companhia de Santa Úrsula, ou seja às virgens”7; no Testamento, “Irmã Ângela, serva indigna de Jesus Cristo, à senhora Lucrezia, mãe principal da Companhia, e às outras 4 5 6 7 Esta expressão refere-se aos textos de Santa Ângela Merici e do Bv. Zefirino Agostini, que desde a fundação inspiraram a vida e a ação apostólica das ursulinas. Os Escritos de Santa Ângela Merici aos quais se faz referência neste texto são tirados respectivamente: da Regra, do volume conservado na Biblioteca Trivulziana de Milão; as Recordações e o Testamento da cópia notarial reproduzida dos originais e conservada no Arquivo Secreto Vaticano e transferidos pela L. Mariani e E. Tarolli em Brescia no ano 1999. Cfr. Os “Escritos” de Santa Ângela Merici, aos cuidados de L. Mariani E. Tarolli, Queriniana, Bréscia, 1996. Reg Prol, 7. As “virgens” eram membros efetivos da Companhia de Santa Úrsula “eleitas para serem verdadeiras e intactas esposas do filho de Deus”. Rec Prol, 1-2. As “coronelas” também elas “virgens”, eram as responsáveis dos pequenos grupos de jovens pertencentes à Companhia. A elas foi confiado o cuidado de cada uma, a missão de compreender o comportamento de cada filha e de perceber as suas necessidades espirituais e materiais, para providenciar o melhor possível. 17 8 governadoras e mães” . No tempo, por causa de circunstâncias históricas, ligadas ao desenvolvimento da Companhia e à compreensão de um estilo de vida novo e inovador, as Virgens fizeram uma transposição corajosa e interessante: na França, sobretudo, as ursulinas se dedicaram à educação das jovens através do ensino; isto também quando aceitaram um estilo de vida monacal. E assim, com toda a simplicidade, aqueles textos que formavam a sua espiritualidade, davam-lhes consistência e as configuravam como “Filhas 9 de Santa Ângela”, tornaram-se a “Carta Magna” de seu estilo educativo . Tudo aquilo que a Madre diz às Coronelas e às Matronas, quanto ao modo de considerar, orientar, valorizar “filhas e irmãs”, foi lido e referido à relação educativa 'professora-aluno', no contexto de uma escola, o 'adulto-jovem', no contexto de uma comunidade de fé, para aqueles empenhados na 10 catequese ou em outras atividades pastorais . Graças a esta mudança de perspectiva, Ângela foi considerada, na história da Pedagogia, educadora e fundadora de uma Ordem de 11 Educadoras . E é graças a esta novidade, providencial e carismática, que nós hoje, nos vários lugares onde nos encontramos a operar, imersas em diversas culturas e situações, inspiramo-nos nela, na nossa missão educativa. Anima-nos a mesma liberdade que caracterizou a sua figura de mulher, e com o mesmo desejo de “obedecer aos conselhos e as inspirações que continuamente o Espírito Santo suscita no nosso coração, qual voz sentiremos tanto mais claramente quanto mais purificada tivermos a 12 consciência” . Numerosos, ao invés, são os Escritos do Bv. Zefirino Agostini 13 dirigidos às ursulinas , recolhidos num único texto que se tornou familiar a 8 9 10 11 12 13 Leg Prol, 1-2. Seguem os nomes das “nobres matronas”: um grupo de damas, de senhoras viúvas, pertencentes a alta sociedade bresciana, que não fazem parte, propriamente, da Companhia, mas que tem a missão de vigiar sobre esta nova e jovem instituição, garantindo-lhe a seriedade diante da sociedade civil e eclesial. Cfr. L. Mariani, O.S.U., As “Recordações” de Santa Ângela Merici. Notas de espiritualidade, Tipolitografia Obra Pavoniana, Brescia 1991, 16ss. Ibidem. Ibidem. Reg VIII, 14-15. Z. Agostini, O Fundador às suas primeiras Ursulinas FMI, uso manuscrito, 18 cada irmã. Nele se percebe a grande familiaridade do Fundador com Santa Ângela que ele conheceu através da mediação das ursulinas de Saló14; apaixona-se por esta figura de mulher santa e deseja “fazer reflorescer o Oratório Paroquial Mariano das Jovens colocando-as sob a proteção de Santa Ângela Merici, Santa nossa e famosa fundadora das ursulinas, à qual, quem escreve, sentia-se atraído com invencível ímpedo de estima e de 15 veneração” . Ele apresenta-lhes a vida, a modalidade de consagração ao Senhor, o carisma virginal, a missão educativa, deixando assim às suas Filhas uma herança espiritual enriquecida pelo “espírito mericiano” e pelo zelo apostólico, sua nota distintiva que transparece em cada reflexão dirigida às Filhas. Muitas vezes, nas suas exortações, Pe. Zefirino apresenta, explica as fontes mericianas e convida as ursulinas a lê-las, mastigá-las, para 16 assimilá-las e saborear o “sabor como de mel” , ricas como são do espírito 17 da Mãe, um espírito que deve transformar-se “em alimento e em sangue” , 18 para ser “verdadeiras ursulinas, dignas filhas” , que tem com Ângela, sua 19 Mãe e Mestra, “uma relação mais cara, mais íntima, mais interessante” . A história nos diz que a primeira escola de caridade concretizou-se 20 próprio graças ao desejo de “três entre as maiores” , que pediram de poder “fazer alguma coisa para imitar Santa Ângela no cuidado das meninas, 21 iniciando uma Escola para as mais pobres e abandonadas” . Na simplicidade e no entusiasmo dos inícios, foram acontecendo algumas novidades nem mesmo imaginadas pelo Pe. Agostini, mas que começam a dar consistência à fisionomia da Ursulina Filha de Maria Imaculada. Santa Ângela é o modelo de vida e de santidade que inspira o agir 14 15 16 17 18 19 20 21 Tipolitografia Obra D. Calabria, Verona 1983, de agora em diante: FO, com o número da página. Cfr. FO, 446. FO, 447. FO, 225. Ibidem. Ibidem. FO, 317. Ibidem. Ibidem. 19 em favor das meninas, sobretudo as mais pobres e abandonadas. É interessante perceber a motivação original, que depois encontrou forma concreta também na escola: o coração de Pe. Agostini estava preocupado com a situação das famílias da Paróquia e, pensando às várias possibilidades, vê na instrução das jovens, e, sobretudo, das mais necessitadas, um meio eficaz de educação. Uma preocupação pastoral 22 sentida e vivida no contexto eclesial da paróquia. Sobre o rastro de Santa Ângela, como solicita o Fundador, vem espontâneo uma pergunta: a quem se dirige hoje, a Ursulina Filha de Maria Imaculada? Quem é 'o outro' com quem a Virgem Filha de Santa Ângela é chamada a estabelecer uma relação educativa? As esposas confiadas às coronelas são, hoje, as jovens as quais somos enviadas, que encontramos nos lugares tradicionais, escola, 23 paróquia, grupos juvenis, mas também em outras instituições e iniciativas e que nos “foram confiadas para cuidá-las como vigilantes pastoras e boas 24 ministras” . “O outro” são também as irmãs com as quais formamos a comunidade. A vida fraterna, de fato, é o espaço no qual assumimos um estilo educativo, com todas as atitudes que o caracterizam e este estilo o vivemos em qualquer lugar, porque, também este “é ursulino”, do lar do 22 23 24 O primeiro “Regulamento para a Pia União das Irmãs Devotas de Santa Ângela Merici”, aprovado em 23 de outubro de 1856 pelo Bispo de Verona Mons. Benedetto de Riccabona, apresenta três campos de trabalho que as irmãs devem abraçar, e destes, dois são: “1.AInstrução Escolar das meninas pobres da paróquia. 2. “Avigilância sobre as mesmas nos dias festivos no tempo do Oratório Mariano, da Doutrina Cristã e do divertimento vespertino”, FO, 11. Neste mesmo Regulamento, na parte dedicada à aceitação das alunas na escola, se diz: “Nenhuma igualmente poderá ser admitida sem que os Pais prometam firmemente que a filha irá freqüentar louvavelmente a escola, e as práticas dos dias festivos, isto é, o Oratório, a Doutrina e divertimento vespertino”,AO, 13. Não é difícil intuir a dimensão pastoral também da escola, inserida num contexto de atividade e iniciativa para a formação humana e cristã da juventude. Sejam confrontados também os artigos 12-15, 17 da Regra de Vida e 12-18,20 do Diretório, significativos para a nossa Tradição. Cfr. RdV 10; Dir 30. Rec Prol, 6; cfr. Rec 7º. 20 25 nosso viver juntas, nasce o zelo para o bem dos outros . É deste espírito e com este espírito que foram elaboradas as reflexões que seguem. 25 Cfr. Fo, 288. 21 I PARTE FUNDAMENTOS CAPÍTULO I Imagem e experiência de Deus em Santa Ângela Merici e transmitida pelo Bv. Zefirino Agostini às suas Ursulinas Ir. M. Magda Capatti INTRODUÇÃO A partir da particular visão de Deus e experiência d'Ele, em Santa Ângela Merici, e transmitida a nós pelo Bv. Zefirino Agostini como herança e experiência possível a ser percorrida, significa reconhecer que esse é o fundamento do ser e do educar da ursulina. Se estivermos convencidas que o fim da nossa missão é fazer crescer a pessoa, nossa e dos outros, a medida de Cristo, de verdade cada ação educativa, nesta luz, torna-se ação do Espírito que se compreende e aprende estando voltadas a Ele: assim nos ensina Santa Ângela, mulher do olhar voltado para Deus, e, portanto que se tornou reflexo d'Ele, para os outros. Essa intuição tinha também o nosso Fundador: “Ângela viveu toda para Deus [...] ela era como uma imagem viva de Deus e como tal refletia sobre o seu próximo à luz suprema daquela sabedoria 26 celeste que Deus tinha infundido nela” . Eleva-se a Deus e torna-se suas imagens vivas, reflexos do seu amor pela humanidade, explica logo o Fundador, atingindo a inacessível ciência de Deus, na fé alimentada na fonte da Palavra, como Ângela que embora iletrada, possuía o conhecimento de Deus de quem sabia falar também aos teólogos do seu tempo: “Sim, porque também se ninguém lhe tinha ensinado nem mesmo a ler, ela possuía o conhecimento das Escrituras em modo elevado que, interrogada diversas vezes por diferentes teólogos e pregadores sobre passagens dos dois Testamentos, também sobre aqueles mais difíceis, deixava-os admirados dos seus discursos. Assim pessoas 27 ilustres e do povo desejavam conhecê-la e escutá-la falar” . Daqui se pode então começar a entender qual experiência de Deus viveu Santa Ângela. E podemos intuir a grandeza de um evento importante e decisivo para a sua vida, que ela não fala nos seus escritos, do qual, porém, perpassa algo de “extraordinário”: é a visão de Brudazzo; a visão da escada representada entre o céu e terra, com a sua procissão de Anjos e Virgens em 28 festa: imagem bíblica que lembra a visão de Jacó . 26 27 28 Aos jovens, Escritos do Fundador, Zefirino Agostini, série “Cadernos vermelhos”, 279, da ora: FG/4. Ibid. Gen 28, 10-17. L. MARIANI, E. TAROLLI, M. SEYNAEVE, Ângela Merici, 25 Quem recebe uma visão, com dificuldade, consegue expressá-la e traduzi-la em linguagem humana, sempre inadequada, à experiência sobrenatural. No caso de Ângela, o evento acontece nos anos da sua juventude: Deus se lhe revela à maneira dos místicos, e ela intui o dom que lhe é confiado, um carisma para partilhar com outras, que só “tarde”, depois de uma longa gestação, se traduzirá em uma ação espiritual, e também social, num novo modo, feminino, de viver a fé. E, por isso, com força e segurança, Ângela “também se sua indigna serva, e por sua infinita bondade, instrumento seu”, poderá dizer sempre: “Deus plantou essa Companhia, 29 jamais a abandonará” . Ângela tenta transmitir-nos a imagem de Deus e a sua singular experiência d'Ele, encontrado na Oração, na Palavra vivida e por ela espalhada nos seus escritos, e na Eucaristia, o freqüente e sempre desejado encontro com Ele. Nesses três espaços, Ângela vive continuamente a presença de Deus e a relação deAmor com Ele. E se faz nossa mestra. Mas quem é Deus para Santa Ângela? Como todos os Santos, Ângela tem seu modo pessoal de ver Deus. É 29 Contribuição para uma biografia, Ancora, Milão 1986. Nas 103-106, 533, 539, 541 se fala desta visão considerada a mais importante entre as “outras visões” de Ângela e das quais se fala nas 85-88, 114, 136, 531, 546, 559, 616, 626, 623. O Fundador se refere a esta quando mais vezes a apresenta as ursulinas: “Sim, diletíssimas, uma semelhante missão bem conhecia Santa Ângela de ter recebido de Deus, desde a hora em que, na jovem idade, teve a celeste visão da misteriosa escada”, FO, 530. E ainda, de modo mais explícito: “Vocês, porém diletíssimas, não deixem vir menos a preciosa graça da sua vocação, do momento que se reúnem sob o casto e virginal estandarte de assim grande Santa, também vocês são esposas do Imaculado Cordeiro, previstas por ela na misteriosa visão da Escada que ela teve na sua jovem idade. [...] Ângela também vê vocês, ó jovenzinhas crescendo na esperança da sua Companhia. Sim cresçam, ela lhes diz, para ajuntar-lhes à portentosa Escada”, FO, 318. Rec. 4°, 8; cf. Leg 11°. 6-8; cf. L. MARIANI, Ângela Merici, 559. 26 fundamental para nós, pela entrega confiada a nós pelo Fundador, caminhar de acordo com uma experiência de Deus, típica da ursulina, em fidelidade ao Espírito da Madre Santa Ângela, para tornar vida “aquela íntima familiaridade”, que ajuda a crescer “na união com Ele e dá vigor a nossa 30 ação apostólica” . Isso motiva a escolha de procedermos guiadas pelos textos de Ângela, refletidos nas palavras do Fundador, em sintonia com a modalidade com que ele se coloca entre Ângela e nós: como aquele que guia e ensina, mas permanecendo “escondido atrás”, busca indicar a Mãe, porque tudo lhe interessa, sobretudo, que cada ursulina aprenda e compreenda, como se vive e opera, à luz de Deus. 1. O MODELO TRINITÁRIO Já nas primeiras linhas do “Prólogo da Regra da Companhia de Santa Úrsula”, Ângela nos dá as diretrizes da sua visão de Deus, três vezes Santo. No nome da Trindade, inicia a Regra, conclui as Recordações, e inicia e conclui os Legados com as palavras de bênção sobre as Filhas, significando que cada ação e obra são cumpridas no seu Nome, para o bem do próximo, invocando sobre as pessoas da nossa missão a presença de 31 Deus, Pai, Filho e Espírito Santo . E tornamo-nos, em primeiro lugar, uma bênção para os outros, quando o Deus que está dentro de nós, se comunica 32 aos outros e continua a manifestar-se como o precioso, único “tesouro” a 30 31 32 RdV 19, 30, 31. “No nome da santa e indivisível Trindade. Prólogo sobre a vida das virgens, recentemente começada com o nome de Companhia de Santa Úrsula”, Reg Prol, 1-2. “Agora lhes deixo; fiquem contentes, e tenham viva fé e esperança. Mas primeiro quero que sejam abençoadas, «in nomine Patris, ET Filii, ET Spiritus Sancti. Amém»”, Rec. Ult, 26-27. “A eterna bênção esteja sobre todas vocês, concebida por Deus Onipotente, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém” (Leg Prol, 3). “Mas antes lhes abraço, e a todas eu dou o beijo da paz, suplicando a Deus que lhes abençoe «in nomine Patris, ET Filii, ET Spiritus Sancti. Amen»”, Leg Ult, 27-28. Rec. 5º, 43. 27 ser levado a todos. Compreendemos então que próprio aqui, na perspectiva trinitária a experiência de Deus, da Santa e também nossa, encontra o fundamento, as características, as motivações. 1.1. “No nome da Santa Indivisível Trindade”, em Santa Ângela O Deus que preenche a vida de Ângela é o Deus da revelação cristã: pela fé na Palavra, Ângela conhece o mistério de Deus trino e uno e reconhece a específica relação com as três Pessoas divinas, que nela “habitam” sem confusão. Deus, para Santa Ângela, é “o Altíssimo, o Criador e Juiz”, Aquele que “concedeu a graça de separá-las das trevas deste mundo e uní-las juntas 33 para servir sua divina Majestade” , e a Ele devemos render infinitas graças 34 por ter concedido a nós um dom assim singular . É Ele que orienta e ensina o 35 que devemos fazer por amor a Ele, na tarefa confiada . É o Deus que respeita a criatura e nada pede por força, mas somente exorta e sugere, porque Ele sabe fazer coisas admiráveis e, como diz a Escritura, “até mesmo 36 das pedras pode cavar filhos celestes” . Entra-se assim, na concepção cristã do “Pai”: Ele é o ápice do amor e da obediência do Filho, o qual intercede por nós, afim de que o Espírito nos torna cada dia mais em conformidade a Ele. Em termos de relação conosco, é o Pai que com o seu amor 37 providente , não nos abandona, conhece as nossas necessidades, pode e 38 quer cuidar-nos e somente deseja o nosso bem e a nossa alegria . Ele nos constrói na existência como pessoas, porque nos gerou imprimindo em nós os traços do seu rosto: rosto de um Deus que se fez assim 39 próximo, até se fazer chamar por nós “Abbá, Pai” ; tornou-nos filhos no 33 34 35 36 37 38 39 Reg Prol, 4. Cf. Reg Prol, 5. Cf. Rec. Prol, 7. Rec. 8º, 6. Cf. Rom, 5, 8. Cf. Rec. 5°. Rom 8, 15. 28 40 imortal Filho de Deus , que é Jesus Cristo. 41 Ele é “o Rei dos reis e Senhor dos senhores” ; é o Enviado do Pai e, por nosso amor, escolheu ser humilhado e aniquilado sobre a Cruz e nos 42 ensina a ter o coração “do verdadeiro e prudente servo de Deus” que, humilde, aniquila-se a si mesmo, porque espera de Deus outra glória e honra 43 mais verdadeiras . Por isso Jesus é nosso Caminho, Verdade e Vida, o bom 44 Mestre que ensina, e “está no nosso meio qual Pai e Bom Pastor” . 45 Cristo é para Ângela, sobretudo “o Esposo , o único verdadeiro 46 tesouro” . A relação do Esposo conosco marca aquela relação de núpcias de sabor bíblico, entre Deus e a humanidade, amada com a sua história de fidelidade e infidelidade e, no Filho, reconciliada. É uma relação de pertença e de redenção, que adquire um lugar todo privilegiado na vida de Ângela. Portanto, é Deus que chama “a tal glória de vida, de ser esposas do Filho de 47 Deus e a tornar-se rainhas no céu” . O Espírito Santo, como o experimenta Ângela, é Aquele que ilumina e nos ensina toda a verdade, suscita no coração “conselhos e 48 inspirações” e no coração é suplicado e obedecido; porque se fizermos fielmente assim como nos ditar o Espírito, a fortaleza e o verdadeiro conforto que vem dele, estarão em nós para sustentar e atuar com força e 49 tenacidade aquilo que nos será confiado . Por isso, é necessário submeter-se “totalmente a Sua vontade e com uma viva e sólida fé, receber d'Ele aquilo que devemos operar por Seu amor. E, nisso, qualquer coisa aconteça, é 50 necessário perseverar constantemente, até o fim” . Na sua relação conosco, o Espírito, se o deixamos operar, nos livra 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 Cf. Leg 4º, 13. Leg 4º, 14. Rec. 1, 12. Cf. Rec. 1°, 13. Leg 10º, 9; 11, 5. Cf. Leg 4º, 3. Rec. 5º, 43. Reg Prol, 17. Reg VIII, 14. Cf. Rec. Prol 4. Leg Prol, 22-24. 29 e nos transforma com a sua potência de amor e move a cumprir ações em conformidade a ele; e é ele, o Espírito que constrói as relações entre nós e 51 nos constitui em uma única família . No Deus Trindade nós encontramos, portanto, o fundamento do nosso ser filhas e crentes: o Pai que plasma em 52 cada uma a imagem do Filho, através da ação do Espírito : é essa a marca trinitária que carrega em si cada pessoa, criada a imagem e semelhança de Deus que é Amor. Também na criação, inscrita igualmente no plano da redenção, o homem encontra os sinais de Deus e se empenha em cuidá-la, louvando a sua presença. 1.2. “O mistério dos mistérios”, no Fundador No reconstruir o percurso espiritual para as suas ursulinas, a partir da dimensão trinitária, Pe. Zefirino faz referência aos textos de Santa Ângela, às “suas breves palavras, mas ricas do espírito de sabedoria celeste 53 da qual era profundamente impregnada” ; uma sabedoria que a Mãe aprendeu no seu assíduo “estar” no amor da Trindade. Eis o convite às suas ursulinas: viver na presença do Deus Amor, para “sentir-se como que transformadas em Deus, tornadas uma coisa só 54 com ele porque quem está no amor habita em Deus e Deus n'Ele” . 55 O elemento básico na nossa Regra que é a dimensão do “habitar” o Amor trinitário em nós e de nós n'Ele, reconduz à freqüente exortação do Fundador, através da imagem dos “ramos”, que produzem frutos somente se ficarem unidos à videira: porque “Cristo é a verdadeira Videira e seu Pai o 56 Agricultor [...] e é argumento da mais importante instrução, para todas aquelas que desejam viver da Sua vida, permanecendo unidas ao Seu divino 57 Espírito” . 51 52 53 54 55 56 57 Cf. Reg VII; Rec. Prol; Rec. 7º; Leg 7º. A. CENCINI, Formação: novas perspectivas de pedagogia, in: «Vita consacrata», 1/2002, 37. O Espírito Santo, Escritos do Fundador, Zefirino Agostini, série “Cadernos Vermelhos”, 17- FSS/1. FSS/1, 8. RdV 19. Jo 15, 1-2. FO, 245 248. 30 O Fundador, com um método pastoral, apresenta a ação das três Pessoas divinas com imagens evangélicas: • O Pai, o Agricultor: o “Deus dos céus” suscita a tal confidência que cada uma pode chamá-Lo Pai. Ele, pela sua infinita bondade, deleitou-se em 58 criar o homem, para que gozasse da dignidade de ser seu filho . E é Ele 59 que faz crescer , porque é um Pai sábio e providente, tão bom que, sem nenhum interesse se comunica a todos segundo a capacidade de cada 60 um . É Pai de todos e cada um aprende a reconhecê-Lo, dirigindo-se a Ele, que quer ser invocado como Pai; • Jesus Cristo, a Videira: o Filho Unigênito, uma coisa só com o Pai, numa vida de amor e de obediência a Ele. Nisto Ele se faz Mestre e Modelo da nossa existência, que se torna fecunda somente se permanece unida a Ele que é a Vida. A nós Ele a doa em superabundância e continuamente 61 porque se fez nosso irmão , e nos redimiu com a sua vida de santidade e 62 de sofrimento, até à cruz ; • O Espírito Santo, o divino Espírito: aquele que habita em nós, do qual 63 jamais entendemos plenamente a força transformadora . Ele nos ilumina e nos faz conhecer o “tesouro de graças que temos nas mãos, a 64 Caridade de Deus derramada por seu intermédio nos nossos corações” . “É o Espírito, diz o Fundador às Filhas, o vosso Mestre de todas as verdades: da beleza da virtude, do amor que Jesus lhes trouxe, da 65 grandeza do seu estado, do fim da sua vocação” . É Ele que forma a verdadeira ursulina, o espírito de uma santidade que deve ser o dote mais 66 precioso de uma esposa de Jesus Cristo” . Segundo a perspectiva trinitária de Ângela, também Pe. Zefirino, 58 59 60 61 62 63 64 65 66 FO, 8. 1Cor, 3, 6. FO, 8. Ibid. 388. Homilias da Quaresma e do Tempo Pascal, Escritos do Fundador Pe. Zefirino Agostini, “Cadernos Vermelhos”, 62-FTP/6. Ibid., 4, 8. Ibid., 251. Ibid., 16. FO, 302; FSS/1,22. 31 67 entra no mistério de “Deus trino nas Pessoas e uno na essência” , o Deus do nosso creio cristão, que palpita na comunhão trinitária, abraçando tudo e todos, a imensidade dos séculos, dos espaços e dos homens. Ele quer ser contemplado no mistério e na luz da Graça operante em quem a Ele se abre; e por isso o Fundador afirma: “A Santíssima Trindade é o mistério dos mistérios, o fundamento de todas as grandezas da nossa religião, o nome que 68 enche céus e terra: Pai, Filho e Espírito Santo” . E, “fixando o olhar da fé” em Deus uno e trino, ele sente a necessidade de exclamar: “Meu Deus, não 69 compreendo, mas creio” . Compreende bem, ao invés, a ação da Graça dentro de nós, onde trazemos inscrito o modelo trinitário, na unidade do ser e junto na multiplicidade das dimensões: filial e fraterna, esponsal e materna, que cada uma experimenta e vive. Conclusão Com as suas profundas reflexões, o Bv. Zefirino Agostini parece dizer-nos particularmente, que “o abrir-se à presença operosa e fecunda da Trindade 70 Santa” , intuição de Ângela como perspectiva de uma existência recebida de Deus, como presença sempre operante, torna-se hoje na Regra e na vida, a íntima familiaridade, que Deus cria, se fazemos espaço para que Ele habite a nossa vida. Isso nos ensina Maria, como diz ainda a nossa Regra, porque é Ela a criatura que Deus quis Imaculada, ícone da humanidade redimida; e 71 com esse título é para nós Mãe e Modelo, a única que pode nos ajudar de 67 68 69 70 71 O Pai Nosso, Escritos do Fundador Zefirino Agostini, “Cadernos Vermelhos”, 8FPN/2. Homilias do Tempo Comum, Escritos do Fundador Zefirino Agostini, “Cadernos Vermelhos”, 12-FTA/7. FTA/7, 13. RdV 31. “Filhas de Maria Imaculada” é o título que já aparece no “Manual para a Companhia das Ursulinas”, preparado por Agostini sob o convite do Bispo de Verona, mon. Luigi di Canossa, e por ele aprovado no dia 21 de junho de 1869. Para isso, veja: FO, 147-159. A escolha de tal título para a nossa Congregação como para várias outras surgidas naquele tempo, explica-se como o redescobrir de uma espiritualidade mariana típica do Oitocentos que se manifesta em diferentes modos: a piedade popular invoca a Virgem como ajuda de um povo 32 verdade a contemplar o rosto do Filho. 2. O “DEUS SÓ” 72 O Deus uno, o Vivente, das invocações salmicas como Santa Ângela o percebe, está sempre presente na sua vida vivida toda para Deus, e a 73 experiência que faz d'Ele, toca os vértices da mística . Podemos percebê-lo em todos os Escritos, mas, sobretudo na linguagem contemplativa, no tom coloquial e inconfundível da sua Oração, inteiramente transcrita no quinto 74 capítulo da Regra . 2.1. 75 “Deus Só” e n'Ele todo nosso bem , em Santa Ângela Esta intensa expressão, que se tornou ao longo do tempo o modo mais eficaz e sintético de definir-nos em relação a Deus, foi pronunciada sem dúvida por Santa Ângela, numa época como a sua, que parecia ter perdido os sinais de Deus. As palavras luminosas da sua oração afirmam a primazia de Deus, 72 73 74 75 sofrido suplicante; as aparições de Lourdes a Bernadete Soubirous, em 1858, a apresentam como “Imaculada Conceição”; a extensão a toda a Igreja das festividades marianas e das devoções, especialmente do Santo Rosário, como sinal de vitalidade espiritual, até a proclamação dogmática da Imaculada Conceição, com a bula “Infabilis Deus” emanada por Pio IX, no dia 08 de dezembro de 1854. Cf. T. GOFFI, La spiritualitá dell'Ottocento /7, EDB, Bologna 1989, 226-227. Colocamos aqui também uma nota que se refere a presença de Maria nos Escritos de Santa Ângela: não parece ter um lugar e uma importância particular. Revela, porém, o seu fundamento doutrinal e a sua renovação devocional. No Prólogo das Recordações e na 5ª Rec., Ângela invoca Maria, para valorizar a oração e a coloca sempre junto a Jesus. Na 9ª Rec. a Santa assegura a benevolência de Maria e da corte celestial à Companhia. Cf. L. MARIANI, O.S.U.,As “Recordações” de Santa Ângela Mérici, 33-34. Sal 41; Sal 62. “Essa mulher «tinha muito mais de divino que de humano», como o Gallo afirma no “Processo”, porque era de pouquíssimo sono, pode-se crer que a maior parte da noite passava contemplando, especulando aquelas coisas que a pouquíssimas pessoas são concedidas”, L. MARIANI, Ângela Merici, p. 135. Reg V, 16-44; Cf. 5ª Rec. Reg X, 6. 13. 33 76 com a qual cada um de nós tem tudo , e “fora de Deus se vê pobre de tudo, propriamente um nada, enquanto que com Deus tem tudo”. E nos convida a colocar todo o nosso “bem, amor e prazer [...], em Deus só e na sua benévola 77 e afável Providência” . O “Deus só” é traduzido por Ângela, na sua oração, nos possessivos da eterna fidelidade de Deus que torna fiel o nosso pertencer-lhe: “Ó meu Senhor, ilumina as trevas do meu coração, [...] Ò meu Senhor, única vida e esperança minha, te peço: digna-te de receber esse meu coração” [...], cada 78 ato da minha vontade, todo meu pensar, falar e operar . O “Tu” confidencial ao se dirigir a Deus, torna-O próximo a cada um, mas faz compreender também a sua grande distância: Tu luz, eu treva. Tu grandeza de santidade, eu sempre em risco de ofender-te, cada dia. Com o olhar de Deus, que por primeiro nos ama e nos conhece, podemos entrar no nosso coração, já perdoado por Ele, para dar nome as fragilidades e as tendências que habitam o profundo do nosso ser criaturas humanas. Santa Ângela reconhece e confessa ofensas e culpas, lentidões, hesitações, demoras: digna-te, ó Senhor, de perdoar as minhas culpas até 79 agora cometidas . Não só: deixando-se olhar por Deus aprende-se a assumir os interesses do seu coração; d'Ele que, no Filho Jesus, deu a vida para todos. E para todos, com a oração, tornamo-nos voz do perdão de Deus: dignos para perdoar a humanidade inteira, a partir dos afetos próximos até 80 aqueles distantes que não te conhecem . A visão do Reino amplia os horizontes da oração, e Ângela pede que o encontro com o Senhor se “apresse” e aconteça, no coração de cada homem, também através da participação da sua Paixão, intuída sim, mas sempre tarde correspondida: “Tarde, muito tarde comecei a servir-Te e não 81 tenho derramado por Ti nenhuma gota de sangue” . E então a conclusão: purifica, santifica tudo “no ardente fogo do teu 76 77 78 79 80 81 Reg X, 6. Reg X, 9-13. Reg V, 35ss. Cf. Reg V, 23. Cf. Reg V, 23ss. Reg V, 27-28. 34 82 amor” , recebe, transforma, não deixar-me mais a mim mesma, mas abandonada a Ti, ao teu amor, ao teu querer: “Tudo isso eu ofereço aos pés 83 da tua divina Majestade” . 