XIII JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2013 – UFRPE: Recife, 09 a 13 de dezembro.
INVENTÁRIO DOS ANIMAIS COMERCIALIZADOS PARA FINS
MÁGICO-RELIGIOSOS NO MERCADÃO DO CABO DE SANTO
AGOSTINHO-PE
David Luan Alves dos Santos1, Jonathas Lins de Souza2, Ewerton Manoel da Silva3, Talitha Nóbrega da Silva4, Eduardo
Pereira Duarte da Silva5, Andreza Cristina da Rocha6, Múcio Luiz Banja Fernandes7
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INTRODUÇÃO
Desde a antiguidade, atributos mágico-religiosos vêm sendo relacionados aos animais em diversas culturas
humanas. Essas constatações evidenciam que a relação entre o homem e a natureza vai mais além que somente relações
ecológicas. Como aponta Marques (2005), o imaginário, presente no cotidiano de muitas pessoas e geralmente
associado à falta de conhecimento científico, gera uma, de muitas interações que o ser humano possui com o meio
ambiente: a interação místico-religiosa. Considerando que as religiões e aspectos culturais influenciam a percepção da
natureza e a relação entre seres humanos e a biodiversidade (Alves, 2006), evidencia-se claramente que o uso de animais
em práticas mágico-religiosas tem importantes implicações para a conservação. Alguns trabalhos evidenciam o uso de
animais silvestres para fins mágico-religiosos no Brasil (Alves, 2006; Alves & Pereira Filho, 2007). Algumas espécies
da fauna silvestre são usadas e comercializadas para fins mágico-religiosos, o que evidencia a urgência de estudos sobre
o tema, tendo em vista suas implicações conservacionistas e a ampla disseminação dessas práticas por todo o país.
Desse modo, o presente trabalho tem o objetivo de inventariar as espécies de animais de uso mágico-religioso
comercializadas na cidade do Cabo de Santo Agostinho- PE.
Material e métodos
Parte integrante da Região Metropolitana de Recife, com cerca de 220 mil habitantes e uma área territorial de 448
km², o Cabo de Santo Agostinho é conhecido por suas belas praias e reservas ecológicas. Limita-se ao norte com
Jaboatão dos Guararapes, a oeste com o município de Escada, ao sul com o município de Ipojuca e a leste com o
Oceano atlântico (Cprh, 2000).
A coleta dos dados de campo consistiu em visitas feitas às lojas de artigos religiosos situadas no Mercadão do
Cabo de Santo Agostinho, através de questionários semi-estruturados (Bernard, 1994), complementados por entrevistas
livres e conversas informais (Mello, 1995; Chizzoti, 2000; Albuquerque & Lucena, 2004).
Os comerciantes estão localizados em uma parte do Mercadão onde somente são vendidos artigos religiosos
(estatuetas de santos católicos e orixás, incensos, defumadores, cachimbos, quadros, colares), ervas medicinais e animais
para fins zooterápicos e mágico-religiosos. Todos os comerciantes que apresentaram algum animal, ou parte deste,
comercializado para fins mágico-religiosos foram entrevistados (n=8).
Os nomes dos animais foram registrados conforme pronunciados pelos comerciantes. A identificação, quando
possível, foi realizada através de visualização direta dos espécimes, consultas à bibliografia especializada e especialistas
na área.
Resultados e Discussão
Segundo os entrevistados, um total de 15 animais/produtos derivados destes é comercializado para propósitos
mágico-religiosos na cidade do Cabo de Santo Agostinho. Os animais citados se enquadram em sete grupos zoológicos:
Mamíferos, Moluscos, Aves, Répteis, Equinodermos, Peixes e Anfíbios (Tabela 1).
Os animais são comercializados inteiros ou em partes. As partes comercializadas consistem em pedaços de couro,
rabos, chifre, penas, conchas, olho e pata. Essas mesmas partes comercializadas também foram encontradas em
trabalhos anteriores em outras regiões do Brasil (Alves, 2006). É frequente observar partes de animais expostas para
comercialização, ainda que os comerciantes declarassem que a venda de algumas espécies era ilegal (Oreaster
reticulatus, Linnaeus, 1758 e Hippocampus reidi, Ginsburg, 1933), sendo proibida a sua comercialização. Dois
entrevistados informaram que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA) tinha
recentemente passado para vistoriar todas as lojas, sendo relatado por um deles que grande quantidade de O. reticulatus
foi apreendida em seu estabelecimento. Mesmo sabendo dessas proibições, foi comum constatar espécimes de H. reidi
1,3
Graduados em Licenciatura em Ciências Biológicas – FAFIRE
Graduandos do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas – UFRPE. Rua Dom Manoel de Medeiros, s/n, Dois Irmãos – Recife, PE. CEP:
52171-900. Email: [email protected]
4
Graduada em Licenciatura em Ciências Biológicas - UFRPE.
6
Graduanda do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, Departamento de Biologia, Universidade Federal de Pernambuco. Centro
Acadêmico de Vitoria de Santo Antão. Rua do Alto do Reservatório S/N Bela Vista.Vitoria de Santo Antão. Cep 55608-680.
7
Professor da Faculdade Frassinetti do Recife - FAFIRE. Av. Conde da Boa Vista, 921, Boa Vista – Recife, PE. CEP: 50060-002.
