1 BANCO DE DADOS GENÉTICOS PARA FINS CRIMINAIS: ASPECTOS JURÍDICOS 1 João Beccon de Almeida Neto 2 Resumo: O presente trabalho versa sobre uma das conseqüências do desenvolvimento científico que envolve a tecnologia do ADN, uma das vedetes da atualidade: banco de dados genéticos. Ele pode ser constituído de distintas formas e para diferentes finalidades, sendo uma e objeto desse estudo, o feito para a identificação criminal. Uma base feita com esse objetivo pode ser uma importante ferramenta à resolução de muitos delitos. Porém, isso pode também significar a deturpação de algumas garantias constitucionais, como a intimidade e privacidade, pois o os dados que compõem o ADN, não se limitam ao indivíduo, mas sim a sua hereditariedade. A partir de uma revisão bibliográfica, legislativa e jurisprudencial, tanto pátria como em direito comparado, o presente trabalho objetiva investigar, sem ter a pretensão de esgotar o assunto, analisar os aspectos jurídicos que envolvem o uso de um banco de dados de perfis de ADN com fins criminais. Palavras-chave: Impressão digital do ADN; Banco de dados genéticos; Intimidade; Privacidade CONSIDERAÇÕES INICIAIS Desde o início da civilização, o homem sempre considerou relevante a identificação pessoal: uma necessidade civil e penal de saber com o máximo de exatidão quem é quem dentro da comunidade. Se voltarmos aos primórdios de nossa história, veremos que as evidências mais antigas datam cerca de 4 mil anos, em múmias do antigo Egito. 3 Mas independente das diversas formas como eram feitas essas identificações, não há dúvidas de que a primeira grande evolução nesse campo, onde o homem logrou êxito na individualização pessoal, foi com o advento do uso das impressões digitais, no final do século XIX princípio do XX. 4 A segunda metade do século pretérito foi um período marcado por importantes avanços técnico-científicos. Avanços que, quiçá por terem ocorrido de forma tão radical, provocaram discussões éticas e morais de grande relevo. Um exemplo disso é a evolução da manipulação genética humana, fomentada pelos estudos a partir do ADN (Ácido 1 Monografia apresentada como requisito para a aprovação na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II, Curso de Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, aprovada pela Banca Examinadora composta pelo orientador Prof. Dr. Paulo Vinícius Sporleder de Souza, Profa. Dra. Anamaria Gonçalves dos Santos Feijó e Profa. Me. Lívia Haygert Pithan 2 E-mail: [email protected]. 3 FIGINI, Adriano Roberto da Luz; LEITÃO E SILVA, José Roberto; JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da. Identificação humana. 2ed.. Campinas: Millenniu, 2003. Outros povos utilizavam os dedos como forma de identificação pessoal. “Na antiga Babilônia, durante o reinado de Hamurabi, de 1955 a 1913 antes de Cristo, contratos eram selados com os dedos. Na China, selos de argila produzidos por impressão de dedos foram usados em cartas e documentos em um período tão antigo quanto o terceiro século antes de Cristo, havendo também documentos de contratos de negócios, identificados com a dinastia T’ang, datados do século oitavo antes de Cristo, nos quais havia digitais de alguma forma impressas. Em uma impressão profunda de polegar esquerdo em um selo de argila, havia, no lado oposto do selo, uma escrita Chinesa antiga representando o nome da pessoa que colocou a impressão digital. (sic)” (p. 11) 4 LORENTE ACOSTA, José Antonio. Identificación genética criminal: importância médico legal de las bases de datos de adn. In: Romeo Casabona, Carlos Maria (ed.). Bases de datos de perfiles de adn y criminalidad. Bilbao-Granada: Comares, 2002, p. 01-25. 2 Desoxirribonucléico, ou DNA se utilizarmos a terminologia inglesa) humano – como o Projeto Genoma 5. Esse cenário, para o Direito, implicou novos conflitos a serem resolvidos; modificou a relação processual no que tange às partes, uma vez que aumentou, significativamente, as formas e meios de obtenção das provas processuais. Hodiernamente, o trabalho de identificação do responsável de um crime está bastante facilitado. Qualquer tipo de fluido corporal deixado na cena do crime, como saliva, sêmen ou suor, ou mesmo um fio de cabelo, por exemplo, pode ser tornar um indício de suma importância. 6 Mas não basta, para a elucidação de um delito com esse tipo de prova, colher os vestígios; é necessário comparar os dados genéticos desses fluidos colhidos no local com os dos suspeitos. Para tanto, porém, necessário será a coleta desses, e é justamente aqui onde encontraremos forte conflito de interesses e interpretações. Para parte da doutrina e da jurisprudência pátria, o uso das novas técnicas vem de encontro à impunidade criminal: traz luz à tão buscada “verdade real” no processo penal. 7 ÁCIDO DESOXIRRIBONUCLÉICO: NOÇÕES PRÉVIAS SOBRE SEU USO NO ÂMBITO DA CIÊNCIA CRIMINAL O ADN é o material genético nuclear dos seres humanos e está presente em todas as células do nosso organismo. É ele que determina a função de cada célula, dando assim a cada indivíduo suas características, que podem se manifestarem ao longo de sua vida. 8 Como o ADN determina as características de cada indivíduo, fazendo com que haja uma 5 “[...] o termo genoma [etimologicamente: do grego gennan, ‘o que era’, e oma, ‘massa’], que indica o quadro haplóide de cromossomos de uma espécie [ou seja, um cromossoma de cada tipo], traduz também o conjunto de todos os genes isolados do indivíduo, na condição de que não haja nenhum gene formando par. Isso é comum nos gametas (células reprodutoras).” (SOARES, José Luís. Biologia no terceiro milênio: biologia molecular, citlogia, histologia, v. 1. São Paulo: Scipione, 1999, p. 265. 6 As formas de coleta, armazenamento e fonte, podem ser consultadas em: BEZERRA, Carlos César. Exame de dna: coleta de amostras biológicas em local de crime. Técnica & Ciência forenses, ano 1, n. 1. Maceió: Centro de perícias forenses de alagoas (CPFor), p. 8-11, 2005. Ou também: BUTLER, Jhon M. Forensic dna typing: biology, technology, and genetics of str markers. 2nd. ed.. Oxford: Elsevier, 2005. 7 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação criminal n. 70019528603. Estupro. Grave ameaça. Violência presumida. Relator: Fabianne Breton Baisch. Porto Alegre, 13 de agosto de 2008. Disponível em: < http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: 10 out. 2008. Idem. Recurso em sentido estrito n. 70021931993. Relator: Marco Aurélio de Oliveira Canosa. Porto Alegre, 19 de junho de 2006. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: 10 out. 2008. Idem. Superior Tribunal de Justiça. Habeas corpus n. 19302. Relator: Min. Gilson Dipp. Brasília, DF, 21 de março de 2002. Diário da Justiça, Brasília, DF, 24 abr. 2002. p. 267. Ver ainda: FIGINI, et al.. Identificação humana. 2ed.. Campinas: Millenniu, 2003. MARIUZZO, Patrícia. Institutos de perícia usam biologia molecular na investigação policial. Ciencia Cultura, v. 59, n. 1. São Paulo: Universidade Estadual de Campinas, 2007, p. 8-9. Disponível em: <http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S000967252007000100004&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 10 out. 2008. 8 CARRACEDO, Ángel; CASADO, Maria; GONZÀLES-DUARTE, Roser (coords.). Documento sobre las pruebas genéticas de filiación. Observatori de Bioètica e Dret, Barcelona, nov. 2006. Disponível em: <http://www.pcb.ub.es/bioeticaidret/archivos/documentos/Pruebas_geneticas_de_filiacion.pdf>. Acesso em: 13 nov. 2007. 3 individualização, e corroborado pelo fato de estar presente em qualquer fluído ou resíduo humano, sua aplicação como prova forense está justamente na comparação entre as amostras biológicas colhidas na cena do crime com a do suspeito. A comparação desses perfis genéticos poderá determinar a inocência, se forem diferentes, ou a culpabilidade do(s) mesmo(s), se forem iguais. 9 A molécula do ADN é muito estável, favorecendo com que cientistas consigam extraí-la de evidências muito antigas, visto o fato de ser resistente à degradação ambiental. 10 A estabilidade da molécula, combinada com as características distintas do DNA de cada indivíduo e a precisão técnica da análise de DNA atuais, enriquecem ainda mais a tecnologia forense de identificação humana, sendo um componente vital da maioria das investigações policiais. 11 Nos Estados Unidos da América (EUA) o uso desta tecnologia, teve como vestíbulo, em casos criminais, o ano de 1988. Naturalmente, o incremento dessa, promoveu o surgimento de implicações científicas e legais, que, ipso facto, fomentaram a criação, em 1989, do National Research Council (NRC) Committee on DNA Technology in Forensic Science (Comitê do Conselho Nacional de Pesquisa sobre Tecnologia do ADN na Ciência Forense), com o objetivo de clarificar e desmistificar o uso desse meio de prova. Em relatório, datado de 1992, esse Conselho advoga pelo uso da tipagem do ADN na análise forense, considerando-o um progresso importante no campo da investigação criminal. Nesse documento, foram lançados, inclusive, conselhos e diretrizes à promoção do aperfeiçoamento dessa inovação. 12 9 SARMENTO, Felipe José de Queiroz. 2006. 46 f. Modelagem de um ambiente para análise de dna em genética forense. Dissertação (Mestre em Modelagem Computacional de Conhecimento). UFA. Maceió, 2006. Com relação à análise do ADN, um aspecto importante a ser ressaltado é que não precisamos dos dois “lados” de nucleotídeos que formam o ADN, uma vez que, considerando que há somente quatro tipos de nucleotídeos (adenina, timina, citosina e guanina), que formam “palavras”, o código genético; considerando ainda que uma cadeia de nucleotídeos, pelo princípio da colinearidade, apresenta correspondência com a outra cadeia, pode-se afirmar que se tivermos acesso a somente um dos “lados” da hélice do ADN poderemos obter a outra por meio da duplicação. “O ADN forma uma dupla hélice, de tal forma que quando em uma cadeia haja uma adenina em outra necessariamente existirá uma timina e à inversa sucederá exatamente igual, pelo que diz respeito à citosina e à guanina nestes aminoácidos ocorrerá exatamente o mesmo. Assim, a ordem das bases de uma cadeia determina a ordem das bases da outra.” (MORA SÁNCHEZ. Aspectos sustantivos y procesales de la tecnología del adn, p. 11, tradução nossa.) 10 “Além de fornecer informação genética mais direta, o DNA pode resistir a condições ambientais que destroem as proteínas; assim, amostras antigas e muito degradadas de fluidos corporais ainda podem fornecer abundante informação.” (CONSELHO NACIONAL DE PESQUISA. A avaliação do dna como prova forense. Tradução e revisão: F. A. Moura Duarte et al.. Ribeirão Preto: FUNPEC, 2001, p. 55.) 11 SARMENTO. Ob. cit., f. 2. 12 CONSELHO NACIONAL DE PESQUISA. A tecnologia do dna na ciência forense. Tradução e revisão: F. A. Moura Duarte et al.. Ribeirão Preto: FUNPEC, 1999. 