2.2. “Ò meu Senhor, única vida e esperança minha”, nas meditações do Fundador A bonita oração de Santa Ângela, pela importância que tem na sua experiência de Deus, não poderia faltar nas meditações propostas pelo Fundador às suas ursulinas, quase querendo dizer a cada uma que naquela oração Deus torna familiar o seu rosto, e no ficar com Ele, no permanecer, como discípula aos seus pés, com as atitudes de Ângela, cresce a ursulina apóstola. 84 O Fundador coloca-se em sintonia com Ângela, iluminando-nos sobre o conteúdo da oração, para entender a intensidade da união e a 85 modalidade com que ela vive para Deus: “única vida e a sua esperança” . 86 É esse o ponto mais elevado da doutrina espiritual de Ângela sintetizada nas últimas linhas da sua oração. Disso era consciente também Pe. Zefirino que escreve: “Santa Ângela dirige-se ao seu Deus suplicando-O como única vida e esperança, com o mais fervoroso ímpeto de todos os afetos: isso quer dizer que Deus assim se revelava a ela, enchendo-a com a imagem viva das suas 87 perfeições” . A criatura que, como Ângela, encontra o seu Criador como o Tudo, deseja somente corresponder-lhe, pedindo-lhe de receber o tudo de si mesma: o seu “pobre” coração, rico de dons de graças não merecidos, mas 82 83 84 85 86 87 Reg V, 37. Reg V, 42. São seis as meditações do Fundador sobre a oração de Santa Ângela, usadas num curso de exercícios espirituais às Ursulinas, Cf. FO, 515-535. Nelas aprofunda toda a oração mericiana; aqui tomaremos em consideração a VI meditação, onde apresenta a invocação final: “Ó meu Senhor, única vida e esperança minha”, FO, 533ss. Reg V, 35. L. MARIANI, O.S.U.,As “Recordações” de Santa Ângela Merici, 108. FO, 532. 35 também habitado por inclinações e tendências terrenas que esperam de serem “queimadas”, para que Deus se faça sua plenitude. Se tal é a consciência de Ângela, diz o Fundador, “quando será que também nós saborearemos a inefável doçura de dirigir-nos a Deus dizendo-lhe: meu 88 Deus, tu és minha única vida, tu a alegre esperança minha. Quando será?” . É importante, então, que nos interroguemos sobre o “nosso coração”, como fez Ângela, não tendo medo de reconhecê-Lo “pobre e imundo” e sob a luz de Deus descobri-lo desfigurado, se Ele “não nos ajuda eficazmente a 89 cada instante com a sua graça” . É urgente, portanto deixar-se purificar pelo amor ardente de Deus, para que Ele habite em nós. Em tal modo logo “o efeito” transparecerá: a nossa vontade, unida a aquela de Deus, será capaz de 90 orientar o pensar, o falar e o agir à imitação da santidade divina . A “medida” será dada da fiel resposta à própria vocação: a sua, como 91 sacerdote de Cristo, e a nossa, como esposas “doAltíssimo” . O “meio” para obtê-lo será sempre a humilde, perseverante e confiante oração, o pedir, como fazia Ângela, que Deus receba todas nós mesmas: “Recebe, Senhor, todo meu pensamento, palavra, obra e, finalmente, cada coisa minha interior como exterior, tudo te ofereço [...], 92 pedindo-te que tu te dignes de recebê-lo, mesmo que eu seja indigna” . Ângela quando nos entregava com as intensas palavras da sua oração, tinha presente tudo isso, a sua experiência de Deus, tornando-se para as 93 numerosas Filhas “a mãe, a mestra e o exemplo” . Assim para ser como a Mãe, o Fundador exorta a cada ursulina a deixar-se “mergulhar no espírito da oração meditada” de Santa Ângela; para viver, como ela, “unicamente para Deus”, sua “vida e esperança”, entregando a Ele o próprio coração, “purificado de cada afeto e paixão”, 94 para que se torne “fornalha ardente da caridade de Cristo” para os irmãos . 88 89 90 91 92 93 94 FO, 533. Ibid. Cf. FO, 534. Ibid. Cf. Reg V; FO, 534. Ibid., 535. Ibid., 533. 36 Conclusão A riqueza de uma tal experiência não podia perder-se, na expressão orante de Santa Ângela, tanto recomendada pelo Fundador às suas Filhas e que se tornou, por tradição, oração cotidiana, “a nossa” oração, porque nos ensina a dirigir-se a Deus com familiaridade e confidência, a reconhecê-Lo como o Senhor a quem pertencemos, a assumir de coração a causa do Reino, como meta da nossa missão. Interroga-nos sobre o primado que se deve dar a uma “vida segundo o Espírito”, ou seja, assinalada essencialmente por uma união sempre mais profunda com Deus, no nosso tempo como aquele de Santa Ângela, que 95 parece ter perdido o sentido de Deus. “A vida espiritual no primeiro lugar” , é de fato, hoje, a urgência que se adverte e pede atenção para colocar a nossa existência de consagradas sob o horizonte de uma dedicação exclusiva aos interesses de Deus e dos irmãos. É próprio Santa Ângela com a sua palavra muito atual, que nos indica como recuperar o espaço da familiaridade com Ele, no qual, mediante a 96 graça, se obtém de Deus a verdadeira vida espiritual . 3. “JESUS CRISTO, O ESPOSO” Existe uma expressão na nossa Regra de Vida, que nos coloca na ótica com a qual olhar o verdadeiro rosto de Deus, revelado no Filho: “O amor esponsal por Cristo dilata e amadurece nossa capacidade de doação, torna 97 fecundo nosso serviço eclesial” . 3.1. “O Esposo, o Amador”, em Santa Ângela Cristo esposo, contemplado por tempo prolongado, torna-nos semelhantes a Ele. Este é o ideal ao qual nos leva Santa Ângela e, sob os seus passos, também o Fundador, que intui na espiritualidade nupcial, o 95 96 97 Consagração para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, Partir de Cristo, 20, Roma, 19 maio 2002. Cf. Reg V. RdV 45. 37 fundamento sólido da vocação ursulina. Considerando essa dimensão, já temos encontrado os diversos modos com os quais Ângela fala de Jesus nos seus escritos e os muitos nomes, assimilados da sua assídua freqüência da Palavra, que expressam quem é Jesus para ela e ao mesmo tempo, quem é Jesus para nós, suas filhas. Jesus 98 para ela é, sobretudo “o Esposo”, “o Amador” . Partindo da convicção teologal de uma iniciativa do Amador, que 99 escolhe e chama a ser esposas do Senhor , se compreende a consagração ursulina, numa vida confiada a ação da Graça, para agradar o mais possível a 100 Jesus Cristo Esposo . Desta forma, Cristo se torna o “Tudo” da esposa, que 101 n'Ele “tem todo o seu bem” ; a Ele, que se tornou o único tesouro, a ursulina promete toda si mesma. “Honrem Jesus Cristo, ao qual prometeram a sua 102 virgindade e a si mesmas . Coloquem a sua esperança e o seu amor em Deus 103 só e não em pessoas viventes” . Santa Ângela inclui na Regra a parábola do amor e do empenho de 104 esposas do Filho de Deus que almejam o encontro sem fim com “o doce e 105 benigno Esposo Jesus” ; é esse um convite a cada ursulina, que ela encontre em Deus, já nesta vida, aquele que a completa: Cristo o seu Tudo, para sempre. Cristo está presente na vida de Santa Ângela e das Filhas como “o 106 Amador meu, ou melhor, nosso e comum de todas” ; e ninguém pode 107 resistir à sua luz, “alegre esplendor da verdade” . Como no Cântico dos Cânticos e no sinal da Aliança de amor de Deus com a humanidade, Santa Ângela entendeu o diálogo de amor que faz surgir 98 Rec. 5º. 38; Leg Ult, 18. Cf. L. MARIANI, Ângela Merici, 148 e C. OSELLA, A Caminho com Ângela Merici, Hesed Torino, 2002, 68. 99 Cf. Reg Prol. Cf. L. MARIANI, Ângela Merici, 234. 100 Cf. Leg 5º. 101 Reg X, 6. 102 Cf. Rec. 5º. 103 Rec. 5º, 21-22. 104 Cf. Reg Prol. 105 Reg XI, 35. 106 Rec. 5º, 38. 107 Leg Ult, 20. 38 o desejo de refletir-se no Amado, quando o Cristo se tornou “a minha vida”, 108 “o único tesouro”, “o único caminho para o céu” . No laço esponsal se enraíza a experiência de amor de Santa Ângela e de cada uma de nós, experiência que transfigura a vida “dentro” e faz descobrir ser amada por um amor pessoal e único, e não somente como criatura, Filha de Deus, mas também como mulher e como esposa. 3.2. “Amados por Deus com amor de Esposo”, nas palavras do Fundador 109 Com a linguagem bíblica nupcial de Isaías e de Oséias , também Pe. Zefirino evoca um Deus Pessoal, o qual quer ser chamado com confidência Pai e Esposo das suas criaturas: • Pai, para cada homem, para cada um, amado “por um amor terno e 110 confiante” , o mais forte que se possa imaginar; • Esposo, para o “dileto povo”, que ama até a dar a vida, com um amor 111 infinito e sem comparação, porque Ele “é Deus e não homem” e por isso faz uma aliança nupcial e pede ao seu povo totalidade de amor: “Sigilando o pacto das suas núpcias lhe pediu que o amasse com todo o 112 coração, com toda a alma, com todas as forças” . Deus manifesta, em Jesus, a paixão pela humanidade e dá plenitude a relação de esponsalidade, que é dom de si, até a extrema oferta. “Eis que para fazer-se nosso Esposo, Jesus Cristo comprou as almas do Pai, em virtude do seu sangue. E sabem quando Jesus Cristo fez esse casamento? No santo Batismo no qual nos deu a sua fé, junto com as outras 113 virtudes e dons de graça” . “Jesus Cristo, nosso Esposo, encarregou-se dos nossos sofrimentos, tomou sobre si as nossas enfermidades [...] para ser nosso Esposo se 108 Reg IV, 4. Cf. Is 61, 10; 10; Os 2, 21-22. 110 FPN/2, 17. 111 Os 11, 9. 112 FPN/ 2, 18. 113 Ibid. 109 39 114 submeteu em tudo ao cumprimento da vontade do Pai. Imitemo-Lo” . E exorta: “Se assim somos amados por Deus, com amor de Esposo, 115 com quanto júbilo as nossas almas devem ser suas esposas” . “Seja essa a prática constante de vocês: imitá-Lo para serem suas 116 esposas, sofrer, rogando-lhe, que não se faça a nossa, mas a sua vontade” . O Fundador nos diz que é dom de Deus a esponsalidade vivida na Congregação, porque torna presente na Igreja, o Cristo Esposo: “A Graça grande que Deus fez de chamar-lhes fora das trevas do mundo e de lhes fazer entrar nesta Companhia, plantada, por vontade de Deus, pela gloriosa Santa 117 Ângela na Igreja de Jesus Cristo” . É um dom assim grande que merece empenho para viver, cada dia, 118 segundo o chamado recebido . Conclusão A aliança de Deus com o homem, através de Jesus Cristo, torna-se o fim último pelo qual fomos criados; uma aliança que se repete na história: do juramento feito por Abraão: “Te abençoarei; abençoarei aqueles que te abençoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra”119, a Moisés: “Eu estarei contigo”120 e, em Cristo, a cada um de nós121. É uma aliança desde sempre radicada no ser do homem, o qual não tem o seu fim em si mesmo: o verdadeiro Tu que o completa é o Outro; por isso permanece forte em cada homem, também quando o ignora, o desejo de encontrar Deus, como o Intimo de si mesmo: o Deus ao qual anela a alma de cada um, na sede d'Ele, Deus vivente122, vida do ser e razão do existir. 114 Ibid., 19. Ibid., 18. 116 Ibid., 18-19. 117 FO, 377. 118 Cf. Reg Prol. 119 Gn 12, 2-3. 120 Ex 3, 12; Cf. C. OSELLA, A caminho com Ângela Merici, 23. 121 Cf. Ef 1, 3. 122 Cf. Sal 41. 115 40 4. CRISTO, O SALVADOR Temos recebido, de Santa Ângela e do Bv. Agostini, um patrimônio espiritual que põe fortemente ao centro Cristo no seu Mistério Pascal: mistério de uma salvação que conduz à glória da ressurreição mediante o caminho do sofrimento e da morte. A nossa Regra de Vida sintetiza o caminho de configuração a ele: “Na certeza de que caminhamos em novidade de vida, na medida em que, morrendo a nós mesmas, revestimo-nos de Cristo crucificado e ressuscitado para nossa salvação, abraçamos com serena alegria a abnegação evangélica 123 no seguimento de Jesus pela sua Igreja” . 4.1. “Derrama o seu sangue por nosso amor”, em Santa Ângela A união esponsal com Cristo, que Ângela propõe, realiza-se numa 124 relação que nos torna com ele um só Corpo, num só Espírito : este é o ideal, o fundamento de uma vida aberta à Graça e transfigurada pelo amor divino. Assim Santa Ângela percebeu e nos seus escritos deixa traçado um caminho em que a contemplação do divino torna-se causa e condição da missão, em plena adesão Àquele que, primeiramente nos procurou: “Jesus Cristo que 125 por nosso amor viveu neste mundo” . Na intensa expressão, Ângela sintetiza a figura de Cristo, tão apaixonado pela humanidade que, por seu amor, toma morada na vida e no 126 ambiente do homem: Ele, que derrama o seu sangue por nosso amor , veio procurar e salvar o que estava perdido e se fez próximo do homem, para 127 redimi-lo e “dar-lhe o poder de se tornar filho de Deus” . São os dois aspectos fundamentais do Evangelho: o mistério da Encarnação e da Paixão, que Ângela bem conhece pela familiaridade com a 128 Palavra transmitida pelos Evangelistas , sem os quais, também nós, como a 123 RdV 27. Cf. Ef 4, 4. 125 Reg V, 12. 126 Cf. Reg V, 25. 127 Jo 1, 12. 128 L. MARIANI, Angela Merici, 147-148. 124 41 Mãe, não saberemos nada do Senhor: é o mistério da sua existência humana 129 e divina, que Cristo ensina ; e então Ela exorta: “Aprendem de nosso Senhor, o qual, enquanto estava neste mundo, foi como servo, obedecendo 130 131 ao Pai eterno até a morte” ; e é “a sacratíssima paixão de Nosso Senhor” , 132 que nos incita a descobrir as nossas lentidões em começar a servir a Deus , e a pedir por isso o seu perdão: “Digna-se de perdoar [...] Peço-lhe, pela sua sacratíssima paixão, pelo seu precioso Sangue derramado por nosso 133 amor” . As suas palavras fazem intuir que conhecer Jesus conduz a amá-lo, e apaixonadas por Ele, a pôr-nos a serviço da sua mesma missão: “Senhor, no lugar daquelas miseráveis criaturas que não te conhecem, nem se curam de ser partícipes aos méritos da sua sacratíssima paixão, quebra-se o meu coração e com muito gosto, se pudesse, daria eu mesma o meu sangue para 134 abrir a cegueira das suas mentes” . Bem entendia Santa Ângela que Jesus é o Amor encarnado de Deus e sua única mensagem, é o amor que se doa. O ser “esposa”, então, é o fazer135 se uma com o amor, é participar em tudo à paixão do Esposo , é apaixonada adesão a Cristo, no servir a causa do Reino: “Deus lhes concedeu a graça de separar-se das trevas deste mundo miserável e de unir-se juntas para servir 136 sua divina Majestade” . Verdadeiramente a Paixão de Jesus ocupava o coração e penetrava o ânimo de Ângela, que se tornava sua expressão espontânea, quase um seu intercalar aquele: “peço-lhes, aliás, suplico-lhes, por amor da Paixão de 137 Jesus Cristo” dirigindo-se “às filhas e irmãs minhas no Sangue de Jesus 138 Cristo, caríssimas” : “Roguem-nO, humilhem-se sob sua grande potência, 129 Cf. Reg IX. Rec. 1º, 6. 131 Reg VI, 3; Rec. Prol, 20. 132 Cf. Reg V, 27. 133 Reg V, 24-25. 134 Reg V, 31-34. 135 Cf. Rec. Prol. 136 Reg Prol, 4-5. 137 Rec. Prol, 20. 138 Rec. 1º, 1. A “Paixão de Cristo”, assim como o seu “sangue”, retornam ao menos sete vezes separadamente, mais duas juntas, nos Escritos mericianos, Cf. L. MARIANI, O.S.U., As “Recordações” de Santa Ângela Merici, 33. 130 42 porque sem dúvida, tendo-lhes confiado tal obra, lhes dará também as forças para poder realizá-la, contanto que não falte a sua parte. Façam, mexam-se, acreditem, esforcem-se, esperem, gritem a ele com o seu coração, e, sem 139 dúvida, verão coisas admiráveis” . O Jesus a quem olhar para configurar o ser e o fazer segundo a medida do “Coração” de Cristo é, para Ângela, o Salvador Jesus: no seu nome expressa a missão, a sua entrega ao Pai, numa voluntária e ardente adesão ao projeto de redenção e de libertação da humanidade. E se compreende, então, como ter presente a vida de doação e de abnegação de Jesus, a sua obediência à vontade de Deus, como medida da nossa adesão a ele. Apreendendo de Jesus, que ensina a tomar sobre si a fraqueza do homem e a curá-la com o amor, tornamo-nos apóstolas da sua salvação, bem conscientes de ser apenas um meio, seus instrumentos somente por sua 140 misericórdia , em fazer compreender aos irmãos, “como o Senhor nos 141 amou” . 4.2. “Jesus é o nosso amadíssimo Redentor”, segundo o Fundador O Fundador estava bem compenetrado nesta visão, pela dimensão do seu sacerdócio, que o consagrava homem de Deus entre os homens, para o bem dos homens, “Alter Christus”, e também pela vocação e missão que intuiu de Santa Ângela para nós Ursulinas. Na sua concepção cristocêntrica, nada é redimido, na Igreja e na humanidade que não se refira a Cristo: é Ele o modelo, o exemplo de cada perfeição humana; não somente, Ele é o Redentor, o autor da Graça e ninguém se salva sem Ele: “Cristo é o nosso amadíssimo Redentor, pagou 142 por nós além de toda medida” . A grandeza do mistério da Redenção vem d'Ele proposta com as tenras imagens evangélicas que caracterizam a sua pregação; e nas suas comparações pessoais entre as palavras dos evangelistas e aquelas dos 139 Rec. Prol 16-18. Cf. Rec. 1º, 1-5. 141 Cf. Jo 13, 34. 142 FPN/ 2, 23. 140 43 143, santos as figuras definem-se e fundem-se porque única é a mensagem de 144 Cristo: “OAmor de Deus que em Jesus Cristo doa-se todo a nós” . Recorre, comovente, a imagem do Bom Pastor, que oferece a vida 145 146 pelas suas ovelhas e se torna a figura do Cordeiro imolado . E une a figura do Bom Pastor que sofre com o Homem da Cruz: “Eu vim ao mundo só pelo desejo de salvar as almas, dando para elas a vida da graça e vida mais vigorosa e feliz [...] Vós sabeis quem eu sou? Eu sou o Bom Pastor [...] Eu me sinto estreitar as entranhas por um desejo que não tem descanso até que não se consuma como vítima de sacrifício, pela salvação das almas [...] Ah! Escutem-me, escutem-me agonizante da minha cruz: tenho sede: como se não tivesse sofrido bastante, desejo como homem extremamente 147 sedento, sofrer ainda mais, se fosse possível, para que ninguém se perca” . Enfim na imagem, a mais cara a Santa Ângela, do Bom Pastor que se associa àquela do Pai: “Me representei sob a imagem do Bom Pastor que com afabilidade busca a ovelha perdida e exulta por tê-la encontrada; sob a imagem de um Pai que, abandonado por um filho ingrato, festeja a sua volta 148 com a maior magnificência e alegria” . Nestes títulos, Cristo mostra toda a sua misericordiosa doçura, o amor que o define Salvador, no significado universal e central de uma vida e de uma missão, dom e responsabilidade para com os outros: em Jesus, o desejo de salvação, “a sede pelas almas” é a sua paixão. Fundamental é, então, compreender o que signifique a sede de redenção do Cristo, e o Fundador nos orienta para entrar, pouco a pouco, em tal mistério: “Sitio”. “Como é inteligível e clara esta tua palavra, igualmente é misteriosa e sobrenatural. Tu tens sede de almas, da sua vida eterna, do número exterminado daquelas que não te conhecem. Tu doaste tudo, corpo e sangue por elas e elas não sabem reconhecer que Tu és a salvação. Podemos 149 nós aliviar um pouco a tua sede?” 143 Cf. FPN/ 2, 20. FPN/ 2, 21. 145 Cf. Jo 10, 11-14. 146 Cf. FO, 367. 147 FO, 529. 148 FO, 367-368. 149 FTP/ 6, 61. 144 44 Conclusão O amor do Filho de Deus por nós e o nosso amor por ele se aprende, como diz o Fundador, direcionando freqüentemente o olhar para Jesus Crucificado: “Abrem o Santo Evangelho; sigam com ternura e humildade todos os passos do Homem-Deus, meditem bem sobre a vida de Jesus e no meio das suas meditações, olhem freqüentemente o Crucifixo: rezem, amem, suspirem olhando para este grande exemplar”150. “O Crucifixo é o grande livro que devemos consultar em cada ação”151. “Mas, ainda mais: procurem que o seu agir e o seu estilo de vida sejam conformes os seus divinos ensinamentos”152. Ressoa, em sintonia com as palavras de Ângela, o convite dirigido às Ursulinas para contemplar e assimilar e em tudo configurar-se ao Jesus da cruz: “Vocês não devem ser conformes à imagem dolorosa de Jesus Cristo, seu Esposo, se querem gozar da sua glória? Também aos seus caríssimos apóstolos, por tal missão, Jesus Cristo predisse cruzes gravíssimas, perseguições, o ódio de todo o mundo”153. É Jesus que, da Cruz, verdadeiramente nos faz suas e nos envia como apostolas154: “Desta missão somente encarreguei os meus Apóstolos, quando disse a eles: «Como o Pai me enviou, eu lhes envio. Idem por todo mundo: salvem todas as almas!»”155. De Jesus que salva da Cruz, recebemos sempre, uma missão semelhante àquela dos Apóstolos: “Filhinhas, vocês negariam de ter recebido de Jesus Cristo semelhante missão quando lhes chamou a servi-lo na eleita fileira das filhas de Santa Ângela? Esta sua gloriosa Mãe, não foi por ventura um portento de zelo para salvar as almas? [. ..] e vocês podendo salvá-las não as salvariam a custo de todos os possíveis esforços?”156. E é ainda Jesus que “da cátedra da cruz”157, diz a sua verdadeira essência na expressão que somente Ele, com absoluta verdade, pode dizer de si mesmo: “Não há maior amor do que dar a vida por aquele que se ama”158. 150 Aos Sacerdotes, Escritos do Fundador Pe. ZefirinoAgostini: FS, Escr. 125. Z.AGOSTINI, Devoções do SS.mo Rosário, Escr. 548, inédito,AOV. 152 FS, Escr. 125. 153 FO, 305. 154 Cf. RdV 9. 155 FO, 368. 156 Ibid. 157 Ibid., 506. 158 Jo 15, 13. 151 45 Assim Ele torna-se para todos “o Homem para os outros”, modelo de uma vida entendida como dom de si, que se realiza, cuidando dos outros: a medida do Crucificado. 5. AEUCARISTIA, SACRAMENTO DOAMOR O Amor de Deus que salva e redime, mantém-se vivo e verdadeiro, para sempre, no dom supremo de Jesus que é a Eucaristia, o Sacramento do Amor, que se sacrifica o sinal da sua Paixão. E a cada encontro com Ele, na mesa do Pão, cada cristão faz experiência. Se esta é a dimensão própria de cada crente, para nós ursulinas, tornou-se particularmente importante e, na tradição, remonta a Santa Ângela. 5.1 “Na Santa Missa encontram-se os merecimentos da Paixão de Nosso Senhor,” em Santa Ângela Na Regra, Ângela dedica um capítulo à Missa cotidiana159; que faz compreender o sentido de fé profundo com que ela olhava para a vida sacramental, e em particular à Eucaristia. E sobre estes valores fundamentais a sua união com Deus, deixa transparecer a sua paixão por Deus. Em poucas linhas, mas densas de conteúdo, sugere às filhas a participação freqüente à Eucaristia, naqueles tempos a comunhão não era hábito cotidiano160 para uma vida formada sobre o sacrifício de Cristo, celebrado cada dia: “Cada uma vai à Missa cada dia, [...] porque na Santa Missa se encontram todos os merecimentos da paixão de nosso Senhor. E quanto mais se participa com atenção, fé e contrição, tanto mais se participa dos benditos merecimentos e mais se recebe consolação. Aliás, será um comunicar-se espiritualmente”161. Ressalta em Ângela a consciência do significado principal do Sacrifício Eucarístico: como participação ao mistério de Cristo que sobre o altar renova o sacrifício da morte pela humanidade. Daqui nasce o envolvimento de toda si mesma: sobretudo na participação aos méritos da Paixão de Cristo que acrescenta o desejo de comunhão com Ele. 159 Cf. Reg VI. Cf. L. MARIANI, Ângela Merici, 98-100, 541. 161 REg VI, 1. 3-5. 160 46 Deste modo a celebração eucarística, a cada novo dia, dá “vida nova” pela novidade perene de Cristo. Ângela leva consigo essa interiorização da Missa, no “cotidiano”, para manter vivos e autênticos o amor de Deus e a paixão pela salvação do próximo, nisto a sua oferta se une na oferta de Cristo e a prepara a uma Comunhão que é ao mesmo tempo alimento e intimidade, desejo e encontro com Jesus, Pão vivo descido do Céu162. Olhando a Eucaristia, Amor de Cristo, e nutrindo-se do Corpo e Sangue de Jesus, Ângela aprende a amar como Ele, num serviço a Deus e aos irmãos. Isso transforma a nossa vida em uma “liturgia” e nos compromete a viver uma presença de participação, disponíveis a ser mediação e prolongamento do seu mistério de amor para com a humanidade. 5.2. “Neste Sacramento encontra-se Deus”, diz o Fundador Também o Fundador exorta as filhas ao encontro com Jesus Eucarístico e à comunhão freqüente, “sob o exemplo de Santa Ângela”, e pela centralidade que o Sacramento ocupa na sua vida sacerdotal: se neste Sacramento se encontra este Deus todo perfeição e santidade, se ali dentro na plenitude de sua força está a fornalha ardente da caridade, o Deus da 163 santidade, unindo-se à alma, torna-a divinizada . “Empenhem o seu coração, abrindo-o ao ardor do amor de Jesus no Sacramento por vocês [...] 164 este divino Sacramento é a fonte dos sagrados dons” . A palavra do Fundador evidencia a firmeza da fé na real presença de Deus no Sacramento e o contágio do amor que se atinge na e da Eucaristia. Referindo-se a Santa Ângela, ele relê e motiva a importância dada pela Madre, ao encontro com Jesus Eucaristia, para que se torne central também para nós. E escreve: ”Dêem um olhar à sua Mãe Santa Ângela. Ela viveu em tempos nos quais muitas e erradas opiniões afastavam os fiéis da Santa Comunhão e a mesa do Senhor era completamente deserta [...]. Ela, referem aqueles que escreveram sobre ela, vestiu o hábito de terciária franciscana para poder comungar freqüentemente [...] por isso a comunhão freqüente, a comunhão também cotidiana pode e deve ser a ocupação mais 162 Cf. Jo 6, 51ss. Cf. FO, 105. 164 Às Mães Cristãs, Escritos do Fundador Pe. Zefirino Agostini, fascículo uso manuscrito, FM, Escr. 204. 163 47 desejada das filhas de uma tão grande Mãe, porque é o meio mais eficaz para crescer no fervor, na piedade, na virgindade, na santidade da vida. [...] O seu corpo tornado-se sacrário vivo do Senhor transmita pureza e santidade, e o seu coração, que assim freqüentemente palpita junto ao coração de Cristo, se 165 mostre estranho a qualquer outro amor que não seja Ele” . A dimensão eucarística para o Fundador, não é devocional, mas expressão do dom pleno de Cristo na Páscoa; por isso propõe às ursulinas numerosas meditações sobre este Sacramento, o “mistério dos mistérios da 166 nossa santíssima fé” , e próprio da linguagem apaixonada e ao mesmo tempo indefinida, deixa transparecer a exaltação extasiada frente “ao Sacramento no qual Jesus derramou as riquezas do seu amor e tanto as 167 derramou que não pode dar-nos mais” . Sobretudo predomina na sua contemplação, a imagem de Jesus Eucaristia, que se faz: • nosso alimento, o maravilhoso prodígio, que o divino Redentor faz a nós, dando-nos o alimento da alma na mesa infinitamente mais preciosa do 168 seu santíssimo Corpo ; • modelo sublime de humildade, obediência e caridade, em ter se abaixado e escondido no Sacramento, obediente à voz do homem, dando-nos a prova do amor por nós, tornando-se intimamente uma só coisa 169 conosco ; 165 FO, 205-208; L. MARIANI, Ângela Merici, 97. FO, 392. 167 FO, 393. 168 “Vemos Jesus intimamente pertencer a nós como o alimento que cada dia nos sustenta. É assim. Jesus se fez alimento das nossas almas. Foi verdadeiramente estupendo o prodígio que Deus operou em favor do seu povo saciando-o no deserto com pão descido do céu; mas quanto mais maravilhoso é aquele que o divino Redentor faz a nós dando-nos o alimento da alma na mesa infinitamente mais preciosa do seu santíssimo Corpo. [...] Prostremo-nos, ó Filhinhas, diante dos sagrados sacrários deste Jesus feito nosso alimento, e escutemos o que nos diz: a mesa já está preparada: venham para as núpcias”, FO, 392-393. 169 Jesus Cristo no seu Sacramento Eucarístico dá as provas mais estupendas e evidentes das suas virtudes. Antes de tudo a mais estupenda e manifesta humildade, no ter se abaixado no Sacramento onde, Deus soberano e glorioso, se esconde sob as espécies frágeis de pouco pão e pouco vinho. Esta é de verdade humildade. Dá prova de obediência. No Sacramento é obediente à voz do homem, ou seja, o seu ministro, talvez o mais indigno, que o faz descer vivo, real, 166 48 • amigo que quer ser recebido na nossa casa, “fazendo-lhe homenagem em recebê-Lo no espírito acreditando nele, no coração, por amor , realmente 170 no corpo pela castidade, com o cuidado dos pobres pela caridade” ; • rei que convida todos ao banquete da graça, também os pobres e os enfermos na alma, contanto que sejam vivos à graça e, com o Sacramento 171 do Corpo e do Sangue, todos são curados e sarados ; • “fonte de bem” e “vínculo de comunhão” da Companhia e se recebe “desta fonte inesgotável de bens [...] a ajuda para formar uma Companhia verdadeiramente singular, virtuosa e santa, toda segundo o Espírito de 172 Jesus Cristo, unida com ele, vivente e operante com ele” ; • e vínculo de “unidade” da Igreja, porque este Sacramento é a alma vivificante de toda a Igreja, é o vínculo estreito da unidade de todos os glorioso na hóstia consagrada. Qual grande obediência! Mas a prova estupenda é a caridade. No Sacramento dá a prova maior do seu amor por nós, de não saber, de não poder amar mais, fazendo-nos uma só e íntima coisa, cf. FO, 457-459. 