2,5
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estocados, sendo que os mesmos são apresentados aos clientes somente para eventuais vendas. Algumas espécies de
serpentes (Tabela 1) eram comercializadas inteiras em frascos contendo álcool. O comerciante informou que não sabia a
utilidade exata das mesmas, já que sacerdotes de religiões afro-brasileiras apenas iam comprá-las, o mesmo acontecendo
com outra comerciante que não sabia informar a finalidade exata do rabo da arraia. Serpentes para fins mágicoreligiosos também foram constatadas em trabalho anterior de Alves & Pereira Filho (2007).
Assim como ocorre em outras cidades do Brasil, o comércio de animais para fins mágico-religiosos é comum na
cidade do Cabo de Santo Agostinho. O uso de animais devido ao seu valor mágico-religioso é uma das formas de
utilização da diversidade biológica e a sua exploração deve ser considerada dentro de uma perspectiva conservacionista.
Além do caráter ecológico, os aspectos culturais associados ao uso de animais para fins religiosos são importantes.
Esses usos estão arraigados nas tradições religiosas, e constituem prática bastante antiga, de forma que o
estabelecimento de medidas conservacionistas voltadas para esse tipo de uso deve, também, considerar a dimensão
sociocultural associada a ela.
Agradecimentos
Agradecemos a todos os participantes desta pesquisa.
Referências
Albuquerque, U.P; Almeida, C.F.C.B.R. Uso e conservação de plantas e animais medicinais no Estado de Pernambuco
(Nordeste do Brasil): um estudo de caso. Interciência. v. 27, n. 6, p. 276-284, 2002.
Alves, R. R. N. Uso e Comércio de Animais para fins mágico-religiosos no Norte-Nordeste do Brasil. João Pessoa:
Universidade Federal da Paraíba, 2006. Tese (Doutorado em Ciências Biológicas- Zoologia).
Bernard, R. Research Methods in Anthropology: Qualitative and Quantitative Approaches. Thousand Oaks: Sage
Publications, 1994.
Chizzoti, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez, 2000.
Cprh – Companhia Pernambucana de Controle da População e recursos Hídricos. Projeto Massangana. Recife: 2000.
CD ROM.
Lucena, R. F. P. Métodos e técnicas para coleta de dados. In: Albuquerque, U. P.; Lucena, R. F. P. Métodos e técnicas
na pesquisa etnobotânica. Recife: NUPEEA/Livro Rápido, 2004.
Marques, J. G. W. “É pecado matar a esperança, mas todo mundo quer matar o sariguê”: Etnoconservação e catolicismo
popular no Brasil. In: Alves, A. G. C.; Lucena, R. F. P.; Albuquerque, U. P. Atualidades em Etnobiologia e
Etnoecologia. Recife: Nuppea, 2005.
Mello, L. G. Antropologia cultural. Rio de Janeiro: Vozes, 1995.
Pereira Filho, G. A. Commercialization and use of snakes in North and Northeastern Brazil: implications for
conservation and management. Biodiversity and Conservation. v. 16, p. 969-985, 2007.
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Tabela 1: Lista das espécies animais comercializadas para fins mágico-religiosos na cidade do Cabo de Santo Agostinho (PE), suas
respectivas utilizações e nomes pelos quais os comerciantes chamam as espécies (entre aspas).
ANIMAL
PARTE
UTILIZADA
UTILIZAÇÃO
“Búzio manteiga” –
morfoespécie
Concha
“Prever o
futuro”
Cypraea sp.- “Búzio
africano”
Strombus goliath (Schröter,
1805)-“Concha”
EQUINODERMOS
Oreaster reticulatus
(Linnaeus, 1758) – “Estrelado-mar”
Bolacha-de-praia - espécie
não identificada- “Estrelado-mar”
PEIXES
Hippocampus reidi
(Ginsburg, 1933) – “Cavalomarinho”.
“Arraia” – espécie não
identificada
ANFÍBIOS
Chaunus sp –“ Sapo”
Concha
“Prever o
futuro”
“Proteção”
MOLUSCOS
RÉPTEIS
Tupinambis sp. – “Teju”
Philodryas nattereri
(Steindachner, 1870)“Corre-campo”.
Oxyrhopus trigeminus
(Duméril, Bribon &
Duméril, 1854)- “Tricolor”
AVES
“Pavão” – Pavus cristatus
MAMÍFEROS
Sotalia fluviatilis (Gervais &
Deville, 1853) – “Boto
tucuxi”
Oryctolagus cuniculus
(Linnaeus, 1758) –
“Coelho”
Bos taurus (Linnaeus, 1758)
– “boi preto”
Concha
Exoesqueleto
“Simpatia para
Iemanjá”
Exoesqueleto
“Proteção”
Inteiro
“Atrair
dinheiro”
Rabo
“Atrair
dinheiro”
Inteiro; pó
“Proteger e
desembaraçar a
vida”
Couro
Inteiro
“Defumador”
“Acelera as
causas na
justiça”
“traz
felicidade”
Inteiro
Pena
“Afasta mauolhado”
Olho
“Proteção”
Pata
“Dá sorte”
Chifre
“Tira olhão”
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