4 Na Europa, no ano de 1992, o Conselho da Europa emitiu a Recomendação n.1 (1992) 13 , orientando seus Estados membros sobre o uso do ADN na justiça criminal. Os aspectos abordados por esse documento giram em torno da tomada de amostras; o credenciamento de laboratórios especializados nesse tipo de análise; a proteção e o armazenamento, tanto das amostras como dos dados obtidos, entre outras disposições. 14 Em nosso país, a presença do ADN no âmbito forense ocorrera somente em 1994, com a criação da Divisão de Pesquisa de ADN Forense (DPDNA) vinculado à Polícia Civil do Distrito Federal 15 . O primeiro laboratório especializado em ADN forense do Brasil foi criado, em princípio sem sede própria, contando com poucos profissionais capacitados. Os casos inicialmente analisados por esse recente órgão restringiram-se a homicídios ou a investigações de paternidade, sem contar os casos de identificação de pessoas desaparecidas à época do regime militar, solicitados por parentes. O know-how para o implemento desta tecnologia fora adquirido dos Estados Unidos, a partir de cursos ministrados pelo Federal Bureau of Investigation (FBI). 16 Desde então, intensificou-se o uso do ADN com prova forense. Apesar de ainda incipiente no Direito pátrio, esse não pára de fomentar cada vez mais discussões. Há, inclusive, projeto de lei ordinária 17 advogando pela sua inclusão, como uma das formas de identificação criminal referidas pela Lei n. 10.054/00 18 , no mesmo âmbito que da datiloscópica e da fotográfica. 13 Council of Europe. Commitee of Ministers. Recommendation No. R (92) 1, de 10 fevereiro 1992. On the use of analysis of desoxyribonucleic acid (dna) within the framework of the criminal justice system. Disponível em: <https://wcd.coe.int/com.instranet.InstraServlet?command=com.instranet.CmdBlobGet&InstranetImage=573811 &SecMode=1&DocId=601410&Usage=2 >. Acesso em: 16 set 2008. 14 GARCIA, Oscar. Ley orgánica 10/2007, de 8 de octubre, reguladora de la base de datos policial sobre identificadores obtenidos a partir del adn: antecedentes históricos y visión genética. Revista de Derecho y Genoma Humano, v. 27, n. 2. Bilbao: Fundação BBVA, 2007, p. 181-203. 15 BRASIL, Distrito Federal. Lei n. 803, de 8 de dezembro de 1994. Cria a Divisão de Pesquisa de DNA Forense, no âmbito da Polícia Civil do Distrito Federal e dá outras providências. Disponível em: <http://sileg.sga.df.gov.br/sileg/default.asp?arquivo=http%3A//sileg.sga.df.gov.br/sileg/legislacao/Distrital/leisor di/LeiOrd1994/lei_ord_803_94.html>. Acesso em: 30 jul. 2008. Com a reestruturação do Polícia Civil do Distrito Federal, pelo Decreto n. 22.997 (de 31 de maio de 2002), este passou a ser a Divisão de Perícias em DNA, integrante do Instituto de Perícias e Pesquisas Laboratoriais – IPPL, vinculado ao Departamento de Polícia Técnica da Polícia Civil do Estado. 16 AGÊNCIA BRASIL (ABr). Polícia civil do df tem o primeiro laboratório de dna forense. Brasília, 2006. Disponível em: <http://www.radiobras.gov.br/ct/1996/materia_050796_5.htm>. Acesso em: 30 jul 2008. 17 ROURE, Wasny de. Projeto Lei n. 417, de 19 de março de 2003. Altera o art. 1º da Lei nº 10.054, de 7 de dezembro de 2000, inserindo o DNA para a identificação criminal. Disponível em: < http://www.camara.gov.br/sileg/MostrarIntegra.asp?CodTeor=118464>. Acesso em: 30 jul 2008. 18 BRASIL. Lei n. 10.054, de 7 de dezembro de 2000. Dispõe sobre a identificação criminal e dá outras providências. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/internet/legislacao/legin.html/textos/visualizarTexto.html?ideNorma=354512&seq Texto=1&PalavrasDestaque=>. Acesso em: 30 jul. 2008. 5 Para Fidalgo 19 os testes genéticos constituem-se na prova de identificação com maior grau de segurança e de fiabilidade atualmente. Mas a autora portuguesa ressalva que mesmo assim não se pode acreditar cegamente nestes testes, posto que se embasam na probabilidade, independente da mesma ser elevada ou não. Tem que se ver esses testes como mais um meio de prova e não como “a prova”, portanto: “O grau de probabilidade dependerá da maior ou menor raridade das características da amostra em causa.” 20 Garcia e Alonso 21 no mesmo sentido entendem que o uso do ADN já se tornou uma ferramenta imprescindível e que em muitos casos configurou como prova fundamental senão a única para demonstrar a culpabilidade ou a inocência dos acusados. Reforçam ainda, que na Espanha o uso dessa tecnologia conta-se a mais de dez anos no âmbito forense. Os autores ressaltam que há determinadas regiões do nosso material genético que apresentam grande variabilidade entre os indivíduos, regiões hipervariáveis que servem praticamente para diferenciar uma pessoa da outra. Não há informações das características genotípicas (patrimônio hereditário) ou físicas do seu titular. Para entender melhor essa questão, clarificamos o assunto da seguinte forma: o DNA é subdivido em não codificante e codificante. Este carrega consigo as informações genéticas propriamente ditas do seu titular; como uma pré-disposição a determinadas doenças. Aquele se compara a um código de barras “[...] que se utiliza para classificar os produtos em um supermercado, que nada nos diz das características do produto, mas nos serve para identificálo”. 22 Porém, diferente das impressões digitais, como podem ser comparadas essas regiões hipervariaveis, elas também trazem consigo informações não só do indivíduo em si, mas de sua origem étnica (de seus descendentes e ascendentes). 23 Podemos, porquanto, inferir que […] em uma primeira aproximacão parece lógico pensar que os problemas legais e/ou éticos derivados do tratamento informatizado de perfis de ADN não codificante não devem diferir significativamente dos que se traçam no tratamento informatizado da descrição dactilar no sentido de que ambas as metodologias permitem identificar indivíduos sim apontar nenhuma informação adicional. Sem embargo, isto não é completamente certo. Em primeiro lugar, é necessário considerar uma diferencia fundamental: enquanto que de uma 19 FIDALGO, Sónia. Determinação do perfil genético como meio de prova em processo penal. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, n. 1. Coimbra: Coimbra, 2006, p. 115-148. 20 Ibidem, p. 119. 21 GARCÍA, Oscar; ALONSO, Antonio. Las bases de datos de perfiles de adn como instrumento de investigação policial. In: ROMEO CASABONA, Carlos Maria (Ed.). Bases de datos de perfiles de adn y criminalidad. Bilbao-Granada: Comares, 2002, p. 27-44. 22 Ibidem, p. 29. 23 Ibidem, p. 30. 6 impressão dactilar não se pode obter mais dados que os puramente identificativos, da amostra biológica obtida para uma análise de ADN com fins identificativos também se poderia estudar outras regiões codificantes, isto é, se poderia estudar um número cada vez mais amplo dos aproximadamente 30-40.000 genes que formam o genoma humano, o que poderia revelar uma informação genética de grande transcendência para o individuo. 24 DADOS GENÉTICOS: DEFINIÇÃO E CARACTERIZAÇÃO Segundo a Recomendação do Conselho da Europa n.º R (97) 5, constituem dados genéticos todos os tipos de dados que digam respeito a características hereditárias do indivíduo ou que relacionadas com aquelas características que constituem o patrimônio de um grupo de indivíduos (família). 25 Na Declaração Internacional sobre dados genéticos humanos da UNESCO, observaremos uma definição no mesmo sentido. 26 A origem da comparação entre a identificação pessoal por meio do perfil genético com as impressões digitais remete ao ano de 1985. Nesse ano, foi publicado na revista Nature uma série de artigos científicos que descreviam um método de identificação genética ao qual fora denominado de “DNA fingerprinting” 27 . 28 A demonstração da potencialidade dessa nova forma de identificação, fez com que os primeiros estudos publicados, que incluíssem referências a nova tecnologia popularizasse a chamada “impressão digital genética”. 29 Os estudos realizados pelo professor Alec Jeffreys e sua equipe na Universidade Leicester (Grã Bretanha), demonstraram que há uma grande variabilidade em certas regiões de minissatélites do genoma humano, que, ao serem estudas, nos ajuda “[...] a obter informações sobre a individualidade humana e as diferenças que existem de uma pessoa para 24 GARCIA. Ley orgánica 10/2007, p. 182-3, tradução nossa. EUROPA. Council of Europe. Commitee of Ministers. Recommendation No. R (97) 5, on 13 february 1997: on the protection of medical data. Disponível em: < https://wcd.coe.int/com.instranet.InstraServlet?command=com.instranet.CmdBlobGet&InstranetImage=43009& SecMode=1&DocId=560580&Usage=4>. Acesso em: 17/03/2008. 26 “Dados genéticos humanos: informções relativas às características hereditárias dos indivíduos, obtidas pela análise de ácidos nucléicos ou por outras análises científicas” (UNESCO. Declaração internacional sobre os dados genéticos humanos. Disponível em: < http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001361/136112porb.pdf>. Acesso em: 20 set. 2008. 27 “Fingerprint do ADN é a imagem (materializada sob a forma de um ‘código de barras’) da repartição das zonas não codificantes do ADN que constitui a hereditariedade do indivíduo. Essa imagem é a mesma para o ADN extraído de qualquer célula com núcleo de um indivíduo e é característica dele.” (HOTTOIS, Gilbert. Fingerprint do adn. In: Hottois, Gilbert; Parizeau, Marie-Hélène. Dicionário da bioética. Tradução de: Maria de Carvalho. Portugal: Instituto Piaget, 1999, p. 257). 28 Alguns dos artigos são: JEFFREYS, Alec J; WILSON, Victoria; THEIN, Swee Lay. Hypervariable 'minisatellite' regions in human DNA, Nature, v. 314, n. 6006, 1985, p. 67-73; Idem. Individual-specific 'fingerprints' of human DNA. Nature, v. 316, n. 6023, 1985, p. 577-79; JEFFREYS, Alec J; BROOKFIELD, John F Y; SEMEONOFF, Robert. Positive identification of an immigration test-case using human DNA fingerprints, Nature, v. 317, n. 6040, 1985, p. 818-9. 29 GARCIA. Op. cit., p. 194-5. 25 7 outra” 30, já que são pequenas regiões de seqüências de nucleotídeos repetidas varias vezes e que diferem de um indivíduo para outro. 31 Como ressalta o professor Souza, esta constatação científica provocou uma mudança total na criminalística biológica, pois o estudo do polimorfismo do DNA substituiu rapidamente as análises de outros marcadores genéticos (análises sorológicas dos polimorfismos de proteínas e grupos sanguíneos), até então, consideradas fundamental importância na genética forense. 32 Mas como ressaltado anteriormente, o uso dos dados genéticos de uma pessoa, mesmo que limitados a mera identificação, trazem, intrinsecamente, informações suprapessoais. Por mais forçosa que seja a interpretação a favor da comparação entre os dois tipos de identificação humana já citados, não há como projetar aos mesmos pesos idênticos. Os desdobramentos de cada um, díspares são. A partir da informação de um perfil genético obtido, por exemplo, em uma investigação criminal e que não se encontra em uma base de dados policial, há a possibilidade de se localizar algum familiar seu que se encontra nessa base de dados, possibilitando estabelecer uma identificação. Essa busca baseia-se no fato de que os perfis genéticos de dois indivíduos aparentados geneticamente têm maior probabilidade de serem parecidos do que há de dois estranhos. Os Estados Unidos e a Grã Bretanha utilizam-se desse sistema de localização a pelo menos seis anos e estima-se que esse método poderia aumentar em até 40% a efetividade das bases de dados de uso criminal, mostrando uma grande potencialidade. 