170 O Verbo feito carne, transformado em alimento e bebida celeste vem habitar realmente em cada um de nós, cheio de graça e de verdade. É, portanto pelas comunhões freqüentes que o constituímos verdadeiro patrão e esposo da nossa alma: o receber Jesus Cristo no espírito acreditando nele, é um fazer-lhe homenagem da razão pela fé; recebê-Lo no coração, guardando a graça santificante, é um fazer-lhe homenagem por amor; recebê-Lo realmente no corpo comungando à sua morte é fazer-lhe homenagem com a castidade; enfim, recebêLo em casa, tendo cuidado dos pobres é um fazer-lhe homenagem dos bens pela caridade, cf. FO, 105-107. ]171 “Não sabem ou se esqueceram que no meu Evangelho me representei sob a imagem daquele Rei que fez uma grande janta e convidou muitos? Esqueceram que, aqueles que rejeitaram com vãs desculpas [...], fiz encher a casa de pobres, enfermos, cegos, e coxos? Não se dão conta que com isso queria fazer compreender que não me indigno de admitir ao meu Convite Eucarístico os pobres, os enfermos, os cegos, os coxos na alma, no entanto que sejam vivos à minha graça e que, com o Sacramento do meu Corpo e do meu Sangue, os teria curado e sarado todos?”, FO, 394. 172 “Porque almejando a comunhão do grande Sacramento não se disponham a receber com essa uma grande abundância das graças que brotam desta fonte inesgotável e infinita de todos os bens? [...] Portanto bastará ó filhinhas, as suas comunhões bem feitas, para que não só individualmente, mas como Ursulinas, formem uma Companhia verdadeiramente singular, virtuosa e santa, toda segundo o Espírito de Jesus Cristo, unida com ele, tendo dito: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue está em mim e eu estou nele”, FO, 207-208. 49 fiéis com Jesus Cristo: um só o pão que nós comemos e um só o corpo que 173 formamos . É constante, no Fundador, o convite a contemplar quanto seja 174 grande e maravilhoso este mistério , a exaltá-lo e glorificá-lo, porque o Pão Eucarístico, partido por nós e distribuído, revela a insondável riqueza do 175 Amor de Deus no seu doar-se e fazer-se nosso alimento ; um Pão que alimenta a interioridade, porque é Jesus que nos faz uma só e mesma coisa 176 com ele e com o Pai , o Pão necessário para viver d'Ele, assimilar o seu modo de amar, fundamento da comunhão entre nós e da relação com os outros. Conclusão A dimensão eucarística tornou-se, no tempo, a consciência central e fundamental que “na Eucaristia se encerra todo o bem espiritual da Igreja, quer dizer o mesmo Cristo, nossa Páscoa e Pão vivo, [...] alimento e força do 177 nosso caminho de fé, de esperança e de caridade” . E é costume familiar para nós, a oração “a Jesus na Eucaristia,” inserida também na nossa 178 adoração comunitária . 6. “NAIGREJADE JESUS CRISTO” Seguimos Cristo servindo-O no “campo” da nossa missão: participamos da sua mesma missão que continua na Igreja, terreno onde 173 “Vocês sabem bem como o celebra a Igreja, o sacrossanto Banquete no qual se recebe Cristo, honra-se a memória da sua paixão, enche-se a mente de graça e da futura glória, nos vem colocado nas mãos um seguro penhor [...] Que maravilha, portanto, que esse Sacramento seja a alma vivificante de toda a Igreja e o vínculo estreitíssimo da unidade de todos os fiéis com Jesus Cristo. Eis que é um só o pão que nós comemos e por isso, todos juntos, formamos um só corpo”, FO, 207. 174 Cf. FO, 457. 175 Cf. FO, 393. 176 Cf. FO, 388. 177 RdV 20. 178 A Oração da Irmã Ursulina FMI, Verona 1991, 21. 50 nasceu e cresce o nosso carisma. A Igreja é o espaço onde Deus revela a salvação: Igreja histórica e concreta, dos tempos de Ângela e de Pe. Agostini; Igreja dos sinais visíveis, sacramentais da Graça; Igreja dilatada a dimensão universal: é esta a visão de Igreja que colhemos nas reflexões e exortações deles e que construiu em nós um forte “sensus Ecclesiae”, uma forte pertença eclesial. 6.1. Asanta mãe Igreja, em Santa Ângela O “sensus Ecclesiae” de Ângela tem as raízes na Palavra de Jesus transmitida pela Igreja que a faz ressoar abertamente aos ouvidos dos fiéis, para empenhá-los a uma vida de abnegação, em conformidade a Cristo, o 179 único caminho para o céu , ao qual nós devemos obediência: “Cada uma queira obedecer [...] ao que ordena a santa mãe Igreja, porque, diz a Verdade: 180 [...] «Quem escuta vocês, escuta a mim»” . No entanto a Igreja, concreta e histórica do tempo de Santa Ângela, era uma realidade com “manchas e rugas”: das heresias e de novas doutrinas 181 que miravam de um lado a demoli-la e do outro a reformá-la ; de homens e acontecimentos que conotavam a condição da Igreja como crise, próprio a partir dos responsáveis e pastores do rebanho. A forte pertença eclesial de Santa Ângela torna-a capaz de ver uma Igreja ameaçada pelo espírito do mundo. Isto é motivo para recomendar as responsáveis da Companhia de defender e proteger “as suas ovelhas dos lobos e dos ladrões”, “de gente mundana”; e não somente dos “hereges”, mas até mesmo dos “falsos religiosos”, aqueles que do interno, com a superficialidade da sua resposta ao chamado, enfraqueceram os valores de 182 fundo da consagração e a fidelidade na vida assumida . 179 Cf. Reg IV, 4-5. Reg VIII, 7ss. 181 “A Reforma Protestante acusa a Igreja desaprovando os abusos e as culpas de muita gente de Igreja. E condena culpa e culpados, atacando diretamente a Igreja e o papado, tentando descobrir princípios doutrinais católico. Ângela ao contrário, distingue Igreja e homem de Igreja”, L. MARIANI, O.S.U., As “Recordações” de Santa Ângela Merici, 97, 102. 182 Cf. Rec. 7º; Leg 10º; Cf. L. MARIANI, O.S.U., As “Recordações” de Santa Ângela Merici, 97. 180 51 183 184 Como Mãe vigilante e prudente sugere de deixá-los no seu estado não apenas se adverte um abandono de alguém sobre as verdades do Magistério eclesiástico. Compreende-se daqui a força e a atualidade de uma das suas mais notas expressões: “Mantenham a antiga estrada e costumes da Igreja, ordenada e conformada por tantos Santos por inspiração do Espírito 185 Santo. E façam vida nova” . Das suas palavras emerge, portanto a sua concepção de Igreja: nem teóloga, nem doutora, mas mulher de Deus reconhece que é o Espírito de 186 Deus a guiar a sua vida , e reconhece na realidade da Igreja o Mistério da 187 “comunhão dos Santos” . Para ela, mulher, as santas virgens e mártires, 188 Ágata e Lúcia, Inês, Cecília e Úrsula, e muitíssimas outras , são todas imagens da Igreja, Esposa de Cristo. Intui que é a união entre os crentes de ontem e de hoje que dão continuidade da Igreja no tempo. Assim Santa Ângela nos introduz de novo na simbologia nupcial, o “lugar” típico mericiano, no mistério da Igreja tornada Esposa na Paixão de Cristo e vivido por tantas Esposas de Cristo, que d'Ele aprendem a 'derramar-se' a si mesmas, para que o Reino venha. É correto ler as palavras “paixão” e “sangue”, em estreita relação com a Igreja, porque ela nasce aos pés da Cruz, do sangue de Cristo que dá vida a uma nova humanidade, segundo a promessa de Jesus: “Serei elevado [...] e 189 atrairei todos a mim” . 183 Cf. Reg Prol, 18. Cf. Rec. 7º, 18. 185 Rec. 7º, 22. 186 Cf. Rec. 7º. 187 Cf. D. BARSOTTI, A espiritualidade de Santa Ângela Merici, Morcelliana, Brescia 1980, 136; 188 E. TAROLLI (aos cuidados de) Ângela Merici, Cartas do Secretário 1540-1546, Ancora, Milão 2000, 36. 189 Jo 12, 32; A respeito da imagem da Igreja “esposa”, como escreve a Mariani, “deixemos a palavra ao teólogo Pe.Valentino Macca ocd: «No clima de renovação da Igreja do seu tempo, Ângela vive em si excepcionalmente o mistério da Igreja “esposa”. E isso constitui o eixo do seu pensar e agir, a nota mais forte da sua experiência e da sua espiritualidade, da sua maternidade de fundadora»”, Cf. L. MARIANI, Ângela Merici, 234. 184 52 Para essa Igreja Santa Ângela pede insistentemente a oração das Filhas: “Rezem e façam rezar, para que Deus não abandone a sua Igreja, mas 190 queira reformá-la como a Ele agrada” . As imagens de Igreja esposa, e de Igreja comunhão, que podemos deduzir nos breves escritos de Santa Ângela, levam a dilatar o nosso “sensus ecclesiae” e de pertença a Igreja universal e as nossas comunidades eclesiais, todas nascidas da Cruz, da riqueza do sacrifício de Cristo, que “ali” nos faz um e nos torna testemunhas, com a ardente fidelidade ao primeiro início; é “ali”, onde não podemos duvidar de encontrar ajuda, nos 191 tempos difíceis e duros, também da Igreja . Na perspectiva eclesial de Santa Ângela, aparece clara também a “vida nova” que Ela propõe qual novo fermento “dentro” da Igreja: o carisma virginal, como modalidade inédita de vida consagrada a Cristo e com Ele partícipes da obra redentora e libertadora, sobretudo da mulher. O “novo” de Santa Ângela, nos tempos em que a condição da mulher era decidida por outros, entre os “muros” de um claustro ou somente doméstica, consiste no poder escolher em liberdade o próprio modo de responder ao chamado de Deus, sem retirar-se do mundo, mas deixando-se encontrar por Cristo entre as pessoas, testemunhando-O e anunciando-O na Igreja. 6.2. “AIgreja, Esposa diletíssima de Jesus Cristo”, no Fundador A sua visão de Igreja emerge enquanto se dirige às ursulinas, as filhas que “fazendo imagem da santa Mãe, recolheram sempre na Igreja de Jesus 192 Cristo copiosos frutos de bênçãos e de saúde das almas” . “O que é a Igreja? A esposa diletíssima de Jesus Cristo, a qual para formar-se sem mancha e sem ruga, deu toda si mesma com a efusão do seu preciosíssimo Sangue [...]. Ora, se o maior empenho da Igreja é conduzir com todos os meios à salvação as almas, que ela gera para Jesus Cristo pelo Batismo, não é claro, então, que semelhante empenho devem ter as Virgens esposas de Cristo na caridade do Espírito Santo? 190 Rec. 7º, 14. Cf. Rec. 7º, 27. 192 FO, 530. 191 53 Vocês, benditas filhas, são deste número privilegiado e, portanto vejam se lhes convêm procurar com as suas possíveis forças, unindo-se ao espírito da Igreja, o bem, a santificação, a eterna salvação das almas, para dilatar o Reino de Jesus Cristo seu Esposo divino. Portanto, junto com a Igreja, também vocês devem entrar no campo das suas batalhas [...] sim, também vocês, também se enfermos e fracos instrumentos. [...] Filhinhas, Jesus Cristo ao vosso zelo confiou a causa da sua honra, da 193 sua Igreja, da salvação das almas” . Essas palavras, no tom convicto e no conteúdo sólido, abrem à dimensão de Igreja do Fundador. Ele vive “na Igreja”, fiel ao Papa, Vigário de Cristo, na terra. E isso compreende-se bem, no tempo de Pe. Zefirino, onde a Igreja se constituía como “ação” em defesa do seu rebanho, para contrastar antes de tudo os fenômenos da incredulidade e as tendências anticristãs difundidas pela cultura leiga e iluminista, e em seguida, para contrastar as posições anticlericais assumidas pelo novo governo italiano, em relação ao temporalismo da Igreja, representado do seu Chefe supremo: “Perseguida a Igreja com toda a força no seu Chefe o Sumo Pontífice, perseguida nas suas ordens religiosas suprimidas, nos seus bens roubados. Proclamada uma liberdade dissoluta para fazer o mal, acorrentada para o livre exercício do 194 bem” . Uma Igreja, comunidade dos crentes que, ao redor do Papa, constituem uma unidade bem compacta: “Unidos estamos a Jesus Cristo, 195 porque unidos por fé ao seu Vigário visível na terra, o Sumo Pontífice” . Sobretudo no dar indicações sobre o sólido fundamento da Igreja, Pe. Zefirino mostra plena adesão a misteriosa realidade instituída por Cristo: “Nós cristãos reconhecemos na Igreja a nossa Mãe. Ela é a preciosa conquista do sangue do seu divino Chefe, Jesus Cristo, a obra admirável da sua onipotência, contra a qual a força do maligno não poderá prevalecer. Isto 193 FO, 284-287. FM, Scr. 222. 195 Z. AGOSTINI, Visita pastoral, Escr. 606, in: «Positio super virtutibus ex officio concinnata», Romae, 1984, 200. 194 54 deve encher-nos de alegria pelos dons que nos são feitos, os mesmos que 196 Cristo faz a Igreja sua esposa” . Nas representações da Igreja que ele oferece aos fiéis e as suas filhas, algumas se tornam particularmente significativas: • mãe, que nasce do dom do Espírito: “Deste milagre nasce a Igreja da qual nascemos, crescemos, somos educados e, nos seus braços, queremos que 197 seja-nos dado morrer” ; • obra do amor de Deus e “que pelo amor é continuamente moderada”198; • templo vivo que cada um de nós é na Igreja199; • lugar onde se recebe a missão: no Cenáculo como os Apóstolos junto 200 com Maria e da força do Espírito, para dar testemunho a Cristo ; • campo onde a missão se cumpre: “em Jerusalém, ou seja, na Igreja de Deus, buscando o bem das almas, atraindo-as a Cristo e ajudando-as no 201 caminho da santidade” . 202 A Igreja comunhão é o “corpo místico” de Cristo e, portanto: sólida 203 n'Ele, sua Cabeça , una pela fé n'Ele, e pela vida de Graça: “os 204 grandíssimos bens que de Cristo cabeça derivam para a Igreja” ; universal, 205 pela “grande obra de ensinar todo o mundo” ; e santa: “santos somos da 206 mesma santidade de Jesus Cristo” . E ainda: “Talvez não sentimos todos uma inexplicável consolação de encontrar-nos na comunhão dos Santos, intimamente partícipes daquela unidade, daquela santidade da nossa Mãe, a 207 Igreja católica, apostólica, romana?” . O profundo “sentir com a Igreja” de Pe. Zefirino expressa-se no seu 196 FTP/ 6, 121. Ibid. 198 FTP/ 6, 123. 199 Ibid. 200 Cf. FO, 308. 201 FO, 309. 202 Cf. Ef 1, 22-23. 203 FP, 66. 204 Ibid., 132. 205 Ibid., 92. 206 FTA, Scr. Inédito,AOV. 207 Ibid. 197 55 empenho de Pároco, atento a defender o patrimônio da verdade da Igreja e a difundir, com a palavra e o ministério, a missão a ela confiada. O seu operar “para a Igreja” o vê Pastor incansável que tem cuidado do seu povo e o guia para a riqueza da Graça sacramental; sobretudo cuida de forma especial da “porção” mais fraca, necessitada do seu ministério, “a juventude”: para educar, para salvar, para fazer caminhar rumo a Deus. O grande empenho de educar: a nova tarefa que, como ele, tantos santos 208 Fundadores do seu tempo, sentem urgente fazer crescer na Igreja . Ele transmite a nós o seu “sentir-se Igreja”, para que participemos da 209 sua missão no “campo” de Deus: a juventude para educar . E do seu incansável ânimo de apóstolo, deriva o zelo: assinala toda 210 ursulina, já de Santa Ângela , mas também traço característico do nosso 211 212 Fundador, “zelantíssimo sacerdote , no seu dizer e, sobretudo no seu 213 apaixonado operar: pela Igreja, pela salvação dos irmãos, pela juventude . Nascidas na Igreja e do coração de um Pároco, não podemos não sentir-nos filhas da “Mãe, a Igreja” e apóstolas da sua missão evangelizadora, nas comunidades eclesiais, como o Fundador nos quer: “Os Apóstolos tiveram a missão de evangelizar toda a terra, e vocês, como Ursulinas, tem a missão de fazer todo o bem possível ao próximo, 214 especialmente à juventude” . 208 Cf. FO, 289-291; T. GOFFI, A espiritualidade do Oitocentos /7, EDB. Bologna, 1989, 51. 209 FO, 16, 144, 149. 210 Cf. Leg 3º. 211 “Em particular admira-se em Pe. Zefirino uma profunda piedade, um zelo aceso no ensinar a Palavra de Deus em particular na formação da juventude, assiduidade ao confessionário, docilidade e obediência aos superiores e à Igreja, diligência no desempenho de todos os deveres, grande prudência e sabedoria”, em: Positio, 103, 492. 212 “Zelo: ele abrange todo o possível ardor para a sua individual santificação [...] mas ao querer imitar os apóstolos que saíram do Cenáculo, nós vemos que eles se distinguem por um grande zelo para a maior glória de Deus, procurando a salvação das almas”, FO, 366. 213 Cf. FO, 284-289; 530-531. 214 FO, 193. 56 Conclusão O “sensus ecclesiae”, próprio de Santa Ângela e herdada pelo Pe. Agostini encontra agora uma expressão pastoral para o lugar onde a Ursulina vive e, sobretudo, pelo modo de pensar as atividades, com aquela mentalidade eclesial, bem sintetizada na nossa Regra de Vida: “Desenvolvemos a nossa missão educativa nas Igrejas particulares em harmonia com as linhas pastorais das Dioceses; [...] Atuamos nas paróquias, nas escolas e em todas as instituições e iniciativas que nos permitem realizar 215 a nossa missão específica” . 215 RdV 10. 57 I PARTE FUNDAMENTOS CAPÍTULO II Antropologia nos Escritos de Santa Ângela Merici e do Bv. Zefirino Agostini Ir. M. Agnese Bellini INTRODUÇÃO Antes do discurso de metodologia se impõe, por necessidade, aquele antropológico: querendo individuar modalidades particulares para fazer 216 crescer o homem não podemos omitir-nos de responder anteriormente à pergunta: quem é o homem que queremos fazer crescer? A antropologia precede a metodologia e a deve inspirar; é sobre a base da antropologia que 217 se formulam programas de formação e não vice-versa . Sejam os escritos de Ângela que aqueles do Agostini, dão razões de uma exemplar coerência em tal sentido. Em particular Pe. Agostini mais vezes dedicou-se a tratar do homem, da sua origem, do seu destino/fim último, da sua condição “atual”, tensão entre o “tornar-se santo” e o viver uma vida arruinada ao ensinamento das ilusórias promessas do mundo. Nos seus escritos podem ser individuadas as características de uma antropologia, dinâmica e diacrônica que conta a história da salvação e explica os vários aspectos do fenômeno humano como resultado de uma sucessão de acontecimentos. Tal antropologia, particularmente sensível aos temas das origens, da culpa e da redenção, representa o homem como imagem de Deus, criado, deturpado e 218 restituído à semelhança da única verdadeira imagem, Cristo . A nossa época se caracteriza por um forte acento da dignidade da pessoa, mas, ao mesmo tempo, é testemunha de uma crescente crise de identidade. O repropôr à nossa atenção a contribuição teológica - espiritual pastoral - educativa de Santa Ângela e de Pe. Zefirino tem por finalidade oferecer a possibilidade de refletir sobre a nossa identidade de pessoas criadas a imagem e semelhança do Criador. A narração da Criação e a humanidade nova gerada em Cristo iluminam a nossa identidade de criaturas e filhas e sobre esta verdade é possível realizar a existência, dar-lhe sentido, significado, aprender a sabedoria e abrir-se à eternidade. 216 Com este termo entendemos o gênero humano: masculino e feminino. Cf. L.M.RULLA, Antropologia da vocação cristã I. Basi interdisiplinar, EDB, Bologna 1997, 339. 218 Cf. G. BARBAGLIO e S. DIANICH ( a cura de), Novo dicionário de teologia, Paulinas, Milão, 1991, 26. 217 61 A identidade criatural e pessoal do ser humano, restituída a nós pelo Mistério Pascal de Cristo, torna-nos capazes de acolher a vida como 219 chamado e de levá-la a plenitude no seguimento . 1. CRIATURAS DE DEUS A experiência fundamental que ilumina a reflexão sobre o educativo típico da Ursulina Filha de Maria Imaculada é aquela contida nos primeiros capítulos do Gênesis. Estes capítulos refletem bem “o princípio” e o fundamento de cada reflexão, de todo caminho e de toda educação. Não nos contam “os inícios”, mas “o início”, e isto é o sentido último das coisas, a raiz profunda dos nossos desejos, problemas, expectativas, medos. Dizem “quem somos” e “porque somos”. O discurso é primordial: não se refere às perguntas “penúltimas”, mas aquelas “últimas”; as perguntas que estão à 220 base e antes de todo outro discurso, de todo outro projeto . À luz da sabedoria adquirida da experiência e da reflexão de fé, conta “o início” da vida e da história, do tempo e do espaço, reconhecendo que 221 Deus criou o homem a sua imagem e semelhança . Do “nada” Deus criou o homem a sua imagem e semelhança, somos “nada” feitos “deuses”, chamados a viver nós mesmos uma “vida divina”. O chamado a existência, que encontra em Deus a sua origem, encontra n'Ele também o seu modelo: se “somos” é por amor vontade de Deus que nos chamou “das trevas à sua luz 222 admirável” fazendo-nos “a sua imagem e semelhança”, o Criador, 219 O discurso que Deus dirige ao homem é revelação do seu desígnio de salvação. De fato na revelação não se trata diretamente de Deus em si mesmo, mas em quanto ele “revela o seu rosto” ao homem, doando-se a ele. Segundo um pensador israelita, “a Bíblia é em primeiro lugar não a visão que o homem tem de Deus, mas a visão que Deus tem do homem. A Bíblia não é a teologia do homem, mas a antropologia de Deus que se ocupa do homem e do que ele pede, mais do que da natureza de Deus”, Cf. Novo Dicionário de Teologia, 27. 220 Cf. M. GRILLI, A sua imagem os criou. Princípios de antropologia bíblica à luz do Gênesis 1-3, em: AA.VV. Educar-se para educar. A formação num mundo que muda, Paulinas, Milão 2002, 12. 221 Cf. Gn 1, 26. 222 1Pd 2, 9b. 62 imprimiu em nós o seu sigilo que é ao mesmo tempo dom e chamado: amados, criados e conhecidos por Deus, somos feitos capazes de conhecêlo, amá-lo e servi-lo, numa vida de intensa relação com ele que é o nosso Pai, e com os homens que são nossos irmãos. 223 Todas somos criaturas de Deus, afirma Santa Ângela na oitava Recordação, falando das virgens e exortando as coronelas a assumir o seu cuidado, mas já antes, na oração do quinto capítulo da Regra, se dirigia a Deus lamentando-se do fato que existem miseráveis criaturas que não o 224 conhecem . “Deus é o meu Criador, o meu verdadeiro Pai, frisa Pe. Agostini. De fato se eu me elevo com o pensamento dos efeitos às causas; se subo todos os degraus dos seres; se eu alcanço o primeiro elo, chego a Deus: eu encontro Deus antes de tudo, Deus princípio de tudo, que se o perguntassem: Quem és? Me responderá como respondeu a Moisés: “Eu sou Aquele que sou” (Ex 225 3,14)” . Portanto, se Deus é o ser, o ser único antes da criação, ele é ao mesmo tempo o Criador do mundo e aquele que fez o homem do nada. Esta é a profissão de fé do Pe. Agostini: tirado do nada, o homem não tem em si o fundamento do próprio ser, nem menos foi gerado do caos e/ou vive no caos, mas tem em Deus a sua origem, Deus que ordenou tudo aquilo 226 que existe para um fim de grande sabedoria . Cada um de nós era um 227 nada . Nada de alma, nada de corpo, nada de obras, mas agora existe, vive, porque Deus o tirou fora do abismo do nada. Esta verdade protege o homem do simples viver como resultado de uma cega necessidade e o preserva do sentimento de abandono de quem pensa a existência humana como um “ser jogado” no mundo, porque aquele que devemos nós mesmos, aquele do qual recebemos tudo aquilo que possuímos nos tirou do nada por causa da 223 Cf. Rec. 8. Cf. Reg. V, 31. 225 Ao povo nas várias circunstâncias, Escritos do Fundador Pe. Zefirino Agostini, fascículo de uso manuscrito, FP, 50. 226 “A família humana, por quanto grande e extensa não é dominada pelo caos, mas é guiada por um olho vigilante que toma cuidado de cada um, das coisas grandes e daquelas pequenas, porque tudo está em Deus que está em toda parte, que tudo vê, que em qualquer lugar está presente e que, com a sua providência, forte e suavemente, tudo determina para um fim de grande sabedoria”, FP, 39. 227 Cf. FG/ 4,96. 224 63 caridade eterna que ele mesmo é. Nas palavras de Pe. Zefirino: “Disse-me o 228 meu Deus: “Olha, sendo eu eterno, com caridade eterna eu te amei” . O motivo pelo qual Deus nos criou é porque ele nos amou. Eis o tudo. Portanto, nós estávamos desde a eternidade no coração de Deus e do seu coração nos tirou para colocar-nos entre as mais preciosas criaturas do 229 universo” . 2. CHAMADO À PERFEIÇÃO Aquilo que é ao início da nossa existência, torna-se com o tempo o nosso fim: criadas por Deus, chamadas à relação com Ele, até gozar da mesma glória no céu, numa vida motivada a re-amar aquele que nos tem amado, é o fim da nossa existência. O Fundador e Santa Ângela usam expressões semelhantes para indicar a meta que o homem é chamado a alcançar depois da existência terrena: o homem é “feito” para o céu e para gozar da glória de Deus no Paraíso. Nas palavras de Santa Ângela: é Deus que inspira no coração a luz da verdade e que dá a vontade de desejar a pátria celeste; o homem busca de 230 231 conservar dentro de si tal voz de verdade e tal bom desejo . Nas palavras do Agostini: “Eu sou uma viva imagem de Deus, dotada de uma alma racional e imortal, destinada a gozar da sua glória eternamente 232 no Paraíso” . Ser imagem de Deus para gozar da sua glória no céu, isso parece reassumir o conteúdo/significado da existência humana, para Pe. Zefirino. Portanto, é necessário para o homem que eleve a mente e o coração 228 FO, 278. Cf. FP 50. 230 Para Santa Ângela “se conserva” aquele que voluntariamente abraça os meios que necessita. 231 Cf. Reg. Prol. Nas Recordações acrescentará: “ Digam a eles que desejem verme não na terra, mas no céu, onde está o nosso amor. Coloquem no alto as suas esperanças, e não sobre a terra. Tenham Jesus Cristo como único seu tesouro, porque assim terão n'Ele também o seu amor” , cf. Rec 5, 41-43. 232 FG/ 4,96. 229 64 233 às coisas do céu e que contemporaneamente vive a perfeição que é a Ele solicitada em força do ser “imagem de Deus”: fora disso, para o Fundador, não existe nem salvação, nem felicidade. “Por qual fim Deus nos criou” é o título de muitas predicações, homilias, instruções às diversas pessoas às quais, Pe. Agostini dirigia-se no seu ministério. O título retomava uma pergunta da Doutrina Cristã que ele utilizava para instruir nas verdades da fé. Numa destas instruções podemos ler: “Deus me criou e me colocou no mundo, para conhecê-lo, amá-lo e servi-lo nesta vida, e depois gozá-lo para sempre na celeste pátria do Paraíso. O fim é este: salvar a alma com o eterno prazer de estar com Deus no Paraíso. Os meios são estes: ocupar-se por todo o tempo que vivemos no 234 mundo em conhecer, amar e servir a Deus” . Ainda outro texto vem em nosso auxílio para compreender o significado do ser criadas a imagem de Deus: “Vocês são a imagem de Deus, mas se são tais e se Deus é fonte de toda perfeição, lhes é dito: 'sejam 235 perfeitos'” . Com estas palavras ele queria afirmar que para conseguir a glória do céu é necessário, para o homem, empenhar-se a 'imitar todas as perfeições da Trindade”. Próprio porque “somos feitos a sua imagem e semelhança”, Deus nos infunde de “desejar ardentemente a perfeição mais alta que podemos alcançar, para buscar de imitar a perfeição mesma de 236 Deus”. Imitar a perfeição de Deus , para Pe. Zefirino, outra coisa não é que viver a santidade: “ para imitar todas as perfeições da Trindade, nós devemos viver a santidade: 'Santifiquem-se, portanto, e sejam santos, porque eu sou santo. Não é a potência que devemos buscar e não possamos 237 imitar a altura, nem a ciência, mas a santidade de Deus'” . Podemos ler ainda num outro texto: “(...) o fim mais sublime ao qual 233 Escreve a este propósito o Pe. Agostini: “ (...) pensar às coisas do céu. Estimamos este tesouro porque: 'onde está o vosso tesouro, lá está também o vosso coração' e ainda: ' vocês sabem que não ao preço de coisas corruptíveis, como a prata e o ouro, foram libertados da sua conduta vazia herdada dos seus pais, mas como sangue precioso de Cristo, como do cordeiro sem defeito e se mancha”, FTA/ 7, 58-59. 234 FP, 31. 235 FTA/ 7, 93. 236 FG/ 4, 24-25. 237 FTA/ 7, 14. 65 (...) gostaria de aplicar-lhes: “ sejam santos, porque eu sou santo” (Lv 19,2). Isso é tão necessário que Deus mesmo com amor indivisível quis fazer-se nosso exemplo tornando-se semelhante a nós. É necessário portanto que o 238 imitemos: ele é o Santo dos santos e o mais perfeito na santidade” . 3. CHAMADO À LIBERDADE “Ainda outro aspecto nos primeiros capítulos do Gênesis é a ligação entre liberdade e relação. (...) A liberdade é antes de mais nada uma questão de relações, e isto reverte a uma dimensão comunitária. A perspectiva bíblica é aquela de uma “liberdade em relação” que não tem nada a ver com uma lógica liberdade individualista. A liberdade sem reciprocidade é um sem sentido. A arrogância de Adão que quer apropriar-se da posição divina, desocupando o terreno da relação a um “Tu”, leva o homem ao fracasso total. (...). É na relação com Deus que o homem encontra o sentido da 239 vida” . Todavia, para o homem a escolha de Deus e para Deus não é, nem obrigatória, nem automática. Por sua natureza, pela liberdade que Deus mesmo lhe doou e que caracteriza a relação com Ele, pela mesma 240 fragilidade/limitação da sua condição , o homem, apesar de ser 241 naturalmente voltado para Deus , contra Ele ao mesmo tempo se revolta, se 238 FG/ 4, 27. GRILLI, M. A sua imagem os criou, 21. 240 A contribuição de Alessandro Manentti ilumina esta questão: “os dois interlocutores participam ao diálogo com um diferente grau de auto-presença: Deus que dialoga sempre perfeito, o homem que dialoga sempre com desilusão. Deus está todo próximo ao homem porque está totalmente próximo a si mesmo. (...) Ao contrário, o homem, ontologicamente dividido em si mesmo e teologicamente assinalado da concupiscência, é um que se contradiz, somente e sempre parcialmente presente a si e aos outros através de atos sucessivos de liberdade pode, por degraus, traduzir em experiência pessoal a prévia presença nele de Deus”, Cf. A. MANTENTI, Os fundamentos antropológicos da vocação, Texto para o seminário deAntropologia,1. 