33 EVOLUÇÃO HISTÓRICA As primeiras discussões sobre a criação de um referencial de amostras genéticas para fins de investigação criminal surgiram nos Estados Unidos em 1989. 34 Em 1990, lançou-se um software piloto do atual sistema CODIS - Combined DNA Index System, sendo que no ano seguinte quinze eram os Estados que já haviam promulgado leis autorizando o 30 SOUZA, Paulo Vinicius Sporleder de. Direito penal genético e a lei de biossegurança: lei 11.105/2005: comentários sobre crimes envolvendo engenharia genética, clonagem, reprodução assistida, análise genômica e outras questões. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 119. 31 HOTTOIS. Fingerprint do adn, p. 258. 32 SOUZA, op. cit., p. 119-20. 33 GARCIA. Ley orgánica 10/2007, p. 195-6. 34 ESTADOS UNIDOS. Fbi laboratory. the combined dna índex system (codis): a theoretical models. Virgínia, outubro de 1989, p. 284. Apud: Mora Sánchez, Juan Miguel. Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal. In.: Romeo Casabona, Carlos Maria (ed). Base de datos de perfiles de adn y criminalidad. Bilbao-Granada: Comares, 2002, p. 55. 8 estabelecimento de um banco de dados. Em 1994, foi, por meio de lei, estabelecido o sistema em escala nacional – o National DNA Index System (NDIS). 35 No que diz respeito à Europa, o tema entrou na pauta das discussões em 1991, com a Reunião do Comitê ad hoc de Peritos nos avanços das Ciências Biomédicas (CDBI). Aqui, o Conselho da Europa estabeleceu recomendações acerca do uso das análises envolvendo ADN no sistema criminal. “Em um dos seus pontos, ressaltou que poderia admitir-se o armazenamento de dados relativos a convictos sexuais e de outros delitos sérios contra a vida e à segurança das pessoas.” 36 Em 1997, o Conselho da Europa promulgou uma resolução 37 , com o objetivo de criar um intercâmbio, no âmbito europeu, de resultados de ADN. Para tanto, incentiva seus Estados membros a criarem bancos de dados nacionais tendo como base normas comuns que facilitem a compatibilidade. O documento demonstra claramente a preocupação em como realizar o intercâmbio, principalmente quanto à proteção dos dados pessoais dos seus possíveis integrantes: “as possibilidades de intercâmbio se limitarão ao intercâmbio de dados da parte não portadora de códigos da molécula do ADN, da que cabe supor que não contenha informação sobre rastros hereditários específicos.” Ou mais especificamente, “a coleta do ADN para o armazenamento de resultados de análises do ADN deverá ir acompanhada de garantias que protejam a integridade física da pessoa de que se trate.” 38 No que tange ainda ao supra referendado, importante ser relatado a previsão de desenvolvimento, como num movimento natural de evolução, de um banco de dados sobre ADN européia. Muitos países europeus já tinham na pauta de suas discussões legislativas e doutrinárias o tema em tela. Na Espanha, por exemplo, as primeiras iniciativas datam de 1995 e desde então houve diversos projetos de lei, emendas legislativas e discussões jurisprudenciais. A necessidade de regulamentação da matéria provocou o Tribunal Supremo 35 MORA SÁNCHEZ, Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal, p. 45-73. Pelo sistema CODIS, o FBI coordena todos os laboratórios forenses que trabalham com análise de ADN, em nível nacional, estadual. (Ibidem). O CODIS tem uma estrutura baseada em três esferas: uma nacional (NDIS - National DNA Index System), onde são feitos as comparações de perfis em nível nacional; uma estadual (SDIS - State DNA Index System), onde é feito o credenciamento dos laboratórios; e uma local (LDIS - Local DNA Index System), de onde se originam os perfis. Os perfis circulam de uma instância para a outra. (ESTADOS UNIDOS. Fbi. Codis: combined dna index system. Disponível em: <http://www.fbi.gov/hq/lab/html/codisbrochure_text.htm>. Acesso em: 02 out. 2008.). 36 MORA SÁNCHEZ, loc. cit, tradução nossa. 37 EUROPA. Resolución del consejo de 9 de junio de 1997 relativa al intercambio de resultados de análisis de adn. Disponível em: <http://eurlex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:31997Y0624(02):ES:HTML>. Acesso em: 16 set 2008. 38 Ibidem, tradução nossa. 9 do país a convocar, para uma seção plenária, todos os seus magistrados, com a finalidade de uniformizar o entendimento, já que a jurisprudência demonstrava-se dissociada. 39 Em outro exemplo, na legislação francesa, o tema se mostra presente desde o ano de 1994. Essa foi a primeira vez em que se regulou o recurso das provas genéticas no país, porém, não havia uma especificação referenciando sobre sua natureza: se era penal ou civil. A previsão legal de um banco de dados genéticos criminal ocorre pela primeira vez quatro anos depois. 40 Em Portugal, a primeira legislação referente ao tema data de 2005 41 . Essa estabeleceu regras de utilização da informação genética pessoal e da informação médica, mas não chegou a realizar uma regulamentação específica sobre a investigação criminal, envolvendo um banco de dados biológicos para esse fim. 42 A previsão legal nesse sentido acabou ocorrendo no início do corrente ano. 43 Importante ressaltar, no que diz respeito às mudanças legislativas dos principais países europeus, o grande ponto de partida foi a Recomendação n.º (92) 1 do Conselho da Europa 44 . As alterações foram específicas à matéria criminal, tendo em vista a própria orientação do documento, que apesar de tratar com generalidade o tema, objetivou que as análises devem ser limitadas as imprescindíveis à determinação de perfis de ADN. 45 39 GARCIA. Ley orgánica 10/2007, p. 190. Lei 98-468, de 17 de junho de 1998. Na verdade, esta serviu mais como um preparativo ao incremento de um banco de ADN criminal, posto que este, efetivamente fora criado, a partir da inserção de um único dispositivo, art. 706-54, incorporado ao Código de Processo Penal francês (Code de Procédure Pénale –CPP). Limitava-se a criação de arquivos genéticos de condenados por crimes sexuais contra menores. (ETXEBERRIA GURIDI, José Francisco. Evolución expansiva en la francesa de los ficheros de huellas genéticas tras las recientes reformas. In: Revista de Derecho y Genoma Humano, v. 19, n. 2, 2003, p. 109-25.) Aduz o autor: “De fato, a reforma indicada incidirá em substanciais modificações no Código Penal, no Código de Procedimento Penal e no Código de Saúde Pública. Mediante as indicadas reformas se procuro dar uma resposta à crescente criminalidade de caráter sexual que suscita uma inquietude particular quando tem como vítimas menores.” (p. 110, tradução nossa.) 41 Portugal. Lei 12/2005, de 26 de janeiro de 2005. Informação genética pessoal e informação de saúde. Disponível em: < http://www.cnpd.pt/bin/legis/nacional/Lei12-2005.pdf >. Acesso em: 15 set 2008. 42 Art. 19º (Bancos de DNA e de outros produtos biológicos), n. 19: “Os bancos de produtos biológicos constituídos para fins forenses de identificação criminal ou outros devem ser objecto de regulamentação específica.” (Ibidem). 43 PORTUGAL. Lei n. 5/2008, de 12 de fevereiro de 2008. Aprova a criação de uma base de dados de perfis de ADN para fins de identificação civil e criminal. Disponível em: <http://www.mj.gov.pt/sections/pessoas-ebens/base-de-dados-geneticos8948/proposta-de-leique/downloadFile/attachedFile_f0/Lei_5_de_2008_de_12_de_Fevereiro.pdf?nocache=1206710619.26>. Acesso em: 16 set. 2008. Até a o advento desta, havia no país uma discussão sobre os desdobramentos decorrente da determinação judicial que ordenava a realização de um exame a partir do ADN, no sentido de que isso poderia resultar na instrumentalização do indivíduo, infringindo direitos fundamentais. (FIDALGO. Determinação do perfil genético como meio de prova em processo penal, p. 144 et seq.) “Este meio de prova há de ter caráter subsidiário: só deve ser utilizado se não for possível o esclarecimento dos fatos com recurso a meios menos restritivos dos direitos fundamentais.” (Ibidem, p. 146) 44 Council of Europe. Commitee of Ministers. Recommendation n. R (92) 1, on 10 february 1992. Op. cit. 45 Além dos exemplos de Espanha, França e de Portugal, há ainda o Reino Unido, onde em “1994 promulgou-se o Criminal Justice and Public Order Act [Decreto sobre a Justiça Penal e da Ordem Pública, tradução nossa] que 40 10 O fruto das Recomendações e Resoluções no âmbito do conselho europeu, nos últimos dez anos, fomenta a criação de diversos tratados e acordos bilaterais entre Estados, principalmente, devido à aproximação, dentro do bloco dos países europeus. Um exemplo disso é o Tratado de Prüm 46 , firmado, em 27 de maio de 2005, na cidade de Prüm (Alemanha), por sete países europeus (Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, França, Holanda e Luxemburgo). Com a finalidade de combater o terrorismo e a imigração ilegal, os signatários acordaram entre outras questões, a criação de bases de dados nacionais 47 , a comparação dos perfis de ADN, além das consultas aos dados datiloscópicos e de registro de veículos. O Tratado de Prüm, pela importância e incipiência da matéria, ganhou relevo e no ano seguinte a sua assinatura, outros oito países (Finlândia, Itália, Portugal, Eslovénia, Suécia, Roménia, Bulgária e Grécia) declararam formalmente a intenção de aderir ao tratado. Em junho de 2007, o mesmo foi aprovado pelo Parlamento Europeu, incorporando o ordenamento jurídico europeu. 48 Como uma das formas de clarificar essa importância lograda, cito as palavras do então Ministro da Justiça português, em intervenção feita em evento internacional, realizado na cidade de Porto: Pela primeira vez um importante tratado europeu, e que irá integrar o acervo comunitário, disciplinará de forma estrita a criação de ficheiros nacionais de análise de ADN, a consulta e comparação automatizada de perfis de ADN, e a recolha de material biológico e transmissão de perfis. 49 introduziu alterações nas normas relativas à colheita de substâncias corporais por parte da plícia e, em 1995, a circular 16/95, de 31 de Março, pela qual se criou a base nacional de dados genéticos; na Alemanha, as Leis de 17 de Março de 1997 e de 10 de Setembro de 1998 alteraram a Strafprozessordenung [Código do Processo Penal, tradução nossa], regulando especificamente as análises de ADN e, recentemente, a Lei de 12 de Agosto de 2005, introduziu novas regras nesta matéria; na Holanda procedeu-se à reforma do processo penal mediante a Lei 596/1993, de 8 de Novembro, posteriormente desenvolvida pelo Decreto 522/1994, de 4 de Julho, que regula especificamente a realização de testes de ADN com finalidade de identificação; [...] em Itália não há ainda uma lei que preveja a realização de testes de ADN com finalidade de Identificação, mas já houve algumas iniciativas neste sentido (proposta de lei Melandri, n.º 2572, de 28 de Outubro de 1996 [...].” (FIDALGO. Determinação do perfil genético como meio de prova em processo penal, p. 143-4.) 46 Disponível em: < http://www.statewatch.org/news/2005/jul/schengenIII-spanish.pdf >. Acesso em: 17 set 2008. 47 Número 1 do art. 2º: “As Partes Contratantes se comprometem a criar e manter ficheiros nacionais de análises de ADN para os fins de perseguição dos delitos. O tratamento dos dados armazenados nestes ficheiros em virtude do presente Tratado se levará a cabo com arranjo ao direito interno vigente para cada tipo de tratamento, sim prejuízo das demais disposições do presente Tratado.” 48 Câmara de Lagos vai homenagear Fausto Correia. Câmara Municipal de Lagos, Lagos, Portugal, 8 ago. 2008. Disponível em: <http://www.cm-lagos.pt/portal_autarquico/lagos/v_ptPT/pagina_inicial/destaques/homenagem_fausto_correia#topo>. Acesso em: 17 set. 2008. 49 COSTA, Alberto Bernardes. Intervenção do Ministro da Justiça no Congresso Internacional do Instituto Nacional de Medicina Legal, Porto, Portugal, 22 jun. 2007. Disponível em: < http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT/Governos/Governos_Constitucionais/GC17/Ministerios/MJ/Comunicacao/ Intervencoes/20070622_MJ_Int_Medicina_Legal.htm >. Acesso em: 17 set. 2008. 11 Mas o referido acordo de cooperação não serve somente para estreitar os laços entre os países europeus, mas também como uma primeira experiência que se bem sucedida poderá se expandir para nações fora do continente europeu. Um exemplo claro disso, é o recente acordo de cooperação bilateral firmado entre Estados Unidos e Alemanha, em março deste ano, que tem como precursor justamente o tratado firmado na cidade alemã – diga-se se passagem, de autoria do Governo alemão. 50 CONCEITUALIZAÇÃO E NATUREZA JURÍDICA Um Banco de DNA pode ser entendido como um conjunto de perfis genéticos de referência. “Tem como objetivo a identificação da pessoa através de perfis genéticos. Trata-se de um conjunto complexo de dados aplicáveis a diversas investigações”. 51 A Recomendação n. 1 (1992) do Conselho da Europa, citada anteriormente, define “arquivo de DNA” como ao que se refere a qualquer coleção estruturada dos resultados dos testes das análises de ADN, que se conserve materialmente em registros manuais ou numa base de dados informatizada. 52 De acordo com a Lei portuguesa 12/2005, sobre informação genética pessoal e informação de saúde, “entende-se por ‘base de dados genéticos’ qualquer registro, informatizado ou não, que contenha informação genética sobre um conjunto de pessoas ou famílias.” 53 O mesmo diploma define também que um banco de produtos biológicos é [...] qualquer repositório de amostras biológicas ou seus derivados, com ou sem tempo delimitado de armazenamento, quer utilize colheita prospectiva ou material previamente colhido, quer tenha sido obtido como componente da prestação de cuidados de saúde de rotina, quer em programas de rastreio, quer para investigação, e que inclua amostras que sejam identificadas, identificáveis, anonimizadas ou anónimas. 54 FORMAS DE CONSTITUIÇÃO Mora Sanchez 55 , afirma que uma base de dados de ADN pode ser constituida com distintas finalidades: para identificar desaparecidos ou de indivíduos vítimas de catástrofe, 50 ALEMANHA e EUA assinam acordo para acesso mútuo de dados. Deutsche Welle, Berlim, Alemanha, 11 mar. 2008. Disponível em: <http://www.dw-world.de/popups/popup_printcontent/0,,3185510,00.html>. Acesso em: 02 set. 2008. 51 MONIZ. Os problemas jurídico-penais da criação de uma base de dados genéticos para fins criminais, p. 238. 52 "’DNA file’ refers to any structured collection of the results of DNA analysis tests whether retained in material form, as manually held records, or on a computerised database.” (Conselho da Europa, Recomendação n. R (92)1.). 53 Portugal. Lei 12/2005, art 7º (Base de dados genética), n.1. 54 Ibidem, art. 19º (Bancos de DNA e outros produtos biológicos), n. 1. 55 MORA SÁNCHEZ. Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal, passim. 12 acidente ou ato terrorista onde os seus corpos acabam ficando irreconhecíveis 56 ; com o objetivo de obter e armazenar informação genética que facilite a determinação de conflitos relativos à filiação 57 ; com fins médicos e farmacêuticos; para identificação de recém- nascidos; ou com a finalidade de identificar autores de feitos delituosos e criminais. 58 Sendo esta o objeto deste trabalho. Com relação à sua constituição, há autores que induzem interpretações que o ADN é um dado de identificação do indivíduo como a impressão digital e que sendo assim poderia o Estado formar um banco a partir de toda a população. 59 Para esses, uma base de dados geral de toda uma população seria, do ponto de vista técnico, perfeitamente possível. Mas, por mais tentadora e atrativa que for, “[...] para muitos governantes, os problemas éticos e legais expostos são muito numerosos, poderia dizer-se que demasiados para que fosse possível a criação desse tipo de base de dados.” 60 Já para outra corrente, numa posição mais comedida, o ADN é mais do que uma forma de identificação, é unidade e pessoalidade do indivíduo, com informações não só individuais, como também dados genéticos relacionados com as características hereditárias, e que, portanto, seu uso deve ser limitado a suspeitos e posteriormente, achada a amostra do criminoso, as dos demais suspeitos devem ser descartadas, fazendo com que o banco seja constituído somente por condenados. 61 Considerando que o propósito inicial dos bancos de dados genéticos era a resolução de crimes com altos índices de reincidência que por sua natureza facilita a coleta de indícios biológicos no local onde o ocorrera, tem-se como lógico delimitar a composição da mesma pelos condenados dos delitos em questão. A inclusão temporária dos suspeitos seria enquanto durassem as investigações, já que, uma vez esgotadas as chances do mesmo ser o culpado, a sua permanência poderia ser interpretada como uma pena. Porém, dissonantes vozes defendem que pelo próprio princípio introduzido pelo ficheiro de ADN, a prova com base na 56 Um exemplo de aplicação deste, fora nos EUA após incidente de 11 de setembro de 2001. (Para saber mais: BBC BRASIL. Legistas encerram em NY identificação de vítimas de 11/9. 23 de fevereiro de 2005. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/story/2005/02/050223_forensicro.shtml>. Acesso em: 02 out. 2008. 57 Na Argentina, por exemplo, está em funcionamento desde 1987 um Banco Nacional de Dados Genéticos, com a finalidade justamente de facilitar a identificação de crianças, em conflitos envolvendo a paternidade, que nasceram em cativeiro na época da ditadura militar. (ARGENTINA. Lei 23.511, de 13 de maio de 1987. Cria o Banco Nacional de Dados Genéticos. Publicado no Boletim Oficial em 10 de julho de 1987. Disponível em: <http://www.biotech.bioetica.org/d104.htm>. Acesso em: 02 out. 2008. 58 MORA SÁNCHEZ. Op. cit., p. 51. 59 LORENTE ACOSTA. Identificación genética criminal: importância médico legal de las bases de datos, p. 0126. 60 MORA SÁNCHEZ. Op. cit, p. 52, tradução nossa. 61 MONIZ. Os problemas jurídico-penais da criação de uma base de dados genéticos para fins criminais, p. 23764. 13 probabilidade, a inclusão serviria para aumentar o grau de fiabilidade dos resultados. Na verdade, para esses, o ideal seria uma base a partir de todos os perfis da comunidade de abrangência do mesmo, que, seja por dificuldade de aceitação, seja por problemas logísticos de implementação em grande escala, seja ainda pelos avultantes gastos que a mesma cobraria, tem-se como improvável. Por isso, o englobamento de toda e qualquer amostra seria encarado como fase intermediária e que só viria em benefício da sociedade. 62 Dentro dessa temática, podemos ainda discutir se todo e qualquer delinqüente deva ser objeto do arquivo. Isto é, se o mesmo englobará todo tipo de delito ou se a partir determinados delitos. Em alguns países, como na Inglaterra, veremos aplicação deste modelo, apesar de que o mais usado seja com base na seleção de alguns crimes. 63 Note-se que este é um critério nitidamente ligado às origens do uso do ADN como prova forense. Uma forma distinta de constituir um banco de dados seria a partir do ADN de todos os homens de um país. Isso se justificaria pelo fato de que geralmente os crimes que necessitam deste tipo de perícia são cometidos por homens. Não precisamos ir muito longe para vermos que esse tipo de referencial é no mínimo inadequado, excessivo e discriminatório. 64 ESTÁGIO ATUAL DOS PRINCIPAIS BANCOS DE DADOS DE ADN Há diferentes bases de dados em desenvolvimento no mundo, como o sistema CODIS (Combined DNA Index System) desenvolvido pelo FBI nos EUA, sistema de âmbito nacional; ou o Projeto Fênix, na Espanha, criado com a finalidade de identificar cadáveres ou ossadas de desaparecidos. 65 No Brasil, a utilização do DNA, está restrita aos casos criminais fechados, onde se compara as amostras extraídas na cena do crime ou da vítima com as amostras dos suspeitos, quando estes não se recusam; ou aos casos civis de identificação de desaparecidos ou de investigação de paternidade. Por outra banda, em sede de discussão parlamentar, vislumbramos alguns projetos de lei visando à criação de banco de dados, via 62 Para saber mais, consultar: ROMEO CASABONA. Base de datos de perfiles de ADN y criminalidad; MORA SANCHEZ. Aspectos sustantivos y procesales de la tecnología del adn; ETXEBERRIA GURIDI. Evolución expansiva en la regulación francesa de los ficheros de huellas genéticas tras las recientes reformas. “Neste tipo de base de dados [formada a partir da totalidade de indivíduos] existiria a vantagem de uma maior eficácia. Outro aspecto positivo seria também o da maior igualdade que existiria, já que ao ser obrigatório a todos, não se poderia esgrimir em nenhum momento por ninguém uma possibilidade de discriminação.” (MORA SÁNCHEZ. Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal, p. 53, tradução nossa). São argumentos embasados no princípio da proporcionalidade, porém, ele por si só não pode servir como argumento de justificativa. 63 MORA SÁNCHEZ. Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal, passim. Cf.: Item 3.4 do presente trabalho. 64 Ibidem, p. 53. 65 LORENTE ACOSTA. Identificación genética criminal: importância médico legal de las bases de datos, p. 9. 14 civil, por meio da coleta e utilização do ADN. 66 Contudo, esses documentos pecam pela injuridicidade e pela falta de adequação constitucional. Muitos países já possuem uma base de dados genéticos para fins criminais: EUA; Grã Bretanha; Holanda; Áustria; Alemanha; Finlândia; Noruega; Dinamarca; Suíça; Suécia; Grécia; Bélgica; França; Eslováquia; Eslovênia; Espanha e Portugal. As formas de constituição diferem umas das outras, principalmente no que tange ao tempo de permanência dos dados colhidos a partir de suspeitos, como também de condenados. Alguns, inclusive, como são os casos da Inglaterra, Noruega e Áustria que não eliminam os dados uma vez colhidos, permanecem in aeternum. 