241 Escreve numa homilia ao povo o Pe. Agostini: “E tu que fizeste o coração para amar o Sumo Bem, que esta lei sentes falar no teu coração, que sente a necessidade de amar um objeto que te possa tornar plenamente feliz, tu nega 239 66 afasta, muitas vezes busca em outro lugar o seu fim, o sentido da vida, a felicidade. Disto se lamenta Pe. Zefirino num dos seus escritos: “Nós estamos no mundo, criados e sustentados para alcançar o nosso último fim que é Deus. Sabemos que Ele, sendo nosso Criador, deve ser servido e amado por nós, sabemos que ele é nosso Pai, nosso Senhor ao qual todas as coisas são submetidas e ao qual nós, enquanto criaturas racionais, devemos obedecer. O homem, porém, com o pecado se revolta a este mandamento, deixando-se guiar pelas paixões que parecem ter a senhoria sobre ele e sacudindo longe de si o jugo do Senhor. Nós, de uma parte não queremos abandonar Deus, do outro, 242 preferimos a senhoria das paixões. E assim servimos a dois patrões” . A imagem dos dois patrões à qual recorre o Fundador para dar razão da presença no homem de impulsos motivacionais às vezes opostos, abre um capítulo indispensável que tenta fazer luz sobre o “mistério” do homem: o tema da complexidade e da problemática da condição humana, “complexidade e problemática, as quais, em última análise, tem a sua raiz no 243 coração do próprio homem” . É próprio no interior do homem que muitos elementos se contrastam mutuamente. Experimenta os seus limites, se dá conta de ser sem confins nas suas aspirações, é chamado a uma vida superior. Fraco e pecador, muitas vezes faz aquilo que não quer e não faz 244 aquilo que quer . Criado para gozar da glória de Deus, dirige muitas vezes o seu coração à vanglória das “alegrias deste mundo, da ambição no aparecer e 245 mostrar vantagens para ser estimado, louvado, aplaudido, mirado” dos outros homens. obediência ao preceito que Deus te pede de amá-lo, quase como fosse um preceito difícil, inútil, injusto? (...) Mas o coração, o coração ama naturalmente, sem instruções, sem arte e tu meu Deus o dotaste desta facilidade para torná-lo mais sensível fim do primeiro instante esta doces palavras do augusto e sublime vosso preceito: <Ama o Senhor teu Deus>, FP, 111-112. 242 FTA/ 7, 65. 243 L. M. RULLA, Antropologia da vocação cristã, 49. 244 Já São Paulo escrevia: “Eu não consigo entender nem o que eu faço: de fato não faço aquilo que eu quero, mas aquilo que eu não quero”, Rm 7,19. “De fato eu não cumpro o bem que quero, mas o mal que não quero”, Rm 7,19. 245 FM, 287. 67 Esta é a condição do homem: chamado a aspirar aos bens celestes, através do conhecer, do amar e do servir a Deus, muitas vezes se encontra a correr em direção de uma glória toda terrena feita de amor próprio e de apego as coisas terrenas que são destinadas a perecer. “O coração de um verdadeiro e prudente servo de Deus se humilha e aniquila interiormente a consideração de si e ao gosto da própria reputação, porque espera e se espera de Deus bem outro gosto e mais verdadeira glória e 246 honra” : assim sintetiza Santa Ângela. 4. CHAMADO À RELAÇÃO EM CRISTO Deus, pelo grande amor com o qual nos tem amado, não deixou de nos atrair a si com laços de amor e, também depois que nos fechamos à relação com Ele numa vida de autonomia individualista, que nega a verdade de nós mesmas, sermos criaturas, diferentes de Deus, necessitadas da sua proximidade e de sua ajuda, não deixou de tomar cuidado de nós para demonstrar o seu amor e chamar-nos sempre de novo para o nosso fim: ser uma só coisa com Ele. O maior sinal do seu amor por nós é aquele do dom que nos tem feito no seu Filho: Jesus Cristo. Ele, em obediência ao Pai, “tomou sobre si o 247 peso da salvação do mundo” . Mortos que éramos pelo pecado, condenados à infidelidade que é o resultado de quem nega a própria pertença a Deus e quem vive a vida negando a verdade da relação original que nos fez existir, Jesus, verdadeiro homem e verdadeiro Deus, na sua vida, morte e ressurreição. Ele deu novamente ao homem o verdadeiro sentido do próprio viver e morrer. Tendo dado a nós um exemplo de santidade amor, de uma vida de filho obediente, de uma relação de plena comunhão com o Pai, Cristo é aquele que com autoridade pode dizer: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai senão por meio de mim. Se me 248 conhecêsseis, conheceríeis também o Pai” . 246 Rec 1, 12. FTA/7, 12. 248 Jo 14,6. 247 68 Afastando-se de Deus, o homem havia perdido a “saúde da própria alma”, condenou-se a infelicidade e tinha perdido a estrada que podia leválo à vida eterna. Jesus tinha restabelecido o pacto das núpcias eternas que Deus quis desde sempre com o homem: ele é o “esposo” que deseja fazer suas todas as almas. Aquela que em Santa Ângela é indicada como a 249 condição privilegiada das virgens da Companhia , no Fundador torna-se o chamado de cada um: a todas as almas Jesus diz “quero torná-la minha 250 esposa” . Em Jesus, Deus manifestou a perfeição do amor e pede a nós, no seguimento do Filho, de conhecê-lo e de amá-lo para tornar-se com Ele, no Espírito, uma coisa somente. 251 “Ninguém pode ir ao Eterno Pai senão por meio de Jesus Cristo , com a imitação de Jesus Cristo, com a semelhança de Jesus Cristo”, exorta o Fundador, continua pois argumentando: “Como avançar na imitação? Devemos estudar este divino modelo, é necessário provar profundamente 252 esta necessidade de todas as perfeições” , porque “Ele é o santo dos santos 253 e o mais perfeito na santidade” . 5. CHAMADO À IMITAÇÃO DE CRISTO Próprio à imitação do Cristo protege o homem de perder a sua vida e lhe permite de alcançar o seu fim. É ainda o Fundador a exemplificar a imitação indicando-a em quatro pontos, correspondentes a quatro valores que, acolhidos e seguidos, expressam as características de uma identidade que se constrói a respeito da imagem e semelhança de Deus. 249 “Sendo vocês assim eleitas para ser as verdadeiras e intactas esposas do Filho de Deus, {...} chamadas para tal glória de vida, de ser esposas do Filho de Deus (...) verdadeiras esposas do Altíssimo, Reg. Prol 7, 17,23. E ainda: “São esposas (...) do imortal Filho do eterno Deus, (...) esposas do Rei dos reis e Senhor dos senhores”, Leg 4, 12-14. 250 FG/ 4,23. 251 Ibid. 252 FS, 157-158. 253 FG/ 4,27. 69 5.1. Glória A Glória a qual o homem é chamado é bem mais alta daquela que o mundo quer oferecer e, para enamorar-se de uma e desprezar a outra, o Fundador indica como exemplo a seguir aquele de Jesus, o qual, próprio para ensinar a fugir de uma glória passageira e a não buscar de ser estimados e conhecidos pelo mundo, por trinta anos conduziu uma vida humilde e 254 escondida , tanto que para o olhar humano podia parecer inútil, de pouca validade. A humildade é a virtude por excelência, para o Fundador, e pela importância que reveste no conduzir-nos para uma vida sucedida, ele não cessa de elogiar-nos em qualquer circunstância; deseja que em cada um que quer imitar o “homem-Deus”, esta virtude, fundamento de todas as outras, antecede e siga cada atividade. Essa contribuirá a ter “a prudência como 255 guia, o zelo por companheiro, a piedade nos olhos, Deus no coração” . 5.2 . Verdade Condição indispensável para poder alcançar o objetivo da vida e conhecê-lo é a verdade. É a ignorância, para o Fundador, o mal entre os mais pestíferos e difusos entre os homens. Esta mergulha o ser humano nas trevas do erro, não lhe permite nem de desejar, nem de perseguir o fim da união com Deus. “A doutrina celeste”, ao invés, “dispersa as trevas da ignorância e 256 ilumina o intelecto com a verdade da fé” . É por esse motivo que entre os empenhos aos quais o homem é chamado a dedicar-se é aquele de atingir à “ciência da salvação”, esse representa o primeiro de todos os deveres. Jesus, ainda uma vez, é ele mesmo o modelo do homem apaixonado da ciência divina, interessado em conhecer e penetrar os mistérios da fé, enamorado de tudo aquilo que diz respeito ao ocupar-se das coisas do seu 257 Pai . É assim que, mesmo sendo Mestre, Jesus no Templo escutou os Doutores, para ensinar que cada um deve ter um grande desejo de instruir-se 254 Cf. FG/4, 28; também “Humildade e graus no vivê-la”, in: FG/4, 37-39e “Humildade como condição para receber o tesouro da graça”, in: FG/4,71. 255 FS, 28. 256 FTA/7, 23. 257 Cf. Lc 2, 49. 70 e para indicar que o primeiro empenho deve ser aquele de aprender a ciência 258 da salvação . 5.3 . Obediência Jesus é o homem obediente por excelência, aquele que faz da escuta 259 da vontade do Pai o seu alimento cotidiano , aquele que antes de tomar decisões importantes, retira-se em oração para encontrar no diálogo com Deus a força para viver a obediência na paixão e até no aparente abandono do Pai. Para dar-nos o exemplo de uma vida de obediente, aquele que deveria ser de todo homem, o Nazareno viveu a submissão não somente “ascendente”, em confronto com o Pai, mas também “descendente”, aquela em confronto das pessoas e das outras criaturas que popularam a sua história terrena. O Fundador exorta: “Tenham diante dos seus olhos o exemplo de 260 um Deus, que obedece as suas criaturas . “A obediência é no homem como uma grande luz que torna boa e aceita cada sua ação: [...] cada coisa nossa para que seja boa, deve ser feita 261 sob a obediência” : estas são as palavras de Ângela sobre a obediência no 8º Capítulo da Regra. Continuando a leitura nos defrontamos num longo elenco de 'pessoas' às quais deve-se obedecer, elenco que remete também para Santa Ângela, a obrigação para cada pessoa de uma obediência não somente 'ascendente', mas também 'horizontal' e/o 'descendente'. 5.4 . Dom gratuito “Sacrifício e oferta não agradam, um corpo ao invés me tens 262 preparado” : este ou outros textos da Escritura que diz oferta total, dom de si, amor levado à extrema conseqüência poderiam ser inseridos comentando 258 Cf. FG/4, 28. Cf. Jo 4, 34. 260 FG/4,29. No mesmo texto havia escrito ainda:”Retornou a Nazaré e era a eles submisso. Ele, o Filho de Deus, do qual se dizia: 'Quem é aquele que dá ordens aos ventos e as águas e eles obedecem?'”. 261 Cf. Reg. VIII, 7-16. 262 Sl 39,7. 259 71 este quarto aspecto do qual Cristo é para todo homem, o modelo. Ele é o Cordeiro imolado, a vítima sacrificada, aquele que dá a si mesmo como alimento e bebida, aquele que não retém nada para si, mas que é e m si mesmo todo dom. O homem cumpre a própria vocação quando, a imitação de Cristo, “esbanja” a própria vida, não retendo nada para si, mas fazendo-se oferta gratuita/agradável. Este é o modelo de homem que Santa Ângela e o Fundador encorajam a imitar. Então, “se queremos nós viver a mesma vida de Cristo é necessário que nos despojemos do homem velho, para revestir-nos d'Ele, que é o homem espiritual e celeste: numa palavra, é necessário que sejamos santos 263 da santidade de Deus” . 6. CHAMADO A UMA VIDA ESPIRITUAL O fazer crescer o homem à plena estatura de Cristo, o santo dos Santos, cumpre-se através de um longo caminho de formação que requer o fazer próprios os meios necessários à finalidade. Assim exorta Santa Ângela: “Porque Deus [...] lhes concedeu a graça de separar-lhes das trevas deste mundo [...] exorto-lhes [...] a fim que por primeiro queiram conhecer o que comporta tal eleição, e que nova e estupenda dignidade seja. Pois, que se esforcem, com todo seu poder, de conservar-se segundo o chamado de Deus, e que busquem e queiram todos aqueles meios e aqueles caminhos que são necessários para perseverar e progredir até o fim [...]. De fato, poderá conservar-se só aquela pessoa que desejará também abraçar os meios e as vias que são necessários, porque pouca ou nenhuma diferença existe entre o dizer francamente: “não quero mais servir a Deus, e o não querer seguir as vias e as Regras necessárias para poder-se manter em 264 tal estado” . Dom recebido, mas também compromisso ao qual corresponder e colaborar, o ser santos, fim por excelência da nossa vida, realizar-se-á através do crescer das virtudes em virtudes, enfatiza o Fundador. Avançar 263 264 FG/4, 31. Reg. Prol. 4-14. 72 de virtude em virtude e acumular tesouros no céu com obras de bem: esta, para ele, “é a única estrada a percorrer para chegar a ver e contemplar o Senhor na sua glória. [...] O que são os outros bens possuídos pelos quais suam e fadigam tantos amantes do mundo? Tudo é vaidade e um perseguir o 265 vento.Aquilo que não é eterno é um belo nada” . Dom recebido, reconhecido, elaborado, levado a plenitude: esta é a parábola de toda existência que se reconhece doada. A graça do Espírito, o dom do Pai e do Filho, acompanha a existência do homem e do seu interior, se escutada, acolhida, aderida, plasma a pessoa à imagem e semelhança doAmor. É a vida espiritual aquela que permite à criatura de elevar-se até Deus; é a vida no Espírito que consente ao filho de modelar a própria pessoa sobre aquela do homem-Deus; é à luz do Espírito que o homem compreende a verdade de si mesmo, aquela de já ter sido amado e aquela de saber e poder amar. Portanto, os meios que Santa Ângela exortava a fazer próprios para perseverar e conservar-se segundo o chamado de Deus são aqueles que, aderindo às moções internas da graça que nos foram doadas, permite-nos gozar do mesmo dom e tornar-nos santos da mesma santidade de Deus até gozá-lo para sempre na vida bem-aventurada no céu. Assim resume Pe. Zefirino: “Quanto mais graça tenham em vocês, mais generosamente podem cumprir as obras de bem; mais a sua vida será santa, mais tenham a 266 certeza de uma bem-aventurada imortalidade” . 6.1 . Silêncio e Palavra: a oração como relação com Deus Meio privilegiado, graças ao qual o homem pode crescer até à plena estatura de Cristo, é aquele de dar-se um tempo para “estar com Deus”, para aprender aquilo que a Ele agrada, para escutar aquilo que Ele quer dizer-nos, antes de tudo, para ouvir a palavra da verdade sobre nós mesmos que nos fez e nos faz existir. A oração é a realidade presente entre silêncio, palavra e Palavra, entre o fazer espaço e acolher, entre o contemplar e o ser 265 266 FG/4, 43-44. FG/4,36. 73 contemplados, realidade que permite de conhecer o “Amador” e assim reamá-lo. Santa Ângela nos deixou passos significativos a propósito da oração, seja vocal ou mental: “A oração é companheira do jejum [...], com o jejum se mortificam as tendências da carne e os próprios sentimentos, assim com a oração se impetra de Deus a graça da vida espiritual. (Ocorre) rezar sempre com o espírito e com a mente devido a contínua necessidade que se tem da ajuda de Deus. ( Reconheceis a) necessidade da oração vocal com a qual se 267 despertam os sentidos e nos dispõem à oração mental” . “Minhas filhas, exorta o Fundador, é necessário ir a Jesus, é necessário buscá-lo, é necessário invocá-lo. [...] Vocês podem escutar conselhos, pregações, instruções, mas não poderão enamorar-se do Senhor, 268 se não vão invocá-lo” . Para convencer o homem da necessidade de não descuidar o importante meio da oração, Pe. Zefirino não poupa exortações, reprovações, argumentações: a oração, declara Pe. Agostini, “é necessária a alma assim como o alimento é necessário ao corpo. Sem o alimento o corpo morre. Sem 269 a oração a alma desfalece” . A oração, todavia, não somente como escuta silenciosa de Deus por parte do homem, mas também como expressão vocal e/ou mental do homem em confronto com Deus e próprio porque a pessoa acolheu no silêncio e não foi surda no espírito, pode abrir a sua boca para o louvor, agradecer, invocar, pedir o perdão por não haver correspondido ao amor. “Entre os cristãos são tantos os surdos e mudos, mas eles recusam a graça do benefício que poderia curá-los. [...] Aqueles que são mudos não rezam, não o louvam, não o agradecem, não confessam as suas culpas e as calam por temor e vergonha. [...] Jesus querendo libertar aquele homem, (o surdo-mudo) começou a abrir os ouvidos. O modo como Jesus libertou aquele homem da surdez, representa um sadio ensinamento também para nós. Levou-o a parte longe da multidão. Assim deve fazer aquele que é surdo e mudo no espírito: afastar-se do tumulto do mundo e dos seus vícios consentidos. 267 Reg. V, 2-8. FG/ 4,10. 269 FG/ 4, 9. 268 74 Na solidão, a alma escuta de verdade a Palavra de Deus e toma 270 consciência das suas falhas” . Na relação com Deus, a importância atribuída do Pe. Zefirino à oração é descrita com a imagem da fonte, expressão da Providência Divina, que está sempre pronta a doar-nos a sua água, mas pede a nossa colaboração: “A fonte está sempre pronta a difundir as suas águas, mas se o jardineiro não 271 faz o sulco para fazer chegar a água às plantas, estas morrem de sede” . 6.2 . Vigilância sobre as paixões “A verdade vos fará livres”: somente quem conheceu, acolheu, aderiu à verdade de si mesmo, do ser objeto de amor, de poder e de saber amar, é verdadeiramente livre. A liberdade em sentido bíblico-antropológico é somente relação, acontece somente ao interno de uma relação e tem como dimensão importante a responsabilidade: o homem é responsável do dom que recebeu e ser livre significa colocar-se ao serviço do dom, ser responsável do dom. Na vigilância das paixões temos um instrumento que faz espaço à ação de Deus, abre-nos a verdade de nós mesmos para reconhecer qual é o patrão que estamos servindo: “Quem segue as suas paixões e o seu amor próprio encontrou um patrão que é tirano e que se faz sentir com todo o peso e não se dá conta que se tornou escravo sozinho. [...] Deus pede de frear os sentidos: olhos, mãos [...] de ser humildes com os pais, de ter respeito pela Igreja. Os sentidos, ao contrário, pedem de permitir-nos toda liberdade e 272 experiência” . Santa Ângela bem o sabia quando, a propósito dos afetos e das paixões, rezava para que Deus os confirmasse, porque os afetos e as paixões que não são direcionados a servir a Deus, que afastam-nos para não 270 FTA/ 7, 57-58. FG/4, 16-17. Escreve sobre o mesmo tema Pe. Agostini: “[...] colocando-se na presença de Deus com um ato de fé viva, adorando a sua infinita majestade e pedindo a sua ajuda [...], exercitem de modo distinto com ordem as potências da sua alma: memória, intelecto e vontade”, FG/4,16. 272 FTA/7,66. 271 75 conhecer o seu amor, ao invés de tornar-nos livres, tornam-nos escravos: “Meu Senhor [...] confirmai os meus afetos e os meus sentidos, para que não se desviam nem a direita e nem a esquerda, nem me afastem da teu luminosíssimo rosto, que torna feliz todo coração aflito. [...] digna-te de receber este meu coração [...] e de queimar todo seu afeto e toda sua paixão 273 no ardente fogo do teu divino amor” . 6.3 . Vida Eucarística A promessa que fez Jesus de permanecer com o homem até o fim do mundo se torna realidade concreta e ao mesmo tempo misteriosa no sacramento da Eucaristia. Cristo que se faz alimento para o homem, num frágil pedaço de pão, torna-se modelo da existência de quem quer assumir em si mesmo os sentimentos do Filho: “Jesus Cristo no Sacramento Eucarístico deve ser a forma, o modelo da nossa vida, assim que n'Ele possamos dizer com verdade aquilo que diz o apóstolo Paulo: “Não sou eu 275 que vivo mas é Cristo que vive em mim” (Gal 2,20)” . O modelo que Jesus dá de si mesmo na Eucaristia é daquele que compreendeu o sentido da própria vida como um fazer-se dom, aquele que não retém nada para si, mas que tudo restitui em oferta agradável ao Pai para levar a cumprimento em nós a obra de Deus, de ter-nos criados a sua imagem e semelhança: “A ceia que Jesus propõe, é aquela da sua carne e do seu sangue; nenhum pastor apascenta as ovelhas com seu sangue, mas deixa que as mães nutram as ovelhinhas. Jesus Cristo ao invés quis dar-se a si mesmo como alimento e bebida, para que de nós possamos dizer com verdade: “Não está talvez escrito na lei: 276 Eu disse: vocês são deuses?” . À luz deste admirável sacramento, “o Deus do amor que vive no meio de nós como o Deus escondido”, o homem dilata a sua alma no amor do Senhor e vê atendidos os desejos do seu coração. Para convencer desta misteriosa realidade, o Fundador tem uma página de autêntica mística: 274 273 Reg. V, 18ss. Cf. Mt 28,20 275 FG/4,66. 276 FTA/7, 17-18. 274 76 “Contemplem a surpreendente beleza e variedade das flores. Elas recebem todo o seu apreço da influência do céu. Não se agitam, não se movem do lugar, não se atormentam, mas sempre pacíficas no seu estado, se expandem gradativamente sob o sol que as aquece e, pouco a pouco, no fundo do seu cálice, amadurece o fruto. E assim, vejam, que se dilatam as almas que amam, diante dos tabernáculos do Amor divino. São tranqüilas e recolhidas diante do sol da bondade divina e, identificadas com Ele na comunhão, absorvem, com delícia, os raios que emanam dele. Descem as invisíveis operações da graça, tornam-se boas caminhando com a bondade, amáveis caminhando com a caridade, misericordiosas, caminhando com a divina 277 misericórdia” . 277 FM, 63. 77 I PARTE FUNDAMENTOS CAPÍTULO III A Ursulina segundo o coração de Ângela Merici e de Pe. Zefirino Agostini Ir. Angiolina Padovani INTRODUÇÃO À luz dos textos de Ângela e do Bem-Aventurado Pe. Zefirino foi apresentada a compreensão de Deus e da pessoa. Perguntamo-nos agora, quem é, na mente e no coração dos nossos fundadores, a Ursulina: que a caracteriza no seu ser e no seu agir educativo. A reflexão tem suas raízes e motivações fundamentais numa forte experiência espiritual, em uma intensa capacidade de reconhecer e condescender as interiores moções do Espírito Santo. Recolocar a prática e a reflexão educativa no quadro de uma antropologia teológica não nos isenta de valer-nos da contribuição importante das ciências humanas. Todavia, justamente a partir desta consciência é importante o aprofundamento para descobrir os traços que nos caracterizam, como religiosas e religiosas Ursulinas Filhas de Maria Imaculada, chamadas a servir o Senhor trabalhando com entusiasmo no seu campo, de cujos frutos somos “cultivadoras e, ao mesmo tempo, 278 depositárias” . Santa Ângela é nossa Mãe porque nos gerou nesta Companhia que, plantada diretamente da santa mão de Deus, dele não será 279 abandonada, até que o mundo dure . Em nome da sua maternidade, Ângela é também nossa Mestra, guia no promover o desenvolvimento de uma fisionomia de pessoa e comunidade caracterizadas por uma vida toda 'espiritual', isto é fruto do Espírito. A originalidade de Santa Ângela propôs para a Igreja do seu tempo, aquela dos séculos XV e XVI, um modelo de vida que valorizava a mulher na sua dignidade de pessoa livre, capaz de autonomia, capaz de ser tão 'dona 280 de si mesma' até fazer de sua vida um dom para 'sua divina Majestade' . 278 FO, 120. Cfr. Leg. Ult. 280 Reg. Prol, 4ss. A mulher de Ângela tem uma grande consciência da sua dignidade, sabe que todas aquelas que foram eleitas a serem “verdadeiras e intactas esposas do Filho de Deus”, Reg. Prol, 7, receberam um dom singular, uma graça tal que não todos “tem e nem poderão ter”, Reg. Prol, 6. É essa “nova e estupenda dignidade”, Reg. Prol, 8, que justifica e enriquece a tantas outras 'dignidades', como aquela das Coronelas, que devem pedir a Deus luz e discernimento na responsabilidade que 279 81 Somos conscientes de possuir um patrimônio educativo construído ao longo dos séculos: desde a primeira instituição e experiência de Ângela, até o Pe. Zefirino Agostini, que fez de Santa Ângela a alma de todo um programa de renovação na sua Paróquia, às nossas Mães e as filhas, que souberam cuidar e “atualizar”, atentas ao passado e ao presente, para que o tesouro se revele sempre mais belo, fecundo, rico para o futuro. 1. QUEM ÉAURSULINA? Perguntar isso e encontrar a resposta, ou algumas indicações, é importante pelo menos por dois motivos: • porque ajuda a esclarecer qual é a nossa identidade; • ilumina o nosso agir, a nossa missão, como campo de ação, como tipo de presença, como estilo específico. “Definir” não é simples, sobretudo quando se trata de pessoas e de carismas, porque é sempre sublinhar alguns aspectos e deixar outros, escolher à luz de alguns critérios, numa mina de tesouros que ainda não acabamos de descobrir, porque o mistério de Deus supera toda 281 possibilidade de conhecimento . Em companhia de Santa Ângela e do Fundador, procuramos ver os elementos que caracterizam uma Ursulina, tendo, como constante referência Deus que, comunhão trinitária, grava em nós o caráter fundamental do nosso ser, a relação mais profunda: somos filhos do Pai; irmãos de e em Jesus Cristo, habitados e tornados fecundos pelo Espírito 282 283 Santo que nos ensina toda a verdade , nos encoraja e consola , tem porque “não pode existir uma outra mais digna que ser 'guardiãs' das esposas do Altíssimo”, Rec. Prol, 8; ou aquela das que são Mães porque Deus se dignou torná-las tais e confiar a elas “as suas mesmas esposas”, Leg. Prol, 16; como aquela de todas as Virgens da Companhia, que merecem as mil atenções e cuidados por parte das “Matronas” e das “Coronelas”, cfr. Rec. 5º, 8º, Leg. 8º. 281 Cfr. Ef 3,19. 282 Cfr. Reg. VIII, 16 283 Cfr. Prol Rec. 3-4; 15-16. 82 284 285 286 ilumina , ajuda a discernir , que gera continuamente vida nova . Algumas relações, e o modo em que são vividas, são fundamentais e determinam a qualidade das sucessivas relações conosco mesmas e com os outros. A filiação e a fraternidade, sobretudo, com a sua valência, positiva ou negativa, marcam a personalidade e condicionam o caminho, mais ou menos difícil, de integração e de recuperação também dos aspectos considerados ou vividos negativamente. Para nós Ursulinas a relação fundante e fundamental com Cristo é vivida com as características da esposa, da virgem, da irmã e da mãe. Em particular duas aparecem evidentes: a esponsalidade e a maternidade. Todas são vividas diacronicamente, isto é, momentos diferentes da vida, e sincronicamente: é possível, de fato, viver contemporaneamente a experiência de ser filhas, irmãs, esposas e mães. Podemos ver estas relações, mesmo que brevemente, na sua dimensão vertical, em referência a Deus, e horizontal, em referência a nós mesmas e aos outros. 1.1. Filha e Irmã Cada um de nós deve sua existência aos outros. É uma constatação tão simples que até parece banal, mas que já diz que a nossa vida é profundamente assinalada, por um lado da gratuidade, e por outro da responsabilidade para com a nossa e dos outros. Direta ou indiretamente, hoje talvez com aspectos mais problemáticos do que no passado, a pessoa vive a experiência de uma vida comunicada aos outros que se tornam 'irmãos'. Ângela viveu o ser filha, em uma família tradicional do seu tempo, assim como viveu o ser irmã. Duas experiências entre elas relativas, recíprocas, uma caracteriza a outra, a modifica, pode fazê-la amadurecer ou regredir. E foi em casa, naquele clima familiar do entardecer, depois do trabalho no campo, que Ângela aprendeu a conhecer tantas figuras 284 Cfr. Leg. 9º, 8. Cfr. Leg. 7º e 9º, 6ss. 286 Cfr. Leg. 2º; cfr. Leg. Ult. 285 83 femininas de santas, através da leitura, que seu pai João fazia, da “lenda 287 áurea” . Em família, Ângela iniciou a construir-se como mulher, com uma riqueza de modelos assimilados pela cotidiana experiência de vida e de fé. E devem ter sido muito importantes e vividos intensamente estes primeiros anos se, mesmo depois de ter ficado sozinha, Ângela foi capaz de amadurecer como mulher adulta, livre, corajosa e original não somente em uma escolha de vida pessoal, mas também na sua atenção à mulher do seu tempo, até ao ponto de ser capaz de propor também a outras um estilo de vida desconhecido no seu tempo. Enquanto a filiação e a fraternidade são dimensões próprias da natureza mesma da pessoa, o ser filhas e irmãs é um dado de fato incontestável, que não se discute, o ser esposa e mãe é, para Ângela, uma dignidade concedida e à qual é possível também não responder. 288 “Filhas” e “Irmãs” são palavras freqüentes nos escritos de Ângela 289 e do Fundador também com matizes diferentes, como o uso afetuoso de 290 “filhinhas” ou até mesmo de “filhinhas celestes” . O 'filhas e irmãs' é usado 291 por Ângela , com a consciência muito clara do seu ser Mãe para sempre, na sua relação com todas as virgens da Companhia, e com as Coronelas: Jesus Cristo mesmo, “na sua imensa bondade, me elegeu para ser mãe, e viva e 292 morta, dessa tão nobre Companhia” . Estas palavras são usadas num contexto de: • humildade, tanto das superioras para com as filhas, quanto das filhas 287 Cfr. L. MARIANI, Ângela Merici, 75ss. A expressão é usada em torno de umas quarenta vezes: a combinação 'filhas e irmãs' aparece 6 vezes (3 na Regra e 3 nas Recordações); a palavra 'filha', 21 vezes (8 nas Recordações e 13 nos Legados), sem considerar as expressões, abundantes sobretudo nos Legados, que “ad sensum” se referem ao que as mães devem fazer; a palavra 'irmã', 9 vezes (8 na Regra e 1 nos Legados). Nos Legados encontramos, por 3 vezes, a combinação 'irmãs e mães'. 