67 Como não seria diferente, todos esses bancos de dados são formados a partir das amostras de condenados. Porém, na maioria, a constituição não é forjada apenas por estas, senão também pelas amostras dos suspeitos e/ou de amostras anônimas colhidas na cena do crime. Há casos onde os três tipos de amostras estão presentes numa mesma base (como, por exemplo, ocorre na Inglaterra, Suíça e Áustria), todavia há casos onde ou se terá uma associação dos dados de suspeitos e condenados (Alemanha) ou de condenados e amostras (Holanda e Suécia). 68 Com exceção da Alemanha, todos esses bancos de identificação nacionais dissociam os dados genéticos dos dados pessoais de cada indivíduo. Todos os Estados passaram por adaptações em seus ordenamentos jurídicos para possibilitar o implemento, sem infringir direitos individuais. 69 Conforme observado na análise comparativa, há uma tendência na intensificação do desenvolvimento de bancos de dados genéticos na cultura ocidental. A cada momento, o rol 66 São alguns: ROSA, Feu. Projeto de Lei n. 6.079, de 22 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre a formação de bancos de dados referentes ao código genético – DNA, a serem mantidos pelos órgãos de identificação dos Estados e do Distrito Federal. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/17763.pdf>. Acesso em: 13 out. 2008. MANNATO, Carlos Humberto. Projeto de Lei n. 7.142, de 31 de maio de 2006. Dispõe sobre a implantação, em nível nacional, de um banco de dados para identificação de todos os brasileiros através de seu código genético. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/399871.pdf>. Acesso em: 13 out. 2008. IZAR, Ricardo Nagib. Projeto de Lei n. 6.610, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a criação do Banco Estadual do DNA, com a finalidade exclusiva de realizar o registro inicial de identificação do recém-nascido. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/29221.pdf>. Acesso em: 13 out. 2008. Cabe ressaltar, que somente esse último passou pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) no Congresso nacional, todavia com substituições. Foi apensado ao Projeto de Lei 6.096, de 21 de fevereiro de 2002. (BRASIL. Congresso. Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania. Projeto de Lei 6.096: parecer do relator. Relator: Dep. Nelson Trad. Brasília, DF, 8 ago. 2008. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/590619.pdf>. Acesso em: 13 out. 2008. 67 GRACÍA; ALONSO. Las bases de datos de perfiles de adn como instrumento de investigação policial, p.39. 68 GRACÍA; ALONSO, loc. cit. 69 GRACÍA; ALONSO loc. cit. 15 dos países que possuem essa ferramenta cresce. Só para citar dois exemplos recentes, a Espanha regulou a sua no final de 2007 e Portugal, no início do presente ano. 70 Como demonstrado também, a interligação e cooperação entre Estados está se tornando uma realidade. Um dos encarregados a promover e facilitar essa troca de informações é a Interpol 71. Por meio de documentos e relatórios, ela orienta a forma como os Estados devem manipular e dispor o material, para que os mesmo tenham uma padronização e assim garantir uma qualidade mínima nos resultados dos exames solicitados. 72 ARMAZENAMENTO DOS DADOS Talvez o ponto nevrálgico no que concerne a forma de constituição dos dados seja o trato dos perfis armazenados. Sendo mais específico, a separação dos dados propriamente genéticos dos dados de identificação pessoal. Aqui, os principais problemas envolvidos condizem com a idoneidade da instituição encarregada de controlar e garantir a impossibilidade de que indivíduos não autorizados logrem efetuar consultas indevidas ou não autorizadas. A princípio, o laboratório só teria acesso aos arquivos de ADN, ao qual seria atribuído um número de identificação. Os dados pessoais estariam reservados num instituto de identificação ou a cargo da própria polícia, que da mesma forma não tem acesso aos dados genéticos. 73 Nesse modelo, o laboratório recebe as amostras a serem analisadas e caso haja coincidência com alguma de seu ficheiro, remete o código correspondente ao órgão solicitante do exame, que uma vez informada do código poderá acessar os dados pessoais do identificado. Portanto, os perfis genéticos são separados dos dados pessoais de cada indivíduo. Só são acessados se der positivo a análise daqueles. 74 70 ESPANHA. Lei 10/2007, de 9 de outubro de 2007. Reguladora da base de dados policial sobre identificadores obtidos a partir do ADN. Boletim Oficial do Estado, Madri, 9 out. 2007, n. 242, p. 40969-72. Disponível em: <http://www.boe.es/boe/dias/2007/10/09/pdfs/A40969-40972.pdf>. Acesso em: 02 out. 2008. PORTUGAL, Lei 12/2008. 71 Organização Internacional de Polícia Criminal. Criada em 1923, em Viena, na Áustria, com o objetivo de facilitar a co-operação policial no âmbito internacional, e dando suporte e assistência a organizações, autoridades e de quem tem a missão de prevenção ou combate ao crime internacional. A Interpol não interfere nas investigações ou na atividade policial. (INTERPOL. About Interpol. Disponível em: <http://www.interpol.int/public/icpo/default.asp>. Acesso em: 02 out. 2008) 72 A Interpol não orienta somente com relação à manipulação dos perfis genéticos, mas também o que diz respeito à manipulação dos ficheiros constituídos por impressões datiloscópicas. Quanto àqueles, um dos documentos de consulta emitidos é o Manual sobre o intercâmbio e a utilização de dados relativos ao ADN. (INTERPOL. Manual da Interpol sobre o intercâmbio e a utilização de dados relativos ao ADN: recomendação do grupo de peritos em ADN da Interpol. Lyon, França, Junho de 2001. Disponível em: <http://www.interpol.int/Public/Forensic/dna/HandbookPublicEs.pdf>. Acesso em: 02 out. 2008. 73 GRACÍA; ALONSO. Las bases de datos de perfiles de adn como instrumento de investigação policial. Como escreve os autores: “A base dados de delinqüentes se encontraria dissociada, por uma parte se armazenariam os perfis genéticos e por outra parte as identidades que corresponderiam aos ditos perfis genéticos.” (p. 35) 74 Ibidem, p. 36. 16 Com a intensificação das relações internacionais de cooperação de intercâmbio de informações, nada mais natural que a discussão sobre a forma de como o mesmo será feito. As disposições em tratados, recomendações e resoluções, pelo menos no âmbito europeu, mostram que cada Estado terá autonomia para implementar o seu banco de dados de ADN. A orientação é no sentido de que este seja feito de forma padronizado para que seja viabilizado num segundo momento o intercâmbio. A Resolução do Conselho da Europa de 1997 é bem clara quanto a isso, no n. 2 do item I (Criação de base de dados nacionais sobre ADN): com vistas ao intercâmbio de resultados das análises do ADN entre os Estados membros, se invita a estes que estruturem as ditas bases de dados com ajuste a normas comuns e de forma compatível. 75 Nesse ínterim, importante frisar a preocupação existente com o trato com os dados a serem objeto de trocas recíprocas. Veja-se uma preocupação limitá-lo a parte não codificante do ADN, entendendo-o como um item meramente informativa. 76 Sendo que, com relação à comparação e compartilhamento dos resultados, em síntese recomenda que a organização deste intercâmbio de informação deverá limitar-se aos resultados de análises do ADN que por comparação possam mostrar se uma pessoa figura em um arquivo ou se se pode estabelecer uma relação entre uma pessoa e os indícios encontrados no entorno do delito. 77 RESPONSABILIDADE SOBRE A GESTÃO DO BANCO DE DADOS Aqui encontramos um dos pontos não menos interessante que os demais. As bases de dados são importantes fontes de informação. Geralmente os itens contidos em um determinado banco de dados não são de livre acesso. Diz o professor Romeo Casabona: De todo modo, estas provas originam problemas novos e acentuam outros já estabelecidos anteriormente em relação com as provas biológicas, respeito às quais não se trata de primar ou obstaculizar sua utilização, senão de 75 Ainda, encontra-se no n. 2 do item II (Da normatização das técnicas do ADN) da Resolução do Conselho da Europa de 9 de junho de 1997: “Com vista a um intercâmbio em escala européia dos resultados de análise de ADN, se insta aos Estados membros a que estruturem os resultados das análises de ADN, utilizando preferentemente marcadores de ADN idênticos.” Ou ainda no n. 1 do item III (Garantias jurídicas): “Corresponderá a cada Estado membro decidir as condições em que se poderão armazenar em bases nacionais de dados os resultados das análises do ADN, assim como os respectivos delitos dos quais deva proceder-se o dito armazenamento.” (EUROPA. Resolução do conselho da europa de 9 de junho de 1997 relativa ao intercâmbio de resultados de análises de adn. Disponível em: <http://eurlex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:31997Y0624(02):ES:HTML>. Acesso em: 16 set. 2008. Tradução mossa). 76 “As possibilidades de intercâmbio se limitarão ao intercâmbio de dados da parte não portadora de códigos da molécula do ADN, da que cabe supor que não contém informação sobre traços hereditários específicos.” (EUROPA. Resolução do conselho da europa de 9 de junho de 1997 relativa ao intercâmbio de resultados de análises de adn, n. 2 do item I (Criação de base de dados nacionais sobre ADN), tradução nossa.) 77 Ibidem, n. 2 do item IV (Intercâmbio de resultados de análises do ADN no âmbito europeu), tradução nossa. 17 assegurar que se realizem com as suficientes garantias técnicas, processuais e de respeito aos fundamentos que puderam ver-se afetados. 78 É importante ter-se em conta quem realiza a gestão e como a faz. Por gestão de um banco de dados entende-se como “[...] a possessão dos sistemas informáticos onde se armazenam os dados e a possibilidade de concordar os mesmos para sua consulta e atualização.” 79 Mas que organismo ou instituição poderia ser esse gestor? A resposta não é nada objetiva ou fechada. Vai variar entre os países. O que se recomenda é que o mesmo seja de natureza pública ou semi-pública, para garantir um perfeito funcionamento da base de dados. Há nações (Áustria, Dinamarca, Suíça) que solucionaram o problema elegendo como gestor uma Universidade pública ajustada com o Estado. Em outras localidades (Alemanha, Noruega, Finlândia, Portugal) optaram em se utilizar da própria estrutura policial ou de laboratórios estaduais de ciência forense (Reino Unido, Bélgica, Holanda). 80 Como ressaltado, nos Estados Unidos, a gestão nacional fica por conta da polícia federal (FBI), que controla em nível nacional (NDIS), sendo laboratórios estaduais os que o fazem no âmbito local (LDIS) e estadual (SDI). 81 Em Portugal, as entidades competentes para a obtenção de perfis de ADN são o Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária e o Instituto Nacional de Medicina Legal (INML). Sendo este o responsável pela base dados e pelas operações que lhe sejam aplicáveis. 