289 São muitas as meditações que o Fundador dedica comentando os escritos e atitudes de Santa Ângela, sempre proposta como modelo a ser imitado. Somente para citar algumas, pode-se ver o comentário à oração de Santa Ângela: FO, 515535; “Ângela, modelo de 'oração' na terra de Jesus, é modelo do nosso ser peregrinos rumo à pátria do céu”, cfr. FO, 482-517. 290 Leg. 4º, 11. 291 Reg. Prol. 3-4; Rec. Prol. 2; Rec. 1º, 1. 292 Rec. 3º, 4. 288 84 • • para com as mães. As primeiras não se creiam “dignas” de serem superioras e Coronelas: “Ao contrário, considerem-se ministras e servas, considerando que possuem mais necessidades vocês de servir do que não tenham necessidade elas de ser servidas ou governadas por vocês, e que Deus bem poderia prover a elas com outros meios até 293 melhores de que vocês” . As outras sejam “submissas às mães 294 principais” que Ângela deixa no lugar dela; respeito pela grande dignidade “dessas filhas celestes”295, chamadas a 296 ser “esposas do Rei dos reis e Senhor dos senhores” à quem devem agradar. Ninguém sabe o que Deus quer fazer delas, e por isso devem ser 297 298 amadas, sabendo que Deus” das pedras pode tirar filhos celestes“ ; serviço, atento e amável, porque Deus pede contas do bem das filhas, aliás, ele mesmo”não deixará de prover às necessidades delas, materiais 299 e espirituais” . 293 Rec. 1º, 3-4. Rec. 3º, 1ss. Toda essa Recordação fala da relação entre as Coronelas e as Matronas, “mães principais”, em função do bem das filhas. É uma relação feita de respeito, de obediência, de estima e prudência, mas também de grande liberdade interior, de senso crítico, de possibilidade de divergência. O que ajuda a discernir o melhor é a certeza da presença do Senhor na Companhia por Ele querida, a caridade fraterna, a fidelidade à Palavra de Deus. 295 Leg. 4º, 11. 296 Leg. 4º, 12ss. 297 Cfr. Rec. 8º. 298 Rec. 8º, 6. 299 Rec. 4º, 7. O Fundador nos deixou como herança também o sentido da filiação em relação a Maria, a Mãe universal, tornada tal por Jesus sobre a Cruz. Diferente da filiação divina, que nos é doada com o Batismo, ser e sentir-nos também “Filhas de Maria Imaculada” nos ajuda: • a acolher mais intensamente o mistério de Deus que nos quer todos “santos e imaculados”, cfr. Ef 1,4. • a crescer no empenho de sermos, além de santas de “mente, de coração e de corpo”, totalmente consagradas “ao bem das meninas”, FO, 145; • a viver com serena confiança, porque Maria, a Virgem Mãe por excelência, é presença que sustenta, precede, acompanha: “Cada dom do céu passa pelas mãos de Maria”, FO, 143. 294 85 1.1.1. “Unidas juntas” O respiro que faz viver esta nova Companhia, o pano de fundo, quase, 300 sobre o qual tudo se move, é o “unidas juntas” . É próprio esta expressão que Ângela usa: um modo e um programa de vida, uma proposta educativa enriquecida da experiência do “unidas juntas” do que se refere, mais do que ao “viver juntas”, à unidade do coração e da vontade, ao ser unidas “com os 301 laços da caridade” . Também o Bem-aventurado Agostini, citando Santa Ângela, nos deixou páginas significativas sobre esta dimensão que anima a 302 nossa vida e a nossa ação. “Eis vocês todas ligadas e estreitamente unidas num só coração e numa só alma, expressando assim a unidade do Pai eterno com o seu divino Filho e do Filho com o Pai [...] Filhinhas, isto comporta o 303 nome de Companhia ou Sociedade, como é esta das Ursulinas” . E ainda: “Quem são vocês, de fato, ó Irmãs? Qual é o fim da sua Congregação? Vocês são chamadas por Deus a servi-Lo num estado de 300 Rec. Ult. 1. Ibid., 1-2. Santa Ângela fundou uma “Companhia”: podemos nos perguntar porque ela quis chamar assim a sua fundação. O XVI século viu florescer uma série de 'Companhias' e 'Confrarias': daquelas “de ventura”, às caritativoassistenciais, como aquela do Divino Amor, por exemplo, a “Companhia de Jesus”, os Jesuítas, a Confraria do Santíssimo. Esta era uma terminologia que indicava um conjunto de pessoas estreita e livremente unidas em nome de um ideal, a serviço de uma causa comum. É sempre difícil atribuir intenções ao agir dos outros e saber qual é o grau de consciência, também porque este depende dos diferentes momentos históricos nos quais os fatos acontecem e são interpretados, mas acreditamos que seja possível dar à “Companhia de Santa Úrsula” também um grande significado social, sem por isso empobrecer a intuição de Ângela, pelo contrário, explicitando a necessidade de coerência, de síntese entre fé e vida, própria de quem, em nome de Deus, serve ao homem. 302 As Virgens da Companhia não tinham o empenho de uma “vida em comum”, como também não a tinham as “Irmãs Devotas de Santa Ângela Merici”. Até à morte do Fundador, as Ursulinas “internas” e “externas” viviam relações harmoniosas, quase completando-se reciprocamente na escola e na assistência às jovens do Oratório. Quando algumas pediram para fazer vida comum, Padre Agostini preparou um breve regulamento, cfr. FO, 450. Em 1869, o Fundador apresentou ao Bispo de Verona, Monsenhor Luigi di Canossa, a lista das Virgens pertencentes à “renascida Companhia de Santa Úrsula” sem distinção entre “internas” e “externas”: todas faziam parte do Pio Instituto canonicamente reconhecido em 21 de junho de 1869. 303 FO, 513. 301 86 maior perfeição, com o fim de santificar vocês mesmas. Somente isso? Não: unidas juntas para vigiar para a educação e o bom êxito da juventude 304 feminina” . Tendo como modelo das primeiras comunidades cristãs, o querer-se bem é o primeiro testemunho da presença de Cristo no meio dos 305 seus, fidelidade para com o que mais lhe estava no coração, o “sinal certo 306 de que se caminha por uma estrada boa e agradável a Deus” . Todos os momentos da vida são vivificados pela 'fraternidade', uma 307 palavra que Ângela não usa, talvez por ser insuficiente, para ela, para 308 expressar toda a riqueza do “unidas juntas” que deriva da constatação da grande graça de ter sido separadas das trevas deste mundo e “unidas juntas” 309 para servir a sua Majestade Divina, cultivar, assim, uma profunda 310 gratidão por ter recebido “um dom tão singular” e traduzi-lo num estilo de vida concreto. Durante a jornada brotam assim mil expressões de solidariedade fraterna, vividas na simplicidade das relações interpessoais, despojadas de sentido de frustração pelo que se ache não ter recebido, e abertas, disponíveis a reconhecer e a valorizar as próprias capacidades e as dos outros, sobretudo quando são colocadas a serviço do crescimento de todos. É bela e significativa, por exemplo, a simplicidade de Ângela que, falando da oração e do modo de rezar, exorta a dizer cada dia “pelo menos o Ofício de Maria e os sete Salmos penitenciais, com devoção e atenção porque 311 dizendo o Ofício se fala com Deus” . E acrescenta, quase convidando a fazer o primeiro passo: “e quem não o sabe dizer, se faça ensinar das irmãs 312 que sabem” , sem sentir nisso uma redução na sua dignidade de esposa de Cristo, pelo contrário, reafirmando implicitamente o papel fundamental da fraternidade. 304 FO, 113. Cfr. FO, 20. 306 Leg. 10º, 12. 307 A terminologia usada por Ângela é diferente: fala de união, unidas juntas, concórdia, um só querer, concordes no bem para a glória de Deus, cfr. Rec. Ult.; Leg10º. 308 Cfr. Reg Prol,4. 309 Ibid. 310 Ibid., 5. 311 Reg V, 9-10. 312 Reg V, 11. 305 87 É em nome deste “unidas juntas” que Ângela pede obediência: a 313 quem a substituirá depois da sua morte, aos pais, a outros eventuais superiores da casa, e aconselha “ pedir perdão uma vez por semana como 314 sinal de submissão e para conservar a caridade” . “Unidas juntas”, procura-se também o bem maior para todas, um projeto de vida que faça viver como irmãs: a regra, e a obediência à mesma, 315 expressa a unidade da família em torno do que se considera importante . Diante das mudanças previstas, já acontecidas e futuras, é importante conservar fidelidade e continuidade com as raízes, fazer memória das motivações fundamentais, pessoais e comunitárias, discernir juntas, com 316 prudência . Ângela é mestra no ensinar a conjugar bem o dom da liberdade, que cada pessoa possui, junto com a capacidade de ter um pensamento e uma reflexão própria, com o respeito do outro, igualmente livre, diferente, capaz de senso crítico, e um grande sentido de responsabilidade, sobretudo para o 317 bem das filhas . O diálogo, outro termo que Ângela não usa, é uma dimensão comunitária importante, feito de palavras e de escuta. A linguagem manifesta aquilo que pensamos, e, sobretudo, aquilo que somos Santa 313 Cfr. Rec. 3º, 1-5. Reg VIII, 12. 315 “E direis a elas que queiram ser unidas e concordes todas juntas, tendo um só querer, permanecendo sob a obediência da Regra porque tudo está aqui”, Rec. 5º, 20. 316 “E se, segundo os tempos e as necessidades, acontecesse de dar novas ordens, ou de fazer diferente alguma coisa, fazei-o prudentemente e com bom juízo, e seja sempre vosso principal refúgio o colocar-vos aos pés de Jesus Cristo; ali, vos todas com todas as vossas filhas elevai fervorosas orações”. Leg. Ult., 2-4. 317 Já falamos sobre esse equilíbrio: cfr. nota nº 17. “Porém se lhes acontecesse de ter qualquer justo motivo para contradizê-las ou repreende-las (as madres principais) façam com jeito e respeito. [...] portanto, procurem que gozem sempre de estima e respeito especialmente junto às suas filhas. [...] Em qualquer modo, se tiverem no coração qualquer coisa que lhes desagrada nelas, com razão e sem escrúpulo poderão falar em segredo com alguma pessoa boa e fiel sob todos os aspectos. [...] Saibam porém que, se souberem que está em perigo a salvação e a honestidade das filhas, não devem por nada consentir, nem suportar, nem ter escrúpulo de nada, tudo porém, sempre com bom discernimento e com maturidade de juízo”, Rec. 3º, 6-15. 314 88 Ângela bem sabe que a caridade fraterna passa também através do que se escuta e do que se fala. E não hesita em dizer às “coronelas” o que devem 318 recomendar às “queridas filhas e irmãs” : “Na escuta, não se deleitem em ouvir se não coisas honestas, lícitas e necessárias. No falar, todas as suas palavras sejam sábias e medidas; não ásperas, não frias, mas humanas e que 319 levam a concórdia e a caridade” . É um diálogo que tem o seu fundamento na capacidade de apreciar, amar, cuidar do outro: “Assim que devem também pensar como as devem apreciar; porque quanto mais as apreciarão, tanto mais as amarão: quanto mais as amarão, tanto mais cuidado e atenção terão por elas. E será assim impossível que dia e noite não as tenham no coração, e esculpidas no 320 coração, todas uma por uma, porque o verdadeiro amor faz e age assim” . Para realizar esta recíproca escuta, tornam-se necessários alguns momentos específicos, e Ângela empenha as suas filhas em proporcionar duas ocasiões importantes: • visitar frequentemente, “a cada quinze dias, ou mais ou menos quanto será o suficiente, todas as outras irmãs virgens espalhadas pela cidade, para confortá-las e ajudá-las se elas se encontram em qualquer situação 321 de discórdia ou em outra dificuldade, seja material que espiritual ; • fazer com que as irmãs se encontrem entre elas, para reforçar os seus laços: “Devem ter cuidado de reunir de vez em quando as suas filhinhas no lugar que acharem melhor e mais cômodo, e assim (e se tem à disposição alguma pessoa indicada) peçam para que lhes dirija alguma breve reflexão e alguma exortação, para que, além disso, possam ver-se como queridas irmãs e, refletindo juntas espiritualmente, possam alegrar-se e juntas consolar-se, coisa que será para elas de não pouca 322 alegria” . 318 Rec. 5º, 1. Ibid., 11-12. 320 Rec. Prol., 9-11. 321 Reg. XI, 8-9; cfr. Rec. 5º, 1. 322 Leg. 8º, 1-6. Trata-se de uma fraternidade concreta, efetiva, que leva também a procurar a ajuda necessária onde é possível encontrá-la. Ângela cita, em modo muito concreto, tantos casos de sofrimento que exigem solidariedade, apoio, consolação fraterna: “No caso que os seus superiores de casa fizessem a elas algum injustiça, ou quisessem impedi-las de fazer alguma coisa de bem, ou expôlas a qualquer risco de mal. [...] Se acontecesse que alguma irmã, sendo órfã, não conseguisse obter a sua parte, ou talvez sendo governante, ou doméstica, ou 319 89 O sentido da fraternidade se revela também no uso dos bens da Companhia, que possuem uma finalidade bem precisa e por isso Ângela lembra: “que devem ser bem administrados, e que serão usados com prudência, especialmente para ajudar as irmãs e segundo as eventuais 323 necessidades” . E deseja que não se procure “conselhos fora; façam somente entre vocês, segundo a caridade e o que Espírito Santo iluminará e ditará, 324 dirigindo tudo para o bem e para o proveito espiritual das suas filhinhas” . Diante do sofrimento, provocado pela solidão, pela idade, pela doença, pela morte, Ângela, com sua praticidade e a sua atenção, sugere várias propostas de ajuda: oferecer a duas irmãs que ficaram sozinhas a possibilidade de viverem juntas; respeitar a liberdade de quem que, mesmo tendo ficado sozinha, não quer renunciar ao seu trabalho; lembra que as irmãs idosas merecem ser “ajudadas e servidas como verdadeiras esposas de 325 Jesus Cristo” ; em caso de doença, recomenda que a irmã “seja visitada, 326 ajudada, e servida de dia e de noite se necessário” . Também a experiência da morte vê as irmãs “unidas juntas”: as vivas acompanham “com caridade” a irmã ao término da sua viagem, e rezam como sabem e podem, para que “o nosso suave e benigno esposo Jesus [...] a conduza para a glória celeste junto às outras virgens, coroada da esplêndida 327 e luminosíssima coroa da virgindade” . Uma vida, então, toda entrelaçada de concórdia, de coração e vontades: é o testamento que Ângela deixa, a última recomendação: “com a 328 qual até com o sangue” nos pede, um valor que devemos continuamente 329 desejar, procurar, abraçar, conservar com todas as forças . outro, não pudesse obter o próprio salário, ou se acontecesse alguma coisa semelhante e por isso fosse necessário recorrer a um processo judicial, [...] então os quatro homens, por caridade e como pais, queiram encarregar-se e prestar ajuda segundo a necessidade”, Reg XI, 10-19. 323 Reg XI, 22-24; cfr. 9º, 1-4. 324 Leg. 9º, 5-8. 325 Reg XI, 29. 326 Ibid, 30. 327 Reg XI, 35-36. 328 Ric Ult., 1. 329 Cfr. Ric Ult., 14. 90 A experiência de viver partilhando assumiu lentamente a forma da vida comunitária, de uma vida fraterna em comunidade onde cada uma acolhe e é acolhida pela outra em nome da Caridade de Cristo para realizar a única missão. A comunidade é educativa, enquanto sujeito capaz de “traditio”, de transmitir, entregar um patrimônio de valores para a geração sucessiva e por isso lugar de iniciação, na medida em que se transforma sempre mais em espaço habitado pela Trindade. No entanto, a mesma comunidade é sujeito de formação, de discernimento, de projetação. Isso faz com que não se perca mais de vista a necessidade de elaborar e reelaborar continuamente uma síntese entre o ser educadoras e o de tornar-se continuamente tais, entre passado e futuro, atenção aos sinais de novidade e fidelidade a um patrimônio recebido e doado. A “vontade de concórdia” à qual Ângela e o Bem-aventurado Zefirino Agostini exortam, é uma meta que pressupõe um itinerário também educativo, além de espiritual: tornar-nos conscientes do nosso ser incompletos, sentir a necessidade do outro, criar uma relação “de misericórdia”, à imitação do amor de Cristo, que de rico que era se fez 330 servo, fazendo-nos descobrir que todos somos gerados “não pela vontade 331 da carne, nem pela vontade do homem, mas de Deus” . Isto torna-nos capazes de percorrer três etapas paradigmáticas de cada crescimento: • libertar o nosso coração de qualquer forma de ressentimento, raiva, rancor: “Como devem mutuamente se estimar e se amar estas irmãs![...] Entre elas, fácil, pronta, generosa a compaixão dos defeitos e das 332 faltas” . • dilatar o coração, ser capazes de participar aos sofrimentos, às esperas da humanidade inteira; Ângela é o modelo proposto por Pe. Agostini: ela encontrava a “maneira de socorrer os indigentes [...] Em fim, a 333 caridade a tornou mãe, guia, alívio e refúgio de todos” ; 330 Cfr. Fl 2,6-7. Jo 1,13. 332 FO, 288. 333 FO, 290. 331 91 • dar espaço à gratidão por aquilo que nos é continuamente doado, e cultivar um olhar contemplativo, capaz de alegrar-se pela glória que nos será doada no céu: “Não devem ser conforme à imagem dolorosa, atribulada, angustiada de Jesus Cristo, seu Esposo, se querem gozar da sua glória? Também aos seus queridos Apóstolos, justamente para tal missão, Jesus Cristo predisse gravíssimas cruzes, perseguições, o ódio de todo mundo. Mas o que? Ninguém no mundo pode raptar-lhes esta 334 interna alegria” . 1.2. Esposa Ângela colheu e viveu em modo particular o mistério da IgrejaEsposa, da Comunidade eclesial chamada a entrar em uma relação de intimidade nupcial, livre e pessoal com Deus que é “beata e indivisível Trindade”, comunidade perfeita e exemplar. É uma espiritualidade trinitária, aquela de Ângela, vivida em termos de união esponsal: “eleitas a ser verdadeiras e intactas esposas do Filho de 335 Deus” , conduzidas pela via de uma compreensão sempre mais profunda 336 da verdade do Espírito , cuja voz é tanto mais reconhecida “quanto mais 337 purificada e limpa teremos a consciência” . A ursulina é chamada a viver como esposa, porque isto ela é, e todo o seu itinerário interior é um progressivo retorno à condição 'original', 338: caminho percorrido e marcado por uma grande esperança 334 FO, 305. Reg Prol, 7. 336 Cfr. Reg VIII. 337 Ibid., 15. 338 São muitas as exortações à confiança, à esperança, a não temer. Para todos, citamos uma parte da 5º Recordação, onde encontramos mais de 15 vezes uma referência a esse modo sereno e confiante de viver também as dificuldades: “Coloquem a própria esperança e o próprio amor em Deus só [...] nunca serão abandonadas nas suas necessidades. Deus providenciará admiravelmente. Não percam a esperança. Quantos senhores, rainhas e outras pessoas importantes existem, que por quanta riqueza e por quanto poder tenham, não poderão encontrar um verdadeiro conforto diante de algumas necessidades! Ao invés elas, 335 92 • • • • • 339 da consciência da “nova e estupenda dignidade” : 340 ao querer conhecer “o que comporta uma tal eleição” ; para alcançar ao melhor daquilo que já somos por dom de Deus: “que se esforcem, com todo se poder, de conservar-se segundo o chamado de 341 Deus” ; procurando e querendo os meios adaptos e necessários “para perseverar 342 e progredir até o fim” ; 343 “retornar gloriosamente em pátria” . A esponsalidade não é simplesmente uma característica entre outras tantas, uma dignidade concedida e da qual nos alegramos, ou um privilégio que embeleza: esta “obra é de tal importância que não poderia ter uma de 344 importância maior, porque esta envolve a nossa vida e a nossa salvação” . Trata-se de uma “obra”, isto é, de algo que, próprio por ser grande, exige dinamismo, atenção, uma mente e um coração que não percam de vista o fim último. Tem outra expressão que Ângela usa, juntamente com “esposas do 345 Filho de Deus”: “se tornar rainhas no céu” . A palavra “rainha” aparece de 346 novo quando Ângela fala da virgindade, definida “rainha das virtudes” . Pe. Agostini a usa quando fala da caridade, rainha das virtudes e 347 cumprimento perfeito de toda lei evangélica . “Virgindade”, “caridade”, “esponsalidade” não são sinônimos, porém justificam o uso comum da palavra “rainha”. Chamados todos, pelo 348 batismo, a constituir um povo real, somos também empenhados em mesmo pobres, encontrarão consolação e conforto”, Rec. 5º, 22-34. Reg Prol, 8. 340 Ibid. 341 Ibid., 9. 342 Reg Prol,10. 343 Ibid, 30. 344 Ibid., 15-16. 345 Ibid., 17. 346 Reg IX, 4. É usada também para indicar os grandes deste mundo, mas não é nesse sentido que vem usada aqui: cfr. Prol Reg; Leg. 4º. 347 Cfr. FO, 81, 119, 394. 348 Cfr. 1 Pd 2,9. 339 93 construir desde agora o Reino de Deus, que será plenamente realizado somente no fim dos tempos, quando seremos associados à glória do Rei, a 349 quem pertencem, “louvor, honra, glória e poder” . Existem, porém, alguns sinais da presença silenciosa do Reino que vem, do seu crescer 350 imperceptível, porém real : trata-se de uma intensa, apesar de ser incompleta, participação à realeza de Deus, Rei dos Reis e Senhor dos senhores, e ao senhorio de Cristo, acreditado, proclamado, anunciado 351 “Senhor” depois da sua ressurreição e glorificação . A esponsalidade exige comunhão de interesses com o amado: é isto que dá fundamento e harmonia à vida da Ursulina e à sua missão 352 apostólica . O ser esposa e o viver como tal é um dom altíssimo que exige vigilância, perseverança, coerência: “Não basta, de fato, começar, se 353 também não se persevera” . Para tanto é necessário procurar e usar os meios adaptos, porque “pouca ou nenhuma diferença existe entre dizer francamente: não quero mais servir a Deus, e não querer seguir as vias e as 354 normas necessárias para poder se manter em tal estado” . Ângela, sabiamente, conhece e prevê dificuldades e perigos: fazer com que uma pessoa se construa em harmonia com a dignidade que possui porque recebida de Deus, e não mais ou menos reconhecida por leis humanas, é trabalho e empenho de toda a vida; “precisa ser atentas e prudentes, porque quanto mais uma obra tem valor, tanto mais fadiga e 355 perigos comporta” . Existe um misterium iniquitatis que se opõe continuamente ao Bem e à procura do Bem: isso entra na dinâmica da 356 construção do Reino . “E assim se armarão contra nós a água, o ar e a terra, 349 Ap 5, 13b. Cfr. Mt 13, 31-33; 25,1-13; 31-45. 351 Cfr. Fl 2,11; 1Tm 3,16. 352 É particularmente significativa uma meditação sobre o zelo, feita comentando a oração de Santa Ângela: FO, 528-531; cfr. também FO, 192ss: “A Filha de Maria Imaculada espiritualmente madura, é aquela que, como Maria, sua Mãe, assume o interesse de Cristo: a Redenção”. 353 Reg Prol, 11. 354 Ibid., 14. 355 Ibid., 18. 356 Cfr. Mt 13, 24-30. 350 94 357 com todo o inferno” , mas existe uma confiança que perpassa o pensamento de Ângela, não fruto de ingenuidade, mas de “segura e firme fé”, de “esperança na infinita bondade Divina” que todos os obstáculos serão não somente superados, mas vencidos “com grande glória e alegria 358 nossa” . A esposa da qual Ângela fala, a mulher que ela sonha, é a mulher forte descrita na Bíblia, uma mulher que se comporta “virilmente”, como Judite, capaz de usar a sua feminilidade para defender o seu povo e decepar 359 “corajosamente a cabeça de Holofernes” . 1.2.1. Virgem Nesta lógica, pascal, escatológica, torna-se significativa a escolha de quem, desde agora, decide entregar-se totalmente ao Reino; de quem faz do seu relacionamento com Cristo a única relação fundamental e fundante, de quem quer continuamente conhecer, aprofundar e realizar o Projeto de Deus e vive o amor aos irmãos como expressão do único grandeAmor. A virgindade, como escolha de vida, é ligada à dimensão esponsal e, ao mesmo tempo, também à experiência da maternidade. Refletir, desejar e, até mesmo, escolher a virgindade tem sentido somente em um contexto de amor que se torna também testemunho. É caridade vivida lá onde Deus nos colocou. No caminho de crescimento, a virgindade não é uma via alternativa ao matrimônio: existe, de fato, uma única via de santidade: a via do amor, vivido em formas diversas. O centro de uma vida empenhada é sempre Deus, cujo rosto nos foi revelado em Cristo, e a realização do seu projeto de salvação. A virgindade é um modo de viver, segundo o Espírito, aquela vocação à maternidade que todos possuímos, porque feitos “à imagem e semelhança de Deus”, criador e amante da vida. A maturidade no amor se manifesta na crescente capacidade de: • ser fiéis em modo constante, também na fadiga; 357 Reg Prol, 20. Ibid., 25. 359 Reg Prol, 30. 358 95 • ‘assumir cuidado' de outros e, portanto, ser abertos, disponíveis à 'fecundidade', ao 'fazer crescer'. A falta de interesse pelo outro, o considerar-se, num certo sentido, o 'centro' do mundo, revela 'esterilidade', leva ao auto-isolamento, e gera um círculo vicioso do qual é difícil sair. Neste sentido pode-se entender porque Ângela, falando da 360 virgindade, refere-se a todas as dimensões da pessoa, desde o pensamento, o sentimento, até o falar, o agir, o relacionar-se, e a coloca como condição 361 para ser admitida na Companhia . Ela afirma que é necessário que cada uma • “queira conservar a santa virgindade”362, e não por puro voluntarismo, nem para ser aprovada pelas pessoas, e nem mesmo “por exortação humana”, mas para fazer “voluntariamente sacrifício a Deus do próprio 363 coração” , motivada unicamente pela caridade, pelo amor de Deus, numa escolha livre e consciente; • assuma uma mentalidade nova: a virgindade é definida “irmã de todos os anjos, vitória sobre a concupiscência, rainhas das virtudes, e senhora 364 de todos os bens” . Trata-se de um novo modo de viver a caridade que, elevando a níveis sempre mais altos, abre os horizontes, ajuda a reconhecer Deus e a procurar sempre a sua vontade, recolhe a vida em torno de um centro unificador, enriquecendo e dando vivacidade às potencialidades da pessoa; • viva coerentemente: “cada uma, então, deve comportar-se de tal modo que não cometa nem em si mesma, nem para com o próximo, coisa 365 alguma que seja indigna da esposa do Altíssimo” , e refere-se à totalidade da pessoa: desde a consciência, “limpa de qualquer 360 Cfr. Reg IX. Reg I, 1-2. 362 Reg IX, 1. 363 Ibid., 2. 364 Ibid., 3-5. 365 Ibid., 6. 361 96 366 pensamento mau” , aos sentimentos, aos desejos, à linguagem, ao modo de agir e às relações que temos com os outros e com o mundo. É a opção fundamental, vivida com coerência, cada dia, pela qual cada uma é “disposta a morrer antes do que manchar e profanar uma jóia tão 367 sagrada” . A resposta de Jesus a quem o interrogava: “Serão como anjos no 368 céu” , expressa toda a grandeza à qual cada pessoa é chamada: ser capaz de contemplar o Senhor face a face, de compreender e realizar o que Ele quer, 369 para que a sua vontade seja feita “assim na terra como no céu” . Refletir e propor o valor da virgindade como modo de ser e colocar-se diante das pessoas, dos acontecimentos, da história, conduz quase necessariamente à reflexão sobre a vasta problemática da mulher, da sua dignidade como pessoa com uma tarefa bem específica na Igreja e na sociedade. O Bem-Aventurado Agostini teve uma intuição no seu considerar a mulher como centro da família e da sociedade: “centro” propulsor, força capaz de animar e promover o outro para que cresça em todas as suas potencialidades. Vivemos um momento histórico carregado de contradições: existe a descoberta e valorização do mundo feminino, do seu gênio, deste jeito diferente e característico de enfrentar problemas e situações, não alternativo, e sim complementar do modo e da mentalidade masculina; ao mesmo tempo, porém, existem ainda tantas formas de discriminação, evidentes ou às vezes evidentes e muitas outras vezes sutis. Neste contexto, a palavra do Fundador, que nos confia sobretudo as 370 “pobres meninas” , parece adquirir uma atualidade toda particular. Junto dele, e antes dele, é atual a sabedoria de Ângela que convida, se o tempo e as 366 Ibid., 7. Reg IX, 23. 368 Mc 12,25. 369 Mt 6,10. 370 “Caríssimas, essas pobres meninas sejam, portanto, o mais precioso objeto dos seus amáveis cuidados, das suas piedosas solicitudes. Instruam as suas mentes, eduquem para a virtude os seus corações, salvem as suas almas do mal contágio deste mundo, principalmente nos nossos dias, extremamente perverso e 367 97 necessidades o pedirem, de agir diversamente, mas sempre com prudência e bom conselho, recorrendo, todas juntas, aos pés de Jesus, que está no meio 371 de nós, ilumina e ensina como “verdadeiro e bom mestre” . A virgindade, neste sentido, é o meio para restituir à mulher a sua dignidade original: aquela do seu ser “imagem e semelhança de Deus” e, portanto, depositária de uma grande dignidade, livre e capaz de assumir-se a si mesma, de decidir a qualidade da sua vida, de viver e estabelecer relações novas: “não se sentem, quase diria, transformadas em outras criaturas? Estão na terra, mas a sua conversação está no céu. Estão na terra, mas o Deus da glória colocou em vocês o seu trono. Estão na terra, mas já 372 experimentaram antecipadamente aqui as delícias de um Paraíso eterno” . 