82 Outro ponto interessante, diz respeito ao credenciamento dos laboratórios especializados. Determinar que laboratórios seriam capazes de gerar perfis de ADN que se incluam na base da dados. Via de regra, os laboratórios especializados que pretendem trabalhar com análises de ADN devem cumprir as medidas de qualidade exigidas. Para tanto, os parâmetros de admissibilidade devem levar em conta critérios de credenciamento rigorosos sobre a gestão, qualificação, treinamento de pessoal, organização do laboratório, controle das amostras, validação, procedimentos analíticos, etc. Estes devem estar claramente documentados, sendo sujeitos a controle periódico do órgão credenciador. Assim, pode-se garantir uma maior 78 ROMEO CASABONA, Carlos Maria. Prólogo. In.: ROMEO CASABONA, Carlos Maria (ed.). Bases de datos de perfiles de adn y criminalidad. Bilbao-Granada: Comares, 2002, p. X, tradução nossa. 79 LORENTE ACOSTA. Identificación genética criminal: importância médico legal de las bases de datos, p. 18. Segue o autor: “Neste sentido, é imprescindível que o equipamento informático (computador) que suporta à base de dados tenha um acesso totalmente restringido, a pessoas autorizadas, com chaves autorizadas e em momentos limitados. Deveriam ser computadores dedicados exclusivamente a este fim, sem conexão externa através da internet ou de correio eletrônico.” (p. 19). 80 LORENTE ACOSTA, loc. cit. 81 LORENTE ACOSTA, loc. cit. 82 PORTUGAL. Lei 5/2008, arts. 5º e 16º. 18 fiabilidade a prova produzida, sendo que neste controle se garantirá o menor índice possível de variabilidade entre os resultados: terão que observar a mesma padronização. 83 TEMPO DE DURAÇÃO DOS DADOS NA BASE Com relação ao tempo em uma amostra pode permanecer no banco de dados, creio que alguns fatores devem ser observados. Um banco de dados tem sua fiabilidade diretamente proporcional à quantidade de amostras inseridas nele. Sendo assim, não precisamos analisar muito para perceber que a melhor opção seria a não exclusão de nenhum dado já inserido. Porém, poderemos questionar até que ponto isso não configura uma ingerência por parte do Estado na esfera privada do cidadão. Da mesma forma que se discute se os antecedentes criminais devem ou não ser um dia “apagados”, aqui se faz igual interpretação. A configuração permanente dos dados seria uma continuação ou uma nova pena ao então ex-detento. Não podemos, pelo menos sem o seu consentimento, agregar informações de uma pessoa não ligada a uma investigação forense. Interpretações a parte, o fato é que cada país determina o tempo de duração dos dados no seu banco. A legislação existente nos países europeus é extremamente variável. 84 Alguns limitam o tempo, com base na duração dos antecedentes nos registros, já que servem justamente, como já demonstrado, para identificar o autor de delitos cujo perfil é marcado pela reincidência. 85 A legislação espanhola optou por esse entendimento. Fixou como critérios o tempo em que a lei determina à prescrição do delito (em caso de condenação a mais de um delito, o prazo limita-se ao maior), o tempo de fixação dos antecedentes e, claro, a data da morte do inscrito 83 86 87 . Em 1999, a lei sobre proteção dos dados de caráter pessoal já entendia que os GARCÍA; ALONSO. Las bases de datos de perfiles de adn como instrumento de investigação policial. Ressalta os autores: “O estabelecimento de programas de creditação é uma necessidade reconhecida não somente por todas as sociedades científicas da área, senão também, e de forma relevante, pelo Conselho da Europa que em sua Recomendação do ano de 1992 relativa ao uso da tecnologia do ADN no marco da jurisdição penal reconhece de forma expressa que as análises de ADN são um procedimento científico sofisticado que somente deve levar-se a cabo por laboratórios que possuem a experiência e os meios apropriados, e insta aos Estados membros da União Européia a estabelecer uma lista de laboratórios creditados.” (p. 32, tradução nossa) 84 LORENTE ACOSTA. Identificación genética criminal: importância médico legal de las bases de datos, p. 178. 85 MORA SÁNCHEZ. Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal, passim. 86 Poderia acrescer-se o cuidado de se garantir que o mesmo esteja morto, e não simplesmente imputado assim. 87 ESPANHA. Lei 10/2007, art. 9º. 19 dados registrados com fins policiais se cancelarão quando não mais forem necessários às investigações que motivaram o seu armazenamento. 88 Em outros países, pode-se ver que não há um critério, e sim prazos estabelecidos de forma objetiva. Assim, arbitrariamente se designa um número determinado de anos para efetuar a exclusão. Na Bélgica, este tempo é de trinta anos para condenados e dez anos em caso de morte (a contar da morte). Na Holanda e na Suécia, também vimos a mesma disposição em relação aos condenados. A Suíça, por outro lado, o tempo de duração vai depender da gravidade do crime, numa escala entre dez e vinte anos. 89 Dentro da União Européia, na Recomendação n. R(92), art. 8º, não há uma determinação de tempo, mas estipula uma série de casos excepcionais que podem ser levados em conta pelos Estados nacionais. 90 Em alguns lugares como no Reino Unido ou na Áustria, por exemplo, o dado só é suprimido com a comprovação de inocência ou com a morte do titular. 91 Portanto, pelo exposto, o fator tempo de armazenamento de uma amostra [...] é um problema técnico do direito de cada país, e não científico ou informático, já que os potentes equipamentos de computação de que se dispõe hoje em dia são capazes de armazenar praticamente uma quantidade infinita de dados deste tipo. E há que se considerar que os dados necessários à identificação genética de uma pessoa ou de um indício biológico são realmente muito limitados (pequenos), já que de 60 a 70 caracteres (números e letras) podem definir uma pessoa ao seu genótipo. 92 Como se pode ver, a manutenção dos dados vai depender da procedência dos mesmos: de pessoas ou de indícios. Se for destes, podem ser arquivados enquanto não se resolve o caso (o que pode significar indefinidamente), até que não prescreva o delito cuja cena fora obtido ou segundo algum prazo fixado de forma específica. Sendo oriundo de pessoas, podem ser arquivadas indefinidamente, por critérios ligados à natureza do delito, ou por prazo fixado de forma específica. O certo é que a única unanimidade existente entre todas as bases de dados é a eliminação imediata de todos os dados oriundos de um indivíduo declarado inocente após decisão judicial ou após uma investigação preliminar, “[...] ainda que 88 ESPANHA. Lei 15/1999, de 13 de dezembro de 1999. Dispõe sobre a proteção aos dados de caráter pessoal. Boletim Oficial do Estado, n. 298, Madri, 14 dez. 1999, n. 242, p. 43088-99. Disponível em: <http://www.boe.es/boe/dias/1999/12/14/pdfs/A43088-43099.pdf#>. Acesso em: 4 out. 2008. 89 GARCIA; ALONSO. Las bases de datos de perfiles de adn como instrumento de investigação policial, p. 39. 90 EUROPA. Conselho da Europa. Recomendação n. R(92) 1. 91 MORA SÁNCHEZ. Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal, p. 69. 92 LORENTE ACOSTA. Identificación genética criminal: importância médico legal de las bases de datos, p. 17. 20 em alguns países isto se faça de modo automático em outros é necessário um requerimento específico.” 93 OS TIPOS DE DELITOS INCLUÍDOS NUM BANCO DE DADOS PARA FINS DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL Aqui vislumbramos os reflexos da orientação estatal pelos poderes legislativo e executivo. Da classificação adotada pelo legislador, é diretamente proporcional o volume das amostras que constituirão o banco de dados. Um aumento do espectro dos indivíduos passíveis de se tomar amostras biológicas de referência (desde suspeitos aos já condenados), e ampliar o âmbito dos delitos a serem considerados (desde roubos até homicídios e crimes contra a liberdade sexual), o número de pessoas será muito maior do que se existissem fortes limitadores nestes aspectos. 94 Como não poderia ser diferente, cada Estado tem soberania para ditar suas próprias regras. Igualmente ao visto na leitura sobre o tempo de permanência dos dados, observa-se nos países a aplicação de distintos critérios. Há exemplos onde praticamente inexistem restrições, como nos casos do Reino Unido e dos Estados Unidos 95 , onde a polícia pode tomar uma amostra da saliva de qualquer suspeito. 96 Por outro lado, a maioria dos países baseia-se em critérios mais restritivos, variando entre tipo de delito e pelo tempo de condenação. A Áustria, Alemanha, Noruega, Espanha e Suíça restringem à natureza do crime, ou seja, procuram filtrar os dados inseridos pelos crimes mais graves. Note-se presente aqui, portanto, uma associação quase direta ao critério de tempo, posto que estes crimes geralmente apresentam condenações superiores a cinco anos. Já Holanda, Finlândia, Dinamarca, Suécia, Portugal e Bélgica, optam pelo critério cronológico. Por esse, inclui-se qualquer tipo de delito, basta a condenação superar o mínimo estabelecido. Com isso, pode acabar por sobrecarregar o banco com pessoas implicadas a 93 LORENTE ACOSTA, Identificación genética criminal: importância médico legal de las bases de datos, p. 17. LORENTE ACOSTA. Op. cit., p. 14 et seq. 95 Em janeiro de 2006, o Congresso dos Estados Unidos (EUA) aprovou mudanças nas regras sobre o acesso federal ao ADN de suspeitos. Antes, a legislação federal só permitia a coleta de ADN somente depois de decretada a condenação do acusado. Com a alteração, a coleta de ADN ficou no mesmo patamar que a coleta de uma impressão digital (LYTON, Julia. Como funciona o banco de dados de DNA nos Estados Unidos. Publicado em 06 de fevereiro de 2007 (atualizado em 24 de junho de 2008). Tradução: HowStuffWorks Brasil. Disponível em: <http://pessoas.hsw.uol.com.br/banco-dna.htm>. Acesso em: 12 de nov. 2007. A alteração foi introduzida pelo Decreto sobre Violência Contra Mulheres, título X. (ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. h.r.3402, de 5 de janeiro de 2006. Decreto sobre violência contra mulheres do departamento de justiça: renovção. Public Law, n. 109-162, de 5 de janeiro de 2006, p. 2959-3135. Disponível em: <http://pessoas.hsw.uol.com.br/framed.htm?parent=dna-database.htm&url=http://thomas.loc.gov/cgibin/bdquery/z?d109:h.r.03402:>. Acesso em: 4 out. 2008. 96 Ibidem. 94 21 delitos sem qualquer relação com indícios biológicos, com crimes os cometidos por meio da internet. 