1.3. Mãe Viver o mistério do amor nupcial entre Cristo e a Igreja, sua esposa, significa participar daquela misteriosa fecundidade que enriquece a esposa 373 com o dom da maternidade . Gerada do lado aberto de Cristo na Cruz, a Igreja, por sua vez, gera continuamente novos filhos na fé. É muito significativa uma expressão de Santo Ambrósio: “A Igreja é imaculada na sua união esponsal: fecunda pelos seus partos, é virgem pela sua castidade, mesmo sendo mãe pelos filhos que gera. Nós somos então nascidos de uma virgem, que concebeu 374 não por obra de homem, mas por obra do Espírito Santo” . Ângela viveu profundamente esta dimensão materna que, nascida do 375 mistério da cruz, do Sangue de Cristo , caracteriza cada fiel e, em particular, quem segue o Senhor na virgindade. É o Sangue de Cristo que dá pervertedor, especialmente da pobre juventude feminina”, FO, 289. Leg. Ult., 5. 372 FO, 471. Existem outros textos interessantes do Fundador sobre o tema da virgindade: FO, 209ss; 253ss;328ss;469ss; 472ss. 373 Aternura materna é atribuída, na Bíblia, a Deus mesmo: “Como uma mãe consola o filho, assim eu vos consolarei” (Is 66,13). E ainda: “Se esquece por ventura uma mulher do seu filho, assim de não comover-se pelo filho do seu ventre? Mesmo que ela se esquecesse, eu não te esquecerei jamais”(Is 49,15). 374 Citado por João Paulo II na sua catequese no dia 17.07.2003. 375 Duas vezes nas Recordações e duas nos Legados, Ângela faz do Sangue de Cristo 371 98 376 dignidade à missão da Mãe , concede o dom da sabedoria e da perseverança 377 a quem o pede com insistência , torna o amor espiritual muito mais forte do 378 que aquele segundo a carne , faz da maternidade uma manifestação da 379 Igreja e na Igreja . É em nome da paixão e do Sangue de Cristo, “derramado a fonte das relações dentro da Companhia: “Minhas cordialíssimas irmãs e mães no Sangue de Jesus Cristo”, Leg. Prol., 4. “Mas sobretudo, peço e suplico a todas, pela paixão e sangue de Jesus Cristo derramado por amor a nós, que queiram colocar em ato com solicitude estas poucas recordações”, Leg. Prol., 25-26. “E entre as outras coisas que devem fazer, com a graça de Deus, peço a todas, as suplico, por amor à paixão de Jesus Cristo e por amor à Nossa Senhora, que se esforcem em colocar em ato estas poucas recordações, que agora lhes deixo para serem executadas depois da minha morte: serão para vocês um chamamento ao menos de uma parte do meu querer e do meu desejo”, Rec. Prol., 19-21. “Filhas e irmãs minhas no sangue de Jesus Cristo caríssimas”, Rec. 1º, 1. 376 “Ora, para tal coisa, queria que acordassem o seu intelecto para considerar a grande graça e a sua sorte, de que Deus se dignou de torná-las mães de tantas virgens, e que tenha colocado as suas esposas nas mãos de vocês e confiando-as ao vosso governo”, Leg. Prol., 14-16. Existem também outros textos que dizem a grandeza desta missão materna: “Oh, qual nova beleza e qual dignidade ser superioras e mães das esposas do rei dos reis e do Senhor dos senhores [...]. Felizes vocês se serão prontas a reconhecerem tal nova e única ventura”, Leg. 4º, 14-17. “Nem lhes deve pesar uma tal missão: ao contrário, devem agradecer sumamente a Deus que se dignou de colocá-las entre o número daquelas que Ele quer que se afadiguem a governar e cuidar desse seu tesouro. Graça certamente grande e sorte inestimável, se a querem reconhecer”, Rec. Prol., 12-13. 377 “Oh! Quanto devem agradecê-Lo por isso, e ao mesmo tempo pedir a Ele, porque, como se dignou de fazê-las presidir assim tão nobre rebanho, assim se digne também de dar-lhes tal saber e tal poder em conseguir realizar obras dignas de louvor a Ele, e de colocar todo empenho e toda força no realizar o seu dever”, Leg. Prol., 17-21. “Portanto lhes é necessário tomar uma íntegra e estável determinação de submeter-se totalmente à sua vontade, e, com uma viva e salda fé, receber dele o que devem operar por seu amor. E nisso, qualquer coisa aconteça preservar constantemente até o fim”, Leg. Prol., 22-24. 378 “De fato, se vê nas mães segundo a carne que, se tivessem mil filhos e filhas, os teriam todos no coração, totalmente fixos um por um, porque o verdadeiro amor faz assim. Pelo contrário, parece que quanto mais filhos se tem, tanto mais cresce o amor e o cuidado por cada um deles. Com maior razão as mães segundo o espírito podem e devem comportar-se assim, porque o amor espiritual é sem 99 380 por amor a nós” , que Ângela pede às Coronelas e às Matronas, de “colocar 381 em ato com solicitude estas poucas recordações” , fruto da graça e da 382 bondade de Deus . O Bem-Aventurado Zefirino Agostini, que conheceu em Saló as Ursulinas, cujo “nome tão doce impressão fez no seu coração que não o 383 esqueceu mais” , assume e faz próprio toda a herança espiritual de Ângela e 384 a propõe para as primeiras jovens do nascente Instituto . A “maternidade espiritual” é característica que o Fundador exige de cada consagrada Ursulina que quer ser apóstola da juventude. nenhum confronto muito mais potente do que o amor segundo a natureza”, Leg. 2º, 5-9. “E entre os providências boas e necessárias que Deus tomou para mim, vocês são uma das mais importantes; vocês que são reconhecidas dignas de serem verdadeiras e cordiais mães de uma assim nobre família, confiada às suas mãos a fim de que tenham aquele cuidado e aquela custódia que teriam se fossem nascidas do seu próprio ventre e mais ainda”, Leg. Prol., 10-13. 379 Todo a 7ª Recordação desenvolve o tema do defender e salvaguardar as ovelhas dos “lobos” e dos “ladrões”. 380 Leg. Prol., 25. 381 Ibid., 26. 382 Cfr. Leg. Prol., 27. 383 Memória sobre a fundação do Instituto das Ursulinas, 18 de fevereiro de 1887, em: FO, 446. 384 Quando o Bem-Aventurado Zefirino Agostini se refere à Santa Ângela, usa expressões como: “a grande Mãe”, “gloriosissíma sua Mãe”, “Santa nossa e famosa fundadora das Ursulinas” e com freqüência exorta as primeiras irmãs a assimilarem os seus ensinamentos e a deixar-se educar pelos seus exemplos: “Santa Ângela, nas suas instruções, nas suas regras lhes diz tudo. O seu manual deve ser para vocês como o livro, o volume que Deus mostrou ao seu Profeta Ezequiel dando-lhes ordem que o comesse. Ele obedeceu [...]. como Ezequiel, comam também vocês o volume das suas regras, ditadas pelo espírito de Deus a Santa Ângela, sua Mãe. Degustem, saboreiem e sentirão inefável doçura, saciando assim a sua alma da abundância dos bens celestes, tendo assim sempre vivo e ardente sobre o altar do seu coração o fogo da caridade de Deus, até que na sua caridade serão transformadas nele mesmo na eternidade da sua mesma glória”, FO, 346. E ainda: “Bom Deus! Não lhes bastariam as virtudes e os exemplos da sua Mãe, Santa Ângela? As suas angélicas recordações, os seus celestes ensinamentos e regulamentos não podem ser capazes de formar no seu coração uma fornalha de fogo ardente que se eleva sem parar?”, FO, 477. 100 Com uma segurança que pode até maravilhar, Ângela atribui a si mesma o título de Mãe, concedido-lhe por Cristo “o qual, na sua imensa bondade, me elegeu para ser mãe, viva e morta, de assim nobre 385 Companhia” . As matronas, e nelas, quem de qualquer forma será responsável da Companhia ou de um “broto” da mesma, são as que continuam e tornam presente a Mãe: “partindo agora desta vida e deixando vocês no meu lugar, e como minhas herdeiras, estas recomendações serão para vocês como legados que, na minha extrema vontade, lhes deixo para atuá-las 386 fielmente” . Estabelece-se um fio vermelho entre o querer da Mãe e o querer de 387 Jesus Cristo, a obediência a ela e a obediência a Cristo , porque foi Ele quem quis a Companhia, escolheu Ângela e lhe deu “também a graça de 388 poder governá-la segundo a sua vontade” . Várias vezes Ângela garante a continuidade da sua presença materna também e sobretudo depois da morte, quando é possível ver coisas, acontecimentos, pessoas, na clara luz de Deus e portanto no seu significado mais verdadeiro e profundo. A morte não elimina as relações construídas na dinâmica da vida do Espírito, ao contrário, torna-as mais fortes. E Ângela pode dizer, com toda certeza e verdade: “Dirão a elas que agora estou mais viva do que quando me viam materialmente, e que agora ainda mais as vejo e conheço, e mais posso e quero ajudá-las, e que estou continuamente entre elas com o Amador meu, aliás, nosso e comum de todas, para que creiam e não se percam de ânimo e 389 de esperança” . 385 Rec. 3º, 4. Leg. Prol., 28-30. 387 “Estejam submetidas às suas mães principais que eu deixo no meu lugar, como é justo. E o que fazem, façam-no obedecendo a elas e não seguindo os seus juízos. Porque, obedecendo a elas, obedecerão a mim; obedecendo a mim, obedecerão a Jesus Cristo”, Rec. 3º, 1-3. 388 Rec. 3º, 5. 389 Rec. 5º, 35-39; e ainda: “Sabem que, agora, estou mais viva de quando estava em vida, e mais vejo e mais me são caras as coisas boas que continuamente vejo realizar, e agora mais quero e posso ajudá-las e fazer-lhes o bem em todos os modos”, Rec. Prol., 23-25. 386 101 Nas Recordações e nos Legados, Ângela diz e repete, 390 fundamentalmente, três coisas : • as virgens da Companhia, na sua identidade de esposas de Cristo, foram enriquecidas de uma dignidade incomparável da qual é necessário ser conscientes; • quem cuida delas na Companhia, tem uma tarefa incomparavelmente grande: Ele se “dignou de colocá-las no número daqueles que ele quer 391 que se afadiguem a governar e cuidar de semelhante tesouro” . Nada de medo, porém, diante das dificuldades, dúvidas, incertezas, porque Deus 392 mesmo “ajudará em cada coisa” , iluminando, consolando, comunicando a sua própria força; • tudo aquilo que uma mãe faz é em função do bem das filhas. Por isso Ângela não se cansa de orientar, aconselhar, sugerir o que uma boa mãe deve fazer. É um “estilo materno” que caracteriza a virgem consagrada, que sabe bem que o amor segundo o Espírito cria vínculos muito mais 393 fortes do que o amor corporal . Entre as muitas expressões de maternidade que emergem dos “Escritos” 390 Uma leitura atenta faz também perceber algumas diferenças: as Virgens Coronelas são chamadas por Ângela “suas diletas filhas e irmãs”, Rec. Prol., 2; as matronas, não são “diletas filhas”, mas “cordialíssimas irmãs e mães”, Leg. Prol., 4, e são, de fato, “viúvas prudentes e de vida honesta”, Reg. XI, 2, chamadas a ser 'Mães' para as virgens da Companhia, em função da dignidade delas de esposas de Jesus Cristo, dignidade tão grande e, ao mesmo tempo, tão exposta à fragilidade do ambiente e da compreensão humana, que têm necessidade de ser sustentadas, protegidas, defendidas, se for necessário, por alguém que, mesmo não fazendo parte, propriamente, da Companhia, é solícito “para o bem e a utilidade da irmã e filha espiritual”, Reg. XI, 5. 391 Rec. Prol, 12. 392 Rec. Prol, 15. 393 Cfr. Leg 2; O Bem Aventurado Agostini, no retiro espiritual do dia 13 de maio de 1875, propunha às Ursulinas o tema da maternidade espiritual tomando alguns pontos deste pensamento de Ângela: “Digam-me: não sabem vocês que as filhas da grande Mãe Santa Ângela, devem ao vivo imitá-la no tornar-se Mães, Mães espirituais, cheias portanto de um espiritual amor, que Santa Ângela chama muito mais potente sem comparação do corporal?”, FO, 297. O texto completo é colocado em anexo. 102 • • • de Ângela, podemos elencar algumas: a capacidade de “intuir” as necessidades das filhas, dar-se conta do que elas precisam, tanto material como espiritualmente, para prover o 394 melhor possível . Isto é tão importante como o cuidar da própria Companhia, e disso Deus pedirá conta, porque Ele mesmo “plantou esta 395 Companhia, e nunca abandoná-la-a” ; a capacidade de cuidar “das esposas do Altíssimo”, “enquanto cada empenho e cuidado no fazer com que as suas filhinhas sejam adornadas de toda virtude e de toda real e bela maneira, assim que possam quanto 396 mais agradar a Jesus Cristo seu esposo” . É um cuidado que se exprime na solicitude para que se conservem íntegras e castas, [...] se comportem com honestidade e prudência, e tudo façam com paciência e 397 caridade” , e com a atenção para “defender e salvaguardar as suas ovelhas dos lobos e dos ladrões, isto é de dois tipos de pessoas pestíferas: dos enganos das pessoas mundanas ou dos falsos religiosos, e 398 dos hereges” . Com bondade, mas também com clareza e firmeza, Ângela orienta as Coronelas sobre o modo de agir diante de idéias e pessoas que possam desviar as virgens da sua escolha de vida e oferece alguns critérios que podem iluminar. “Mantenham a antiga estrada e costumes da Igreja, ordenados e confirmados por muitos santos pela inspiração do Espírito Santo. [...] não encontrarão outro recurso que refugiar-se aos pés de Jesus Cristo, porque se é Ele quem governar e 399 ensinar, serão instruídas” , “e especialmente tenham cuidado que serem unidas e concordes no querer [...], porque quanto mais serão unidas, tanto mais Jesus Cristo estará no meio de vocês como pai e bom pastor. Nenhum outro sinal haverá que estão na graça do Senhor, de que 400 o amar-se e o viver unidas juntas” ; a capacidade de ajudar a renovar as motivações de cada uma, para que 394 Cfr. Rec. 4º. Rec. 3º, 8. 396 Leg 4º, 1-3. 397 Leg 4º, 4-6. 398 Rec. 7º,1. 399 Rec. 7º, 22. 27-28. 400 Leg 10º, 7. 9-10. 395 103 possa “perseverar no caminho empreendido; [...] desejar as alegrias e os 401 bens celestes” . Por isso, Ângela dirige às Coronelas uma série de recomendações porque, como mães, orientem as suas filhas no modo de comportar-se, de falar, de escutar, de estar com os outros. Sobretudo convida a conservar fixo o olhar sobre o futuro que as espera, o futuro definitivo, aquele que ilumina e dá sentido ao presente, não por uma necessidade de compensação diante das dificuldades do viver quotidiano, mas próprio porque estamos em caminho rumo ao que é definitivo, perfeito, eterno: “Como devem se alegrar e fazer festa porque no céu para todas, e cada uma, está preparada uma nova coroa de alegria e de júbilo [...]. Digam-lhes que desejem ver-me não na terra, mas no céu, onde está o nosso amor. Coloquem lá em cima a sua esperança, e não sobre a terra. Tenham Jesus Cristo como único tesouro, porque assim, terão nele também o seu amor. E devem procurá-lo não aqui neste 402 mundo, mas no alto dos céus, à direita do Pai” . Tudo isso prevê o empenho de cada uma para “ser” um modelo coerente, porque é justo “e conveniente que as mães sejam exemplo e de espelho para as filhinhas, especialmente na honestidade e no 403 comportamento” . E é possível se verdadeiramente as mães amam as suas filhas, tê-las esculpidas no próprio coração dia e noite, uma por uma com a sua própria personalidade, o seu próprio ritmo de crescimento, os seus próprios sonhos e projetos, sabendo que Deus tem um plano sobre cada uma delas, “porque o verdadeiro amor faz assim. [...] Ainda mais as mães segundo o espírito podem e devem comportar-se assim, porque o amor espiritual é sem alguma 404 comparação muito mais potente do que o amor natural” . 401 Rec. 5º, 2-3. Rec. 5º, 25. 41-44. 403 Rec. 6º, 8. 404 Leg 2º, 6-9; cfr. Rec. Prol, 11; Rec. 8º; Leg 3º. 402 104 1.3.1. Zelosa Uma maternidade assim compreendida e vivida é cheia de zelo: um 405 modo de considerar a vida, a missão, o empenho apostólico , as 406 motivações , que depois se traduzem em uma série de atitudes e escolhas: 407 agir “somente movidas pela caridade e o zelo pelas almas” , ser “repletas 408 de desejo e de ardor em colocar todo empenho e cuidado” dedicação 409 apostólico, fidelidade alegre e perseverante na obra começada , com a certeza da alegria plena, porque Deus é fiel às suas promessas: “Se realizarão essas e outras coisas parecidas, como lhes ditará o Espírito Santo segundo os tempos e as situações, alegrem-se, permaneçam de boa vontade. Eis que uma grande recompensa será preparada para vocês. E onde estarão as filhinhas, lá estarão também as mães. Estejam contentes, não duvidem; no 410 céu queremos vê-las no meio de nós” . Muitas vezes Pe. Agostini fala do zelo, uma dimensão que nos empenha seriamente no caminho de configuração a Cristo e nos faz desejar e procurar ardentemente a “maior glória de Deus, procurando a saúde eterna 411 das almas” . São dois aspectos inseparáveis da vida de cada cristão e, em particular, de cada ursulina, empenhada a continuar a presença de Cristo atento a cada pessoa e, especialmente, a quem está, de qualquer maneira, em 412 situação de desvantagem . 405 “Esforcem-se com a ajuda de Deus em adquirir e conservar em vocês um tal conceito e bom sentimento, de ser movidas a tal cuidado e governo somente pelo amor de Deus e o zelo pela salvação das almas”, Leg. 1º, 2-3. 406 “E esforcem-se em trabalhar movidas somente pelo amor de Deus e do zelo pelas almas assim que as cuidarão e as aconselharão, e as exortarão a qualquer bem e as afastarão de qualquer mal”, Rec. 2º, 2. 407 Leg. 3º,15. 408 Leg. 4º,1. 409 Cfr. Leg Ult. 410 Leg. Ult., 14-17. 411 FO, 366. 412 Mais vezes o Fundador indica algumas imagens: a “Sede” de Jesus sobre a cruz, a espera ao Poço da Samaria, o chamado de Mateus o públicano, a pecadora defendida na casa de Simão o Fariseu, o Bom Pastor, cfr. FO, 114, 367, 529. 105 Mas o que é propriamente o zelo? Pe. Agostini o define como “um ardente desejo de glorificar a Deus, edificando e salvando as almas do seu 413 414 próximo” , que faz agir” com todo o possível ardor” , com criatividade, com entusiasmo, disponibilidade e abertura ao novo que o Espírito continuamente suscita e que cada situação histórica e cultural provoca. Zelo, missão, glória de Deus, bem do outro, e não um bem qualquer, mas “eterno”, com um valor que transcende o tempo: são todas realidades e dimensões em relação entre elas, a ponto que não se entende uma sem a outra. Não existe imagem mais eficaz, para o Pe. Agostini, do que a dos Apóstolos que, no dia de Pentecostes, encontram a coragem de sair do Cenáculo e falar publicamente. Os tempos e os espaços, também mais intensos, de oração, tudo aquilo que podemos fazer para a nossa formação, adquirem significado numa perspectiva apostólica, e o zelo é expressão da renovação que continuamente acontece: “Sim: o Espírito Santo, ainda que invisivelmente, também sobre vocês desceu naquele tempo precioso do seu recolhimento: iluminou-lhes a mente com a sua divina luz; inflamou-lhes o coração do seu santo amor: saíram de lá... mas como? Com qual sinal da sua espiritual renovação? Sabemos o que fizeram os santos Apóstolos repletos do Espírito Santo e tudo podemos resumir numa só palavra: Zelo. Portanto, visível sinal 415 da sua espiritual renovação, sem dúvida, deve ser este: zelo, zelo” . Com grande facilidade, quase com uma espontaneidade “pastoral”, ligada ao seu ser sacerdote, Pe. Agostini associa e vê uma continuidade entre a missão confiada por Jesus aos Doze, a missão de Ângela, que sabia “de ter recebido de Deus, desde quando, nos seus anos juvenis, teve a celeste visão 416 da misteriosa escada” , a missão da Ursulina, herdeira do zelo “da sua santa 417 mãe” e aqui não é possível deixar de lado um dos nossos textos 'clássicos', tão significativo e eloqüente ao coração de cada uma de nós: “mas, no entanto, lhes falta talvez o fácil campo para expandir o santo ardor do vosso zelo? Não tem debaixo dos olhos freqüentes ocasiões aqui e lá, por tudo, nos dias de semana e sobretudo para os dias festivos, principalmente nestes 413 FO, 113. FO, 366. 415 FO, 366. 416 FO, 530. 414 106 inspirando-se a uma caridade toda materna para com as filhas do povo? Oh! zelo de caridade, não podes tu ser compreendido se não por quem vivamente te sente e cede espontâneo à eficácia das tuas prova. Ângela era pronta a derramar até mesmo o próprio sangue, contanto fosse o suficiente para abrir a cegueira das mentes dos pecadores e salvá-los e isso porque nela encontravam-se todas as características da verdadeira caridade de Jesus Cristo, de uma caridade paciente e benigna, de uma caridade que tudo sofre, tudo espera, e não diminui jamais. Ora, caríssimas, se o zelo da sua caridade não fosse desta qualidade, se fosse para vocês um grave peso sujeitar-se a incômodos e, por delicadeza, 418 os evitarem, ai de mim que zelo seria esse?” . O verdadeiro zelo se distingue por três características: • • • aceso de caridade, e por isso somos capazes de perceber as sutilezas da vaidade, da ambição, de um amor de si narcisista; informado de ciência: a ação precisa ser “plasmada, assumir uma forma, a fisionomia de uma vida habitualmente empenhada, do conselho bom, que é dom do Espírito, da vida de oração. Sem isso “não teremos nunca a ciência dos santos, que torna cauteloso, prudente, e eficaz o nosso zelo. 419 Seríamos como temporal ruidoso que faz mais estragos do que bem” ; sustentado da constância, porque diante da liberdade da pessoa é necessária “muita paciência pelas muitas fadigas, pelo pouco proveito, pelas contínuas ingratidões, resistências e perseguições que se 420 encontram.Aperfeiçoem, portanto o seu zelo” . A ursulina, esposa e mãe, assume a causa de Cristo: é, este, um aspecto muito importante, para bem discernir onde investir energias, “ver em que particularmente deve uma ursulina zelar pela honra de Deus isto é o 421 que expressa a sua maior glória” . Pe. Zefirino identifica, e explica, três âmbitos: 417 Ibid. FO, 530-531. 419 FO, 115. 420 Ibid. 421 FO, 284. 418 107 1. zelo pela Igreja e a salvação das almas.Acausa da Ursulina é a causa da Igreja, “esposa diletíssima de Jesus Cristo, para formar-se a qual, sem mancha e sem ruga, deu todo si mesmo com a efusão de todo seu preciosíssimo Sangue. [...] e portanto, junto com a Igreja, também vocês deverão entrar no campo das suas batalhas contra as portas do inferno, que continuamente tentam prevalecer contra a Igreja com a ruína de 422 inúmeras almas” ; 2. zelo para a libertação das santas Prisioneiras do Purgatório: no mistério da comunhão realizada por Cristo, que nem mesmo a morte pode destruir, “as irmãs da Igreja militante não arderão de zelo para 423 consolar, libertar, as irmãs da Igreja que se purifica?” . Temos à disposição o potentíssimo meio da oração, do sufrágio, da recordação, do respeito, da valorização, do sentir o passado e o presente como história de uma só família, que caminha num sulco já traçado: “Oh! O Esposo dessas Esposas e o Esposo seu, quanto generosamente as 424 recompensará!” . 3. zelo pelo exercício da caridade na própria Companhia, não para ficar protegidas em um ambiente fechado, mas porque “do lar da mútua 425 caridade se difunda o zelo pelo bem do seu próximo” . Trata-se de coerência, no único empenho de fidelidade a Cristo, vivido “no segredo 426 427 do nosso quarto” e “até os confins do mundo” , sem esquecer que para a ursulina é confiada especialmente a juventude mais necessitada: “Caríssimas, essas pobres meninas sejam então o mais caro objeto dos seus amáveis cuidados, das piedosas suas solicitudes. [...] Não as desanimem, nem fadigas, nem tribulações, e nem o pouco fruto que talvez colham das suas fadigas e dos seus trabalhos. [...] Lembrem que a coroa do bem é a perseverança”428. 422 Ibid., 284-285. Ibid., 287. 424 Ibid., 288. 425 Ibid. 426 Mt 6,6. 427 Mc 16,15. 428 FO, 289. 423 108 CONCLUSÃO Filhas, irmãs, esposas e mães: relações que enriquecem e fazem crescer a pessoa em quanto tal e a Ursulina em particular. Cada crescimento é um processo interior que faz descobrir cada vez mais a identidade de criaturas em relação e da relação como esponsalidade. Cada pessoa, enquanto tal, faz experiência de uma solidão e de um ser incompleto radical e, ao mesmo tempo, sente também o chamado do outro para retornar ao projeto inicial da humanidade: “À sua imagem e 429 semelhança Deus os criou” . O amor nupcial se expressa neste caminho, na liberdade da qual a pessoa é capaz e em nome da qual escolhe com quem e como apostar a sua existência. A Ursulina percorre este itinerário educativo que a faz crescer, humana e espiritualmente, ao longo de todas as fases da vida, para chegar a amadurecer em si e nos outros uma revelação do rosto de Deus cada vez mais bela, até ser capaz de doar a vida, através da maternidade e através da 430 obediência ao mandado de Jesus: “Vão [...] anunciem [...] curem” , em uma atitude de serviço a Deus, reconhecido sobretudo na juventude: “Os Apóstolos tiveram a missão de evangelizar toda a terra; e vocês como Ursulinas têm a missão de fazer todo bem possível ao seu próximo, e em 431 especial à juventude feminina” . Na Igreja, Esposa, a ursulina é chamada a viver, em modo carismático, como esposa perenemente enamorada, capaz de recuperar continuamente as razões da sua fé, até se tornar Mãe, capaz de comunicar a vida recebida. A ursulina sabe que este crescimento não é automático e por isso é disponível a querer crescer, educar-se continuamente, em cada momento da sua vida, reconhecendo-se educadora e aluna, na escola do único Mestre. Como pessoas inseridas no espaço e no tempo somos, por um lado, ligadas a uma série de condições que recebemos de um passado como dom e 429 Gn 1, 27. Mt 10, 7-8. 431 FO, 193. 430 109 riqueza, por outro lado, abertas a um futuro diante do qual devemos sempre reestruturar-nos, porque as condições, as exigências, os desafios são sempre diferentes. É importante, então, ter clareza da nossa identidade e, por conseqüência, da nossa vocação: “Quem são vocês, ó Irmãs? Vocês são um pequeno rebanho, chamado pelo bom Pastor Jesus Cristo a saciar-se nas pastagens mais eleitos das suas graças, sim pequeno no número, pequeno pelo profundo sentimento da humildade que deve guiá-las em tudo, pequeno pela meta à qual é orientada esta união, que é fazer o bem às almas 432 pequenas, acolhendo nelas a Jesus Cristo” . 432 FO, 5. 110 I PARTE FUNDAMENTOS CAPÍTULO IV A Ursulina vive e educa empenhando-se a “revestir-se de Cristo” Sr. M. Agnese Scomparin INTRODUÇÃO A Ursulina, chamada a viver e a anunciar a graça da salvação que experimenta, vive como primeira atitude a gratidão. A bondade de Deus chamou-a para um projeto de pertença a Ele e de maternidade espiritual. Consciente da grandeza e dignidade do dom vive-o com alegria e empenhase em deixar-se revestir de Cristo para expressar em si mesma, diante do Pai e diante do mundo, a imagem viva do seu Esposo Divino. Escolhida para ser sua coadjutora na obra da salvação, através da tarefa educativa colhe o seu lugar como instrumento humilde e dócil. O Fundador e Santa Ângela, mediadores carismáticos do seu ser ursulina e da missão educativa, são para ela guia e modelo. Deixa-se educar por suas vidas e suas palavras para que se imprimam nela os traços do Rosto de Cristo e as características verdadeiras da sua caridade. 1. REVESTIDA DE CRISTO “Eu vim ao mundo somente pelo desejo de salvar as pessoas, dandolhes a vida da graça, a mais vigorosa e feliz. Sabem quem eu sou? Eu sou o Bom Pastor. E de qual bondade? Tal pastor que chega a dar a vida pelas suas ovelhas. Querem que eu vos diga? Eu me sinto apertar as entranhas por um desejo que não repousa até que não me consume vítima de sacrifício para a salvação das pessoas. Sintam-me agonizante desde a minha cruz: Sitio, tenho sede. Quase não tivesse padecido o bastante, desejo, como homem sequioso, de padecer ainda mais, se fosse possível e necessário, 433 para que ninguém se perca” . 433 FO, 529. 113 1.1. Responde oferecendo-se Cada ursulina, tocada e mudada pela graça da vocação, vive no desejo de assumir a mesma caridade de Cristo e se abre ao dom da graça oferecendo-se livre e totalmente a si mesma. Na sua relação com Deus, 434 contempla a Caridade, que se revelou “paciente e benigna” na obra da Redenção e mostra as dimensões infinitas da profundidade, largura, 435 cumprimento e amplitude do coração de Deus . Do amor imolado e gratuito de Cristo, aprende a oferecer-se, a doar a sua liberdade, a inteira sua vontade, cada pensamento e ação, tudo quanto 436 437 lhe pertence . Aprende da “sacratíssima paixão de Nosso Senhor” a expressar na ação apostólica, a imagem de Cristo que derrama o seu sangue 438 439 “por amor a nós” . Reconhece as próprias lentidões em servi-lo e recebe força para estar pronta a derramar até mesmo o próprio sangue, “se for 440 necessário para abrir a cegueira da mente dos pecadores e salvá-los” . 