97 Com relação aos crimes cujos dados genéticos dos condenados deveriam constar em uma base de dados, não há dúvida alguma quanto aos de caráter sexual. Desde que se iniciaram as discussões sobre o implemento de um arquivo desta natureza, a justificativa era justamente a resolução dos crimes de estupro ou de atentado violento ao pudor. A razão disso reside no perfil de quem comete esse tipo de delito e na natureza do mesmo. Geralmente, o criminoso o comete mais de uma vez, demonstrando uma tendência à reincidência. Outro fator importante, é que neste tipo de crime há uma maior possibilidade de encontrar vestígios fontes de ADN para análise. Com isso ficaria muito mais fácil de localizar o autor do crime, já que um banco de ADN criminal serve para isto: localizar os reincidentes, uma vez que ela só pode comparar os dados que ela possui com os oriundos da cena do crime. Como ressalta Etxeberria Guridi, a limitação das infrações justificativas de análises de ADN e posterior incorporação a ficheiros automatizados dos resultados obtidos às de índole sexual se poderia explicar argumentando, por um lado, que são as ditas infrações, ainda que não de forma exclusiva, que favorecem por seu modo de comissão a produção de vestígios biológicos analisáveis. Por outro lado, a criação do ficheiro se explica ou justifica pela possibilidade de reincidência do autor e índice de reincidência em delinqüentes sexuais é muito elevado. 98 Por outro lado, poderemos observar, inclusive a partir do que já fora exposto, uma tendência ao alargamento dos delitos inseridos numa base de dados de ADN criminal. No âmbito da União Européia as tratativas de corroboração e intercâmbio de dados já nasceram com ênfase nos cometidos por terroristas, por exemplo. 99 Na França, a primeira base de ADN objetivou os crimes sexuais contra menores. Mais adiante, três anos depois, inicia-se um processo de dilatação dos delitos inseridos. Incluíram-se desde crimes contra a vida como ao patrimônio. O critério de inclusão, portanto, muda, deixou-se o da natureza do crime para adotar o da sua gravidade. Tudo isso, sob o manto de melhor garantir a segurança social. 100 97 LORENTE ACOSTA. Identificación genética criminal: importância médico legal de las bases de datos, p. 14- 5. 98 ETXEBERRIA GURIDI. Evolución expansiva en la francesa de los ficheros de huellas genéticas tras las recientes reformas, p. 117, tradução nossa. 99 Como visto anteriormente no Tratado de Prüm, por exemplo. 100 ETXEBERRIA GURIDI. Op. cit. Aduz o autor: “não nos encontramos ante uma mera ampliação das infrações em torno às quais cabe a realização da impressão genética e a incorporação da mesma a um ficheiro automatizado, senão ante uma modificação mais essencial, pois se altera a filosofia do mesmo texto. Anteriormente ao mesmo, a criação do ficheiro automatizado vinculado às infrações sexuais suporia sustentar aquele em torno da importância da reincidência nos crimes sexuais. Após a referida reforma, as infrações 22 A natureza da base de dados criminal, a vigilância de delinqüentes sexuais perigosos, foi alterada para que assim possa-se criar um banco de dados genético mais próximo do universal, compreendendo informações do maior número de pessoas possíveis. O que pode contrastar com o princípio da proporcionalidade “[...] que tem de inspirar as atuações do Estado que incidem na esfera das liberdades do indivíduo.” 101 Estudos justificando essa dilatação dos crimes a serem abocanhados pelo escrutínio dos bancos de dados a partir do ADN não faltam. O principal argumento seria de que muitos os autores de delitos mais graves geralmente cometeram antes outros de menor poder ofensivo. Assim, se fichados desde logo ao cometerem esses, o banco se tornaria mais eficiente e preciso no combate à impunidade. 102 DA AUTODETERMINAÇÃO E DA PRIVACIDADE Da equiparação da identificação via ADN aos demais modos de individualização, como as impressões digitais, emergem dúvidas importantes. Relevante aqui a visão de Víctor Gabriel Rodriguez ao afirmar que Tal posicionamento, entretanto, congrega claro delineamento reducionista. Isto porque, ainda que se possa dizer que o DNA é tão individualizador do ser humano quanto a já utilizada impressão digital, ele carrega em si uma série de informações distintas, relacionadas a outras matérias – a exemplo da raça, origem, possíveis doenças, predisposição a um ou outro comportamento – que, desnecessárias à identificação pessoal, podem gerar preconceito e interpretações deturpadas. 103 A Convenção sobre os direitos do homem e a Biomedicina expressamente prevê que nenhuma pessoa deve ser discriminada com relação ao seu patrimônio genético. 104 Na realidade, precisamos levar em conta que todos os seres humanos, independente de credo, cor ou sexo, devem ser tratados igualmente. Da mesma forma, não se justifica qualquer ato que previstas afetam aos bens, às pessoas e ao interesse nacional; o critério considerado, por conseguinte, não é o do bem penalmente protegido, senão o da gravidade efetiva das condutas.” (p. 118, tradução nossa). 101 Ibidem, p. 121, tradução nossa. 102 MORA SÁNCHEZ. Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal, p. 53 et seq. 103 RODRIGUEZ, Victor Gabriel. Tutela penal da intimidade: perspectivas da atuação penal na sociedade da informação. São Paulo: Atlas, 2008, p. 211. Segue o autor brasileiro: Imagine-se a hipótese de um gene que seja apontado, com sensacionalismo determinista,côo causador de tendência a comportamentos criminosos: quanto não pesaria como indício do cometimento de um delito, para além das meras condições de comparação identificadora, com os vestígios encontrados em um local periciado? (p. 211). 104 “Art. 11: É proibida toda a forma de discriminação contra uma pessoa em virtude do seu património genético.” EUROPA. Conselho da Europa. Convenção para a protecção dos direitos do homem e da dignidade do ser humano face às aplicações da biologia e da medicina: convenção sobre os direitos do homem e a biomedicina. 1997. Disponível em: <http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionaisdh/tidhregionais/convbiologiaNOVO.html>. Acesso em: 03 abr. 2008. 23 resulte numa reificação do homem ou que o trate como um instrumento, um meio; e não com um fim em si mesmo. Dentro do contexto da autodeterminação e da privacidade, será abordado, como ponto introdutório, a proteção à integridade física e moral. Considerando que um dos princípios do processo criminal seja a busca da justiça pela verdade; considerando ainda que esta não pode servir de justificativa para supressão de direitos dos cidadãos, já que uma das facetas do processo (em lato sensu) é a garantia dos direitos fundamentais, vejo que um dos sustentáculos da privacidade e da autonomia do indivíduo seja a sua integridade física e moral. 105 Fidalgo chama a atenção “que a tutela constitucional da integridade pessoal traduzse, desde logo, na afirmação da sua inviolabilidade, na inexistência de autorização expressa de leis restritivas [...].” 106 Já a Constituição Federal brasileira (CFB) prevê que é assegurado o direito à integridade física, independente de ser réu solto ou preso (art. 5, XLIX). Dentro do ordenamento jurídico brasileiro infraconstitucional, a proteção ao bem jurídico integridade física está indexada no art. 129 do Código Penal (CPB), já a integridade moral, no art. 146 do mesmo diploma. Relacionado aos bancos genéticos para fins criminais, não precisaremos pensar muito para achar um exemplo de como a integridade de uma pessoa possa ser ofendida. Ninguém irá discutir, levando-se em conta o atual estágio legislativo de nosso ordenamento jurídico, se se constitui um excesso por parte do Estado compelir alguém fisicamente a fornecer uma amostra de seu sangue. Mas o que podemos discutir é até onde vão os limites dessa intervenção. Aprofundando-se um pouco mais na questão, temos que analisar o que realmente constitui uma ofensa: se ela ocorre somente quando houver o recurso da força. Neste diapasão, devemos nos perguntar se toda forma de coleta de material biológico constitui uma ofensa. Essa relativização se torna presente uma vez que há outras fontes, além do sangue, que permitem a análise do ADN (cabelo, esperma, saliva, urina, pêlos, etc.). Portanto, se seguimos esta linha de raciocínio, defenderemos que somente constituirá um atentado a integridade física caso não haja ato de disposição contrário do indivíduo e sendo assim, o 105 FIDALGO. Determinação do perfil genético como meio de prova em processo penal, p. 120 et seq. Ibidem, p. 120. Na Constituição portuguesa encontramos, no art. º 25, n.º 1, a disposição sobre a inviolabilidade da integridade física e moral, mesmo para os casos de exceção – estado de sítio ou de emergência (art. 19.º, n.º 6). (PORTUGAL. Decreto de 10 de abril de 1976. Constituição da República Portuguesa. Disponível em: <http://www.pgdlisboa.pt/pgdl/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=4&artigo_id=&tabela=leis&nversao=&ficha =1&pagina=1>. Acesso em: 26 set. 2008.) 106 24 mais importante a ser analisado não é propriamente a coleta da amostra, mas a forma como fora feita. 107 No entanto, se entendermos que qualquer tipo de intervenção seja um ato atentatório, mesmo carente de um recurso forçado, como no caso, por exemplo, de obter amostras a partir de uma pessoa inconsciente, e entender que em regra o ordenamento jurídico assim o entende, o nosso raciocínio se inverte. Passaremos a defender que o consentimento não deve ser dado como forma de negação, e assim os casos omissos seriam interpretados como de autorização, mas sim como documento de autorização e exclusão de ilicitude. 108 A integridade moral tem-se sua violação “[...] na perturbação de liberdade de vontade ou de decisão e da capacidade de memória ou de avaliação.” 109 Está ligada ao nome, à imagem ou à intimidade. É a faculdade de autodeterminação da pessoa. Podemos inferir que sua análise se torna, assim, mais complexa, posto o caráter subjetivo que constitui a prova da existência de uma coação. Aplicando o mesmo entendimento supra demonstrado, pode-se defender que as dificuldades aqui expostas poderão ser minimizadas se houver o consentimento esclarecido do sujeito passivo. Partindo do ponto de vista dos atos de vontade do indivíduo, passarei a discorrer sobre a autodeterminação e a privacidade. A privacidade tem um conceito mais amplo que a intimidade. Alguns de nossos atos privados não fazem parte do invólucro da intimidade. Como ressalta Faria Costa Na verdade, o ‘eu’ vive em constante relação com o ‘outro’ e se o acto comunicacional é afirmação de abertura ao ‘outro’ isso supões (...) que o ‘eu’, para se desenvolver harmoniosamente, crie espaços onde o ‘outro’ só pode penetrar quando aquele, o ‘eu (...) o permita. A esse escrínio do nosso modo-de-ser individual é costume dar-se o nome de intimidade. 110 A simbiose existente entre o poder diretivo do Estado com a tutela da esfera privada promove muitas discussões sobre até onde se pode limitar essa, por meio de um normativo, sob o escrutínio de estar-se garantindo a ordem pública, ou seja, o benefício de todos os cidadãos. No direito alemão, com o intuito de garantir um balanceamento entre esses interesses, a jurisprudência cria a autodeterminação informacional, no sentido de que “[...] cada cidadão tem o direito de decidir, ele próprio, quando e dentro de que limites os seus 107 FIDALGO, Determinação do perfil genético como meio de prova em processo penal. p. 122. Ibidem, p. 123-4. 109 Ibidem, p. 125. 110 FARIA COSTA, José de. Direito penal, a informática e reserva da vida privada. In: Faria Costa, José de. Direito penal da comunicação: alguns escritos. Coimbra: Coimbra, 1998, p. 70. 108 25 dados pessoais podem ser revelados.” 111 Segundo Fidalgo, esse direito a autodeterminação informacional consagra-se, sob o manto jurídico português, como uma garantia fundamental constitucional 112 de direito à reserva da vida privada. 113 Sob os auspícios do ordenamento jurídico português, Moniz defende que a criação de um banco de impressões genéticas é fonte de ofensa “à privacidade/intimidade ou à autodeterminação informacional”. 114 Mas a autora lusitana reconhece que este direito não deve ser encarado como absoluto: ele pode sofrer limitações que deverão estar explicitamente descritas em leis em condições da mesma forma específicas. 115 Essa sopesação de interesses também se encontra presente em Rodriguez, que defende um trato diferenciado, por parte do legislador, ao que ele denomina de intimidade genética. Mas o autor ainda ressalta os interesses mediatos que poderão surgir: Qualquer lei que venha prever a criação de base de dados humano por meio de DNA esbarrará certamente na garantia constitucional da intimidade, e terá de lidar com sua compressão proporcional, em nome de um interesse maior. Mas, mesmo consciente da existência desse direito da personalidade, e daí a nota da excepcionalidade de seu sacrifício em nome do interesse de identificação pessoal, é difícil ao legislador escapar à tentação precipitada de adotar a tecnologia para solver seus problemas mais imediatos. 116 111 GÖSSEL, As proibições de prova no direito processual penal da República Federal da Alemanhã. Trad. Manuel da Costa Andrade. Revista Portuguesa de Ciências Criminais, n. 2, 1992, p. 432. Apud.: FIDALGO, loc. cit. 112 Art. 35º (utilização da informática) da Constituição da Republica Portuguesa, em especial o número 3: “A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem étnica, salvo mediante consentimento expresso do titular, autorização prevista por lei com garantias de não discriminação ou para processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis.” (PORTUGAL. Decreto de 10 de abril de 1976. Constituição da República Portuguesa. Disponível em: <http://www.pgdlisboa.pt/pgdl/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=4&artigo_id=&tabela=leis&nversao=&ficha =1&pagina=1>. Acesso em: 26 set. 2008.) 113 FIDALGO, Sónia. Op. cit, p. 127-8. Já Helena Moniz, defende que a esta “é simultaneamente um direito garantia do direito à reserva da vida privada e um direito fundamental que se traduz na faculdade de o particular determinar e controlar a utilização dos seus dados pessoais.” (MONIZ, Helena. Os problemas jurídico-penais da criação de uma base de dados genéticos para fins criminais. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, n. 2, Coimbra: Coimbra, 2002, p. 246-7). 114 Ibidem, p. 247. 115 MONIZ. Os problemas jurídico-penais da criação de uma base de dados genéticos para fins criminais, p. 246 et seq. 116 RODRIGUEZ. Tutela penal da intimidade, p. 212. Vemos mais adiante: “A criação de um banco de dados, entretanto, é muito mais complexa. Porque, à diferença do exame individual comparativo, o armazenamento de dados importa em grave risco de desvirtuamento dos dados em relação à finalidade para qual foram originalmente colhidos, a investigação da criminalística, transportando-se para uma criminologia determinista, que afrontaria várias conquistas históricas em matéria de direitos fundamentais. Em outras palavras, caso se armazenem informações genéticas advindas de seres humanos condenados por delitos – talvez os mais graves ou mais violentos -, será difícil renunciar à tentação de utilizá-la como material de pesquisa criminológica (de fundo genético). Pode-se facilmente, para aproveitar o discurso da busca da cura dos males transmitidos hereditariamente, para imputar a este ou àquele gene o comportamento criminoso, e a partir de então justificar um Direito Penal do autor, com razões científico-biológicas aparentemente resistentes a argumentos das ciências humanas. (sic) (p. 216). Do ponto de vista da bioética, isso poderia ser traduzido como um efeito slippery slope 26 Clotet 117 entende que a autonomia deve ser respeitada de forma mais ampla possível, mas evitando que a sua defesa, em caráter absoluto, não acabe por prejudicar a sociedade em sentido amplo ou a própria pessoa. Portanto, pode haver limitação neste direito de autodeterminação. O autor ainda chama a atenção para o fato de que o genoma humano, ou a série completa dos genes da espécie humana, é componente fundamental do patrimônio comum da humanidade, que “é evidente que o genoma pertence ao corpo e é ele que o determina”, mas o corpo de cada indivíduo ao mesmo tempo que o pertence, também integra o conjunto, formando uma unidade, que é a humanidade. Por esses motivos é que vimos no autor o equilíbrio dos interesses entre a autonomia individual e a coletiva ou a comunitária. No mesmo sentido, de forma a corroborar com Clotet, Mora Sánchez ressalta que em certas ocasiões alguns direitos fundamentais constitucionais cederão em favor de outros interesses ou valores igualmente protegidos devido a circunstâncias oriundas do caso concreto. Ou seja, os direitos fundamentais não são absolutos, podem sofrer restrições em situações onde se exigem interesses superiores, como o interesse social de reprimir e prevenir o comportamento delitivo. 118 Mas esta relação deve ser feita de forma comedida. Alguns requisitos ou garantias, como bem ressalva o autor, não podem deixar de ser observados. Primeiro, é importante haver uma previsão legal, onde se resumirá e legitimará a ação do Estado (lex previa, scripta, certa e stricta), servindo também como um limitador desse (nulla cactio sine lege). Além disso, o ato de limitação desses direitos devem passar pelo crivo judicial. Toda e qualquer ingerência deve preceder de uma autorização judicial fundamentada, onde “terá que apreciar a absoluta necessidade da realização dessa prova de ADN [...] para uma satisfatória resolução do caso.” 119 Outro requisito a ser observado, indo ao encontro do já exposto, é a proporcionalidade entre o ato elisivo com a sua necessidade. É o indispensável equilíbrio entre o interesse público, social e coletivo, com o interesse individual. A palavra-chave aqui presente é a ponderação, portanto. Mas não basta garantir esta sopesação se eu não agir da mesma forma com relação ao acolhimento e guarda das amostras. A tomada das amostras e sua posterior análise devem ser feitas por pessoa especializada e previamente credenciada pelo organismo (proposto 1985 por Schauer e traduzido para o português como “ladeira escorregadia”), onde a consideração ou admissão de um determinado comportamento, permite ampla aplicação a circunstâncias semelhantes, podendo levar no futuro a eventos não-desejáveis ou não presumíveis. (FELDHAUS, Charles. Hare e o problema da ladeira escorregadia. Ética. Florianópolis: Ufsc, v. 2, n. 2, p. 173-91, Dez 2003.) 117 CLOTET, Joaquim. Bioética como ética aplicada e genética. Bioética, v. 5, n. 2, Brasília: Conselho Federal de Medicina, 1997, p. 173-183. 118 MORA SÁNCHEZ. Propuesta para la creación y regulación legal en españa de una base de datos de adn con fines de identificación criminal, p. 45 et seq. 119 Ibidem, p. 48, tradução nossa. 27 competente. Trata-se, então, “[...] de uma dupla garantia, por um lado para o sujeito que as tolera, e por outro para a atuação em si.” 120 Ainda, importante a lume do preceito Constitucional brasileiro de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo (art. 5º, II). Da mesma forma, são invioláveis a intimidade e a vida privada (art. 5, X do CFB). Com base nessas disposições, a única possibilidade é a coleta do material com o consentimento do disponente. CONSIDERAÇÕES FINAIS Desde que se descobriu, em final da década de oitenta do século passado, a individualidade por meio do uso do ADN, iniciaram as primeiras proposições sobre seu uso na identificação criminal. Vende-se a idéia de uma ferramenta poderosa e imprescindível, que tornam as investigações criminais cada vez mais matemáticas, inequívocas de erro. Realmente, um arquivo dessa magnitude pode constituir-se numa ferramenta poderosa. Nunca se discutiu a sua capacidade de identificação, apesar de sabermos que ela em nada acrescenta às impressões digitais na individualização pessoal. Na verdade, o que foi facilitado, foram os meios de se obter uma identificação. Mas quando se trata da criação e constituição de um banco de ADN criminal, não podemos olvidar certos cuidados essenciais. Ele não pode ser utilizaado como a panacéia da política criminal. O seu uso deve ser restrito. Não é qualquer motivação que deva servir de justificativa. Como ressaltado neste trabalho, a constituição de um ficheiro de ADN necessariamente atinge a autonomia e a intimidade. As garantias constitucionais não devem ser deixadas de lado, em prol de um suposto direito maior de justiça social. Os direitos fundamentais, em regra, não podem sofrer limitações sem que lei especifique os casos excessivos. Um banco de dados não pode servir de ferramenta para reduzir o ser humano em meio. Ele não pode ser dissociado de sua finalidade: facilitar a identificação pessoal. Portanto, deve-se ter cuidado no trato das amostras, principalmente mo que se refere ao acesso das mesmas. O presente trabalho tentou trabalhar um tema incipiente, mas de grande interesse atual. Os bancos de dados genéticos para fins criminais são uma tendência irreversível. Tratase de um tema pouco abordado em nosso país, de parca produção doutrinária. Porém, é amplamente debatido no fórum de países ditos desenvolvidos há mais de uma década e meia. 120 Ibidem, p. 49, tradução nossa. Mais adiante, em síntese diz o autor: “Seria um erro pretender evitar este tipo de provas que supõem uma mínima intervenção e que, mas por outro lado, possuem alto grau de certeza. Os organismos públicos correspondentes não só deveriam estar facultados ao seu emprego e utilização, senão que deveriam estar obrigados a auxiliar-se desta nova modalidade pericial quando as circunstâncias do caso assim o aconselhar.” (p. 50, tradução nossa). 28 É imprescindível criarmos mais canais de discussões para debater o tema. Só assim ordenamento jurídico brasileiro poderá um dia chegar ao ponto de cria uma base nacional de dados genéticos para fins criminais. REFERÊNCIAS AGÊNCIA BRASIL (ABr). Polícia civil do df tem o primeiro laboratório de dna forense. Brasília, 2006. Disponível em: <http://www.radiobras.gov.br/ct/1996/materia_050796_5.htm>. Acesso em: 30 jul 2008. ALEMANHA e EUA assinam acordo para acesso mútuo de dados. Deutsche Welle, Berlim, Alemanha, 11 mar. 2008. Disponível em: <http://www.dw-world.de/popups/popup_printcontent/0,,3185510,00.html>. Acesso em: 02 set. 2008. ARGENTINA. Lei 23.511, de 13 de maio de 1987. Cria o Banco Nacional de Dados Genéticos. 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