1.2. Expressa em si mesma a imagem de Cristo Na sua ação, a ursulina quer expressar a imagem viva do seu Esposo 441 Divino que, fazendo-se Bom Pastor, conhece os seus e se deixa por eles 442 reconhecer, para conquistá-los ao seu amor . Torna-se disponível para que nela possam imprimir-se e manifestar-se “as características da verdadeira 443 caridade de Jesus Cristo” . A ursulina, chamada a revestir-se deste Cristo, sob o seu exemplo deseja instaurar com as pessoas, relações que exprimam a caridade na 434 FO, 530. Ibid. 436 Cf. Reg V. 437 Ibid.; cf. Rec. Prol, 20. 438 Reg V, 25. 439 Ibid., 27. 440 FO, 530; cf. Reg V, 34. 441 Cf. FO, 55. 442 Cf. FO, 529. 443 FO, 530. 435 114 gratuidade, animada pelo desejo que a impele a se consumir para a salvação 444 do outro . 1.3. Deixando-se educar pela cruz A ursulina assume com Jesus, “luminossíssimo, grandíssimo 445 exemplo de paciência” , o sofrimento que existe hoje no mundo. Acolhe, como seus, os sofrimentos da Igreja e dos pobres e, solidária com eles, toma sobre si mesma amorosamente os sofrimentos e as contradições que esta 446 solidariedade comporta. Se deixa educar na escola da “cátedra da cruz” e pede a força para aceitar de sacrificar-se como Jesus. Vive a cruz como amorosa participação à obra de redenção e, enquanto acolhe a dor, tem a certeza de que cada aflição e tribulação se 447 transformarão em alegria, em gaudio . 1.4. Cuida do próprio crescimento 448 Chamada a santificar-se para santificar, a ursulina se dá o tempo para a autoformação, no cuidado da qualidade da própria vida espiritual. A fidelidade à oração, ao silencio interior, ao confronto com a Palavra são para ela condições indispensáveis para o seu crescimento. Prepara-se e atualiza-se, através do estudo e da reflexão assídua, para amadurecer também a necessária competência, e estar à altura da missão. A atenção à autoformação é uma forma de ascese necessária e que empenha cada ursulina no cuidado do seu comportamento. 444 Cf. FO, 289. FO, 176. 446 FO, 506. 447 Rec. 5º. 448 Cf. FO, 216. 445 115 2. UNIDA COM OS LAÇOS DA CARIDADE “Cada uma de vocês, esposas de Jesus Cristo, tem por companheiras outras Esposas d'Ele. Como devem reciprocamente estimar-se e amar-se 449 estas Irmãs! . A última recomendação minha, que lhes faço, e com a qual até com o sangue lhes rogo, é que sejam concordes, unidas juntas, todas de um só coração e um só querer. Sejam unidas umas às outras com os laços da 450 caridade, apreciando-se, ajudando-se, suportando-se em Jesus Cristo . Professarão uma docilíssima e amável harmonia entre elas, assim que a caridade recíproca seja o principal vínculo que as une e o sinal que as 451 distingue” . 2.1. Acolhe o dom da Comunidade O Amor infinito de Deus, mistério de Comunhão Trinitária, se comunica a todas e a cada ursulina, em Cristo, como amor de Esposo. A ursulina é agradecida pelo dom da Comunidade e encontra nela o 452 primeiro lugar no qual viver a expansão do amor e faz desse amor o seu primeiro empenho de vida. 453 Cultiva a sua relação pessoal com Cristo, o verdadeiro Vínculo que a une às irmãs e procura aprender a amar cada uma da mesma amabilidade e 454 mansidão de Cristo , da sua misericórdia e ternura. Consciente do alcance apostólico do ser unidas, cada ursulina aproveita tantas ocasiões que a vida de comunidade oferece e se empenha para que a “mútua caridade” se torne sempre mais visivelmente “sinal que 455 distingue” , realizando a primeira ação missionária da Comunidade. 449 450 451 452 453 454 455 FO, 288. Rec. Ult, 1-2. FO, 10 e 149. Cf. RdV 45. Cf. FO, p.10. Cf. Leg. 3º. FO, p. 10. 116 Torna-se solícita e primorosa para com todas contribuindo num intercâmbio, que enriquece e une; atenta e compreensiva, presta ajuda de 456 coração segundo as suas possibilidades. Também através da escuta e a partilha estabelece relações significativas que pacificam, criando um clima 457 de amorosa harmonia , no qual é possível dar expansão ao coração e 458 construir laços de caridade que tornam bonito o ser unidas . Acolhe e promove as ocasiões para “ver-se como queridas irmãs, e assim refletindo 459 juntas espiritualmente, possam alegrar-se e consolar-se juntas” , sabendo 460 que o estar juntas também fisicamente é “de não pouca alegria” , para que 461 todas “sejam unidas e concordes no querer” e disponíveis a renunciar aos seus gostos, limitar as suas exigências, rever e confrontar o seu modo de pensar, mediar algum desentendimento. 2.2. Estima cada uma e aceita a gradualidade Na Comunidade, por dom constitutivo, torna-se recíproco o estimar462 se e o amar-se : a ursulina para construir uma relação de amor recíproco, 463 para viver em relação de “docilíssima e amorosa harmonia” que une 464 umas às outras, empenha-se antes de tudo a estimar e apreciar cada uma , cultiva as motivações que fundamentam e tornam autêntica essa sua estima: 465 as suas irmãs são, como ela, “Esposas de Cristo” . Empenha-se na acolhida de todas, com aquela singeleza que caracteriza os laços de fraternidade. Aprecia cada uma na sua diferença de idade, de cultura, de temperamento, de costumes e acolhe as diferenças como riqueza. 456 457 458 459 460 461 462 463 464 465 Cf. Rec. 8º. Cf. FO, 149. Cf. Rec. Ult. Leg. 8º, 3-5. Leg. 8º, 6. Leg. 10º, 7. Cf. FO, 280. FO, 10. Cf. Rec. Ult. FO, 288. 117 A ursulina é convicta que a comunidade é uma realidade doada e 466 sempre “a ser construída, dia a dia com a contribuição de todas” , aceita a gradualidade do crescimento e se empenha confiante sabendo que o amor de Cristo já realizou a comunhão, fundando-a sobre o seu próprio sangue. Por isso é possível construir a Comunidade. Respeita, em si e nas irmãs, os tempos de crescimento e aprende a 467 compadecer e a perdoar em modo “fácil, pronto, generoso” . Em tal empenho é sustentada pela força do amor que torna desejável o 468 sacrifício de si em vantagem do outro , como Cristo faz com cada uma. Promove, em comunidade e com as pessoas que encontra na missão, a 469 busca feita em conjunto, na oração e no discernimento . Manifesta com clareza e coragem, o que considera um bem, especialmente em relação à 470 ação apostólica, e se submete de coração a quem tem a tarefa de decidir . 3. COM AMOR DE MÃE “Estendam com Jesus os seus braços à amplitude da caridade, para que as suas obras, as suas orações, os seus sofrimentos, unidos àqueles de Jesus Cristo possam ser úteis para atrair à maior virtude os bons e converter os pecadores. O seu coração, o seu pobre coração, seja traspassado e aberto como aquele de Jesus, para que jorre abundante misericórdia em vantagem das almas. Em fim doe-lhes, Jesus, seu dulcíssimo Esposo, uma caridade fecunda de bons conselhos, de santos exemplos, de fervorosa oração, de obras generosas, de ajudas, de confortos, de compaixão, de ternura, para poderem ser verdadeiras mães espirituais 471 como Santa Ângela as quer” . “O amor espiritual é sem alguma comparação muito mais potente do 466 467 468 469 470 471 RdV 37. FO, 299. Cf. FO, 528. Cf. RdV 56. FO, 16. FO, 299-300. 118 amor segundo a natureza [...] se amarão as suas filhinhas com viva e ardente caridade, será impossível que não as tenham todas particularmente 472 gravadas na memória e no seu coração , [...] esculpidas no coração uma por uma, não somente os nomes, mas também a condição, a índole e toda 473 situação delas” . 3.1. Aberta a todas e a cada uma por necessidade do coração 474 A ursulina é chamada em primeiro lugar a infundir nas pessoas que 475 encontra a “viva e ardente caridade” que lhe inflama o coração; o seu é amor de mãe espiritual “sem comparação e mais potente do corporal porque 476 é sugerido, alimentado, inflamado pela graça” . O seu é um coração de mãe espiritual que gera a dá à luz desde as entranhas da sua caridade, uma 477 caridade ao feminino, feita de acolhida e ternura . Leva no coração as 478 jovens que lhes foram confiadas esculpidas uma por uma , as cuida na profundidade do seu ser, onde se estabelece uma relação de conhecimento amoroso, que lhe permite tê-las “gravadas” na memória e no coração. 472 Leg 2º, 9. Ibid., cf. Rec. 2º e 4º. 474 FO, 298. 475 Leg 2º, 10. 476 FO, 298: O Fundador retoma e remete ao Leg 2º onde “a ardente caridade” se torna generativa e se expressa com a intensidade da “necessidade do coração”: “Poderia ser chamada mãe espiritual sem ter gerado e dado à luz filha alguma das entranhas da sua caridade?”. 477 A atenção e os Escritos de Santa Ângela e a mesma obra educativa desejada pelo Fundador, são orientados ao mundo feminino; Pe.Agostini, indica às ursulinas do seu tempo, as meninas pobres e abandonadas como o campo onde viver a paixão ardente pelas almas. O mundo feminino fica e é a primeira preocupação das filhas de Ângela e Pe. Zefirino. Como pensava Pe. Zefirino, como mulheres somos capazes de entrar em relação educativa mais facilmente com a jovem, por uma sensibilidade afim e também por uma consciência carismática. Na prática educativa, na maior parte dos ambientes onde estamos inseridas, a co-educação nos faz encontrar a menina, a adolescente e a jovem junto aos seus colegas. Por esse motivo, no presente texto, em referência aos destinatários da nossa missão, se usará tanto o masculino quanto o feminino. 478 Cf. Rec. Prol, 11. 473 119 3.2. Com afeição e afabilidade Na ursulina, mãe espiritual, a caridade se manifesta como afeição que a torna capaz de acolher a todos com abertura de coração: “[...] ama a todas 479 igualmente” [...] as abraça com viva caridade” . Não descuida de ninguém, cuida especialmente dos mais pequenos, tem atenção para com todos segundo as necessidades de cada um; se comporta como uma mãe e 480 “com mais razão” porque o seu amor é alimentado pela Graça . Este amor se manifesta na sua afabilidade respeitosa e delicada; suave e doce no aspecto e no comportamento a ursulina educadora pode encontrar a jovem em num relação de serena confiança. Cuida para ter, sempre e com todos uma atitude amável, que encoraja, facilita a comunicação, faz superar os temores porque deixa perceber a profunda benevolência. Acolhe uma recomendação que Santa Ângela sublinha com particular intensidade: “[...] rogo-lhes, por favor, esforcem-se de atraí-las com amor e com mão suave e doce, e não imperiosamente e nem com aspereza, mas queiram ser afáveis 481 em tudo” . Através do trato humilde, da atitude equilibrada e serena, da disponibilidade em ver e louvar o bem do outro, testemunha o amor de Deus. 3.3. No conhecimento amoroso pessoal 482 A ursulina “abraça com caridade indistintamente a todos” porque todos lhe são caros e, ao mesmo tempo, trata cada um segundo a sua concreta situação, com aquela capacidade de intuir, que move a comportar-se de 483 modo adequado, segundo o tempo e o lugar . A caridade lhe faz compreender as perguntas verdadeiras do jovem para responder-lhe 484 segundo a necessidade . 479 Cf. Rec. 8°. FO, 298; Leg 2°, 8. 481 Leg 3°, 1-3. 482 FO, 298. 483 Cf. Rec. 2°. 484 Cf. FO, 298. O Fundador, em modo pessoal, faz referência também neste texto, a Santa Ângela, fazendo própria a escolha da educação personalizada que é 480 120 Ama as mais pequenas e frágeis, as mais fortes e ardentes, as mais virtuosas ou defeituosas, com a discrição que lhe vem do intuito amoroso de mãe, se faz por vezes mais terna ou mais prudente, pronta para encorajar dando confiança, para sustentar, consolar e ajudar. 3.4. Reconhece e aprecia a dignidade de cada pessoa Consciente de que a grandeza do seu empenho educativo deriva da dignidade das pessoas a serem educadas, a ursulina nutre para com cada uma 485 delas uma estima sem medidas por aquilo que são: “criaturas de Deus” 486 abertas ao infinito do Seu Mistério, “as coisas mais preciosas que ele tem” adquiridas ao preço do sangue do próprio Filho. Fundamenta o seu apreço sobre essa realidade de fé, sabendo que quanto maior será a estima, tanto mais as amará e quanto mais as amará, tanto mais cuidado e solicitude terá 487 por elas . Por isso é respeitosa da liberdade de cada pessoa, que Deus fez a sua imagem. Torna-se companheira de caminho e, com a força da sua caridade e amizade, convida e aconselha; quer o bem e respeita o mistério de liberdade 488 de cada uma ; evita “impor as coisas, porque Deus deu o livre arbítrio a cada um e não quer forçar a ninguém, mas somente explica, convida e 489 aconselha” . É consciente de que as pessoas pertencem a Deus e assim o futuro 490 delas : “[...] e vocês não sabem o que Ele quer fazer delas”. Portanto se antecipada como profecia do educativo seja em Ângela que no Fundador, com a nota característica de uma caridade toda ao feminino. “Este cuidado pois vocês devem desenvolver segundo a necessidade: as mais novas em idade e mais fracas terão necessidade de maior ternura; as mais robustas e ardentes de espírito, necessitarão de maior prudência; às mais defeituosas devem estar perto com aquele paciente amor que uma paciente mãe tem para com o filho enfermo; às tímidas devem dar confiança; as pobres ajuda; às fracas de ânimo e desconsoladas, oportunos confortos”, cf., em particular, Rec. 2º. 485 Rec. 8°, 2. 486 FO, p. 17. 487 Cf. Rec. Prol. 488 Cf. RdV 13. 489 Leg 3º, 8-11. 490 Ibid, 2. 121 empenha na missão apostólica sabendo que Deus “das pedras pode tirar 491 filhos celestes” e fazer “coisas admiráveis a seu tempo e quando lhe 492 agradará” . 3.5. Sábia e vigilante Com solicitude primorosa, a ursulina não somente procura conhecer as suas filhas e dar-se conta das suas necessidades, mas não perde tempo e depois de ter compreendido as necessidades verdadeiras de suas filhas 493 procura providenciar, resolver “da melhor forma possível” . Solícita e pronta empenha a si mesma, o seu tempo e as suas forças para tirar da situação de dificuldade as pessoas confiadas a ela e não hesita a recorrer a quem pode ajudá-la, afim de que as pessoas vivam segundo o projeto de Deus. Sabe que a juventude lhe foi confiada para que fosse cuidada. Ela, que não ignora a presença do mal, se faz atenta, como vigilante pastor, para 494 poder cuidar e defender o jovem . A ursulina é solícita e atenta porque, como pessoa sábia, sabe que o compromisso é tão importante que não existe um de maior importância, mas é também consciente da presença do perigo e 495 do mal . Por isso, procura os meios para favorecer a ação da Graça e ajuda os jovens a formar uma consciência crítica capaz de perceber a ambigüidade 496 da lógica do mundo . 4. INCANSÁVEL NO ZELO “Não se pode cooperar na obra de salvação da juventude sem o zelo, 497 e esse tem que ser sempre sustentado pela constância” . 491 Rec. 8°, 6. Rec. 8°, 9. 493 Rec. 4°, 2. 494 Leg 10°, 1. 495 Cf. Reg Prol. 496 Cf. FO, 116-120. 497 FO, 368. 492 122 “Sustentado pela constância, com muita paciência pelas muitas dificuldades, o pouco proveito, pelas contínuas ingratidões, resistências e 498 perseguições que se encontram” . “Pois, que se esforcem, com todo seu poder, de conservar-se segundo o chamado de Deus, e que procurem e queiram todos aqueles meios e aquelas vias que são necessárias para perseverar e progredir até o fim. Não basta, portanto, começar, se não se perseverar. Portanto diz a Verdade: 499 quem terá perseverado até o fim, será salvo” . “A fortaleza e o verdadeiro conforto do Espírito Santo estejam em todas vocês, a fim de que possam sustentar e realizar fielmente a obra que 500 lhes foi confiada” . 4.1. Com coração aberto, se empenha assiduamente A ursulina amplia a sua visão além do âmbito em que opera sabendo que está colaborando com um projeto maior. Enquanto se empenha com 501 diligência no compromisso que lhe foi confiado , se sente partícipe da missão apostólica da Igreja e mantém o coração e a atenção abertos ao inteiro campo apostólico da Congregação. Por quanto lhe é possível se interessa na sua atividade de evangelização, consciente de que toda a missão 502 do Instituto e a fidelidade lhe pertencem e trabalha assiduamente e com os meios considerados mais oportunos juntamente com a comunidade e os colaboradores leigos. 4.2. Com a fortaleza do Espírito A ursulina sabe que o Espírito de Deus fundou a Companhia; é ele quem suscitou em Santa Ângela a intuição carismática da virgindade consagrada no mundo e da maternidade espiritual; é ele quem mantém viva, 498 FO, 115. Reg Prol, 9-10. 500 Rec. Prol, 3-4. 501 Cf. FO, p. 120. 502 RdV 8. 499 123 renovada, fecunda, aquela corrente de vida que, de Ângela em diante, não cessa de dar frutos abundantes; é ele que continuamente suscita no coração 503 conselhos e inspirações . Sustentada pelo Espírito, portanto, obtém força para poder realizar a 504 obra e não se deixa desanimar pelo empenho que a mantém em relação, 505 “dia e noite” , às pessoas da sua missão. Na confiança operosa espera a grande recompensa, abrindo-se à esperança teologal e cuida da sua relação privilegiada com o Senhor, fonte do empenho e da perseverança na obra 506 começada . 4.3. Sempre e em cada situação Uma ursulina pode cumprir a sua missão como educadora da 507 juventude porque Deus sustenta a sua constância . Esta qualidade é indispensável na ação educativa, que exige um cuidado contínuo pelo jovem, no empenho de todas as energias, em todo tempo. Para a ursulina educadora, a ocasião para viver a paciência é cotidiana. A caridade paciente torna-a capaz de acolher sempre o outro sem 508 reservas e sem recusar a fadiga. A sua pedagogia nasce de uma mentalidade de fé e torna-a capaz de promover e fazer nascer o homem novo 509 e de fazê-lo crescer segundo a estatura de Cristo . 5. NAOBEDIÊNCIAAMOROSA “Cristo e a obediência são uma só coisa: pensava por obediência, falava, operava, até à morte de cruz ... e obedeceu a todas as pessoas, em 510 todas as coisas, de modo perfeitíssimo” . 503 Cf. Reg VIII, 14. Cf. Leg Prol. 505 Rec. 1°. 506 Cf. Leg Ult. 507 Cf. FO, 368. 508 Cf. FO, 299. 509 Cf. Ef 4, 13. 510 FO, 170. 504 124 5.1. À procura do verdadeiro bem Entregando a própria vida a Deus e à sua guia, experimenta a obediência como dom que, libertando-a de si mesma, torna-a idônea à 511 missão ; acolhe a missão específica do Instituto como vontade do Senhor e 512 toma “uma integra e estável determinação de submeter-se totalmente” e, 513 na fé, receber d'Ele o que é chamada a realizar por seu amor . A ursulina sabe que a vontade de Deus é o Bem a ser procurado como necessário para a sua vida; por isso, através da sua livre e constante adesão à vontade do Pai acolhe como graça da bondade divina a missão apostólica 514 pela qual se reconhece seu instrumento . 5.2. Na Igreja 515 A ursulina realiza a sua missão em adesão às orientações da Igreja , à 516 qual Cristo confiou a tarefa “de conduzir as pessoas à salvação” ; procura ser, com o melhor das próprias energias, coadjutora de Cristo através da educação. Interessa-se dos itinerários que a Igreja elabora, preocupa-se me conhecer os seus documentos, sobretudo em referência ao mundo juvenil; informa-se sobre as orientações e atividades da igreja local e colabora de coração nas obras paroquiais e diocesanas. Deseja alcançar a todos e especialmente os jovens confiados a ela como seu campo específico; sabe obedecer, porém, à sabedoria de fé do Fundador que lhe sugere de fazer quanto é verdadeiramente possível, com a certeza que “isto bastará diante de Deus como se fosse obra estupenda e 517 prodigiosa de caridade” . 511 Cf. RdV 60. Leg Prol, 22. 513 Ibid. 514 Cf. Leg Prol, 5-8: “Querendo Deus, com sua eterna decisão, eleger fora da vaidade do mundo [...] esta nossa Companhia, e sendo que lhe agradou, na sua infinita bondade, quis usar-me como seu instrumento, por uma tal obra, apesar de ser eu insuficiente e inútil serva, também me deu e me concedeu, segundo a sua bondade, tal graça e tal dom de poder governá-la segundo a sua vontade”. 515 Cf. Reg VIII. 516 Cf. FO, 184. 512 125 6. HUMILDE E CONFIANTE “Pensem que a humildade foi a primeira virtude professada pelo (humanizado) Encarnado Filho de Deus, pelo qual foi um opção mesmo descer do céu para a terra e rebaixar-se no aniquilamento [...] se abaixou 518 quase ao nada” . “Eu olho de novo o meu Jesus crucificado e o vejo feito vítima de 519 humilhação extrema. Sendo Ele Deus aniquilou-se” . “A humildade é próprio aquela virtude pela qual somente o Senhor olha propício a pessoa, mora nela, comunica-lhe até mesmo os seus 520 profundos segredos” . “Quanto mais uma árvore está carregada de frutos, tanto mais 521 abaixa os seus ramos, e neste seu abaixar-se mostra a sua riqueza” . 6.1. Conhece a si mesma e encontra o seu lugar É na relação que o Senhor estabelece com a ursulina, que ela encontra o seu lugar, descobre que através da sua pequenez, Ele constrói com ela uma relação inédita de amor e lhe concede os seus dons. A sua pobreza, aceitada em relação à grandeza do amor de Deus, torna-a confiante e “esvaziando-se 522 de si mesma” a faz gozar de grande liberdade . Com a inteligência iluminada pela graça atribui a Deus quanto é seu, toma consciência de não possuir nada que não lhe seja doado e se alegra porque “Deus é o tudo e o 523 tudo em Deus” . Experimenta com gratidão que “o Senhor a olha propício, 524 mora nela e lhe comunica até mesmo os seus profundos segredos” . 517 FO, 300. FO, 166. 519 FO, 399. 520 FO, 82. 521 FO, 168. 522 FO, 88. 523 FO, 166. 524 FO, 82. 518 126 6.2. Instrumento inadequado, porém confiante A ursulina reconhece a sua inadequadez, diante da grandeza do compromisso. É consciente que Ele a escolheu movido somente pelo amor; Deus poderia escolher outros instrumentos mais aptos e a escolheu porque lhe quer bem; sabe de ter mais necessidade ela de servir na missão do que os 525 outros de receber o seu serviço . Aceitando a sua impotência e a sua lentidão reforça a confiança na 526 ajuda de Deus , sente-se segura do Senhor que lhe confiou tal empenho e 527 lhe dará também as forças para realizá-lo . Instrumento frágil e inadequado coloca a sua firme confiança em 528 Deus vivendo um sadio equilíbrio entre o temor pela sua própria fragilidade e a sua plena confiança em Deus: “[...] um belo enxerto, uma 529 grande confiança com um santo temor” . Quando se encontra em dificuldade não desanima, porque tem certeza de que Ele a ajudará em todas 530 as coisas . Livre de si mesma e confiante em Deus torna-se disponível, com 531 coração e inteligência, para a missão . 6.3. Cria relações positivas Na sua ação apostólica, apresenta-se aos outros por aquilo que é: 532 instrumento do qual Deus se serve ; aprecia o outro no qual Deus colocou a 533 sua mesma imagem, o estima, sente que é um dom poder servi-lo . Cria relações fraternas com todos e em particular, com os pobres e pequenos, porque vê neles melhor refletida a imagem de Cristo, manso e humilde de coração. Reconhecendo-se pequena, torna-se autêntica e 534 acreditável: tem na humildade, “fundamento de todas as virtudes” , uma 525 Cf. Rec. 1°. Cf. Leg Prol; FO, 8. 527 Cf. Rec. Prol. 528 Cf. FO, 84. 529 FO, 85. 530 Cf. Rec. Prol. 531 Cf. FO, 88. 532 Cf. Rec. 5°. 526 127 afabilidade que facilita o empenho de entrar em relação construtiva com o outro, necessária para poder educar. “Sejam humildes e serão sábias” 535 recomenda o Fundador . É capaz de colocar-se de lado para que o outro tenha espaço para a sua autonomia. 7. SIMPLES, PROCURA “DEUS SÓ” “Em primeiro lugar, cordialíssimas mães e irmãs minhas em Jesus Cristo, esforcem-se com a ajuda de Deus em adquirir e em conservar em vocês um tal conceito e bom sentimento, de ser movidas a tal cuidado e 536 governo somente amor de Deus e pelo zelo pela salvação das pessoas” . “Para começar, tenham bem claro que a pureza de intenção consiste em fazer tudo com a única finalidade de agradar a Deus [...]. Jesus Cristo nos faz compreender que se a nossa intenção é simples, isto é, que não tem outro fim que a sua complacência, então a obra é toda boa e resplandecente de pureza [...] Mas o que tem de próprio a santa simplicidade? De admitir em si somente o gosto de Deus. Então vejam que a reta intenção é a alma das nossas ações, que a elas dá vida e faz que sejam 537 boas. [...] Deus olha o coração” . 533 Cf. Rec. 1°. FO, 165: “Humildade, humildade, quanto és grande por excelência, e apreço! [...] Ela é o único, o sólido fundamento de todas as virtudes. É verdade que a fé é a base de toda a fábrica espiritual, que nós devemos elevar até à vida eterna, porém, a humildade é o fundamento da mesma fé. Não acredita quem não é humilde. Esta uma verdade, ahi! muito comprovada pela experiência”. 535 FO, p. 168. 536 Leg 1°, 1-3. 537 FO, 63-64. 534 128 7.1. Com o coração e as mãos numa só direção Aursulina é animada pela caridade que a leva a agir somente por Deus e pelos seus filhos, esta é a única força que dá eficácia e fecundidade à ação apostólica. A reta intenção do coração torna-a capaz de agir por Deus e de acolher os frutos bons da sua ação nela: “Se a nossa intenção não tem outro 538 fim que agradar a Deus, então a obra é toda boa” . Deus olha o coração. Ele nos pede para fazer, no nosso trabalho 539 educativo, o que podemos e o aceita como “obra admirável e prodigiosa” . Procurando somente o que agrada a Deus, “fazendo por Ele tudo aquilo que 540 faz” , a ursulina dá plenitude ao seu tempo e fecundidade à missão porque Deus opera onde encontra corações livres. Na comunidade e na atividade apostólica a ursulina simples não 541 deseja uma incumbência ao invés de outra , é feliz com a tarefa que lhe é confiada, com o que é estabelecido para ela. É feliz se uma atividade parece dar bons frutos, mas não depende disso a sua satisfação pessoal porque sabe que aos olhos do Senhor a bondade da ação é medida pela intenção com a 542 qual foi cumprida . 7.2. Serena diante dos limites Aceita com realismo os próprios limites e as dificuldades da missão, sem afligir-se pelo que não pode realizar, se for consciente de ter feito 543 544 quanto podia e é feliz pelo bem que outros realizam . Quando parece que o seu esforço não produz os êxitos esperados ou comete qualquer erro ou fracasso, não se maravilha muito, sobretudo “não se perturba, permanece 545 na mesma paz” . Quando lhe pedem um trabalho torna-se disponível e o assume com responsabilidade. 538 Ibid. FO, 66. 540 Ibid. 541 Ibid., 65. 542 Cf. FO, 64. 543 Ibid. 544 Ibid., 65. 545 FO, 65; FO, 66: “Convençamo-nos de que o Senhor não espera de nós coisas 539 129 8. ALEGRE NO SENHOR, HABITADA PELA PAZ “Esta santa alegria é como o perfume das virtudes da alma que se 546 espalha em suave odor com agradável sensação de todos” . “Confortem-nas, exortem-nas a permanecer animadas e dar-lhes-ão esta boa notícia que eu lhes anuncio da parte de Jesus Cristo e de Nossa Senhora: quanto devem se alegrar e fazer festa, porque no céu para todas, 547 uma por uma, está preparada uma nova coroa de glória e de alegria” . 8.1. Profundamente em paz, anseia à plenitude 548 Na ursulina, a alegria, “preciosíssimo dom do Espírito” , tem um duplo valor: é dom a ser acolhido e comunicado, perpassa a sua vida de 549 profunda paz, torna suave o jugo e leve o peso que o seguimento requer e dá eficácia à sua ação apostólica. Cultiva a alegria espiritual que nasce ancorada às admiráveis realidades que a esperança lhe faz esperar; vive, portanto, no meio do mundo com uma específica orientação e tem a certeza de completar um dia a sua alegria na luz da eternidade onde para todas as filhas e para cada uma está 550 preparada uma coroa de glória ; percebe a preciosidade e cuida desta 551 “íntima paz do coração” que, tendo em Deus a sua fonte, a une estreitamente a Ele. A alegria do seu coração se manifesta num aspecto constantemente alegre: o seu rosto, as atitudes e o modo de falar deixa transparecer a íntima paz da sua vida interior. As virtudes emanam ao seu redor um sentido de serenidade porque a alegria que nela habita “é como o perfume de todas as grandes, mas somente que o pouco que lhe damos, seja dado com reta intenção [...] faça com que enquanto desejas e enquanto operas, eu seja o único objetivo de todos os teus desejos, de todas as tuas ações”. 546 FO, 223. 547 Rec. 5°, 23-25. 548 FO, 221. 549 Cf. FO, 220. 550 Cf. Rec. 5°, cf. Leg Ult. 551 FO, 220. 130 552 virtudes” e como o perfume, por sua própria natureza, também a alegria da ursulina se espalha ao redor. 8.2. Serena também na provação A alegria que a caracteriza convive com as dificuldades, as cruzes e até mesmo com o ódio do mundo. As dificuldades e os sofrimentos não faltam na vida, como não faltaram, e com uma intensidade sem medida, na vida de Jesus, porém a alegria se enraíza na pessoal e única relação com o Único, por quem a ursulina sabe ser amada. 553 “Sejam alegres” : é assim que a ursulina atrai e ganha o coração da juventude; nada mais do que a força de atração e do fascínio da alegria e da serenidade permite ao jovem expressar o melhor de si. A ursulina faz da alegria uma força para a sua ação apostólica, porque contribui a difundir a Boa Notícia e testemunha que quem serve ao Senhor é pessoa realizada. 552 FO, 223, 420; “Tal paz é como o perfume das virtudes da alma e está estreitamente unida e dependente das virtudes teologais e “das virtudes fundamentais da humildade e da abnegação”. FO, 306. 553 FO, 223. 131 II PARTE LINHAS PARA A CONSTRUÇÃO DE UM PERCURSO EDUCATIVO INTRODUÇÃO A experiência de vida e de fé de Santa Ângela e do Fundador faz compreender a educação como uma realidade dinâmica, um “processo” que nos faz olhar a pessoa criada para ser feliz, chamada à santidade. Para isso, buscamos nos seus escritos, as origens, os fundamentos e as linhas da nossa missão educativa, e, isto é: • a imagem e experiência de Deus, • os elementos que caracterizam e constituem a pessoa no projeto de Deus, • a realidade da ursulina que, na missão educativa, expressa o seu ser esposa e mãe, • as atitudes fundamentais que caracterizam a ursulina no seu viver e educar. Propomos, em seguida, alguns dos elementos essenciais, como brotam da reflexão anterior, em perspectiva da construção de percursos educativos para diferentes destinatários. Tornam-se, portanto, linhas metodológicas que traduzem valores e conteúdos fundamentais, aos quais remetem continuamente, em propostas educativas. 1. VALORES E CRITÉRIOS DE TODO PERCURSO FORMATIVO Os valores e os critérios que temos individuado fazem parte do nosso carisma, nos caracterizam como consagradas-apóstolas-ursulinas e caracterizam, portanto, a nossa ação educativa tornando-se imprescindível em toda a nossa atividade. Citamos alguns, deixando aberta a reflexão e a re-compreensão do nosso ser Ursulinas na Igreja, a serviço dos irmãos. 1.1.“Unidas juntas” • colaborando como comunidade, disponíveis a oferecer e buscar colaboração com outras presenças educativas; 135 • • conscientes que a primeira mediação na obra educativa é a nossa pessoa; numa relação de reciprocidade, caracterizada pela amabilidade, estima, diálogo, confiança, respeito, responsabilidade e das demais atitudes próprias da ursulina. 1.2. Partícipes da missão da Igreja • Na fidelidade à Igreja e à sua missão universal que, concretamente, se traduzem com a inserção, responsável e zelosa, nas Igrejas particulares. 1.3. No campo que é próprio • O âmbito específico que nos foi confiado pelo Fundador é a juventude, “a mais pobre e abandonada”, especialmente feminina. 1.4. Com sabedoria de mãe • • • • • atenta a oferecer sólidos conteúdos de fé, ancorados à Palavra e à “doutrina segura” da Igreja, e com a contribuição que nos pode vir das ciências humanas; com a sabedoria da gradualidade que respeita o caminho de crescimento da pessoa; escolhendo e realizando o que é concretamente possível; oferecendo modelos de vida bem sucedidos, escolhidos entre os santos de ontem, primeiros entre os quais Santa Ângela e Pe. Zefirino, e entre as figuras significativas de hoje; olhando Maria “humilde e admirável educadora de Jesus”. 1.5. Numa contínua formação A autoformação é uma mentalidade e uma prática assídua e constante, necessária para manter vivas as motivações profundas que estão no início da nossa vocação e missão. A ação educativa, de fato, preciosa mas também complexa, deve considerar as mudanças que acontecem na pessoa e no contexto cultural no qual está inserida e exige uma contínua recompreensão construtivamente crítica. A isto responde o dever e o 136 compromisso da própria formação contínua. 2. PERCURSO FORMATIVO PARADIGMÁTICO A missão educativa é confiada a cada uma de nós que, como esposa e mãe, com o zelo herdado do Fundador, consumir a si mesma para oferecer à querida juventude uma “boa educação” da qual Pe. Zefirino e Santa Ângela fazem depender a felicidade terrena e celeste. A proposta educativa é fortemente enraizada no nosso ser coadjutoras de Cristo, chamadas juntas a manifestar a comunhão de amor que existe entre as pessoas divinas. Esta se traduz num percurso que acolhe e respeita a realidade maravilhosa da pessoa, ajudando-a a descobrir a grandeza da qual Cristo é autor e modelo. 2.1. Do modelo Trinitário, aprendemos o dinamismo da nossa ação educativa. O Pai, Autor da vida • • • continuamente nos gera educa-nos conduzindo a nossa pessoa da situação na qual se encontra à plenitude do ser alcança, acolhe e interpela cada uma de nós numa relação de confiança que nos regera e nos introduz no seu Mistério. Cristo, o Homem obediente por excelência, revela o rosto humano de Deus. Ele, o Bom Pastor, afável e manso, • • • deixa-nos um exemplo da sua perfeição e santidade transforma nossa vida configura-a a Si. O Espírito Santo é Dom que do íntimo acompanha a existência do homem; graça que, acolhida e favorecida, plasma a pessoa a imagem e 137 • • • • • semelhança do Cristo, Ele ensina toda a verdade encoraja-nos e consola ajuda a discernir continua a gerar via nova dá força de dentro, de onde “descem as invisíveis operações da graça e (as pessoas) tornam-se boas caminhando com a bondade; caridosas caminhando com a caridade; misericordiosas caminhado com a divina misericórdia”. 2.2. Construamos um percurso educativo As “fichas” que seguem são exemplificativas daquilo que temos refletido até este momento. Encontramos nelas os momentos fundamentais de um itinerário: • Um ponto de partida: olhado com os olhos de Deus e o coração de Deus é sempre algo de positivo, um ponto de força, “uma esplêndida dignidade”; • Objetivos para curta, média, longa validade; • Meta final: explicita sempre uma dimensão apostólica, um “ser luz”; • Meios. Tudo isso é como um “canovaccio” de base sobre o qual se definem pontos de partida e metas finais, objetivos, meios, etapas, prazos significativos para as diversas realidades nas quais operamos. 138 139 1 MEIOS adaptados a grupos de pessoas em tempos, ]na Igreja e no mundo do próprio tempo. Com atenção as: - necessidades dos próximos e distantes - situações em mudança - perguntas fundamentais Experiência de fé e de empenho cristão programados, vividos e confrontados à luz da Palavra Percursos de formação: - afetiva, relacional e social - intelectual - ética e cultural - comunicativa - de fé com uma mentalidade habitualmente disponível ao confronto, à avaliação crítica. - Criação de um ambiente de relação - com a ação e a palavra - em colaboração com a família e o contexto mais amplo Sobre as indicações deste percurso paradigmático, podem ser construídos percursos específicos, lugares, situações, exigências formativas diferentes. PARA SER LUZ REVESTIDOS DE CRISTO Fazer a passagem da multiplicidade do vivido e da experiência à sabedoria da vida que torna-nos partícipes e responsáveis na história. Amadurecimento dos valores humanos e cristãos no dinamismo da vida de Graça ESTUPENDA DIGNIDADE OBJETIVOS Consciência da dignidade da pessoa: descoberta-acolhida-amada MOMENTOS FUNDAMENTAIS 2.2.1. DA ESTUPENDA DIGNIDADE AO SER LUZ1 140 MÃE SEGUNDO O ESPÍRITO “ESPOSA DE CRISTO” PARTÍCIPE DA SUA PAIXÃO PELA SALVAÇÃO DE TODOS ESTUPENDA DIGNIDADE DO SER FILHA MOMENTOS FUNDAMENTAIS Contemplativa na ação, deixa-se conduzir por Deus que gera nela um amor previdente e confiante que a torna mãe no Espírito, aliado na sua ação educativa em favor das “coisas mais caras que o Senhor tem” Esposa de Cristo, perenemente educadora e aluna na sua escola, se reveste d'Ele, animada do seu mesmo zelo de caridade Torna-se sempre mais consciente da dignidade da própria vocação, continuamente redescoberta acolhida amada MEIOS Empenho das próprias energias de mente e de coração na missão e nós confiada Confronto com a Comunidade, com a Igreja, à luz da Palavra Em diálogo com pessoas e instituições, com as quais colabora, - atenta a perceber as situações em mudança e as perguntas fundamentais dos jovens - capaz de propor intervenções formativas realizáveis e com coerência com as necessidades. com uma mentalidade habitualmente disponível ao diálogo e ao confronto e a “recomeçar sempre” - Abertura à Graça através da vida sacramental que tem o seu centro na Eucaristia celebrada e vivida - Íntima familiaridade com o Senhor - Robusto exercício das virtudes - Criação de um ambiente comunitário no qual as relações, fundadas na estima recíproca, permitam a cada um de reconhecer e expressar o melhor de si - sintonia com a Palavra meditada e rezada, pessoal e comunitariamente - partilha cotidiana da vida, vivida nas suas diferentes expressões - escolha de meios oportunos, ao lado daqueles já previstos, para o crescimento da pessoa e da comunidade DE ESPOSA À MÃE OBJETIVOS 2.2.2. Para a educadora ursulina 141 PARA FAZER TODO O BEM POSSÍVEL ACOLHEMO-NOS COMO DOM E EM CRISTO CONSTRUIMOS A COMUNIDADE “UNIDAS JUNTAS” MOMENTOS FUNDAMENTAIS Fazer mover-nos gritar a deus com todo o coração partícipes da mesma sede que ardia no coração de cristo Disponíveis num empenho constante para tornar-nos abertas ao dom que continuamente nos é oferecido, acolhemos as diversidades como oportunidade de crescimento pessoal e comunitário Consciência da dignidade de Esposa de Cristo partilhada com outras Esposas OBJETIVOS - testemunhar a alegria de viver juntas - sentir-se enviadas pela comunidade - empenhar as energias de mente e de coração na obra apostólica confiada à comunidade - atentas, juntas, a perceber as necessidades do mundo juvenil, nas múltiplas situações de mudanças - juntas, dar a nossa colaboração nas várias atividades - colaborar com outras presenças educativas, eclesiais, sociais e civis - Perseverar e sustentar-nos nas dificuldades. - Abertura à Graça através da vida sacramental que tem o seu centro na Eucaristia celebrada e vivida - Íntima familiaridade com o Senhor - Robusto exercício das virtudes - com uma mentalidade habitualmente disponível ao diálogo e ao confronto e a “recomeçar sempre” - Criação de um ambiente comunitário no qual as relações, fundadas na estima recíproca, permitam a cada um de reconhecer e expressar o melhor de si - sintonia com a Palavra meditada e rezada, pessoal e comunitariamente - partilha cotidiana da vida, vivida nas suas diferentes expressões - escolha de meios oportunos, ao lado daqueles já previstos, para o crescimento da pessoa e da comunidade MEIOS 2.2.3. Para as nossas comunidades DO LAR DA MÚTUA CARIDADE AO ZELO INCANSÁVEL 142 Atentas as: - necessidades dos jovens próximos e distantes - situações em mudança - perguntas fundamentais oferecer a oportunidade de empenhos concretos e responsáveis - fé - de solidariedade cristã programados, livremente escolhidos, sempre vividos e confrontados à luz da Palavra No dinamismo da vida de Graça, iniciada como Batismo, assume gradualmente as características da pessoa de Cristo e do seu agir Amadurece uma atitude constante de serviço e escolhas de vida coerente, na responsabilidade diante das exigências do Reino no tempo em que vive APÓSTOLO/A NA IGREJA E NA SOCIEDADE - favorecer uma rede de relações pessoais e/ou de grupo: com outros jovens e com os educadores - propor percursos finalizados para a descoberta de si e da própria vocação - provocar, acolher e ajudar a discernir as perguntas fundamentais sobre o sentido da vida - projetar atividades a serem desenvolvidas junto com os jovens, que permitem e favorecem potenciar as características de cada um - confiar tarefas que envolvem, e os torne protagonistas e responsáveis em colaborar com a família e o contexto mais amplo num clima habitual de confronto, que amadurece a sua capacidade de avaliação crítica MEIOS CRESCER ATÉ A PLENA ESTATURA DE CRISTO Tornar-se sempre mais consciente da sua dignidade de pessoa de filho de Deus de chamado a um Projeto de vida OBJETIVOS Predispor caminhos de crescimento: - afetivo, relacional e social - ética e cultural - comunicativa - vocacional - de fé, de oração, de vida sacramental e de empenho solidário e missionário, em diálogo com as diversidades do mundo atual criando ocasiões de reflexão e de avaliação pessoal e de grupo “IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS” MOMENTOS FUNDAMENTAIS 2.2.4. Para os jovens DA DIGNIDADE DE FILHO DE DEUS AO EMPENHO DO TESTEMUNHO 143 - À luz dos critérios evangélicos, distingue e ajuda a discernir valores e contra-valores presentes no mundo dos jovens e na sociedade contemporânea - com os mesmos sentimentos de Cristo Bom Pastor, ama as pessoas com coração solidário e misericordioso - vive e propõe experiências de fé e de empenho cristão Sustentado por uma maturidade de empenho que o/a torna constante Assimilação e interiorização dos traços de uma personalidade capaz de viver e testemunhar em coerência com os critérios evangélicos Empenha a si mesmo/a num serviço concreto, sentindo-se, junto com a comunidade, partícipe e responsável, pelo crescimento humano e cristão das pessoas a ele/ela confiados PARA SER SAL DA TERRA E LUZ DO MUNDO - empenha-se e envolve outros na criação de um ambiente de relações que fazem crescer - participa da vida da comunidade - vive uma relação de colaboração com as famílias e outras presenças educativas MEIOS NA ESCOLA DO ÚNICO MESTRE Consciência da dignidade e responsabilidade de ser chamado, como batizado, a colaborar par ao crescimento em Cristo da pessoa inserida na Comunidade humana e eclesial OBJETIVOS Na escola do Evangelho - amadurece o sentido do serviço gratuito - cuida a própria formação humana, espiritual, teológica e eclesial - assume, no educar, a dimensão carismática ursulina - lê criticamente os acontecimentos de seu tempo Com uma mentalidade habitualmente disponível ao confronto e à avaliação ESTUPENDA DIGNIDADE DE COLABORADORES MOMENTOS FUNDAMENTAIS 2.2.5. Para os leigos colaboradores DA ESTUPENDA DIGNIDADE DE SER PARTÍCIPES... AO SER SAL E LUZ 144 Com a “boa educação” que em Pe. Zefirino se caracteriza em - amor e educação - instrução e bom exemplo - vigilância e correção no respeito à pessoa dos filhos e das suas escolhas de vida com a atenção de preparar o seu futuro crescendo juntos na obediência à Palavra Amadurecimento pessoal e do casal aberto à acolhida e ao cuidado da vida Acompanhar os filhos no seu crescimento para que se tornem capazes de colocar-se na história como protagonistas e construtores do Reino PARA SER PAIS E MÃES NA ÚNICA PATERNIDADE DE DEUS - construir uma relação de reciprocidade que, na acolhida do outro/outra, libera nele/nela as melhores energias - numa comunicação de si continuamente reconstruída - disponíveis para fazer o primeiro passo em direção ao outro/outra no recíproco sustento e na oração feita juntos - escolha de meios oportunos, ao lado daqueles já previstos, para o crescimento da pessoa e da comunidade MEIOS CRESCER E APRENDER JUNTOS Consciência da dignidade de ser chamados a tornar-se colaboradores de Deus na transmissão, cuidado e crescimento da vida OBJETIVOS - percursos de crescimento afetivo, relacional, de fé que reforçam a união do casal - incansável dedicação recíproca e para com os filhos - confronto e diálogo com outras famílias - atenção e disponibilidade em relação às necessidades do contexto em que vivem com uma mentalidade habitualmente disponível para a avaliação na Comunidade de fé DA ESTUPENDA DIGNIDADE DE CHAMADOS A GERAR E CUIDAR DA VIDA MOMENTOS FUNDAMENTAIS DE ESTUPENDA DIGNIDADE DE CHAMADOS A GERAR PARA A ÚNICA PATERNIDADE EM DEUS 2.2.6. Para os pais APÊNDICE CONCLUSIVO NOS ESCRITOS, IMAGENS QUE SE TORNARAM FAMILIARES INTRODUÇÃO Concluindo, citamos em seguida alguns textos de Pe. Zefirino, além da riqueza dos conteúdos são indicativos para possíveis percursos para as pessoas, a quem dirigimo-nos com a nossa ação educativa. Cada texto propõe uma imagem de imediata compreensão que, articulada e desenvolvida, pode tornar-se um ponto de partida eficaz para encontros ou para percursos formativos. Aordem com que são colocados os textos, pode responder ao caminho de crescimento segundo o Espírito. Este tem o seu início na inserção vital em Cristo, como ramos na videira; conduz-nos a contemplar e a fazer nossas as atitudes do Bom Pastor, que busca, defende, acolhe e festeja; tem como meta a fecundidade do nosso ser e agir que, em Cristo, traz fruto e fruto abundante. AVideira e os Ramos 554 “O Senhor me ajude a explicar bem este texto do Evangelho e vocês escutem-no com santo recolhimento e aprofundem-no. Jesus Cristo disse falando aos seus discípulos: Vocês sabem quem eu sou? Ouçam: Eu sou a videira e vocês os ramos desta mesma videira. Filhinhas, atentas a aplicação desta parábola, a vocês como Ursulinas, que é um estado de perfeição que vai além de uma vida simplesmente cristã, como a vida dos discípulos de Jesus Cristo que devia ser perfeita à escola do Divino Mestre. Jesus Cristo, sem dúvida, é a nossa videira e nós os seus ramos, mas a videira, que é Cristo em meio às ursulinas, fez surgir outra videira que forma uma única videira com aquela de Cristo, pela qual os ramos, que são as ursulinas, são nutridos da abundância das celestes bênçãos, porque produzem belíssimos cachos de uva, extrair excelente mosto, e excelentíssimo vinho. Entenderam bem agora que esta videira das ursulinas 554 FO, 245 ss. 147 é a planta feliz da sua Companhia, plantada e radicada no fecundo terreno da Santa Companhia e das santas regras que a animam, dirigem, fazem-na frutificar, pela divina virtude da videira verdadeira que é Cristo. Jesus Cristo, sendo ele a videira, e os seus discípulos os ramos, tinha anunciado uma verdade alegre e de consolação. Verdade assim alegre e de consolo para cada ursulina em poder dizer: eu sou um precioso ramo da videira que é Cristo, porque sou ramo da fervorosa videira da minha Companhia. Mas vocês devem andar devagar, ó filhinhas, de gloriar-se disto. Pensem bem e meditem se vocês têm o mérito de gloriar-se tanto assim. Aquilo que Jesus Cristo acrescenta me dá um pouco de medo. Não sei se isso também causa medo a vocês. Escutem o que Ele diz: qualquer ramo, seja ele produzido e unido a mim, mas que não produz fruto, o meu Pai, Agricultor, o cortará. Portanto, aplicando esta sentença às ursulinas, é necessário dizer que cada ursulina que não produz fruto de boa ursulina, Deus a arrancará da videira da sua Companhia. De que maneira Deus a arrancará da videira da sua Companhia? Sem dúvida, aquela ursulina que não produz fruto, que não recebe da videira o bom alimento, a boa seiva que a fecunda, parece ligada, mas de maneira estéril e infrutuosa. Deus Pai, que na sua Igreja enxertou esta videira da Companhia das Ursulinas à videira verdadeira do seu Filho, feito homem, não consegue suportar este ramo de Ursulina, arranca-o e libera a videira: e de que maneira? Privando-a das intervenções da verdadeira videira que é Cristo, isto é, das suas luzes, das suas graças. Jesus Cristo, depois de anunciar que ele era a videira e o Pai seu Agricultor, depois de pronunciar que todos os ramos que não produzem frutos, o Pai mesmo os cortará e os jogará, Ele acrescenta que cada ramo unido a ele, videira que produz fruto, o seu Pai se ocupará de purificá-lo para que produza mais frutos. E logo acrescenta: vocês, meus discípulos, sejam puros em virtude da Palavra que lhes anunciei. Minhas filhinhas, eu espero que o seu Jesus, o Esposo divino, fale a vocês a mesma linguagem. Imaginem ele aqui no meio de vocês, como certamente está com o Espírito da sua caridade. Abram os seus ouvidos, escutem-no o que lhes diz: Minhas discípulas, vocês são já puras e o são porque acolheram a doutrina do meu Evangelho, para serem submissas ao meu santo jugo e, sobretudo, por ter seguido a distintíssima graça que concedi a vocês de elegê-las minhas esposas e assim uní-las a mim, sua 148 videira, plantada no jardim da Companhia das Ursulinas. Companhia que eu mesmo edifiquei por meio das virtudes, dos méritos e das obras da minha serva e madre Ângela Merici. Sim, por tudo isso vocês puras. Mas é verdadeiro, ó filhinhas, que vocês todas são puras, daquele grau que deseja Jesus Cristo? Se assim fosse, não lhes será necessário outra coisa, par ser ramos assim purificados, de produzir sempre mais abundantes e perfeitos frutos. Estamos aqui, filhinhas, ao grande pensamento deste importante história. Esta videira divina, que é Cristo, quer frutos, e frutos sempre em crescente beleza e sabor, sempre mais apreciáveis, de ramos sólidos: “a fim de que produza mais frutos”. O Bom Pastor 555 “Jesus bendito disse de si: Eu vim ao mundo somente com o desejo de salvar as pessoas, dando a elas a vida da graça e vida a mais vigorosa e feliz. Sabem quem eu sou? Eu sou o Bom Pastor. E de que bondade? Do pastor que chega a dar a vida pelas suas ovelhas. Querem que eu o diga? Eu me sinto estreitar as entranhas de desejo que não tem repouso até que não me consuma vítima de sacrifício pela salvação das pessoas. Sentem-me agonizante da minha Cruz: Sitio, tenho sede. Como se não tivesse sofrido o suficiente, desejo, como homem extremamente sedento, de sofrer ainda mais, se fosse possível e necessário, para que ninguém se perca. Jesus bendito, que se declarou que do céu veio na terra para procurar não os justos, mas os pecadores, (nos diz): Olha-me, escute-me: • Cansado, debilitado, esperei uma pobre pecadora no poço da Samaria e a converti. • Chamei da banca um Mateus cobrador de impostos, do Sicômoro um Zaqueu, príncipe dos publicanos. Tornei-os meus. • Defendi, na casa do Fariseu Simão, a Madalena, que aos pés chorava, derramando lágrimas, arrependida dos seus pecados e eu a perdoei. 555 FO, 528 ss.; textos paralelos: FO, 113ss; 367ss. Fez-se a escolha da figura do Bom Pastor porque neste texto, as várias imagens de Jesus que são oferecidas, são todas dirigidas pelo Fundador à pessoa de Jesus que toma cuidado de cada pessoa, e que, como Bom Pastor, espera, chama, defende, procura, acolhe e festeja, envia. 149 • Representei-me com a imagem de um Bom Pastor que ansiosamente, entre barrancos e vales, procura a ovelha perdida e exultou de alegria per tê-la encontrada; sob a imagem de um Pai que, cruelmente abandonado por um filho ingrato, festeja o seu retorno com a mais esplêndida magnificência e alegria. E depois? E depois? Desta única missão eu encarreguei os meus Apóstolos quando disse a eles: Assim como o Pai me enviou eu envio vocês. Vão por todo o mundo: salvem todas as pessoas. Aárvore e os seus frutos 556 Dos frutos, diz Jesus Cristo, se conhece a bondade da árvore. Qual sentença mais clara do que esta? Jesus Cristo fez-nos a aplicação, e vocês o sabem; e tal aplicação serve também para vocês, no sentido que agora lhes explico. Vocês são Ursulinas. Mas como vocês podem ser reconhecidas como tais? Dos frutos, dos frutos, isto é, das boas obras, virtuosas e santas, que são intimamente próprias e ligadas ao seu estado. Mas a árvore não produz os seus frutos para retê-los para si, não, mas para fazer dom aos outros. A árvore recebe honra pelos seus ótimos frutos, mas especialmente daqueles que não somente admiram a beleza, mas saboreiam o seu gosto. Filhinhas, filhinhas. Assim uma ursulina, que é verdadeira ursulina, deve ser santa não para si somente, mas para comunicar a santidade a outros. Uma ursulina que é verdadeira ursulina deve, como tal, ser reconhecida e admirada por todos, mas especialmente daquelas almas que saboreiam os frutos, ou seja, os preciosos efeitos das suas santas obras. “Quanto mais uma árvore é carregada de frutos, tanto mais abaixa os 557 seus ramos, e no seu abaixamento mostra a riqueza dos seus produtos” . 556 557 FO, 297. FO, 168. 150 558 AUrsulina mãe “Digam-me: vocês não sabem que as filhas da grande Mãe Santa Ângela, devem ao vivo imitá-la tornando-se também Mães, Mães espirituais, cheias, portanto, de um amor espiritual, que Santa Ângela chama muito mais potente sem comparação daquele corporal? Ora se vocês são Mães, onde estão, pergunto eu, as suas filhas espirituais, como demonstram o seu amor por elas, mais potente sem comparação do corporal? Onde estão àquelas jovens, especialmente aquelas confiados aos seus cuidados, para educá-las à vida cristã? E quantas são? A verdadeira ursulina pode responder-me: Eu sei onde estão as minhas filhas, e tenho seis, dez, vinte sob a minha assídua vigilância. Carrego-as todas no coração, parece-me não viver senão para fazer a elas todo o bem possível. Mas uma ursulina interrogada e que fica muda, ou me diz somente: eu cuido de mim: rezo, comungo com freqüência, medito, examino a minha consciência, e depois ... e depois faço aquele bem que me parece melhor; esta ursulina, digo, jamais poderia chamar-se mãe espiritual, sem ter gerado filha alguma das entranhas da sua caridade? Mas que eu disse das entranhas da sua caridade, se assim comportase a Ursulina, manifesta de forma clara, de não ter esta caridade? Não pode ser diferente, porque se tivesse caridade, seria por ela uma necessidade do coração, de gerar e amar as filhas do próprio coração. E amá-las como? Com um amor, diz Santa Ângela, mais potente sem comparação do corporal, porque se este da natureza, aquele é sugerido, alimentado, inflamado da graça. Portanto, se as mães terrenas parecem que não tem outro tesouro no 558 FO, p. 297 ss. Outras imagens “educativas” propostas pelo Bv. Pe. Zefirino nos seus Escritos “Aos Jovens” são indicados: Juventude, primavera da vida, FG, 19, 27, 102. Juventude e desejo de santidade, FG, 42, 129, 155. Maria, a Mãe a quem se assemelhar, FG, 19-20, 96, 107, 114-119. 151 mundo que os seus filhinhos, quanto mais as ursulinas devem concentrar os seus afetos na sua família espiritual? Vocês devem abraçar com grande caridade indistintamente todas as pessoas queridas que o Senhor se digna de confiar aos seus cuidados especiais. Este cuidado vocês devem desenvolver segundo as necessidades: • As mais tenras em idade e as mais débeis em virtude terão necessidade de maior ternura; • As mais robustas e ardentes de espírito terão necessidade de maior prudência; • Às mais defeituosas, necessitam de um amor paciente, como uma paciente mãe que se dedica ao filho enfermo; • Às tímidas vocês devem dar confiança; • Às pobres ajuda; • Às impulsivas e desconsoladas, constantes confortos. Mas como fazer tudo isso sem sacrifícios? Vocês deverão ter sempre preparado o seu ânimo aos possíveis sacrifícios, sejam também grandes, para conquistar as pessoas a qualquer custo. Não é verdade que Jesus apreciou e estimou as nossas almas até desejar resgatá-las com todo o seu sangue? E vocês querem se poupar de qualquer coisa quando se trata de ganhar almas? Estendam com Jesus os seus braços à plenitude da caridade, para que as suas obras, as suas orações, os seus sofrimentos, unidos aos méritos de Jesus Cristo possam servir para ajudar a crescer as virtudes nas almas boas, e a converter as almas desviadas. O coração de vocês, portanto, o seu pobre coração seja também transpassado e aberto com aquele de Jesus para que dele jorre abundante misericórdia em vantagem das almas. Em fim, doe-lhes Jesus, o seu Esposo, uma caridade fecunda de bons conselhos, de santos exemplos, de fervorosas orações, de obras generosas, de ajudas, de confortos, de compaixão, de ternura, para poderem ser verdadeiras Mães Espirituais, como Santa Ângela as quer”. 152 BIBLIOGRAFIA FONTES AGOSTINI, Z., Manual para a Companhia das Ursulinas Filhas de Maria Imaculada, Tipografia deAntonio Merlo, Verona, 1869. Memórias sobre a fundação do Instituto das Ursulinas, 18 de fevereiro de 1887, Doc 114,AOV. Pregação aos Clérigos e Sacerdotes, Fascículo para o suo manuscrito,AOV. Escritos para o povo em várias circunstâncias, Fascículo para uso manuscrito,AOV. Regulamento para a Pia União das Irmãs Devotas de Santa Ângela Merici, Instituída na Paróquia dos SS. Nazario e Celso de Verona, 1856, Doc 123,AOV. Regras de disciplina para as irmãs internas devotas de S. Ângela Merici, Doc 123,AOV. Escritos às Mães Cristãs, 1873-1895, Fascículo para uso manuscrito,AOV. Escritos escolhidos sobre o ano Litúrgico “Homilias do tempo comum”, Fascículo para uso manuscrito,AOV. Escritos escolhidos “Aos jovens”, Fascículo para uso manuscrito,AOV. 153 O Fundador às suas Ursulinas FMI, Fascículo impresso par auso manuscrito, Tipografia D. Calabria, Verona 1983. Positio super virtutibus ex officio concinnata, Romae 1984,AOV. Oração da Irmã Ursulina FMI, Verona 1991,AOV. Projeto educativo escola das Irmãs Ursulinas FMI de Verona, Verona, 1992. Projeto educativo escola infantil, Verona, 1989. 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